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Lexicografia: Uma Introdução ao Estudo de Dicionários * CDU:801,32 Jondira Batista de Assunção * * s Estudo dos dicionários como objetos manufaturados e como discurso pedagógico. Tipofogia segundo os objetivos de cada tipo e quanto à natureza, densidade e alcance do léxico. Estrutura do artigo de dicionário. Problemas relativos a definições: fazer corresponder a uma unidade lexical'''n'' signos, no interior de "n" discursos. Compardção entre dicionário e Thesaurus. Do ponto de vista dalnformática, o thesaurus tem objetivos próprios, diferentes dos thesauri de Ungua ,- que diferem dos dicionários, apenas quanto á abrangência do léxico; Mas o thesaurus de Roget (1852), apesar de ser dicionário de Iingua, apresenta certas peculiaridades: as lexias são arranjadas por categorias eo objetivo é mostrar o relacionamento entre idéia/palavra; em lnformática, o thesaurus é um instrumento de controle terminológico, cuja finalidade é precisar assunto/descritor. Conclui: ' que estudos teóricos sobre a construção e manutenção dos thesauri só podem ser desenvolvidos se baseados' na teoria semântica, ou seja, nas relações entre osplanos de "conteúdo e expressão ". '. 7 1- DlCIONARIOS: NATUREZA, FUNÇÃO, DEFINIÇOES dicionário é um "objeto manufa- turado" que responde às exigências de informação e de comunicação de uma so- ciedade. É' um instrumento de educação permanente. É ponto de referência entre a língua e a ciência, entre a língua e a 'cultura. É uma obra de segunda mão: um texto sobre outros textos. É um livro de consulta, onde as informações são apresentadas segundo a nomenclatura das unidades lexicais. O dicionário de Robert dá a seguinte difíníção de dicionário: 1 "Elenco de palavras de uma língua, arranja- das em ordem alfabética ou segundo uma classificação que permita encontrá-Ias fa- cílmente." Podemos afirmar, então, que os dicionários podem e devem ser analisados como uma "praxis", como um material de consumo imprescindível à sociedade e com todas as ímplícações comerciais Trabalho de pós-graduação apresentado à Profa. Dra. Maria Aparecida Barbosa, da disciplina Lexicografia Estrutural, da FFLCH/USP, no 29 semestre de 1978. Mestre em Ciência da Informação pelo lBBD. Pós-Graduanda em Lingüística na FFLCH/USP, Profa. de 'Oassificação da ECA/USP.

Lexicografia: Uma Introdução ao Estudo de Dicionários · dos exemplos e pela conceituação de determinadas lexias: estruturalismo, mar-xismo, psicanálise, etc. Mas são sobretudo

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Lexicografia: Uma Introduçãoao Estudo de Dicionários *

CDU:801,32Jondira Batista de Assunção **

s

Estudo dos dicionários como objetosmanufaturados e como discursopedagógico. Tipofogia segundo os objetivosde cada tipo e quanto à natureza,densidade e alcance do léxico. Estruturado artigo de dicionário. Problemas relativosa definições: fazer corresponder a umaunidade lexical'''n'' signos, no interiorde "n" discursos. Compardção entredicionário e Thesaurus. Do ponto de vistada lnformática, o thesaurus tem objetivospróprios, diferentes dos thesauri de Ungua, - que diferem dos dicionários, apenasquanto á abrangência do léxico; Mas othesaurus de Roget (1852), apesar deser dicionário de Iingua, apresenta certaspeculiaridades: as lexias são arranjadaspor categorias e o objetivo é mostrar orelacionamento entre idéia/palavra; emlnformática, o thesaurus é um instrumentode controle terminológico, cuja finalidadeé precisar assunto/descritor. Conclui: 'que estudos teóricos sobre a construçãoe manutenção dos thesauri só podem serdesenvolvidos se baseados' na teoriasemântica, ou seja, nas relações entreosplanos de "conteúdo e expressão ".

'.

7

1 - DlCIONARIOS: NATUREZA,FUNÇÃO, DEFINIÇOES

dicionário é um "objeto manufa-turado" que responde às exigências

de informação e de comunicação de uma so-ciedade. É' um instrumento de educaçãopermanente. É ponto de referência entrea língua e a ciência, entre a língua e a

'cultura. É uma obra de segunda mão:um texto sobre outros textos. É um livrode consulta, onde as informações sãoapresentadas segundo a nomenclatura dasunidades lexicais. O dicionário de Robertdá a seguinte difíníção de dicionário: 1"Elenco de palavras de uma língua, arranja-das em ordem alfabética ou segundo umaclassificação que permita encontrá-Ias fa-cílmente."

Podemos afirmar, então, que osdicionários podem e devem ser analisadoscomo uma "praxis", como um materialde consumo imprescindível à sociedadee com todas as ímplícações comerciais

Trabalho de pós-graduação apresentadoà Profa. Dra. Maria Aparecida Barbosa,da disciplina Lexicografia Estrutural, daFFLCH/USP, no 29 semestre de 1978.

Mestre em Ciência da Informação pelolBBD. Pós-Graduanda em Lingüística naFFLCH/USP, Profa. de 'Oassificação daECA/USP.

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dos outros produtos manufaturados: custo,concorrência, especulação sócio-cultural.

Mas os dicionários podem ser vistostambém como um texto, como umaobra literária, 'Ou mais precisamente,como um discurso pedagógico e didático.A redação do dicionário se define comouma arte (OU uma técnica?). O lexicó-grafo deve seguir regras formais específi-cas do discurso pedagógico que fazem dodicionário um enunciado lexicográfico.O lexicógrafo toma como objeto do seudiscurso "o que se diz da língua ou da'cultura", segundo ele pretenda responderquestões sobre a utilização de "palavrase frases aceitáveis", ou sobre "coisas"denotadas (ciência e técnica) às quais sereferem o léxico. Deste ponto de vista,Duboís! diz que o lexicógrafo é umlingüista. Ele deve se referir explícitaou implicitamente a uma teoria lingüís-tica de onde procede sua análise. Ele étambém um antropólogo que define umacerta cultura, uma civilização; pode serum jurista, um geólogo, um médico etc.,segundo a área do conhecimento que 'élevado a definir.

Há certa contradição entre a atitudepedagógica e normativa do discruso didá-tico e a atitude científica e polêmicade um dicionário. A definição de palavrasou expressões implica necessariamenteI '

numa posição teórica ou ideológica. Aintrodução de uma dialética ideológicaOu cultural é feita consciente ou incons-cientemente pela seleção ou elaboraçãodos exemplos e pela conceituação dedeterminadas lexias: estruturalismo, mar-xismo, psicanálise, etc. Mas são sobretudoos exemplos que engajam ética ou esteti-camente o lexicógrafo. Os exemplosformam um conjunto de "asserções" sobreo mundo que implicam na ideologia dacomunidade com a qual o lexicógrafose identifica. O lexicógrafo é o interme-diário entre a Sociedade e os leitores.Seus enunciados têm força de lei. l! a

garantia da Norma que representa a comu.nidade ideal. Portanto, o dicionário podeser considerado como uma instituiçãosocial cuja função é definir a norma lin-güística. E tais regulamentos comportamsanções. O dicionário autoriza palavras,construções, sentidos integrando-os aouso da éomunidade. Contrariamente elecondena ou despreza rejeitando certosusos. A sanção mais decisiva é a rejeição.Uma lexia só é considerada como perten-cente a norma, quando aparece nos dicio-nários. A rejeição é feita também atravésde ~otações ou rubricas específicasjunto às lexias: "neologismo", "dialeto","arcaísmo" ;'farniliar" ...

E preciso notar também que algunsdicionários ditos de uso, rejeitam certosjulgamentos normatívos: a norma de gru-pos ou de ideologias que poss3J1l ser consi-geradas como as de uma comunidadetradicional e ultrapassada. Mas de ummodo geral, os dicionários tem carátercoletivo e não temporal. Ele se identificacom a língua nacional e com a comuni-dade ideal. O ensinamento dado nãocomporta tolerância. A resposta dada auma consulta não comporta ambigüidades.Aí aparece o caráter moral dos dícíonã-rios. Trata-se de uma diferença: importanteentre o discurso científico e o discursopedagógico. O discurso científico apre-senta uma tese, tenta falsear aquela àqual ele contesta, e oferece base parauma possível verificação; No discursOpedagógico nem a língua, nem a culturaregistrada são objetos de uma tese. Olexicógrafo desaparece ,no anonimato, con'fundindo-se com a comunidade que elerepresenta.

2 - OBJETIVOS E TIPOLOGIA

Os dicionários visam sobretudo pre-encher a uma lacuna «e conhecimenNque existe entre seus u tilizadores (usuárioS,

Jandira Batista de Assunção - Uma Introdução ... Dicionários 41

leitores) e a comunidade que representam,quer seja de um ponto de vista lingüístico,cultural ou científico. Eles facilitam assima comunicação lingüística ou científicacontribuindo para nivelar a competênciados falantes. Dentro desta abordagem,podemos analisar os objetivos dos dicio-nários sob quatro aspectos:

I. Valorizar o comportamento ver-bal, desenvolvendo ou aperfeiçoando osmeios de expressão pela análise semântica,sintática, morfológica ou fonética dalíngua: dicionários monoltngües.

11. Traduzir de modo satisfatóriomensagens, sentido, permitindo ultrapassar.as barreiras encontradas num enunciadoem língua estrangeira: dicionários bilin-gües.

111. Decodificar corretamente normassociais 'Ou científicas de diferentes uni-versos de discursos. Ampliar a competên-cia lingüística com relação à compreensãodo léxico de grupos diversos daquele aque o leitor pertence ou dos campos deexperiência que domina: dicionários tec-nicos ou de assuntos.

IV. Aumentar ou desenvolver osaber sobre o mundo, através de infor-mações mais completas sobre os dadosda experiência em qualquer área do conhe-cimento: dicionários enciclopédicos.

Podemos defrnir uma tipologia dosdicionários por meio de uma abordagemdiferente, usando critérios para a classi-ficação dos mesmos, dos quais selecío-namos os seguintes:

a) Quanto ao domínio, o alcancedo léxico:

todo o léxico: dicionários geraisparte do léxico: dicionários espe-

cializados (técnicos ou de as-sunto)

b) Quanto à natureza das informa-ções oferecidas sobre o léxico:

palavra da língua; defíníçõessemânticas e sintáticas: dicioná-rios de língua

coisa significada pelo léxico;dados ideológicos ou culturais -dicionários de "coisas", dicio-nário enciclopédicos.

c) Natureza da língua: língua origi-nal, derivada (cible) ou correlata:

Dic. monolíngües ou unilfngüesDic. bilíngües -ou plurilíngües (po-

liglotas)d) Densidade da nomenclatura em

relação ao léxico:Dic. extensivo - totalidade do lé-

xico (thesauri)Dic. intensivos - totalidade de

informações sobre uma lexía ouexpressão sintagmáticas.

e) Modelo genérico: Alain Reycriou um modelo teórico, gerativo, conce-bido para descrever toda a atividade le-xicográfica, a partir dos traços funda-mentais e estáveis, aplicáveis a qualquertipo de dicionário. O modelo não foibaseado na história ou numa visão deconjunto dos dicionários observados, con-forme vem sendo feito até o momento.A análise é tão geral quanto possível eo foco principal são os dados geradores,chegando-se a um número reduzido deelementos considerados essenciais e cons-tantes a todos os tipos já identificados. 3

Todos os lexicógrafos reconhecem'que os dicionários são quase sempreheterogêneos em relação a estas classi-ficações. Há uma continuidade do dicio-nário de língua no dicionário enciclopé-dico e do dicionário técnico no de línguapadrão, o que dá origem a diferentesformas intermediárias. Usando a combi-nação das duas características principais, -'maís . ou menos lingüísticos ou, maisou menos enciclopédicos (de coisas) - te-remos:/ + enciclopédico/ / - lingüísticof díc.técnicos, de assunto/ + enciclopédico/ / + lingüístico/ dic.enciclopédico

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i!:••.,,ati.~S!:;••

2. Unidades G'de Léxico

tratamento I I

4. Nomenclaturaordenada.

1. Dados(discurso)

7. Enunciadosexemplos

I - enciclopédico! ! + lingüísticol dic. delíngua

3 -' O ARTIGO DO DICIONARIO(A ENTRADA, O

ENUNCIADO)

A seqüência de palavras, a nomemcla-tura constitui a arquitetura do dicio-nário. A análise da nomenclatura e doenunciado lexicográfico levanta dois tiposde problemas:

_ os que dizem respeito às regrasde composição e apresentação gráficado artigo;

._ os que se referem à linguagemtécnica, ou metalinguagem lexicográficacom a qual se redige ou reescreve as ín-formações.

Os enunciados se organizam emartigos, sendo estes uma seqüência or-denada de frases que comportam umou vários tipos de infonnações. De um

5. Inf9 semi-funcionais6. Inf9 não-semânticas

modo geral, um artigo apresenta ou seconstitui dos seguintes elementos:A palavra, a unidade lexical, o "ende-

reço" - e. a entrada ou tema doqual as outras Informações vão sero predicado;

A pronuncia - transcrita em códigopróprio, de caráter internacional,aparecendo quase sempre entre pa·rentese,

A categoria gramatical - que dá os tra·ços sintáticos fuhdamentais, ist(é, a pertinência da palavra, quel

seja de um morfema-raiz ou untermo derivado, a uma parte d(discurso, determinada segundo I

análise gramatical tradicional: subitantivo, verbo, pronome, adjeti~1etc. Em seguida as sub_classes

masculino, feminino, transitivo dirt

to, qualificativo etc.A etmologia - a origem da palavra, oi

os elementos constitutivos, ou cprocedimentos sintáticos que a or

Jandira Batista de Assunção - Uma Introdução ... Dicionários

ginaram. Em alguns casos o dicio-nário fomece a data de apareci-mento do termo,

A definição - constitui-se de frases,que procura dar um sinônimo ouuma acepção da palavra. Cadafrase é enumerada ou separada porum sinal convencional

.Os exemplos - que oferecem ocorrên-cia da palavra em frases ou sin-tagmas.

Idiotismos e ecpressões estereotipadas- Informações específicas, termosúnicos de sub-entrada; provérbios,máximas etc.

O sentido funcional - São também sub--entradas; significação particular dotermo num discurso científico deter-minado. Ou informações ideológi-cas sobre o objeto denotado pelaentrada.

Cada tipo de dicionário dará ênfase maiorou menor em algumas destas infor-mações, donde os dicionários or-tográficos, etmológicos, de gíria,fonéticos etc.

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Existe uma redundância nas infor-mações dadas, numa relação entre asfrases que compõem o artigo e a entra-da:

X é definido por Y que é definidopor Z, mas Z só é definído por X

A Definição - Alain Rey 3 tentadefinir a defínição primeiramente pelaetmologia da palavra: definito - defi-nire - finire - "de + fínír ou de + ter-minar". Em Lógica a definição tem porobjeto detenninar. a extensão de umconceito; seria simplesmente "o con-junto de termos conhecidos cuja combi-nação determina o conceito". Para osgramãticos, filósofos de Port-Royal, adefinição é um remédio para a confu-são que nasce do nosso pensamento enos discursos pela confusão das .pala-vras.

A. Rey fala ainda da malignidadelexical - a palavra culpável é uma cons-tante de Bacon a Locke.

Para se evitar as ambigüidades, épreciso pelo menos lembrar-se das dife-renças clássicas entre deflnição de pa-lavras e definição de coisas, .entre defi-nições explicativas, delimitando i um con-ceito e definições construtivas, criandoo conceito; entre definições acidentaisque permitem somente o reconhecimentodo definido e definições essenciais.. À Lingüística interessam sobretudoas definições de palavras, explicativas eacidentais. Como Ciência Social, a Lin-güística não pode agir, por enquanto,senão para reencontrar seu objeto, nãode o criar.

Definição Lex icográfica: A defini-ção pela língua natural é sempre umadefinição de "palavras": seja de um signopor outros signos pertencentes ao mes-mo sistema e organizados segundo asleis deste sistema; seja de um "sígnífica-do" analisado em traços diferenciaise construtivos (semas) organizados emestruturas (sememas) pelas normas do

i!:Q'o~Sc..,Ol

Nos enunciados, as frases são redi-gidas num código particular, numa lin-guagem artificial. A metalinguagem le-xicográfica é explícita e convencional.

Um substantivo só é definido por'um síntagma nominal;

Um verbo só é apresentado no seuinfrnitivo;. Um adjetivo só é definido pelo

Slntagma: "se diz do que é ..."

Todas as frases têm como sujeitoa "Entrada", o endereço, e, como sin-tagma verbal, a informação. Exemplo:

o termo X é Y na língua faladao termo X é Z na língua de origem

o que pode ser parafraseado;o termo X é pronunciado Yo termo X é originário de Zo termo X significa P

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discurso; seja, enfim, de um conceitocuja descrição em língua natural é encar-regada de determinar a natureza e o usodo signo (termo) que o exprima. A de-finição de coisas seria então uma "pra-xis". Servir-se de um elemento distintode uma classe referencial, modificã-lo,agir sobre ele, isto é, ter mesmo de dis-tinguir um elemento de uma classe detodos os outros elementos da mesmaclasse. Assim o programa de definiçõesse reduz pela prática lexicográflca, afazer corresponder a uma unidade lexi-cal, supostamente desconhecida ou malconhecida, uma pluralidade de unidadespertencentes ao mesmo sistema lingüís-tico, e organizadas segundo as estruturassintáticas deste sistema, a fun de provo-car no leitor ou no ouvinte a elabora-ção conceitual adequada. Trata-se deinvocar pela definição (colocada comointérprete entre o signo e o significado)um conceito analisado, que deverá cor-responder ao mesmo significado e re-meter à mesma classe referencial.

Para Alain Rey, ao lexicógrafoescrupuloso o grande problema da de-fínição nos dicionários se resume noseguinte: 1. É nas várias estruturas ideo-lógicas e psicológicas que signo e concei-to são engajados. E o redator terá quesubstituir a defíníção de n signos nointerior de 11 discursos, muito mais ca-valheírescamente (diz ele)! por uma fór~mula única. 2. O signo muito raramenteaparece em' uma função única, ou seja,é quase impossível considerar qualquersigno num grau máximo de índetermí-nação. Daí as discussões a respeito de:

, 'I

definições práticas, arbitrárias;possibilidade de cada estruturasintagmática corresponder exata-mente a um semema distinto,uma vez que o signo possuivárias possibilidades de função,no discurso;a análise semântica dos dícioná-

rios ser uma distribuição domaterial descrito, de fatos lin.güistícos em fragmentos de umametalinguagem;a unidade gráfica ser ínsufícíentepara identificar a unidade lé-xica, por exemplo: o apóstrofo(n'alma, d'água, c'est, n'est); overbo na forma interrogativa (nãoé? que há?; ou vã-t-il"); o traçode união (pé-de-moleque; arriêre--grandparent); as palavras poli-morfas (Fou, fol; cou, col;beau,Bel, etc.; barganha, berganha;perguntar, preguntar; digo, dizes;fui, somos, é).

Discussões sobre problemas lexicaissimilares, de "soluções impossíveis"...podem e devem ser estudados atenta-mente.

A fragmentação de conceitos, deconjuntos conceituais interdependentes, oude classes conceituais é também fragmen-tada pela ordenação alfabética das le-xias. O arranjo alfabético é consideradopor A. Rey como uma outra absurdidadeque não conduz a nada, a não ser a umaseqüência já conhecida.

Na escolha dos dados ou dos ele·mentos que serão usados na defmição,o lexicógrafo deve ser mais íntuttíwque cíenttfico, selecíoríar os traços queaparecem no plano da experiência psi·co-lingüística de preferência àqueles quepertencem a um plano sistemático e/OU

científico. Por exemplo, na defmiçãoda lexia "gato", as relações mais coneretas e intuitivas seriam: "rato", "a!li·mal doméstico", "miado" , "bigodes","olhos cintilantes" - e no plano siste'mático, que é um "mamífero", perten'cente à família dos "felinos" ou, "qUeé delgado e que tem as patas semelhs"tes às do Leão, Leopardos", etc.

Jandira Batista de Assunção - Uma Introdução ... DI,cionários 45

4 - DICIONARIO E THESAURUS

o dicionário já foi visto comoproduto manufatu~ado e como textopedagógico,c~n:o dl~curso. Veremos agoraa relação Dícíonãrio-Thesausus, atravésda conceituação de "thesaurus", sejado ponto de vista lingüístico, seja doponto de vista da Informãtica,

Quando se fala em thesaurus (te-souro), pensa-se logo em "preciosida-des", em riquezas, em quantidade e,por analogia, em exaustividade. O the-saurus de língua visa, realmente, â to-talidade do léxico. É o "depositário",a "arca" das riquezas lexicais de umsistema, arrolando todas as palavras,unidades lexicais e sintagmas, sejam elesdo presente ou do passado. A preocupa-ção principal é, portanto, com a exaus-tividade, com a totalidade. Ex.: Trésorde Ia Langue Française. Contudo, em1852, um lexicógrafo inglês, Peter M.Roget fez um dicionário de língua aque chamou de Thesaurus af EnglishWords and Phrases, onde as lexias sãoapresentadas não em ordem alfabética,Como nos dicionários usuais, mas agru-padas em categorias lógicas e mostrandoum relacionamento entre elas. Não hou-ve a preocupação com a exaustividade,COma totalidade lexical. A riqueza lin-güística aqui se reflete numa ínterdepen-déncia semântica, no relacionamento con-ceitual, ou seja, na relação "idéia-pala'v "ra . A questão básica a que o dicionáriopre~ende responder é: qual a palavramaiSprecisa, mais adequada para expres-sar determinada idéia? ou: existe na lín-gua inglesa uma lexia mais precisa para~xpressar esta idéia? Assim, tanto a es-drutura quanto a função do thesaurusde Roget recebeu tratamento diversodos thesauri de língua até então conheci-as.

Do ponto de vista da Infonnática,POde-se igualmente definir o thesaurus

.•••.........

segundo a sua estrutura, ou segundo asua função. Segundo a sua função, umthesaurus é um instrumento de contro-le tenninológico, utilizado para tradu-zir a linguagem natural dos documen-tos para uma "linguagem sistêmica",reduzida, a ser usada pelos indexadores eusuários no armazenamento e na recupe-ração da informação. Quanto â sua es-trutura, o thesaurus é um Vocabuláriocontrolado, mas dinâmico de termos,que possuem entre si' relações hierár-quicas (gênero-espécie) e semânticas, eque abrange de maneira exaustiva umaárea específica do Conhecimento. 5

Como subproduto estruturado dalíngua natural, ele reúne a terminologíanecessária para descrever o conteúdodos documentos, com maior precisão,evitando as ambigüidades e inconsistên-cias da linguagem natural. Conformea natureza do controle tenninológico,vêm[ sendo elaborados, àtualmente, doistipos principais de thesauri:

a) thesauri que realizam o controleda terminologia por meio de termospreferidos, isto é, que admitem que ape-nas um único dentre os termos que de-signam um conceito seja empregada paraa indexação e recuperação do conceito--assunto;

b) thesauti cujas normas admitem,para a indexação e recuperação de assun-tos, todos os termos representativos deum conceito, mas que fazem correspon-der a todos esses termos uma representa-ção inequívoca do conceito I(por exemplo:um código numérico, um símbolo, umanotação). Neste tipo de thesaurus tor-na-se mais fácil o cancelamento de si-nônimos e a alteração de relações con-ceituais anteriores, no caso de um tennomudar de sentido.

Relação entre lexias efoll descri-tores. Uma das funções primordiais deum thesaurus é apresentar as relaçõesentre conceitos, mediante a indicação

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das relações entre as lexias ou descri-tores usados para designã-los. A redede relações entre um descritor e outrosproporciona assim uma espécie de defi-nição, ao situã-lo num espaço semântico.

Três tipos de relação devem mere-cer a atenção de quem esteja interes-sado na estruturação do thesaurus. Sãoelas:

relações hierárquicas (gênero/es-pécie);relações de equivalência (ou si-'nonímia);

- relações associativas (de afínída-de).

Em qualquer um destes casos <>relacionamento é recíproco, isto é, quan-do um descritor se acha em relação comoutro, a indicação é feita em ambos osdescritores.

Relações de equivalência. Quandocertos descritores são considerados equi-valentes, similares ou de significado qua-se idêntico, eles devem ser reunidos emcategorias de equivalência, de tal modoque os termos equivalentes correspon-dam a um único e mesmo conceito. Narecuperação (busca da informação), to-dos os documentos cujos assuntos es-tejam associados com a categoria deequivalência, serão recuperados, mesmoque apenas um só termo seja utilizadocomo descritor. Deve-se observar a dis-tinção entre:

- os sinônimos - termos que temo mesmo ou quase o mesmo sentido emdeterminada área de conhecimento; Ex.alteração, Modificação.

- os quase-sinônimos - isto é,termos cujos significados podem diferirnum vocabulário especializado, mas quesão considerados como sinônimos parafins de recuperação da ínformação.] Ex.Genética, Hereditariedade; Fluidez, Vis-cosidade.

Na apresentação da relação deequivalência são usadas as seguintes con-

venções:UP usado para (ex: Alteração Dp

Modificação) ;USE Usar (ex. Modificação US~

Alteração).A seguir um lay-out das recome-,

dações feitas acima (em ordem alfabé.tica):

.ALTERAÇÃOUP MODIFICAÇÃO

FLUIDEZUP VISCOSIDADE

GENÉTICAUP HEREDITARIEDADI

HEREDITARIEDADEUSE GENÉTICA

MODIFICAÇÃOUSE ALTERAÇÃO

VISCOSIDADEUSE FLUIDEZ

Isto quer dizer que, ao índexaou ao buscar (recuperar) uma informaçãtsobre "hereditariedade" , deve-se usar (termo Genética, é sob este termo qUI

os documentos serão encontrados. C

mesmo acontecendo com os outros doêexemplos.

Os termos preferidos foram: Alteração e Fluidez.. Relações hierárquicas. As relaçõC

hierárquicas exprimem as relações dsubordinação, mais conhecidas cient~camente como relações de gênero/esplcie. Em geral são analisadas sob qua~aspectos:

1. do geral para o específico2. do específico para o geral3. do todo para a parte4. da parte para o todo

Convencionalmente, as relações lJil

Jandira Batista de Assunção - Uma Introdução ... Dicionários 47

rárquicas são ap!esentadas, no thesaurus,da seguinte maneira:

TG - Termo genéricoTE ,- Termo específicoTEP -- Termo específico partitivoTR - Termo relacionado

Exemplos:

RÉPTEISTE LAGARTOSOFlbIOSTARTARUGAS

LAGARTOSTG RÉPTEIS

OFÍDIOSUP SERPENTES'TG RÉPTEIS

TARTARUGASTG RÉPTEISTR CROCODILOS

PLANTASTEPCAULE

FOLHAFLORFRUTOSEMENTE

CAULE. TGPLANTASTRTRONCO

FOLHATGPLANTAS

FLORTGPLANTASTEPPÉTALAS

Relações associativas (relação deafinidade) - Emprega-se comumente arelação associativa para explicitar osOutros tipos de relação entre conceitosque são intimamente relacionados nodiscurso científico e tecnológico. Con-tudo, como existe uma grande variedadede relações asso ciativas , estas devem~r estabelecidas somente quando setIver a certeza de que serão necessárias~ recuperação da informação, para me-

or atender ao usuário.

As relações associativas, em geral,são empregadas para indicar:

- autonomia ;'conceitos opostos,mas estudados freqüentemente juntos.Ex.: Permeabilidade e impermeabilidade

- coordenação: conceitos deriva-dos de um tronco comum. Ex.: Animaise Plantas; Educação e Ensino; Marxismoe Capitalismo; .

- relação genética: conceitos de-rivados ou originários uns dos outros.Ex.: Pais e Filhos.

- relação de causa e efeito; Ex.:Ensino e aprendizagem.

- similaridade física.- material, ins-trumental ou processual. Ex.: Xilogra-vura e Madeira; Catalogação e Catálogos;Indexação e Thesaurus.

No Thesaurus este tipo de relaçãoaparece como Termo Relacionado - TR,ou como Termo Correlato - TC:APRENDIZAGEM

TR ENSINOEDUCAÇÃOCAPITALISMO

TR COMUNISMOMARXISMOSOCIALISMO

COMUNISMOTR CAPITALISMO

MARXISMOSOCIALISMO

EDUCAÇÃOTR APRENDIZAGEM

EDUCAÇÃOENSINO

TR APRENDIZAGEMEDUCAÇÃO

IMPERMÉABlLIDADETR PERMEABILIDADE

MARXISMOTR CAPITALISMO

COMUNISMOISOCIALISMO I

PERMEABILIDADE iTR IMPERMEABILIDADE

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SOCIALISMOTR CAPITALISMO

COMUNISMOMARXISMO

Como se pode notar, reciproca.mente, junto a cada termo relacionado,aparecem, em rem1ssiva inversa, os ter-mos que lhe forem associados.

CONCLUSÃO

Dicionário e Thesaurus são obje-tos manufaturados que servem de ins-trumento de consulta e de trabalho paradiferentes tipos de usuários (escritores,leitores, bibliotecários, professores, pes-quisadores, estudantes, etc.) no uso ade-quado do léxico, da terminologia.

O primeiro visa ao discurso oralou escrito; o segundo, ao annazenamentoe à recuperação da infonnação registra-da em documentos.

O thesaurus, como instrumento decontrole tenninológico (Informâtica), ba-seou-se num thesaurus de língua, o de

Roget, cuja finalidade é a de ajustarprecisar "idéia e palavra", valorizand~o comportamento verbal da língua in-glesa, através da apresentação das rela,ções entre as diferentes lexias; o quecorresponde, por outro lado, a ajustar,precisar "assunto e descrito r" , visandoà maior precisão no processamento ena recuperação da infonnação.

Ambos devem \ ser analisados doponto de vista da Comunicação entreAutor-Leitor, Fonte-Receptor, a fim deque se possa obter um constante preces-so de retro-alimentação e atualização(manutençêo).l

N:enhuma tentativa parece ter sidofeita no sentido de desenvolver umateoria sobre a construção e a manuten-ção de thesaurus. Sabe-se, porém, queessa teoria, se desenvolvida, deveria le-var em conta a conceituação de "assunto","conteúdo" (significado) e "tennos-cha·ve". Em outras palavras, seria na teorialingüística, mais precisamente, na teoriasemântica (expressão e conteúdo). quese poderia encontrar uma base teóricapara desenvolver estudos igualmente teó-ricos sobre os thesauri.

Jandira Batista de Assunção - Uma Introdução ... DIcionários 49

REFEReNCIAS BIBLlOGRAFICAS

1 _ DUBOIS, Jean. Dictionnaire et discours didactique. Languages, 5 (9): 34-47,sept. 1970.

2- DUBOIS, Jean & DUBOIS, Jean Claude. Introduction à Ia lexicographie: le dic-tionnaire. Paris, Larousse, 1971. Capo 1, 2,3,4,5,11 e 12.

REY, Alain. Le lexique: images et modeles; du dictionnaire à Ia lexicologie. Pa-ris, A. Colin, 1977. Capo 1-4.

3-

4 - SOERGEL, Dabgobert. Indexing languages and thesauri: construction and main-tenance. Los Angeles, Melville, J. Wüley, 1974. Capo D.

5 - UNESCO. Diretrizes para elaboração e desenvolvimento de thesaurus monolinguesdestinados à recuperação de informações. Trad. Antônio Agenor Briquet deLemos. Brasília, Departamento de Biblioteconomia da UnB, 1973. (Documen-to SC/WS/SOO)

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