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 CUR RÍC ULO E DIVERSIDADE CULTURAL Eunice Maia Assumpção Grace Gotelip Cabral Rossilene Brasil Muniz Valda Inês Fontenele Pessoa

Livro Curriculo e Diversidade

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Livro sobre diversidade e currículo

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  • C U R R C U L O E D I V E R S I D A D E C U L T U R A L

    Eunice Maia AssumpoGrace Gotelip CabralRossilene Brasil MunizValda Ins Fontenele Pessoa

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    Estado do AcreGovernadorArnbio Marques de Almeida JniorVice-GovernadorCarlos Csar Correia de MessiasSecretaria de Estado de Educao do AcreMaria Corra da SilvaCoordenadora de Ensino Superior da SEEANilzete Costa de Melo

    Fundao Universidade de Braslia FUB/UnBReitor Pro TemporeRoberto Armando Ramos de AguiarVice-ReitorJos Carlos BalthazarDecana de Ensino e GraduaoMrcia Abraho MouraDecano de Pesquisa e Ps-graduaoMarco Antnio Amato

    Faculdade de Educao FE/UnBDiretoraIns Maria Marques Zanforlin Pires de AlmeidaVice-Diretora e Coordenadora GeralLaura Maria CoutinhoAssistentes PedaggicasEvandra Cristina de CastroMnica da Costa BragaCoordenador de TecnologiasLcio Frana TelesSecretaria do CursoAntonilde Gomes BomfimMaria Cristina Siqueira MelloAdministrao da PlataformaJoviniano Rabelo JacobinaSetor FinanceiroFrancisco Fernando dos Santos SilvaCoordenao IntermediriaAureclia Paiva RuelaAulenir Souza de ArajoJos Ferreira da SilvaMaria Lucilene Belmiro Melo AccioDesign instrucionalEzequiel Neves

    Professores (as) Mediadores (as)Adima Jafuri MaiaAdriana Arajo de FariasAdriana Martins de OliveiraAleuda Soares Dantas TumaAna Cludia de Oliveira SouzaAna Maria Agostinho FariasAntonio Auclio Assis de AlmeidaArtemiza Barros PimentelCarmem Cesarina Braga PereiraCtia Maria da Silva SilvanoDomingas Pereira da Costa FerreiraEliana Maia de LimaElizete Maia de Limarica MedeirosGeania Mendona da CostaGercineide Maria da Silveira FernandesHevellin de Figueiredo FlixHilda Jordete Marinho

    Gercineide Maria da Silveira FernandesHevellin de Figueiredo FlixIvanir Oliveira de LimaJocilia Braga de SouzaJorge Gomes PinheiroJos Ribamar Gomes AmaralLeidissia Alves de CastroLuciana M Rodrigues de LimaLuciene Nunes CalixtoLucilene de Andrade MoreiraLuiz Augusto da Costa dos SantosMrcia da Silva QueirozMrcia Maria de Assis AlencarMaria Cirlene Pontes de PaivaMaria de Nazar Ferreira PontesMaria do Carmo de Lima GomesMaria do Rosrio Andrade SenaMaria Itamar Isdio de AlmeidaMaria Izaunira Nunes da Silva

    Maria Mirnes Soariano OliveiraMaria Zenilda de Lima CorreiaMarilza da Silva RodriguesMiraclia M Freire de MouraMirna Suelby MartinsNadir Silva de SouzaNorma Maria da Silva OliveiraNorma Maria Vasconcelos BaladoOzana Alves de BritoPedro Lopes da SilvaRenilda Moreira ArajoRita de Cssia Machado MommeratSmia Gonalves da SilvaSonja Priscila Vale de Freitas FernandesUilians Correia CostaVnia Maria Maciel TaveiraVanucia Nunes Valente CalixtoVera Maria de Souza Moll

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    Mo692Mdulo V: Currculo e diversidade cultural / Eunice Maia As-sumpo, Grace Gotelip Cabral, Rossilene Brasil Muniz, Val-da Ins Fontenele Pessoa. Braslia: Universidade de Braslia, 2008. 43 p. 1. Educao a distncia. 2. Currculo: Etimologia e Principais Abordagens Tericas. 3. A Abordagem Curricular. 4. Mltiplas Culturas. I. Assumpo, Eunice Maia. Cabral, Grace Gotelip. Mu-niz, Rossilene Brasil. Pessoa, Valda Ins Fontenele. II. Universida-de de Braslia. Faculdade de Educao.

    CDD 375 ISBN: 978-85-230-1320-2

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    Sumrio

    Conhecendo as autoras ___________________6

    Apresentao ___________________________8

    Seo 1

    Currculo e sua Histria _________________ 11

    Currculo: Etimologia e Principais Abordagens Tericas ___ 12

    A Perspectiva Curricular Tradicional ____________________ 13

    A Perspectiva Curricular Crtica ________________________ 15

    Seo 2

    A Abordagem Curricular no Brasil ________ 21

    Leia sobre as mudanas no nosso Estado ________________ 26

    Mltiplas Culturas: Currculos Diferenciados _____________ 29

    Seo 3

    Sala de Aula: Espao de Culturas _________ 33

    Bibliografia ___________________________ 40

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    Conhecendo as autorasEunice Maia Assumpo

    Natural de Mncio Lima-Acre, casada, e me de dois filhos. Estudou na Zona Rural do Estado, fez Magistrio de 2 Grau, possui graduao em Pedagogia pela Uni-versidade Federal de Mato Grosso (1990), especializao em Currculo e Avaliao Educacional pela Uni-versidade Federal do Acre (1997) e mestrado em Educao pela Uni-versidade Federal do Rio de Janei-ro (2003).

    Atualmente professora da Universidade Federal do Acre. Tem experincia na rea de Educao, com nfase em Pla-

    nejamento e Avaliao Educacional. Atuando principalmente nos seguintes temas: Legislao Educacional, Avaliao da Aprendiza-gem, Avaliao Educacional. Tem participado do amplo programa de formao de professores desenvolvido pelo Estado do Acre e Universidade Federal do Acre, como Coordenadora do Curso de Pe-dagogia, e, atualmente, como Coordenadora de Campi/PROGRAD na UFAC, situao que lhe permite acompanhar todos os cursos de formao.

    Grace Gotelip Cabral

    Possui Graduao em Licenciatura Plena de Pedagogia pela Universidade Federal do Acre (1995) e mestrado em Educao pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2003). Atualmente pro-fessora assistente da Universidade Fede-ral do Acre. Tem experincia na rea de educao e atua na graduao nas disci-plinas de Didtica, Fundamentos da Ge-ografia, Metodologia do Ensino de Geo-grafia, Investigao e Prtica Pedaggica, Estgio Supervisionado e TCC.

    Na Ps-Graduao atua com Teorias da Educao, Pressupos-tos Tericos da Administrao Escolar, Metodologia do Ensino Su-perior e Metodologia do Trabalho Cientfico. Membro do grupo de pesquisa Educao, Culturas, Identidades e Cidadania, atuando nos seguintes temas: organizao e gesto escolar, prticas educativas formais e no formais, prticas pedaggicas, organizao do traba-lho docente, sucesso e fracasso escolar.

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    Rossilene Brasil Muniz

    Possui graduao em Licencia-tura Plena em Pedagogia pela Univer-sidade Federal do Acre (1989), gradu-ao em Bacharelado em Direito pela Universidade Federal do Acre (1992) e mestrado em Educao pela Universi-dade Federal do Rio de Janeiro (1999). Atualmente professora do quadro efetivo dedicao exclusiva da Uni-versidade Federal do Acre. Tem expe-rincia na rea de Educao e Gesto, tendo sido Coordenadora de Curso de Graduao de Pedagogia, Assessora Pedaggica do Curso de Pedagogia do Programa Especial de For-mao de Professores para a Educao Bsica. Atualmente Coorde-na as atividades de Ensino de Graduao CADEN/PROGRAD/UFAC. Atua principalmente nos seguintes temas: educao, ensino da ln-gua portuguesa, leitura, prtica de ensino e investigao e prtica pedaggica e gesto.

    Valda Ins Fontenele Pessoa

    Nasceu em Rio Branco Acre. Pos-sui graduao em Pedagogia pela Universidade Federal do Acre (1981) especializao em Planejamento Educacional pela Universidade Fede-ral do Acre (1986), especializao em Metodologia do Ensino Superior pela Universidade Federal do Acre (1994), Mestrado em Educao pela Universi-dade Estadual de Campinas-UNICAMP (1999) e aperfeioamento e atualiza-o em Administrao Universitria pela Universidade Federal do Amazonas (1994).

    Atualmente professora do Ensino Superior e Pr-Reitora de Graduao da Universidade Federal do Acre. Tem experincia na rea de Educao, com nfase em Currculo, atuando principalmen-te na Formao de Professores.

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    ApresentaoNos ltimos anos no Brasil as discusses sobre currculo e di-

    versidade cultural vm ocupando posies de destaque nos fruns educacionais e nos cursos de licenciaturas, seja pelas variadas pro-postas curriculares oficiais que chegam s escolas, seja pela multi-plicidade terica que tem constitudo o campo curricular. Nesse fas-cculo, as autoras procuram oferecer a voc professor(a) um mapa sinttico dos estudos sobre currculo, desde a sua origem, chegando s discusses atuais, com a inteno de subsidiar as reflexes acer-ca do cotidiano das escolas. A concepo que permeia o presente material est centrada na idia de que o currculo corresponde a uma seleo da cultura dentro de um universo muito mais amplo de possibilidades. Essa seleo no ingnua e no pode ser enfrenta-da como neutra. As escolhas realizadas e as ausncias de temticas no currculo demonstram o resultado de disputas culturais dentro de um territrio que se travam lutas por diferentes significados do indivduo, do mundo e da sociedade.

    Com essa viso geral, o mdulo foi organizado em duas se-es: na primeira apresentado o significado original do termo currculo e suas transformaes ao longo da histria da educao escolarizada. Na seqncia so esboadas as vrias concepes te-ricas de currculo, produzidas ao longo da histria, abordando o pensamento de autores representativos das concepes tradicio-nal, progressivista e crtica tanto do exterior, quanto no Brasil. Na segunda seo so tratados aspectos da diversidade cultural e suas implicaes para o currculo. Explicita preocupaes que devem estar presentes nas reflexes e nos fazeres dos agentes que tm a incumbncia de produzir e tornar vivo o currculo da escola. Afir-ma a centralidade das culturas no campo curricular, evidenciando a importncia dos aspectos que envolvem o poder de deciso nas definies e implementaes curriculares.

    A segunda seo evidencia ainda, caro professor(a), aspectos que envolvem o universo da sala de aula, sua constituio e diver-sidade, colocando foco na diferena cultural ali presente, reconhe-cendo o direito a essa diferena e a riqueza que dela advm. Por fim, faz parte do material desse mdulo pequenos textos, para refle-xes, que retratam a realidade do Acre, indicaes de leituras com-plementares e sugestes de atividades acerca dos estudos a serem realizados.

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    1Currculo e sua Histria

    OBJETIVOS ESPECFICOS

    - compreender as construes de entendimento do signicado de currculo nos diversos momentos da histria; - comparar a prtica pedaggica desenvolvida na escola com as concepes de currculo estudadas.

    Alunos de escola pblica em Mncio Lima/ACFoto COCAM/UFAC

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    Currculo: Etimologia e Principais Abor-dagens Tericas

    Caros professores e professoras!

    Nossa expectativa a de encontr-los animados para essa nova etapa do curso!

    Nessa etapa iniciaremos o estudo da temtica Currculo e Di-versidade Cultural, dando continuidade, assim, sua formao pro-fissional em servio. Desejamos compartilhar com voc momentos ricos de formao e de alegria no estudo.

    Para iniciar nossa conversa, estaremos explicitando a origem do termo currculo e como hoje podemos conceitu-lo, nesse senti-do vamos comear.

    A palavra currculo tem sua origem no vocbulo latino currere, significando correr em um determinado trajeto, caminho. a par-tir dessa significao, que ao longo da histria do currculo, alguns pensadores da educao interpretaram o termo como um percurso a ser trilhado pelo aluno no processo educativo vivenciado no inte-rior da escola. Assim, etimologicamente a compreenso foi sendo construda em torno da idia de que o currculo o contedo apre-sentado para estudo, prescrito para ser ensinado de forma seqen-ciada a uma classe de educandos (viso original).

    O termo currculo j recebeu muitas significaes. Ao fazer-mos uma investigao sobre os conceitos a ele atribudos, selecio-namos para trabalhar com vocs aquele que Burnham (1993) ela-borou. Segundo esse pensador o currculo um processo social, que se realiza no espao concreto da instituio educativa, com a atribuio de dar queles sujeitos que ali interagem, acesso aos diferentes referenciais de leitura e relacionamento com o mundo, proporcionando-lhes no apenas um lastro de conhecimentos e de outras vivncias que contribuam para a sua insero no processo da histria, como sujeito do fazer dessa histria, mas tambm para a sua construo como sujeito (qui autnomo) que participa do processo de construo e de socializao do conhecimento e, assim, da instituio histrico-social de sua sociedade.

    Da viso originria a compreenso do termo currculo foi sen-do transformada e complexificada, mobilizada pelas circunstncias conjunturais, associadas com a institucionalizao da educao de massas. O surgimento do currculo, como campo de estudo, acon-tece nas primeiras dcadas do sculo passado, quando a sociedade americana passa por grandes transformaes.

    Das concepes iniciais, predominantes na rea por um gran-de perodo, surgem as orientaes baseadas na fenomenologia, no neomarxismo e, hoje, convivemos tambm com as vises enfatiza-das pelas teorias ps-estruturalistas e ps-modernas.

    Caro aluno, para melhor entendermos as orientaes tericas que formam o mosaico do campo curricular, faremos uma breve in-curso pelo caminho trilhado pelos principais pensadores que tm como objeto de estudo o currculo.

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    Etimologia - a parte da gramtica que trata da his-tria ou origem das pala-vras e da explicao do sig-nificado de palavras atravs da anlise dos elementos que as constituem. Por ou-tras palavras, o estudo da composio dos vocbulos e das regras de sua evolu-o histrica.

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    Fenomenologia (do grego phainesthai, aquilo que se apresenta ou que se mostra, e logos, explicao, estudo) afirma a importn-cia dos fenmenos da cons-cincia os quais devem ser estudados em si mesmos tudo que podemos saber do mundo resume-se a es-ses fenmenos, a esses ob-jetos ideais que existem na mente, cada um designado por uma palavra que repre-senta a sua essncia, sua significao. Os objetos da Fenomenologia so dados absolutos apreendidos em intuio pura, com o prop-sito de descobrir estruturas essenciais dos atos (noesis) e as entidades objetivas que correspondem a elas (noema). A fenomenologia o estudo da conscincia e dos objetos da conscincia. A Fenomenologia represen-tou uma reao pretenso dos cientistas de eliminar a metafsica.

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    A Perspectiva Curricular Tradicional no contexto americano que surge a perspectiva curricular

    tradicional. Nessa poca os Estados Unidos da Amrica estavam imersos em preocupaes impostas pela crescente industrializao e urbanizao; a extenso da educao escolarizada em nveis cada vez mais altos a segmentos cada vez maiores da populao; pre-ocupaes com a manuteno de uma identidade nacional, como resultado das sucessivas imigraes. Essa orientao curricular sur-ge diretamente vinculada a preocupaes estritamente tcnicas de organizao e de mtodo. Antes da predominncia dessa viso, vi-gorava nas escolas americanas o currculo clssico humanstico, her-deiro da Antiguidade Clssica, estabelecido pelo trivium (gramtica, retrica e dialtica) e quadrivium (astronomia, geometria, msica e aritmtica).

    O currculo clssico at ento vigente, objetivava introduzir os aprendizes no mundo das grandes obras literrias, artsticas e, ao mesmo tempo, lev-los a dominar a lngua grega e latina. Para justificar a necessidade de mudar a forma de organizao curricular em vigor, os pensadores tecnocrticos destacavam a suposta inu-tilidade das habilidades e conhecimentos desenvolvidos por esse modelo para o trabalho da vida moderna.

    A referncia curricular tecnocrtica, devedora da literatura educacional americana, tem seu marco no livro de Bobbitt, publi-cado em 1918. As indicaes tericas desse pensador estavam cla-ramente articuladas e preocupadas com a economia e para essa finalidade o sistema educacional deveria se organizar. No modelo de organizao escolar proposto por Bobbitt h uma prioridade em definir de forma precisa os objetivos a serem perseguidos no pro-cesso educativo.

    Para a definio dos objetivos tomava como parmetro as ha-bilidades requeridas para a ocupao eficiente dos diversos postos de trabalho no contexto industrial. Tais objetivos ao serem definidos possibilitavam, segundo aquele pensador, o estabelecimento de mtodos adequados para alcan-los e mensur-los de forma preci-sa. Com a mensurao dos objetivos o processo educacional seguia seu curso ou passava por alteraes julgadas necessrias.

    Segundo Bobbitt a escola deveria funcionar da mesma forma que qualquer outra empresa, fosse ela industrial ou comercial. E as-sim sendo, caro aluno, o sistema educacional deveria ser to eficien-te quanto quelas. Sua palavra-chave era eficincia e para exercitar o trabalho com eficincia acreditava que o processo de trabalho iniciava-se com a especificao precisa de quais resultados preten-dia obter de modo a favorecer a escolha do mtodo adequado e a forma de mensur-los.

    Embora o contexto vivido por Bobbitt fosse os Estados Uni-dos, seu pensamento influenciou sobremaneira os educadores da rea de currculo do Brasil. Essa atrao pelo modelo de Bobbitt talvez tenha predominado por permitir um fazer educacional mais calcado no pensamento cientfico.

    Com essa orientao a questo curricular entra para a histria com uma perspectiva estritamente tcnica, cabendo ao curriculista a tarefa de realizar o levantamento das habilidades requeridas para

    Designa-se por ne-omarxismo ou marxismo ocidental o conjunto das correntes nascidas nos anos vinte do sculo XX.

    O estruturalismo uma corrente de pensa-mento nas cincias huma-nas que se inspirou no mo-delo da lingustica e que apreende a realidade social como um conjunto formal de relaes.

    Chama-se de Ps-Mo-dernidade a condio scio-cultural e esttica do capitalis-mo contemporneo, tambm chamado de ps-industrial ou financeiro. um termo que se tornou de uso corrente, mas bastante disputado. Tericos e acadmicos tm diferentes concepes sobre o mesmo.

    A Ps-Modernidade, que o aspecto cultural da socieda-de ps-industrial, inscreve-se neste contexto como conjunto de valores que norteiam a pro-duo cultural subseqente. Entre estes, a multiplicidade, a fragmentao, a desreferen-cializao e a entropia - que, com a aceitao de todos os estilos e estticas, pretende a incluso de todas as culturas como mercados consumido-res. No modelo ps-industrial de produo, que privilegia servios e informao sobre a produo material, a Comu-nicao e a Indstria Cultural ganham papis fundamentais na difuso de valores e idias do novo sistema.

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    as diversas ocupaes no campo do trabalho e a partir desse mape-amento, organizar e desenvolver contedos padronizados e acom-panhados de mtodos que possibilitassem a sua aprendizagem e o domnio das habilidades inicialmente pretendidas.

    O pensamento de Bobbitt consolidado em 1949 com a pu-blicao do livro de Ralph Tyler. Este livro vem fortalecer a idia de currculo em torno do binmio organizao e desenvolvimento. Re-finando a proposta evidenciada anteriormente, Tyler afirma que a organizao e o desenvolvimento curricular deve buscar responder quatro questes bsicas:

    1. Que objetivos educacionais deve a escola procurar atingir? 2. Que experincias educacionais podem ser oferecidas que

    tenham probabilidade de alcanar esses propsitos? 3. Como organizar eficientemente essas experincias educa-

    cionais? 4. Como podemos ter certeza de que esses objetivos esto

    sendo alcanados? Tais questes correspondem diviso tradicional da ativida-

    de educacional: A primeira questo corresponde em termo estrito a currculo; a segunda e terceira questes so correspondentes a ensino e instruo e a quarta e ltima equivale a avaliao. Se-gundo Silva (2001) sobre a primeira questo que Tyler dedica a maior parte do seu livro. E sobre esse aspecto orienta que para a formulao dos objetivos educacionais trs fontes devem ser con-sideradas:

    1. Estudos sobre os prprios aprendizes; 2. Estudos sobre a vida contempornea fora da educao; 3. Sugestes dos especialistas das diferentes disciplinas. So acrescidos, se compararmos s orientaes de Bobbitt,

    dois aspectos. Ao propor estudos sobre os alunos e consultas aos especialistas das diferentes reas disciplinares, introduz a psicologia e as disciplinas acadmicas como fonte de conhecimento e subsi-diadoras para as definies dos objetivos educacionais. Alm dos dois aspectos sugeridos acima, orienta para a necessidade do uso de filtros capazes de superar contradies entre objetivos emergi-dos das diferentes fontes inicialmente propostas. Os filtros so a fi-losofia social e educacional e a psicologia da aprendizagem.

    ressaltado ainda, que os objetivos devem ser formulados em termos de comportamentos explcitos. Segundo o modelo de Tyler, somente a partir de uma definio precisa, detalhada e compor-tamental dos objetivos que ser possvel responder s trs outras questes que constituem o paradigma desse pensador. Ou seja, definir com preciso quais so as experincias a serem vivenciadas pelos aprendizes e como organiz-las e mensurar se o caminho tri-lhado alcanou a meta desejada vai depender de como os objetivos educacionais foram visualizados.

    Como possvel observar tanto no modelo de Bobbitt, quan-to no modelo de Tyler, no h qualquer preocupao em fazer ques-tionamentos mais radicais em relao s formas dominantes de co-nhecimentos ou forma social dominante. Tomavam o status quo como referncia aceita e irreprovvel para desencadear o processo de organizao e desenvolvimento curricular, restringindo-se aos aspectos de como fazer o currculo.

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    A hermenutica a cincia que estabelece os princpios, leis e mtodos de interpretao. Em sua abrangncia trata da teoria da interpretao de sinais, smbolos de uma cultura e leis.

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    Embora as idias de Bobbitt e de Tyler tenham predominado a formao do currculo como campo de estudo, bem antes dos dois, John Dewey publica o livro intitulado A criana e o currculo. Nes-ta obra Dewey, diferentemente de Bobbitt e Tyler, orientava muito mais para a construo da democracia, deixando o funcionamento da economia em um patamar inferior.

    Nesse livro ele considera educao como crescimento e cres-cimento como vida e, assim sendo, define o currculo como o con-junto de atividades nas quais as crianas se engajaro em sua vida escolar. V o currculo como parte de um processo educativo que dura por toda a vida. Afirma que nesse processo as experincias vi-vidas iro afetar o presente, transformando-o e, consequentemen-te, o futuro tambm ser afetado. Por esse processo o homem e a sociedade modificam-se e assim tambm a vida.

    Para Dewey a educao no era somente uma preparao para a vida ocupacional adulta, mas principalmente, um local de vi-vncia e prtica direta de princpios democrticos. Nesse sentido, para atingir essas finalidades, afirmava que o planejamento curri-cular deveria ser permeado por preocupaes que levassem em considerao os interesses e as experincias das crianas e jovens. Deveria tambm centrar-se em atividades, projetos e problemas e, antes de tudo, o currculo deveria emergir das atividades naturais da humanidade. No Brasil o iderio de Dewey e de seus seguidores ficou conhecido como tendncia progressivista.

    A Perspectiva Curricular CrticaA dcada de setenta para a educao significou uma reviravol-

    ta, transformando significativamente a forma de pens-la, abalando os sustentculos da teorizao tradicional. Houve movimentos de crtica e renovao em vrias partes do mundo, destacando entre outros: Os Estados Unidos com o movimento de reconceptualiza-co de cunho fenomenolgico e hermenutico, impulsionado por William Pinar e o movimento traduzido no livro intitulado A Escola Capitalista na Amrica, de autoria dos economistas Samuel Bowles e Herbert Gintis; na Inglaterra o movimento liderado por Michael Young chamado de Nova Sociologia da Educao; na Franca vrios autores so destacados pelos seus ensaios, como Althusser, Bour-dieu e Passeron, Baudelot e Establet e, no Brasil, o importante pen-samento liderado por Paulo Freire.

    As crticas radicais desenvolvidas por esses movimentos educao liberal e em especial aquelas produzidas por Althusser e Bourdieu vo dar sustentao ao pensamento de Michael Apple ao elaborar uma anlise crtica do currculo. Para o iniciador da crtica neomarxista s teorias tradicionais de currculo, a dinmica da so-ciedade capitalista gira em torno da dominao de classe, da do-minao dos que detm o controle da propriedade dos recursos materiais sobre aqueles que possuem apenas sua fora de trabalho. Esse movimento e organizao da sociedade capitalista vai de certa forma afetar todas as esferas que fazem parte desse contexto, como por exemplo, a educao. H nesse sentido, uma ligao estrutural entre economia e educao.

    Paulo Freire: O caminho de um Educador. Nasceu em Recife em 1921 e fale-ceu em 1997. considerado um dos grandes pedagogos da atuali-dade e respeitado mundialmente. Em uma pesquisa no Altavista en-contramos um nmero maior de textos escritos em outras lnguas sobre ele, do que em nossa pr-pria lngua. Embora suas idias e prticas tenham sido objeto das mais diversas crticas, inegvel a sua grande contribuio em favor da educao popular. Publicou vrias obras que foram traduzidas e comentadas em vrios pases. Suas primeiras experincias edu-cacionais foram realizadas em 1962 em Angicos, no Rio Grande do Norte, onde 300 trabalhado-res rurais se alfabetizaram em 45 dias. Participou ativamente do MCP (Movimento de Cultura Po-pular) do Recife. Suas atividades so interrompi-das com o golpe militar de 1964, que determinou sua priso. Exila-se por 14 anos no Chile e, poste-riormente, vive como cidado do mundo. Com sua participao, o Chile, recebe uma distino da UNESCO, por ser um dos pases que mais contriburam poca, para a superao do analfabetis-mo. Em 1970, junto a outros bra-sileiros exilados, em Genebra, Su-a, cria o IDAC (Instituto de Ao Cultural), que assessora diversos movimentos populares, em v-rios locais do mundo. Retornando do exlio, Paulo Freire continua com suas atividades de escritor e debatedor, assume cargos em universidades e ocupa, ainda, o cargo de Secretrio Municipal de Educao da Prefeitura de So Paulo, na gesto da Prefeita Luisa Erundina, do PT. Algumas de suas principais obras: Educao como Prtica de Liber-dade, Pedagogia do Oprimido, Cartas Guin Bissau, Vivendo e Aprendendo, A importncia do Ato de Ler.

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    No entanto, diferentemente de Althusser, Apple ressalta que a vinculao entre economia e educao no se estabelece de for-ma automtica e direta. Essa relao mediada por processos pro-duzidos pela ao humana no ambiente educacional e por dentro do currculo. Assim, entende que as relaes que se estabelecem no contexto educacional e no currculo no podem ser traduzidas como uma continuidade do funcionamento da economia. Nesse sentido, chama a ateno para o fato de que a reproduo social no um processo garantido.

    Segundo Apple o campo social (e nele est inserido a edu-cao) um campo contestado em que os grupos sociais domi-nantes recorrem constantemente a estratgias de convencimento ideolgico para a manuteno da sua dominao. nesse processo constante de convencimento que a dominao econmica pode transformar-se em dominao cultural. A eficcia dessas estratgias atingida quando so naturalizadas e passam ao senso comum. No entanto esse no um processo tranqilo, sem oposio. Ele um processo constitudo tambm de conflitos e resistncias.

    dessa forma que Michael Apple compreende o currculo tanto em uma dimenso estrutural, como prev Althusser em seu ensaio sobre o campo mais amplo da educao, quanto em uma dimenso mais relacional de processo. Para ele o currculo no um corpo neutro, desinteressado que por passar pelos filtros da filoso-fia e da psicologia da aprendizagem passa a se constituir em corpo consensuado de conhecimento inquestionvel e aceito pela socie-dade. O conhecimento constituidor do currculo um conhecimen-to particular, selecionado a partir de interesses de classes e grupos dominantes.

    Com a viso de Apple a preocupao, que antes era centrada nos aspectos tcnicos de como elaborar o currculo, deslocada para entender como certos conhecimentos so considerados legti-mos e outros conhecimentos so vistos como ilegtimos. Nesse sen-tido, a perspectiva postulada por Apple passa a preocupar-se com o por qu em torno do currculo e com essa preocupao faz alguns questionamentos: por que esses conhecimentos e no outros? Por que esse conhecimento considerado importante e no outros? Trata-se do conhecimento de quem? Quais interesses guiaram a se-leo desse conhecimento particular? Quais so as relaes de po-der envolvidas no processo de seleo que resultou nesse currculo particular?

    A anlise de Apple abrange os dois grandes aspectos da ten-dncia crtica de currculo. Envolve em sua anlise os comporta-mentos que corporificam o currculo oculto e os contedos expl-citos e oficializados do currculo. Considera importante observar as regularidades do cotidiano escolar, quanto o que ele denomina de currculo oficial. Estes dois eixos esto substanciados nas normas, comportamentos, atitudes regulares, nos valores e disposies dos pressupostos ideolgicos e epistemolgicos contidos nas discipli-nas que formam o currculo oficial.

    Alm dos aspectos ideolgicos que caracterizam a reprodu-o cultural no ambiente educacional Apple v aspectos importan-tes na escola, possveis de viabilizao do novo. V na escola uma dimenso propulsora de produo de conhecimento, sobretudo

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    Ideologia no pensa-mento Marxista (materialis-mo dialtico) um conjunto de proposies elaborado, na sociedade burguesa, com a fi-nalidade de fazer aparentar os interesses da classe dominan-te com o interesse coletivo, construindo uma hegemonia daquela classe. A manuteno da ordem social requer dessa maneira menor uso da violn-cia. A ideologia torna-se um dos instrumentos da reprodu-o do status quo e da prpria sociedade. O mtodo precpuo da ideologia a utilizao do discurso lacunar (Althusser). Nesse, uma srie de proposi-es, nunca falsas, sugere uma srie de outras, que o so. Des-se modo, a essncia do discur-so lacunar o no dito (porm sugerido).

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    O currculo oculto constitudo por todos aqueles aspectos do ambiente escolar que, sem fazer parte do curr-culo oficial, explcito, contri-buem, de forma implcita para aprendizagens sociais rele-vantes (...) o que se aprende no currculo oculto so funda-mentalmente atitudes, com-portamentos, valores e orien-taes....

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    aquilo que denomina de conhecimento tcnico. Embora a perspectiva da construo do novo esteja ampla-

    mente vinculada a aspectos reprodutivos, reconhece a possibilida-de do surgimento, nesse local, do conhecimento at ento inexis-tente, negando dessa forma, que o espao educativo institucionali-zado detenha apenas a dimenso reprodutora do conhecimento j produzido em outro lugar. Estes conhecimentos estabelecem uma forte relao com os interesses econmicos que esto na base da organizao e funcionamento da sociedade, acabando por fortale-cer o prestgio destes em detrimento de outros, como por exemplo, os conhecimentos estticos e artsticos.

    Antes de passarmos para um outro terico da rea, podemos concluir dizendo que para Apple o currculo s pode ser compre-endido na sua amplitude e ser transformado se estabelecermos fortes conexes para o entendimento das estratgias de poder arti-culadas para a sua instituio. Nesse sentido, segundo Silva (2001) importante fazermos perguntas fundamentais, tais como: Como as formas da sociedade afetam o currculo? Como a forma como o currculo processa o conhecimento e as pessoas contribui, por sua vez, para produzir e fortalecer a diviso de grupos? Qual o conhe-cimento - de quem privilegiado no currculo? Quais grupos se beneficiam e quais grupos so prejudicados pela forma como o cur-rculo est organizado? Como se formam resistncias e oposies ao currculo oficial?

    No mesmo contexto de Michael Apple, surge Henry Giroux para contribuir e delinear a corrente do pensamento crtico de cur-rculo. Ao analisar a teorizao curricular tradicional enfatiza que es-tas ao concentrarem-se nos critrios de eficincia e na racionalidade tcnica, no levam em considerao o carter histrico, tico e pol-tico das aes humanas e sociais. A absteno desses aspectos con-tribui para a reproduo das desigualdades e das injustias sociais.

    Giroux aps realizar a crtica rigidez estrutural e ao conse-qente pessimismo das abordagens mais amplas das teorizaes crticas da educao, estabelece como sustentculo sua aborda-gem o conceito de resistncia. A sua teorizao apresenta uma al-ternativa capaz de superar o pessimismo e imobilismo que as teo-rias da reproduo acarretaram, passando a construir o conceito de pedagogia da possibilidade.

    Conforme sua abordagem terica, Giroux acredita na exis-tncia de mediaes e aes, praticadas no espao escolar e con-seqentemente do currculo, que possam estar agindo contra as determinaes do poder e do controle. Segundo ele, possvel di-recionar o potencial de resistncia de estudantes e professores para um currculo que detenham contedos claramente polticos e que estabeleam crticas s crenas e aos arranjos sociais dominantes.

    Ainda na primeira fase de sua teorizao, Giroux compreende o currculo por intermdio dos conceitos de emancipao e liberta-o. por meio do processo pedaggico de resistncia que as pesso-as podem tomar conscincia do papel de controle e poder exercido pela escola e pelas estruturas sociais que elas podem emancipar-se e libertar-se desse mesmo poder e controle.

    Os conceitos de esfera pblica, intelectual transforma-dor e voz estabelecem o contorno da concepo de currculo

    O currculo oficial entendido como o que pla-nejado oficialmente para ser trabalhado nas diferentes dis-ciplinas e sries de um curso, no mbito da legislao edu-cacional. Designa um conjun-to de disciplinas a ser desen-volvido em um dado curso ou srie, sendo que historica-mente variou a intensidade da sua normatizao, desde o simples elenco de disciplinas at a definio de contedos para determinadas disciplinas, alm de abordar, em alguns momentos, aspectos didticos e metodolgicos do currcu-lo. Ento, o currculo oficial se constitui na prescrio legal da organizao das matrias/dis-ciplinas a serem trabalhadas pela escola e demais orienta-es, tais como de contedo, didticas e avaliativas, fruto de um movimento mais amplo que se processa nas polticas educacionais e na sociedade como um todo. Neste caso, no estudo do currculo oficial fundamental analisar os docu-mentos legais (Leis, Decretos, Pareceres, Resolues, Indica-es) das polticas pblicas de educao em mbito federal, estadual e municipal, levando em conta as prticas polticas, econmicas e sociais, pois o currculo proposto fruto das opes tomadas dentro des-sas prticas.

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    emancipador ou libertador, desenvolvido por Giroux. Segundo ele a escola e o currculo devem ser concebidos como esfera pblica democrtica, onde alunos, professores e todos que ali convivam possam exercer e desenvolver as habilidades da discusso, da parti-cipao e do questionamento.

    Nesse processo, o professor deixa de exercer apenas a funo de tcnico especializado dentro da burocracia escolar, passando a desempenhar o papel de intelectual transformador em que se man-tm permanentemente envolvido no processo de construo da emancipao e libertao, combinando reflexo e prtica a servio da educao dos estudantes para que tornem-se cidados reflexivos e ativos. O professor estando a servio desse processo, necessaria-mente ter uma postura de crtica sistemtica e de questionamento do contexto ao qual faz parte. O professor ao absorver os mtodos, procedimentos e contedos tcnicos que os capacitam para a ao de ensinar, estar sempre preocupado em entender os pressupostos e princpios que esto subjacentes e que do sustentao queles saberes. Essa postura os capacita para a investigao e o questiona-mento como prtica profissional.

    Ao definir o conceito de voz expressa a importncia de criar um ambiente propcio para a evocao dos anseios, desejos e expli-citao dos pensamentos dos aprendizes e que possam ser ouvidos e considerados. Esse entendimento coloca em questo o processo educativo de mo nica, em que s o professor detm a voz. Contra-riando essa prtica, concede um papel ativo e participativo a todos envolvidos no processo, contestando as relaes de poder em que mantm essas vozes suprimidas.

    Para Giroux, nesse processo de participao e atuao, ssen-cial tornar o pedaggico mais poltico e o poltico mais pedaggi-co. Tornar o pedaggico mais poltico significa colocar a escolariza-o na esfera poltica. Nessa perspectiva a reflexo e ao crticas passam a fazer parte do projeto social medida que os alunos so inseridos, de forma confiante, no processo de combate para a su-perao das injustias econmicas, polticas, e sociais e nessa luta humanizarem-se cada vez mais. Com essa perspectiva fica reconhe-cido que o aperfeioamento da prtica democrtica implica tomar o conhecimento e o poder a servio da melhoria da qualidade de vida para todos.

    Por outro lado, tornar o poltico mais pedaggico significa a utilizao de pedagogia que trate os aprendizes como agentes cr-ticos, que tornem os conhecimentos problematizados e utilizem o dilogo crtico e afirmativo que argumentem a favor de um mundo qualitativamente melhor para todos. Isso sugere que o professor as-suma uma postura sria e constante de dar voz ativa ao conjunto de estudantes em suas experincias cotidianas de aprendizagem, dei-xando ressaltar os diversos ambientes culturais, raciais, histricos, classe e gnero em que esses grupos de estudantes faam parte, possibilitando compreender as particularidades de seus problemas, esperanas e sonhos.

    Para sintetizar, Giroux v a pedagogia e o currculo por meio da noo de poltica cultural. Dentro do currculo se constri significa-dos e valores culturais. Diferentemente da perspectiva da racionali-dade tcnica, a abordagem de Giroux no compreende o currculo

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    Epistemologia - Re-flexo geral em torno da natureza, etapas e limites do conhecimento huma-no, especialmente nas re-laes que se estabelecem entre o sujeito indagativo e o objeto inerte, as duas polaridades tradicionais do processo cognitivo; teoria do conhecimento. Estudo dos postulados, concluses e mtodos dos diferentes ramos do saber cientfico, ou das teorias e prticas em geral, avaliadas em sua vali-dade cognitiva, ou descritas em suas trajetrias evoluti-vas, seus paradigmas estru-turais ou suas relaes com a sociedade e a histria; teoria da cincia. etim epis-tem- + -o- + -logia.

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    como somente um processo de transmisso de fatos e de conhe-cimentos objetivos, muito mais que isso, o currculo um espao em que ativamente se produzem e se criam significados sociais que esto em permanente disputa. Significados que so impostos, mas tambm contestados.

    1. Destaque as principais caractersticas de cada uma das abordagens Curriculares:

    Perspectiva Curricular Tradicional Perspectiva Curricular Crtica__________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

    2. Enumere as caractersticas das orientaes curriculares tra-balhadas em sua escola e faa um paralelo destas com as aborda-gens estudadas nesta sesso.

    3. A partir do paralelo feito na questo anterior o que voc aponta como prtica pedaggica que deve ser potencializada e/ou reencaminhadas no coditiano escolar?

    Para chegar ao Fim do Mundo (Antnio Alves)

    Saindo de Rio Branco num barco e viajando umas nove ou dez horas rio acima, pode-se chegar ao seringal So Luiz do reman-so. Nos tempos ureos da borracha, ali se encontrava um movimen-tado Barraco, ponto de abastecimento de centenas de colocaes espalhadas pela floresta. A mais distante delas chama-se Fim do Mundo. Nos lombos dos burros , com as estopas cheias de merca-dorias, era conveniente sair do Barraco antes do dia amanhecer para chegar ao Fim do Mundo na boquinha da noite e no ter que pernoitar em outra colocao a caminho. Pra voltar, trazendo a bor-racha, mais um dia de viagem pelos varadouros antes de amarr-las numa balsa que flutuaria rio abaixo.

    Os seringais foram falncia , o mundo mudou, uma estrada foi aberta at Assis Brasil e boa parte dela j foi asfaltada. Por obra do destino e da engenharia, seu traado foi mais que fsico-profeti-co e simblico: passa exatamente no Fim do Mundo. Hoje, saindo de Rio Branco num carro de passeio, ou mesmo num nibus, qualquer pessoa pode chegar ao Fim do Mundo em menos de uma hora.

    1. O texto nos mostra as rpidas mudanas que so processadas no mundo, juntamente com seus colegas, discuta e reflita sobre:

    a. As mudanas ocorridas nos contextos econmico, social, cultural e poltico do seu municpio;

    b. Estas mudanas melhoraram a vida? E as melhorias foram para todos?

    c. Como o currculo trabalhado na escola pode estar ajudando aos alunos a fazerem anlises sobre as mudanas?

    d. De que forma a escola est preparando os alunos para se-rem cidados e profissionais num contexto de uma sociedade em constantes mudanas?

    Hoje a estrada est toda asfaltada.

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    2 A Abordagem Curricular no

    Brasil

    OBJETIVOS ESPECFICOS

    - identicar e caracterizar a prtica curricular das escolas; - analisar possibilidades alternativas de prticas curriculares.

    Alunos de escola pblica em Feij/ACFoto COCAM/UFAC

    lAlunos dde escolla pbbblilica em FFeijij//ACAC

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    Aps a Primeira Guerra Mundial uma incipiente indstria organizada no Brasil. Segundo Ianni (1970), essa organizao foi in-fluenciada pelas mudanas nas relaes entre o Brasil e os pases industrializados. Tal influncia se efetivou muito mais pelas formas dos contatos realizados no perodo da guerra, que propriamente pela guerra. A necessidade de pessoal alfabetizado para ocupar os novos postos de trabalho, juntamente com a percepo da burgue-sia industrial emergente em modificar o quadro poltico, desfavor-vel para o impulsionamento da iniciante industrializaco, faz com que se comece a pensar em alfabetizar os trabalhadores.

    Os trabalhadores alfabetizados alm de dar uma nova condi-o industrializaco passariam a votar e mudar as foras polticas, derrotando as oligarquias rurais. Juntamente a essa vontade, a in-telectualidade brasileira encontrava-se horrorizada pelo percentual de 85% da populao do Brasil ser analfabeta. Relacionavam esse ndice imensa pobreza do pas.

    A efervescncia da dcada de vinte e trinta faz florescer re-formas educacionais nos estados de So Paulo, Bahia, Minas Gerais e no antigo Distrito Federal. Essas reformas so influenciadas pelas idias e princpios da tendncia progressivista americana. Tais refor-mas foram organizadas por Antnio de Sampaio Dria, Ansio Tei-xeira, Francisco Campos, Mrio Casassanta e Fernando de Azevedo.

    Quando foram formuladas as primeiras reformas nos sistemas educacionais dos estados brasileiros, anteriormente citados, no ha-via ainda acontecido no Brasil estudos sistemticos que abordassem ou propusessem questes que envolvessem temticas curriculares. At ento, o que estava presente no terreno educacional institucio-nalizado era a convivncia de tradies curriculares sustentadas em uma base filosfica hbrida que reunia princpios do positivismo de Herbart, Pestalozzi e dos jesutas.

    As reformas educacionais desses pioneiros representaram um rompimento com a escola tradicional laica organizada a partir dos cinco passos formais da orientao metodolgica de Herbart (pre-parao, apresentao, comparao, assimilao, generalizao e aplicao). Os elementos constituidores da escola tradicional laica eram indicados pela nfase ao ensino humanstico de cultura geral, centrada no docente, que transmite a todos os aprendizes conheci-mentos considerados verdades absolutas. A relao pedaggica se dava de forma hierarquizada em que cabia ao aluno seguir atenta-mente a exposio do professor.

    O que isso significava, caro aluno? Para os estudos iniciais, ou melhor, para a educao elementar havia a crena que todas as cincias e todas as artes pudessem ser ensinadas desde que fosse utilizado o mtodo adequado. Para os estudos mais avanados ou secundrios o currculo era moldado a partir de uma perspectiva enciclopdica e as disciplinas e o ensino eram fortemente constitu-dos por uma viso literria e academicista. Alm disso, a ideologia que resquardava tais escolhas dividia o trabalho manual do traba-lho intelectual.

    As proposies contidas no iderio das reformas rompiam com esse modelo, apresentando uma orientao de renovao cur-ricular. Embora as reformas no tenham explicitamente proposto procedimentos detalhados de planejamento curricular, a metodo-

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    logia de ensino indicada apresentava diretrizes para a prtica curri-cular. Por enfatizar dessa forma, os pensadores da rea de currculo localizam a origem dos estudos curriculares no Brasil s reformas dos pioneiros da escola nova e assim vincula-la s idias de Dewey e a seus seguidores.

    Vejamos, ento prezado aluno, quais as principais caracters-ticas do pensamento que dava nova constituio organizao es-colar. A viso de homem estava centrada na existncia, na vida, na atividade. A defesa dos princpios democrticos permeava todo o processo de vivncia educativa. A valorizao da criana uma ou-tra caracterstica muito evidenciada. A criana, diferentemente da primeira concepo, passa a ser vista como ser dotado de poderes individuais, cuja liberdade, iniciativa, autonomia e interesses devem ser respeitados. Outro aspecto bastante preconizado era o cultivo da soluo de problemas e o desenvolvimento de projetos como mtodo de ensino, dentre outros.

    Nesse sentido, caros alunos, podemos afirmar que as primei-ras preocupaes com o campo do currculo no Brasil so datadas na dcada de vinte. Desde ento, at a dcada de oitenta, o pen-samento curricular brasileiro foi influenciado essencialmente pelas teorizaes americanas.

    A poltica educacional durante o regime militar esteve voltada ao combate do analfabetismo e empenhada em dar ao ensino m-dio e ao ensino superior um carter mais tcnico.

    Para combater o analfabetismo o governo brasileiro trabalhou na ampliao da rede escolar do ensino fundamental e tambm do ensino supletivo, alm de trabalhar com educao de adultos atra-vs do Movimento Brasileiro de Alfabetizao (MOBRAL). Ao ensino superior o carter tcnico dado tinha a finalidade de atender as ne-cessidades do mercado de trabalho que estava em expanso nas cidades.

    Na vigncia da ditadura foram feitos acordos de cooperao entre o MEC e os Estados Unidos que visavam reforma educacio-nal e pelos quais o Brasil passa a receber assistncia tcnica e coope-rao financeira para a implantao da reforma que se desenvolve de maneira autoritria visando integrar o sistema educacional ao modelo de desenvolvimento econmico dependente, imposto pe-los norte-americanos.

    Dentre outros aspectos, a reforma educacional brasileira efeti-vada no perodo autoritrio visava principalmente:

    Erradicao do analfabetismo; sA formao de prossionais que atendessem s necessida-s

    des urgentes do pas, formando mo-de-obra especializada para um mercado em franca expanso;

    Implementar um currculo que possibilitasse a formao de sum cidado consciente das exigncias de seu contexto social, qual seja: submisso s autoridades militares e amor incon-dicional a ptria. Para alcanar tal intento foram introduzidas disciplinas como Educao Moral e Cvica, Organizao Social e Poltica do Brasil (OSPB) e no Ensino Superior Estudos de Problemas Brasileiros (EPB);

    Estabelecer a relao entre escola e comunidade, com a scriao de conselhos de empresrios e mestres.

    Atividades Pedaggicas em escola pblica em Feij/AC

    Foto COCAM/UFAC

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    No entanto, a partir dos anos 70 novas configuraes so per-cebidas no cenrio educacional brasileiro, dentre as quais podera-mos elencar:

    Aprovao do texto da Reforma do ensino de 1 e 2 graus spor meio da Lei 5692/71;

    O MEC e o Conselho Federal de educao produzem no sperodo Pareceres com alta carga doutrinria curricular, dis-ciplinando o ensino prossionalizante e o currculo de 1 e 2 graus, incluindo disciplinas como Tcnicas Agrcolas, Tcnicas Comerciais, Tcnicas Industriais e Educao para o Lar;

    Pressupostos da pedagogia progressista vo ganhando cor-spo e forma, principalmente aps o incio da abertura e rede-mocratizao do pas a partir da segunda metade da dcada de setenta;

    Nas universidades, ainda de forma velada se debatem teo-srias pedaggicas silenciadas durante o regime.

    Mas, contudo, as elites brasileiras passaram a fazer frente a movimentos de resistncia relao educao e trabalho proposto nos currculos oficiais, entendendo que seus filhos no necessita-vam de tal iniciativa, entretanto, as camadas populares viam nela a possibilidade de romperem com o trabalho manual e subalterno.

    Podemos afirmar, que embora o elitismo no currculo estives-se naquele perodo mascarado por uma proposta de escola nica, que primava pela igualdade na oferta, principalmente no que diz respeito profissionalizao obrigatria, no se pode perder de vis-ta a acirrada seletividade marcada ora pela reprovao e evaso, ora pelo funil ao qual tinha que se submeter, principalmente, os alunos oriundos das camadas populares para terem acesso ao chamado 2 grau ou qui ao Ensino Superior.

    Mas, o que ocorre com as discusses e abordagens no campo do currculo?

    Bom, veja, quanto ao currculo ainda no incio da dcada de 70 havia forte preocupao de deslocar as discusses e teorizaes desse campo de um enfoque tcnico-metodolgico, legado ainda do incio da dcada de 60, marcados pelos acordos de cooperao tcnica, j mencionados, estabelecidos entre o Brasil e organismos internacionais americanos, desvinculados das reais expectativas e necessidades da nao e marcados pelas influncias tecnicista de tericos norte-americanos como Bobbit e Tyler que concebiam o currculo fundamentalmente como rea tcnica, vinculada na sua essncia a questes de planejamento, mtodos e processos avalia-tivos, como j demonstramos anteriormente.

    A partir da segunda metade da dcada de 70, marcada pelo incio do processo de reabertura poltica do pas, ocorreu o desloca-mento das preocupaes curriculares de um enfoque meramente tcnico para questionamentos em torno de questes econmicas, sociais, polticas e culturais fortalecidas por uma tmida circulao de produo terica no campo da educao, por uma concepo crtica refletindo as novas influncias e tendncias que, no Brasil, podem ser percebidas a partir do final dessa dcada, largamente influenciadas pelos pressupostos filosficos sociolgicos marxistas e neomarxistas.

    Em meados da dcada de 80 com o Movimento de Diretas

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    A reflexo neomarxista pro-posta pelos tericos da de-nominada Teoria Crtica ou Escola de Frankfurt. Como sabemos, a Teoria Crtica tem como alvo de seu programa, criar nexo entre teoria e pr-tica com a inteno de prover idias e potencializar temti-cas que auxiliem na mudana de circunstncias opressivas; tem, tambm, como objetivo, conquistar emancipao hu-mana e construir uma socie-dade racional que satisfaa as necessidades e capacidades humanas.

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    J, conseqentemente, o fim do Regime Militar e a aprovao da Constituio Federal de 1988, tambm chamada de Constituio Cidad, um novo cenrio no campo educacional vai se configurar, influenciando profundamente os estudos no campo do currculo.

    inegvel que os estudos nesse campo passam a desfrutar hoje de visibilidade e prestgio crescentes. Consubstanciada nas anlises de Moreira e Silva (1995) possvel perceber que a preocu-pao central passa a ser a de compreender quem favorecido com o currculo? Que interesses esto em jogo? Ele atende aos interesses de que classe? Que relao se estabelece entre currculo e diversi-dade cultural?

    Para responder tais indagaes discusses acirradas sobre po-lticas oficiais de currculo passam a se constituir em mola propulso-ra para amplo desenvolvimento de pesquisas e de produo terica que tem at os dias atuais (re) significado as abordagens nesse cam-po.

    1. Entreviste pessoas de sua comunidade que vivenciaram, como estudantes e/ou educadores, as mudanas nas orientaes curriculares no Brasil a partir da dcada de 60. Procure fazer uma anlise de como sua formao contribuiu para a identidade profis-sional e a construo da cidadania.

    2. O texto Ns, Quem? faz reflexes sobre currculo e aponta algumas iniciativas locais que buscam apresentar um currculo dife-renciado, que atenda a nossa especificidade cultural:

    1. Procure junto s instituies citadas no texto, as publica-es, estude-as e discuta com seus colegas;

    2. Pesquise junto aos sistemas estadual e municipal quais as mais recentes orientaes curriculares, conhea-as e analise-as, levando em considerao as indicaes at aqui estudadas.

    Referenciais Curriculares do Estado do Acre de 5 a 8 Srie

    1. Entreviste pessoas de sua comunidade que vivenciaram, como estudantes e/ou educadores, as mudanas nas orientaescurriculares no Brasil a partir da dcada de 60. Procure fazer uma anlise de como sua formao contribuiu para a identidade profis-sional e a construo da cidadania.

    2. O texto Ns, Quem? faz reflexes sobre currculo e aponta algumas iniciativas locais que buscam apresentar um currculo dife-renciado, que atenda a nossa especificidade cultural:

    1. Procure junto s instituies citadas no texto, as publica-es, estude-as e discuta com seus colegas;

    2. Pesquise junto aos sistemas estadual e municipal quais asmais recentes orientaes curriculares, conhea-as e analise-as, levando em considerao as indicaes at aqui estudadas.

    Referenciais Curriculares do Estado do Acre de 5 a 8 Srie

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    Leia sobre as mudanas no nosso Esta-do

    Ns, quem? (Antnio Alves)

    Muito j se falou sobre os currculos importados e os livros

    didticos, que no levam em conta a realidade cultural da Regio Amaznica. De fato, h coisas absurdas. Nas escolas do Alto Juru, crianas que se alimentam de paca e tatu aprendem a ler soletrando a palavra camelo. Todo mundo sabe que isso no est certo, que o currculo e o material didtico deviam ser adaptados cultura re-gional.

    Mas as dificuldades para fazer essa adaptao so maiores do que se imagina. No incio da dcada de 80, no governo de Joaquim Macedo, o Conselho Estadual de Educao analisou os livros did-ticos usados nas escolas pblicas e orientou a Secretaria de Educa-o para que produzisse outros, mais adequados. Foi formada uma equipe multidisciplinar e, depois de alguns meses, saram as to esperadas cartilhas regionais. O resultado foi simplesmente desas-troso.

    Na cartilha de Histria , por exemplo, havia um captulo dedi-cado aos ndios que comeava mais ou menos assim: Antigamente viviam no Acre duas grandes tribos, Panos e Aruaques. Para come-ar, pano e aruaque no so tribos, mas troncos lingsticos. Assim como brasileiros, espanhis e franceses tm idiomas com origem no antigo latim, tambm existem vrias naes indgenas que falam lnguas de origem pano ou aruaque. Para completar, esses povos no existiam antigamente, mas existem at hoje e podem ser en-contrados com quase todos os municpios do Acre. O mais engraa-do era o desenho que ilustrava o captulo dedicado aos ndios. Nele aparecia um indiozinho vestindo cala de couro enfeitada com tiras e calando sapatos mocassim, costurados maneira dos apaches. Usava uma pena atrs da cabea, amarrada com uma tira. Ao longe, por trs do guerreiro, viam-se altas montanhas com seus cumes co-bertos de neve. O simptico indiozinho tinha sado de um filme de bangue-bangue diretamente para a histria do Acre.

    Para tornar os livros e currculos adequados cultura regional necessrio estar dentro dessa cultura, conhecer a histria, a geo-grafia e a linguagem da regio. tambm necessrio usar a melhor tcnica disponvel, para no produzir um material feio, incapaz de despertar interesse no aluno. Por que nosso sistema educacional no conseguiu, at hoje, produzir um material e um currculo inte-ressante e adequado? Talvez seja o caso de perguntar: algum j conseguiu? Nesse caso, melhor seguir um exemplo que deu certo do que ficar enumerando as falhas dos que no deram certo.

    Sim, j existem experincias positivas na elaborao de curr-culos e materiais didticos adequados cultura amaznica e capa-zes de despertar interesse nos alunos. Dois exemplos se destacam. O currculo do Projeto Seringueiro, executa do pelo Centro dos Tra balhadores da Amaznia, tem sido aplicado em seringais e reservas extrativistas com sucesso. As cartilhas da Comisso Pr-ndio, para alfabetizao nas aldeias, so vistosas e coloridas, com excelente

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    qualidade grfica e ilustraes feitas pelos professores ndios. So dois exemplos bem particulares, de trabalhos dirigidos s popula-es da floresta. Mas eles mostram o que possvel fazer quando o projeto educacional est integrado ao saber da prpria populao a que se dirige.

    possvel produzir currculo e material com essas caracters-ticas para as escolas municipais? Sim, mas teriam que ser mudados tanto a gesto do sistema de ensino como os mtodos pedaggicos. Os professores, pais e alunos teriam que participar. As escolas teriam que deixar de ser apenas reparties pblicas e transformar-se em centros de vivncia comunitria, onde os diversos saberes pudes-sem se expressar.

    Uma pergunta se impe: temos recursos financeiros e huma-nos para fazer nossas prprias propostas educacionais? Antes de responder a essa pergunta, consideremos as condies que a so-ciedade oferece para o desenvolvimento dos saberes especficos e regionais.

    Se observarmos bem, veremos que os professores se tor-naram meros repassadores de mercadorias de uma indstria que produz livros didticos. Podemos traar um paralelo com os farma-cuticos. Antigamente, eles diagnosticavam doenas, receitavam e fabricavam os medicamentos combinando substncias bsicas. Hoje, os empregados de uma drogaria, que nos atendem no balco, geralmente no sabem coisa alguma de qumica, so incapazes de diagnosticar doenas ou prescrever medicamentos. Apenas ven-dem remdios prontos, fabricados pelas multinacionais. At mes-mo os mdicos agem assim. Tornaram-se vendedores de remdios. Atendem dezenas de pacientes por dia, muitas vezes com base em exames rpidos e superficiais. No conhecem a histria de vida do paciente, sua famlia, suas doenas anteriores, seus hbitos.

    A destruio do conhecimento comunitrio e autnomo um trao caracterstico da sociedade moderna. Antigamente as telhas que cobriam nossas casas eram fabricadas em nossas cidades, nas olarias cobertas de palha. Os carpinteiros conheciam os segredos da madeira e faziam casas que duravam 40 ou 50 anos (algumas ainda esto de p, como testemunhas silenciosas de uma sabedoria extinta). Em cada beira de rio havia que soubesse construir embar-caes de grande porte e intricadas armaes. Os mestres artesos que detinham esses conhecimentos desapareceram. Hoje, na terra da madeira e da argila, vivemos em casas cobertas com fibras indus-triais fabricadas a 4 mil quilmetros de distncia. Navegamos em barcos de alumnio. Sentamo-nos em cadeiras de plsticos. Nossos mveis so de frmica e aglomerados.

    Um causo, para ilustrar: preparando-se para uma viagem ao Alto Juru, um jornalista acreano passou horas procurando uma mochila no mercado de Rio Branco. Perguntava nas lojas e os ven-dedores lhe apontavam essas mochilas escolares, de plstico, com palavras escritas em ingls falsificado (brek s, truks, bobs, as pesso-as acham que colocando s no final esto escrevendo em ingls). No encontrou a mochila que procurava. Deixou para comprar em Cruzeiro do Sul, uma cidade mais tradicional e de comrcio fluvial. Deu-se o mesmo. Ento percebeu que no Acre no existem mais armarinhos , emprios ou armazns, agora s existem shoppings.

    Alunos de escola pblica em Brasilia/AC

    Foto: COCAM/UFAC

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    No se encontram mais os velhos materiais nobres como o couro, a madeira, o ferro, o tecido de algodo, agora o mundo feito de plstico.

    O que quer dizer tudo isso? Quer dizer que a regio mais dis-tante da terra , o isolado fim do mundo, foi tocado pela socieda-de de consumo. A isso chamou-se progresso. Esse o sistema no qual nossas idias sobre o desenvolvimento e nossos valores de vida foram sendo (de)formados nos ltimos 25 anos. Ento no de se admirar que tambm os sbios mestres tenham desapareci-do das escolas e que no seu lugar tenham ficado os vendedores de livros. A pergunta agora se repete, na esperana de ser respondida: temos condies de elaborar nossa prpria proposta educacional? Ou, dito de outra forma: podemos fazer uma educao com valores diferentes daqueles que dominam a sociedade em que vivemos? Veremos.

    Em primeiro lugar, necessrio recuperar os valores antigos, mas sem cair no saudosismo e sem recusar as conquistas da moder-nidade. Ningum quer abandonar o ferro eltrico e soprar brasas novamente. Da mesma forma, no possvel nem desejvel des-ligar todos os aparelhos de TV. Se a mdia eletrnica mais inte-ressante e est fazendo as nossas escolas ficarem atrasadas, ento devemos levar a TV para dentro das escolas e utilizar sua linguagem. Aqui acontece a primeira dificuldade: dinheiro. Em nossas escolas, muitas vezes, falta giz e papel. Sendo assim, como editar material didtico de qualidade e comprar aparelhos de TV ou computado-res? Evidentemente, equipar toda a rede municipal seria impossvel. Mas possvel encontrar alternativas. Em Rio Branco, a Semec criou o Centro de Multimeios, em parcerias com a Fundao Municipal de Cultural. Ali esto instalados equipamentos cuja distribuio para todas as escolas ficaria acima das condies financeiras do munic-pio: biblioteca, videoteca, brinquedoteca, escola de msica, escola de xadrez, oficinas de teatro, dana e artes plsticas. Ainda no foi possvel, mas inteno dos administradores, instalar uma sala com computadores para o aprendizado de informtica. O Centro funcio-na como um ponto de apoio para as escolas, que podem ter acesso aos seus equipamentos sob a forma de emprstimo ou levando os alunos ao local. O custo semelhante ao de uma escola de pequeno porte, dessas que existem em todos os municpios. Quer dizer: em vs de construir e manter uma nova escola, como costuma aconte-cer, uma administrao municipal pode equipar uma escola j exis-tente e dot-la de condies para servir s outras.

    As deficincias de pessoal so mais difceis de resolver. Os pro-blemas vm desde a formao dos professores . Os cursos de magis-trio no oferecem qualificao suficiente para atender nem mesmo as exigncias de um ensino tradicional. Para melhorar a qualidade do ensino, as Semecs precisam completar a formao dos professo-res. O ideal seria o estabelecimento de um curso permanente que completasse a formao bsica e ainda o oferecesse especializaes em reas definidas. Para isso, seria necessrio firmar convnios com universidades e institutos de pesquisa. Mas existem alternativas lo-cais e de menor custo financeiro. Em diversas reas de conhecimen-to, h organizaes civis que podem oferecer formao: Igrejas, Or-dem dos Advogados, sindicatos e associaes profissionais, grupos

    noligresdeAqmudidresMao CCutodpiode

    Alunos de escola pblica em Brasilia/AC

    Foto COCAM/UFAC

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    artsticos e culturais, empresas, alm dos j citados CTA e CPI. Cabe direo do sistema de ensino atuar como articuladora de conv-nios e parcerias, aproximando da Educao as foras que atuam em outras esferas da sociedade.

    1. O texto de Antonio Alves ao explicitar a forma que ele gos-taria de ver a escola funcionando, aproxima-se de qual concepo de currculo? Justifique.

    2. Localize nas unidades educacionais de seu municpio o ma-terial do Projeto Seringueiro produzido pelo Centro de Trabalhado-res da Amaznia CTA e as Cartilhas da Comisso Pr-ndio - CPI e analise esse material luz do que j estudamos.

    Mltiplas Culturas: Currculos Diferen-ciados

    Para Forquim (1993) a cultura o fator primordial da educa-o. a partir da cultura que as aes educativas so construdas e so justificadas as suas finalidades. Os conhecimentos constituido-res do currculo da educao escolar so selecionados no interior da cultura e a partir dos interesses dos grupos que detm maior poder. Nesse processo de seleo a instituio escolar afunila as possibi-lidades, trabalhando apenas com uma parcela restrita de conhe-cimentos, experincias, valores e atitudes da cultura consideradas legtimas e, consequentemente, oficializadas. A dominao cultural tem sido um dos principais pontos centrais do fazer pedaggico he-gemnico, e sua superao uma de nossas principais lutas no con-texto do projeto de construo de uma escola e de uma sociedade mais democrticas.

    O resultado desse processo de seleo acaba por deixar de fora, das vivncias educativas, a cultura de diversos grupos sociais. E alm disso, o que no foi selecionado passa a ser visto como algo indesejado, devendo ser eliminado das prticas educativas proces-sadas no interior da escola. Estabelece-se com isso a cultura hege-mnica, recorrente em todas as esferas do sistema de ensino.

    Embora historicamente a escola tenha se constitudo em um espao de homogeneizao e assimilao cultural, impe-se atitu-des educativas que transgridam e encaminhem na direo de rever-ter essa tendncia histrica, possibilitando currculos diferenciados que expressem e d sentido democrtico diversidade cultural.

    Voc deve estar nos perguntando por que essa afirmativa se impe? O que nos leva a esse entendimento? Essa assertiva indica no apenas o reconhecimento da diversidade cultural presente no ambiente educativo da escola, mas principalmente, aponta para a valorizao e o respeito cultura do outro.

    Por outro lado, o que objetivamente se quer alcanar ao en-veredar por alternativas curriculares? do nosso conhecimento a difcil relao entre a denominada cultura culta e cultura no cul-ta. Muitos argumentam que a cultura considerada culta eivada de valores burgueses e assim sendo, danosa s camada populares. No

    1. O texto de Antonio Alves ao explicitar a forma que ele gos-taria de ver a escola funcionando, aproxima-se de qual concepo de currculo? Justifique.

    2. Localize nas unidades educacionais de seu municpio o ma-terial do Projeto Seringueiro produzido pelo Centro de Trabalhado-res da Amaznia CTA e as Cartilhas da Comisso Pr-ndio - CPI eanalise esse material luz do que j estudamos.

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    entanto, necessrio salientar que os saberes considerados cultos carregam em si aspectos importantes que viabilizam o desenvol-vimento da capacidade reflexiva crtica. Nesse sentido, salutar se impor como um desafio para a escola a possibilidade de absoro da cultura culta, pelos grupos que no a detm, sem que esses per-cam a ligao, o reconhecimento e a valorizao de sua cultura de origem.

    Para exemplificar essa afirmativa, podemos evidenciar nessa direo o ensino da lngua materna. O ensino da Lngua Portugue-sa, inserido em um universo constitudo de diferentes culturas e re-presentadas por inmeros grupos sociais, no pode ter como nico eixo a linguagem considerada culta, habitualmente utilizada por um nico grupo social.

    As aes desenvolvidas em um currculo comprometido com a no homogeneizao cultural, com a luta contra as desigualdades sociais e econmicas e que reconhece o direito que tm os diversos grupos sociais de apropriar-se do dialeto de prestgio, ou melhor da linguagem culta, estabelece como objetivo levar os alunos perten-centes aos diferentes grupos a domin-lo. No para que se adap-tem s exigncias de uma sociedade que divide e discrimina, pelo contrrio, para que adquiram um instrumento fundamental para a participao poltica e para fortalecer a luta contra as desigualdades sociais.

    Nesse sentido, o ensino da lngua materna, pertencente a um currculo que valoriza a diversidade cultural, parte da compreenso das condies sociais e econmicas que explicam o prestgio atri-budo a uma variedade lingstica em detrimento de outras e leva o aluno a perceber o lugar que ocupa o dialeto do grupo a que per-tence na estrutura de relaes sociais, econmicas e lingsticas, e a compreender as razes por que o seu dialeto socialmente estig-matizado.

    Com isso a escola apresenta razes consistentes ao aluno que justificam e o levam a aprender um dialeto que no o do seu gru-po social, adquirindo um outro, no para a sua adaptao, mas para a transformao de suas condies de marginalidade.

    Perseguindo essa perspectiva, fundamental que a escola e seus professores percebam que ensinar diferentes temticas no implica apenas uma dimenso tcnica, mas sobretudo, uma di-menso poltica. Quando optamos por teorias para fundamentar e orientar a prtica pedaggica, a escolha que se est fazendo no , apenas, uma opo tcnica, em busca de uma eficincia que supere o fracasso na escola, que, substancialmente e verdadeiramente o fracasso da escola, mas , sobretudo, uma opo poltica, que ex-pressa um compromisso contra as discriminaes, as desigualdades e o respeito diversidade cultural.

    Outro aspecto a ser considerado e que deve se constituir em elemento de busca pela escola, no processo das vivncias educati-vas de interao cultural, reconhecer a necessidade de estabele-cer, nesse processo, mecanismos de crtica e autocrtica s diversas manifestaes culturais, analisando os seus aspectos repressivos e discriminadores, objetivando fortalecer cada vez mais a armao da liberdade, da autonomia e do respeito ao outro.

    Para concluir, reafirmamos que reverter o que historicamente

    conpasoc

    curdasbuo atena cma

    juspoa tr

    Caminhos pelas guas e matas

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    foi sendo construdo nas redes escolares, implica incluir abertura de espaos para que a cultura dos grupos no representados no curr-culo escolar passem a fazer parte deste e se torne presente por meio de narrativas que salientam suas experincias e viabilizem dilogo entre as diversas culturas. Essa condio fundamental para esta-belecer e consolidar a democracia plena nas instituies escolares.

    Trabalhar nessa direo, em que o movimento se configura na busca de construir alternativas curriculares, sobretudo pensando-as como possibilidade de contribuio para a emancipao social, dois elementos so importantes e que merecem reflexo. Vejamos quais so: O primeiro o de ter clareza sobre o significado de currculo. Currculo no apenas uma lista de contedos a serem ministrados a um determinado grupo de alunos. muito mais que isso. criao cotidiana de todos os que fazem parte da escola, prtica que en-volve todos os saberes e processos interativos do trabalho educati-vo realizado por professores e alunos; o segundo, no menos impor-tante que o primeiro, diz respeito aos locais em que estes currculos se realizam. Vivncias curriculares no ocorrem somente no interior de escolas. A vida cotidiana tem seus prprios currculos, expressos nos processos sociais de aprendizagem que permeiam todo o nosso estar no mundo e que vo constituindo nossas identidades.

    1. Faa um levantamento das diversas prticas artesanais re-presentadas na comunidade: discorra sobre o tipo de conhecimen-to tradicional que estas representam e como est presente no coti-diano escolar.

    2. Consulte o Dicionrio de Termos Populares do Acre, e a par-tir deste verifique em que medida esta forma de falar ainda usada e/ou conhecida por seus alunos.

    Conhea publicaes que se referem aos diversos conhe-cimentos tradicionais.

    MARTINS, Edlson. Chico Mendes: um povo da Floresta. Rio de Ja-neiro: Garamond, 1998. LEITAO NETO, Antnio Alves. Conversa Educada. Reflexes sobre a educao no Acre. UNDIME-Acre, Rio Branco, 1995. MODESTO, Mauro Dvila.Dicionrios de Termos populares do Acre: pesquisa lingstica. Rio Branco: FEM, 2006. 166p. ESTEVES, Florentina. Enredo de memria. 2 ed. Rio Branco FEM, 2002. 160p. LOPES, Francisca Trindade. Contos e Crnicas. Grfica Tico-Tico. Rio Branco: 2006.MARCHESE, Daniela. Eu entro pela perna direita: espao, repre-sentao e identidade do seringueiro no Acre. Trad. Elenckey B. Pi-mentel. Rio Branco: EDUFAC, 2005. 144p. FLORENTINA, Esteves. Direito e Avesso. Rio de Janeiro: Oficina do Livro, 1998, 104p.

    1. Faa um levantamento das diversas prticas artesanais re-presentadas na comunidade: discorra sobre o tipo de conhecimen-to tradicional que estas representam e como est presente no coti-diano escolar.

    2. Consulte o Dicionrio de Termos Populares do Acre, e a par-tir deste verifique em que medida esta forma de falar ainda usadae/ou conhecida por seus alunos.

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    3 Sala de Aula: Espao de Cultu-

    ras

    OBJETIVOS ESPECFICOS

    - identicar o papel dos professores, alunos e de outros membros da comunidade es-colar na construo de prticas diferenciadas de currculo.

    Atividades Pedaggicas em escola pblica em Brasilia/AC - Foto COCAM/UFACAtAtAtAtiiviv dididid dddades PPP dddedagaga giicicas em escolllla p bbbbblllililica em

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    A partir das reflexes realizadas anteriormente, como pode-mos perceber a sala de aula? O que nela est inserida? Por que um espao de culturas? E de cultura no plural?

    Todos ns ao adentrarmos uma sala de aula somos acompa-nhados por nossas experincias e por nossas vivncias desenvolvi-das no ambiente, do qual fazemos parte. Cada um que compe a sala de aula traz o seu mundo, caracterizando esse espao em um ambiente repleto de culturas. Desse conjunto de culturas, a depen-der da orientao docente, surge um universo cultural novo, distin-to, heterogneo, singular, original, com peculiaridades prprias, no apenas racionalmente conduzido, mas emocionalmente sentido e intensamente vivido por todos.

    Da falarmos de cultura no plural, posto que a diversidade cul-tural ali presente no pode ser omitida, pelo contrrio, deve perme-ar e orientar as decises coletivas e os encaminhamentos do proces-so didtico de ensino.

    Admitir a importncia da diversidade cultural da sala de aula, no processo de formao escolar, perceber a diferena de cultura de cada aluno e de si mesmo, enquanto docente e, principalmente, acolher a idia da possibilidade e do direito de cada um construir sua identidade, sua histria, seu destino, seu mito pessoal de forma singular, autnoma e significativa nesse espao. Isso significa que aos alunos devem ser proporcionado as condies efetivas de cons-truo autnoma de aprendizagem, a partir de suas culturas.

    Colocar em foco a diferena cultural, reconhecendo o direito a essa diferena, e a percepo dos efeitos positivos e enriquecedo-res que podem advir das interaes culturais so posicionamentos e orientaes tericas relativamente recentes. Podemos perguntar: Tais orientaes j chegaram ao cotidiano do territrio das salas de aula? As pesquisas apontam que embora os agentes educativos se-jam sensveis a essa percepo, como todo processo de mudana, esto presentes grandes dificuldades de implementao no nvel dos projetos educativos das escolas e das prticas de grande nme-ro de professores.

    Na realidade, os educadores no tm conseguido, na propor-o desejada, superar a tradio escolar que historicamente valori-zou exclusivamente os produtos da cultura hegemnica. No tem sido fcil estabelecer um rompimento com posturas cristalizadas pelo tempo e tornar presente, na cultura escolar, as vozes, costu-mes, etc. que dela tm estado ausentes. Construir conhecimentos no ambiente curricular que seja de todos e, simultaneamente, de cada um dos grupos culturais presentes so desafios que se im-pem escola.

    Nessa perspectiva, a diversidade cultural dos grupos que es-to presentes na escola para ser percebida como um direito estru-turante das aes polco-pedaggicas; como um fator de enrique-cimento curricular e como um fator potencializador do desenvolvi-mento pessoal e social e no continue a ser concebida e encarada como problema a ser superado e extinguido do espao da sala de aula e da escola ou que provoque sentimentos de rejeio e de pa-ternalismo.

    Nesse sentido, voc pode perguntar: qual o papel do profes-sor e da escola nesse processo? importante, enquanto professor,

    tuarso

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    Alunos de escola pblica em Brasilia/AC

    Foto COCAM/UFAC

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    ter sempre presente nas situaes de aprendizagem os seguintes questionamentos: qual o direito que temos de interferir na apren-dizagem do outro? Qual o respeito que temos aos seus valores cul-turais? At que ponto, o processo pedaggico que desenvolvo tem sido uma construo coletiva e compartilhada por todos os envol-vidos?

    Esse tema assim questionado ultrapassa a sala de aula e a es-cola. Adquire uma dimenso social mais ampla, colocando na pauta da prtica docente a construo coletiva e multicultural da prpria sociedade, suas possibilidades e seus limites.

    Cabe aos professores refletirem, em cada circunstncia de ensino, sobre o sentido e o significado das relaes estabelecidas no contexto educativo, sobre a contribuio dos educandos nos conhecimentos desenvolvidos, sobre a participao dos alunos na construo dos saberes coletivos e por ltimo, sobre a produo de novos mundos e valores culturais.

    Sem dvida, essa postura docente diante do processo educa-tivo, rene decises polticas que envolvem relaes de poder e que caracteriza a ao educativa como um ato dotado essencialmente de tomada de deciso poltica para alm das decises pedaggi-cas.

    Tm surgido algumas propostas que perseguem essa pers-pectiva, apontando posturas frente ao multiculturalismo presente no ambiente escolar. Considerando que o currculo no uma cons-truo inocente e neutro de trabalho pedaggico, no qual transmite de forma desinteressada o conhecimento social, no se pode negli-genci-lo em polticas educativas que pretendem voltar-se para as caractersticas culturais dos alunos a quem se direciona.

    Bernstein nos seus primeiros trabalhos destaca que a insti-tuio escolar coloca em desvantagem as crianas provenientes de determinados grupos sociais. Estabelece uma crtica bastante consistente escola por esta usar predominantemente um cdigo elaborado, condicionando o que se aprende e como se aprende, privilegiando as crianas em que o seu espao familiar constitu-do de uma cultura que utiliza o cdigo elaborado e que coincide com as formas de comunicao escolhida pela escola, deixando em desvantagem as crianas pertencentes aos outros grupos que no o dominam.

    Nessa linha de raciocnio, a compreenso dos resultados pro-duzidos pelos processos de desenvolvimento de um currculo re-quer a anlise do que se ensina e de como se ensina, bem como das situaes de quem ensina e de quem se deseja ensinar.

    Ver Bernstein, Basil. Comu-nicao verbal, cdigo e socializao. In: Cohn, Ga-biel (org.) Comunicao e indstria cultural. So Pau-lo, Nacional, 1971; Estrutura social, linguagem e apren-dizagem. In: Patto, Maria Helena Souza (org.). Introduo Psicologia es-colar. So Paulo, Queiroz, 1982; Uma crtica ao concei-to de educao compensa-tria. In: Brando, Zaia (org.) Democratizao do ensino: meta ou mito? Rio de Janei-ro, Francisco Alves, 1979.

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    1. Faa uma anlise dos Referenciais Curriculares do Estado do Acre e verifique em que medida estes atendem especificidade da cultura local sem deixar de dar uma formao global aos alunos.

    2. O mdulo do Ensino da Arte dos Referenciais Curriculares para o Ensino Fundamental de 5 a 8 sries, apresenta um panorama da arte e da cultura no Acre, demonstre como tais aspectos culturais esto configurados na prtica pedaggica e no cotidiano escolar.

    Agentes e Pacientes

    Vrias administraes municipais, inclusive a de Rio Branco, desenvolvem programas de medicina preventiva com base no tra-balho dos agentes de sade. Cada agente de sade fica encarregado de dar assistncia a 300 famlias. Em um ms, deve visitar suas casas e anotar todas as ocorrncias: quem nasceu, quem morreu, quem ficou doente. Deve fazer exames bsicos, pesar as crianas, verificar as datas de vacinao, ver como anda a alimentao de cada mem-bro da famlia. Se encontrar casos simples, ele mesmo faz o atendi-mento. Em casos mais graves, encaminha aos postos ou centros de sade para atendimento mdico.

    de se imaginar que depois de alguns meses , o agente de sade comea a ficar amigo dessas famlias. Conhece as crianas pelos seus nomes, ou as queixas dos mais velhos, ajuda a resolver pequenos problemas , envolve-se com a comunidade e passa a fa-zer parte dela. Quando pergunta sobre a sade de uma pessoa, no est mais fazendo apenas uma pergunta tcnica para cumprir um roteiro de trabalho. E com a confiana que passa a receber respostas sinceras e passa a conhecer na intimidade a vida das pessoas. Assim, est apto a prestar um servio de grande qualidade e atingir seu objetivo: ajudar as pessoas a adquirir e conservar a sade.

    Numa educao humanista, especialmente em pequenas ci-dades , um professor pode ser uma espcie de agente de sade para seus alunos. Pode envolver-se com eles, freqentar suas casas, co-nhecer suas famlias, chorar com suas dores e rir com suas alegrias. Ter, ento, uma compreenso mais profunda e um conhecimento mais ntimo das necessidades de cada aluno. Assim, pode dar a eles realmente educao e no apenas aulas. Mas como pode o profes-sor fazer isso, se d aulas em duas ou trs escolas? Se fica nelas ape-

    1. Faa uma anlise dos Referenciais Curriculares do Estado do Acre e verifique em que medida estes atendem especificidade dacultura local sem deixar de dar uma formao global aos alunos.

    2. O mdulo do Ensino da Arte dos Referenciais Curriculares para o Ensino Fundamental de 5 a 8 sries, apresenta um panorama da arte e da cultura no Acre, demonstre como tais aspectos culturais esto configurados na prtica pedaggica e no cotidiano escolar.

    Agentes e Pacientes

    Vrias administraes municipais, inclusive a de Rio Branco, desenvolvem programas de medicina preventiva com base no tra-balho dos agentes de sade. Cada agente de sade fica encarregado de dar assistncia a 300 famlias. Em um ms, deve visitar suas casase anotar todas as ocorrncias: quem nasceu, quem morreu, quem ficou doente. Deve fazer exames bsicos, pesar as crianas, verificar as datas de vacinao, ver como anda a alimentao de cada mem-bro da famlia. Se encontrar casos simples, ele mesmo faz o atendi-mento. Em casos mais graves, encaminha aos postos ou centros de sade para atendimento mdico.

    de se imaginar que depois de alguns meses , o agente de sade comea a ficar amigo dessas famlias. Conhece as crianaspelos seus nomes, ou as queixas dos mais velhos, ajuda a resolverpequenos problemas , envolve-se com a comunidade e passa a fa-zer parte dela. Quando pergunta sobre a sade de uma pessoa, noest mais fazendo apenas uma pergunta tcnica para cumprir um roteiro de trabalho. E com a confiana que passa a receber respostas sinceras e passa a conhecer na intimidade a vida das pessoas. Assim, est apto a prestar um servio de grande qualidade e atingir seu objetivo: ajudar as pessoas a adquirir e conservar a sade.

    Numa educao humanista, especialmente em pequenas ci-dades , um professor pode ser uma espcie de agente de sade paraseus alunos. Pode envolver-se com eles, freqentar suas casas, co-nhecer suas famlias, chorar com suas dores e rir com suas alegrias.Ter, ento, uma compreenso mais profunda e um conhecimento mais ntimo das necessidades de cada aluno. Assim, pode dar a eles realmente educao e no apenas aulas. Mas como pode o profes-sor fazer isso, se d aulas em duas ou trs escolas? Se fica nelas ape-

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    nas no horrio da aula? Se quase no convive com os alunos fora das salas de aula?

    O regime de trabalho da maioria dos professores resulta numa impessoalidade na sua relao com os alunos. Estes passam a ser nmeros, turma, multido, no mais pessoas. So como pacientes desconhecidos num pronto-socorro de uma grande cidade: o mdi-co os atende rapidamente, faz exames superficiais e receita o mes-mo remdio para todos.

    Outro resultado a perda de substncia da escola, o quase desaparecimento da chamada comunidade escolar. Num passado no muito distante era possvel perceber que cada escola tinha uma personalidade. Havia at mesmo uma certa rivalidade entre elas, ex-pressa no apenas em jogos e competies mas em todo o compor-tamento de seus membros. Os alunos demonstravam identificar-se com a escola e tinham orgulho de pertencer a ela. Hoje tanto faz estudar numa escola ou noutra. Entre os professores d-se o mes-mo: a diferena entre uma escola e outra a distncia, o horrio, o tamanho das salas, jamais o estilo ou a proposta educacional.

    Se nem alunos nem professores se identificam com a esco-la, ela deixa de ser o segundo lar, como se dizia antigamente. Isso significa um prejuzo na socializao dos alunos e na sua identifi-cao com conjuntos maiores: a cidade, o Estado, a nao. A escola no mais oferece opo de identidade, no faz mais a mediao na passagem do lar para o mundo. As novas geraes so jogadas di-retamente na fragmentao da sociedade moderna, na qual a mdia e as ruas expem novas opes de identidade. A gangue, a moda e o f-clube so opes mais leves. As drogas oferecem experincias mais radicais.

    Essa mediao na passagem do lar para o mundo tambm feita em outros ambientes, nos quais a identidade das pessoas e grupos podem formar-se pelo exerccio de valores socialmente acei-tos; a Igreja , o partido, o clube etc. Mas nenhum destes ambientes substitui a experincia da escola como iniciao ao poder civil, laico, universal. A escola unidade bsica de integrao social. A parcela da populao socialmente excluda (os 32 milhes de miserveis no Brasil) aquela que no tem terra, trabalho ou moradia, mas , prin-cipalmente, aquela que no tem escola.

    O mundo vive uma revoluo tecnolgica cujo elemento cen-tral a informao ou, em termos mais amplos, o conhecimento e o saber. A excluso social ser, cada vez mais, uma separao en-tre os que tm e os que no tm acesso ao conhecimento. A perda de substncia da escola, sua incapacidade de funcionar como am-biente de integrao social, significa que mesmo aqueles que esto dentro dela podero estar socialmente excludos. Isso j acontece. Antigamente a condio para quem queria arranjar emprego era ter o primeiro grau completo e o curso de datilografia. Hoje, uma multido de jovens com essas qualificaes est condenada ao de-semprego.

    Nas grandes cidades, advogados dirigem nibus e economis-tas vendem sanduches. O apartheid social atingiu a escola: umas possibilitam a incluso na sociedade, outras condenam excluso.

    O primeiro passo para recuperar a eficcia da escola como

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    ambiente de integrao social a reconstruo de sua identidade perdida. Para isso, necessrio que a escola desenvolva seu estilo, sua maneira de inserir-se na sociedade.

    Uma escola pode destacar-se pela excelncia cientfica, outra pode ser conhecida pelo seu humanismo, outra pelo seu trabalho no resgate da identidade cultural, outra pela formao tcnica e profissional. Enfim, cada escola pode proporcionar uma maneira di-ferente de insero social aos seus alunos. Mas, para isso, necess-rio que desenvolva no seu ambiente interno um esprito de corpo, um mtodo, uma idia, uma maneira de ser escola que seja aceita pela comunidade e com quais seus profissionais e seus alunos se identifiquem.

    A nica maneira de a escola conseguir essa identidade con-tar com profissionais exclusivos e permanentes. Profissionais que vivam o ambiente escolar convivam com a comunidade, partici-pem da gesto da escola, desenvolvam atividades extracurriculares, mantenham relaes pessoais com os alunos e seus pais. Em resu-mo, profissionais que sejam agentes de sade comunitrios, com uma determinada quantidade de famlias sob sua responsabilida-de. Os programas de sade preventiva acompanham uma criana desde o perodo pr-natal at a idade adulta. Se a sade do corpo justifica esse cuidado, a sade do esprito e da cultura no pode ser considerada igualmente importante?

    Essa a fundamentao ltima da proposta de dedicao ex-clusiva feita pela Secretaria Municipal de Educao - SEMEC de Rio Branco. Trabalhando apenas na rede municipal, o professor no se dispersa em vrios servios, cada um deles sendo mais um bico. Seu campo de atuao torna-se mais restrito, porm mais profun-do. Outra proposta complementa essa exclusividade: a de que o m-nimo necessrio para que desenvolva laos e compromissos com seus colegas e com a comunidade. Se apenas uma escola no for suficiente para completar a carga horria prevista em seu contrato, o professor pode lecionar em outra escola da rede municipal. Mas o ideal que se identifique com uma escola, concentre nela sua aten-o, sinta-se responsvel por ela.

    Essa proposta no visa diminuir o alcance do trabalho do pro-fessor. No se mede o trabalho educacional apenas pela quantida-de. A qualidade essencial. Em vez de correr de um lado para outro para dar aulas em escolas diferentes, o professor pode realmente pesquisar e planejar suas aulas, alm de desenvolver atividades ex-tra-sala. Hoje isso no acontece: os horrios de planejamento so ocupados por outras aulas, igualmente mal preparadas. Os duplos contratos de 40 horas semanais so um fingimento para o qual to-dos fazem vista grossa. So antiticos, todo mundo sabe disso. Per-manecem por inrcia, convenincia poltica e falta de coragem para encarar a verdade.

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    FLORESTANIA