704
CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE PROFISSIONAL EM EDUCAÇÃO FÍSICA: da formação à intervenção COLEÇÃO TEMAS EM MOVIMENTO

Livro Identidades Do Profissional (Gelcemar Farias e Juarez Nascimento)

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Os organizadores desta obra Juarez Vieira do Nascimentoe Gelcemar Oliveira Farias, ambos finalizaram seusestudos doutorais enfocando a formação inicial de professoresde Educação Física. Enquanto autoridades nestaárea de investigação, assumem o compromisso de abordarcomo tema central do livro a “Construção da identidadeprofissional em Educação Física”, contemplando tanto aformação quanto a intervenção profissional.

Citation preview

  • CONSTRUO DAIDENTIDADE

    PROFISSIONAL EMEDUCAO FSICA:

    da formao interveno

    C O L E O T E M A S E M M O V I M E N T O

  • Antonio Heronaldo de Sousa

    Reitor

    Marcus Tomasi

    Vice-Reitor

    Leo Rufato

    Pr-Reitor de Pesquisa e Ps-Graduao

    Darlan Laurcio Matte

    Diretor Geral do Centro de Cincias da Sade e do Esporte

    Alexandro Andrade

    Diretor de Pesquisa e Ps-Graduao do

    Centro de Cincias da Sade e do Esporte

    Suzana Matheus Pereira

    Departamento de Educao Fsica

  • Florianpolis2012

    Volume 2

    Juarez Vieira do Nascimento

    Gelcemar Oliveira FariasOrganizadores

    C O L E O T E M A S E M M O V I M E N T O

    CONSTRUO DAIDENTIDADE

    PROFISSIONAL EMEDUCAO FSICA:

    da formao interveno

  • A Coleo Temas em Movimento uma publicao da Editora da UDESC, composta por um conselho editorial interinstitucional, que objetiva divulgar as pesquisas realizadas sob diferentes perspectivas na rea de Educao Fsica e Esportes, para aprofundar aspectos con-ceituais e metodolgicos da profisso, bem como contribuir para a aproximao entre a comunidade cientfica e prtica pedaggica em diferentes contextos de interveno.

    Conselho EditorialAdriana Coutinho Azevedo Guimares - UDESCChristi Noriko Sonoo UEMFlvio Medeiros Pereira UFPELJoice Mara Facco Stefanello UFPRLuiz Srgio Peres - UNIOSTEMarcos Augusto Rocha - UELViktor Shigunov UFSCZenite Machado - UDESC

    Catalogao na publicao por: Onlia Silva Guimares CRB-14/071

    Projeto grfico, diagramao e capa Rita Motta - Ed. Tribo da Ilha

    C764 Construo da identidade profissional em educao fsica : da formao interveno, Juarez Vieira do Nascimento, Gelcemar Oliveira Farias, organizadoras. Florianpolis : Ed. da UDESC, 2012. v. 2. (Temas em movimento)

    Inclui bibliografia ISBN:978.85.61136-73-4

    1. Educao fsica como profisso. 2. Educao fsica Currculos. 3. Professores de educao fsica Formao. 4. Prtica de ensino. I. Nascimento, Juarez Vieira do. II. Farias, Gelcemar Oliveira. III. Srie. CDU:796:37

  • 5Prefcio

    A assertiva da alegria, satisfao ou at honra embate-se com a responsabilidade, dificuldade e receio em elaborar o prefcio de uma obra que sntese das contribuies de um importante evento cientfico. Ao ser convidado para tal tarefa no hesitei em aceita-la, pois me pareceu como um imenso desafio apresentar uma pliade de especialis-tas, estudiosos, pesquisadores em diferentes eixos temticos da formao e desenvolvi-mento profissional.

    Por mais vasto que seja o conhecimen-to de uma pessoa, devo destacar que hoje em dia, por contingncias do prprio acmulo temporal do conhecimento e aliado s novas tecnologias, seria difcil ou quase impossvel de domin-lo. Desta forma, apenas uma pes-soa, no caso o prefaciador, ter o conhecimen-to de todas as nuances, todos os labirintos, todas as possibilidades, enfim, toda a com-plexidade que tomou conta do campo profis-sional em Educao Fsica, seria ingloriosa a sua tarefa.

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    6

    Diante do tempo acumulado de exerccio profissional e tambm da experincia adquirida, com toda a tranqili-dade delego esta tarefa aos especialistas que comunicam, discutem, argumentam, propem e sugerem diferentes formas de olhar sobre a profisso docente e demais reas de interveno em Educao Fsica. A opo de publicar um livro do II Congresso Internacional de Formao Pro-fissional em Educao Fsica e do VI Seminrio de Estu-dos e Pesquisas em Formao Profissional no Campo da Educao Fsica foi de grande relevncia, principalmente por reunir as contribuies de diferentes especialistas na-cionais e internacionais, alm de contemplar vrias con-cepes de formao profissional. Ouso ainda intuir que a opo por eixos temticos pode evidenciar as identidades concretas, as quais revelam que a sua construo compre-ende um processo histrico.

    Os organizadores desta obra Juarez Vieira do Nasci-mento e Gelcemar Oliveira Farias, ambos finalizaram seus estudos doutorais enfocando a formao inicial de pro-fessores de Educao Fsica. Enquanto autoridades nesta rea de investigao, assumem o compromisso de abordar como tema central do livro a Construo da identidade profissional em Educao Fsica, contemplando tanto a formao quanto a interveno profissional.

    A opo de reunir os diferentes especialistas em seis eixos temticos acena para a amplitude da temtica e cres-cente complexidade. Da mesma forma, aponta para a pos-svel fragmentao e diviso de uma totalidade que ainda nebulosa, especialmente na constelao profissional do campo da Educao Fsica.

    A magnitude dos participantes necessita ser destacada e seria indelicado da minha parte, por conhecer a maioria

  • 7prefcio

    dos componentes, no os referenciar. Contudo, farei a gra-ta tarefa de destacar, tanto os eixos temticos (identida-des concretas) como os seus componentes.

    O primeiro eixo temtico, sob a denominao Cons-truo da identidade profissional em Educao Fsica, agrupa textos dos professores Carlos Janurio, Isabel Mesquita, Robyn Jones, Joana Fonseca, Luciana De Mar-tin Silva, Juarez Vieira do Nascimento, Gelcemar Oliveira Farias, Paula Maria Fazendeiro Batista, Ana Luisa Pereira, Amndio Braga dos Santos Graa, Samuel de Souza Neto, Larissa Cerignoni Benites, Roberto Tadeu Iaochite e Ceci-lia Borges.

    Os Desafios dos estgios na formao inicial em Educao Fsica so abordados no segundo eixo temti-co pelos professores Alberto Albuquerque, Joo Lira, Rui Resende, Marcos Garcia Neira, Giovani De Lorenzi Pires, Alcyane Marinho, Priscila Mari dos Santos, Ieda Parra Barbosa Rinaldi, Juliana Pizani e Pablo Juan Greco.

    O terceiro eixo temtico contempla os Desafios das prticas pedaggicas na formao inicial em Educao F-sica a partir das contribuies dos professores Marin-gela da Rosa Afonso, Nice Nocchi, Mariana Afonso Ost, Glauco Nunes Souto Ramos, Llian Aparecida Ferreira, Edison Roberto de Souza e Alba Regina Battisti de Souza.

    O quarto eixo temtico tem como proposta abordar os Conhecimentos para formao e interveno profis-sional em Educao Fsica e os professores autores Dag-mar Hunger, Juliana Martins Pereira, Camila Borges, Fernanda Rossi, Daniel Marcon, Juarez Vieira do Nasci-mento, Amndio Braga dos Santos Graa, Jeane Barcelos Soriano, Priscilla Maia da Silva, Ansio Calciolari Junior e Valmor Ramos.

  • A Formao inicial e interveno profissional em Educao Fsica compreende o quinto eixo temtico, ten-do como protagonistas os professores Sheila Aparecida Pereira dos Santos Silva, Ricardo Rezer, Vicente Molina Neto, Rosane Kreusbrug Molina, Lisandra Oliveira e Silva, Tnia Rosane Bertoldo Benedetti, Sueyla Ferreira da Sil-va dos Santos, Silvio Aparecido Fonseca, Juarez Vieira do Nascimento, Mauro Virgilio Gomes de Barros, Alex Anto-nio Florindo, Alessandro Nicolai R, Marlia Velardi, Luiz Mochizuki, Paulo Cesar Montagner, Alcides Jos Scaglia, Katherine Grace Amaya, Rita de Cssia Garcia Verenguer e Alexandro Andrade.

    Finalmente, o ltimo eixo temtico expem a temtica As Redes de Pesquisa e Associaes de Ensino e a formao em Educao Fsica, tendo como timoneiros os professo-res Ana Maria Alvarenga, Gelcemar Oliveira Farias, Silvio Aparecido Fonseca, Juarez Vieira do Nascimento, Mathias Roberto Loch, Aldemir Smith Menezes, Wallacy Milton do Nascimento Feitosa e Alex Antonio Florindo.

    Com a apresentao dos eixos temticos e seus au-tores, vale destacar a atualidade e a pertinncia, alm da serventia deste instrumento de consulta e de divulgao, o qual foi gestado para suprir as possveis lacunas na te-mtica escolhida e que d ttulo obra. Assim, almejo uma leitura profcua, ainda mesmo que no se tenha esgotado os problemas enfrentados na formao inicial em Educa-o Fsica.

    Florianpolis, abril de 2012.

    Viktor Shigunov

  • 9Sobre os organizadores

    Juarez Vieira do Nascimento

    Professor licenciado em Educao Fsica pela Faculda-de Salesiana de Educao Fsica. Mestre em Cincia do Movimento Humano pela Universidade Federal de San-ta Maria. Doutor Cincias do Esporte pela Universida-de do Porto. Docente da Universidade Federal de Santa Catarina, coordenador do Laboratrio de Pedagogia do Esporte. Tem experincia na rea de Educao Fsica, com nfase em Formao Profissional e Pedagogia do Esporte, atuando principalmente nos seguintes temas: Educao Fsica, formao inicial, voleibol, desenvolvi-mento profissional e currculos e programas.

    Gelcemar Oliveira Farias

    Professora licenciada em Educao Fsica e especialis-ta em Educao Fsica Escolar pela Universidade Fe-deral de Pelotas. Mestre e doutora pelo Programa de Ps-Graduao em Educao Fsica da Universidade Federal de Santa Catarina. Docente do Curso de Edu-cao Fsica da Universidade do Estado de Santa Cata-rina. Desenvolve estudos relacionados formao, ao desenvolvimento profissional e prtica pedaggica dos professores. Tambm membro do grupo de pes-quisa do Laboratrio de Pedagogia do Esporte da Uni-versidade Federal de Santa Catarina e do Laboratrio de Pequisa em Lazer e Atividade Fsica da Universida-de do Estado de Santa Catarina.

  • Sumrio

    Prefcio

    PARTE IConstruo da identidade profissional em Educa-o Fsica

    O desenvolvimento profissional: a aprendi-zagem de ser professor e o processo de roti-nizao das decises printerativas em pro-fessores de Educao FsicaCarlos Janurio

    Nova abordagem na formao de treinadores: o que mudou e porqu?Isabel MesquitaRobyn JonesJoana FonsecaLuciana De Martin Silva

    Construo da identidade profissional: me-tamorfoses na carreira docente em Educao FsicaGelcemar Oliveira FariasJuarez Vieira do Nascimento

    5

    19

    21

    41

    61

  • A (re)configurao da identidade profissional no espao formativo do estgio profissionalPaula Maria Fazendeiro BatistaAna Luisa Pereira Amndio Braga dos Santos Graa

    O estgio supervisionado como prtica pro-fissional, rea de conhecimento e locus de construo da identidade do professor de Educao FsicaSamuel de Souza NetoLarissa Cerignoni BenitesRoberto Tadeu IaochiteCecilia Borges

    PARTE IIDesafios dos estgios na formao inicial em Edu-cao Fsica

    Representaes dos professores de Educao Fsica sobre o seu ano de prtica de ensino supervisionadaAlberto AlbuquerqueJoo LiraRui Resende

    Proposies para o estgio disciplinar na for-mao de professores de Educao FsicaMarcos Garcia Neira

    Estgio supervisionado em Educao Fsica escolar: relatos e apontamentos como deman-das formao profissionalGiovani De Lorenzi Pires

    81

    113

    141

    143

    177

    203

  • Estgios curriculares nos cursos de bachare-lado em Educao FsicaAlcyane MarinhoPriscila Mari dos Santos

    Desafios dos estgios nos cursos de bachare-lado em Educao FsicaIeda Parra Barbosa RinaldiJuliana Pizani

    Desafios dos estgios nos cursos de bacharela-do em Educao Fsica: a questo dos esportes coletivosPablo Juan Greco

    PARTE IIIDesafios das prticas pedaggicas na formao inicial em Educao Fsica

    A prtica pedaggica como componente curri-cular: contextos e processos Maringela da Rosa AfonsoNice NocchiMariana Afonso Ost

    As prticas pedaggicas como componente curricular na formao inicial em Educao FsicaGlauco Nunes Souto RamosLlian Aparecida Ferreira

    235

    263

    287

    303

    305

    323

  • A extenso na formao inicial em Educao FsicaEdison Roberto de SouzaAlba Regina Battisti de Souza

    PARTE IVConhecimentos para formao e interveno pro-fissional em Educao Fsica

    Conhecimentos para formao e interveno em Educao Fsica: os desafios da docncia universitriaDagmar HungerJuliana Martins PereiraCamila Borges Fernanda Rossi

    Formao inicial em Educao Fsica, legislao e conhecimentos docentes: interfaces e pos-sveis perspectivasDaniel MarconJuarez Vieira do NascimentoAmndio Braga dos Santos Graa

    A Educao Fsica enquanto grupo profissio-nal: algumas inquietaes sobre formao e interveno na reaJeane Barcelos SorianoPriscilla Maia da SilvaAnsio Calciolari Junior

    O conhecimento do professor: a prtica pe-daggica como referncia Valmor Ramos

    347

    371

    373

    397

    423

    447

  • PARTE VFormao inicial e interveno profissional em Educao Fsica

    A atuao em esporte e seus desafios for-mao profissionalSheila Aparecida Pereira dos Santos Silva

    Trs desafios da formao profissional em Educao Fsica para interveno no contex-to do esporte...Ricardo Rezer

    O processo de identizao docente e a forma-o em Educao Fsica para o trabalho do-cente no contexto da escolaVicente Molina NetoRosane Kreusbrug MolinaLisandra Oliveira e Silva

    Educao Fsica no contexto da sadeTnia Rosane Bertoldo BenedettiSueyla Ferreira da Silva dos Santos

    A formao inicial em Educao Fsica e a in-terveno profissional no contexto da sade: desafios e proposiesSilvio Aparecido FonsecaJuarez Vieira do NascimentoMauro Virgilio Gomes de Barros

    465

    467

    493

    519

    543

    557

  • Formao em Educao Fsica e sade: o exem-plo do curso de cincias da atividade fsica da universidade de So PauloAlex Antonio FlorindoAlessandro Nicolai RMarlia VelardiLuiz Mochizuki

    Desafios da formao em esporte para inter-veno profissional no contexto da gesto: investigaes iniciais Paulo Cesar MontagnerAlcides Jos ScagliaKatherine Grace Amaya

    Formao inicial em Educao Fsica e a in-terveno profissional no contexto da ges-to: comportar-se como um eterno aprendizRita de Cssia Garcia Verenguer

    Inovao em Educao Fsica: formao pro-fissional deficiente Alexandro Andrade

    PARTE VIRedes de pesquisa e associaes de ensino em Educao Fsica

    Rede Ibero-americana de investigao da forma-o em Educao Fsica: contexto e proposiesAna Maria AlvarengaGelcemar Farias de OliveiraSilvio Aparecido FonsecaJuarez Vieira Nascimento

    587

    605

    633

    645

    669

    671

  • Associaes de ensino e a formao do ba-charel em Educao Fsica: passos e comen-trios iniciais Silvio Aparecido FonsecaMathias Roberto LochAldemir Smith MenezesWallacy Milton do Nascimento Feitosa

    Alex Antonio FlorindoJuarez Vieira do Nascimento

    687

  • PARTE I

    CON ST RU O DA

    IDEN T IDADE PROFI SSIONAL

    EM EDUC A O F SIC A

  • 21

    O Desenvolvimento Profissional:

    a aprendizagem de ser professor

    e o processo de rotinizao

    das decises printerativas em

    professores de Educao Fsica

    Prof. Dr. Carlos Janurio1

    Introduo

    Tem havido muitas evidncias sobre os fatores que podem influenciar o Desenvolvi-mento Profissional (DP) nas vrias fases da vida. Esta comunicao est orientada abor-dando dois problemas:

    1 problema: Qual o perodo mais im-portante e de maior valia para o DP?

    1 CIPER, Centro de Investigao da Performance Humana, apoiado pela Fundao para a Cincia e Tecnologia. Faculda-de de Motricidade Humana, Universidade Tcnica de Lisboa.

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    22

    2 problema: Aps a formao inicial o profissional est formado? At que ponto?

    Vamos primeira questo. So vrias as histrias que podem ilustrar o contributo da infncia para o DP. a his-tria do menino cujo pai lhe ofereceu um kart. Esse menino foi campeo de Frmula 1. Infelizmente morreu num aci-dente em Imola na flor da idade. O seu nome era Ayrton Senna. a histria do menino cujo pai lhe ofereceu uma bola. A bola acompanhou o durante a vida; levava a na mo para a escola e aproveitava todos os momentos para brincar e jogar. O seu nome Lus Figo. a histria do menino que andou na ginstica, gostou e teve um excelente professor. A partir da quis ser professor de gintica. O seu sonho foi cumprido e hoje forma professores e est aqui hoje perante vs. Porm, apenas dois desses meninos foram professores de ginstica; no entanto, pessoalmente posso testemunhar a importncia dessa experincia para o meu DP.

    Todas estas histrias remetem nos para o quadro das experincias antecipatrias de pr socializao. Tm a vantagem de possibilitar um treino prvio, centrado na tarefa. Dito por outras palavras, todas estas pessoas trei-naram a sua vida profissional e tiveram um avano de al-guns milhares de horas sobre outras.

    Ao perodo de infncia e adolescncia segue se o de preparao e de formao inicial. Aqui outras competn-cias so adquiridas.

    Quando estive na Universidade de Coimbra, uma das mais antigas da Europa, tive a curiosidade em conhecer a lista de todos os presidentes da Associao Acadmica de Coimbra, a associao de estudantes de toda a academia. Fiquei surpreso por conhecer quase todos os presidentes.

  • 23

    construo da identidade profissional em educao fsica

    Quase todos foram, ou so hoje, lderes polticos, lderes de opinio, pessoas que ocuparam ou ocupam papis im-portantes na vida pblica, na academia, nas empresas e na administrao. Tiveram a possibilidade de treinar falar em pblico, de arrastar multides, de lutar pelos direitos dos estudantes (alguns lutaram contra a ditadura), e de aprender a gerir oramentos e as competncias pessoais. Juntemos ainda um capital social e de afetos que, mais tarde, so capitalizados. Deste modo, a formao inicial constitui uma experincia de vida que vai alm das com-petncias prprias a qualquer profisso. uma oportuni-dade de crescimento pessoal e, novamente, de treino, de exercitao e de tempo na tarefa.

    Findo este perodo entramos na fase de vida ativa. A Figura 1 procura responder questo que inicial-

    mente colocmos (Qual o perodo mais importante e de maior valia para o DP?), onde se encontram os trs pero-dos do DP, os quais tm de ser vistos de forma integrada.

    Figura 1 - Processo de aprendizagem e de desenvolvimento ao longo da vida.

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    24

    As ilaes que retiramos que o DP decorre tambm antes e durante o perodo de formao inicial, onde se exercitam as vrias competncias pessoais. Deste modo, a formao deve ser considerada como um processo con-tnuo e multilateral. Mesmo na formao inicial, onde as competncias mais especficas relacionadas com as fun-es profissionais requeridas pela formao so o foco principal, devemos utilizar todos os recursos para o de-senvolvimento do universo das competncias pessoais, fornecendo experincias de vida e de formao que pos-sam enriquecer o desenvolvimento, tanto ao nvel do cur-rculo formal como do informal.

    A formao inicial: o professor est formado?

    Passemos ao 2 problema: Aps a formao inicial o profissional est formado? At que ponto?

    A resposta a esta questo tem sido procurada nos v-rios quadros profissionais e no especfica da profisso de professor, tal como a anterior.

    importante conhecer as teorias do desenvolvimento profissional do professor para melhor compreender a sua evoluo. Todavia, pouca ateno tem sido dada a como se desenvolve os aspetos evolutivos do processo de aprender a ensinar (BERLINER, 2000).

    H uma necessidade de estudos longitudinais para investigar a evoluo dos processos de pensamento e de comportamento dos professores, com o intuito de com-preender como so automatizadas as rotinas de ensino e de planeamento na fase inicial da profisso, a fase em que

  • 25

    construo da identidade profissional em educao fsica

    se concentra o maior desenvolvimento das competncias especficas que caraterizam a profisso de professor.

    Deste modo, analismos a natureza e as caratersticas dos pensamentos e decises printerativas ou de planeamento em estagirios (dados de 2004) e voltmos a fazer a mesma anlise quatro anos aos mesmos estagirios, agora professores (dados de 2008). O objetivo verificar como os professores evoluem na fase inicial da profisso, j que as decises de planeamento constituem uma janela privilegiada para compreender o pro-cesso de ensino (GRAA, 2001). No entanto, a anlise compa-rativa ainda est em curso e apenas podemos apresentar uma pequena parte desses resultados aqui.

    A amostra inicial de 20 estagirios de Educao Fsica, da Universidade Presidente Antnio Carlos, em Conselheiro Lafaiete, Minas Gerais, e de 60 aulas (no segundo momento, a amostra de 18 professores, dos 20 iniciais). Nesta comu-nicao apenas sero apresentados dados relativos entre-vista retrospetiva, atravs do Guio de Entrevista Pr-Aula (JANURIO, 1996); assim, as entrevistas foram gravadas, e posteriormente transcritas e sujeitas a anlise de contedo.

    As informaes provindas das entrevistas referentes aos processos de pensamento dos estagirios foram cate-gorizadas atravs de cinco sistemas de anlise: Pensamen-tos e Decises Didticas, Diagnstico de Aluno, Diferenciao do Ensino, Legitimao das Decises e Preocupaes Prticas (JANURIO, 1996).

    Como questes prvias colocmos:1) Existe estabilidade nos pensamentos e decises

    printerativas em cada estagirio nas vrias aulas? 2) Quais as caratersticas dos pensamentos e decises

    pr-interactivas dos estagirios de Educao Fsica? possvel dizer que existe um perfil tpico de estagirio?

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    26

    A primeira questo tem como finalidade saber se h diferenas no perfil decisional dos estagirios nas vrias aulas. Mesmo cientes que o comeo da vida profissional tambm o incio do processo de rotinizao, possvel haver fatores comuns em cada estagirio no processo de planeamento em vrias aulas, que possibilite haver uma estabilidade de perfil decisional em cada professor?

    A segunda questo procura saber da existncia de per-fis que reunam caratersticas comuns nos pensamentos e decises preinterativas nos estagirios. As caratersticas pessoais sobrelevam a formao inicial, necessariamente homogeneizante? Que perfil(is) podemos esperar?

    Anlise dos resultados dados de 2004

    Respondendo s questes prvias, verificou se esta-bilidade decisional nas 3 aulas de cada estagirio (das 23 variveis pr-interativas, apenas 2 apresentam diferenas significativas com valor superior a p .05), o que possibili-ta considerar a mdia das aulas como referncia, dado que existe uma estabilidade aprecivel nos dados.

    Em primeiro lugar quismos ver at que ponto exis-tiam diferenas interindividuais nos estagirios, relativa-mente s variveis da fase preinterativa de ensino. A clus-ter analysis possibilitou identificar 4 perfis de estagirios (Quadro 1):

    o Perfil 1, com 2 estagirios; o Perfil 2, com 15 estagirios, ou seja, 75% da

    amostra; o estagirio tpico; o Perfil 3, com 2 estagirios;

  • 27

    construo da identidade profissional em educao fsica

    o Perfil 4 singular, no tendo interesse terico.

    Quadro 1 - Agrupamento dos Estagirios.

    Agrupamentos Estagirios

    Perfil 1 1, 4

    Perfil 2 14, 19, 12, 8, 16, 9, 17, 11, 15, 20, 5, 7, 2, 6, 10

    Perfil 3 3, 13

    Perfil 4 18

    Analisemos agora os vrios perfis para caraterizar que tipo de estagirios temos. Na Tabela 1 mostramos os dados dos estagirios do perfil 1 (1 e 4).

    Tabela 1 - Perfil 1: Pensamentos e Decises Didticas.

    Variveis Pr-interativasMdia

    Estagirio 1

    MdiaEstagirio

    4

    MdiaGeral

    Decises Legitimadas pela Experincia 7,00 6,67 1,31

    Total de Diagnstico 19,33 25,00 11,9

    Diagnstico Especfico 12,33 9,67 5,63

    Diagnstico Genrico 7,00 15,33 6,56

    Diagnstico Acadmico 11,67 11,00 4,23

    Diagnstico Comportamento 7,67 14,00 7,90

    Diferenciao do Ensino 1,00 1,00 1,55

    Os resultados mostram que os estagirios apresen-tam alta frequncia de Decises Legitimadas pela Experin-cia, comportamento justificado por legitimarem as suas decises nas experincias profissionais. So os nicos es-tagirios que possuam experincia profissional anterior. Com efeito, embora estagirios, ambos possuem mais de 35 anos e experincia de lecionao anterior ao ingresso

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    28

    na licenciatura. Esta situao confere lhes mais segurana e autonomia em relao aos demais sobre o planeamento do ensino.

    Alguns estudos descrevem as influncias socializado-ras, que se traduzem em imagens da profisso e modelos de prtica pedaggica interiorizados pelos estagirios em experincias escolares anteriores (SANCHES; JACINTO, 2004), atribuindo significados aos seus pensamentos e decises de planeamento com base nos sistemas de valo-res, representados pelas suas teorias implcitas, crenas e concepes pessoais (JANURIO, 1996; CARREIRO DA COSTA, 1996; HENRIQUE, 2004).

    caraterstica do perfil 1 uma maior frequncia de diagnstico em relao aos restantes estagirios. Possuin-do experincia profissional anterior, diagnosticam mais facilmente os traos mais comuns dos alunos, referen-ciando os aspetos fsicos, motores, afetivos, sociais e cog-nitivos relativos ao desenvolvimento e aprendizagem.

    Esta capacidade diagnstica confere-lhes um me-lhor conhecimento dos alunos, possibilitando uma es-truturao de situaes de ensino e de aprendizagem mais adequadas s necessidades e capacidades dos alu-nos (JANURIO, 1996).

    O estagirio 4 apresenta frequncia significativa nas categorias Comportamento e Genrico, estes de natureza mais simplista, referindo-se a aspectos relacionados com a participao, o comportamento da turma e dos alunos. Possui mais diagnsticos referentes s caratersticas dos alunos, pois realiza pelo segundo semestre consecutivo o Estgio na mesma escola.

    O Estagirio 1 apresenta frequncia elevada nas catego-rias Especfico e Acadmico, dado que realiza o estgio numa

  • 29

    construo da identidade profissional em educao fsica

    escola de Educao Especial, exigindo um conhecimento mais especfico relativo aos alunos com Necessidades Educativas Especiais, onde estes no apresentam compor-tamentos de natureza disciplinar, mas relativos s suas limitaes de aprendizagem (cognitivas, afetivas, sociais e motoras).

    Pertencem ambos ao Perfil 1, no sendo diferencia-dores do ensino. Em contrapartida, a literatura refere que os docentes com experincia profissional so mais dife-renciadores do ensino (JANURIO, 1996; HENRIQUE, 2004). Porm, mesmo possuindo experincia anterior no ensino e maturidade pessoal, estes esto em processo de formao inicial.

    possvel que o tempo de docncia e o habitus com estes alunos em seus respectivos ncleos de estgio te-nham influenciado sobre uma atitude de Diferenciao do Ensino. Evidenciam carncia de rotinas de gesto, fator que compromete o processamento cognitivo de outras estra-tgias e assimilao de novos aprendizados necessrios ao amadurecimento profissional (HENRIQUE, 2004).

    Em sntese, estes estagirios recorrem com frequn-cia sua memria profissional para a tomada de decises pr-interativas, apresentam um perfil diagnosticador, que se justifica pelas experincias e maturidade pessoal, pro-veniente de suas trajetrias profissionais antes do ingres-so no curso de Educao Fsica. Esta experincia torna se pilar de concees pedaggicas e crenas pessoais, passando a ser parte de suas rotinas de pensamento durante o plane-amento do ensino.

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    30

    Tabela 2 - Perfil 2: Pensamentos e Decises Didticas.

    Variveis Pr-interativas MdiaPerfil 2MdiaGeral

    Total de Pensamentos Didticos 39.71 42.76

    Pensamento Didtico de Contedo 10.53 11.50

    Pensamento Didtico de Gesto 10.48 11.25

    Pensamento Didtico de Clima 3.82 4.25

    Pensamento Didtico de Instruo 2.86 3.21

    Total de Diagnstico 10.73 11.90

    Diagnstico Especfico 5.04 5.63

    Diagnstico Genrico 5.80 6.56

    Diagnstico Acadmico 3.46 4.23

    Diagnstico Comportamento 7.28 7.90

    Decises Legitimadas pela Experincia 0.71 1.31

    Decises Legitimadas por Preconcees 0.42 0.80

    Decises Alternativas 2.93 3.51

    Preocupaes Prticas com a Atividade 1.75 1.65

    Face aos dados, legitimo pensar que o Perfil 2 tpico de iniciante, com 15 do total de 20 estagirios da amostra, apresentando caratersticas de pensamento e de decises pr-interativas muito prximas da mdia geral, como b-vio, dado que os outros trs perfis tm apenas 5 estagirios.

    A atitude de indiferenciao do ensino caraterizado-ra. Segundo a literatura, a Diferenciao do Ensino, seja de objetivos, de situaes de exerccio ou de estratgias, re-quer experincia e conhecimento que possibilite lidar com as diferenas individuais dos alunos (JANURIO, 1996; HENRIQUE, 2004).

    Apresentam baixa frequncia de Decises Alterna-tivas, indicando menos recurso a alternativas didticas,

  • 31

    construo da identidade profissional em educao fsica

    limitada capacidade para lidar com factores de contin-gncia e menor plasticidade no processo de planeamento (JANURIO, 1996). Consequentemente, h uma reduzida capacidade de interveno pedaggica, o que era de espe-rar, dado que esto em processo de formao.

    Constatou-se, tambm, baixa frequncia de Decises Legitimadas por Preconcees demonstram poucas conce-es educativas prprias sobre o ensino da disciplina ou em relao aos contedos. Por serem estagirios, no possuem quadros pessoais tericos bem legitimados, recorrendo aos conhecimentos proporcionadas pela formao inicial.

    Quanto dimenso Diagnstico de Alunos houve uma frequncia mais baixa nas categorias Acadmica e Espec-fica, relativo s capacidades e necessidades dos alunos re-ferente s aprendizagens em Educao Fsica. A limitao de diagnsticos mais individualizados s necessidades e capacidades dos alunos tm como consequncia menos decises de planeamento relacionadas com a organizao e a gesto do tempo e da atividade.

    Este comportamento estatstico corrobora se com a literatura, os estagirios tendem a uma maior preocupa-o com aspetos de natureza comportamental e de parti-cipao nas atividades, os diagnsticos so mais genera-listas e menos especficos em relao aos alunos e turma (JANURIO, 1996; HENRIQUE, 2004).

    Outra caraterstica importante refere se s Preocupa-es Prticas com a Atividade, evidenciando preocupaes de natureza disciplinar e/ou de participao, a fim de manter os alunos ativos, demonstrando preocupaes de controlo e de gesto da turma.

    Apresentam uma atitude pedaggica de indiferencia-o, dificuldades em antecipar fatores de contingncia

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    32

    baixa frequncia de Decises Alternativas, caraterstico de professores em formao inicial e reduzida capacidade diagnstica dos alunos.

    A capacidade de realizar um planeamento ao nvel das necessidades e capacidades dos alunos concretiza se com o tempo, ou seja, com a prtica da lecionao. O profes-sor adquire uma bagagem de legitimao de suas decises fundamentada no seu repertrio terico e nas suas expe-rincias, que posteriormente passam a ser automatizadas rotinas de pensamento no processo de planeamento e, consequentemente, na interao da aula.

    Em suma, o Perfil 2 o tpico estagirio que compe este estudo, por ser composto por 75% da amostra do es-tudo e pelo fato de suas caratersticas serem corroboradas pela literatura concernentes as caratersticas de professo-res estagirios e iniciantes.

    Tabela 3 - Perfil 3: Pensamentos e Decises Didticas.

    Variveis Pr-interativasMdia

    Estagirio 3

    MdiaEstagirio

    13

    MdiaGeral

    Diferenciao do Ensino 2.67 1.67 1.55

    Total de Pensamentos Didticos 68.33 77.67 42.76

    Pensamento Didtico de Contedo 16.33 28.00 11.50

    Pensamento Didtico de Gesto 17.00 18.67 11.25

    Pensamento Didtico de Clima 7.00 10.33 4.25

    Pensamento Didtico de Estratgia 8.00 5.67 3.33

    Pensamento Didtico de Instruo 6.00 3.67 3.21

    Decises Legitimadas pela Experincia 1.67 0.33 1.31

    Decises Legitimadas por Preconcees 3.33 1.00 0.80

    Decises Alternativas 6.33 10.33 3.51

  • 33

    construo da identidade profissional em educao fsica

    Quanto ao Perfil 3, considerando a natureza das ca-tegorias e o valor das mdias podemos explicitar que os 2 estagirios estruturam quadros didticos de maior com-plexidade pedaggica, com densidade significativa de pen-samentos e de decises pr-interativas e diferenciadores do ensino, de pensamento tpicas de docentes experientes em algumas categorias. Apresenta caratersticas antag-nicas ao Perfil 1, dado que aqui as crenas sobrepem se formao inicial.

    Segundo a literatura, as categorias de pensamento que melhor identificam os professores pensadores e mais experientes so: Pensamentos didticos em quase todas as modalidades, Decises Legitimadas pela Experincia e por Preconcees e Diferenciao do Ensino, demonstrando melhor gesto e controlo da atividade (JANURIO, 1996; HENRIQUE, 2004).

    Independentemente de serem estagirios, revelam perfil diferenciador, com uma atitude diferenciadora do en-sino. Como mencionado anteriormente, no caratersti-co de estagirios ser diferenciadores. Entretanto, devemos relembrar que estas caratersticas e as seguintes, devem se formao inicial e s capacidades de ambos.

    A complexidade de pensamentos e decises pr--interativas so expressas na qualidade de diferenciao das opes didticas e no diagnstico, que so caracters-ticos de professores com alguma maturidade profissional (SANCHES; JACINTO, 2004).

    Apresenta frequncia alta de Decises Alternativas, caraterstica diferenciadora em relao aos demais estagi-rios do estudo, prevem fatores de contingncia, se mu-nindo de conjecturas estratgicas para controle e gesto da ati-vidade. A previso de alternativas aumenta potencialmente a

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    34

    capacidade de ao do professor e, dessa forma, seria de prever um contributo para a eficcia pedaggica (JANURIO, 1996; HENRIQUE, 2004).

    Outra caracterstica relevante refere-se frequncia das categorias Decises Legitimadas por Preconcepes e pela Experincia o estagirio 3 (respetivamente, 3,33 e 1,67) apresentou maior frequncia em relao ao estagirio 13 (1,00 e 0,33). Este comportamento estatstico justifica-se pela trajetria do estagirio 3: durante a formao inicial apresentou excelente desempenho acadmico, edificando um quadro terico consistente e, consequentemente, uma capacidade de planeamento complexa e diferenciadora, quando comparado com os demais estagirios do estudo. O estagirio 13 tem mais de 35 anos e grande experincia pessoal (mas no de ensino). Apresenta frequncias sig-nificativas de Decises Alternativas, Pensamentos Didcti-cos de Contedo, de Gesto e de Clima, um perfil focado no controlo e gesto da atividade, demonstrando possuir um vasto repertrio de proposies didticas para lidar com a imprevisibilidade. Esta caraterstica justifica se pela matu-ridade pessoal e apurado senso de responsabilidade para com a formao dos alunos.

    A inteno no discernir as caratersticas de pensa-mento destes estagirios, mas explicitar o fato de que um referencial terico bem fundamentado na formao ini-cial e um projeto de Estgio Curricular prximo do reque-rido no mundo da profisso, pode sobrepor se s crenas pessoas implcitas dos professores que se apegam s suas experincias pessoais de vida.

    A frequncia de Pensamentos Didticos est associado s experincias pessoais, condicionantes na estruturao de quadros tericos prprios, a uma atitude de diferenciao

  • 35

    construo da identidade profissional em educao fsica

    do ensino e maior plasticidade na ao pedaggica. Estas caratersticas so indicadores de coerncia de quantidade e qualidade dos pensamentos didticos prvios (JANURIO, 1996; HENRIQUE, 2004).

    Em sntese, o Perfil 3 revelou caratersticas de pensa-mento e decises de planeamento que tangenciam as de professores experientes. Apresentam maior quantidade de pensamentos didticos prvios, proporcionando me-lhores condies de ensino. No planeamento demonstram atitude de diferenciao, originria das experincias aca-dmicas e pessoais, atribuindo construtos que favorecem um clima de aula positivo aprendizagem, alm de pos-surem alternativas para melhor gesto e organizao do tempo de aula.

    Por fim, temos o Perfil 4, o qual no tem interesse te-rico de monta, pelo que no o analisaremos.

    Anlise dos resultados dados de 2008

    Esta anlise ainda no est completa, pelo que ape-nas temos alguns dados comparativos que agora propor-cionamos.

    A maior diferena entre os estagirios de 2004 e os professores de 2008 nos sistemas de anlise utilizados reside no Sistema de Anlise de Preocupaes Prticas, construdo a partir do quadro terico de Fuller. Esta teo-ria deu asas s primeiras teorias do DP, seja no campo da administrao, da gesto ou da educao.

    Os dados encaixam perfeitamente na teoria de Fuller, na medida em que justificam os primeiros estgios do desen-volvimento profissional dos professores. Com efeito, houve

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    36

    um aumento das Preocupaes Prticas de Impacto e baixa das Preocupaes Prticas sobre o Prprio no segundo momento.

    Sobre o modo e o grau de apropriao das rotinas de ensino e de planeamento, existem rotinas gerais e expec-ficas do perfil de cada professor e no existe uma direo nica do caminho de apropriao dessas rotinas; a maior parte dos professores comeam por rotinizar as decises de organizao, seja de gesto ou da instruo. Neste caso, um exemplo mais fcil de observar respeita estrutura e organizao da aula, constituda pelas trs fases tradicio-nais (atividade de aquecimento, atividade principal, re-torno a calma), certamente oriunda da formao inicial e transmitida e vivenciada nas disciplinas de ndole prtica.

    Mesmo no estando completada esta anlise, faltan-do alguns outros dados e refelxes, h algumas considera-es finais que queramos deixar, em jeito de concluso, as quais so apresentadas no prximo captulo.

    Consideraes finais

    Os pensamentos e decises preinterativas norteiam a conduta do professor nas suas aes habituais na aula, alm de atribuir significados aos contedos e s conjunturas do ensino. Com efeito, a maioria das decises tomadas duran-te a fase interativa de ensino so reflexo da tomada de de-cises prvias na fase de planeamento (JANURIO, 1996).

    Estudar o pensamento e decises de planeamento dos estagirios possibilita melhor compreender o proces-so de ensino e de aprendizagem, a fronteira entre o modo de pensar e o modo de agir o que ensinar / como ensinar, revelando para os prprios atores do processo as mlti-plas facetas da ao educativa.

  • 37

    construo da identidade profissional em educao fsica

    A disponibilidade dos professores para expressar os seus prprios pensamentos e falar sobre as suas concees e crenas mais profundas, e a idia de que esses pensamentos sobrevivem imutveis ao longo do tempo, so questes que atingem a validade temporal dos estudos, assumindo certo presentismo das concees e das perspetivas dos professo-res, ou seja, os processos de pensamento sofrem alteraes com o evoluir da pessoa e com a influncia do contexto ins-titucional e social (SANCHES; JACINTO, 2004).

    Nesta perspectiva, esta rea de investigao apresen-ta uma carncia e necessidade de estudos longitudinais que investiguem a evoluo dos processos de pensamento dos professores, com a finalidade de compreender como so au-tomatizadas as suas rotinas de ensino durante a trajetria profissional, especialmente no perodo inicial da profisso. A compreenso desta evoluo profissional dos professores de extrema importncia quando se considera processos de reforma curricular dos Sistemas Educativos, para alm das mais valias para a formao inicial de professores.

    Compreender o que os professores fazem importan-te e significativo, mas tambm o as formas como eles justificam, explicam e procuram sentido naquilo que fa-zem (SANCHES; JACINTO, 2004).

    No que respeita aos resultados da investigao longitu-dinal, parace haver algum desencanto, dado que espervamos maiores diferenas nos professores investigados entre os da-dos de 2004 e os de 2008. No que os professores no te-nham rotinizado certos procedimentos e mecanismos. Mas numa anlise qualitativa do desempenho h certas zonas onde nos parece haver maior segurana e economia na con-duta dos professores, sem que haja uma melhor qualidade do desempenho em vrias das dimenses da funo docente.

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    38

    Por ltimo e finalizando este artigo escrito, deixamos aqui algumas interrogaes decorrentes dos dados reco-lhidos da fase experimental do estudo que ilustrou a nossa comunicao, as quais so tambm preocupaes nossas:

    Sero as demandas da prtica pouco exigentes? Ou seja, qual o grau de exigncia na prtica profissio-nal do professor de Educao Fsica? Quais os me-canismos de controlo de qualidade, a nvel federal, estadual, municipal e local?

    A excessiva desportivizao da Educao Fsica far com que se confunda recreao com ensino? Mesmo considerando a existncia de desigualda-des de acesso relativo ao direito ao desporto e atividade fsica por parte de algumas franjas da populao, isso faz com que o mbito da discipli-na seja o de proporcionar apenas experincias de prazer e de usufruto da prtica dessas atividades?

    No havendo programas de ensino que especifi-quem objetivos e contedos a atingir, como cada professor pode progredir, se ele faz aquilo que sem-pre fez ou tem feito?

    Estas questes apenas se colocam para os profes-sores analisados e para a regio em que vivem e em que lecionam?

    Referncias

    ANACLETO, F. Do pensar ao planear: anlise das decises pr-interativas de planeamento de professores de Educao F-sica em Estgio Curricular Supervisionado. 2008. 129 f. Tese (Mestrado em Cincias da Educao, especialidade de Superviso

  • 39

    construo da identidade profissional em educao fsica

    Pedaggica) Faculdade de Motricidade Humana, Universida-de Tcnica de Lisboa, Lisboa, 2008.

    ANACLETO, F.; JANURIO, C. Um estudo comparativo lon-gitudinal do perfil decisional pr-interativo de professores de educao fsica: Desafios tericos e metodolgicos. In: SYMPO-SIUM INTERNACIONAL SOBRE EL PRACTICUM Y LAS PRC-TICAS EN EMPRESAS EN LA FORMACIN UNIVERSITARIA: EVALUACIN Y SUPERVISIN DEL PRACTICUM: EL COM-PROMISO CON LA CALIDAD DE LAS PRCTICAS, 11., 2011, Poio. Anais Poio: Imprenta Universitaria, 2011. p. 343-354.

    BERLINER, D. A personal response to those who bash teacher education. Journal of Teacher Education, Washington, v. 51, n. 5, p. 358-371, Nov./Dec. 2000.

    FREIRE, A. M. Concepes orientadoras do processo de aprendizagem do ensino nos estgios pedaggicos. In: COLQUIO: MODELOS E PRTICAS DE FORMAO INI-CIAL DE PROFESSORES, 1., 2001, Lisboa. Anais... Lisboa, 2001. p. 1-25. Disponvel em: http:/www.educ.fc.ul.pt/recen-tes/mpfip/pdfs/afreire.pdf. Acesso em: 12 fev 2009.

    GRAA, A. Breve roteiro da investigao emprica na pedago-gia do desporto: A investigao sobre o ensino da educao f-sica. Revista Portuguesa de Cincias do Desporto, Porto, v. 1, n. 1, p. 104-113, 2001.

    HENRIQUE, J. Processos mediadores do professor e do aluno: uma abordagem quali-quantitativa do pensamento do professor, da interao pedaggica e das percepes pessoais do aluno na disciplina de Educao Fsica. 2004. 586 f. Tese (Doutorado em Cincias da Educao) Faculdade de Motrici-dade Humana, Universidade Tcnica de Lisboa, Lisboa, 2004.

    JANURIO, C. O pensamento do professor: relao entre as decises pr-interactivas e os comportamentos interactivos de

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    40

    ensino em educao fsica. 358 f. Tese (Doutorado em Cincias da Educao) Faculdade de Motricidade Humana, Universida-de Tcnica de Lisboa, Lisboa, 1992.

    JANURIO, C. Do pensamento do professor sala de aula. Coimbra: Livraria Almedina, 1996.

    PEREIRA, P. A planificao dos professores em Educao Fsica: Alguns contributos para o seu estudo. Revista Horizonte, Lis-boa, 16, 92, 14-18, 2000.

    PEREIRA, P. Os processos de pensamento dos professores e alunos em Educao Fsica. 2008. 715 f. Tese (Doutorado em Cincias da Educao) Faculdade de Motricidade Huma-na, Universidade Tcnica de Lisboa, Lisboa, 2008.

    SANCHES, M. F. C.; JACINTO, M. Investigao sobre o pensa-mento dos professores: Multidimensionalidade, contributos e implicaes. Revista da Sociedade Portuguesa de Cincias da Educao, Porto, v. 3, p. 131-233, 2004.

  • 41

    Nova abordagem na formao de

    treinadores: o que mudou e porqu?

    Prof. Dra. Isabel Mesquita1

    Prof. Dr. Robyn Jones2

    Mestre Joana Fonseca2

    Mestre Luciana de Martin Silva2,3

    Introduo

    As pesquisas na rea do treino desporti-vo, relacionadas com a atividade do treinador (Coaching Desportivo), tm vindo a aumentar consideravelmente nos ltimos anos (GILBERT; TRUDEL, 2004a), afirmando a sua legitimida-de como disciplina acadmica (LYLE, 2002). Para tal, tem contribudo o conhecimento desenvolvido em diferentes disciplinas da

    1 Faculdade de Desporto da Universidade do Porto (FADEUP).2 Cardiff Metropolitan University- Cardiff School of Sport (CMU).3 UWE Hartpury, Gloucester, UK.

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    42

    rea do desporto, como exemplo a Psicologia (ALLEN; HOWE, 1998; KENOW; WILLIAMS, 1999), a Sociologia (CUSHION; JONES, 2006; JONES, 2000; JONES et al., 2002; 2003; 2004; POTRAC; JONES; CUSHION, 2007), a Filosofia (CASSIDY; JONES; POTRAC, 2009), Apren-dizagem Motora (SMOLL; SMITH, 1993) e a Pedagogia (ABRAHAM; COLLINS, 1998; CASSIDY; JONES; POTRAC, 2004; CUSHION et al., 2006), decorrendo dai uma curio-sidade crescente na investigao deste tema. Porm, ainda que a produo cientfica nesta rea tenha vindo a aumen-tar, a abordagem prevalecente de carcter racionalista (JONES, 2000), no atendendo natureza complexa do treino e concomitantemente da atividade do treinador.

    semelhana da investigao na rea do Coaching Desportivo, a formao de treinadores, que influenciada por esta, tem vindo a recorrer-se de paradigmas positivis-tas, os quais desesperadamente procuram sistematizar e sequenciar mtodos e procedimentos de ao. Esta pers-petiva, ao apresentar um cariz linear comporta uma viso fragmentada e irreal na anlise da atividade do treinador, acabando por aumentar o fulcro entre a teoria e a prtica. Ora, sendo o treino um contexto multidisciplinar e par-ticularmente dependente e influencivel, nunca poder ser estudado de forma isolada e compartimentada visan-do desenvolver planos de ao passiveis de generalizao a serem utilizados, independentemente da especificidade situacional. Recentemente, a investigao tem vindo a demonstrar a necessidade de recorrer a paradigmas cons-trutivistas, os quais assumem a complexidade do processo de treino e procuram alcanar o conhecimento, reconhe-cendo a natureza complexa dos fenmenos em estudo, no sentido de intentar o desenvolvimento de indivduos

  • 43

    construo da identidade profissional em educao fsica

    autnomos e reflexivos, capazes de adaptar realidade o conhecimento adquirido (MESQUITA et al., 2010).

    No presente artigo, d-se conta do contraste entre a abordagem tradicional (positivista), e a abordagem mais recente (construtivista), no estudo do Coaching Desporti-vo, servindo de ponto de partida para justificar a neces-sidade premente da valorizao do desenvolvimento da identidade profissional do treinador Desportivo, no con-texto da formao acadmica. Conclui-se, com um exem-plo prtico de um projeto de investigao em desenvolvi-mento, resultado de uma cooperao entre Portugal e Rei-no Unido, o qual procura compreender de que forma os estudantes de licenciatura em Treino Desportivo, apren-dem e desenvolvem a sua identidade profissional enquan-to futuros treinadores durante a sua formao acadmica. Em Portugal, o projeto est a ser desenvolvido na Faculda-de de Desporto da Universidade do Porto (FADEUP) e no Reino Unido na Cardiff Metropolitan University (CMU).

    Formao de treinadores: da abordagem positivista

    abordagem construtivista

    Como anteriormente apontado, o Coaching Desporti-vo relaciona-se com toda a atividade do treinador. Jones et al. (2002, 2003) apresentam diferentes definies ou consideraes sobre o que o Coaching desportivo, resul-tantes de excertos de entrevistas a treinadores de elite as quais salientam a sua natureza essencialmente social e pedaggica: Coaching refere-se gesto do homem (pessoa) tem a ver com a gesto do indivduo dentro

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    44

    do coletivo; Coaching consiste em reconhecer situaes, tomar decises e agir... lidar com pessoas fundamental; Coaching tem a ver com aspetos sociais saber o quanto se pode exigir aos jogadores (re)conhec-los como pes-soas; Coaching respeitar os atletas... influenci-los faz-los querer trabalhar arduamente.

    Apenas recentemente, esta rea foi reconhecida no mbito das Cincias do Desporto (JONES, 2007; MES-QUITA, 2010), em oposio as demais reas disciplinares tradicionalmente consideradas (Fisiologia, Psicologia, Biomecnica, Sociologia, etc.). Porm, e apesar de um co-meo tardio, esta uma rea em crescimento exponencial no mbito acadmico, a avaliar pela variedade de cursos que as universidades tm vindo a oferecer, tanto ao nvel da graduao como da ps-graduao, particularmente nos pases anglo-saxnicos. A ttulo exemplificativo, um estudo recente realizado por Bush (2008) evidencia que as Universidades Britnicas em 2009 ofereciam 217 cur-sos de graduao especfica em Coaching Desportivo, num espetro de 765 cursos de graduao existentes no mbito das Cincias do Desporto, sendo que 11 em 54 cursos de ps-graduao na rea das Cincias do Desporto eram es-pecializados na rea do treino.

    Em Portugal, a formao de treinadores apresen-ta uma realidade consideravelmente distinta de pases como o Reino Unido e a Austrlia, os quais revelam um estrutura de suporte bem desenvolvida, fundamentada e documentada (MESQUITA et al., 2010). Com apenas al-gumas instituies de ensino superior (com um nmero no superior a cinco) a serem capazes de oferecer cabal-mente cursos de graduao e ps-graduao em Treino Desportivo, a formao de treinadores em Portugal tem

  • 45

    construo da identidade profissional em educao fsica

    estado ao cargo de instituies desportivas e organismos federativos. At a um passado recente, mais precisamente 2010, em Portugal, cada federao desportiva decidia qual o quadro conceptual e organizacional que o seu curso de treinadores deveria seguir, o que resultava numa vasta va-riedade de abordagens. Para alm disso, trs ou quatro n-veis de formao eram considerados, sem serem definidas claramente fronteiras ao nvel dos objetivos, contedos e contextos de prtica (MESQUITA et al., 2009). Paralela-mente, as instituies do ensino superior curricularmente mapeadas para certificar os estudantes de licenciatura e ps-graduao em Treino Desportivo no tinham reco-nhecimento formal enquanto agncia de formao de trei-nadores (MESQUITA, 2010). Esta situao tem pautado a formao de treinadores em Portugal pela ausncia de estabilidade, de caracter assistemtico e no obrigatria.

    Para alm disso, a sua matriz conceptual tem-se base-ado numa perspetiva tradicionalista, onde impera a linea-ridade e a fragmentao, no suportada pelo conhecimen-to cientfico, o que concomitantemente, dificulta a apren-dizagem e a otimizao do desenvolvimento do treinador ao longo da sua carreira. Recentemente, mais precisamen-te em 2010, assistiu-se em Portugal a uma mudana de paradigma na formao de treinadores, atravs de uma reestruturao baseada no modelo europeu promovido pela AEHESIS (2006), atendendo todavia singularidade da realidade portuguesa. Como resultado deste processo, o modelo de formao de treinadores atual em Portugal comporta quatro nveis de formao. Os trs primeiros orientados para o que demais identitrio tem a profisso, isto , a orientao de praticantes no contexto do treino e da competio, num acrescentar de exigncias desde

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    46

    a formao at ao alto rendimento. O quarto nvel, est orientado para uma formao superior ao nvel da gesto, coordenao, desenvolvimento e implementao de pro-gramas desportivos exigindo-se, por isso, que o treinador possua uma viso ecltica, fundada em pressupostos te-ricos consistentes, os quais lhe permitem ter uma atitude crtica face ao desporto e ao seu papel na sociedade. Neste novo modelo, o estgio tutorado obrigatrio em todos os nveis de formao, sendo que os treinadores tero de o realizar num contexto real de treino/competio no de-curso de toda uma poca desportiva. Mais se acrescenta como uma das principais mais-valias deste modelo, a con-siderao da formao no ensino superior enquanto via formal de formao de treinadores, desde que a mesma comporte a matriz curricular implcita ao estipulado ao nvel governamental para o sistema desportivo. Este re-conhecimento da formao acadmica , indubitavelmen-te, um passo fundamental na qualificao da formao de treinadores porquanto o acervo cientfico, epistemolgico e instrumental, apangio do ensino superior, constitui em si mesmo, garantia do incremento da qualidade profissio-nal do treinador de desporto.

    Formao de treinadores no contexto acadmico: a

    valorizao da construo da identidade profissional

    Atualmente a investigao na rea do Coaching Des-portivo tem assistido a uma reconfigurao do seu foco de orientao. Mais do que se perceber o qu e o como treinar, procura-se descobrir quem o treinador. (e.g.

  • 47

    construo da identidade profissional em educao fsica

    JONES, 2009; 2006). Nesta linha de pensamento, o olhar no se restringe apenas anlise do que o treinador diz aos atletas, nem tampouco forma como o faz, mas sim quem o diz. No por acaso que Jos Mourinho, intitula-do com um dos melhores treinadores de sempre (Special One) afirma que O mesmo exerccio aplicado em cam-po, por dois treinadores diferentes, no o mesmo exer-ccio, e as mesmas palavras, no so as mesmas palavras (citado por CASTLES, 2010, p. 10). O mesmo treinador, assegura ainda que Qualquer um pode usar os meus exer-ccios, qualquer pessoa pode usar as minhas palavras, mas ningum ter os meus resultados (citado por CASTLES, 2010, p. 10). Deste modo, Jos Mourinho renega para se-gundo plano os mtodos e as estratgias utilizadas, atri-buindo maior importncia ao eu que mora em cada trei-nador, como elemento crucial para o alcance do sucesso.

    Este entendimento privilegia, inquestionavelmente, a esfera social, onde se situa a atividade do treinador, pau-tada numa interveno inspirada em noes como as de respeito, confiana e lealdade, conducente ao desenvolvi-mento de sentimentos de filiao e comprometimento.

    Num discurso sobre Pedagogia geral, Agne (1998, p. 166) explica-nos que as crianas aprendem, absorven-do aquilo que so para elas e no, memorizando aquilo que lhes dizem. Ora, transportando esta afirmao para o contexto de treino, acreditamos que a importncia do treinador como pessoa inegvel, pois ele exerce uma influncia direta nas pessoas sobre as quais lhe foi dada responsabilidade, o que a longo prazo poder equivaler a milhares (Agne,1998). Por isso, concordamos com Hard-man et al. (2010) quando afirma: O treinador nunca po-der separar o seu carter enquanto pessoa daquele que

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    48

    utilizado no desempenho do seu papel profissional (HARDMAN et al., 2010, p. 351).

    Apesar de um reconhecimento profundo sobre a im-portncia de descobrir quem o treinador, necessrio que esta rea cientfica encontre o seu espao nos programas de formao de treinadores de modo a que tal se expresse numa prtica de sucesso. De facto, esta negligncia parece um pouco contraditria, uma vez que, o treino est, obvia-mente, dependente de quem nele participa e o lidera sen-do, por isso, um ato promulgado e aprovado por algum. Consequentemente, importa, e muito, saber quem esse algum, emergindo questes que procurem desvendar que tipo de pessoa dever ser o treinador e de que forma a for-mao poder desenvolver essas qualidades e competncias pessoais e sociais. claro que para tal, no poderemos des-curar sobre o que implica o alcance de uma prtica de su-cesso. Apesar de existirem linhas normativas que indicam o caminho a seguir, para atingir uma boa prtica (como por exemplo na rea do ensino), o treino tambm ele dever en-contrar princpios de compreenso e atuao concretos que considerem a sua natureza complexa e dinmica.

    Como qualquer treinador poder comprovar, nem sempre, os momentos de aprendizagem so momentos fceis e claros. No entanto, no apenas porque o mato parece um pouco grosso, que devemos evitar o terreno! no esforo em tentar desbravar novos terrenos que emerge claramente uma sociologia e pedagogia do treino, as quais fornecem conhecimento e informao, capaz de contribuir para uma compreenso mais completa e profunda do Co-aching (JONES et al., 2011). Nesta perspetiva, o Coaching decorre sobretudo de um esforo relacional implicando, por isso, a responsabilidade sobre a aprendizagem dos atletas,

  • 49

    construo da identidade profissional em educao fsica

    o que inevitavelmente, atribui especial importncia ao contexto (imbudo de subjetividade). Assim sendo, a no-o do eu ou identidade pessoal do treinador ter de ser percecionada e percebida com base nesta panplia de fa-tores, numa perspetiva de compreenso fundada teorica-mente evitando-se, assim, o recurso a interpretaes hi-per-romnticas da ao do treinador, imbudas de uma perceo popular deste enquanto heri que consegue tudo contra todas as probabilidades.

    Embora as identidades governamentais afetas ao Desporto evidenciem ainda alguma relutncia em se en-volver nesta tarefa, as instituies de ensino superior e universidades, especializadas em pesquisa e interpretao de questes complexas, esto a comear a aceitar o desa-fio. Esta uma agenda de investigao exploratria que se baseia em Jones e Wallace (2005, 2006), alertando para a necessidade do desenvolvimento de projetos que evitem a abordagem prescritiva e unidirecional e se baseiem numa abordagem compreensiva, capaz de atender ao contexto complexo e dinmico do Coaching.

    O projeto de investigao que se apresenta em segui-da, poder ser considerado como uma resposta necessida-de de se melhor conhecer a pessoa que mora no treinador, atravs do estudo do desenvolvimento da sua identidade durante a sua formao. Ser colocada especial ateno so-bre as prticas, as pessoas, os lugares, os regimes de com-petncia, as comunidades e os limites, os quais servem de base constitutiva da formao da identidade, tornando-se parte de quem somos (WENGER, 2010). Tal perspetiva, situa o treino dentro de uma realidade construtiva e idios-sincrtica, distanciando-o da procura irreal de um perfil de treinador adequado a todas as realidades.

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    50

    Projeto de investigao: estudo longitudinal sobre a

    aprendizagem e formao da identidade profissional de

    estudantes de licenciatura em treino desportivo

    O desenvolvimento da rea da formao de treina-dores hoje, mais que nunca, uma necessidade emergen-te para o desenvolvimento do desporto em geral e, em particular, o alto rendimento. Para tal, contribui indubi-tavelmente a promoo de projetos de investigao que integrem a anlise das prticas profissionais, capazes de fornecer um retracto fiel do panorama real e permitam, assim, uma avaliao fidedigna dos fenmenos em estudo.

    Em Portugal, a introduo da nova abordagem de for-mao de treinadores antes exposta (i.e., construtivista), recente, e como tal, necessita de um controlo proximal ca-paz de possibilitar, por um lado, uma atuao rpida sobre possveis enviesamentos, e por outro, o desenvolvimento de novas estratgias de ensino que sirvam eficazmente a prtica. O mesmo ser afirmar que no bastam as pesqui-sas realizadas no final de curso por examinadores exter-nos que avaliam de, certa maneira, a qualidade dos cursos oferecidos. Em boa verdade, por esta via poucos dados so fornecidos sobre a forma como os estudantes so influen-ciados pela formao a que so sujeitos, ou seja, qual o impacto que os cursos de formao em treino desportivo exercem no processo dinmico e social da construo da sua identidade profissional (WENGER, 2010).

    Embora se saiba que os estudantes aumentam o co-nhecimento atravs da sua formao acadmica, pouca informao disponvel existe acerca da forma como se desenvolve este processo, incluindo o como, o onde e o

  • 51

    construo da identidade profissional em educao fsica

    porqu de eles aprenderem determinado contedo. Da mesma forma, o conhecimento da mudana ao longo do tempo das suas percees e identidades (isto , identificar aspetos relacionados com o como e o porqu dessas percees, bem como das suas alteraes como consequ-ncia do seu envolvimento em cursos de formao supe-riores correlatos com o Treino Desportivo), no foram ainda estudadas.

    Assim sendo, partindo desta lacuna no mbito da for-mao de treinadores, a Universidade do Porto, Faculdade de Desporto (Portugal) tem vindo a desenvolver um proje-to de investigao em parceria com a Cardiff Metropolitan University (Reino Unido). O principal objetivo desse projeto mapear o desenvolvimento pessoal e social e a aprendiza-gem de estudantes de licenciatura em Treino Desportivo. Concomitantemente, importa examinar as experincias e percees de aprendizagem dos estudantes, e perceber de que forma essas experincias influenciam a formao da sua identidade profissional durante os trs anos de forma-o acadmica (licenciatura). Neste alcance, o seu contribu-to inquestionvel, porquanto no s analisada a qualida-de pedaggica (ENTWISTLE, 2000), a qual no se limita ao contedo ensinado estendendo-se ao como e ao porque desses mesmos contedos, como tambm a anlise da in-fluncia destes processos na formao da identidade.

    Paralelamente, este projeto permitir discusses fun-damentais sobre os objetivos da formao de treinadores, os contedos fundamentais a ensinar, assim como funda-mentar conhecimentos e crenas dos estudantes em rela-o complexidade social envolta. Tal decorre do entendi-mento de que apenas atravs de uma avaliao desta natu-reza, a investigao poder contribuir para a melhoria na

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    52

    qualidade das aprendizagens (ENTWISTLE, 1995). Como advoga Wenger (2010), o conhecimento no apenas um produto da formao acadmica formal nem reflexo de um currculo acadmico imposto mas tambm e, fundamen-talmente, um conjunto de vivncias experienciadas na primeira pessoa, as quais sinalizam oportunidades e limi-tes reais da aprendizagem perscrutando o estabelecimen-to de uma melhor articulao entre a formao e a prtica.

    Este projeto constitui assim uma resposta cabal, chamada de ateno de McEwens (1996) para a neces-sidade de se realizar pesquisas longitudinais sobre o de-senvolvimento da identidade de estudantes, em relao a si mesmo e profisso a desempenhar no futuro, bem como ao examinar profundo e detalhado do desenvolvi-mento deste processo ao longo do tempo. Esta abordagem relaciona-se assim com a necessidade de orientar o foco de ateno para as pessoas, as comunidades e as prticas, os quais se constituem elementos catalisadores da formao da identidade profissional (WENGER, 2010). Deste modo, inequvoco que s possvel aceder compreenso do complexo processo de desenvolvimento da identidade do estudante atravs de estudos de natureza qualitativa e, preferencialmente, atravs de desenhos longitudinais (JONES; MCEWEN, 2000).

    Do ponto de vista conceptual, este projeto atende ain-da necessidade apresentada por Jones (2009) de conferir maior enfse e importncia pessoa que mora no interior de cada treinador (who is coaching), porquanto s assim possvel reavivar o elemento humano numa das mais huma-nas das profisses (CONNELL, 1985). Neste alcance, esta perspetiva coloca o treino num domnio peculiarmente cons-trutivista e numa epistemologia interpretativista vincada, a

  • 53

    construo da identidade profissional em educao fsica

    qual delega um investimento particular no desenvolvimen-to do self no desempenho do papel (self-in-role) (JONES et al., 2004; JONES, 2009). Esta rea, a qual atenta natu-reza idiossincrtica do Treino Desportivo tem sido negli-genciada, apesar do reconhecimento de que o treinador muito mais do que um seguidor de mtodos sistematiza-dos ou um expert do contedo (JONES; TURNER, 2006). Consequentemente, compreender como os estudantes de licenciatura em Treino Desportivo percebem as suas ex-perincias constitui um contributo essencial para o incre-mento da sua qualidade profissional.

    Com vista a alcanar tais objetivos, este projeto, como j referido anteriormente, ir recorrer a uma metodologia de natureza qualitativa, utilizando especificamente trs mtodos complementares de recolha de dados: Blogs indi-viduais de reflexo, dirios em vdeo e discusses em gru-po (focus group). Cada participante ter assim de escre-ver um blog reflexivo, com a tnica colocada no tanto na descrio de eventos, mas sim na reflexo pessoal sobre experincias vivenciadas ao longo dos trs anos de forma-o. Simultaneamente, cada participante far um dirio em vdeo, no sentido de lhe tornar possvel a representa-o da sua prpria vida de uma forma mais explcita pela sua externalizao, atravs da narrativa da histria na primeira pessoa. As entrevistas semi-estruturadas (Focus Group) sero aplicadas quatro vezes ao longo do ano esco-lar, sendo o objetivo principal destes encontros a discus-so e partilha no expr das percees individuais que cada um dos estudantes possui, bem como na identificao e exame minucioso de como compreendem e percecionam o processo de desenvolvimento da sua identidade profissio-nal e pessoal (JONES; MCEWEN, 2000).

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    54

    A estruturao das entrevistas ser flexvel, uma vez que sero continuadamente construdas com base nos re-sultados obtidos nos blogs, dirios em vdeo e focus group anteriores, possibilitando no s a sua anlise profunda, como tambm, a possibilidade dos participantes apresen-tarem e discutirem as perspetivas e significados atribudos aos contedos apresentado nos dados, at ento recolhidos.

    O modus operandi deste estudo consistir em seguir um grupo de 17 estudantes da Universidade do Porto e um grupo de 12 estudantes da Cardiff Metropolitan Uni-versity durante os trs anos da licenciatura em Cincias do Desporto - Vertente Treino Desportivo e Sports Coaching, respetivamente. A seleo dos participantes foi inten-cional (PATTON, 2002), tendo como objetivo selecionar estudantes com um perfil acadmico e pessoal capaz de fornecer garantias de participao neste projeto durante os seus trs anos de formao. Os dados recolhidos sero transcritos e analisados com a maior prontido possvel de forma a informar e enriquecer as fases consequentes da pesquisa, expressando assim as concees de Glaser e Strauss (1967), os quis afirmam que tudo se constitui como dados all is data quando a metodologia utilizada recai sobre os ditames da fundamentao terica sistem-tica (grounded theory).

    Consideraes finais

    A rea do Coaching Desportivo tem sofrido um notvel desenvolvimento nos ltimos anos fruto de um interesse crescente dos investigadores. Tal desiderato tem conduzido a um enfoque crescente na anlise da atividade do treinador,

  • 55

    construo da identidade profissional em educao fsica

    sem deixar de atender sua natureza complexa e dinmi-ca, a qual exige o recurso a paradigmas construtivistas em oposio aos de caracter behavioristas, tradicionalmente utilizados.

    Nesta senda, e de forma cada vez mais consistente, o estudo da pessoa que o treinador emerge na agenda da investigao do Coaching Desportivo, intentando-se perceber quais as suas qualidades, competncias, fragili-dades, dilemas, etc., no sentido de melhor informar a for-mao de treinadores. Tal baseia-se no entendimento de que os resultados do processo de treino no so, de forma alguma, independentes da pessoa que o lidera.

    Esta perspetiva ainda no encontra, de forma algu-ma, eco nos currculos da formao de treinadores em sede de sistema desportivo, encontrando-se todavia em fase embrionrio de desenvolvimento ao nvel acadmico, principalmente em pases como o Reino Unido, Nova Ze-lndia e Portugal. O seu estudo, assume redobrada impor-tncia ao nvel acadmico se considerarmos o fato dos es-tudantes terem de realizar trs anos de formao ao longo da sua licenciatura e dois ao nvel do mestrado em Treino Desportivo, permitindo o mapeamento dos processos de construo e desenvolvimento da sua identidade profis-sional bem como da aprendizagem. Esta abordagem ir permitir, ainda, aceder complexidade da aprendizagem e estabelecer a relao desta com a prtica, reconhecer a reflexo sobre e o valor e o desafio da experincia pes-soal, permitir uma robusta teorizao sobre os problemas emergentes da prtica e construir e desenvolver processos a partir dos quais o conhecimento implcito (usualmente negligenciado) pode ser formalmente desenvolvido.

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    56

    Desvendar e desafiar o que complexo e im-plcito constitui de fato o principal propsito des-te tipo de investigao pois s desta forma possvel conferir robustez conceptual formao de treinadores alocando um discurso terico s prticas profissionais. Concomitantemente, a intensificao do investimento na formao de treinadores na Universidade constitui um potencial nico para influenciar no futuro os paradigmas e modelos de formao de treinadores, carentes de acervo epistemolgico e cientfico. Por ltimo, e no menos importante, permitir a construo de primados pedaggicos e cientficos que considerem a natureza complexa do Coaching desportivo de forma a ir contra a retrica, a doutronizao e o anti-intelectualismo, forte-mente enraizados no mundo do Treino Desportivo.

    Referncias

    ABRAHAM, A.; COLLINS, D. Examining and extending research in coach development. Quest, Champaign, v. 50, p. 59-79, 1988.

    AEHESIS. Final report of the coaching group: aligning a Eu-ropean Higher Education Structure in Sport Science. Cologne: Institute of Sport Development & Leisures Studies, Germaine Sport University Cologne, 2006.

    AGNE, K. J. Caring: the way of the master teacher. In: LIPKA, R.; BRINTHAUPT, T. (Eds.) The role of self in teacher deve-lopment. Albany: State University of New York, 1998.

    ALLEN, J. B.; HOWE, B. L. Player ability, coach feedback, and fe-male adolescent athletes perceived competence and satisfaction.

  • 57

    construo da identidade profissional em educao fsica

    Journal of Sport and Exercise Psychology, Champaign, v. 20, p. 280-299, 1998.

    BUSH, A. Doing coaching justice: promoting a critical cons-ciousness in sports coaching research. 2008. 159 f. Tese (Dou-torado em Educao) Department of Education, University of Bath, Bath, 2008.

    CASSIDY, T.; JONES, R. L.; POTRAC, P. Understanding sports coaching: the social, cultural and pedagogical founda-tions of coaching practice. London: Routledge, 2004.

    CASSIDY, T., JONES, R. L. & POTRAC, P. Understanding sports coaching: the social, cultural and pedagogical founda-tions of coaching practice. 2. ed. London: Routledge, 2009.

    CASTLES, D. Jos ([01.08]2010):: His new life as a Hollywood director. Sunday Times. London, Section 2, p.10.

    CONNELL, R. Teachers work. London: Allen & Unwin, 1985.

    CUSHION, C. J.; JONES, R. L. Power, discourse and symbolic violence in professional youth soccer: The case of Albion F.C. Sociology of Sport Journal, Champaign, v. 23, n. 2, p. 142-161, 2006.

    CUSHION, C. J.; ARMOUR, K. M.; JONES, R. L. Locating the coaching process in practice: Implications for coach education. Physical Education and Sport Pedagogy, Abingdon, v. 11, n. 1, p. 83-99, 2006.

    ENTWISTLE, N. Promoting deep learning through teaching and assessment: Conceptual frameworks and educational contexts. In: TLRP CONFERENCE, 1., 2000, Leicester. Proceedings Leicester: TLRP, Nov. 2000. p. 1-12.

    ENTWISTLE, N. The use of research on student learning in quality assessment. In: GIBBS, G. (Eds.) Improving student

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    58

    learning: through assessment and evaluation. Oxford: Oxford Centre for Staff Development, 1995. p. 140-149.

    GILBERT, W.; TRUDEL, P. Analysis of coaching science research published from 19702001. Research Quarterly for Exerci-se and Sport, Reston, v. 75, n. 4, p. 38899, 2004.

    GLASER, B.; STRAUSS, A. The discovery of grounded the-ory: strategies for qualitative research. Chicago: Aldine Pu-blishing Company, 1967.

    HARDMAN, A.; JONES, C.; JONES, R. L. Sports coaching, vir-tue ethics and emulation. Physical Education & Sport Peda-gogy, Abingdon, v. 15, n. 4, p. 345-359, 2010.

    JONES, R. L.; TURNER, P. Teaching coaches to coach holisti-cally: the case for a problem-based learning (PBL) approach. Physical Education and Sport Pedagogy, Abingdon, v. 11, n. 2, p. 181-202, 2006.

    JONES, R. L. Coaching as caring (The smiling gallery): Acces-sing hidden knowledge. Physical Education and Sport Pe-dagogy, Abingdon, v. 14, n. 4, p. 377-390, 2009.

    JONES, R. L. Coaching redefined: an everyday pedagogical en-deavour. Sport, Education and Society, Oxon, v. 12, n. 2, p. 159-174, 2007.

    JONES, R. L. Dilemmas, Maintaining Face, and Paranoia. Qualitative Inquiry, Thousand Oaks, CA, v. 12, n. 5, p. 1012-1021, 2006.

    JONES, R. L. Toward an applied sociology of coaching. In: JO-NES, R. L.; ARMOUR, K. M. (Eds.) The sociology of sport: theory and practice. London: Addison Wesley Longman, 2000. p. 33-43.

  • 59

    construo da identidade profissional em educao fsica

    JONES, R. L.; WALLACE, M. Another bad day at the training ground: Coping with ambiguity in the coaching context. Sport, Education & Society, Oxon, v. 10, n. 1, p. 119-134, 2005.

    JONES, R. L.; ARMOUR, K. M.; POTRAC, P. Constructing ex-pert knowledge: a case study of a top-level professional soccer coach. Sport, Education and Society, Oxon, v. 8, n. 2, p. 213-229, 2003.

    JONES, R. L.; ARMOUR, K. M.; POTRAC, P. Sports coaching cultures. London: Routledge, 2004.

    JONES, R. L.; ARMOUR, K. M.; POTRAC, P. Understanding coaching practice: A suggested framework for social analysis. Quest, Champaign, v. 54, n. 1, p. 34-48, 2002.

    JONES, S. R.; MCEWEN, M. K. A conceptual model of multiple dimensions of identity. Journal of College Student Develo-pment, Alexandria, v. 41, n. 4, p. 405-414, 2000.

    KENOW, L.; WILLIAMS, J. M. Coach-athlete compatibility and athletes perception of coaching behaviors. Journal of Sport Behavior, Mobile, AL, v. 22, n. 2, p. 251-259, 1999.

    KERNO JR., S. J. Limitations of communities of practice: A consideration of unresolved issues and difficulties in the appro-ach. Journal of Leadership and Organizational Studies, Thousand Oaks, CA, v. 15, p. 69-78, 2008.

    LYLE, J. Sports coaching concepts: a framework for coaches behaviour. London: Routledge, 2002.

    MCEWEN, M. K. New perspectives on identity development. In: KOMIVES, S. R.; WOODARD, J. D. B. (Eds.) Student ser-vices: a handbook for the profession. 3. ed. San Francisco: Jos-sey-Bass, 1996. p. 188-217.

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    60

    MESQUITA, I. et al. Coachs knowledge needs acording to gen-der and experience. International Journal of Performance Analysis in Sport, Cardiff, v. 9, n. 3, p. 392- 400, 2009.

    MESQUITA, I. Towards a new paradigm in coach education. In: BENTO, J.; TANI, G.; PRISTA, A. (Eds.) Sport and Physical Education in Portuguese. Porto: CIFID, Faculty of Sport, University of Porto, 2010. p.84-99.

    MESQUITA, I.; ISIDRO, I,; ROSADO, A. Portuguese coaches perceptions of and preferences for knowledge sources related to their professional background. Journal of Sports Science and Medicine, Bursa, v. 9, p. 480-489, 2010.

    PATTON, M, Q. Qualitative research and evaluation me-thods. 3. ed. London: Sage, 2002.

    POTRAC, P.; JONES, R. L.; CUSHION, C. J. Understanding po-wer and the coachs role in professional English soccer: A preli-minary investigation of coach behaviour. Soccer in Society, v. 8, n. 1, p. 33-49, 2007.

    SMOLL, F. L.; SMITH, R. E. Educating youth sport coaches: an applied sport psychology perspective. In: WILLIAMS, J. M. (Ed.) Applied sport psychology: personal growth to peak performance. 2. ed. Palo Alto: Mayfield, 1993. p. 36-50.

    WENGER, E. Knowledgeability in landscapes of practice: From curriculum to identity. In: SOCIETY FOR RESEARCH INTO HIGHER EDUCATION ANNUAL RESEARCH CONFERENCE. 1., 2010, Newport in South Wales. Proceedings Newport in South Wales: Society for Research into Higher Education, 2010. p. 124-132.

  • 61

    Construo da identidade

    profissional: metamorfoses na

    carreira docente em Educao Fsica

    Prof. Dr. Gelcemar Oliveira Farias1

    Prof. Dr. Juarez Vieira do Nascimento2

    Introduo

    Ao longo da carreira docente, o profes-sor constri e identifica-se com sua profis-so; cria expectativas e altera crenas cons-titudas no decorrer da interveno profis-sional; manifesta sentimentos de abandono e a permanncia na profisso, delineando di-ferentes trajetrias em momentos distintos da carreira. A carreira docente em Educao

    1 Professora da Universidade do Estado de Santa Catarina.2 Professor da Universidade Federal de Santa Catarina.

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    62

    Fsica compreende, conforme Farias (2010, p. 232), um constructo de aes que so desempenhadas pelos docen-tes enquanto atuantes no contexto de trabalho, o que vem ampliar o conceito de carreira encontrado na litera-tura consultada.

    A preocupao de abordar a construo da identida-de do profissional da Educao Fsica, considerando sua formao e a interveno, se constitui em grande desafio, devido escassez de estudos que reportam esta temtica na realidade brasileira. Todavia, um dos fatores que carac-terizam a identidade do professor est associado com a profissionalizao docente, bem como as relaes que os professores estabelecem com a profisso, tanto no pero-do que compreende a formao inicial ou as experincias profissionais anteriores formao, como durante a inter-veno profissional e na aposentadoria.

    As evidncias encontradas na investigao sobre a carreira docente em Educao Fsica, no magistrio p-blico municipal de Porto Alegre/RS (FARIAS, 2010), des-crevem as relaes mediadas entre a profisso docente e os ciclos de desenvolvimento profissional que os profes-sores experimentam durante a carreira. Nesta investiga-o, foi possvel identificar cinco ciclos de desenvolvimen-to profissional em Educao Fsica: entrada na carreira; consolidao das competncias profissionais na carreira; afirmao e diversificao na carreira; renovao na car-reira; maturidade. Neste sentido, o presente texto busca compreender o processo de profissionalizao docente e as metamorfoses que marcam a carreira docente em Edu-cao Fsica.

  • 63

    construo da identidade profissional em educao fsica

    A profissionalizao na docncia

    A temtica da profissionalizao ganhou destaque em vrios pases, desde a dcada de 1990 (NASCIMENTO, 2002; VALLE, 2003; SOUZA NETO; CESANA; SILVA, 2006). Mais especificamente no Brasil, a discusso sobre esse tema recente, principalmente no contexto da do-cncia. No cenrio atual, observam-se profisses que so mais apreciadas no contexto social devido ao prestgio de seus profissionais, frequentemente associado a maior n-vel de instruo e ao corpo de conhecimentos profissio-nais consolidados (como Direito, Medicina e Engenharia). H outras profisses que, embora possuam elevada repre-sentatividade no contexto social, no gozam do mesmo prestgio, como o caso da docncia.

    Embora os termos profisso e ocupao/ofcio sejam frequentemente considerados sinnimos, Valle (2003, p. 85) descreve que, no Brasil, a palavra profisso (...) sin-nimo de distino social, pois est reservada apenas a algu-mas ocupaes e ofcios observados pela sociologia anglo--saxnica e francesa. Souza Neto, Cesana e Silva (2006) complementam que a profisso exige, alm de uma gama de conhecimentos, qualificao profissional de nvel superior e transformao dos papis ocupacionais em profisso.

    Ao abordarem a distino entre profisso e ocupao, Souza Neto, Cesana e Silva (2006) baseiam-se nos prin-cpios apontados por Lawson para estabelecer critrios necessrios para assegurar tal diferenciao. A ocupao apresenta como caractersticas a dedicao exclusiva, o re-cebimento de salrio, a preocupao com a qualidade do servio prestado sociedade e a dependncia ao mtodo da tentativa e erro. A profisso caracterizada como uma

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    64

    ocupao de elite que deve ter maior recompensa (salrio) e status social, tendo a pesquisa como norteadora de seu campo de atuao. Neste sentido, o trabalho considerado mais significativo, pois o profissional tem maior controle sobre ele e, consequentemente, maior comprometimento com a carreira.

    Nesse campo de conceituaes, surge a dvida: a do-cncia considerada profisso ou ocupao/oficio? Uma das possveis respostas que, embora o professor desem-penhe papel de elevada importncia no desenvolvimento do ser humano, sua atividade profissional ainda no con-siderada uma ocupao de elite. Talvez a docncia compre-enda os profissionais qualificados para o exerccio profis-sional que so menos recompensados financeiramente. Outro aspecto importante que seu status social advm do vnculo afetivo que o profissional estabelece com a co-munidade durante a carreira. Suas pesquisas orientam e esclarecem seu campo de atuao, porm ficam reservadas somente comunidade acadmica.

    Ao reconhecer que as profisses so definidas por suas prticas, por um conjunto de regras e pelos conhe-cimentos necessrios para o desenvolvimento de cada atividade, Sacristn (1999) esclarece que a profisso do-cente apresenta um conjunto de conhecimentos caracte-rsticos, mas com determinadas diferenciaes marcadas pelos contextos e pelas reas de conhecimento nas quais o profissional atua. Nesta perspectiva, Nascimento (2002, p. 28) descreve a existncia de um continuum de caracte-rsticas diferenciadoras de profisso/ocupao, cujos prin-cipais critrios so o (...) desenvolvimento de habilidades especializadas, o desempenho de funo social, a limita-o de corpo de conhecimentos exclusivos, o perodo de

  • 65

    construo da identidade profissional em educao fsica

    formao e treinamento extenso e a manuteno de uma organizao ou categoria profissional. O continuum des-creve a existncia de ocupao, quase profisso, semipro-fisso, profisso emergente e profisso.

    Na atualidade, notria a demanda acelerada por no-vas profisses, que surgem relacionadas, principalmente, com as inovadoras tecnologias de informao, exigindo profissionais com novos conhecimentos e com diferentes configuraes de carga de trabalho e de saberes. Em vis-ta de outras profisses j consolidadas, como o caso do Direito, da Medicina, da Engenharia, o processo de pro-fissionalizao da docncia realizou-se tardiamente. A ca-racterizao do professor como profissional, na realidade brasileira, deu-se somente no final do sculo XX, graas mobilizao de grupos empenhados pela mudana. Esse fato reafirma a ideia de que professor, ao consolidar o seu status na profisso, busca a construo de sua identidade profissional, de modo a neutralizar a percepo que a so-ciedade tem em relao subprofisso, pseudoprofisso, profisso marginal, quase profisso ou semiprofisso (VALLE, 2003).

    A profissionalizao da docncia entendida por Tar-dif (2000, p. 8) como (...) uma tentativa de reformular e renovar os fundamentos epistemolgicos do ofcio de professor e educador, assim como os da formao para o magistrio. Valle (2003) destaca que o processo de profis-sionalizao do professor derivou de duas vertentes: uma relacionada s aspiraes, tanto individuais como coleti-vas, dos professores frente profisso; outra relacionada eficincia do ensino face s orientaes dos modelos di-tados pelo Estado. De fato, no final do sculo XX surgiram diversos rgos de representao dos professores, o que

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    66

    motivou o debate em todos os contextos e viabilizou a va-lorizao do professor e a efetivao do status profissional. Em consequncia, os professores sentiam-se satisfeitos ao ingressarem em um corpo docente, embora ainda no go-zassem de muitos privilgios.

    A profissionalizao docente no Brasil pode ser carac-terizada por trs fases. A primeira iniciou na dcada de 1960, com a institucionalizao da primeira Lei de Dire-trizes e Bases. Em meados da dcada de 1960, a segunda fase consolidou uma nova organizao do ensino brasilei-ro e de seu corpo docente. A terceira fase, na dcada de 1980, foi aquela na qual tomaram forma as expectativas de profissionalizao (VALLE, 2003). Nessa ltima, a no-o de profissionalizao aparece de forma clara, pois at ento se entendia que a profisso de professor era ofcio, ocupao, misso a ser desempenhada na sociedade. necessrio, contudo, tambm reconhecer que as recomen-daes da segunda fase j demonstravam a preocupao com a qualificao do professor e com melhores condies de trabalho. O exerccio da profisso docente exigia, alm de competncias adquiridas por meio de estudos de apro-fundamento, a responsabilidade pessoal e coletiva para a formao e para o bem-estar dos estudantes.

    A docncia, uma das mais antigas atividades profis-sionais, foi legitimada somente quando dispositivos legais trouxeram mudanas ao cenrio nacional. Um exemplo a Constituio Federal de 1988, que previa a admisso de docentes atravs de concurso pblico e o qualificava como profissinal do ensino, o que suscitou sua valorizao. A consolidao da carreira docente tem sido, no entanto, permeada por lutas de classe pela atuao de organiza-es administrativas, como sindicatos e associaes, que

  • 67

    construo da identidade profissional em educao fsica

    se configuraram essenciais na construo da carreira dos professores de todas as reas de conhecimento. A partir da ideia de profissionalizao associada concepo de modernidade, desvinculada principalmente da percepo vocacional instituda pelas escolas normais, Valle (2006, p. 179) ressalta que (...) a carreira vista como funda-mental no engajamento dos professores nas lutas coleti-vas do magistrio, o que somente a condio de membro integral do corpo docente parece ser capaz de promover. Assim, as mobilizaes da classe do magistrio ganharam vez, voz e representatividade nas lutas de classe.

    Crescente inquietao instaurou-se na dcada de 1990, considerada a Era da Profissionalizao. Neste perodo, a preocupao com o professor visto como pro-fissional foi acentuada no contexto mundial. Essa mobili-zao tornou-se foco de discusses e debates em diversos contextos, dentre os quais as universidades e as faculda-des como instituies formadoras.

    Diante do estado de tenso no qual se encontravam os profissionais da educao no final do sculo XX, Perre-noud (1999) comentou que ficava difcil pensar em profis-sionalizao e prtica reflexivas, em novas competncias e reformas escolares. Neste sentido, o autor considera que ainda necessrio ampliar e clarear o perfil do docente como profissional, concretizando a transformao que dele ser exigida com o intuito de se tornar profissional. Para que esse pensamento se concretize, importante tambm a realizao de trabalho, em longo prazo, sobre a profissionalizao docente no sistema educacional e sobre o aumento das competncias dos profissionais.

    Ao abordar a consolidao da profisso docente, Tardif (2000, p. 13) reconhece a importncia do (...) diploma que

  • construo daidentidade profissional emeducao fsica: da formao interveno

    68

    possibilita o acesso a um ttulo profissional, titulo esse que protege um determinado territrio profissional contra a invaso dos no diplomados e dos outros profissionais. Nesta perspectiva, o curso universitrio torna-se um dos elementos necessrios para a caracterizao de um profis-sional (VALLE, 2003; WEBER, 2003).

    Independente dos esforos coletivos e das reformas educacionais para