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OS IMPOSTOS ENTRE O DIREITO E A ECONOMIA (com uma incursão pela questão da «progressividade» do I.R.S. na Curva de Laffer) M. Jorge C. Castela FDUNL N.º 3 – 2004

M. Jorge C. Castela - fd.unl.pt · 3. Os Impostos na perspectiva económica: a Tributação do Trabalho vista “do lado da Oferta” – o impacto dos Impostos sobre os rendimentos

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OS IMPOSTOS ENTRE O DIREITO E A ECONOMIA (com uma incursão pela questão da «progressividade» do I.R.S. na Curva de Laffer)

M. Jorge C. Castela

FDUNL N.º 3 – 2004

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Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa “OS IMPOSTOS ENTRE O DIREITO E A ECONOMIA (com uma incursão pela questão da «progressividade» do I.R.S. na Curva de Laffer)”

Por: M. Jorge C. Castela♣

Aluno n.º 000778

Tópicos: Razão de Ordem, à guisa de “Nota Introdutória” 1. Eficiência e Equidade – os “conflitos fronteiriços” do Direito e da Economia. 2. Os Impostos na abordagem do Direito Fiscal.

2.1. A “Lei Fiscal” no contexto da “Law & Economics”. 2.2. Enquadramento Constitucional e Normativo. 2.3. Suporte “filosófico”.

3. Os Impostos na perspectiva económica: a Tributação do Trabalho vista “do lado da Oferta” – o impacto dos Impostos sobre os rendimentos singulares (e sobre a economia) – e a “Curva de Laffer”.

4. A “progressividade” dos Impostos e a Economia da Oferta – uma perspectiva crítica dos “sistemas fiscais” contemporâneos com suporte na revisitada “Curva de Laffer”.

5. Pistas para uma alteração de filosofia normativa tributária: um Direito Fiscal para os nossos dias.

Bibliografia.

♣ Manuel JORGE Cardoso CASTELA, com uma Pós-Graduação em Direito dos Valores Mobiliários, pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e o Mestrado/P.E. em Ciência Política no ISCSP/UTL, é Licenciado em Economia, pela Universidade Técnica de Lisboa (ISE), com uma Pós-Graduação em Gestão na A.E.S.E., e frequência dos Cursos de Direito da Universidade de Coimbra, da Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa e, presentemente, da Universidade Nova de Lisboa. Desempenhou, desde 1996, o cargo de Director de Investor Relations/Marketing Financeiro, na Portugal Telecom, SA e de Responsável pela Gestão da Carteira de Acções Próprias da Portugal Telecom, SA.; em 1997 é designado Representante da Portugal Telecom para as Relações com os Mercados de Valores Mobiliários (registado na CMVM e BVLP) e Capital Markets Representative (na SEC e NYSE). Depois de 1999, Membro do Conselho de Administração, Gerente e Senior Advisor de Empresas do Grupo PORTUGAL TELECOM. Anteriormente exerceu ainda funções de Docência Universitária no ISEG/UTL (entre 1982 e 1988) e, desde 1981, vários cargos de Gestão e Direcção no sector das Comunicações (TLP, CTT e PT). Desde 1991 é Consultor Internacional das Nações Unidas (ITU/UN) tendo desempenhado várias missões em países da Europa Central e de Leste e em África. Neste domínio realizou e colaborou em vários processos de Avaliação, Fusões e Aquisições e Privatização de Empresas, bem como no domínio da Gestão e Desenvolvimento de Recursos Humanos. Publicou: “O NeoConservadorismo e a Economia da Oferta (NeoConservatism & Supply-Side Economics): Teoria e Política” (2.ª Edição revista e actualizada), Ed. Vida Económica, Porto, Fev. 2004, 524 Pgs.); “A Constituição da República Portuguesa (5.ª Revisão) e o Estatuto do Tribunal Penal Internacional” (em co-autoria com o Professor Doutor Jorge Miranda e o Dr. Armando Braga) – Ed. Vida Económica, Porto, 2002 (747 Pgs.); “As Sociedades Abertas e os Mercados Financeiros” – Ed. Vida Económica, Porto, 2000 (264 Pgs.); “Economia da Oferta («Supply-Side Economics» ): Teoria e Política” – Edição P.E., Lisboa, 1991 (519 Pgs.); e vários artigos sobre “Mercados Financeiros” (em Coluna mensal no Semanário “Vida Económica") e sobre “Teoria Económica”, “Fiscalidade”, “Contratação Colectiva” e “ Recursos Humanos”, em diversas revistas especializadas.

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Razão de Ordem, à guisa de “Nota Introdutória”. Este texto surgiu de um duplo desafio: do Professor Doutor Jorge Bacelar Gouveia, dirigido aos seus alunos do Curso de Direito da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, no ano lectivo de 2003/2004; e da Professora Doutora Maria Lúcia Amaral, minha Professora de Direito Constitucional, a quem dirigi um “atrevido repto” por e-mail, submetendo estas reflexões à sua apreciação, poucos dias após me ter sujeitado à sua rigorosa avaliação, num Exame em que me fez retomar o prazer em que o Professor Doutor Jorge Miranda me tinha já iniciado na Universidade Católica, para aferir da utilidade de difundir estas linhas ou na Revista THEMIS, ou como Working Paper no site da Faculdade, ou na gaveta das coisas sem interesse académico… . Dito e feito, de imediato, este que se subscreve – na sua qualidade de discente que, neste seu percurso de estudante “viciado” pelo Direito, desde que concluiu a sua Licenciatura em Economia, se tem dedicado, em complemento à sua actividade profissional, a uma tentativa, contínua mas interminável, de aprofundamento dos seus conhecimentos numa, ainda, “terra de ninguém” que é a “fronteira” entre o Direito e a Economia – aceitou o repto do primeiro e lançou aquele à segunda, de publicar (ou não) umas linhas de reflexão concretizada no âmbito do “Direito Fiscal”, constitucionalmente consagrado na nossa Magna Carta, secante da Economia “do lado da Oferta”. Um “caminho” árduo e pleno de escolhos, que conheceu uma forma “publicada” num livro, “esquecido”, que entrou nos escaparates em 1991, sob a epígrafe “Economia da Oferta («Supply-Side Economics»): Teoria e Política (das vitórias eleitorais)”, que versava, então, numa 1.ª Edição (entretanto esgotada), aquele que o autor elegeu como o domínio em que se a intercepção entre aqueles ramos do conhecimento científico se constitui, epistemologicamente, numa dialéctica de “ruptura” e “continuidade” mais perceptiva: o Direito, a Economia e a Política, “Fiscal”. Depois, numa outra incursão nesse “espaço fronteiriço”, em “remate” a uma Pós-Graduação em Direito dos Valores Mobiliários, concluída na Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa, pela via da Economia (dos Mercados) Financeiros e das “Securities Law” (de que resultou uma “Tese”, igualmente publicada, em 2000, sob a epígrafe “As Sociedades Abertas e os Mercados Financeiros: Enquadramento jurídico e normativo das Relações com Investidores (o papel do «Investor Relations»), que versava mais um domínio de coexistência, mais ou menos pacífica, daqueles dois “pilares” da Acção Humana), surgiu a oportunidade de iniciar uma colaboração mensal no semanário Vida Económica, cujo mote se tem centrado, em várias Crónicas publicadas desde então, uma vez mais e sempre, nas “questões fiscais”, seja na perspectiva dos Mercados Financeiros, seja no debate, sempre actual, do “papel dos Impostos” na gestão das expectativas dos agentes económicos que trabalham e investem, consomem ou poupam, “neste mundo (onde) nada está garantido senão a morte e os impostos” (Benjamim Franklin). Este texto, na forma de um “Trabalho” executado nas longas noites de insónia de quem persiste em trabalhar e estudar, ocupando muito do tempo de “lazer” no prazer da escrita – seguindo os bons exemplos (passe, sem ser mal-entendida ou interpretada, esta “liberalidade”) do nosso Professor Jorge Bacelar Gouveia –, acaba por constituir um modesto contributo para uma ainda mais singela reflexão do seu autor (que se reveste, agora, na forma de uma 2.ª Edição, revista e actualizada, no Prelo, do seu opúsculo de 1991, agora alargada a uma abordagem d’ “O Neoconservadorismo e a Economia da Oferta («NeoConservatism & Supply-Side Economics»): Teoria e Política”) – fonte e inspiração das linhas do texto que se segue, em forma de um “Trabalho” para a Disciplina de Direito Fiscal… e que acabou por surgir em resultado da memória, revisitada pela Professora Maria Lúcia Amaral na sua Lição sobre o “Contratualismo norte-americano”, da histórica “Boston Tea Party” e do princípio emblemático do “no taxation without representation”…

Dezembro 2003 / Janeiro 2004

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1. Eficiência e Equidade – os “conflitos fronteiriços” do Direito e da Economia. A formulação do Princípio do “no taxation without representation” é bem paradigmática das sucessivas turbulências sociais que a História tem registado em torno da existência de impostos tidos por “injustos”. Na base das Revoluções Americana de 1776-1787 e Francesa de 1789 (que constituiu uma reacção primordial à “inquisição fiscal” do Antigo Regime sobre o Terceiro Estado – o Povo), também na nossa ancestral Nação (pela “Revolta do Manuelinho” – com o levantamento popular, iniciado em Évora, em 1637, contra o “real d’água” e o aumento do “cabeção das sisas”, alavancaria a Restauração de 1640 – ou na “Revolta da Maria da Fonte”, de 1846, contra o aumento de impostos que a reforma fiscal de Costa Cabral fomentaria…) esteve sempre presente a magna questão da “Justiça Tributária”. Desde então, na costumeira “rivalidade” entre juristas e economistas, dois termos há que, em matéria de Impostos, à face do conceito de “Justiça”, na “Análise Económica do Direito” (ou na “Análise Jurídica da Economia”), despontam na “fronteira” entre estas Ciências que têm o “Homem” no centro das suas preocupações: a “Eficiência” e a “Equidade”. Para as remissões que ao longo deste texto se farão assume-se, nas expressões adoptadas por A. Mitchell Polinsky, que “Eficiência” se constitui como uma “relação entre os benefícios e os custos agregados de uma situação” (que corresponde ao “tamanho do bolo”) e a “Equidade” se reporta à forma como se processa “a distribuição dos rendimentos entre os indivíduos” (que concerne à forma como esse “bolo” é “fatiado”) – conceitos que levam os Economistas a concentrar-se mais em encontrar as fórmulas de maximizar o dito “tamanho do bolo” e os Juristas a dedicarem-se às “normas” que permitam a sua “divisão” (∗). O “bolo” é, para os fins analíticos em vista neste texto, a “Receita Fiscal” que é retirada da “Economia Privada” para, conforme se consagra na nossa própria Constituição, “satisfação das necessidades financeiras do Estado e outras entidades públicas” (Art.º 103.º, n.º 3). A primeira grande questão que se coloca neste contexto – e sem entrar, ainda, na questão da “progressividade” dos tributos sobre o rendimento – reside exactamente em se aferir o grau de conflito que concerne à gestão que o Estado dedica a esses meios financeiros que colecta ao comum cidadão, na base dos rendimentos que conquistam pelo seu esforço físico e intelectual ou pelos riscos em que incorrem ao tentar aplicá-los de forma produtiva, para si e para a sociedade: “Eficiência” ou “Equidade”?... Intuitivamente, mas com um valor jurídico e um valor económico (para já) nulos, a resposta seria… não!... Que o Estado, quando tributa os cidadão não prossegue nem a Eficiência, nem a Equidade. Mas se se assumir que o “bolo” poderia ser “fatiado” de uma maneira por todos desejada, é um facto que não ocorreria qualquer “conflito” entre a Economia e o Direito – com um “bolo” cada vez maior, cada cidadão tiraria uma “fatia” também maior. Se, porém, se admitir que com vista a se “cozinhar” um “bolo” maior, a sua divisão tenha que ser desigual, então, dependendo do que se concebe por uma “distribuição equitativa” do dito “bolo”, já se tornará mais evidente o “conflito fronteiriço” entre o Direito e a Economia, podendo levar mesmo a uma situação em que se torne preferível aceitar um “bolo” mais pequeno (menor “eficiência”) para se assegurar uma divisão do mesmo “mais equitativa” – é o que se retira de uma interpretação literal da segunda parte do preceito constitucional citado: “e uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza” (in Art.º 103.º, n.º 1, da CRP). Ou seja, se o rendimento de cada cidadão em condições de ser tributado não for, como não é, redistribuído sem custos para si e para a sociedade, o “conflito” começa a ganhar contornos de “revolta”, em grau que dependerá da medida específica das consequências de como se alcança a “eficiência” em face do que se entender como uma “distribuição equitativa do rendimento” dos cidadãos contribuintes. Como se procurará demonstrar ao longo deste texto, qualquer Imposto que incida sobre o rendimento das pessoas causa sempre uma distorção, seja sobre o seu comportamento produtivo (trabalho versus lazer), seja sobre as suas decisões de aplicação desse rendimento

∗ POLINSKY, A. Mitchell, “An Introduction to Law and Economics”, Ed. Aspen Law & Business, Aspen, 1989, pg. 7.

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(consumo presente versus consumo futuro): um Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, “progressivo”, distorce não apenas o preço relativo do trabalho/lazer, como causa decisões ineficientes de consumo. Daí que, em jeito de conclusão provisória, se admita o entendimento que a Lei Fiscal possa e deva ser um instrumento do legislador para promover a “Eficiência”, mas seja questionável para promover a “redistribuição do rendimento”. Comecemos pois por analisar o “Imposto”. 2. Os Impostos na abordagem do Direito Fiscal. “Imposto” é, para o Direito Fiscal português, uma prestação, em “regra” jurídica com expressão económica pecuniária, sempre coactiva e unilateral, sem o carácter de sanção, exigida pelo Estado ou por outro ente público, com vista à realização de fins públicos que constituem uma receita a título contributivo, criados para assegurar a cobertura de «despesas públicas» (finalidades fiscais do imposto) e ainda, supostamente, tendo em atenção objectivos de ordem económica e social (finalidades extra-fiscais do imposto). A seu respeito, em termos de “Princípios Tributários”, reclama a consciência jurídica contemporânea a constitucionalidade de determinadas regras: a) a legalidade do imposto; b) a igualdade de tratamento na repartição dos encargos tributários; c) capacidade contributiva, como base da incidência fiscal (posição económica que justifique a própria exigência tributária). Na presente análise, a abordagem versa particularmente, como releva da sua epígrafe, sobre os “Impostos Directos” – Impostos que incidem sobre a matéria colectável directamente determinada, aqueles cujo lançamento se baseia na elaboração prévia de um rol nominativo de contribuintes, caracterizando-se pela sua periodicidade e, relativamente aos quais se verifica, entre a ocorrência do facto gerador do imposto e o seu pagamento, uma intervenção directa do fisco exercida através das operações administrativas do lançamento e da liquidação (caso paradigmático do IRS e do IRC, que têm por base uma manifestação imediata (ou directa) da capacidade contributiva, como seja o rendimento ou o património. Sustentar-se-á que, simplesmente, se trata de “Impostos Fiscais” – tributos que o Estado cobra apenas para obter receitas –, “Periódicos” no sentido em que atingem situações que se prolongam indefinidamente, dando assim lugar a renovação das obrigações tributárias com o decurso de um determinado período, normalmente um ano, fazendo-se a sua renovação automaticamente, e para que tal renovação se não verifique, torna-se necessária uma oportuna declaração do contribuinte, dizendo que ela cessou. “Impostos Pessoais”, enquanto incidem sobre a matéria colectável, atendendo, também supostamente, às condições económicas do seu possuidor. Quatro alternativas se poderiam ter colocado ao Legislador português ao longo das Cinco Revisões Constitucionais e das ditas “Reformas Fiscais”, que se foram sucedendo desde 1976 –, conceptualmente: Impostos Progressivos, Proporcionais, Degressivos e Regressivos. O Imposto Progressivo caracteriza-se pelo facto de a sua taxa aumentar à medida que se eleva a matéria colectável. No sistema fiscal português não há exemplo de impostos ilimitadamente progressivos, mas sim de impostos com características de progressividade até determinado montante – é o caso do (já extinto) Imposto sobre Sucessões e Doações e do Imposto sobre os Rendimentos das Pessoas Singulares (o IRS – um imposto directo, sobre os rendimentos do trabalho, real, estadual, periódico, ordinário, global e… progressivo – sobre que se particulariza o presente texto, aquele a que Einstein se refere como “a coisa mais difícil de compreender neste mundo”). Os Impostos Proporcionais são aqueles que apresentam uma taxa constante – o imposto está, assim, em proporcionalidade directa com a matéria colectável – caso do IRC, do imposto de mais-valias e da sisa (ou do novo “IMT”). Imposto Degressivo é aquele que apresenta uma taxa normal e taxas reduzidas para rendimentos colectáveis que não ultrapassem determinado limite, baixando estas à medida que a matéria colectável vai baixando. Impostos Regressivos são aqueles cuja taxa diminui à medida que a respectiva matéria colectável aumenta. Não existe no nosso sistema fiscal qualquer destas duas espécies de impostos. Na situação em apreço, assente nas características do IRS, o legislador adoptou um sistema de “progressividade”, cujos contornos constituirão o “eixo” em torno do qual se desenvolverá a análise que se segue, no que concerne a um entendimento que demarca as linhas do “conflito fronteiriço” entre o Direito e a Economia.

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2.1. A “Lei Fiscal” no contexto da “Law & Economics” Robert Mundell, considerado por muitos (e por este que se subscreve), fundador “de direito” da “Supply-Side Economics” e como “um dos melhores economistas do Mundo” (e que, só em 1999, como tal foi reconhecido ao lhe ser atribuído o Prémio Nobel da Economia…), sustentava no Prefácio à sua obra Man and Economics que a “Economia é a ciência da escolha”. “Escolha” determinada pela escassez e pelo uso alternativo dos bens e serviços à disposição das pessoas e que tanto pode ser ditada no plano normativo, como no plano positivo. A Lei Fiscal, neste plano dicotómico, constitui-se como uma “instrução” pela qual o decisor político define procedimentos tendentes a ordenar as “selecções” possíveis que tal escolha comporta no quadro das diferentes combinações alternativas, em face dos constrangimentos constitucionais e, em termos marginais, da avaliação do “custo (político) de oportunidade” das opções que se lhe oferecem – o que, no fim, implica determinar o montante individual do Imposto, o montante que cada contribuinte terá que pagar. No que importa aqui relevar, duas opções se colocam “à cabeça” da Lei Fiscal: ou determina que esse montante revista uma importância fixa para todos os contribuintes, um valor absoluto de colecta igual para todos, estabelecido no seu articulado como uma “quota” que dispensa uma “liquidação”, stricto sensu; ou então faz variar esse montante em razão da matéria colectável, sob a forma de uma percentagem (“taxa”) que incida sobre o valor da matéria colectável para o correspondente apuramento da colecta e subsequente liquidação. Nesta “opção”, a Lei Fiscal pode revestir, como referido no ponto anterior, uma “quota variável” de impostos cujo montante varia em função da matéria tributável, seja em “taxa fixa”, única (Impostos Proporcionais), seja em “taxa variável”, múltipla (Impostos Progressivos, Regressivos ou Degressivos), em que, concomitantemente a uma variação da taxa média de imposto, se pode fazer progredir, manter ou regredir a taxa marginal de imposto. Atrás caracterizaram-se conceptualmente as várias hipóteses do legislador. Para que haja uma correcta percepção prática, abstraindo as situações atinentes aos “impostos regressivos” e “degressivos”, pelas razões expostas, exemplifiquem-se dois singelos casos, teóricos e hipotéticos, que serão replicados, com maior pormenor, mais à frente: - um, em que, o Contribuinte “A”, que aufere 10 000 € por ano, é colectado a uma Taxa (Proporcional) de 10% e, por isso paga 1 000 € de Imposto; o Contribuinte “B”, que aufere 20 000 €, também por ano, é colectado por essa mesma taxa proporcional de 10%, paga 2 000 € de Imposto… “B” paga, em termos absolutos, o dobro de “A”; - noutra situação, sob o “manto” da Progressividade, o mesmo Contribuinte “A”, que aufere os mesmos 10 000 € por ano, continua a ser colectado a uma taxa de 10%, pagando os mesmos 1 000 € de Imposto; já o Contribuinte “B”, auferindo os mesmos 20 000 €, por força do carácter “progressivo” do Imposto, irá ser objecto de uma Taxa de 20% (o dobro), pagando, por isso, 4 000 € de Imposto… “B” paga, em termos absolutos, quatro vezes mais que “A”. Os Contribuintes “A” e “B” são, ambos, Trabalhadores por Conta de Outrem; tanto um como outro não escolheram nem o que cada um aufere em termos ilíquidos, nem o que o outro recebe ao fim do mês a título de salário, bruto ou líquido – a Lei Fiscal “progressiva” determinou que, das 8 horas que cada um trabalha por dia, a “A” sejam retirados 48 minutos do seu esforço de trabalho para pagar impostos e a “B” (que “não tem culpa de ganhar mais que A”), são 96 os minutos que trabalhou mas que não “levou para casa”… e, se mais auferisse, menos veria compensado o seu esforço, o que, no limite, para uma Taxa Marginal de 40%, acrescida de 11% de TSU, implicaria que nem metade do seu trabalho seria compensado no seu salário “líquido”. Ou seja, colocando a questão na linguagem do dia-a-dia, seja em que circunstâncias for, “B” (que não é “rico”), que trabalha tanto como “A” (que não é “pobre”), que por ter um salário superior (porventura, por mérito ou por maior qualificação técnica, profissional ou académica), vai ter que pagar de Imposto, sobre o seu rendimento, honestamente auferido pelo seu esforço, duas vezes mais em termos de percentagem e de horas de trabalho e quatro vezes mais em termos absolutos, de € “ganhos”, que “A”? Porquê?

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2.2. Enquadramento Constitucional e Normativo. A Constituição da República Portuguesa de 1976 contém, no texto da sua Quinta (e última, até ao momento) Revisão, as seguintes disposições que se destacam para se encontrar uma “resposta” à questão anterior – a saber: Artigo 13.º (Princípio da igualdade) 1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei. 2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social. Artigo 81.º (Incumbências prioritárias do Estado) Incumbe prioritariamente ao Estado no âmbito económico e social: a) Promover o aumento do bem-estar social e económico e da qualidade de vida das pessoas, em especial das mais desfavorecidas, no quadro de uma estratégia de desenvolvimento sustentável; b) Promover a justiça social, assegurar a igualdade de oportunidades e operar as necessárias correcções das desigualdades na distribuição da riqueza e do rendimento, nomeadamente através da política fiscal; c) Assegurar a plena utilização das forças produtivas, designadamente zelando pela eficiência do sector público; (…) Artigo 103.º (Sistema fiscal) 1. O sistema fiscal visa a satisfação das necessidades financeiras do Estado e outras entidades públicas e uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza. 2. Os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes. 3. Ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que não hajam sido criados nos termos da Constituição, que tenham natureza retroactiva ou cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei. Artigo 104.º (Impostos) 1. O imposto sobre o rendimento pessoal visa a diminuição das desigualdades e será único e progressivo, tendo em conta as necessidades e os rendimentos do agregado familiar. 2. A tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real. 3. A tributação do património deve contribuir para a igualdade entre os cidadãos. 4. A tributação do consumo visa adaptar a estrutura do consumo à evolução das necessidades do desenvolvimento económico e da justiça social, devendo onerar os consumos de luxo. Destas disposições constitucionais não se encontra uma resposta unívoca à questão formulada… Seja sob um “regime” de Taxas Proporcionais, seja sob um “regime” de Taxas Progressivas, um trabalhador por conta de outrem que aufira um salário, como contrapartida da sua prestação subordinada, que seja superior ao auferido por qualquer outro seu colega, paga sempre, numa situação ou outra, mais de Imposto, seja em termos percentuais, seja, mais, em termos absolutos!... por conseguinte, claramente “prejudicado (…) em razão (…) da sua situação económica ou condição social”. Leia-se o Princípio da Igualdade contido no Art.º 13.º da CRP sob que prisma for, a conclusão só pode ser favorável à adopção de “Impostos Proporcionais” – impostos “progressivos” (que são os que resultam do conteúdo do n.º 1, do Art.º 104.º da mesma Constituição), não só não concretizam o Princípio da Igualdade, como agravam duplamente a “desigualdade” dos contribuintes que aufiram um salário superior (mas a quem assiste, também, o direito fundamental a uma remuneração pelo trabalho prestado), pois o imposto que sobre ele incide aumenta duplamente, seja por força do aumento da matéria colectável, seja em função da Taxa (ou alíquota), também em função da matéria colectável. A capacidade contributiva não se reporta nem à “teoria do benefício” (ou da “equivalência”) – que se filia numa concepção contratualista do Estado, impraticável e em contradição com o “Estado social” –, nem à “teoria do sacrifício” – que, para além da sua indeterminação e subjectividade, oferece três “regras” de “igualdade” não compagináveis (um sacrifício “igual”, “proporcional” ou “marginal”), que não preenche a lacuna de sentido atribuído à Taxa de Imposto aplicável. Da “Lei Fiscal”, destacar-se-ia, de entre a vasta profusão de normas que integra o “sistema” português, as que relevam do Código do Imposto sobre o rendimento das Pessoas Singulares, aprovado, pelo Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro, a saber: - a atinente à “Incidência Pessoal” do Imposto (contida no Art.º 13.º e ss. do CIRS);

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- a que respeita à “determinação (por “englobamento”) do Rendimento Colectável”; e - as “Taxas”, onde se concretiza de forma inequívoca, a “progressividade” do Imposto. Um autêntico “garrote fiscal” que se vai apertando à medida que cada contribuinte vai auferindo mais, num esquema de taxas médias e marginais crescentes, que se supõe, sem prova, em consonância com a capacidade contributiva. Tal esquema de progressividade tem sido justificado, como se reconhece no próprio Preâmbulo do Diploma referido, em nome da necessidade de, por via do sistema fiscal, “se corrigir a distribuição primária do rendimento que decorre do processo produtivo, de modo a operar uma redistribuirão secundária que concorra para definir um padrão de distribuição tido como social e politicamente mais aceitável”. Ou seja, não predomina uma racionalidade económica nem um “racional” jurídico, mas uma cedência ao “politicamente aceitável” e a uma inspiração filosófica de matriz “socializante”. Aliás, o legislador reconhece, ainda, no mesmo Preâmbulo, que “se é certo que a tomada de consciência dos efeitos de desincentivo das elevadas cargas fiscais associadas aos esquemas de tributação progressiva tem suscitado em numerosos países um movimento no sentido das inflexão da curva ascensional das taxas e da redução do nível da taxa marginal mais alta, não é menos certo que o princípio da tributação com intensidade crescente à medida que o rendimento se eleva continua a constituir o critério geralmente aceite de ajustamento da carga fiscal à capacidade contributiva”. Tal reporte da “carga fiscal” à “capacidade contributiva” é, exactamente, o âmago do que as concepções “supply-siders” (que adiante se irão sumariar) vêm criticando. Este “Princípio da capacidade contributiva” mais não é afinal do que uma tentativa de “nivelamento por baixo”, de desincentivo à produtividade e à qualificação técnica, profissional e académica, um prémio ao lazer e ao absentismo, uma agressão ao valor jurídico da Liberdade individual e a expressão de um “positivismo” que compete ao Direito Fiscal, aos fiscalistas e aos constitucionalistas, questionar no âmago dos seus fundamentos filosóficos. 2.3. Suporte “filosófico”. A finalidade última do Direito será, já o afirmava John Locke, no seu “Second Treatise on Government”, «not to abolish or restrain, but to reserve and enlarge freedom» (*), promover a Justiça e preservar a Justiça para o indivíduo, uma virtude que consiste na disposição de atribuir a cada um o que é seu, o seu “direito” (o “ius suum” de Ulpiano), significando uma igualdade perante a Lei, de acordo com as “regras da conduta justa” que Hayek “traduziu” a Epieikeia aristotélica, como uma forma superior de Justiça, universal, que se sobrepõe à “Justiça Legal” e permite ao aplicador de normas positivas corrigi-las se se revelarem inadequadas ao caso particular, de forma a permitir a melhor realização do “Justo Concreto”. A Justiça é uma “virtude cardeal” que consiste na disposição firme e permanente da vontade de atribuir a cada um o seu direito, ou a simples exigência da atribuição objectiva a cada um do que é seu – uma “Justiça Objectiva”, uma justiça em sentido estritamente jurídico, não uma “justiça social”, um conceito absolutamente indeterminado, vazio de segurança e certeza jurídica, que ninguém sabe o que é e muito menos sabe ou consegue concretizar… mas que se mantém quer na “vulgata” discursiva da “política”, quer na “base filosófica” do chamado “Estado Providência”, que lhe conferiram “assento constitucional” e “legal”, sem cuidar, como se tentará demonstrar ao longo deste texto, de explicitar o seu fundamento objectivo e concreto em disposições constitucionais como as que se transcreveram no Ponto anterior… . Se o objecto da Justiça é, precisamente, o direito de cada um, o que é devido a uma pessoa e por este pode ser exigido, pressupondo o Direito na sua exterioridade, alteridade e reciprocidade, não se apercebe o sentido de disposições, como as contidas nos preceitos constitucionais em que centramos a nossa análise, a saber e voltando a reproduzi-los, sublinhando o que se nos afigura, no mínimo, “controverso”:

* LOCKE, John (1690), Two Treatises of Government, in “Cambridge Texts in the History of Political Thought”, Cambridge University Press, 1960, Cambridge.

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«Artigo 103.º (Sistema fiscal) 1. O sistema fiscal visa a satisfação das necessidades financeiras do Estado e outras entidades públicas e uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza. 2. Os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes. 3. Ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que não hajam sido criados nos termos da Constituição, que tenham natureza retroactiva ou cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei. Artigo 104.º (Impostos) 1. O imposto sobre o rendimento pessoal visa a diminuição das desigualdades e será único e progressivo, tendo em conta as necessidades e os rendimentos do agregado familiar. 2. A tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real. 3. A tributação do património deve contribuir para a igualdade entre os cidadãos. 4. A tributação do consumo visa adaptar a estrutura do consumo à evolução das necessidades do desenvolvimento económico e da justiça social, devendo onerar os consumos de luxo.» Nem mesmo que se entendesse a “justiça social” ordenada especialmente ao chamado “bem comum” e inserido na “Justiça Geral” se consegue a percepção de um sentido jurídico a estas “alusões” vertidas para a Lei Fundamental – afinal um “dogma” que acaba por colidir com a própria “Justiça Geral (ou Legal)”, que no seu cerne dispõe os membros da comunidade a dar a esta o que lhe é devido, como contribuição para esse dito “bem comum”, mas com um critério de “igualdade proporcional” (“ordo partium ad totum”), do mesmo modo que colide com a chamada “Justiça Distributiva”, que regula a repartição pelos membros da sociedade de bens que são comuns, conforme um critério, também de “igualdade proporcional”, ou seja, uma proporção entre bens e pessoas que atende à finalidade da distribuição e à situação dos sujeitos relativamente a essa finalidade. (“ordo totius ad partes”). Uma percepção que se torna mais “controvertida” ainda quando o “legislador constitucional” se “revela” finalmente bem mais “claro” quando reconhece que “o sistema fiscal visa a satisfação das necessidades financeiras do Estado e outras entidades públicas” (in Art.º 103.º, n.º 1, 1.ª parte, da CRP), sem observar o mais elementar critério de “justiça comutativa” (“ordo partium ad partes”), em que o Estado deveria sim operar segundo uma igualdade simples, absoluta, real, objectiva, “aritmética”, traduzida na equivalência entre prestações. Não é, de todo, assim, como a própria realidade quotidiana se encarrega de demonstrar e este texto apenas visa reflectir. Quando se atende ao “Princípio do Benefício”, correcta seria a expectativa de que os Impostos que cada um dos Contribuintes paga deveriam ter como contrapartida, em exacta medida, a mesma proporção de benefícios que o Estado deveria facultar com as colectas que arrecada a todos, a cada um. Porém, como se transcreveu atrás, este “Estado” limita-se a replicar a vacuidade de “intenções genéricas”, sob a epígrafe de Incumbências prioritárias do Estado, de “Promover a justiça social, assegurar a igualdade de oportunidades e operar as necessárias correcções das desigualdades na distribuição da riqueza e do rendimento, nomeadamente através da política fiscal” (in al. b) do Artigo 81.º da CRP), para, logo na alínea seguinte, pretender em absoluto contrario senso, “assegurar a plena utilização das forças produtivas, designadamente zelando pela eficiência do sector público”, através da “extorsão”, pela via fiscal, dos meios financeiros “libertos” que lhes são essenciais para a sua própria subsistência e em “progressividade”… . Mesmo sem progressividade nas taxas de incidência fiscal é do senso comum que, em regra, estando a generalidade dos “activos” (mobiliários, imobiliários e pecuniários) em estreita correlação com os rendimentos percebidos ao longo da vida, uma Taxa Proporcional sobre o rendimento acabará sempre por tributar de forma bem mais “pesada” aqueles que são “mais ricos”… introduzindo os mecanismos da “progressividade”, os efeitos serão bem mais óbvios! Em causa está, não só a concepção do “Estado social fiscal”, que como reconhece Casalta Nabais, extravasa “largamente o terreno de uma discussão jurídica”, mas que, já no domínio do debate constitucional e do Direito Fiscal, obriga a um aprofundamento do sentido, hoje ainda indeterminado e assaz equívoco, do conceito de “capacidade contributiva” e do seu

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carácter programático (∗) vis-a-vis as posições doutrinais que partem do Princípio do “Benefício”, como critérios de “Justiça Fiscal” – a que, no nosso entendimento, se deverá “acoplar” uma análise económica, perspectivada do “lado da oferta”, atenta a poderosa imagem que a “Curva de Laffer” propicia. Em síntese e por partes, se o Princípio do Benefício assenta na “equivalência” do Imposto ao preço dos serviços que o Estado presta aos cidadãos, admite-se como lícito e legítimo um sistema fiscal em que cada contribuinte seja tributado de harmonia com o benefício que retira dos bens e serviços que o Estado, por ele financiado, lhe proporciona. Uma ideia que já um dos fundadores da “Supply-Side Economics”, Jean-Baptiste Say, pugnava, em 1803, ao afirmar que “se a equidade impõe que os consumos sejam pagos por aqueles que os desfrutam, os países melhor administrados sob este aspecto são aqueles onde cada classe de cidadãos suporta os custos dos consumos públicos proporcionalmente ao proveito que deles retira” – a “contribuição em avaria grossa” de que falava Ferreira Borges, nos seus “Princípios de Sintelologia” de 1831 – como condição de equilíbrio económico, pelo qual se apercebe uma correcta percepção das preferências dos cidadãos numa afectação optimizada de recursos e como factor de Justiça Fiscal e de Eficiência Económica. Por oposição, o Princípio da “Capacidade Contributiva” assenta numa concepção de sistema fiscal em que a “Justiça” se alcança se a repartição dos impostos pelos cidadãos se efectuar em função da sua capacidade económica, independentemente do grau de satisfação que cada contribuinte possa retirar dos “benefícios” dos bens e serviços que o Estado entenda disponibilizar: o imposto como “dever fundamental” observando dois critérios cumulativos – o da “igualdade horizontal” (que exige que as pessoas com capacidades contributivas equivalentes devem pagar o mesmo imposto) e o da “igualdade vertical” (que obriga que pessoas com diferentes capacidades contributivas deverão pagar impostos desiguais). Critérios que, aparentemente, se vão reconduzir à “progressividade” e à medida do “sacrifício” imposto a cada um dos contribuintes na definição das suas funções de utilidade marginal do rendimento vs. consumo. È, exactamente, neste contexto, que se vem situar a análise que preside à “Curva de Laffer”. Como se desenvolverá no ponto seguinte, a ideia que lhe preside estava já presente numa das obras fundamentais da cultura islâmica – a “Al Muqaddima”, da autoria de Ibn Khaldun (aliás Abd-ar-Rahmân b. Kaldûn Al-Hadramî, que viveu entre 1332 e 1406), ao ter sustentado que se os impostos não provocarem sacrifícios exagerados, “os contribuintes são enérgicos e activos nas suas empresas: cultivam mais terras, o que acresce o número de contribuições fundiárias e, por conseguinte, o conjunto da receita fiscal”. Se, entretanto, “o imposto ultrapassa os limites da equidade (…) o povo perde toda a disposição para o desenvolvimento agrícola (…). Muitos abandonam a terra. O resultado é uma baixa geral do rendimento nacional, consequência da diminuição das contribuições directas” (da tradução francesa de 1997)**. Mais ou menos o mesmo alerta que o Professor Teixeira Ribeiro nos deixou quando escreveu que “o sistema fiscal que hoje se reputa justo – o sistema progressivo não conduz a uma igualdade real, concreta, mas apenas a uma igualdade suposta, imaginada. Efectivamente, ele decorre de toda uma cópia de postulados, os quais, por definição, consistem em princípios que não se demonstram, mas cuja aceitação se pede e que, portanto, se pode conceder ou negar” (in “A Justiça na Tributação”, Boletim de Ciências Económicas, Vol. XXX, 1987). A “Curva de Laffer” surge, neste quadro, nessa bissectriz da Economia, do Direito e da Ciência Política, enquanto expressão que não se resume, nem ao Princípio do “Benefício”, nem da “Capacidade Contributiva”, mas como uma função derivada dos pontos pelos quais o eleitorado deseja ser tributado, tal como Jules Dupuit já o havia perspectivado quando sustentava, em 1844 que: “se um imposto é gradualmente aumentado desde zero até ao ponto em que se torna proibitivo, o seu produto começa por ser nulo, depois cresce sucessivamente até atingir um máximo, depois do qual decresce progressivamente, até se tornar nulo de novo. Daí que quando o Estado precisa de cobrar uma dada soma através de impostos, há sempre duas taxas que preenchem essa necessidade, uma acima e outra abaixo daquela que produziria a receita máxima” (in “De la Mesure de l’Utilité des Travaux Publics”, cit. in CASTELA, M. Jorge C., 1991 e 2004). ∗ Vd. NABAIS, José Casalta, in “Direito Fiscal”, Almedina, 2.ª Edição, Coimbra, 2003, pág.55/56 e 148 e ss. ** IBN KHALDUN (1382), Al Muqaddima, tradução francesa in Discours sur l’Histoire Universelle, “Thesaurus” Sindbad, Éditions Actes Sud, Arles, 1997.

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3. Os Impostos na perspectiva económica: a Tributação do Trabalho vista “do lado da Oferta” – o impacto dos Impostos sobre os Rendimentos Singulares (e sobre a economia) – e a “Curva de Laffer”.

Os impostos são, no entendimento sábio do comum dos cidadãos, um factor de constrangimento e enviezamento das suas decisões e comportamentos, um «mal necessário» (!?) a que se sujeitam, até certos limites... Qualquer cidadão contribuinte sente, de uma forma mais ou menos evidente, a iniquidade, a ineficácia, a complexidade e a injustiça do sistema fiscal que vigora (na) e atrofia invariavelmente a economia do seu país. Raros são, de facto, as excepções a regimes fiscais marcados pela complexidade, materializada num número excessivo de impostos, sem qualquer objectivo financeiro, económico ou social de relevo; pela iniquidade, constatada pelas elevadas e crescentes taxas de imposto que incidem sobre o trabalho e o risco, pela fraude impune e provocante que leva à não tributação de diferentes ganhos ou à concessão de benefícios sem uma justificação aparente, ou mesmo à tributação efectiva de rendimentos intributáveis; pela ineficácia e injustiça, que passa pela incapacidade de corresponder ao propósito de, pelo seu lançamento, proporcionar a estabilização conjuntural a que se propõe, antes evidenciando as malhas de uma imensa teia burocrática, injustificada e injustificável, de uma Administração Pública ancilosada, corrupta, onerosa e parasitária. Tem-se afirmado como indiscutível que o Estado e o Sistema Fiscal por que se oferece ao cidadão, longe de se imbuir do espírito do tal «bom pastor (que) tosquia as suas ovelhas sem lhes arrancar a pele», se tem pautado por atitudes e comportamentos, em relação aos contribuintes líquidos, que, longe de qualquer função «socia1», de que se reclama, e distante do respeito pelos supra referidos limites (do insuportável), antes malbarata os seus recursos (que saca à sociedade) em meios que em quase nada recompensam os sacrifícios daqueles. Dizia o «nosso» Oliveira Martins, actual em 1883 como hoje, em referência ao nosso país, que «(...) urge reformar num sentido prático os sofismas que, sob o nome de «liberdades», corrompem até à medula o corpo desta sociedade. Urge moralizar a administração e extirpar o parasitismo que nos rói. Urge pôr ponto de ordem no desvairado rumo das finanças, no regime iníquo e absurdo do imposto (...). Urge, numa palavra, moralizar uma política desvairada, levantar uma autoridade abatida; e levantá-la não pela força, mas pelo respeito devido ao saber e ao carácter; urge restaurar as forças económicas de uma nação adormecida e o vigor floral de um povo atormentado» (*). Palavras que a própria vida económica das sociedades contemporâneas se tem encarregado de corroborar, evidenciando que os poderes públicos, por exemplo, ao cobrarem os seus impostos, longe de os utilizarem de uma forma mais eficaz, deles se servem para fins estranhos aos interesses de quem os elege ou suporta. De facto, as políticas fiscais e a sua filosofia são, no quadro da actual política económica levada a cabo pela generalidade dos países ocidentais, o exemplo que mais se assemelha à célebre «Lei Seca», destruindo aquilo que pretendia promover!... Como que corporizando esta perspectiva, os proponentes da respectiva supply-sider vão precisamente escalpelizar os efeitos de «má conduta» do Estado detectando, nomeadamente, as consequências que as taxas de impostos produzem sobre os preços relativos, a oferta agregada e o crescimento económico. No seu entendimento, as transformações das taxas de imposto de transformações relativas dos preços, dos bens e/ou serviços produtivos» que afectarão sempre a escolha, a distribuição dos recursos e a própria autoridade económica real. Em conformidade, estas transformações das taxas de impostos produzirão repercussões significativas sobre os incentivos dos indivíduos em oferecer trabalho e/ou capital no mercado. É claro para os «economistas da oferta» que, por exemplo, alterações nos preços relativos induzidas nas taxas de imposição fiscal afectam as escolhas entre: I) Trabalho e lazer; II) Trabalho «mercantil» e trabalho «não-mercantil»; III) Consumo presente/futuro e poupança/investimento; e IV) actividade («economia legal») e inactividade («economia subterrânea») do mercado.

* MARTINS, Oliveira (Novembro de 1883 – 2.ª ed. – Explicações), Portugal Contemporâneo, Guimarães & C.ª Editores, Lisboa, 1976 (8.ª ed.).

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Com este entendimento tomava-se, então, possível, aos supply-siders estabelecer, por exemplo, uma relação, entre as taxas de imposto e a produção agregada, tributável, de mercado. Quando as taxas de imposição fiscal se aproximam de zero, a produção é baixa na medida em que certos bens públicos que são vitais à própria operação normal do mercado não estão a ser oferecidos – bens como os tradicionalmente dados a título de exemplo: a justiça, a defesa, as infra-estruturas básicas, a educação obrigatória... . À medida que as taxas de imposto vão aumentando, tais bens e serviços públicos essenciais vão sendo proporcionados. Nesta fase inicial supõe-se que os efeitos destes aumentos em eficiência produtiva vão contrabalançando os efeitos desincentivadores das taxas de imposto praticadas. Está-se num nível em que a carga fiscal, tributável, é exactamente aquela que assegura o financiamento do mínimo indispensável de gastos de Estado em investimento na (e) produção de bens públicos essenciais. Entretanto, se se aumentarem as taxas de imposto acima de tais montantes, as ineficiências e os desincentivos por tais acréscimos, começam a fazer-se sentir de forma cada vez mais acentuada. Em particular, este aumento das taxas de imposto – directo ou indirecto (por via de um aumento dos rendimentos pessoais, por indexação destes à inflação... que induz uma subida de escalão e uma inerente diminuição do acréscimo do rendimento líquido - vai alterar os preços relativos e induzir o declínio dos rendimentos do trabalho, da poupança, do investimento e do próprio rendimento tributável... Desta forma, os agentes económicos vêm-se forçados a abandonar as suas actividades» «mercantis» para dedicarem o seu tempo a actividades mais «rentáveis» como o lazer, o consumo improdutivo, a evasão e a fraude fiscais, a trabalhos de rendimento não tributável, … enfim, a actividades «não-mercantis», à improdutividade, ao absentismo, a atitudes e comportamentos que, certamente, Tomás d' Aquino, na sua lucidez «protoeconómica» de uma Idade Média obscurantista, se encarregaria de vilipendiar... Acentua-se, pois, neste contexto, onde afinal prevalecem formas de economia paralela, subterrânea, a par da economia «oficial», onde se regista um volume inexoravelmente menor de oferta de mercado. Concomitantemente, os melhoramentos públicos, resultantes da eficiência dos factores produtivos, vão conhecendo níveis de concretização cada vez menos acentuados, com benefícios progressivamente menores para os contribuintes, como menores serão, também, os seus ganhos de rendimento. Levando às últimas consequências este tipo de atitudes, discricionárias, de um Estado fiscalista como o é o Estado contemporâneo, a situação teórica de taxas de imposição fiscal efectiva próximas dos 100%, traduzir-se-iam por uma oferta nula do sector tributável, anulando-se, por conseguinte, a própria produção. Saliente-se que a tendência actual, vigorante em muitas economias ocidentais, não retira o absurdo da anterior afirmação... Todavia, se, em contrapartida, se processassem reduções nas taxas de imposto – incentivando a opção pelo trabalho («o trabalho enobrece» - S. Tomás d' Aquino), pela poupança/investimento e pela actividade do (no) mercado, em prejuízo do consumo improdutivo e da inactividade do mercado – importantes seriam, no entendimento da Supply-Side Economics, as implicações nas variações (positivas) da oferta agregada, no crescimento económico e no próprio bem-estar (e clima) social. Vasta é a evidência empírica e a reflexão teórica sobre esta problemática. Em estudos recentes tem sido demonstrada a existência de vínculos estreitos entre impostos e crescimento. Tem-se consciência que o desenvolvimento é um processo económico e social complexo. A sua configuração não é uniforme de sociedade para sociedade, podendo ser influenciada pelos mais diversos factores e variáveis, endógenos e exógenos às suas vontades respectivas. É assim que, em diferentes países, o crescimento foi retardado por factores de instabilidade política, governativa, por convulsões sociais, conflitos, dissenções e guerras de que foram vítimas. Também factores de instabilidade económico-financeira, como a inflação, a deterioração dos termos de comércio, as altas taxas de juro, os aumentos dos preços do petróleo, as barreiras comerciais, …, dificultaram o progresso económico e social para toda uma série de países.

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No entanto, mais recentemente, um outro tipo de factores, de índole económico-política, têm vindo a destacar-se pela sua evidência empírica e pela atenção que despertou junto dos economistas das mais diversas formações: a incidência dos impostos sobre os comportamentos dos agentes económicos, no mercado e no crescimento económico. É um dado da história que as reacções de cada país às medidas fiscais são influenciadas pelas faculdades, motivações e costumes dos seus povos. Reacções que dependem também da própria «qualidade» do sistema fiscal aplicado. Pode acontecer que um determinado país suporte uma proporção Receitas Fiscais/PIB mais elevada mas, por apresentar uma estrutura fiscal mais favorável, pode obter resultados mais eficazes do que um outro com um nível geral de impostos mais baixos que desestimule actividades promotoras do crescimento ou imponha um ónus excessivo sobre os segmentos mais produtivos ou inovadores do mercado. Uma «qualidade» que é, também, uma função da complexidade do sistema fiscal, da eficiência e integralidade da sua administração e, ainda, do grau de equidade horizontal e vertical da sua incidência (dentro de, e entre os vários escalões de rendimentos). De qualquer forma, seja qual for o país, fortes são os vínculos entre o nível de tributação e o ritmo de crescimento económico. Com efeito, os níveis de impostos aplicados afectam não só o montante de capital disponível, para estimular ou desestimular a poupança interna e o investimento interno e externo, como também podem afectar a distribuição dos investimentos. Impostos que, como se referiu, afectam a produtividade e o emprego e sua distribuição pelos sectores, influenciando as opções individuais entre trabalho e lazer, a intensidade do esforço no emprego, a investigação e as próprias decisões dos empresários e investidores no domínio das opções tecnológicas. Impostos que, pelo seu impacto sobre os custos dos factores produtivos e o comportamento empresarial, afectam a capacidade das empresas de diversificar e expandir as suas actividades, influindo mesmo sobre factores menos tangíveis, como sejam, a publicidade, a pesquisa, o progresso técnico, etc. São, de facto, múltiplos os indícios empíricos que sugerem a existência de relações causais, supply-siders, entre o nível e os tipos de impostos e os factores-chave do crescimento económico no que tange a investimentos, emprego, produtividade, inovação e outros factores da Economia da Oferta. (∗) Conforme demonstra o estudo de Keith Marsden, através de uma análise regressiva baseada nas proporções médias Impostos/PIB, o impacto dos impostos, tomados como variáveis administrativas, sobre o crescimento económico, é, em geral, profundamente negativo. Considera Marsden, a partir da amostra que utilizou para a sua análise (20 países, do Malawi e do Zaire à Suécia e Japão, entre 1970 e 1979), «Um aumento de 1% na proporção impostos/PIB foi associado a um decréscimo de 0,38% na taxa de crescimento económico. Quarenta e cinco por cento da variação entre países, de crescimento do PIB foram explicadas por diferenças no ónus global dos impostos. Quando se levava em conta o investimento interno bruto e o crescimento de contingente de mão-de-obra, era possível explicar 78% dessa variação. Mas, como a mão-de-obra e o capital incluem os efeitos dos impostos na oferta desses factores, a variável residual dos impostos, que media o efeito desses factores sobre a produtividade, caía para – 0,12%» (∗∗). Este estudo oferece ainda a constatação de que os impostos têm um efeito significativamente mais acentuado sobre os países que apresentam um rendimento superior relativamente aos de rendimento inferior. «Um aumento de 1% na proporção impostos/PIB, provocava uma redução de cerca de 0,57% no crescimento do PIB quando os impostos eram as únicas variáveis independentes consideradas, e de cerca de 0,30% quando combinados com o crescimento dos investimentos e do contingente de mão-de-obra». (∗∗∗) ∗ Cfr., por exemplo, estudos conduzidos por:

- MARSDEN, Keith, «Impostos e Crescimento», in “Finanças e Desenvolvimento”, Vol. 3, nº 3, Setembro de 1983, Edição do JBGI e do BM (extractos do Staff WorkingPaper, nº 605);

- DIAMOND, P.A. e MIRRLEES, P.A. «Optimal Taxation and Public Production», in American Economic Review, Vol. 61, págs 8 a 27;

- CARREIRA, Medina, “A Situação Fiscal em Portugal”, Ed. do Autor, Lisboa, 1984. ∗∗ MARSDEN, Keith, art. cit., págs. 41 e 42. ∗∗∗ Idem, pág. 42.

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Uma outra e determinante constatação que releva destas análises, é a que sugere que os impostos podem afectar o crescimento por duas vias: por um lado, influenciando a oferta total dos principais factores de produção, elevando ou baixando o seu rendimento líquido (depois de impostos); por outro lado, influenciando a eficiência da utilização dos recursos, incrementando ou diminuindo a produtividade global dos factores. Entretanto, a incidência dos impostos sobre a oferta, a produção agregada e o crescimento económico processa-se de forma divergente, de acordo com as circunstâncias peculiares de cada país. De um modo geral, milita como explicação possível, para os efeitos maiores e mais significativos da redução dos impostos sobre o crescimento nos países de mais fracos rendimentos, o facto destes oferecerem maior margem de ganhos de produtividade devidos à disseminação de tecnologia moderna, formação avançada e transferência de trabalho e de capital para sectores e actividades mais produtivas – podendo, ainda, beneficiar de «efeitos de externalidade». Nos países de rendimentos mais elevados, em contrapartida, é suposto que as diferenças de produtividade entre os sectores de actividade tendem a ser menores, ao passo que os níveis de exigências quanto a um modo eficiente de operar são mais altos. Isto, acumulado a uma certa rigidez estrutural e institucional – que, invariavelmente, limita a mobilidade dos recursos produtivos, ou retarda a aceitação de novas técnicas – pode limitar as potencialidades latentes das forças vivas da sociedade, de produzir benefícios decorrentes de impostos mais baixos. Daqui decorre que, qualquer que seja o país, os impostos mais baixos asseguram uma maior rendibilidade da poupança, dos investimentos do trabalho e das inovações, estimulando uma oferta global maior desses factores e fazendo crescer a produção total. Os dados da realidade concreta mostram ainda que a ênfase e os tipos de incentivos fiscais, oferecidos por países com baixos níveis de impostos, tendem a favorecer a transferência de meios financeiros, humanos e Know-how de sectores menos produtivos para outros mais produtivos. O oposto oferece-se como mais provável nos países de impostos mais elevados, onde se sofre uma quebra da eficiência global da utilização de recursos. É, pois, este, o tipo de problemas, relações e interacções que ocupa um lugar de primordial importância nos interesses teóricos e analíticos da Supply-Side Economics. A sua reflexão representa, mesmo no actual estádio do seu desenvolvimento teorético, a preocupação básica da perspectiva de intervenção político-económica desta corrente de expressão de Pensamento Económico que desponta, num inequívoco apoio à implementação de medidas e à criação de condições, sob as quais se possibilite uma maximização do crescimento económico.

a) O impacto dos “Impostos sobre os Rendimentos das Pessoas Singulares” O modelo económico da Supply-Side Economics identifica a tributação, a política fiscal, como um dos instrumentos privilegiados de política económica para a concretização de dois objectivos que se lhe oferece cumprir: a redução dos gastos públicos e a expansão da formação de capital privado. No seio do modelo supply-sider, sobreleva-se, por conseguinte, uma redução dos impostos sobre o rendimento como forma de despressionar as distorções que se impõem às escolhas económicas dos agentes, pela sua (ainda importante) incidência. Com este acto (que corporiza uma atitude inovadora quanto à relação mercado/Estado, no sentido de uma redução do papel intervencionista deste último sobre o primeiro) preconiza-se o incremento das poupanças formadas no sector privado, limitando-se, simultaneamente, o crescimento do sector público para um mínimo indispensável e não corruptor da economia de mercado. No mesmo sentido concorre, aliás, uma redução das taxas de imposto sobre as empresas, ao estimular novos investimentos em capital fixo e emprego em resultado de maiores taxas de rendibilidade depois dos impostos. Com efeito, no entendimento supply-sider, os impostos interferem, de forma decisiva, na eficiência do mercado, ao alterarem os preços relativos dos serviços produtivos e dos bens. Os impostos incidentes sobre os rendimentos do capital e sobre os salários distorcem as escolhas económicas individuais entre o consumo presente e futuro e entre actividades mercantis e não-mercantis. Desse reconhecimento, releva, para esta nova corrente ou expressão de Pensamento Económico, a necessidade de aperceber a forma como processam os efeitos negativos dos impostos sobre as

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famílias e as empresas, mas também, e fundamentalmente, da acção positiva que se pode exercer, pela via da fiscalidade, sobre os rendimentos daqueles agentes económicos. Entreabrindo essa análise pela incidência da Fiscalidade, preconizada pela Supply-Side Economics, sobre as famílias e o mercado de trabalho, reconhecem-se as suas intenções de incrementar a oferta de trabalho. Se bem que as determinantes da oferta de trabalho sejam muitas e complexas, é bem possível enunciar-se com alguma segurança que a quantidade de trabalho «oferecida» no mercado está relacionada positivamente com o nível de salários reais. Isto é, ceteris paribus, um aumento dos salários reais resultará num aumento da quantidade de trabalho voluntariamente «oferecida». Por outro lado, esta quantidade de trabalho voluntariamente oferecida para um qualquer nível de salário real está relacionada também com a «riqueza» pessoal de cada trabalhador. «Riqueza» que, no aparelho conceptual supply-sider, significa o valor presente, ou actual do rendimento antecipado de todas as fontes. «Fontes de Rendimento» que, por seu turno, assumem uma natureza «humana» e «não-humana». Ou seja, um indivíduo (ou uma família) pode auferir um ordenado ou um rendimento salarial através do aluguer dos seus serviços, produzidos pelo seu stock de «capital humano». Mas o mesmo indivíduo (ou a mesma família) pode vencer rendimentos provenientes de fontes «não-humanas», como o são os dividendos e os juros. Tudo o que aumenta o valor presente do rendimento «humano» e/ou «não-humano», antecipado, faz aumentar a «riqueza». Por sua vez, reconhecidas tais contrapartidas, importa aumentar os salários depois de impostos numa proporção idêntica ao aumento de «riqueza», de forma a salvaguardar um incremento conforme da oferta de trabalho. No entanto, esta alteração faz-se sob pressão de três efeitos: um efeito-substituição, um efeito-rendimento e um efeito-riqueza. O efeito-substituição sobre a oferta de trabalho é a expressão, de uma alteração dos preços relativos do trabalho e do lazer por efeito de, por exemplo, uma redução nas taxas marginais de imposto. Neste caso é imediato o reconhecimento de que uma tal redução das taxas de imposto aumenta o preço relativo do lazer: cada hora de trabalho perdida representa uma perda mais que proporcional de rendimento salarial. Daqui resulta que o efeito-substituição é sempre negativo; isto é, um aumento do preço relativo do lazer implica, ceteris paribus, uma redução no tempo de lazer em contrapartida de um incremento da quantidade de trabalho voluntariamente «oferecida». Efeito-Substituição que se sobredetermina aos restantes quer no que concerne aos trabalhadores já integrantes da força de trabalho produtiva, quer no tocante à força de trabalho potencial. Com efeito, os que pretendem integrar a força produtiva devem desde logo tomar as decisões relativas às suas carreiras em função da comparação dos benefícios e dos custos de investimentos em capital humano, alternativos. Reduções das taxas marginais dos impostos permitem aumentar o valor presente dos rendimentos futuros, aumentando a rendibilidade do investimento em capital humano, e contribuindo para o aumento da taxa de crescimento da economia. Há, pois, como que um efeito líquido positivo que se materializa, todavia, num incremento da oferta de trabalho inferior ao da procura por trabalho. Quer isto dizer que, em consequência de uma redução de impostos, se espera uma expansão do emprego. O concorrente efeito positivo introduzido no investimento em capital humano e não-humano assegura um aumento significativo da Procura por trabalho. Mesmo que se assumisse que, o efeito líquido dos efeitos-substituição, rendimento e riqueza fosse negativo (isto é, que a quantidade de trabalho voluntariamente «oferecida», a um nível de salário real, diminuísse), seria lícito esperar que a procura por trabalho aumentasse, incrementando os níveis de emprego e os salários reais. Isto porque, a procura por trabalho é uma procura derivada. Nas empresas, a quantidade de trabalho procurada – medida em termos de tempo potencial de trabalho, em horas-homem – dependerá das contribuições de cada unidade de trabalho para a formação de rendimento. «Rendimento» que, na acepção supply-sider, dependerá da quantidade das unidades adicionais de «produto» (output) que uma unidade adicional de trabalho e capa de produzir. Entretanto, a quantidade de produto (output) que uma unidade adicional de trabalho é capaz de produzir – o produto marginal do trabalho é determinada também pela tecnologia de que dispõe a empresa. «Tecnologia» que, por sua vez, é determinada pelo stock (capital humano e não-humano ou físico que se encontra à disposição da empresa.

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Por conseguinte, tudo o que fizer expandir o produto marginal do trabalho – que aumente a sua produtividade – aumenta procura por trabalho. Como, aliás, aumenta a procura por trabalho por efeito de tudo o que fizer aumentar a oferta e a procura dos produtos da empresa. Como tem sido salientado ao longo deste texto, é objectivo da Supply-Side Economics incrementar a taxa de crescimento económico através de uma aceleração da taxa de acumulação de capital, o que passa por uma expansão dos factores da oferta, mas, também, por um aumento da procura por trabalho. Com efeito, assume-se como proposição fundamental da Economia da Oferta, a necessidade de se proporcionar um ambiente propício à acumulação de capital. Reduções nas taxas marginais de impostos pessoais acompanhadas pela redução das expectativas inflacionistas permitirão uma expansão das taxas de rendibilidade, reais, depois de impostos dos investimentos em capital humano. Mas a dinâmica criada produzirá resultados ainda mais eficazes se alicerçada em reduções dos impostos, graduais, balanceadas, no empenhamento das autoridades governativas em reduzirem a sua intervenção sobre o mercado, reduzindo, simultaneamente, o crescimento da oferta, moeda, através de uma política monetária de inspiração monetarista. Criadas estas condições, o incentivo para o recrutamento «massa cinzenta» e para o reforço de actividades de investigação e desenvolvimento, torna-se uma realidade com resultados palpáveis. Resultados que a aceleração da acumulação de capital contempla e que se materializam num aumento dos gastos em investimento no mercado dos bens e serviços. Eliminar o consumo excessivo em contrapartida de um encorajamento da poupança e do investimento, constituem objectivos centrais na Economia da Oferta. É reconhecido que uma elevada e variável inflação, a par de altas taxas marginais de imposto, têm sido as principais responsáveis pelo declínio das taxas de poupança. Poupança que, no entendimento supply-sider, pode ser fomentada por três vias. Em primeiro lugar, as reduções preconizadas nas taxas marginais de imposto são destinadas a compensar os efeitos da inflação nas taxas de rendibilidade, depois de impostos, da poupança e do investimento. Segundo, as mesmas reduções das taxas de imposto asseguram o incremento das posições de riqueza dos contribuintes de uma determinada nação. Reduções das taxas de imposto aumentam os rendimentos futuros e o valor presente dos incrementos consequentes ao rendimento futuro dos contribuintes. Assim, não só se esfumam tensões inflacionistas como se assegura um crescimento balanceado e estável da riqueza dos contribuintes. Na prática, este aumento de riqueza pode traduzir-se em reforço da poupança e do investimento. Em terceiro lugar, é assumido pela perspectiva supply-sider que o consumo é determinado parcialmente pelos preços correntes mas também pelos preços antecipados. Se se concretizar a esperada redução das expectativas inflacionistas, dar-se-á a transferência de meios para fins de poupança, em prejuízo do consumo corrente. Com efeito, a intuição e a experiência demonstram que o declínio das taxas de poupança dá-se em resultado de uma antecipação de preços elevados e das perspectivas de erosão do poder aquisitivo das poupanças. No que concerne ao investimento, os efeitos esperados das acções desencadeadas no plano da Economia da Oferta, ao reduzirem as expectativas inflacionistas e os factores de incerteza, apontam, tendencialmente, para uma diminuição das taxas nominais de juro. Tendencialmente, a expansão do crédito interno faz-se sentir pelo reconhecimento, pelos agentes económicos, do aumento das possibilidades de investimento, face às expectativas de reduzidos custos antecipados em contrapartida de rendimentos esperados acrescidos. Em síntese, ao protagonizar-se uma redução do pendor consumista, que a inflação, os códigos fiscais e as políticas económicas de stop-and-go corporizaram no sistema, assume-se a responsabilidade pelo encorajamento da poupança e do investimento, junto das famílias e das empresas.

a-1) Trabalho e Salários.

Aperceber a incidência dos impostos sobre os salários e o trabalho é uma preocupação que tem marcado as produções teóricas de muitos autores, quer no mundo jurídico, quer ao longo da História do Pensamento Económico. É praticamente consensual a ideia de que, se as taxas de imposto são elevadas, uma proporção significativa da população vê-se atraída a abster-se de trabalhar «produtivamente». Ou seja, os efeitos

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desencorajadores do trabalho, para uma mesma carga fiscal, são mais importantes do que os eventuais benefícios redistributivos que lhes apontam os economistas de formação demand sider. A demonstração da perspectiva da Economia da Oferta, quanto a, esta matéria, pode ser ilustrada com alguma evidência empírica relativa às acções de um agente económico qualquer – por hipótese o Professor de Direito J. B. G. (adiante JBG) – em face de três situações teóricas: (a) um sistema sem impostos; (b) um sistema de imposto único; (c) um sistema de impostos progressivos sobre o rendimento. Num mundo totalmente libertado desse espartilho que são os impostos, o Prof. JBG, indivíduo racional, com um comportamento racional e no pleno gozo das suas faculdades mentais, em face de um determinado salário e de um número limitado de horas disponíveis por dia (até um máximo, óbvio, de 24 horas), decide afectar uma fracção «L» desse seu dia a actividades não-mercantis (o «lazer»), dedicando o tempo restante a actividades produtoras de rendimento, numa fracção «T» de «trabalho». Simultaneamente, configura-se-lhe a oportunidade de despender uma porção do rendimento auferido, «Wc», em consumo corrente, destinando a restante verba a poupança, «Ws», com vista à formação de capital ou a consumo futuro. Como não se vê confrontado com o espectro de pagar um imposto, JBG não sente qualquer interferência exógena à sua vontade, na afectação que faz dos seus recursos e dos seus meios, fazendo reflectir nas suas decisões e escolhas, integralmente, as suas prioridades e preferências. Dir-se-á que JBG usufrui de um nível óptimo de satisfação. No fundo, as suas decisões e escolhas entre trabalho e lazer entre consumo presente e consumo futuro, fazem-se, exclusivamente, por reporte a dois «tipos» de preços relativos: - a taxa de salário, que é também o preço de uma hora de lazer; - a taxa de juro de mercado, que é também o preço do consumo presente sendo que o preço de uma unidade monetária (u.m.) qualquer, dispendida no presente, corresponderia a um juro auferido depois, se essa u.m. tivesse sido poupada durante, p. ex., um ano, e só depois gasta. São, de facto, na prática, estes «preços relativos» que guiam todos os indivíduos para as escolhas económicas óptimas entre trabalho e lazer e entre consumo presente e futuro, dadas as suas preferências e as próprias circunstâncias. Haverá, por conseguinte, em termos de oferta de trabalho e de quantidade de poupanças disponíveis para nova formação de capital, um nível óptimo, no sentido que se realiza uma satisfação colectiva máxima. É, todavia, aceite que, nas actuais circunstâncias, mesmo uma economia de mercado necessita de determinados serviços, proporcionados pelo governo, para operar. A definição e a sustentação legal dos direitos relativos à propriedade privada são vitais para o funcionamento dos mercados. Todavia, para financiar um sector público, qualquer que seja a sua dimensão, necessário é desviar recursos gerados pela iniciativa privada. Nestas circunstâncias, às autoridades governativas oferecem-se várias possibilidades para fazer face às despesas contraídas: cobrar (mais) impostos, emitir papel-moeda inconvertível (e invariavelmente não apoiado em qualquer reserva metálica), contrair empréstimos internos ou agravar a dívida pública externa, etc. Várias são as consequências e os efeitos que estes instrumentos (e as suas combinações) têm traduzido na gestão corrente dos assuntos económicos, na dinâmica de crescimento e nas próprias escolhas económicas individuais. Não obstante, de uma forma ou de outra, directa ou indirectamente, a sua expressão mais evidente decorre das ineficiências e bloqueamentos introduzidos pelos impostos. Em geral os impostos assumem um carácter distorcionário, na medida em que a massa colectável não é fixada independentemente das actividades económicas dos contribuintes. De facto, os sistemas de imposto único podem não influenciar grandemente os comportamentos económicos dos contribuintes e as suas escolhas neste ou naquele sentido. Entretanto, o acto de tributar gera sempre um efeito de descompensação das iniciativas conduzidas pelas forças vivas da sociedade, incentivando a sua fuga para actividades não-mercantis, enquanto estas permanecerem «livres», de tributação. A consequente diminuição do bem-estar e da produtividade faz-se sentir em termos de «desperdício», no sentido em que os contribuintes desembolsam sempre mais, em prejuízo de um maior nível de satisfação, do que usufruem em termos pecuniários (e de satisfação) por parte do governo.

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Em consequência, competiria às autoridades governativas a adopção e «implementação» de um sistema fiscal e uma política que minimizasse os efeitos de uma carga tributária excessiva. A concepção supply-sider, quanto ao impacto indesejável dos impostos sobre as escolhas individuais e, particularmente, sobre as decisões relativamente ao trabalho versus lazer e poupança versus consumo, constitui-se, assim, como uma das proposições fundamentais em que alicerça o seu edifício teórico. A ilustração desta afirmação encontra significado na leitura que a própria realidade concreta e a matemática financeira nos oferece. A evidência dos factos demonstra que, na realidade, um imposto lançado sobre os rendimentos de trabalho faz declinar a taxa de salário líquido auferido pelos trabalhadores, contribuindo para o avolumar de distorções nas escolhas individuais entre actividades tributáveis («trabalho») e não tributáveis/não mercantis («lazer», «economia subterrânea», «trabalho negro»,...) – senão, atente-se às presumíveis reacções do Prof. JBG em face das situações alternativas que se configuram nos sistemas supra referidos: - num mundo sem impostos (situação a), JBG ao ser remunerado em 10 u.m. por hora de trabalho, pode optar pelas seguintes alternativas: O u.m. de rendimento (y) e 24 horas de lazer (L); 10 u.m. (y) e 23 (L);...; 120 u.m. (y) e 12 (L);...; 240 u.m. (y) e 0 (L). Por aqui se verifica que se JBG decidir trabalhar 12 horas, aufere um salário de 120 u.m. por dia e goza 12 horas de lazer. Ou seja, para o Prof. J.B.G. cada hora adicional de lazer equivale-lhe a uma contrapartida de 10 u.m. Dir-se-á que a sua decisão dependerá exclusivamente da satisfação, «do gosto, da fortuna e do capricho» (David Ricardo), que uma determinada combinação rendimento/lazer lhe oferece. - num sistema em que o governo faça a cobrança de um imposto único per capita de 60 u.m., recaindo, também, naturalmente, sobre JBG, não se constata qualquer alteração no preço do lazer relativamente ao rendimento. Com efeito, a sua incidência apenas provoca um «empobrecimento» de JBG, relativo à colecta de que é vítima. Ou seja, a fim de satisfazer tal encargo, JBG é forçado a usufruir não só de um menor vencimento líquido, como também, de um menor tempo de lazer. Trata-se, afinal de um «efeito-rendimento» negativo que reduz o grau de satisfação (o nível de vida) de JBG, na exacta medida das 60 U.M. que entrega ao governo. Nestas circunstâncias a alternativa óptima escolhida por JBG seria a combinação 90 u.m. (y) e 9 (L). Com efeito, JBG teria de trabalhar 15 horas, para ganhar 150 u.m; das quais se veria espoliado de 60 u.m., restando-lhe 90 u.m. para os seus gastos correntes. Se o governo correspondesse com uma contrapartida de 60 u.m. em bens e serviços beneficiando JBG, não se faria sentir sobre ele uma excessiva carga fiscal (ou custo de eficiência) - no entanto, na prática, JBG vê-se privado não só de rendimento, como de horas de lazer. Em suma, o «efeito-rendimento» destes impostos conduz os indivíduos a ajustar o seu rendimento/lazer numa mesma direcção, degradada em relação à situação (a). Supondo que se revela necessário colectar 60 u.m. de rendimento, através de um imposto de 50% sobre o salário-hora do Prof. JBG, daqui decorre que a taxa de salário líquida de impostos passaria a ser de 5 u.m. por hora e, consequentemente, o leque de opções rendimento/lazer passaria a apresentar-se como se segue: 0 u.m. (y) e 24 (L); 5 (y) u.m. e 23 (L);...; 60 u.m. (y) e 12 (L); 65 u.m. (y) e 11 (L); 70 u.m. (y) e 10 (L); 75 u.m. (y) e 9 (L);...; 120 u.m. (y) e 0 (L). Uma vez mais, JBG poderá revelar as suas preferências escolhendo a combinação 60 u.m. (y) e 12 horas (L), a opção que maximizaria a sua satisfação no contexto destas novas circunstâncias. Isto é, JBG trabalha durante 12 horas, suportando uma taxa de imposto correspondente a 60 u.m. do seu rendimento bruto. Com efeito, este imposto, ao incidir sobre a taxa de salário vencida por JBG, vai reduzir-lhe também o preço de lazer para 5 u.m. por hora. Quer isto significar que JBG retira uma maior satisfação para si próprio se substituir lazer por rendimento até ao ponto em que a última hora de lazer e a última hora remunerada assumam igual importância para ele, de tal forma que, na prática, ele passa a trabalhar 3 horas menos do que as 15 horas óptimas que conheceu no sistema (b) - o «efeito-substituição» faz-se sentir... «Efeito-Substituição» que representa a carga fiscal excessiva, incidindo sobre a taxa de salário, que impossibilitou a escolha óptima de JBG e o forçou a aceitar um nível de bem-estar mais baixo do que o que havia conhecido sob um sistema de imposto único.

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Se bem que JBG ofereça ainda 12 horas de trabalho, a ineficiência da sua prestação pode reflectir-se por uma maior improdutividade, absentismo e, concretamente, na distorção das escolhas económicas que lhe concernem. Ou seja, um dos primeiros problemas que se oferecem a JBG será o da opção, em face das circunstâncias que lhe são impostas, pela fiscalidade, entre efectuar o seu tempo a «trabalho doméstico» ou a «trabalho mercantil». Ora, tal passa por uma clarificação destes conceitos e por uma compreensão dos factores que levam à sua ocorrência. Nessa tarefa, a «Supply-Side Economics» começa por assumir que a «produção doméstica» pode ser definida, em sentido estrito, como a produção, decorrente de uma actividade não-mercantil, não remunerada oficialmente, pelos membros da família, de bens e serviços susceptíveis de encontrar substitutos no mercado. Isto é, todo um conjunto de actividades que vão desde as tarefas de uma dona-de-casa, dos «biscates» do mecânico de automóveis, da casa clandestina construída pelo pedreiro, até à assessoria económica do economista a processos de contratação colectiva de índole salarial ou de revisão do clausulado global, à «escrita» do contabilista, à programação que o técnico de informática faz no seu «micro» em casa, ao parecer do jurista, etc..., enfim toda aquele miríade de relações para-económicas, internas à família ou externas à «legalidade» instituída, que não são mediatizadas pela economia oficial, mas pelo Mercado no sentido amplo do termo... no seu verdadeiro sentido. Tomada na sua acepção mais primária, mas menos aparente, a «actividade doméstica» produz bens e serviços que não são objecto de uma troca institucionalizada e a sua afectação não é acompanhada pela formação de um «preço normal». Está-se perante uma «forma acidental» cuja valorização se faz no espaço da «economia subterrânea» e se exprime num «preço sombra» que vigore na realidade, embora o trabalho que o cristaliza não seja oficialmente remunerado nem mesmo contabilizado. Aliás, a sua conceptualização pode fazer-se no quadro da análise da «Teoria da Escolha do Consumidor» (∗) que, no caso vertente, pode ser aplicada a um bem particular – o Trabalho – com o objectivo de se inserir a Teoria da Oferta de Trabalho na Economia da Oferta. Uma teoria que, neste contexto, se focaliza na arbitragem que os indivíduos (identificados com o Prof. JBG) fazem entre lazer e trabalho (subentendido como trabalho remunerado e tributado). Nessas condições, a função da utilidade não dependerá de dois bens mas do rendimento — que permite adquirir bens — e do tempo de lazer (subentendido como tempo de descanso ou tempo de trabalho «não-oficial»). No fundo, como vimos, a afectação do tempo entre o lazer e o trabalho remunerado depende da taxa de salário, dos impostos, e da utilidade relativa do lazer e dos bens. Se nos abstrairmos da supracitada «actividade doméstica propriamente dita», no contexto da Teoria do Consumidor e da oferta de trabalho, ter-se-á que o indivíduo enquanto consumidor é considerado exclusivamente como o agente que adquire bens (ou não) e enquanto ofertante de trabalho, como o agente que faz face à dicotomia: trabalho/lazer. Uma arbitragem que é só por si só elucidativa da importância que encerra para a Supply-Side Economics e que pode ser esquematizada graficamente. Entretanto, há que atender ao facto de que a oferta de trabalho não é determinada exclusivamente por um cálculo individual; os recursos da família são tomados em consideração na escola entre «actividade doméstica» e «actividade mercantil», designadamente no que concerne ao caso do cônjuge. Por outro lado, importa reconhecer que a oposição dicotómica positiva entre lazer e trabalho remunerado já não preenche a complexidade que o sistema de economia subterrânea oferece à

∗ Vd., a este propósito, por exemplo:

- BECKER, Gary S., «A Theory of the Allocation of Time», in The Economic Journal, Setembro, 1965.

- GRONAU, Reuben, «Leisure home production and Work: the theory of the allocation of time revisited», in Journal of Political Economy, nº 6, Vol. 85, Dezembro, 1977.

- LANCASTER, Kelvin J., «A new approach to Consumer Theory», in The Journal of Political Economy, Fevereiro, 1966.

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realidade concreta. Com efeito, nem todo o tempo que não de trabalho é de lazer, nem todo o tempo que não de lazer é tempo de trabalho remunerado por uma actividade «mercantil».

Um bom exemplo desta nova visão de atitudes comportamentais do agente económico é oferecido pelo caso da mulher casada, tradicional, portuguesa, que não se reconhece confrontada com a alternativa de trabalho mercantil, v.g., lazer, em virtude do seu trabalho de «dona-de-casa» … a sua oferta de trabalho não depende, de facto, apenas da comparação da desutilidade do trabalho e de uma taxa de salário. Importa, por conseguinte, reconhecer que a possibilidade de uma substituição entre os produtos e os serviços mercantis e não-mercantis vai conduzir a Supply-Side Economics a uma profunda reformulação da Teoria da Oferta de Trabalho e do Direito Fiscal, maxime na sua “codificação” dos Impostos incidentes sobre os rendimentos das pessoas singulares. Como se evidenciou atrás, o trabalho total (trabalho «remunerado» e trabalho «doméstico») e o trabalho remunerado não reagem de forma idêntica às variações de rendimentos, por exemplo, por efeitos dos impostos. Por exemplo, uma diminuição de impostos que tende a aumentar os rendimentos (e os salários) vai ter influência sobre a repartição do tempo entre trabalho total e lazer, atendendo à utilidade respectiva do lazer e dos bens. Bem assim, um aumento de salários das mulheres casadas tende a influenciar a sua opção entre trabalho remunerado e trabalho doméstico, em função do jogo da substituição entre actividade mercantil e actividade não mercantil. Do mesmo modo, um aumento de salários (para uma produtividade doméstica dada) leva, por efeito da suposta diminuição supply-sider dos impostos, a um aumento do custo de oportunidade do trabalho «doméstico» (e/ou do lazer). Com efeito, a produção não-mercantil torna-se relativamente mais onerosa do que a aquisição correspondente de bens de mercado, i.e., os bens mercantis são relativamente menos caros do que os que não são objecto de um mercado, quando expressos em termos de horas de trabalho. Nestas circunstâncias, poder-se-á aperceber que uma variação dos salários, provocada por medidas supply-siders, tenderá a deslocar a fronteira entre a produção doméstica e o recurso a mercadorias. Revelam-nos, ainda, estudos sobre o efeito dos impostos sobre os rendimentos salariais auferidos pelos agentes económicos dos dois sexos (∗) que, p. ex.: a oferta de trabalho dos homens casados pode estar ligada negativamente ao salário (o que corresponde ao clássico comportamento descrito por L. Robbins de que o crescimento da procura de lazer é consecutivo ao aumento do rendimento). Em contrapartida, as taxas de actividade das mulheres casadas estão positivamente associadas às variações correspondentes dos salários: ao efeito de rendimento sobre a procura de lazer vem combinar-se uma substituição acrescida do trabalho doméstico, por efeito das despesas, em

∗ Q. vd.:

- GRAMM, Wendy Lee, «Household Utility and the Working Wife», in The American Economic Review, Março, 1975.

- GRONAU, Reuben, «The Intrafamily Allocation of Time: The Value of the Housewives Time», in The American Economic Review, Setembro, 1973.

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compras de material doméstico, em utilização de serviços...) tornados possíveis por um trabalho remunerado suplementar. Dir-se-á que a investigação sobre os motivos que regulam a oferta de trabalho estará ainda por se fazer... e esta lacuna que a Supply-Side Economics procura suprir adquire um significado particular se se atender que a perda de bem-estar dos contribuintes, para além da perda de rendimento, apenas se tem perspectivado pela ênfase dado ao efeito líquido dos impostos sobre o rendimento na oferta agregada de trabalho. Estudos concretos têm demonstrado, à evidência dos factos (∗), que uma diminuição da taxa de salários líquida de impostos induz tendencialmente um efeito-substituição desfavorável ao «esforço de trabalho» e um efeito-rendimento favorável àquele. Do mesmo modo, entende-se que uma redução dos impostos sobre o rendimento, ao aumentar a taxa de salário líquido, induz um efeito-substituição favorável ao «esforço de trabalho» e um efeito-rendimento desfavorável. Há, todavia, quem argumente que uma redução dos impostos sobre o rendimento não se traduz, no imediato, num significativo efeito-rendimento. Norman Ture, como a generalidade dos analistas supply-siders, sustenta que naquelas circunstâncias, um efeito-rendimento ou riqueza é impossível no imediato, em virtude de que o nível das extracções governamentais permanece invariável. Prevalece, com efeito, o entendimento de que o efeito-substituição «prevalece» sobre o efeito-rendimento, de tal modo que uma redução das taxas de imposto sobre o rendimento provocará em simultâneo, um aumento da oferta agregada de trabalho, aliviando a eventual perda de produtividade que adviria para a economia em caso contrário. Ainda no que concerne ao efeito dos impostos sobre a oferta agregada de trabalho, Harvey Rosen acentuou que, para além das horas potenciais de laboração existem «at least three important dimensions of labor supply» que «may be influenced by taxes: (a) lifetime hours of work and timing of retirement; (b) intensity of work effort; and (c) quality of work effort”. Analisando cada uma destas facetas, Rosen concluiria que, relevando da distinção entre «oferta de trabalho» e «horas de trabalho», «there may be a temptation to increase relative tax rates on labor because hours of work appear to be inelastic in supply. But hours of work are just the tip of an iceberg that is potentially very deep, and this may be a misguided policy». Importaria pois que, dada a necessidade das sociedades modernas de incentivar os investimentos em capital humano, os «makers of tax policy (...) should proceed with caution when it comes to taxing labor» (∗∗). Conclusões que são, aliás, concorrentes com as de Jerry A. Hausman (que, não sendo, tal como H.S. Rosen, um supply-sider, considera...), quando refere: «It is a common misconception to assume that a tax is not distortionary if it has a little or no effect on market behavior. On the contrary, taxes affect economic efficiency through the compensated substitution effect. (Even) if the income effect and the substitution effect offset each other exactly, a tax could still leave individuals much worse off than another tax that altered market behavior would» (∗∗∗). O efeito dos impostos sobre as famílias faz-se sentir, sem dúvida alguma, em primeira instância, sobre as decisões trabalho/lazer. Foi o que atrás, em síntese, se perspectivou. Conclusões que são, aliás, corroboradas por uma vasta evidência empírica, objecto de estudos vários, visando, exactamente, a sua inferência estatística e confirmação econométrica (∗ν).

∗ Vd. estudos vários in AARON, Henry J. e PECHMAN, Joseph A. (Editors), How Taxes Affect Economic Behavior, The Brookings lnstituion, (Col. «Studies of Government Finance»), Washington D.C., 1981, designamente no capítulo relativo à Labor Supply da autoria de Jerry A. HAUSMAN, págs 27 a 83. ∗∗ ROSEN, Harvey S., idem, pág. 172. ∗∗∗ HAUSMAN, Jerry A., “Labor Supply”, in How Taxes Affect Economic Behavior, edited by Aaron, H.Y. e PECHMAN, Joseph A. (The Brookings Institution, Washington D.C., 1974, págs. 119 a 237. ∗ν São exemplo: - BREAK, George F., «The Incidence of Economic Effects of Taxation», in The Economics of Public Finance, Essays by Alan S. Blinder, et. al., The Brookings Institution, Washington D.C., 1974; - KOSTER, Marvin, «Effects of Income Tax on Labor Supply», in Taxation of Income from Capital, ed. by A. C. Harberger and M.I. Bailey, The Brookings Institution, Washington D.C., 1969, págs. 1 a 234.; BOSKIN, Michael I., «The Economics of Labor Supp1y», in Income Maintenance and Labor Supply: Econometric Studies, ed. by G1en G. Cain and Haro1d W. Watts, Academic Press, New York, 1973, págs. 163 a 181. - HAUSMAN, Jerry A., «Income and Payroll Tax Po1icy and Labor Supp1y», Working Paper nº 160, Nationa1 Bureau of Economic Research,

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a-2) Juros e “Aplicações de Capital”

Há, todavia, entretanto, que atender aos efeitos que os impostos (e a variação das suas taxas de incidência...) produzem sobre decisões que concernem também às famílias, mas que se reflectem de algum modo na vida das empresas e, enfim, da própria economia, pela via da sua acção sobre a formação de capital. Em causa estão, por conseguinte, as decisões consumo/poupança e a sua repercussão sobre o investimento, a formação de lucros, etc... o que nos levaria para uma análise do impacto dos Impostos sobre os Rendimentos das “aplicações de capitais” (vulgo, os Rendimentos da “Categoria E”, do CIRS), que, todavia não sendo objecto central deste texto, se pode também perspectivar a questão da “progressividade”. Em síntese, é de igual modo geralmente aceite que um imposto colectado sobre um rendimento, que inclua juros, dividendos e outras retribuições provenientes de poupanças e investimentos, faz, naturalmente, diminuir a recompensa líquida por se «adiar» o consumo presente. Ou seja, ao se baixar o «preço» do consumo presente, o tal imposto, vai distorcer as decisões individuais, afastando-as do ratio óptimo, atingível num mundo sem impostos, entre consumo presente e consumo futuro, para valores inferiores da taxa de poupança (para consumo futuro), em benefício de um maior (e menos ponderado) consumo presente. Poder-se-á afirmar que, em certa medida, a taxa de juro de mercado o «preço» do consumo presente. Isto no sentido de se assumir que, se a taxa de juro por ano for, para simplificar os cálculos, de 10%, o preço de uma unidade monetária (u.m.) dispendida no presente corresponde a um juro de 0.10 u.m. que se poderia vencer se aquela u.m. fosse poupada por um período de um ano e, só então, gasta. Se, nesta situação, se assumir ainda que é criado um imposto (ainda mais “socializante” do que as actuais “Taxas Liberatórias”) de 50% a incidir sobre tal rendimento, ter-se-ia que o preço efectivo daquela u.m., gasta em consumo presente, diminuiria para 0,05 u.m.. 0 impacto deste decrescimento sobre as duas decisões alternativas, ou consumo presente ou consumo futuro, depende de novo, do jogo dos efeitos-substituição e rendimento. Ou seja, retomando o exemplo dos dilemas existenciais do Prof. J.B.G., que dispõe de um rendimento diário de 60 u.m., dir-se-á que, antes da introdução de um imposto sobre os seus eventuais juros e rendimentos, as suas opções, entre consumo imediato e poupança até ao ano seguinte (na data do vencimento de tal juro), poderão situar-se entre: 0,00 u.m. de Cp e 66 u.m. de Cf;...; até 60 u.m. de Cp e 0,00 de Cf – representando Cp e Cf respectivamente, o consumo presente e o consumo futuro. Supondo que JBG decide gastar 30 u.m. no momento presente e 33 u.m. um ano depois, o ratio resultante seria óptimo, entre 30 e 33 u.m., para JBG, em termos de satisfação e de bem-estar, num paraíso fiscal de um sistema sem impostos. Porém, com a introdução de um imposto de 50% sobre os rendimentos dos juros, o leque de opções de JBG já vai variar como se segue: 0,00 u.m. (Cp) e 63 u.m. (Cf);...; 30 u.m. (Cp) e 31,50 u.m. (Cf); 31 u.m. (Cp) e 30,45 u.m. (Cf); 32 u.m. (Cp); 29,40 (Cf),..., 60 u.m. (Cp) e 0,00 u.m. (Cf). De imediato se constata que a sua decisão óptima (30 u.m. de Cp e 33 u.m. de Cf) já não é exequível. De facto, o imposto distorceu completamente os preços relativos do consumo presente e do consumo futuro, para além de deixar a JBG um rendimento líquido menor. Nestas condições, resta a JBG optar pela combinação que, não sendo óptima, é a que lhe oferece uma maior satisfação em face da extorsão de que foi vítima: nunca inferior a 30 u.m. (Cp) e nunca superior a 31,50 u.m. (Cf). Se, porventura, a mesma u.m. de rendimento fosse colectada por um imposto que, por não influenciar os preços relativos, tivesse um efeito neutro na decisão de escolha de JBG entre consumo presente e futuro, ele teria então um leque de opções diferente, das quais escolheria, p. ∗ν (cont.) Cambridge, Ma., Dez. 1980. - PECHMAN , Joseph A., Federal Tax Policy , The Brookings lnstitution, Washington D.C., 3rd ed., 1977. - ROSEN, Harvey S., «Tax Illusion and the Labor Supp1y of Married Women”, in Review of Economics and Statistics, vo1. 58, Maio, 1976, págs. 167 a 172.

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ex., a combinação 28,50 u.m. (Cp) e 31,35 u.m. (Cf) – uma combinação que representa aproximadamente o efeito-rendimento deste imposto neutro, mas que, apesar de tudo, impõe a JBG um rendimento ainda mais baixo para despesas em consumo presente e consumo futuro. Voltando ao efeito do imposto sobre o rendimento é nítida a distorção introduzida pelo efeito-substituição: à medida que o preço de consumo presente diminui, JBG tende a fazer aumentar o montante de rendimento afecto a consumo presente, em decorrência do facto de o efeito-substituição suplantar o efeito-rendimento, o que faz com que o efeito líquido seja negativo sobre a poupança para consumo futuro. Também a este nível existe evidência empírica comprovativa destes factos (∗). Tem-se, por conseguinte, uma certa similitude nos efeitos que os impostos provocam sobre as decisões dos agentes económicos, pela alteração dos preços relativos do trabalho e do lazer, de consumo futuro e presente. Com efeito, de um modo ou de outro, as distorções são (ou podem ser) acentuadas, quando as taxas de imposto escalam e escavam a vida económica, agravando as subsistências e as oportunidades de quem nela opera, afectando de forma deficiente os recursos em capital e horas de trabalho, diminuindo o bem-estar social,… Existe, pois, um certo paralelismo na análise do efeito dos impostos sobre as famílias e as empresas, sobre o trabalho e o capital. Aliás, como o reconhece Martin Feldstein: «A tax may alter saving rate by changing the net yield on capital and by redistributing disposable income among groups with different savings propensities. A tax on labor income may also affect the stock of capital indirectly: if a tax on labor income reduces the supply of labor, it may also, by increasing the capital – labor ratio and thus decreasing the yield on capital cause a reduction in the rate of capital accumulation» (∗∗). O problema da formação de capital põe-se exactamente no problema, sentido pelas famílias e pelas empresas, de afectar os meios financeiros disponíveis ou ao consumo imediato ou ao consumo futuro – o que é o mesmo que dizer, à expectativa de um rendimento suplementar ulterior (o investimento). Lícita é, portanto, a constatação de que um aumento da fiscalidade desencoraja a poupança e os investimentos. É o que também demonstra Milton Friedman, ao referir-se ao sistema fiscal britânico, propiciador não de incentivos ao comportamento «desenvolvimentista» mas do consumo luxuoso e «ostentatório», ironizando com o exemplo que se cita, da tradução francesa: «L’une des choses qui frappe toujours comme un paradoxe les visiteurs étrangers en Grande-Bretagne, c’est le grand nombre de Rolls Royce dans un pays au bord du désastre et où le gouvernement est voué depuis de nombreuses années à l’égalitarisme. Comment se fait-il qu'il y ait toutes ces Rolls Royce? La réponse est très simple, comme vous le savez mieux quelconque. C'est la façon la moins coûteuse pour quelqu'un qui possède une fortune d’essayer de la conserver tout en assurant son transport. Si au li eu d'investir cet argent dans une Rolls Royce, on le place dans les valeurs produisant un revenue, la plus grand partie de celui-ci va au percepteur, alors qu'il ne coûte rien d'avoir une Rolls Royce, quelqu'un investit, disons 30.000 L. Sterling dans une Rolls Royce. S'il investit cet argent dans des valeurs procurant une revenue, disons de 15%, il aura un ∗ Vd., p. ex.:

- FURSTEMBERG, George M. Von (Ed.), Social Security versus Private Saving, Ballinger, Cambridge, Ma., 1979;

- HARBERGER, Arnold, «The Measurement of Waste», in American Economic Review, vol. 54, Maio, 1964, págs. 58 a 76.

- WRlGHT, Colin, «Saving and the Rate of Interest», in Taxation of Income from Capital, ed. by A.C. Harberger and M. Y. Bailey, The Brooking Institution, Washington D.C., 1969, págs. 275 a 295.

- ANDO, Albert e MODIGLIANI, Franco, «The Life Cycle Hypothesis of Saving: Agregrate Implications and Tests», in American Economic Review, vol. 53, Março, 1963, págs. 55 a 84.

- BOSKIN, Michael I., «Taxation, Saving, and the Rate of Interest», in Journal of Political Economy, vol. 86, nº 2, pt. 2, Abril, 1978, págs. 53 a 527. ∗∗ FELDSTEIN, Martin, Capital Taxation, Harvard University Press, Cambridge, Ma., USA, 1983, pág. 377.

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rendement brut de 4.500 Livres par an. S'il est dans la tranche fiscale de 98%, il ne lui reste que 90 Livres par an à dépenser après impôts. II ne lui coûte donc que 90 Livres par an pour profiter de sa Rolls Royce toute l'année! C'est la forme de transport la moins cofiteuse qu'il puisse acheter! Par-dessus un marché il a l'avantage d'un avoir qui conserve une partie de sa valeur en capital. S’il met cet argent dans des obligations d’Etat, cela se dépréciera chaque année, même en dehors de ce que l'Etat va lui prendre sous forme d'impôts. Donc, votre système fiscal décourage l'Epargne, et l'investissement. Il encourage la consommation gaspilleuse (ostentatoire)» (∗). Se há casos em que os exemplos são mais elucidativos do que a sua explanação teórica, este é, indubitavelmente, um deles. Torna-se, de facto, mais evidente que, se se operar uma redução da carga fiscal, não só se sentirá uma maior propensão à oferta de mão-de-obra como poderá resultar numa progressiva inclinação de composição da procura global no sentido do investimento. Como sustenta de novo Feldstein: «Since the individual consumes three distinct goods (i.e., leisure, first-period consumption, and second-period consumption), any tax other than a lump-sum tax) will impose at least one distorting wedge. The theory of the second best suggests that since all distortions cannot be eliminated (i.e., any feasible tax wi1l cause some distortion), all of the usual first-order efficiency condition should generally be violated (∗∗). Conclusão que, reza a História do Pensamento Económico, havia já sido sustentada por Frank P. Ramsey, em 1927, ao sublinhar que, quando um sistema de impostos único não é possível (ou, o que é o mesmo, como é impossível tributar o lazer), então «todas as mercadorias deveriam ser tributadas a diferentes taxas (positivas e negativas) dependentes das suas elasticidades-procura relativas e elasticidades cruzadas» (∗∗∗). Ou seja, de novo centrados no problema original que norteou Supply-Side Economics nas suas incursões pelas finanças pública e que alicerça o raciocínio implícito à «Curva de Laffer». Considerando que as famílias utilizam dois factores – capital e trabalho – para produzir utilidades «domésticas» (no sentido de que são utilidades produzidas de forma tal que não sejam sujeitas a um imposto), a oferta desses factores de produção no mercado só dependerá, de facto, das taxas marginais de imposto a que ficarão obrigados. Quanto mais baixo for o rendimento auferido depois de impostos, pela oferta de capital e trabalho (menor a capacidade de procurar utilidades nesse mercado), maiores serão as hipóteses de as famílias acrescerem a sua satisfação dirigindo uma parte dos seus recursos produtivos para a produção de utilidades «domésticas» não sujeitas a imposto. Afinal, a leitura de uma relação tão velha, como incompreendida, na História do Pensamento Económico – e que o Direito contemporâneo despreza –, que se consubstancia em exemplos vários, como os apresentados por Milton Friedman (∗ν) ou por Paul Craig Roberts (ν), demonstrativos da existência de uma relação «especial» entre as receitas fiscais e as taxas de imposto... Uma relação cuja leitura integral só se pode, todavia, fazer pela observação minuciosa da célebre «barriga desenhada num guardanapo»: a “Laffer Curve”.

b) O impacto dos Impostos sobre a economia e a “Curva de Laffer” Como peça central que alicerça o edifício teórico que a Supply-Side Economics vem construindo, apresenta-se, normalmente, a chamada «Curva de Laffer» – uma ideia que configura a base da sua concepção de «Efeitos de Incentivo». ∗ FRIEDMAN, Milton, Contre Galbraith, ed. Economica. Paris. 1977. págs. 46-47 (os itálicos são do original). ∗∗ FELDSTEIN, Martin, «The Welfare Cost of Capital Income Taxation», in Journal of Political Economy, vol. 86, nº 2. pt. 2, 1978, pág. 532. ∗∗∗ RAMSEY, Frank P., «A contribution to the Theory of Taxation», in Economic Journal, vol. 37, Março, 1972, págs. 47 a 61. ∗ν FRIEDMAN, Milton, Contre Galbraith, op. cit., págs. 47-48. ν ROBERTS, Paul Craig, «The Breakdown of the Keynesian Model», in The Public Interest, nº 52, Verão de 1978.

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Expressão de uma das proposições fundamentais que estruturam esta nova corrente de pensamento económico, a «Curva de Laffer» tem-se assumido, igualmente, como a justificação teórica que sustenta a «revolução dos contribuintes», conferindo um conteúdo positivo a uma atitude que via a sua intussuscepção no sentimento popular, de uma forma algo acéfala e negativista. A simples reivindicação, contida no slogan – «Pagar Menos Impostos» – que se faz sentir de forma crescente na racionalidade económica dos mais diferentes povos, ganhava, assim, nos traços supply-siders da «Curva de Laffer», o perfil de uma política económica claramente definida: a redução massiva da pressão fiscal, visando encorajar o esforço de trabalho, o espírito empreendedor (de iniciativa) e a poupança, um meio de incentivar e relançar a actividade económica sem induzir inconvenientes desequilíbrios de funcionamento. Como ficou explícito no ponto anterior, um dos aspectos caracterizadores principais da teoria que se elege no seio da Economia da Oferta, concerne, exactamente, ao papel do Estado, ao seu modus faciendi em matéria de tributação e às reacções da «economia subterrânea». Supply-Side Economics, «Curva de Laffer» e Economia Subterrânea, novo «triângulo de Sultan» explicativo e terapêutico de alguns dos mais candentes problemas que têm afectado um crescimento económico, salutar e cadenciado, da generalidade das nações desenvolvidas do mundo democrático, ocidental. Elevadas taxas de desemprego e de inflação, combinadas com reduzidas taxas de crescimento real e défices estruturais dos orçamentos de Estado, impuseram aos economistas a necessidade de investigar alternativas teóricas e de política económica aos paradigmas dominantes – principais responsáveis pela situação gerada – em matéria de estabilização macroeconómica e de política financeira. De facto, as questões levantadas pela Supply-Side, na «Curva de Laffer» e pela Economia Subterrânea, fizeram atrair para o primeiro plano das preocupações dos economistas, os efeitos que os impostos (e as suas elevadíssimas taxas de incidência) produzem sobre a eficiência económica e a capacidade dos governos de sustentarem os ambiciosos (e inconsequentes) programas de «bem-estar social» estabelecidos ao longo da década de 70 deste século. Dir-se-á que, neste contexto, a «Curva de Laffer» funciona como uma «charneira» teórica entre uma realidade em decadência económica e uma alternativa de desenvolvimento, assente numa dinâmica evolutiva em que os factores da oferta e os impostos se «chocam» permanentemente e numa relação inversa. Desse confronto, dá Arthur B. Laffer relato, ao explicitar, numa primeira instância, que existe uma relação tendencialmente inversa entre as taxas de imposto, as receitas fiscais e a oferta dos factores produtivos, determinando que, para toda e qualquer receita fiscal dada, se poderão encontrar sempre associadas duas taxas de pressão fiscal à excepção de um ponto óptimo, ou seja, o ponto onde o rendimento do imposto é máximo. Tornava-se, desta forma, possível a constatação de uma curva, num referencial cartesiano, de eixos ortogonais monométricos, entre dois pontos que delimitam as taxas-limite de pressão fiscal: 0% e 100% – correspondentes aos pontos em que as receitas fiscais são, evidentemente, nulas. Situações meramente teóricas, já que, se por um lado o Estado não tributasse os seus cidadãos, estar-se-ia perante um sistema em que seria o próprio Estado a garantir a sua desaparição; por outro lado, se, em contrapartida, o Estado usasse o seu poder discricionário para sacar todo o rendimento disponível, isto é, se cobrasse impostos e taxas de 100% sobre aquele, como consequência ter-se-ia, identicamente, uma situação em que seria colectada qualquer receita. Nesta última circunstância, ponto de referência puramente teórico da Supply-Side Economics, toda a produção «oficial» cessaria em economia monetária, na medida em que «se cada vez que um pessoa se dirigisse ao seu local de trabalho recebesse uma factura do Governo em vez de um cheque do seu empregador, mais tarde ou mais cedo, tal pessoa, mesmo a mais rica e a mais motivada deixaria de lá voltar» (∗).

∗ Citação traduzida de WANNISKI, Jude, «Taxes, Revenues and the Laffer Curve», in Public Interest, nº 50, Inverno de 1978, págs. 3 a 16.

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Não serão, todavia, estas situações-limite que vão preencher as preocupações dos teóricos da Supply-Side Economics, mas, outrossim, os eventos que ocorrem no controverso segmento côncavo da «Curva de Laffer», que relaciona as taxas de imposição fiscal com os níveis de receita tributária. Conforme se pode verificar pela observação da figura seguinte, que representa a supracitada «Curva de Laffer», a sua configuração evidencia como taxas de impostos crescentes induzem, até certo ponto, rendimentos tributados crescentes (mas com acréscimos menos que proporcionais), a partir do qual, às taxas de imposto ainda crescentes se vão colectar rendimentos tributados declinantes:

Numa primeira leitura desta «Curva de Laffer», extrair-se-ia que, em qualquer circunstância, no espaço dos limites que a definem, existirão sempre duas taxas de imposto que produzem sempre o mesmo rendimento tributário, até ao ponto em que, para uma dada «pressão fiscal», representada pela taxa de imposto, t*, se atinge o máximo de receita tributária (configurada no Ponto E). Este Ponto E, de receita fiscal máxima, que se encontra no cume da Curva, apresenta uma elasticidade constante (e=l, delimitando as áreas «normal» e «proibitiva» da Laffer Curve, correspondentes às situações em que se verifica uma elasticidade da taxa de imposto/receita e<1, das que evidenciam uma elasticidade e>1). Em termos muito simples, esta a primeira mensagem contida na célebre «barriga» que Laffer desenhou num guardanapo de papel, num restaurante de Washington D.C., em 1974, e que, com esta forma, mais não seria do que uma extensão da concepção de «Curva de Procura», estática, de Alfred Marshall, tal como por ele exposta nos capítulos do Livro V dos Principies of Economics (1980). De facto, se se inverter o referencial cartesiano atrás figurado, verifica-se que a área sob a curva marshalliana da procura representa a receita total e o que lhe acontece quando o preço varia. Substituindo a taxa de imposto pelo preço no, agora, eixo das ordenadas; representando, no eixo das abcissas, o rendimento dos contribuintes que pagam impostos (os agentes individuais ou colectivos que operam na «economia subterrânea» não pagam, naturalmente, impostos!); reposicionando o eixo das «quantidades» em termos de receita total, ter-se-ía a representação marshalliana originária das relações entre receita (total, média e marginal), preço e quantidade, sob a forma, idêntica, que hoje a Laffer Curve assume. Torna-se, com efeito, possível extrair múltiplas inferências, da sua representação corrente e desta relativização a outras «curvas» e raciocínios económicos mais ou menos adjacentes, cuja importância extravasa mesmo o âmbito exclusivo da política fiscal.

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É o que se poderá confirmar se se alargar o modelo de análise da actividade económica a uma taxionomia abrangente não só do sector monetário «observável» oficial, mas também do sector monetário «não-observáve1» e dos não monetários «não-observáveis» (não oficiais). Neste sentido, constata-se que o montante de rendimento colectado por impostos, de acordo com uma estrutura determinada de taxas de imposto sobre o rendimento, depende de três influências básicas e distintas. Em primeiro lugar, e como se evidenciou atrás, existe um efeito Supply-Side dos impostos sobre os rendimentos fiscais. A matéria colectável é influenciada pela existência de impostos que alteram as escolhas de Trabalho e Capital e maximização da sua rentabilidade e produtividade. Em geral, é palpável a tendência para retirar capital e trabalho do mercado à medida que as taxas de imposto aumentam, conduzindo a um menor incentivo à participação empenhada na produção mercantil tributável. Como se constatou em a-1) o lazer e as actividades produtivas «não-oficiais» afiguram-se mais atractivas em face de elevadas taxas de impostos. Do mesmo modo, o uso de capital na produção «doméstica» e o abandono progressivo de projectos de investimento na economia «oficial» tendem a aumentar à medida que os rendimentos de capital gerados na produção mercantil são crescentemente tributados (vd. a-2). Dir-se-ía que a magnitude da construção supply-sider da matéria tributável dependerá do grau de substituição, em que se empenharam os proprietários de factores produtivos, na sua oferta entre sectores de produção «mercantil» e «não-mercantil». Substituição que, por seu turno, dependerá da elasticidade da oferta de trabalho e capital. Configura-se, pois, em acréscimo, uma segunda fonte de contracção de matéria colectável em resultado de impostos elevados. Mesmo que as ofertas de factores produtivos se revelem relativamente inelásticas, esta segunda fonte pode criar um limite aos rendimentos tributáveis abaixo de taxas de imposto de 100%. Isto é, em vez de retirarem os seus serviços de capital e trabalho de mercado, os contribuintes poderão continuar com as suas actividades, embora se recusem a declará-las para efeitos de imposto («fraude fiscal» como forma de evasão…). Comportamento «racional» de todo o agente económico, em circunstâncias marcadas por altas taxas de imposto, determinado pela ponderação do risco assumido por tal evasão em face do encargo a incorrer pela prestação do dever instituído de pagar um imposto elevado. Sendo certo e assumido que uma tal ponderação dependerá não só da moralidade pública (em face de um Estado (i)moral, consoante a «confiança» de que é depositário), mas também do grau de fiscalização do exactor, das suas atitudes ao nível da política global, da situação económico-financeira dos parceiros envolvidos, e, enfim, do próprio carácter do imposto. Influências que revelam a Curva de Laffer e dependem de um complexo leque de factores políticos e sociológicos que extravasam o mero campo económico. Isto, sem embargo de se verificar um terceiro efeito sobre a “Laffer Curve”, em resultado da progressividade do sistema fiscal. Efectivamente, enquanto num sistema de tributação proporcional sobre os rendimentos, uma redução global de impostos de 10% reduziria a taxa agregada de impostos em 10%, num sistema progressivo de impostos sobre o rendimento essa mesma redução de 10% sobre todas as taxas de incidência individuais só reduzirá a taxa agregada em 10% se não se produzir qualquer efeito de tal redução de impostos na matéria colectável. Isto porque se a matéria colectável aumentasse com a redução de impostos, sentir-se-ia um concomitante e endógeno incremento da taxa agregada de impostos que descompensaria o efeito do desagravamento fiscal sobre a carga tributária. Este relacionamento íntimo entre taxas de imposto e rendimentos tributados (e receitas fiscais) dependerá sempre destes três tipos de influências, que determinam, por sua vez, o formato específico de cada “Curva de Laffer”. Muito embora se possam construir tantas “Curvas de Laffer” como «curvas de procura», importa reflectir sobre o seu funcionamento intrínseco, para aferir da sua aderência à realidade concreta (∗). ∗ Existem, com este propósito de aplicar a “Curva de Laffer” à realidade dos países de economia de mercado, vários estudos e ensaios dos quais os mais interessantes são os aplicados às economias da Suécia, Grã-Bretanha, EUA e Alemanha.

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Assim, retomando a Figura 2, facilmente se deduz, por exemplo, que se a pressão fiscal for ligeiramente «aliviada», seja de 100% para 99%, seja de 100% para (ta2), gerar-se-ia, de imediato uma receita fiscal (igual à alcançada por uma taxa de imposto de apenas te1 %), passando-se de O2 para A2. Uma das eventuais consequências de tal acto seria o regresso de um certo número de unidades produtivas de sectores da «economia paralela» para o estado de «legalidade» da economia monetária. Com efeito, e apesar de se tratar de uma situação extrema, poderia, por um lado, acontecer que a produção depois de impostos fosse superior à que se geraria em «economia não-oficial» e, bem assim, por outro lado, que o risco da ilegalidade já não fosse compensador no «custo-benefício» de pagar impostos. Em consequência, no último caso, as receitas fiscais seriam positivas e iguais a 01A em decorrência da diminuição verificada das taxas de imposição fiscal. Entretanto, repita-se, ainda em termos teóricos, obter-se-iam os mesmos resultados do caso anterior (receitas fiscais em montante igual a 01A), se os responsáveis da política económica fixassem a taxa de imposto em (ta1) no Ponto A1 – ou em 1% no primeiro caso... No entanto, nestas circunstâncias, a produção poderia declinar, na medida em que alguns agentes económicos poderiam deixar-se atrair pelo «refúgio» da «economia subterrânea», pelo lazer ou por actividades de trabalho «doméstico». Ou seja, portanto, todos aqueles que estimam que a perda marginal de rendimento consecutivo ao imposto é superior aos ganhos extraídos da economia oficial (monetária, mercantil, legal...)... mas com o concomitante aumento de risco de poderem ser detectados nessa fuga. De qualquer forma, gerar-se-ia uma receita fiscal positiva, aplicada a uma produção estatisticamente contabilizada e positiva, em montante igual a 01A. Deste modo se verifica que as mesmas receitas fiscais, 01A, poderiam ser associadas a dois níveis distintos de pressão fiscal: ao ponto A1, que ilustra uma situação que poderá ser de elevada produção mercantil em correlação com um nível de pressão fiscal brando; ao ponto A2, que configura uma produção mercantil frouxa de uma carga fiscal exacerbada. O mesmo raciocínio deve ser aplicado à situação descrita pela receita fiscal 01, em associação em dois momentos, B1 e B2. Nestes termos, para qualquer ponto considerado, está implícito no traçado da Curva de Laffer que, à medida que se avança nessa linha côncava, a situação se vai progressivamente degradando. No entanto, se, numa primeira instância – definido no segmento de curva OE – um aumento no nível das taxas de imposto provoca um incremento de receitas tributadas (embora progressivamente menores), concorre a par de um aumento de incentivo à fraude e evasão fiscais e da atracção à fuga para actividades não sujeitas ao diktat fiscal. Numa segunda instância (inelutável para o Estado-Providência que governa ainda a generalidade das economias «modernas»), se a ineficácia governativa colocar a pressão fiscal a níveis que se situam na porção declinante da «Curva», a situação tenderia a agravar-se substancialmente, já que não só se gerariam «receitas marginais» negativas, como maior seria a atracção e o incentivo para a manifestação de desejos e fenómenos exógenos à «racionalidade económica» instituída (exigida!). Quer isto dizer, por exemplo, que a posição B2 deveria ser, na medida do possível, rejeitada, pois que o «preço» do financiamento da produção de utilidades públicas, em termos de produção de utilidades privadas perdidas, seria superior àquele que deveria ser pago em B1. Por outras palavras, o custo da opção pela produção de utilidades públicas é superior em B2 do que seria em B1. Poder-se-á, por conseguinte, desenhar uma «Área (Amplitude) Proibitiva» (Prohibitive Range) na Curva de Laffer (a tracejado na Figura 2), aquela onde as taxas de imposto seriam inutilmente elevadas. Nestas circunstâncias, uma sua redução teria como consequência um aumento (estatístico contabilizado, apenas) da produção e, correlativamente, das próprias receitas fiscais (real). Em simultâneo, a produção de utilidades públicas poderia, ela própria, também, ser aumentada. Sobre o outro trecho da «Curva», que confina a «Área (Amplitude) Normal» de variação das «taxas de imposto» versus receitas tributadas» (Normal Range), um agravamento dos níveis de imposto

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fiscal, terá por consequência um aumento das receitas colectadas – se, porventura, se passasse de A1 para B1, a produção de utilidades privadas será, em termos relativos, reduzida, em benefício da de utilidades públicas que é susceptível de ser incrementada (embora com acréscimos proporcionalmente, cada vez menores). Não obstante, realce-se, este aumento da pressão fiscal (considerado, teoricamente, como meio de financiar a produção de utilidades públicas) será apenas aceite, pacificamente, pelos agentes económicos, desde que estes não vejam por um lado, a sua actividade drasticamente reduzida (ou substituída por produção pública, subsidiada pelos impostos que pagam), no sentido em que o agravamento da fiscalidade seja anulado por um decrescimento proporcional do produto colectável, enquanto, por outro lado, se consigam aperceber da «correcção» da forma como o Estado despende estes proveitos sacados à iniciativa privada. Dois aspectos proeminentes se destacam nestas ilações da “Curva de Laffer” e levam à representação de uma outra curva que lhe é adjacente: elevadas taxas marginais de imposto e implícita ou explícita referência a elevadas elasticidades dos factores da oferta. Aliás, a ênfase dado aos fortes efeitos de incentivo das medidas supply-side para o relançamento da economia, implica que as elasticidades sejam reconhecidamente elevadas. Daqui se pode inferir também que, nestas circunstâncias, de elasticidades suficientemente elevadas, a economia em apreço pode perfeitamente situar-se na área proibitiva. Com efeito, a própria configuração da Curva de Laffer no espaço circunscrito na Figura 2, depende, como se viu, da elasticidade da oferta do factor produtivo tributado. Se a elasticidade fosse sofrivelmente baixa, o ponto maximizador da receita fiscal dar-se-ia a uma taxa de imposto relativamente alta, e inversamente, na situação contrária. Poder-se-á, mesmo, imaginar uma terceira dimensão no diagrama da Figura 2 para diferentes valores dados de elasticidade. Nesta nova construção gráfica, o ponto E, o cume da Laffer Hill seria convertido numa cordilheira, configurando todas as combinações entre a de uma baixa taxa de imposto e uma elevada elasticidade até à de uma elevada taxa de imposto e uma curva baixa de elasticidade. Configuração que gera uma nova curva que se poderia designar por “Curva de Laffer II”:

Isto é, qualquer combinação situada a sudoeste da “Curva” significa que um aumento de impostos aumenta (ainda que de forma cada vez menos acentuada) as receitas (normal range); a nordeste da “Curva” estar-se-ia na prohibitive range, área na qual nenhum governo, de forma consciente e racional, deveria operar, pelas razões atrás descritas. Na fronteira, correspondente ao ponto E da “Curva de Laffer II”, cada ponto desta «Laffer II» representa a taxa de imposto que maximiza a receita total para uma dada elasticidade. Ganha, por conseguinte, licitude a constatação de que o agravamento da pressão fiscal será somente «aceite» até que atinja o «pólo norte» da Curva de Laffer (ponto E da Fig. 2); para além deste ponto, todo e qualquer agravamento suplementar das taxas de imposto provocaria uma quebra tendencialmente acentuada do produto tributável, o que indicia que o acto da colecta traduz intenção (teórica e implícita) de financiar utilidades (ou desutilidades, desperdícios, ineficácia, improdutividade,...) públicas, que reduzem o montante das utilidades disponíveis na nação em que se efectiva tal processo.

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Conforme Alain Barrère deixa explícito: «Sabe-se que a economia cria utilidades para assegurar a satisfação de necessidades públicas. Para que a sua gestão permanente racional, a soma das utilidades que fornece, e a soma das utilidades que tributa, deverão no mínimo compensar-se; o que significa que a soma global das unidades privadas e públicas deve ser pelo menos igual à soma global das utilidades existentes anteriormente ao aumento da pressão fiscal. Senão, dever-se-ia concluir que, a arbitragem realizada pelo Estado teria sido nociva. Com efeito, exigências do financiamento da produção de utilidades públicas traduziam-se por uma perda, (pelo que) a economia privada poderia ser considerada como susceptível de fazer melhor emprego de recursos tributados sobre os resultados da sua actividade» (∗). O ponto E (Fig. 2), que configura a situação em que as rectas fiscais são maximizadas, será em consequência, também aquele em que a soma das utilidades produzidas, públicas e privadas, é máxima. Até se atingir o ponto E admite-se que os agentes económicos estão dispostos a assumir o financiamento de mais utilidades públicas (desde que estas se materializem a seu contento e não sejam concorrentes com as que são por si produzidas...) não rejeitando, pelo menos em bloco, um correspondente aumento de carga fiscal. Porém, ultrapassado que esteja esse ponto, ao agente económico tornar-se-á mais atractivo o recurso às utilidades privadas que lhe são proporcionadas pela «economia paralela», reagindo, então, às taxas de imposto que o Estado os obriga a observar, reduzindo a sua própria actividade sujeita a tributação (ou tentando escapar ao seu pagamento...), o que, em qualquer caso, se traduzirá por uma diminuição, em valor absoluto, das receitas fiscais. São, aliás estas circunstâncias que terão levado Alain Barrère a enunciar os chamados limites de ordem «económica», «política» e «psicológica», aos aumentos da pressão fiscal. «Limites de ordem económica» que se manifestam de imediato, em virtude do desenvolvimento da actividade pública, que não obedece em geral a critérios de rendibilidade, tendem a provocar a passagem de importantes sectores da economia nacional para uma situação deficitária permanente, necessitando de um financiamento que, em geral também, nem a iniciativa privada, nem o sector «não mercantil» (juntos), são capazes de fornecer. Nos termos de A. Barrère, com uma diminuição da matéria colectável, em resultado do aumento das taxas de imposto, a própria economia «se condena pouco a pouco a tornar-se não rentável e a enfraquecer a economia de troca» (∗∗). «Limites de ordem política», na medida em que os poderes públicos são obrigados a proceder a «uma arbitragem correcta entre o financiamento da satisfação das necessidades públicas e as possibilidades, que deverão ser deixadas aos indivíduos, de satisfazer as suas necessidades privadas, pela livre disposição dos seus rendimentos e o acesso ao mercado» (∗∗∗). Isto, para além dos limites ditados por motivos de «ordem Psicológica» que serão, aliás, talvez, os determinantes para que, apesar dos estudos econométricos já desenvolvidos, ainda hoje se revele difícil determinar com precisão quais as coordenadas exactas do ponto E. Este, aliás, o ponto nodal das críticas que os muitos detractores da Supply-Side Economics apontam à sua vertente mais conhecida: a “Curva de Laffer”. Sem embargo de considerações quanto à forma, conteúdo e justeza daqueles juízos, um aspecto desde logo se sobreleva do raciocínio que preside à sua construção: não importa, «naturalmente» (conforme o próprio A. Laffer reconhece várias vezes), fazer corresponder o ponto E, na Curva de Laffer, a uma taxa de imposto determinada. E as razões são para os supply-siders, também, naturalmente, simples, entre outras: por um lado, aquilo que poderia ser apontado como «carga fiscal tolerável» (correspondente ao ponto E), é algo que é susceptível de variar segundo as épocas, as circunstâncias, os países,..., enfim, as próprias pessoas; por outro lado, não terá sido possível, ainda, testar econometricamente, com

∗ Citação traduzida e extraída de BARRÈRE, Alain, Economie Financière (Tome II. Premiere Partie - Le circuit financier»), col. Précis, Dalloz, Paris, 2ª ed., 1971, pág. 285. ∗∗ BARRÈRE, A., op. cit., pág. 284 (citação traduzida). ∗∗∗ Idem, pág. 284-285.

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precisão e eficácia, os efeitos de uma política, coerente e cadenciada, da redução das taxas de imposto. Acresce ainda que, mais do que os efeitos de curto prazo, importaria detectar os «efeitos de drenagem» sobre a «economia subterrânea», a evasão e fraude fiscais (efeito psicológico) e os «efeitos de incentivo» sobre a poupança, o investimento e o esforço de trabalho, em resultado de reais decréscimos das taxas de imposto. Só então faria sentido detectar os efeitos, naturalmente positivos, sobre as receitas fiscais... Nestas circunstâncias, o ponto E, o optimum em que os rendimentos do Estado atingem o seu máximo sem provocar «desequilíbrios de funcionamento» na economia, nem sacrifícios vãos sobre os agentes económicos, será, afinal, entrando nos domínios da interpenetração dos elementos políticos e económicos, «o ponto em que o eleitorado desejar ser tributado», ponderadas todas as consequências (∗). Daí que ao político competirá a tarefa de «descobrir qual será essa taxa (ideal) (∗∗). Não será necessariamente 50% (como apressadamente se leria da Figura 2), mas também poderá ser... Tudo dependerá, afinal, das sensibilidades dos contribuintes (e da capacidade dos responsáveis da política económica em as interpretar correctamente), quanto às taxas de imposto mais adequadas para economia, doseadas pelo importe dos serviços (bens, utilidades) governamentais que aqueles desejam usufruir e estão dispostos a pagar por, sem se sujeitarem a qualquer forma de coerção. Ao Homem de Estado competiria a tarefa de estudar, testar, enquadrar e localizar as múltiplas determinantes que definem o ponto E e a correspondente taxa de imposto «de equilíbrio», t*, aferindo a necessária percentagem e montante do seu decréscimo (ou acréscimo) em relação ao nível prevalecente, de forma a proporcionar o nível desejado, vigiando as suas variações, «deixando ao eleitorado a última palavra» (∗∗∗). A interpretação dos elementos políticos na Análise dos efeitos supply-siders dos impostos torna-se, de facto, explícita nos ciclos político-eleitorais, nas opções que são feitas pelos votantes e nas promessas que são feitas, em matéria de política fiscal, pelos pretendentes ao governo dos assuntos públicos. Daí que há quem argumente que, reduções de impostos estimulam respostas supply-siders suficientes para gerar aumentos nas receitas fiscais, não de imediato, mas num período diferido no tempo (∗ν). Um tal reconhecimento leva, aliás, James Buchanan e Dwight Lee, à construção de “Curvas de Laffer de Curto Prazo” e longo prazo e de «equilíbrios políticos», sempre que a “Curva de Laffer de Longo Prazo” (LRLC) intercepta a Curva de Laffer de Curto Prazo (SRLC) no ponto de receita fiscal máxima. Como afirmam Buchanan e Lee «at this rate and only at this rate is govermment maximizing short-run revenue collections at a position consistent with stable rates through time. At equilibrium, those who determinate rates have no incentive to change them and those who pay taxes have fully adjusted to the rates in being. The position is, of course, on the down-sloping part of the long-run Laffer Curve, but it is also at the maximizing point on the relevant short-run curve. There is (neste ponto) no political incentive for rates to be increased or decreased» (ν). E se, em determinadas circunstâncias, os esperados efeitos supply-siders se não materializam na sua plenitude, é porque os agentes económicos formam expectativas quanto ao futuro, podendo «not respond to a reduction in rates because they predict a retum to the equilibrium rate, thereby making full response to any lower – than equilibrium rate disadvantageous»

∗ Vd. WANNISKI, Jude, «Taxes, Revenues ant the Laffer Curve», in Public lnterest, nº 50, Inverno de 1978, pág. 5; e The Way the World Works, Simon and Schuster, New York, 1979, pág. 100. ∗∗ Cfr. KEMP, Jack, An American Renaissance: A Strategy for lhe 1980's , Harper and Row, New York, 1979, pág. 51. ∗∗∗ Cfr. WANNISKY, Jude, The Way lhe World Works pág. 100. ∗ν Vd.; BUCHANAN, James M, e LEE, Dwight R. «Politics, Time and the Laffer Curve», in Journal of Political Economy, vol. 90, nº 4, 1982, págs. 816 a 819. ν Idem, pág. 818.

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Por outro lado, «Government cannot increase tax revenues by moving down the long-run Laffer Curve unless it can convince taxpayers that the rate cuts are permanent. But taxpayers will not predict permanence in rates so long as they postulate short-run maximizing behavior by government». (∗) De facto, as expectativas quanto o comportamento futuro dos responsáveis da política económica geram um ambiente em que a racionalidade económica se confronta com dilemas que poderão provocar, no curto prazo, reacções diversas àquelas que é lícito esperar-se... Daí que, para se assegurar alguma eficácia, se imponha à Supply-Side Economics a proposição de desagravamentos fiscais plurianuais. Facilmente se verifica a riqueza intrínseca que se encerra nesta curva tão simples. Uma curva que, afinal, mais não é do que uma forma actualizada de exprimir uma relação funcional que a História do Pensamento Económico já tinha cuidado de enunciar e aperfeiçoar. Com efeito, muito antes de Arthur Laffer ter «desenhado a sua curva num guardanapo de papel de restaurante, em Washington, em 1974» (um gossip dos media americanos) já o citado Jules Dupuit havia antecipado – como, aliás, era seu apanágio – em 1844, a sua curva, ao enunciar que: “If a tax is gradually increased from zero up to the point where it becomes prohibitive, its yield is at first nil, then increases by small stages until it reaches a maximum, after which it gradually declines until it becomes zero again. It follows that when the state requires to raise a given sum by means of taxation, means there are always two rates of tax which will full the requirement, one above and one below that which would yield the maximum, There may be a very great difference between the amounts of utility lost through these two taxes which yield the same revenue» (∗∗). Também David Hume, no seu Essai sur les Impôts, publicado em 1847, diria: «Je ne prétende pas être l'apologiste de toutes les taxes et de tous les impôts; je conviens, au contraire, que, semblables à l'extrême nécessité, ils détruisent l'industrie et réduisent le peuple au désespoir, lorsqu'ils sont exorbitants; (...) le législateur prudent, et animé du désir de faire le bien de son peuple, ne doit jamais perdre de vue le degré ou l' accroissement des impôts cesse d 'être avantageux à l'industrie de la Nation, et lui devient préjudiciable; (...) L'excès sera la seule cause de ce malheur (o fim de toda espécie de indústria em todos os Estados da Europa), s'il arrive jamais, et il n'en sera pas moins vrai que les impôts modérés, et répartis avec égalité, peuvent contribuer au progrès de l'industrie». Mas, antes mesmo destes dois autores terem antecipado as suas «Curvas» à de Arthur H. Laffer, já em 1744, Edmund Burke terá enunciado aquela que talvez hoje se pudesse designar de «Curva de Burke», para argumentar, contra a sobrecarga fiscal a que estavam sujeitos os colonos americanos, nos seguintes termos: «(...) o vosso esquema não produz rendimento; não concede nada a não ser descontentamento, desordem, desobediência; (...) isto é, tributar onde nenhum rendimento está para ser encontrado» (∗∗∗). Muitas são, como se procurou demonstrar (∗ν), as referências do mesmo teor, que se vão encontrando à medida que a História do Pensamento Económico avança e que o Direito foi esquecendo. Todas elas, porém, apesar dos momentos históricos em que surgem e dos objectivos a que se propõem os seus autores, se identificam, pelo menos no plano da aparência em que a Teoria Económica é fértil, no enunciado do Teorema de Rolle, célebre na Análise Matemática que se estuda em todo o curso de Economia que se preze e que um estudante de Direito, como o que se subscreve, deveria aprofundar.

∗ Ibidem, pág. 819. ∗∗ DUPUIT, Jules, «On the Measurement of the Utility of Public Works», tradução do artigo «De La Mesure de l'Utilité des Travaux Publics» (publicado nos Annales des Ponts et Chaussées, 2nd. series, vol.8, 1844), inserto na Colectânea Readings in Welfare Economics, editado por H. J. ARROW, e T. SCITOUSKY, Richard D. Irwin, Illinois, USA, 1969, pág. 278. ∗∗∗ «Your scheme yields no revenue: it yields nothing but discontent, disorder, disobedience; and such is the state of America, that after weding up to your eyes in blood, you could only end just where you began; that is, to tax where no revenue is to be found...», Edmund BURKE, citado por Alan S. BLINDER no artigo «Thoughts on the Laffer Curve», inserto na Coletânea editada por Meyer, Laurence The Supply-Side Effects of Economics Policy, Federal Reserve Bank of St. Louis, Maio, 1981, pág. 83. ∗ν Vd. CASTELA, M. Jorge C., Capítulo 3., 1991/2004, in Bibliografia.

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Relativo às raízes da derivada, o Teorema de Rolle enuncia que «se a função f (re) é constituída no segmento (a,b) derivável em qualquer ponto interior do segmento e se anula nas extremidades deste segmento [f(a)=f(b)=O], então existe pelos menos um ponto intermediário re=c, (como) e<c<b, em que a derivada f '(re) se anula, isto é, f '(c)=0», sendo c a raiz de função Y(re), se Y(ce)=O (∗).

Ou seja, pelo Teorema de Rolle se admite a possibilidade de interpretar geometricamente a Curva de Laffer: se uma curva contínua tendo uma tangente em cada ponto corta o eixo das abcissas, Ot, nos pontos de abcissas a e b, existe sobre esta curva pelo menos um ponto de abcissa, c(=t*), com a<e<b, tal que a tangente neste ponto é paralela ao eixo Ot. Daqui se extrai que, fazendo G(t)=f(re), uma função contínua e diferenciável qualquer, com G(a)=O e G(b)=O, existirá um ponto t*=c, maior que a e menor que b (com a=O e b=1 ou a tender para “infinito” dependendo do tipo de imposto que se considerar) que dará à «Curva de Laffer» a corroboração matemática que lhe assiste. Se se considerar ainda que: a) o Teorema permanece válido para uma função derivável que não se anula nas extremidades do segmento (a,b) mas toma nestes pontos valores iguais, f(a)=f(b); e que, b) se f(re) – ou, no caso vertente, G(t) – é uma função tal que a sua derivada não existe em certos pontos do intervalo aberto (a,b), então o teorema pode cessar de ser verdadeiro (isto é, que neste caso pode não existir neste intervalo [a,b] um ponto intermédio e em que a derivada f(re) se anula); ... torna-se, então, indesmentível (matematicamente), a existência de um «cume de Laffer», isto é, que existe uma taxa de imposto (que poderá ser t*) que maximiza as receitas fiscais. Aceites que são as hipóteses de continuidade e diferenciabilidade da função implícita à “Curva de Laffer” e que uma taxa de imposto nula não corresponde de iure a uma receita fiscal, post hoc, ergo propter hoc, fica apenas em aberto a possibilidade teórica (ou talvez não!), de se verificar que G(l)=O ou G(O)=O. Esta circunstância dependerá, fundamentalmente, do tipo de imposto em questão e da política fiscal delineada para incidir sobre os rendimentos ou sobre as vendas, p. ex.. De qualquer forma, é óbvia a afirmação que se as concomitantes taxas de imposto atingirem os 100% do rendimento tributável, inevitável será a integral eliminação da actividade mercantil «oficial», sem embargo se constate que há Impostos sobre o tabaco, bebidas alcoólicas e gasolina que, p. ex., excedem em 100%, muitas vezes, o preço do produto. Mas, conforme Jude Wanniski deixou claro no seu The Way the World Works, a contribuição de Arthur Laffer não será uma mera expressão matemática, mas antes, uma visão de como se poderá desfazer o nó górdio do crescimento governamental e da estagnação do sector privado. Procurava assim, Wanniski, demonstrar que as taxas de imposto mais baixas poderão estimular os negócios, o investimento, a produtividade e o próprio volume de receitas colectadas pelo ∗ PISKOUNOV, N.- «Cálculo Diferencial e Integral», vol. I, págs. 148-150, Lopes da Silva Editora, 3. ed., Porto, 1974.

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Estado, via impostos, desviando os rendimentos para actividades próprias de uma economia de mercado com todas as virtualidades que lhe concernem: o sector privado verteria libertado de onerosos encargos tributários sem que, necessariamente se tenha de questionar os serviços «não competitivos» do sector público, nem operar cortes no seu volume de despesas, em montante significativo. O problema põe-se, por conseguinte, claramente, quanto ao nível das Taxas de Imposto, que são praticadas no espaço e no tempo, que a “Curva de Laffer” permite delinear. Em geral, os economistas, mesmo (e em particular) os de formação liberal e conservadora, têm-se preocupado não apenas com a forma como o Governo angaria os seus fundos, mas também com a forma como estes são dispendidos. Por maioria da razão, os juristas e, em particular, os reflectem sobre o Direito Fiscal, dessa reflexão não se podem demitir, atento que é a eles que a “feitura da lei” concerne em primeira instância. 4. A “progressividade” dos Impostos e a Economia da Oferta – uma perspectiva

crítica dos “sistemas fiscais” com suporte na revisitada “Curva de Laffer”.

Sem embargo da importância que a gestão das despesas públicas assume na condução das políticas económicas dos governos, não, é de facto, de somenos relevo – apesar de, na sua história, nem o Direito, nem a Análise Económica se terem sobre ela debruçado convenientemente – uma Política Fiscal coerente e conforme com os desígnios das leis de mercado. É esta a proposta da Supply-Side Economics, que, neste domínio particular, procura compatibilizar os resultados analíticos da “Curva de Laffer” com a vitalidade própria das leis que regulam a economia. São os Parlamentos e os Governos, pois, responsáveis solidários pelas opções com que, em matéria tributária, decidem onerar quem os elege e financia, no que à relação funcional entre o Imposto e a respectiva matéria tributária concerne. Assim, invariavelmente, os Impostos são, como vimos, “regressivos”, “proporcionais” ou “progressivos”, por reporte à elasticidade do imposto em relação à matéria colectável, atenta a “taxa média” (apurada pelo quociente entre o montante do imposto e o valor da matéria colectável) e a “taxa marginal” (calculada pelo quociente entre a variação do imposto e a variação da matéria colectável) sobre ela incidente. Retomando a abordagem com que se introduziu esta reflexão, “Imposto Regressivo” será todo o imposto em que a taxa nominal decresce à medida em que aumenta o volume da matéria colectável: situação em que a taxa marginal é menor que a taxa média, pelo facto de a elasticidade do impostor ser inferior à unidade, ou seja, uma relação inversa entre o montante da matéria colectável e a taxa média por que o contribuinte é colectado (uma expressão da célebre “Lei de Engel”). O “Imposto Proporcional”, será aquele em que a sua taxa nominal se mantém constante, independentemente do valor da matéria colectável: o montante de imposto a pagar é uma função linear da matéria colectável, numa proporção fixa da base tributária, onde a elasticidade é igual à unidade, porque igual será a taxa média e a taxa marginal de imposto – um critério que prima, antes de mais, pela transparência e pela simplicidade, pois é inequívoca a uniformidade matemática com que a taxa de imposto a determinar vai incidir sobre todos os valores da matéria colectável. O “Imposto Progressivo” será, por fim, mas não em última das opções fiscais (o imposto pode ser ainda “degressivo”, ou seja, “progressivo” ao contrário, por força de uma fixação da taxa de imposto que ao ser aplicada a valores mais altos da matéria colectável, vai beneficiar de reduções graduais para as matérias colectáveis de menor valor), o imposto em que a respectiva taxa nominal vai subindo à medida que aumenta a matéria colectável – seja por força de uma “progressividade contínua”, por “classes” ou por “escalões”, indirectamente, ou por via da “progressividade por abatimento”, ou por “variação da base”. Em qualquer caso, o montante do imposto a pagar pelo contribuinte cresce sempre mais do que proporcionalmente à sua base, com uma elasticidade do imposto, em relação à matéria colectável, superior à unidade, com uma taxa marginal acima da correspondente à taxa média, com um limite que se queda nos 100%, onde o imposto se convola em puro e simples “confisco”. Uma progressividade que, para além de, em qualquer dos métodos, ser sempre intermitente e aplicada de forma que é necessariamente

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descontínua, gerando, em qualquer caso que se considere, situações de iniquidade fiscal, mesmo que mitigada por “deduções à colecta”… . Com efeito, partindo do quadro destas balizas, reconhece-se que, face aos dois cenários alternativos mais comuns (“Impostos Progressivos” vs. “Impostos Proporcionais”) de política fiscal a «implementar», as taxas marginais de imposto – as taxas para cada sucessivo incremento de ganhos – terão de levar, necessariamente, a resultados diferentes. São efectivamente, as taxas marginais de imposto que comandam e determinam o impacto de um imposto no comportamento, motivos, hábitos e expectativas dos agentes económicos, na sua vontade ou desejo de trabalhar – ou investir – em contrapartida de um ganho adicional de rendimento. Uma questão crucial será, então, a de saber quanto desse ganho adicional de rendimento será «sacrificado» em pagamento de impostos, qual o montante de recompensa «autorizada» pelo Governo para os agentes investidores, pelo risco, esforço ou despesas em que incorreram, ao darem consecução a determinado projecto, com consequente prejuízo da sua «propensão» ao consumo presente e ao lazer. Estamos, por conseguinte, de novo, reconduzidos à questão da “Progressividade” dos Impostos, maxime a “progressividade” a que o nosso sistema fiscal está constitucionalmente “agarrado”, em confronto directo com a “Proporcionalidade” que, como vimos tentando demonstrar, configura um sistema mais eficiente, mais justo e mais equitativo. Seja em termos de “Equidade Horizontal”, pois confere igual tratamento fiscal às pessoas com o mesmo rendimento e fonte de rendimento (por exemplo, o Sistema Fiscal português desvaloriza claramente este Princípio quando tributa duas, três ou mais vezes o rendimento quando ele é aplicado em poupança ou em investimento, mas só o tributa uma vez quando destinado ao consumo); seja em termos de “Equidade Vertical”, na medida em que contribuintes mais “endinheirados” pagarão sempre mais impostos se não forem tributados desproporcionadamente. Uma Taxa Proporcional de Imposto alcança estes dois critérios sem distorção: mesmo pagando, sempre, mais impostos (como atrás q.e.d.) – quer em termos absolutos, quer em termos relativos – uma incidência proporcional sobre todos os rendimentos auferidos por um contribuinte, sem “réplicas” de dupla ou tripla tributação, consoante as aplicações a que os destina, uma única vez, sob uma única taxa, é iniludivelmente mais “fair”; como mais “fair” será sempre uma “flat tax” que retira do rendimento de qualquer contribuinte uma mesma percentagem, mesmo considerando a “injustiça” de uma família que mereça auferir o dobro do rendimento de outra, tenha que pagar o dobro dos impostos… . Indissociáveis da “Curva de Laffer” são, pois, no seu enunciado e expressão económica, as forças psicológicas, as principais responsáveis pelo colégio de reacções sociais, económicas e políticas, que moldam a performance e a eficácia de uma economia para um dado volume de recursos e para uma dada tecnologia. Estão-lhe, pois, subjacentes, factores como, p. ex., a «ambição» e a «resolução» que, também, e por seu turno, animam os impulsos empreendedores, o crescimento, a inovação, o progresso... É, aliás, neste sentido que se poderá, igualmente, corroborar o raciocínio lafferiano, positivamente, na medida em que o efeito desincentivador, de que uma determinada taxa de imposto (ou tarifa), por excessiva, é portadora, poderá «deflacionar» as expectativas de ganho dos suppliers de «serviços produtivos». Nestas circunstâncias, uma tal taxa de imposto não traria, conforme decorre da Curva de Laffer, qualquer acréscimo de receita tributária para o Estado: taxas e receitas difluentes da sua aplicação são, nos pontos circundantes do fastígio da Curva de Laffer, inversamente proporcionais – tanto mais, quanto maior for a deslocação pela vertente declinante. Concomitantemente, acresce ainda que, para além dos efeitos psicológicos e de rendimento que tais situações provocam, sobrelevam-se ainda os efeitos (de substituição) da crescente progressividade no rendimento colectável, induzidos pelas actualizações nos primeiros escalões de imposto (que se repercutem em cadeia) e ainda, the last but not the least, da inflação – um imposto muito especial... Será, aliás, também, este o sentido da denúncia, de um insuspeito economista (em nada ligado à Supply-Side Economics), Gunnar Myrdal de seu nome, em matéria de impostos sobre o rendimento. Ousando traduzir: «A minha conclusão principal é de que impostos sobre o rendimento são perniciosos sob vários pontos de vista (...). Para a maioria das pessoas (...) uma taxa marginal de impostos elevada e

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progressivamente aumentativa deverá fazer decrescer a vontade de trabalhar mais do que o necessário (...). Através de uma diminuição dos impostos sobre o rendimento, a subtracção irracional de investimentos, da produção para bens de consumo duráveis, não será demasiado severa (...). O facto de que os impostos sobre o consumo (isto a propósito da posição que debatia em torno da necessidade da adopção de impostos sobre o valor acrescentado) são impostos sobre os padrões de vida e não sobre o rendimento, (... premiando) a poupança e a acumulação de capital, deveriam ser preferidos por quase toda a gente, especialmente nos tempos que correm (...). De todas as deficiências do nosso sistema de impostos sobre o rendimento, para mim a mais séria é a de que as leis (existentes) nos convidam directamente a praticar fraudes e evasão fiscal. A honestidade dos suecos tem sido uma fonte de orgulho para mim e para a minha geração. Agora tenho a sensação de que se estão a tomar numa nação de aldrabões por causa de leis nocivas» (∗). De facto, se transpusermos a fronteira da teoria para o pragmatismo, verificamos de imediato, e sem necessidade de altissonantes e tonitruantes lucubrações sobre as hodiernas formas de contrafacção fiscal, que são inúmeros os exemplos das consequências a que uma ineficaz e incongruente política fiscal podem conduzir. Pode demonstrar-se, por exemplo, que, numa análise ceteris paribus em que se neutraliza o efeito-rendimento consecutivo a uma diminuição dos níveis de fiscalidade, o efeito-substituição conduzirá o contribuinte a aumentar o seu esforço de trabalho. Com efeito, nesta análise, por se produzir o efeito-substituição, uma redução da carga fiscal vai encarecer o custo do lazer, conduzindo o contribuinte a preterir tempo de lazer em contrapartida da sua substituição por tempo de trabalho mercantil. Atente-se num caso particular (entre vários outros) em que, exempli gratia, um contribuinte, como o nosso Prof. J.B.G., ganha 40.000 u.m. por mês e decide usufruir de um mês de férias não remuneradas (ou de licença sem vencimento). Supondo que o somatório dos impostos sobre o rendimento acrescido das Contribuições para a Segurança Social, vem igual a 50%, o seu rendimento disponível viria igual a: 40.000 u.m. x 11 x 0,5 = 220.000 u.m. Admitindo então que a taxa de impostos sobre o rendimento (ou, mais propriamente, a taxa de descontos obrigatórios), seria reduzida para metade, mas que, simultaneamente, se aplicaria num imposto «per capita» igual a 110.000 u.m. – neutralizava-se, assim, o efeito-rendimento resultante da baixa da taxa de impostos (de descontos) sobre o rendimento. Ou seja, o rendimento líquido do contribuinte não se alteraria, ficando igual a: 40.000 u.m. x 11 x 0,75 -110.000 u.m. = 220.000 u.m. No entanto, se o mesmo contribuinte decidisse aumentar o seu esforço de trabalho, prestando um mês de trabalho suplementar (12.º), tal lhe traria um rendimento, nesse mês de 30.000 u.m. líquidas, neste último cenário, contra apenas 20.000 u.m. líquidas, no cenário inicial. Esta a base do raciocínio implícito ao traçado da “Curva de Laffer” nos termos de um equilíbrio individual. À sua generalização importa, porém, fazer realçar, no processo integrado de gestão pública das receitas e despesas, o tipo de utilização que é dada às somas arrecadadas em impostos. Deste modo, face a um aumento de fiscalidade poder-se-ão fazer sentir efeitos-rendimento, levando a acréscimos da oferta, p. ex., de mão-de-obra, em termos absolutos (diminuindo, eventualmente, em termos relativos) daqueles que a suportam melhor. Correlativamente, outros efeitos de rendimento poderão ter lugar, mas em sentido contrário, para aqueles que viram o seu rendimento real acrescido por via da utilização que é feita pelo Estado das suas receitas suplementares (**).

∗ MYRDAL, Gunnar, citado por Meluyn B. KRAUSS, in «The Swedish Tax Revolt», artigo do The Wall Street Journal, 1 de Fevereiro de 1979, pág. 16. ** Constatação que The Wall Street Journal extrai, em termos jornalisticamente mais acessíveis, quando, na sua edição de 15 de Abril de 1976, no artigo «A New (Soak the Rich) Theory», argumenta sobre a adopção de um «imposto sobre a fortuna», preconizado por Lester Thurow, para quem um tal imposto incitaria, aqueles que atinge, a trabalhar mais, a fim de manter o seu nível de fortuna, opinando com um exemplo elucidativo: «Se se sacar 100 USD a Jones forçando-o assim a trabalhar mais e subsidiar com esses mesmos 100 USD, Smith, este último sentirá necessidade de trabalhar menos para atingir o seu nível desejado de riqueza» (pág.14).

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Teoricamente, sucederia que, a nível global, os efeitos-rendimento se anulariam, subsistindo apenas os efeitos-substituição. Não obstante, na prática importa saber se há (e qual) uma compensação exacta dos efeitos-rendimento. Sabe-se que as variações dos níveis de pressão fiscal são geralmente modulados segundo a importância dos rendimentos; em princípio, se se processa um aumento global dos impostos, a sua repercussão sentir-se-á ao longo de toda a escala de rendimentos, mas será mais forte nos escalões mais elevados do que nos escalões mais baixos. Inversamente, as despesas públicas suplementares correspondentes serão preferencialmente dirigidas aos detentores de rendimentos mais baixos, em prejuízo dos de rendimentos mais elevados. Se se integrarem, na análise das repercussões das taxas de imposto sobre os níveis de receita fiscal (e, concomitantemente, sobre a oferta dos factores), os efeitos de rendimento «em retorno», poder-se-ão traçar as constatações seguintes: a) para a categoria dos rendimentos médios (escalões intermédios) – todos aqueles para quem a situação financeira não é modificada pelo sistema redistributivo – os efeitos de rendimento anulam-se subsistindo apenas os efeitos de substituição, que tenderão a reduzir a oferta dos factores produtivos envolvidos, se os níveis de fiscalidade se agravarem; b) para a categoria dos detentores de rendimentos baixos, não somente o efeito de rendimento «em retorno” é mais importante que o efeito-rendimento ligado ao aumento da pressão fiscal, como ainda se lhe «anexa» o efeito-substituição, com a consequente redução da oferta de mão-de-obra e/ou de capital; c) para a categoria dos detentores de rendimentos elevados, o efeito de rendimento «em retorno» não anula o efeito de rendimento primário. Em contrapartida e em princípio, o efeito de substituição será mais importante que o resultado líquido dos efeitos-rendimento. Conforme é corroborado por um documento da OCDE: «é muito provável que o efeito de dissuasão atinja sobretudo os titulares de rendimentos elevados» (∗) – conclusão empírica que é reforçada se, de facto, se tomarem em consideração os efeitos de rendimento «em retorno». Contudo, não deixa de ser teoricamente possível a hipótese (pouco provável, na prática) de que um aumento da pressão fiscal provoque, na categoria dos rendimentos mais elevados, um aumento da oferta de trabalho (ou de qualquer outro factor produtivo). Com efeito, o único caso em que tal é, teoricamente, possível, concerne à situação em que o efeito-substituição não anula o resultado líquido dos efeitos-rendimento no seio dos «mais favorecidos» pelo sistema e que, ainda, se verificasse que o aumento da oferta de trabalho destes últimos fosse superior à redução da oferta de mão-de-obra (p. ex.), sentida nas duas restantes categorias de contribuintes – a) e c). Poder-se-á, então concluir do enunciado da Curva de Laffer e das suas implicações em tudo aquilo que respeite à Economia da Oferta que, numa primeira aproximação e de forma geral, a oferta dos factores produtivos varia em sentido inverso das suas remunerações líquidas (∗∗). Constatação que tem acompanhado a própria História do Pensamento Económico, ab initio, e que configura a dupla circunstância que valida a «Curva de Laffer»: - se a pressão fiscal aumenta, os agentes económicos reduzirão a oferta dos «serviços produtivos» de que são detentores. - se a pressão fiscal diminui, os mesmos agentes económicos tenderão a fazer aumentar a sua oferta de «serviços produtivos». “Curva de Laffer”, cuja verdade geral permanece irrefutável como uma ampla formulação de uma tendência, que deixa profundas marcas numa estratégia económica que visa um desenvolvimento económico integrado, consistente, balanceado e temperado na correcção dos «desequilíbrios de funcionamento» das sociedades contemporâneas (∗∗∗).

∗ OCDE, Evolution des Dèpenses Publiques, Juin 1978, pág. 64. ∗∗ Cf., a propósito, a adequabilidade do raciocínio de Laffer para a determinação da chamada «Curva Monetária de Laffer». ∗∗∗ A este propósito, para além do estudo que encetei em 1991 e que agora conhece 2.ª Edição, poderá aprofundar-se toda a riqueza do original, nas seguintes obras: (cont. pág. seg.)

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5. Pistas para uma alteração de filosofia normativa tributária: um Direito Fiscal para os nossos dias. É sempre preferível, para acabarmos por onde começamos esta análise, que o rendimento seja redistribuído sem custos desproporcionais para cada contribuinte, que seja maximizado o tamanho do “bolo”, pois assim poderá ser “fatiado” em razão do esforço que cada um produziu para o “cozinhar”. Um Estado, como o Estado português, que gasta metade da riqueza nacional produzida por cada um dos contribuintes que cumprem o seu “dever fundamental de pagar impostos” e não lhes oferece contrapartidas pelo que recebe de impostos, tem que ser o primeiro a assumir a responsabilidade moral e política de atacar o desperdício e a despesa e libertar a “Economia da Oferta” dos espartilhos fiscais que a inibem de criar riqueza. Se o não fizer ou não conseguir fazer, terão os eleitores, contribuintes líquidos do “sistema fiscal”, que “votar com os pés” e deixar claro que não aceitam uma Despesa Pública próxima dos 50%, uma Despesa Pública Corrente Primária em 40% do PIB e forçar o “legislador” (o “Direito”) a adoptar as medidas fiscais que desonerem a base de incidência tributária, que abandonem as taxas progressivas que impendem sobre quem mais produz e obriguem o Estado a uma rigorosa “dieta”, devolvendo-o à sua missão originária: financiar os custos de “bens públicos”, aqueles bens cujo consumo por uma pessoa não provoca o decrescimento do consumo por outras, bens para os quais não existe incentivo à sua oferta por parte do Mercado, bens e serviços que comportem externalidades positivas significativas que não sejam “oferecidos” em quantidade suficiente pela Economia Privada. É a dinâmica da Oferta, o crescimento do PIB, que deve constituir a determinante maior da receita fiscal – quanto maior for o Produto Interno Bruto, maior será a “matéria colectável” e maior será a receita dos impostos sobre os rendimentos tributados numa base proporcional. O Estado, em Portugal, “engordou”, “engordou” muito mesmo e mais do que proporcionalmente aos seus mais directos e importantes parceiros comerciais e terá, hoje, sobretudo em consequência de um maior “desgoverno” que marcou a “gestão da coisa pública” nos últimos cinco anos do século e do milénio, cerca de 10 Kg. mais do que deveria ter, sendo que cada quilo representa, nos cálculos de reputados economistas (de Cavaco Silva a Vítor Constâncio, de Medina Carreira a Eduardo Catroga), um por cento do PIB, representando este valor, em termos anuais, a preços constantes, cerca de 1 250 milhões de €. Essa “dieta” só produzirá resultados se se “cortar” no que alimenta tais “gorduras” – os Impostos. A “fatia” do “bolo” com que, afinal e em grande medida, este Estado se auto-alimenta e que retira aos que o produzem, terá que lhe ser retirado e devolvido a estes numa base não progressiva mas proporcional, em “taxa única”, que iniba reacções do tipo “prefiro não pagar” ou “receber pela porta do cavalo”, porque “se vou trabalhar mais e com isso subo de escalão, vou pagar mais impostos”, então “mais vale estar quieto” – e são estas reacções, mesmo que aparentemente primárias e comezinhas, que devem preocupar o Direito… sob pena de ao Direito e ao Direito Fiscal, em particular, se retirar a sua função primordial como “ius”: a virtude que consiste na disposição de atribuir a cada um o que é seu! Do ponto de vista macroeconómico, esta «revolução teórica», introduzida pela Supply-Side Economics, comporta uma estratégia económica concreta que, como ficou atrás implícito, traduz duas consequências capitais. Por um lado, a constatação supply-sider de que, pelo facto de subestimarem o grau de elasticidade dos factores da oferta as políticas económicas de inspiração keynesiana partem de uma definição de «pleno emprego» e de «procura agregada» que leva a uma intervenção

∗∗∗ (cont.) LAFFER, Arhur, The “Elipse”: An Explanation of the Laffer Curve in a Two Factor Model, in A.B Laffer Associates, 28 de Julho de 1980; LAFFER, Arthur, Government Exactions and Revenue Deficiences, in Cato Journal, n.º1, Spring 1981; LAFFER, Arthur, Supply-Side Economics, in Financial Analysts Journal, Sept.-Oct. 1981; LAFFER, Arthur, The Laffer Curve, A.B. Laffer Associates, 17 de Abril de 1984; LAFFER, A., CANTO, V., ODOGWU, O., The Output and Employment Effects of Fiscal Policy in a Classic Model, University of Southern California, L.A., 1977; LAFFER, A., SEYMOUR, J., The Economics of Tax Revolt: A Reader, Harcourt Brace Jovanovich, N.Y., 1979.

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governamental tendente a sustentar artificialmente a actividade económica e o mercado de emprego – é a célebre «fuga em frente» em stop and go que conduz ao descontrolo inflacionário. Por outro lado, o reconhecimento de que, pelo facto de ignorarem os efeitos dos agravamentos da pressão fiscal e a sua incidência sobre as motivações individuais face ao trabalho e à poupança, os modelos macro-económicos tradicionais incorrem no defeito essencial de sobrevalorizar sistematicamente o «efeito-multiplicador» das despesas públicas conduzindo as autoridades governativas a negligenciar um instrumento de regulação e de relançamento económico: a redução dos impostos. As consequências destes modelos e políticas que inspiraram têm sido demasiado evidentes para serem prosseguidas, como ainda o são em muitos países: aumento em flecha da inflação e do desemprego, produtividade e produto estagnantes, diminuição do investimento e das poupanças produtivas, défices internos e externos crescentes, perda de eficácia, aumento da pobreza, diminuição da liberdade económica e (mais grave) da liberdade política. É um facto reconhecido que a liberdade económica e a liberdade política estão intimamente relacionadas. Nenhuma nação em que o governo tem o papel económico dominante (medido, por exemplo, pela proporção, de produto originado no sector público, no PNB) tem conseguido manter uma base ampla de liberdade política. De facto, as condições económicas nesses países são, em geral, inferiores às de nações, em circunstâncias comparáveis, em que predomina a economia de mercado. A história demonstra e a realidade contemporânea prova que: todas as nações que possuem governos com uma ampla base de representação e liberdade civis, têm a maior parte da sua actividade económica organizada em função do mercado; e que as condições económicas numa economia de mercado são geralmente superiores ás das nações (com cultura e recursos básicos comparáveis) em que o governo tem um papel económico dominante. É ainda uma superficial análise da política internacional que vem mostrar que as nações em que o governo detém um controlo dominante sobre a economia, enviesando as potencialidades da oferta e manipulando a procura, são governadas por pequenas oligarquias e, na sua esmagadora maioria, sofrem de condições económicas precárias. Face a tais constatações, são os novos «Economistas da Oferta» a alertarem que, na ausência de limites ao papel económico do Estado, a erosão da liberdade económica destrói tanto a liberdade política como os resultantes económicos (∗). De igual modo, reconhecem que resultados económicos eficientes não se conseguem com políticas que actuam sobre a procura, através de instrumentos orçamentais e monetários clássicos (keynesianos e em parte monetaristas). Tais políticas, no seu entendimento, não têm qualquer efeito durável (a não ser um efeito estagflacionista), conducente ao crescimento económico, que incite os agentes económicos a produzir e a investir. Como diz Arthur Laffer num dos artigos referenciados atrás: «não é porque existe uma procura para os seus serviços que as pessoas trabalham, mas por serem pagas; não para pagarem impostos, mas para ganhar o mais possível uma vez que liquidados estejam os impostos...». Não é, pois, de facto, a procura que determina a estratégia económica supply-sider, mas os incentivos à oferta com vista ao crescimento económico, sem inflação, sem desemprego, sem «desequilíbrios de funcionamento» capazes de fazer perigar as referidas liberdades, económica e política. Se os incentivos faltam para o investimento, a formação de capital tenderá a estagnar. Se os incentivos faltarem ao trabalho, o esforço de trabalho tenderá a declinar, isto é, a quantidade da oferta de trabalho dos que já integram a força de trabalho tenderá a diminuir, diminuindo, concomitantemente, a produtividade.

∗ Ensaios elucidativos das concepções Supply-Siders sobre estas matérias são:

- GILDER, George, Weatlh and Poverty, Basic Books Inc., Nova Iorque, 1981. - WANNISKI, Jude, The Way the World Works, Simon and Schuster, Nova Iorque, 1978.

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Em consequência, decorrerá que a capacidade produtiva total da economia crescerá mais lentamente do que a procura total, daí resultando, inevitavelmente, uma elevada inflação, estrangulamentos económicos, bloqueios sociais, etc… . De acordo com a «Economia da Procura», keynesiana, esta elevada inflação deveria ser travada com uma terapêutica recessiva, conducente a uma redução da procura agregada. Mas se é verdade que este gap entre a procura agregada e a oferta deve ser corrigido de forma a desacelerar as pressões inflacionistas, verdade é também que «todas as moedas têm duas faces» e «as balanças, dois pratos». Uma «face» do problema poderá, sem dúvida, conduzir a um «correcção» pela diminuição da procura, a expensas, todavia, de um elevado desemprego. O outro «prato» aponta para um aumento da oferta agregada, através de um aumento da curva das possibilidades de produção, aumentando o emprego dos factores produtivos e o produto, ao mesmo tempo que a inflação é baixada. Esta é, em termos muito sumários, a hipótese fundamental que configura a Estratégia Económica da Supply-Side Economics. Grande parte das medidas de política económica e «fiscal» já desencadeadas nas passadas duas décadas têm-se baseado no entendimento de que um aumento dos gastos do Estado poderiam conduzir a uma expansão da procura e do produto mais acentuada, do que uma equivalente redução dos impostos. Uma conclusão que se revelou dramática como terapêutica... se o Governo aumenta as suas despesas, as unidades monetárias dispendidas são integralmente utilizadas para aumentar a procura agregada. Porém, se os impostos baixarem, é certo que pelo menos parte das unidades monetárias arrecadadas pelo público se vão destinar à poupança. No entanto, como os modelos keynesianos tradicionais não incorporam os laços supply-siders entre poupança e investimento, a procura, aí, não aumenta tão consideravelmente e, bem assim, o produto. Ora, os modelos traçados pela Supply-Side Economics vêm demonstrar exactamente o inverso: uma redução dos impostos sobre o rendimento têm um efeito mais significativo sobre a economia do que aumentos das despesas governamentais. Di-lo, de uma forma algo virulenta, Jude Wanniski quando escreve que: «Demand management simply involves increasing government spending, via deficit finance, in recession, and increasing government taxation (to reduce the deficits) when the economy «heats up» in a boom. » (∗) E de uma forma algo mais positiva quando aponta que, pelo contrário: «Marginal taxes all sorts stand as a wedge between what an employer pays his factors of production and what they ultimately receive in after-tax income. In order to increase total output, policy measures must have the effect of both increasing firm's demand for productive factors and increasing the productive factor's desire to be employed. Taxes of all sorts must be reduced. These reductions will be most effective where they lower marginal tax rates the most. Any reduction in marginal rates means that the employer will pay less and yet employees will receive more. Both from the employer and employee point of view, more employment will be desired and more output will be forthcoming» (∗∗). Importaria, pois, atender aos detentores de factores produtivos, independentemente do tipo e do montante de que são potenciais ofertantes, pela adopção de uma estratégia económica global, em que se destacam os seguintes aspectos: a) Existe uma relação íntima entre o fenómeno inflacionista e a elevação do nível das despesas públicas, no período das duas últimas décadas. Inflação esta que tem duas origens: por um lado, a acumulação contínua de défices orçamentais, cada vez mais volumosos, que na concepção keynesiana dominante levaria ainda a uma monetarização inevitável da dívida pública; por outro lado, as consequências (negativas) do agravamento da pressão fiscal sobre os factores da oferta, com a inerente redução da oferta disponível. Enfim, uma consequência directa da conversão das

∗ WANNISKI, Jude, The Way lhe World Works, Simon and Schuster, Nova Iorque, 1978, pág. 157. ∗∗ WANNISKI, Jude, op. cit., págs. 85-86.

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autoridades governativas de grande número de países às perspectivas keynesianas do pós-guerra e da influência crescente em que se fez sentir (e que perdura ainda hoje) em muitas universidades e faculdades de Economia. b) A perda de dinamismo de algumas economias ocidentais e o inerente recuo do crescimento, como consequência directa da hipertrofia do Estado Intervencionista de inspiração keynesiana – em resultado, em grande medida, do seu empenhamento em grandes programas «sociais», dos aumentos de gastos militares, enfim, de uma extensão maciça de transferências sociais, da escalada belicista e da sobredimensionada esfera de intervenção governativa. Factores que levaram a um desequilíbrio permanente, sobrecarregando as finanças públicas, travando o crescimento, orientando um volume crescente de recursos para empregos menos produtivos, penalizando o trabalho e a poupança (pelo agravamento da fiscalidade), encorajando, em contrapartida, a fraude, o «trabalho negro» e a economia paralela, multiplicando as regulamentações e as restrições legislativas (preços administrados, salários sujeitos a tectos,...), reduzindo a flexibilidade do tecido económico e a capacidade de reacção e de ajustamento dos segmentos industriais. c) Assim, chegou ao reconhecimento da Supply-Side Economics que, quer se trate do crescimento ou do emprego, o mal está no funcionamento que o Estado pretende imprimir à economia com a derrapagem contínua das despesas públicas. Daí a estratégia económica supply-sider apontar como dois objectivos indissociáveis vencer a inflação e relançar o crescimento económico; considerando ainda que só se poderão cumprir ambos se e só se colocarem radicalmente em causa as filosofias e político-económicas que, ao longo das últimas duas, três décadas, foram responsáveis pelo crescimento considerável da participação do Estado na vida das nações democráticas. d) Decorrendo do aspecto anterior a consecução de tal duplo objectivo exige uma estratégia de redução simultânea das despesas públicas e dos impostos. E isto, indissociavelmente, por três razões principais: d-l) porque uma das causas da persistência do défice orçamental tem a ver com o agravamento da pressão fiscal que penaliza a oferta (quanto maior é a carga fiscal, menos o público estará disposto a esforçar-se no mercado para, assim, pagar menos impostos); d-2) porque uma diminuição dos impostos não pode estimular eficazmente a oferta de trabalho, da poupança e do investimento, ao não ser acompanhada por uma promessa formal das autoridades governativas de fazer tudo o que lhe é conferido pelo poder que o eleitorado lhe oferece, para que se verifique uma redução cadenciada e durável das despesas públicas e da «fleborragia» que estas operam nas economias nacionais. Não é de facto possível, no entendimento supply-sider, esperar modificar, de forma durável, os comportamentos presentes dos agentes económicos face ao trabalho ou à poupança a menos que as autoridades administrativas do território lhes garantam que não vão, no futuro, inflectir uma estratégia económica conducente à diminuição dos gastos públicos e dos impostos. d-3) porque, também, na sua perspectiva, não será suficiente reduzir o volume das despesas públicas para produzir efeitos favoráveis sobre a economia, graças aos ganhos de produtividade que resultarão da libertação de um certo volume de recursos do sector público em benefício do sector privado (∗) – com inerentes ganhos de eficácia – ou graças ao alisamento da pressão que as necessidades ornamentais exercem sobre os circuitos financeiros; tais efeitos nunca serão significativos se, simultaneamente, se não formularem as estruturas fiscais que, em muitas nações presentemente, incitam um número crescente de indivíduos a optar por tipos de trabalho «não-mercantil» ou por formas de desemprego mais ou menos «voluntário». Dir-se-á que, no seio da Economia da Oferta, fazer desaparecer o défice orçamental, ou no mínimo, reduzir a sua amplitude, não pode ser dissociado de uma operação paralela e concorrente, visando a diminuição da sangria fiscal. e) Significa o exposto nas alíneas anteriores que uma tal política não poderá ser eficaz a não ser se inserida numa estratégia firme e regular visando a implementação de acções que assegurem a manutenção do crescimento da massa monetária em limites extremamente estritos. Aceita-se, ∗ «It is always best to cut government spending wherever its yield or benefit is less than private spending» (GILDER, G., Wealth and Poverty, Basic Books Inc., Nova Iorque, 1981, pág. 227).

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provisoriamente, o risco de se suportarem consequências simultaneamente inflacionistas e recessionistas, a curto prazo, em virtude das taxas de juro tendencialmente elevadas, a que tal política pode conduzir. No entanto, se os poderes públicos conseguirem demonstrar capacidade de operar reduções significativas das despesas públicas e de aceitar o jugo do mercado nas operações correntes sem agravar o ritmo da expansão monetária, as antecipações inflacionistas dos agentes económicos regredirão, como diminuirão as taxas de juro, de uma forma progressiva, pelo menos a um nível inferior ao que se faria sentir se a gestão das coisas públicas se arrastasse de acordo com a tradição keynesiana. Enfim, uma Estratégia Económica tendente a substituir o círculo vicioso do arco “inflação-desemprego-estagflação” pelo ciclo virtuoso da desinflação-crescimento económico, sem pressão deflacionista, pela operação de mecanismos concretos que passam, em primeira análise, por uma redução drástica, espaçada no tempo, das taxas de imposto sobre os rendimentos pessoais e empresariais, e que se sumariam na seguinte cadeia de efeitos: 1. um aumento das taxas de rendibilidade depois de impostos das poupanças pessoais, ocasionada pela redução das taxas de imposto sobre os rendimentos pessoais, ou pela simples reposição da sua “proporcionalidade” aumenta os incentivos dos indivíduos para pouparem. Este aumento da poupança leva, tendencialmente, a taxas de juro mais baixas e a investimentos mais volumosos; 2. uma redução nas taxas de imposto sobre o rendimento efectivo das empresas (equivalente a maiores isenções fiscais para investimento, mais liberais taxas de amortização...) promove um maior empate de capital, atraído por um aumento das taxas médias de rendibilidade; 3. um aumento das poupanças pessoais e das empresas conduz a uma maior liquidez e a uma menor procura de crédito, contribuindo para um tendencial declínio das taxas de juro. Efeitos que, por seu turno, incentivam os gastos de capital e o investimento interno, produtivos e reprodutivos; 4. um aumento do ratio Investimento/PNB revela uma maior produtividade, significando que mais bens e serviços podem ser produzidos por unidade do factor empregue. Consequentemente, os custos unitários respectivos não aumentarão tanto nem tão rapidamente e a inflação cresce mais devagar, sem riscos de deflação; 5. uma redução das taxas de imposto sobre os rendimentos pessoais, concomitante à sua “proporcionalidade” conduz a um incremento da participação da força de trabalho e do esforço de trabalho, aumentando em correspondência a oferta de trabalho necessária para produzir mais bens e serviços; 6. com estes aumentos da oferta de trabalho, do stock de capital e da produtividade, aumenta a capacidade produtiva das economias nacionais e a competitividade das suas produções; 7. em resultado desta capacidade acrescida, as tensões inflacionistas provocadas por insuficiências da oferta, bloqueios e constrangimentos, desagravam-se, diminuindo a taxa de inflação, o desemprego e a estagflação; 8. esse mesmo aumento da capacidade permite também a produção de mais bens e serviços, mais baratos e de melhor qualidade, para os mercados de exportação. Assim se melhoram as contas com o exterior (diminuindo as importações), fortalecendo-se a unidade monetária nacional, concorrendo, igualmente, para uma mais baixa inflação em face de um declínio dos preços dos bens importados; 9. taxas de imposto sobre os rendimentos pessoais mais baixos revertem em ganhos salariais mais modestos (porque mais modesta a inflação), em resultado de processos de contratação colectiva de índole salarial mais «suaves» — porque suave a inflação a que são indexadas as respectivas tabelas salariais revistas; 10. baixas taxas de impostos causam, pois, reduções na inflação através de vários canais: as tensões inflacionistas declinam à medida que o desvio entre o PNB real e o PNB «desejado» vai diminuindo; a produtividade aumenta, baixando os custos unitários; a moeda nacional reforça-se, causando uma menor inflação importada; as taxas de salário crescem mais lentamente; … 11. baixa inflação representa um maior rendimento real disponível, com um consequente aumento do emprego, do produto e do consumo; 12. baixa inflação significa taxas de juro mais baixas, estimulando o investimento global e atraindo capitais estrangeiros (porque oferece melhores condições de estabilidade e, mesmo, económicas, porque ligeiramente superiores à taxa de inflação vigente internamente); 13. o aumento da procura interna e externa dos bens e serviços produzidos proporcionado por baixos níveis de inflação é condizente com o reforço da capacidade produtiva da economia para produzir tais bens e serviços, concorrendo estes factores para um crescimento equilibrado,

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consistente, balanceado e não-inflacionário da economia nacional (com alguns efeitos de arrasto sobre as restantes...). De facto, quando o Governo intervém, «oferecendo bem-estar» (!?), pagando o desemprego, subsidiando a ineficácia, reificando a incompetência e a corrupção na gestão pública está a dissuadir o trabalho produtivo, empenhado e criativo; quando o Governo intervém para aumentar impostos sobre empresas rentáveis e lucrativas para pagar os seus desperdícios e improdutividade; quando o Governo intervém contribui decisivamente para o desincentivo dos factores da oferta em contribuir para o crescimento económico, e mesmo para o próprio declínio da procura. De facto, todos aqueles projectos e programas reclamados e advogados pela generalidade dos economistas de filiação keynesiana, que afirmam promover a «equidade» e «combater a pobreza» – e que são frequentemente racionalizados em termos que estimulam o consumo improdutivo – tendem, afinal, pelo contrário, a reduzir a própria procura, em virtude de minarem (pela inactividade decorrente) a produção, da qual toda a procura real deriva. Como afirma George Gilder: «Buying power does not essentially «trickle down» as wages or «flow up» and away as profit and savings. It originates with productive work at any level. This is the simple and homely first truth about wealth and poverty. «Give and you will be given unto». This is the secret not only of riches but also of growth. This is also the essential insight of supply-side economics» (∗). Com efeito, o Estado não poderá influenciar decisivamente a procura agregada real através de políticas fiscais ou de gestão de despesas públicas – transferindo moeda de um agente económico para outro, com o Estado por mediador. Afinal, todo este «vai-vem» de riqueza mais não é do que um jogo de soma-zero, sendo também nulo o efeito sobre os rendimentos. Como sustenta, ainda, Gilder: «The only way tax policy can reliably influence real incomes is by changing the incentives of suppliers. By altering the pattern of rewards to favor work over leisure, investment over consumption, and the sources of production over the sumps of wealth, taxable over untaxable activity, government can directly and powerfully foster the expansion of real demand and income. This is the supply side mandate» (∗∗). Mandato que não é – até porque se afirmou em muito curtos lapsos de tempo – impermeável a observações (nem a críticas). No entanto, a estratégia fundada pela Supply-Side Economics constitui um conjunto teórico e concreto muito mais coerente e, afinal, muito mais complexo do que as aproximações ensaiadas na chamada Reaganomics I, do “Program for Economic Recovery” que alicerçou o célebre «America’s New Beginning”, apresentado pelo Presidente Ronald Reagan, a 18 de Fevereiro de 1981 e retomado pelo Presidente George W. Bush, no seu não menos célebre “Address on the State of the Union”, de 28 de Janeiro de 2003. Não obstante, tem sido fácil acusar a Supply-Side Economics de inspirar políticas económicas cujo efeito é sacrificar os «mais pobres» (em termos nacionais e internacionais) e agravar as desigualdades a nível interno e externo. Acusações que encontram uma fundamentação aparente nas propostas draconianas de uma economia orçamental onde se subalternizam sectores tão diferentes como os créditos à educação, as subvenções à habitação, os «fundos de abastecimento», os subsídios às empresas públicas, à saúde, etc... e que levam à conclusão quase generalizada (e precipitada) de que se trata de uma estratégia com resultados profundamente anti-sociais que agravará a situação dos mais pobres e dos mais desfavorecidos... Em linguagem popular, o que lhes seria dado com a mão direita (pela via de um desagravamento da carga fiscal), ser-lhes-ia retirado com a mão esquerda (através da redução das despesas públicas, do aumento das taxas de juro e da paridade da moeda nacional). Nada de mais enganador e deturpante, no entendimento supply-sider originário, que, para além das considerações atrás alinhavadas, responde com uma objecção muito simples: para que tais argumentos fossem plenamente aceites, necessário seria que, realmente, o crescimento contínuo

∗ GILDER,George, Wealth and Poverty, Basic Books Inc., New York, 1981, pág. 45, itálico meu. ∗∗ Idem, pág. 46, itálico meu.

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das despesas ditas «sociais» e as transferências contribuíssem para reduzir a pobreza e assegurassem a preconizada equidade. Do mesmo modo, ter-se-ia de demonstrar que, em matéria de consumos ditos «colectivos», como a educação ou a saúde, não poderá haver uma outra solução que o monopólio do Estado-Providência, ou se, pelo contrário, a disciplina do mercado não se revelaria mais eficaz para atingir objectivos conformes com as expectativas dos agentes económicos no seu todo. De facto, ao examinar-se o papel do Estado na Economia é habitual começar por analisar os efeitos da situação da concorrência sobre a eficiência económica. É certo que para uma economia competitiva ser completamente eficiente, deveriam ser satisfeitos determinados factores (como, por exemplo, a ausência de externalidades - os chamados «efeitos colaterais» - a ausência de monopólios significativos, um adequado aprovisionamento de bens públicos,...), que, efectivamente, não têm lugar na realidade concreta. Este argumento tem servido para «demonstrar» que a intervenção do Estado se justifica, para se corrigirem as falhas que ocorrem quando as condições desejadas não se materializam. Contudo, notam os economistas supply-siders, a incapacidade de se satisfazerem determinadas hipóteses não é suficiente para se justificar a intervenção do Estado. Não bastará demonstrar que um governo funciona sem problemas e que, por esse facto poderá corrigir um determinado desequilíbrio numa economia de mercado, já que, por natureza, dizem-no os politólogos, os governos, em si, nunca funcionam perfeitamente. Por outro lado, as suas intervenções correntes, para além de não poderem ser explicadas com argumentos baseados no pretenso «fracasso» do funcionamento dos mercados de concorrência, não podem, mesmo, ser justificados por qualquer critério de eficiência. Porque «eficiência económica» significa a capacidade de uma economia em satisfazer cada agente económico, tanto quanto possível, tomando em consideração as preferências dos outros. Um conceito que alicerça um sistema que se forma na capacidade das pessoas negociarem, livremente, umas com as outras, porque, como o havia já demonstrado Léon Walras, um negócio em que dois cidadãos tomam parte voluntariamente é, por inerência, aquele que esperam ser o mais produtivo para ambos. E porque, hoje, cada vez se toma mais nítido que o Estado de Providência – o “sacrossanto” Welfare State – assenta em estruturas e modos de funcionamento que demonstraram, à evidência dos factos a total inépcia e incapacidade para resolver um que seja dos problemas a que se propunha dar solução. Um pouco por todo lado, os números são abundantes para a demonstração de como os resultados obtidos pelo desenvolvimento de programas «sociais» e de políticas de redistribuição e transferência de rendimentos, levaram, por um lado, ao aumento acentuado das despesas públicas, sem quaisquer contrapartidas de peso em matéria social ou de atenuação de efeitos colaterais, para, por outro lado, se reforçar a burocratização da sociedade e o emperramento dos mecanismos de mercado, com efeitos exactamente inversos aos protagonizados. Significa isto que a Supply-Side Economics não se restringe, como pretendem, levianamente, alguns dos seus detractores, a um «mero slogan poujadista» em que se preconiza apenas uma redução dos impostos sobre os ricos (∗). A Estratégia Económica da Supply-Side Economics faz-se acompanhar de um já vasto leque de propostas concretas. Como o são, por exemplo, as propostas que visam reestruturar os sistemas de

∗ Aliás, a este propósito, refira-se que mesmo sob este prisma, a Supply-Side Economics não adulterará a sua filosofia global, em benefício de posições fáceis e socialmente aceitáveis, quando afirma a redução dos impostos sobre os ricos repudiando dogmas famosos do estilo «os ricos que paguem a crise». É o que por exemplo G. Gilder uma vez mais transmite ao afirmar que tributar exageradamente os ricos é «the gravest peril of capitalism in our current inflationary period. As the wealthy consume more and invest less, resentment toward them increses and ignorant or demagogic poiliticians impose yet higher rates to punish them. The rich discover that it is easier and more gratifying to spend money than to earn if fot the govemment, and they get a yen to travel and invest abroad (...). Under these circunstances, the wealth of a country can revert to more riches, and its citizens begin to consume its capital, the source of future wealth» (GILDER,George, op.cit. pág. 59).

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transferências por um sistema assente no princípio do «imposto negativo», que assegure uma melhor protecção social àqueles que realmente dela necessitam. Como são propostas concretas, por exemplo, no campo da ecologia, as que visam o combate à poluição do meio ambiente. Não pelas ineficazes regulamentações tradicionais do Welfare State, mas por medidas consistindo em debitar àquele que polui um montante baseado no custo que a poluição impõe aos outros, ou pela criação de direitos de propriedade sobre o ar ou a água, que seriam adquiridos por aqueles que maior valor lhes atribuíssem – isto é, por aqueles que pagassem o preço mais elevado para reduzir a sua poluição. No fundo, a estratégia económica da Supply-Side Economics visa o aumento de confiança nos mecanismos de mercado, assegurando a competição, a concorrência entre empresas eficientes, viradas não para a «segunda-vaga», mas para a «terceira», através de leis antimonopolistas ou mesmo por intervenções governamentais, desde que adequadas. Importará, pois, abandonar a regulamentação directa, administrativa, que, invariavelmente, coloca os governos numa posição de adversário em relação ao parceiro social a regulamentar, num relacionamento anti natura. Relacionamento que provoca, necessariamente, mal-estar na iniciativa privada, tal como se cria má-vontade quando, por exemplo, os funcionários públicos procedem a verificações e controlos apertados e permanentes. Comportamentos estes que, para além de gerarem animosidades, envolvem altos custos, com contrapartidas duvidosas... para além da eventual corrupção e não transparência de processos, os «fiscalizadores» apenas têm capacidade para controlar uma fracção mínima dos milhões de indivíduos regulamentados, empresas e outras instituições privadas... porque, felizmente, se estará ainda um pouco longe da «Eurásia» do Mil Novecentos e Oitenta e Quatro de G. Orwell. Enfim, uma estratégia de mercado fortemente direccionada para a criação de incentivos, para um comportamento desejado da oferta. Isto é, se se puder simular um mercado efectivo, poder-se-á confiar no auto-interesse para se chegar à meta preconizada, o que não só reduzirá o custo de alcançar o objectivo regulatório mas aumentará também a amplitude dos resultados, o que, nunca por nunca, será possível num “sistema fiscal” assente na “Progressividade” dos Impostos. Por fim, uma missão que compete aos Economistas numa directa e decisiva articulação com os Juristas, inspirada pelos Doutrinadores do Direito, que force, junto dos que têm a responsabilidade política da “Feitura das Leis”, a coragem de introduzir as necessárias e profundas alterações do articulado conexo em próxima Revisão Constitucional a concretizar numa verdadeira e simplificadora “Reforma Fiscal” que se não limite a uma mera cosmética. Uma Reforma Fiscal que introduza, a propósito, em abono da Equidade (Horizontal e Vertical), como a que se obtém, inequivocamente, com Impostos Proporcionais, uma Eficiência residente no Princípio do Benefício, por via da qual, sobre uma “taxa única” de Imposto, se faça repercutir apenas e só (e como contributo a um imperioso incentivo à “Demografia”), uma dedução significativa à colecta por cada “dependente” nascido… bem mais “fair” do que a actual arquitectura fiscal que tanto tem contribuído para o “achatamento” da pirâmide etária das “Civilizações Ocidentais”: mas essa é uma reflexão para um outro Trabalho!

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