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MARILICE DARONCO Felipe, 11 anos, começou a fumar crack com adolescentes que mora- vam perto de sua casa no ano passa- do. Experimentou por pura curiosi- dade: queria saber o que “os grandes da rua” sentiam ao fumar os cachim- bos esquisitos. Não demorou muito para ficar viciado na pedra, menos ainda para come- çar a furtar e para virar morador de rua. Foi com ele que outro menino, Lucas, 14 anos, fu- mou a droga pela primeira vez, há dois meses. Felipe e Lucas são nomes fictícios para uma história que é verdadeira e assusta- doramente mais comum do que se imagina: o crack já tem entre 1,5 mil e 3 mil usuários na cidade. Entre eles, muitos guris para os quais surgiu uma pedra no caminho entre a in- fância e a adolescência. – Eu parei de ir no colégio e come- cei a pegar arroz e massa de casa para trocar por crack. Um vez, peguei di- nheiro de um taxista, mas nunca usei arma. Já usei droga de todo jeito, de lata, de cachimbo, de pitico (maconha com crack) – conta o menino de 11 anos, que tem olhar de criança e jeito de falar incompatível com a idade. Hoje, os dois garotos fazem companhia um ao outro, na Casa de Saúde – o único hospital de San- ta Maria que têm vagas para inter- nar dependentes de crack menores de 17 anos. A de- manda é tanta que o hospital nem dá conta das ordens judiciais. Os 15 lei- tos do hospital estão sempre lotados de meninos que um dia comparti- lharam drogas e, hoje, dividem a luta para vencer uma batalha difícil até mesmo para os adultos: livrar-se da dependência no crack. Entre os adultos, o drama do cra- ck não é menor. A droga, segundo as autoridades da área de segurança, causou uma explosão nos índices de violência. E, se para o usuário chegar ao ponto de querer parar de usar é di- fícil, conseguir leitos para desintoxi- cação e reabilita- ção é ainda mais. Santa Maria não tem leitos públi- cos para adultos, que têm de ser encaminhados a outras cidades. Na segunda-fei- ra, o Hospital de Caridade entrega ao Ministério Público uma proposta para abrir 10 leitos para homens e mulheres na Casa de Saúde. Efeito – A forma como a droga é consumida – fumada – leva a cocaí- na (matéria-prima do crack) rapida- mente ao cérebro e, já nas primeiras pedras, os usuários se viciam (veja quadro na página 16). O que mais as- susta é que as pedras se espalharam rapidamente, tornando o crack uma droga que distingue classe social, sexo, ou idade. A droga, aparentemente barata – cada pedra custa entre R$ 1 e R$ 5 – e de efeito rápido e intenso, vicia tão rapidamente como mata. Para lutar contra ela, há muitas pedras no caminho: fal- tam leitos para desintoxicação e reabilitação, os trabalhos educa- tivos nem sempre têm o apoio que merecem, as famílias estão cada vez mais desestruturadas, e é difícil com- bater o tráfico de uma droga vendida em pedaços tão pequenos. Para o perito criminal da Polícia Federal Marcelo Gatelli Holler, o pe- ESPECIAL DIÁRIO DE SANTA MARIA SÁBADO E DOMINGO, 1º E 2 DE AGOSTO DE 2009 | 14 e 15 | DIÁRIO DE SANTA MARIA SÁBADO E DOMINGO, 1º E 2 DE AGOSTO DE 2009 Aprisionados pelo vício NO MEIO DO CAMINHO, CRACK Estimativa é que entre 1,5 mil e 3 mil santa-marienses sejam usuários da droga que vicia rapidamente MAIS Estado A estimativa é que, no Estado, haja cerca de 50 mil pessoas viciadas em crack. No Hospital Psiquiátrico São Pedro, em Porto Alegre, o número de internações em função do crack começou a aumentar consideravelmente há três anos NA DESINTOXICAÇÃO Meninos lutam para se livrar do vício, internados na ala de dependentes da Casa de Saúde NÚMEROS QUE PREOCUPAM Usuários – A estimativa da Secretaria Estadual da Saúde é que Santa Maria tenha entre 1,5 mil e 3 mil usuários de crack. A exemplo do que ocorre em todo o Estado, esses números estariam aumentando rapida- mente. Santa Maria já tem casos de mortes relaciona- das ao tráfico da droga Surgimento – Os primeiros relatos oficiais de usuários de crack em Santa Maria são de 2005, mas acredita-se que o crack tenha chegado à cidade muito antes disso. Naquela época, jovens confessa- ram que estavam usando a droga, mas a polícia não estava conseguindo localizar os pontos de distribui- ção. Hoje, a Polícia Civil acredita que haja pontos de venda em toda a cidade Espera – Na região, por ordem judicial, cerca de 30 pessoas estão na fila de espera por leitos para desintoxicação, o primeiro passo para quem quer deixar o vício. Em Santa Maria, só a Casa de Saúde faz esse tipo de atendimento. O hospital tem 15 leitos destinados a pessoas com menos de 17 anos rigo que os viciados em crack estão correndo vai além dos trazidos pela cocaína. Ele afirma que existe uma série de substâncias misturadas, como benzeno e ácido de bateria. – No início do aparecimento do crack no Estado, havia mais con- centração de cocaína nele do que no produto vendido em pó. Provavel- mente, isso era devido a uma falta de conhecimento entre os traficantes sobre como adulterar o crack. Hoje, é comum encontrar amostras da droga contendo concentrações reduzidas de cocaína – diz o perito. O diretor do Hospital Psiquiátrico São Pedro, de Porto Alegre, Luiz Car- los Coronel, afirma que os danos que o crack causa no cérebro podem se tornar irreparáveis em muitos casos: – Estamos assustados com o cra- ck. É a primeira vez que uma droga não precisa de aumento de cada dose consumida para produzir efeito. O Diário produziu uma série de reportagens sobre o avanço do crack. Elas serão publicadas ao longo das próximas edições e revelam por que, apesar de toda a vontade que muitos usuários da droga têm de se recupe- rar, é tão difícil remover a pedra de seu caminho. [email protected] Casa de Saúde só dá conta de atender os dependentes menores de 17 anos que chegam por ordem judicial ! Diretor de hospital de Porto Alegre que trata dependentes diz que o crack pode causar danos irreparáveis ! Nesta edição e nos próximos seis dias, o Diário mostra uma série de reportagens sobre o crack, que assolou rapidamente o Estado SÁBADO E DOMINGO, 1º E 2/08 – A droga SEGUNDA-FEIRA – A falta de leitos TERÇA-FEIRA – Meninas do crack QUARTA-FEIRA – O crack e a violência QUINTA-FEIRA – A prevenção SEXTA-FEIRA – O crack na região SÁBADO E DOMINGO – A esperança A SÉRIE SEGUE É impossível percorrer o imenso corredor que dá acesso a ala onde estão internados os meninos do cra- ck na Casa de Saúde sem perceber o feixe de luz que existe em seu final. É atrás exatamente disso – uma luz no seu caminho – que todos aqueles jovens estão ali. Basta um toque em uma campainha para que uma das profissionais da equipe que trabalha no local abra a porta. Não demora nada para que alguns dos garotos, curiosos, comecem a espiar por trás das grades que os separam do mun- do do lado de fora. As grades, num primeiro momen- to, assustam. Fazem pensar em celas, em prisão. Mas, quando se passa por elas e a ouvir as histórias de violência, dependência e abandono, comuns entre a maioria daquelas crianças, percebe-se que a verdadeira prisão delas é o crack. Ali estão encontrando uma chance – talvez a única – de mu- dar essa realidade. Não faltam abraços e beijos quan- do se cruza a porta. A frieza inicial das grades cai por terra ao olhar as crianças jogando futebol ou bolita. Um painel colorido afixado na pa- rede logo à frente das grades deixa claro que o que se quer por lá não é, nem de longe, criar um ambiente típico de hospital. O painel foi cons- truído pelas próprias crianças em uma das aulas de terapia ocupacio- nal. Os meninos fazem atividades físicas, participam de brincadeiras e oficinas como pintura, artesanato, e desenhos, assistem filmes. Tudo tem um objetivo bem claro, fazer com que voltem a se descobrir como crianças e adolescentes que são e também fazê-los recuperar a autoestima. Nas quartas-feiras, alguns dos ga- rotos voltam à sala de aula. O Grupo de Estudo e Pesquisa sobre Forma- ção Inicial, Continuada e Alfabetiza- ção (Gepfica) da UFSM ajuda os meninos a reto- marem – ou até começarem – seu aprendizado. Esperança – O resultado de todo esse trabalho está exposto nas pare- des de alguns dos quartos, onde os meninos fazem questão de colar seus desenhos, e em olhinhos brilhantes, cheios de esperança. – Eu vendia maconha para com- prar crack. Chegava a fumar três gramas por dia. Agora, quando eu sair, vou cuidar do meu avô, que está doente. Por isso, preciso ficar bem longe do crack. E também, se eu voltar para a droga, ou a polícia me mata ou eu mesmo acabo fazendo isso. Crack não é vida – afirma um adolescente de 17 anos. Infelizmente, as estatísticas não são tão positivas como a expectativa dos meninos. Muitos garotos acabam vol- tando ao vício pouco depois da alta. – O meu irmão viu que eu tinha co- meçado a fumar e começou também. Tinha uma boca de crack bem perto da nossa casa, era fácil conseguir. Mas a minha mãe ficou doente e eu botei na cabeça que ia parar. Ele não. Veio se tratar obrigado e logo que saiu voltou para a pe- dra – conta outro jovem de 17 anos. Para tentar mudar a realida- de dos garotos quando eles saem do hospital, algu- mas atividades são oferecidas também aos pais. No entendimento dos profissionais que trabalham na unidade, a família precisa estar muito bem preparada para que os meninos não recaiam na droga. Mas nem todos compre- endem dessa forma. Alguns, ainda que esperem bastante, não rece- bem sequer visitas, muito menos a confiança de que precisam para (re)construírem suas vidas. Muitos meninos que estão em tratamento não recebem uma visita sequer de seus familiares ! OCUPANDO A CABEÇA Crianças e adolescentes internados na Casa de Saúde fazem diversas atividades para recuperar sua autoestima durante o tratamento diariosm com.br Confira o especial sobre o crack, com dados sobre o avanço da droga, onde pedir ajuda para combater o vício e depoimentos de familiares de dependentes MANIPULAÇÃO SOBRE FOTO CHARLES GUERRA – 23/07/09 MANIPULAÇÃO SOBRE FOTO CHARLES GUERRA – 24/07/09 MANIPULAÇÃO SOBRE FOTO BANCO DE DADOS

MANIPULAÇÃO SOBRE FOTO BANCO DE DADOS CRACK NO MEIO DO … · O diretor do Hospital Psiquiátrico São Pedro, de Porto Alegre, Luiz Car-los Coronel, afirma que os danos que o crack

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Page 1: MANIPULAÇÃO SOBRE FOTO BANCO DE DADOS CRACK NO MEIO DO … · O diretor do Hospital Psiquiátrico São Pedro, de Porto Alegre, Luiz Car-los Coronel, afirma que os danos que o crack

MARILICE DARONCO

Felipe, 11 anos, começou a fumar crack com adolescentes que mora-vam perto de sua casa no ano passa-do. Experimentou por pura curiosi-dade: queria saber o que “os grandes da rua” sentiam ao fumar os cachim-bos esquisitos. Não demorou muito para ficar viciado na pedra, menos ainda para come-çar a furtar e para virar morador de rua. Foi com ele que outro menino, Lucas, 14 anos, fu-mou a droga pela primeira vez, há dois meses. Felipe e Lucas são nomes fictícios para uma história que é verdadeira e assusta-doramente mais comum do que se imagina: o crack já tem entre 1,5 mil e 3 mil usuários na cidade. Entre eles, muitos guris para os quais surgiu uma pedra no caminho entre a in-fância e a adolescência.

– Eu parei de ir no colégio e come-cei a pegar arroz e massa de casa para trocar por crack. Um vez, peguei di-nheiro de um taxista, mas nunca usei arma. Já usei droga de todo jeito, de lata, de cachimbo, de pitico (maconha com crack) – conta o menino de 11 anos, que tem olhar de criança e jeito de falar incompatível com a idade.

Hoje, os dois garotos fazem companhia um ao outro, na Casa de Saúde – o único hospital de San-ta Maria que têm vagas para inter-nar dependentes de crack menores de 17 anos. A de-manda é tanta que o hospital nem dá conta das ordens judiciais. Os 15 lei-tos do hospital estão sempre lotados de meninos que um dia comparti-lharam drogas e, hoje, dividem a luta para vencer uma batalha difícil até

mesmo para os adultos: livrar-se da dependência no crack.

Entre os adultos, o drama do cra-ck não é menor. A droga, segundo as autoridades da área de segurança, causou uma explosão nos índices de violência. E, se para o usuário chegar ao ponto de querer parar de usar é di-fícil, conseguir leitos para desintoxi-

cação e reabilita-ção é ainda mais. Santa Maria não tem leitos públi-cos para adultos, que têm de ser encaminhados a outras cidades. Na segunda-fei-ra, o Hospital de Caridade entrega

ao Ministério Público uma proposta para abrir 10 leitos para homens e mulheres na Casa de Saúde.

Efeito – A forma como a droga é consumida – fumada – leva a cocaí-na (matéria-prima do crack) rapida-mente ao cérebro e, já nas primeiras pedras, os usuários se viciam (veja quadro na página 16). O que mais as-susta é que as pedras se espalharam rapidamente, tornando o crack uma droga que distingue classe social, sexo, ou idade.

A droga, aparentemente barata – cada pedra custa entre R$ 1 e R$ 5 – e de efeito rápido e intenso, vicia

tão rapidamente como mata. Para lutar contra ela, há muitas pedras no caminho: fal-tam leitos para desintoxicação e reabilitação, os trabalhos educa-tivos nem sempre têm o apoio que

merecem, as famílias estão cada vez mais desestruturadas, e é difícil com-bater o tráfico de uma droga vendida em pedaços tão pequenos.

Para o perito criminal da Polícia Federal Marcelo Gatelli Holler, o pe-

ESPECIAL

DIÁRIO DE SANTA MARIASÁBADO E DOMINGO, 1º E 2 DE AGOSTO DE 2009 | 14 e 15 |

DIÁRIO DE SANTA MARIASÁBADO E DOMINGO, 1º E 2 DE AGOSTO DE 2009

Aprisionados pelo vício

NO MEIO DO CAMINHO,CRACK

Estimativa é que entre 1,5 mil e 3 mil santa-marienses sejam usuários

da droga que vicia rapidamente

MAIS

Estado

A estimativa é que, no Estado, haja cerca de 50 mil pessoas viciadas em crack. No Hospital Psiquiátrico São Pedro, em Porto Alegre, o número de internações em função do crack começou a aumentar consideravelmente há três anos

NA DESINTOXICAÇÃOMeninos lutam para se livrar do vício, internados na ala de dependentes da Casa de Saúde

NÚMEROS QUE PREOCUPAM

■ Usuários – A estimativa da Secretaria Estadual da Saúde é que Santa Maria tenha entre 1,5 mil e 3 mil usuários de crack. A exemplo do que ocorre em todo o Estado, esses números estariam aumentando rapida-mente. Santa Maria já tem casos de mortes relaciona-das ao tráfico da droga

■ Surgimento – Os primeiros relatos oficiais de usuários de crack em Santa Maria são de 2005, mas acredita-se que o crack tenha chegado à cidade muito antes disso. Naquela época, jovens confessa-ram que estavam usando a droga, mas a polícia não estava conseguindo localizar os pontos de distribui-ção. Hoje, a Polícia Civil acredita que haja pontos de venda em toda a cidade

■ Espera – Na região, por ordem judicial, cerca de 30 pessoas estão na fila de espera por leitos para desintoxicação, o primeiro passo para quem quer deixar o vício. Em Santa Maria, só a Casa de Saúde faz esse tipo de atendimento. O hospital tem 15 leitos destinados a pessoas com menos de 17 anos

rigo que os viciados em crack estão correndo vai além dos trazidos pela cocaína. Ele afirma que existe uma série de substâncias misturadas, como benzeno e ácido de bateria.

– No início do aparecimento do crack no Estado, havia mais con-centração de cocaína nele do que no produto vendido em pó. Provavel-mente, isso era devido a uma falta de conhecimento entre os traficantes sobre como adulterar o crack. Hoje, é comum encontrar amostras da droga contendo concentrações reduzidas de cocaína – diz o perito.

O diretor do Hospital Psiquiátrico São Pedro, de Porto Alegre, Luiz Car-los Coronel, afirma que os danos que o crack causa no cérebro podem se tornar irreparáveis em muitos casos:

– Estamos assustados com o cra-ck. É a primeira vez que uma droga não precisa de aumento de cada dose consumida para produzir efeito.

O Diário produziu uma série de reportagens sobre o avanço do crack. Elas serão publicadas ao longo das próximas edições e revelam por que, apesar de toda a vontade que muitos usuários da droga têm de se recupe-rar, é tão difícil remover a pedra de seu caminho.

[email protected]

Casa de Saúde só dá conta de atender os dependentes menores de 17 anos que chegam por ordem judicial

!

Diretor de hospital de Porto Alegre que trata dependentes diz que o crack pode causar danos irreparáveis

!

■ Nesta edição e nos próximos seis dias, o Diário mostra uma série de reportagens sobre o crack, que assolou rapidamente o Estado

SÁBADO E DOMINGO, 1º E 2/08 – A drogaSEGUNDA-FEIRA – A falta de leitosTERÇA-FEIRA – Meninas do crackQUARTA-FEIRA – O crack e a violênciaQUINTA-FEIRA – A prevençãoSEXTA-FEIRA – O crack na regiãoSÁBADO E DOMINGO – A esperança

A S

ÉRIE

SEGUE

É impossível percorrer o imenso corredor que dá acesso a ala onde estão internados os meninos do cra-ck na Casa de Saúde sem perceber o feixe de luz que existe em seu final. É atrás exatamente disso – uma luz no seu caminho – que todos aqueles jovens estão ali. Basta um toque em uma campainha para que uma das profissionais da equipe que trabalha no local abra a porta. Não demora nada para que alguns dos garotos, curiosos, comecem a espiar por trás das grades que os separam do mun-do do lado de fora.

As grades, num primeiro momen-to, assustam. Fazem pensar em celas, em prisão. Mas, quando se passa por elas e a ouvir as histórias de violência, dependência e abandono, comuns entre a maioria daquelas crianças, percebe-se que a verdadeira prisão delas é o crack. Ali estão encontrando uma chance – talvez a única – de mu-dar essa realidade.

Não faltam abraços e beijos quan-do se cruza a porta. A frieza inicial das grades cai por terra ao olhar as crianças jogando futebol ou bolita. Um painel colorido afixado na pa-rede logo à frente das grades deixa claro que o que se quer por lá não é, nem de longe, criar um ambiente típico de hospital. O painel foi cons-truído pelas próprias crianças em

uma das aulas de terapia ocupacio-nal. Os meninos fazem atividades físicas, participam de brincadeiras e oficinas como pintura, artesanato, e desenhos, assistem filmes. Tudo tem um objetivo bem claro, fazer com que voltem a se descobrir como crianças e adolescentes que são e também fazê-los recuperar a autoestima.

Nas quartas-feiras, alguns dos ga-rotos voltam à sala de aula. O Grupo de Estudo e Pesquisa sobre Forma-ção Inicial, Continuada e Alfabetiza-ção (Gepfica) da UFSM ajuda os meninos a reto-marem – ou até começarem – seu aprendizado.

Esperança – O resultado de todo esse trabalho está exposto nas pare-des de alguns dos quartos, onde os meninos fazem questão de colar seus desenhos, e em olhinhos brilhantes, cheios de esperança.

– Eu vendia maconha para com-prar crack. Chegava a fumar três gramas por dia. Agora, quando eu sair, vou cuidar do meu avô, que está doente. Por isso, preciso ficar bem longe do crack. E também, se eu voltar para a droga, ou a polícia me

mata ou eu mesmo acabo fazendo isso. Crack não é vida – afirma um adolescente de 17 anos.

Infelizmente, as estatísticas não são tão positivas como a expectativa dos meninos. Muitos garotos acabam vol-tando ao vício pouco depois da alta.

– O meu irmão viu que eu tinha co-meçado a fumar e começou também. Tinha uma boca de crack bem perto da nossa casa, era fácil conseguir. Mas a minha mãe ficou doente e eu botei na cabeça que ia parar. Ele não. Veio

se tratar obrigado e logo que saiu voltou para a pe-dra – conta outro jovem de 17 anos.

Para tentar mudar a realida-de dos garotos quando eles saem do hospital, algu-mas atividades

são oferecidas também aos pais. No entendimento dos profissionais que trabalham na unidade, a família precisa estar muito bem preparada para que os meninos não recaiam na droga. Mas nem todos compre-endem dessa forma. Alguns, ainda que esperem bastante, não rece-bem sequer visitas, muito menos a confiança de que precisam para (re)construírem suas vidas.

Muitos meninos que estão em tratamento não recebem uma visita sequer de seus familiares

!

OCUPANDO A CABEÇA Crianças e adolescentes internados na Casa de Saúde fazem diversas atividades para recuperar sua autoestima durante o tratamento

diariosm

com.brConfira o especial sobre o crack, com dados sobre o avanço da droga, onde pedir ajuda para combater o vício e depoimentos de familiares de dependentes

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RA – 23/07/09

MANIPULAÇÃO SOBRE FOTO CHARLES GUERRA – 24/07/09

MANIPULAÇÃO SOBRE FOTO BANCO DE DADOS

Page 2: MANIPULAÇÃO SOBRE FOTO BANCO DE DADOS CRACK NO MEIO DO … · O diretor do Hospital Psiquiátrico São Pedro, de Porto Alegre, Luiz Car-los Coronel, afirma que os danos que o crack

CRACK

O crescimento docrack que degrada entre 1,5 mil a 3 mil usuários na cidade

ESPECIAL

DIÁRIO DE SANTA MARIASÁBADO E DOMINGO, 30 E 31 DE MAIO DE 2009 | 16 e 17 |

DIÁRIO DE SANTA MARIASÁBADO E DOMINGO, 30 E 31 DE MAIO DE 2009

A DROGA DAMARILICE DARONCO

“Eu não volto para esta vida, não. Es-tão se matando por causa do crack, e eu não caio mais nessa”. A declaração de um adolescente de 16 anos, que come-çou a fumar crack aos 13, serve de aler-ta para quem desconhece os perigos da droga. Desde novembro de 2008, o garoto está fora da estimativa da Secre-taria Estadual da Saúde que diz que há entre 1,5 mil a 3 mil usuários da droga na cidade. Como a maioria dos viciados em crack, ele é apenas um menino que conheceu cedo demais o significado de estar no fundo do poço. O que o di-ferencia dos demais é o fato de ele ter deixado de consumir a droga, algo raro quando se fala da pedra da morte.

Quem olha o menino com um sor-riso no rosto e aspecto saudável não acredita que, em junho de 2008, ele es-tava em cima de uma cama, amarrado pelos pés, cadavérico. Foi a atitude de sua mãe, uma dona-de-casa de 44 anos, que escancarou um problema iniciado em 2005 em Santa Maria. Desesperada ao ver o filho mais magro e mais violen-to a cada dia, ela renunciou à condição de vítima: lutou por leito de internação para o filho quando não havia vagas.

– Pensei que iam matá-lo. Toda vez que ele saia para a rua, eu tinha medo que o pegassem roubando alguma coi-sa e fizessem algo de ruim. Era o meu fi-lho. Eu não podia só ficar olhando. Uma mãe não pode ver o filho se matando e ficar parada – lembra a dona-de-casa.

Depois de fugir de um hospital em Rio Grande, onde foi parar graças a uma internação judicial, o garoto foi obrigado a se internar em Porto Alegre.

– Cada vez que eu saía de um hospi-tal, estava mais revoltado. Só pensava em quando ia fumar de novo. No Dia de Finados do ano passado, fiquei guar-dando carros, uma trabalheira danada. Ganhei R$ 70 e fui direto comprar cra-ck. Estava tão viciado que não fez efeito nenhum. Então, decidi parar– afirma.

Como a maioria das vítimas do cra-ck, o garoto já furtou, já roubou e já viu amigos morrerem por causa da droga. A recuperação também não é fácil. Ainda mais com uma oferta tão per-to de sua casa, onde a venda da pedra

não parou.Histórias como a do adolescente e de

pessoas que vendem o corpo para con-seguir a droga e são capazes até de ma-tar levaram à criação da Frente Santa Maria Contra o Crack, que reúne mais de 40 entidades da cidade, e ao lançamen-to da campanha Crack, Nem Pensar, do Grupo RBS. Em três anos, o número de usuários triplicou no Estado, chegando a cerca de 50 mil pessoas. O apoio aos usuários e os trabalhos de prevenção, no entanto, ainda engatinham.

– O grito é geral e vem de cidades tão pequenas que nem se imagina. Estamos de mãos amarradas sem termos para onde mandar os depentendes – diz a coordenadora regional dos conselhos tutelares, Vera Maria Seckler Rauber.

Para os representantes do Centro de Atendimento Psicossocial Álcool e Drogas (Caps AD), que trabalham com usuários e familiares, a saída para o crack não parte só das autoridades. A equipe acredita que a raiz do proble-ma é mais profunda e passa por uma revisão da própria sociedade santa-mariense, que registra cerca de 25 mil viciados em álcool.

Punição – Com o conhecimento de quem vê a epidemia do crack bater a sua porta diariamente, a juíza da Infân-cia e da Juventude de Santa Maria, Li-lian Paula Franzmann, afirma que está na hora de todos agirem. Ela não pode fugir da obrigação de punir os viciados que cometem crimes, mas acredita que assim não está resolvendo o problema:

– Preciso puni-los. Mas a minha preocupação maior tem sido em como prevenir que isso aconteça.

Para quem acredita que está longe da epidemia, olhe ao redor. O crack não atinge só usuários e suas famílias. Ele é responsável pela escalada da violência e se tornou o maior problema de saúde pública gaúcho.

As quatro páginas desta reportagem mostram que o crack chegou com tudo e só pode ser combatido se todos co-laborarem. Mais conversas entre pais e filhos, maior atuação dos órgãos pú-blicos e mais cidadania. Dê o primeiro passo: informe-se.

[email protected]

DUAS VIDASAdolescente,

que em 2008 foi acorrentado pela

mãe (à dir.) faz um desabafo: parou de

fumar há sete meses depois de chegar

ao fundo do poço. Ele e a mãe (abaixo) comemoram e lutam

pela não-recaída

A campanhaO Grupo RBS lançou, na última quinta-feira, a campanha “Crack, Nem Pensar”. O objetivo é evitar novos usuários da droga que, no Rio Grande do Sul, já tem mais de 50 mil dependentes condenados à degradação física, mental e social. Todos são penalizados por essa epidemia, considerada um dos maiores problemas de saúde pública do Estado e a principal causa de violência nos grandes centros urbanos. O crack está na raiz das tragédias familiares. A campanha da RBS inclui reportagens e anúncios publicitários de TV, rádio, jornal e Internet. O site www.cracknempensar.com.br concentra informaçõessobre o assunto.

Em números O tratamento■ Desintoxicação – O usuário é inter-nado em um hospital até que os efeitos químicos da droga desapareçam do corpo. Em Santa Maria, só há 15 leitos públicos disponíveis na Casa de Saúde, que só recebe meninos entre 12 e 18 anos. Para conseguir um, é preciso ordem judicial. Os outros casos são en-caminhados para Pelotas, Rio Grande e Nova Palma. As meninas são levadas a Caxias do Sul e Porto Alegre

■ Ressocialização – O usuário vai para comunidades terapêuticas, onde fica longe da droga e onde há atividades que o incentivam a se recuperar dos traumas que o levaram para as drogas. Essa etapa pode levar vários meses.

Em Santa Maria não há comunidades conveniadas com o Estado porque nenhuma tem a equipe de profissionais exigida. Os pacientes são levados a Santo Ângelo, Caxias do Sul e Santa Cruz do Sul

■ Acompanhamento – Mesmo após anos de recuperação, o usuário pode recair caso não tenha acompanha-mento para si e sua família. Em Santa Maria, o atendimento é oferecido pelo Centro de Atendimento Psicossocial Álcool e Drogas. Hoje, ele está lotado e não recebe novos pacientes. A cidade não tem atendimento para crianças e adolescentes. Quem consegue ordem judicial vai para Santo Ângelo

■ Usuários – A estimativa da Secretaria Estadual da Saúde é que Santa Maria tenha entre 1,5 mil a 3 mil usuários de crack. A exemplo do que ocorre no Estado, esse número estaria aumentando drastica-mente. No Rio Grande do Sul, ele dobrou nos últimos 3 anos, e já é de cerca de 50 mil pessoas. Santa Maria já tem casos de morte de usuários de crack registrados

■ Alerta – Os conselhos tutelares que atendem crianças e adolescentes até 17 anos recebem pedidos de ajuda para usuários. Na região Leste, 10 meninos esperam tratamento. Na Oeste, são em 8 pedidos por dia em média. No Centro, 3 por dia

■ Crescimento – Os primeiros relatos de usuários de crack em Santa Maria são de 2005. Naquela época, jovens confessavam ser consumidores, mas

a polícia não conseguia localizar os pontos de distri-buição da droga. Hoje, a estimativa da Polícia Civil é que haja pontos de venda espalhados por toda a cidade. A Zona Norte é a campeã em apreensões

■ Ajuda – No Centro de Atendimento Psicossocial Álcool e Drogas (Caps AD), dos 428 pacientes, 134 eram usuários de crack em 2008. Neste ano, entraram nos grupos de apoio 177 novos dependen-tes, 47 de crack. No Grupo Amor Exigente, o número de famílias atendidas saltou de 200 para 600 depois que foram abertas vagas para dependentes de crack. Atualmente, a cada semana cerca de novas 10 famílias procuram ajuda para crianças entre 9 e 11 anos viciadas

■ Internação – Cerca de 60 pessoas estão na fila de espera por leitos para desintoxicação nas cidades atendidas pela 4ª Coordenadoria Regional de Saúde. O Husm não tem serviço especializado para o crack, só fornece leitos com o pedido judicial. Só a Casa de Saúde oferece leitos: 15

O usuário de crack precisa passar por três fases de tratamentospara se livrar da droga:

A pedra■ O crack – É uma pedra derivada da cocaína, feita com a sobra não-refinada dessa substância misturada a bicarbo-nato de sódio ou amônia e a outros elementos tóxicos. Por ser uma sobra da cocaína, é mais barata e causa muito mais danos ao organismo. O formato sólido permite que a pedra seja fumada. O nome da droga surgiu devido ao barulho que a pedra faz ao ser queimada

■ O uso – O usuário queima a pedra de crack em ca-chimbo e aspira a fumaça. O crack também é misturado a cigarros de maconha, chamados de piticos. Muitas vezes, o cachimbo é improvisado em latinhas de alumínio

■ Efeito – O crack chega ao cérebro em oito a 12 segun-dos e provoca intensa euforia e autoconfiança. Por isso, é considerada uma droga mais rápida que a cocaína, que ao ser consumida leva de 10 a 15 minutos para começar a fazer efeito. Por outro lado, o efeito do crack dura cinco a 10 minutos, o que faz com que o usuário consuma várias pedras por dia

■ Dependência – A fumaça do crack atinge rapidamen-te o pulmão, entra na corrente sanguínea e chega ao cérebro. É a forma de uso, e não a composição, que torna a pedra mais potente. A droga é tão forte que a pessoa se torna dependente nas primeiras vezes que consome

■ Mito – O baixo custo da pedra – em torno de R$ 5 – revela-se ilusório. Empurrado para o precipício da fissura, o dependente precisa fumar 20, 30 vezes por dia. Desfaz-se de todos os bens, é capaz de roubar de familiares e amigos, brigar e até matar para ter a pedra

■ Consequências – O crack afeta a visão, provoca dor no peito, convulsões e até coma. Em casos extremos, chega a provocar paradas cardíacas. A morte também pode ocorrer, devido à diminuição da atividade cerebral em áreas que controlam a respiração

A família e a recuperação■ Sinais – Atenção aos sintomas do crack. Em poucas semanas, o dependente apresenta emagrecimento acentuado, agressividade, depressão, dedos e boca queimados e até delírios e paranoias

■ Ajuda – Quanto antes houver ajuda, mais chances o usuário tem. Em Santa Maria, é possível procurar os postos de saúde, que darão encaminhamento para o atendimento de psicólogos e psiquiatras. A desintoxica-ção é uma fase importante, mas conseguir leito é difícil. Os conselhos tutelares são a porta de entrada para conseguir ordens judiciais de internação

■ Aceitação – Toda a família faz parte do problema e todos terão de ajudar a resolvê-lo. Se a família não rever suas atitudes, a chance de recaída é alta. As presenças materna e paterna são fundamentais. É comum pais darem dinheiro ao filho se ele se dispor a se internar. Isso só atrapalha a recuperação

LAURO ALVES – 28/05/09

CH

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A – 22/06/09

MAIS

DesesperoEm abril de 2009, uma mãe matou o filho, usuário de crack, com um tiro após um ato de desepero. Leia o depoimento completo dela em www.cracknempensar.com.br

Fonte: Ministério da Saúde

SEGUE

Page 3: MANIPULAÇÃO SOBRE FOTO BANCO DE DADOS CRACK NO MEIO DO … · O diretor do Hospital Psiquiátrico São Pedro, de Porto Alegre, Luiz Car-los Coronel, afirma que os danos que o crack

DIÁRIO DE SANTA MARIAQUARTA-FEIRA, 5 DE AGOSTO DE 2009 | 10 e 11 | GERAL DIÁRIO DE SANTA MARIA

QUARTA-FEIRA, 5 DE AGOSTO DE 2009

■ Nesta edição e nos próximos três dias, o Diário mostra uma série de reportagens sobre o crack, que assolou rapidamente o Estado

SÁBADO E DOMINGO, 1º E 2/08 – A drogaSEGUNDA-FEIRA – A falta de leitosONTEM – Meninas do crackHOJE – O crack e a violênciaAMANHÃ – A prevençãoSEXTA-FEIRA – O crack na regiãoSÁBADO E DOMINGO – A esperança

MANIPULAÇÃO SOBRE FOTO BANCO DE DADOS

Jovem de 17 anos que cumpre me-dida socioeducativa depois de confes-sar ter esfaqueado um homem, bati-do nele com um pedaço de pau e um tijolo, e ter colocado fogo no corpo, afirma que agiu por fissura do crack. Para quem pensa em experimentar, ele aconselha: não vale a pena.

Diário – Com que idade e por que você começou a usar crack?

Adolescente – Eu tinha 13 anos quando fumei maconha pela pri-meira vez. Nunca mais parei de usar drogas. Cocaína, eu usei pela pri-meira vez com 15 anos. O crack veio por acaso. Eu comecei a fumar por curiosidade, com 16 anos. Via amigos usarem. Eles fumavam demais, tanto no cachimbo quanto na lata. Quis ex-perimentar para saber qual era a daquela droga.

Diário – Você sabe quantas pe-dras fumou até ficar viciado?

Adolescente – Me viciei uma ou duas semanas depois de começar a fumar. Notei que estava dependente porque todo o dinheiro que eu pegava, usava no crack. Ele agia ligeiro e passava mais ligeiro, então eu logo queria outra pe-dra. Conheço gente que viciou mais rápido. Quando usam álcool, cachaça, na primeira vez que fumam, já ficam viciados.

Diário – Era muito difícil com-prar a droga?

Adolescente – Não existe dificul-

dade nenhuma. Difícil é arrumar dinheiro. Eu chegava a fumar R$ 400 por noite. Comprava pedra de R$ 5 ou de grama. Quando era de grama, chegava a pagar R$ 20 a grama. Tendo dinheiro, em cidade que nem a nossa, tem crack em qualquer esquina.

Diário – E como você conseguia dinheiro?

Adolescente – Eu tinha de fazer al-guma coisa para ter dinheiro: roubar, assaltar ou fazer algum outro tipo de delito. Eu também trabalhei numa reciclagem. Naquela época, trabalha-va o dia todo, e o dinheiro ia só para o crack.

Diário – Você não tinha medo de morrer em um assalto?

Adolescente – Não. Eu tinha medo de fazer o que acabou acon-tecendo, perder o controle e matar alguém.

Diário – Você confessou ter matado um ho-

mem. Foi pela droga?Adolescente – Foi. Eu tinha rouba-

do e conseguido uns R$ 500. Fumei crack durante três dias. O dinheiro estava acabando, e eu estava ansio-so para fumar de novo. Era o último dinheiro que eu tinha, uns R$ 50. Ele falou que sabia onde tinha crack de R$ 15 a grama. Ele ia buscar. Mas as horas se passaram e ele não vinha. Percebi que ele tinha comprado e fu-mado. Descobri que ele estava na casa de um amigo e fui atrás dele.

Diário – E o que aconteceu lá?Adolescente – Ele me falou que

já tinha fumado tudo, e eu perguntei como é que eu ia ficar. Ele disse que era para eu esperar que ele me paga-va. Eu estava muito nervoso, e disse que não ia esperar coisa nenhuma. Ele me agrediu com um tapa e um soco. Eu, então, dei uma facada nele.

Diário – Ele morreu na hora?Adolescente – Não. Ele tinha caí-

do do lado de fora da casa. Juntei um tijolo e joguei na cabeça dele. Eu esta-va revoltado pela droga, pelo tapa que ele me deu e umas coisas que ele tinha me falado. Não consegui me segurar. Quando ele caiu, botei fogo na casa do amigo dele e dei mais duas paula-das nele. Ele se levantou e correu para dentro de casa. Eu vi que a casa estava queimando, saí e deixei ele lá.

Diário – E o que você fez logo que saiu de lá?

Adolescente – Fui para a casa de um amigo meu e cheirei cola para aliviar um pouco. Uma meia hora de-pois, a polícia chegou para me buscar. Eu não lembrava de nada. Fui lem-brando aos poucos.

Diário – Você começou a fumar crack por curiosidade. O que diria para quem tem a mesma curio-sidade que você tinha na época, mas nunca usou essa droga?

Adolescente – Não experimente. Se experimentar, mesmo que use ou-tro tipo de droga, vai gostar do crack. Não vale a pena. Eu perdi todos os amigos. Esse cara que eu matei, mor-reu pela dependência. Eu vou fazer o que puder para ficar longe do crack.

A S

ÉRIE

O PESO DO PROBLEMA■ Nos oito primeiros meses de 2008, foram apreendidas 37 vezes mais gramas de crack na cidade do que no mesmo período de 2007. Nos sete primeiros meses de 2009, o número de apreensões despencou. Segundo a Polícia Civil, provavelmente, isso teria ocorrido porque os traficantes pararam de circular com grandes quantidades da droga para evitar a caracterização de crime de tráfico de entorpecentes. No começo deste mês, houve a maior apreensão da história da cidade: 2 quilos de crack

Apreensões de crack em Santa Maria (em gramas)Mês 2009 2008 2007Janeiro 1.641,0 18,3 2,7Fevereiro 0 105,0 33,7Março 118,7 988,0 0,9Abril 5,3 224,0 0Maio 101,7 55,0 67,0Junho 699,7 1.798,0 3,0Julho 25,9 1.738,0 0Agosto 2.003,5 79,0 28,4Total 4.595,8 5.005,3 135,7

Fonte: Delegacia de Furtos, Roubos, Entorpecentes e Capturas de Santa Maria (Defrec)

DO VÍCIO À MORTE

Pelo menos três homicídios que ocorreram em Santa Maria este ano teriam relação com o crack

■ 10 de março – Dionatam Braz de Oliveira, 23 anos, teria sido morto por um traficante com quem tinha uma dívida de R$ 20. A vítima passava pela Linha Velha da Fronteira, na Vila Carolina, quando foi morta com um tiro nas costas

■ 6 de abril – O corpo de Pedro Oliveira Dias, 42 anos, foi encontrado, carbonizado, em uma casa na invasão da BR-158, bairro Urlândia. A vítima teria sido agredida com tijolaços na cabeça e pedaços de pau e queimada. Um adolescente

confessou que agrediu a vítima porque lhe deu R$ 50 para comprar crack, mas a droga não foi entregue

■ 20 de maio – Marcelo Correa foi morto com três tiros pelas costas na Vila Carolina. Segundo investigação da 3ª Delegacia de Polícia de Santa Maria, havia uma rixa entre o autor dos disparos e a vítima devido ao tráfico de drogas. Correa estaria devendo dinheiro de crack para o homem que o teria matado

CERCO AO TRÁFICOConfira algumas das principais ocorrências envolvendo tráfico de crack em 2009:

■ 2 de janeiro – Faxineira de 26 anos foi presa com 40 gramas de cocaína, 90 gramas de maconha e 18 pedras de crack na Vila Lorenzi

■ 14 de janeiro – A polícia apreendeu mais de 1,5 quilo de crack em casas da invasão do Km 2. Cinco pessoas foram presas

■ 5 de março – Um homem de 25 anos foi preso em flagrante na Rua Venâncio Aires com 20,1 gramas de crack

■ 26 de março – Cinco pessoas foram presas no bairro Itararé, com 70 pedras de crack, duas gramas de maconha, um revólver com a nume-ração raspada, munição, dinheiro e objetos

■ 12 de junho – Dois irmãos foram presos no Residencial Cipriano Rocha. Foram apreendi-dos com eles quase meio quilo de maconha, pedras de crack, dinheiro e outros objetos

■ 23 de julho – Três pessoas foram presas na Vila Maringá. A polícia encontrou pedras de crack enterradas em uma casa, e maconha, cocaína, dinheiro, munição e uma balança de precisão em outra residência

■ 3 de agosto – Uma dona-de-casa de 35 anos e um mototaxista de 39 foram presos na RSC-287, perto de Arroio do Só. Eles traziam drogas de Santa Cruz do Sul para Santa Maria

‘Eu vi que a casa estava queimando, saí e deixei ele lá’VIOLÊNCIA

CRACK

MARILICE DARONCO

“Não existe dificuldade nenhuma para conseguir crack. Difícil é arru-mar dinheiro”. A frase é de um ado-lescente de 17 anos, internado desde abril do Centro de Apoio Sócio-Edu-cativo de Santa Maria (Case) por ter matado um homem de 42 anos com resquícios de crueldade. A frase resu-me como um problema que seria ori-ginalmente da área de saúde – a de-pendência química – transformou-se também em questão de segurança.

As estatísticas sobre quantos cri-mes na cidade estão de fato ligados ao uso do crack não existem. Porém, as autoridades da área de segurança garantem que se chegou a um ponto em que sequer são necessários nú-meros para comprovar a associação entre crack e violência, que está es-cancarada para quem quiser ver. Sem dinheiro, os viciados não conseguem a droga e, para consegui-la, acabam se tornando capazes de tudo: furtar, roubar, assaltar e até matar.

Exemplo disso é o adolescente que disse a frase acima. Ele confessou um dos crimes mais brutais que já ocor-reram em Santa Maria. Disse à polícia que usou faca, pedaço de pau, tijolo e fogo para matar Pedro Oliveira Dias, 42 anos, porque ele teria ficado de comprar R$ 50 em crack e não lhe entregou (veja depoimento ao lado). Em entrevista ao Diário, repetiu

– sem nenhum orgulho – que ma-tou um homem por causa da droga. Diante disso, poderia se ter a imagem de um bandido sem coração. Mas isso nem de longe lembra o menino que olha nos olhos e aconselha – com convicção – que ninguém fume cra-ck. O que causa tamanha oscilação de personalidade? A resposta, segundo os especialistas, pode ser a fissura pela droga.

O psiquiatra Félix Kessler, um dos mais reconhecidos pesquisadores da dependência química no Brasil, é um dos que defendem que o perfil do usuário da pedra é mais violento que o das demais drogas.

– O usuário do crack prefere rou-bar, que é mais rápido. Por isso, usa faca, revólver ou mesmo a violência física, já que forma pequenos grupos para atacar na rua. Há pelo menos três homicídios na cidade com rela-ção direta à droga – diz o delegado Sandro Meinerz, que responde pela 1ª e 3ª delegacias de polícia, que investi-garam as três mortes (veja quadro).

Apreensão – Na última segunda-feira, ocorreu a maior apreensão de crack de Santa Maria. Foram dois quilos, o suficiente para produzir pelo menos mil pedras de crack. A esti-mativa da polícia é que o casal preso por tráfico fazia cerca de três viagens a Santa Cruz do Sul por mês para buscar quantidade semelhante de

MORTEJovem diz ter matado um homem pela fissura que tinha pela droga

Um tatuador santa-mariense de 30 anos, que está internado em uma fa-zenda terapêutica de Jari há um mês e 15 dias, era consumidor de crak há quatro anos. Ele chegou a ter um pro-blema em um dos pulmões, que dei-xou de funcionar – fato atribuído pe-los médicos aos efeitos do crack. Para conseguir as cerca de 20 gramas que consumia todos os dias, ele afirma que cometeu crimes arriscados e está respondendo por eles. Um deles foi um assalto a uma agência lotérica da Avenida Presidente Vargas, outro um assalto a uma empresa de transpor-te coletivo onde um guarda foi feito refém. Tudo para conseguir dinheiro para a pedra.

– Minha casa parecia a cracolân-dia. Sempre tinha gente consumin-do crack lá. Me arrisquei muito em assaltos. Fui pego pela polícia, mas isso não foi o pior que poderia me acontecer. Chegamos a trocar tiros com policiais. Agora, eu poderia es-

Assaltos, furtos, roubosAssaltos, furtos, roubose assassinatos eme assassinatos emSanta Maria estariamSanta Maria estariamrelacionados à dependênciarelacionados à dependência

Parecia a cracolândia

crack, fazendo entrar na cidade mais de 3 mil pedras da droga por mês. De acordo com o titular da Delegacia de Furtos, Roubos, Entorpecentes e Capturas (Defrec), Vladimir Urach, apreender tanta droga está cada vez

mais difícil. E isso, de forma alguma, significa redução no tráfico.

O delegado desconfia que, para não serem pegos, os traficantes estariam usando pessoas – principalmente adolescentes – para servirem como formigas, jargão policial aplicado a pessoas que carregam pequenas quantidades de pedra de crack e vão até os pontos de distribuição buscar a droga várias vezes por dia. Quan-do elas são abordadas pela polícia, livram-se das pedras ou, devido à pe-quena quantidade, alegam que são só consumidores.

– Está na cara que as ocorrências de furto e roubo, inclusive a ônibus, estão relacionadas ao crack. No de-sespero para conseguir crack, os usu-ários perdem a noção do que estão

fazendo e são capazes de uma violên-cia exacerbada – afirma Urach.

Perfil – O diretor do Case, Vitélio Rossi de Freitas, diz ter notado uma mudança no perfil dos adolescen-tes encaminhados ao local. Segundo ele, de março para cá, a maioria dos jovens que chegaram para cumprir medidas sócioeducativas tinha co-metido crimes mais violentos.

– O que está acontecendo é errado. Eles cometem crimes relacionados ao crack e são encaminhados direto para cá. Estamos praticamente fazen-do a desintoxicação desses meninos. E, quando eles saem, a sociedade não está preparada para recebê-los. Não demora a voltarem – lamenta Freitas.

[email protected]

MAIS

Extremo

Em Caçapava do Sul, um jovem viciado em crack é suspeito de ter matado cães e comercializá-los como se fossem carne de ovelha e porco para ter dinheiro para comprar a droga

RECUPERAÇÃOTatuador de 30 anos está internado em uma fazenda terapêutica

Juntei um tijolo e joguei na cabeça dele. Quando ele caiu, botei fogo na casa e dei mais duas pauladas nele

MANIPULAÇÃO SOBRE FOTO CLAUDIO VAZ – 31/07/09

MANIPULAÇÃO SOBRE FOTO CHARLES GUERRA – 29/07/09

Page 4: MANIPULAÇÃO SOBRE FOTO BANCO DE DADOS CRACK NO MEIO DO … · O diretor do Hospital Psiquiátrico São Pedro, de Porto Alegre, Luiz Car-los Coronel, afirma que os danos que o crack

MARILICE DARONCO

Nada de roupas secando no varal à noite. Trancas fechando as portas e janelas das casas. Carros cuidado-samente guardados. Esse cenário em nada lembra o sossego que fazia muita gente procurar refúgio em pequenas cidades da região. Mas os moradores foram forçados a transformarem suas ca-sas em verdadeiras forta-lezas diante da insegurança trazida pelo crack. Homicídios rela-cionados à droga, furtos por toda a parte, crianças e adolescentes vicia-dos, famílias destruídas. Essa já não é uma realidade só da maior cidade da Região Central – Santa Maria. As pedras rolaram e quebraram de vez a tranquilidade do Interior.

A posição geográfica é apontada pelo delegado regional da Polícia Ci-vil, Oscar Corrêa dos Santos Júnior, como um dos fatores que facilitam a circulação da droga vinda de países vizinhos. Cortada por rodovias como a BR-158, uma das mais importantes do país, a região pode servir de rota para o tráfico. Se um número incal-culável de pedras apenas circulam, outras tantas estariam encontrando consumidores por aqui mesmo.

Um dos consumidores das pedras é um jovem de 18 anos, morador de Caçapava do Sul. Ele é suspeito de praticar um crime do qual a família não quer acreditar, mas que embru-lhou o estômago de muita gente. Para conseguir dinheiro para sus-tentar o vício, ele teria matado cães

e vendido a carne como se fosse de porco e de ovelha.

– O depoimento dele será na se-gunda-feira. Não foi ouvido ainda porque estava em tratamento. Mas temos provas concretas que está envolvido no crime Não só há teste-munhas como também outros fatos, como ele ter ganho cães do canil do

município para tomar con-ta, e 21 carcaças terem sido encontradas em um terreno perto de sua casa – afirma

a delegada Fabiane Bittencourtt, res-ponsável pelo caso.

Desde que o crime foi descoberto, em junho, a família do rapaz não tem sossego. Além de fazer de tudo para que ele se recupere, os irmãos e a mãe precisam conviver com o preconcei-to. Na rua, eles são tratados como “os parente do adoles-cente que vendeu carne de cachorro”.

– Se ele fez mes-mo, foi porque se tornou uma vítima do crack – diz uma das irmãs (leia de-poimento ao lado).

Violência – His-tórias de desgraça em função do crack se propagam pelo Interior, deixando um rastro de famí-lias desestruturadas, de violência e de desespero, já que não há leitos para o tratamentos de todos. Raras são as ci-dades que ainda não tiveram grandes apreensões de crack e que ainda não

encaminharam pedidos para inter-nar dependentes da droga.

– Estima-se que em São Sepé haja cerca de 200 usuários. É muito para uma cidade pequena como a nossa. Se os crimes são cada vez maiores, a idade das vítimas é cada vez menor – afirma a promotora do Ministério Público de São Sepé Cíntia Foster.

Em São Sepé e São Gabriel, o Mi-nistério Público está engajado em projetos para unir forças com a po-lícia, secretarias de saúde, prefeitura, Estado e Brigada Militar. Algumas ações já surgiram como palestras para a comunidade e uma escolinha de futebol para vítimas da droga. O comandante regional da Brigada Mi-litar, coronel Silvio Régis Rosa Macha-do, defende que ações conjuntas são a única forma eficiente de combater

o crack. Para ele, policiamento não é suficiente para conter o seu avanço e a violência gerada pela pedra.

– É uma questão que vai além da segurança. Nunca houve tantas pri-sões e apreensões. Mas acabar com essa epidemia não depende só da po-

lícia. Precisamos de apoio de todos, inclusive das famílias, que, muitas ve-zes, esquecem de educar seus filhos e só se dão conta disso quando já é tarde demais – diz Machado.

[email protected]

DIÁRIO DE SANTA MARIASEXTA-FEIRA, 7 DE AGOSTO DE 2009 | 18 | GERAL

ESPERANÇAIrmã de usuário de pedra torce pela sua reabilitação

MANIPULAÇÃO SOBRE FOTO MARCELO BARCELOS, GAZETA DE CAÇAPAVA

■ Nesta edição e na do final de semana, o Diário mostra uma série de reportagens sobre o crack, que assolou rapidamente o Estado

SÁBADO E DOMINGO, 1º E 2/08 – A drogaSEGUNDA-FEIRA – A falta de leitosTERÇA-FEIRA – Meninas do crackQUARTA-FEIRA – O crack e a violênciaONTEM – A prevençãoHOJE – O crack na regiãoFINAL DE SEMANA – A esperança

A S

ÉRIE

AS PEDRAS ROLAMCRACK

A irmã de 24 anos do jovem de 18 acusado de ter matado mais de 20 cães em Caçapava do Sul para vender a carne como se fosse de porco e ove-lha contou ao Diário o drama que a família vive desde que ele se tornou dependente do crack. Ela diz que os parentes estão agarrados à possibili-dade de ele se recuperar do vício de-pois de uma internação para desinto-xicação. Leia abaixo:

Diário – Como o seu irmão co-meçou a usar drogas?

Irmã – Já havia sido um golpe des-cobrir que ele fumava maconha aos 15 anos. Nosso pai era alcoólatra, e não queríamos mais ninguém meti-do com drogas. Um dia, a minha irmã chegou mais cedo do trabalho e en-controu ele fumando maconha.

Diário – E chegaram a conversar com ele naquela época?

Irmã – Sim. Como ele tinha pro-blemas de rendimento na escola – só estudou até o 2ª ano do Ensino Fundamental –, queríamos que ele fosse acompanha-do por um psicó-logo. E buscamos apoio do Grupo Amor Exigente. Mas ele disse que a maconha era uma droga fraca. Nós, eu admito a nossa culpa, não levamos o vício dele a sério.

Diário – E o crack?Irmã – Começou uns dois anos

depois, com 17 anos. Na nossa vila, tem traficante de tudo quanto é lado, é só chegar e pegar a pedra. Quando a gente viu, ele já estava no crack.

Diário – Como vocês descobri-ram que ele usava crack?

Irmã – Quando ele começou a pedir muito dinheiro sem conseguir explicar o porquê. De uma hora para a outra, ele mudou completamente o comportamento. Tornou-se mais agressivo. Ele é o nosso irmão mais novo, o bebê da família. De repente, a gente começou a perceber que esta-vam sumindo coisas de casa. Ele ven-deu as roupas ou trocou por crack, e não tinha mais nem o que vestir.

Diário – E vocês voltaram a con-versar com ele sobre isso?

Irmã – Ele não queria conversar. A coisa estava feia. Dos 80 quilos que pesava antes do crack, estava com menos de 60. E continuava tirando muita coisa de casa. Eu ia na casa dos vizinhos para buscar de volta as coi-sas que ele vendia. Ameaçava chamar a polícia. Ele só tirava de casa porque tinha gente que comprava na rua. Não passo a mão na cabeça dele, mas quem compra produto que sabe que é furtado também alimenta o crime.

Diário – Ele chegou a ser inter-nado em dezembro do ano passa-do. O tratamento não adiantou?

Irmã – Ele ficou 10 dias em desin-toxicação no hospital de Caçapava. Ele fugiu, nós o levamos de volta para o hospital, mas ele conseguiu nos convencer que estava curado. Nós o levamos para casa. Em pouco tempo, ele voltou para o crack.

Diário – E o que ele conta para vocês dessa suspeita de vender carne de cachorro?

Irmã – Para nós da família, não diz nada. Ele sabe que a polícia está investigando, mas não toca no assunto.

Diário – Vocês acreditam que ele possa ter co-

metido esse crime?Irmã – A gente sabe que, pelo cra-

ck, as pessoas são capazes de tudo. Eu não quero acreditar que ele tenha feito isso. Mas se um usuário de crack até mata para ter a droga, isso não é impossível de ter acontecido. Só acho que tem outro problema por trás dis-so. Se for verdade, todo mundo por aqui sabia que ele não era um cria-dor, por que compravam carne sem procedência?

Diário – Ele voltou para casa depois de mais um tratamento. Como ele está?

Irmã – Foi ele quem pediu para ser internado num hospital onde não re-cebesse nossa visita para não correr o risco de nos convencer a tirá-lo do tratamento. Conseguimos interná-lo em Pelotas em 19 de junho. Ele voltou essa semana e fica só em casa. Não saiu atrás de drogas. Aliás, acho que essa é a esperança de toda a família que tem um dependente do crack.

“Não é impossível de ter acontecido”

Irmã do jovem que vendia carne de cachorro acredita que, pelo crack, as pessoas são capazes de tudo

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MANIPULAÇÃO SOBRE FOTO BANCO DE DADOS

DIÁRIODA REGIÃO

Localização geográfi ca estaria facilitando arota de passagem dotráfi co do Estado