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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEM CARLA THOMAS A NARRAÇÃO COMO EXPERIÊNCIA FORMATIVA: o conto nas esferas comunicativas literária e multimidiática Campinas, S.P. 2012

Monografia Carla Thomas

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Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas como requisito parcial para a obtenção do título de Especialista em Língua Portuguesa. Orientadora: Profª Dra. Roxane Rojo

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEM

CARLA THOMAS

A NARRAÇÃO COMO EXPERIÊNCIA FORMATIVA:

o conto nas esferas comunicativas literária e multimidiática

Campinas, S.P.

2012

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEM

CARLA THOMAS

A NARRAÇÃO COMO EXPERIÊNCIA FORMATIVA:

o conto nas esferas comunicativas literária e multimidiática

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas como requisito parcial para a obtenção do título de Especialista em Língua Portuguesa. Orientadora: Profª Dra. Roxane Rojo

Campinas, S.P.

2012

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Um país se faz com homens e livros.

Monteiro Lobato

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RESUMO

Este Trabalho de Conclusão de Curso tem por objetivo analisar uma sequência didática

(SD) elaborada para alunos do 2º ano do Ensino Médio, na disciplina de Língua

Portuguesa. A SD analisada, intitulada A arte de contar histórias: o conto na literatura e

nas mídias, focaliza, dentro da literatura e da multimidia, o gênero textual conto. Nessa SD

são sugeridas leituras, atividades em grupo e exercícios, a serem realizados em trinta

aulas, com objetivo de capacitar o aluno a reconhecer as diferentes formas de linguagens

e discursos como manifestações dinâmicas das práticas sociais. Observa-se, ao final, que

a SD enfatiza a apreciação da leitura literária e de textos multimidiáticos pelos alunos como

forma de obtenção de conhecimento e posicionamento frente à sociedade. A intenção é

fazer que os alunos extraiam dos contos lições de vida e convívio, refletindo acerca dos

conflitos individuais e sociais que, embora nesse gênero sejam manifestações fictícias,

aludem de alguma forma à realidade.

Palavras-chave: Conto; Literatura; Multimídia; Sequência didática; Ensino Médio.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 01

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA .................................................................................. 03

2.1 O trabalho com gêneros textuais no ensino de Língua Portuguesa ..................... 03

2.2 A esfera comunicativa literária ............................................................................. 07

2.3 A esfera comunicativa multimidiática ................................................................... 09

2.4 O gênero conto .................................................................................................... 10

3. ANÁLISE COMENTADA DA PROPOSTA DE SEQUÊNCIA DIDÁTICA ................... 12

3.1 Informações gerais ............................................................................................... 12

3.1.1 Objetivos esperados.................................................................................. 12

3.1.2 Características da turma ........................................................................... 13

3.2 A organização da SD ........................................................................................... 14

3.3 As atividades propostas em cada unidade de trabalho ........................................ 15

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................ 17

REFERÊNCIAS ............................................................................................................... 19

ANEXO: A SD Elaborada ................................................................................................ 20

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1 INTRODUÇÃO

Neste trabalho analisa-se uma sequência didática (SD) voltada à disciplina de

Língua Portuguesa, na qual o objeto de ensino é o gênero textual conto presente,

sobretudo, nas esferas comunicativas literária e multimidiática. A SD tem como público-

alvo alunos do 2º ano do Ensino Médio e duração de trinta aulas.

O objetivo geral da SD é fazer com que os estudantes sejam capazes de reconhecer

os elementos textuais específicos do gênero conto, presente na literatura e na multimídia,

concebendo-o como forma de manifestação comunicativa ficcional que simboliza as mais

íntimas experiências individuais e sociais. Além disso, espera-se que os alunos, ao

identificar os elementos textuais do conto e explorar diferentes esferas comunicativas,

instruam-se sobre funcionamento e a estrutura da Língua Portuguesa.

A base das atividades da SD são a leitura e análise linguística e histórico-social de

quatro contos de tipos distintos, arrolados na literatura e na multimídia, quais sejam: O

Barba de Ouro e a Carantonha (1949), de Luis Maria Ferreira (conto popular), Noite de

Almirante (1884), de Machado de Assis, Negrinha, de Monteiro Lobato (1920) e Preciosa -

uma história de esperança (2009), de Lee Daniels. São propostos exercícios e atividades

individuais e em grupo, solicitando aos estudantes que formulem hipóteses, pesquisem e

coloquem à prova as noções elementares do sistema linguístico. As atividades estão

organizadas visando permitir a apreciação e confronto de outros gêneros textuais e esferas

comunicativas além do conto, da literatura e da multimídia, a fim de ampliar as

possibilidades de leitura intertextual e a formação multiletrada do aluno. Como eixo

norteador do desenvolvimento das atividades, propõem-se a produção e doação de livros

de conto infantil a alunos mais novos. O propósito é fazer com que os estudantes situem-

se, como leitores e, também, como autores, apropriando-se do gênero conto como meio de

comunicar e questionar conflitos existenciais determinados por fatores históricos, sociais,

culturais e políticos.

A escolha desse gênero justifica-se pelo entendimento de que a narração concisa,

embasada em fatos fictícios, é um modo de interpelar a realidade por meio da imaginação

criativa e de reminiscências que permitem aos estudantes apreenderem a estrutura da

Língua Portuguesa – e da linguagem em geral – como manifestação de diferentes formas

de sentir, agir e pensar. Além disso, parte-se do pressuposto de que o conto é um tipo de

texto que os alunos têm contato desde a infância, sendo, portanto, um significativo

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elemento de referência no processo de aprendizagem e um potencial difusor de

conhecimentos e valores humanos.

Já a delimitação das esferas comunicativas literária e multimidiática incide sobre três

motivos. O primeiro deles é a marcante expansão contemporânea de novas formas de

expressão e comunicação consubstanciadas pelo desenvolvimento tecnológico. Tal

expansão demanda a formação de sujeitos capazes de usarem de modo eficiente a leitura

e a escrita, a fim de que possam compreender e, assim, reiterar e transformar o complexo

processo de construção de significados em que interagem socialmente. Nesse sentido, a

apreensão do funcionamento dialógico de diferentes formas de comunicação é essencial.

Os dois outros motivos referem-se a objetivos específicos que se quer alcançar com a

sequência didática. O estudo da esfera literária possibilita aos alunos compreenderem as

bases que estabelecem as representações culturais disseminadas de acordo com o

desenvolvimento histórico e cultural da sociedade por meio da “arte da escrita”. Por sua

vez, a multimídia, por estar cada dia mais presente na vida dos estudantes, recebe

destaque com vistas a aprimorar o uso da linguagem, sendo utilizada como ferramenta de

acesso e produção de conhecimento. Por outro lado, a presença da multimídia na escola

permite que os estudantes entendam o impacto das tecnologias de comunicação no

desenvolvimento humano, identificando os avanços e os retrocessos implicados nos

processos e métodos decorrentes do progresso científico.

Entende-se que o trabalho com sequência didática é valioso, pois permite o

planejamento detalhado das aulas, por meio do qual o professor tem suporte para

acompanhar e avaliar continuamente o desenvolvimento dos alunos e, consequentemente,

articular práticas que o aproximem dos objetivos esperados. Nesse sentido, ao analisar a

SD proposta pode-se chamar atenção a todos os aspectos importantes que devem ser

considerados pelos professores ao executarem seu trabalho.

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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 O trabalho com gêneros textuais no ensino de Língua Portuguesa

A sociedade das últimas décadas em muito se diferencia das épocas anteriores. O

aumento da produção técnico-científica e do consumo no século XXI demanda elaboração

de propostas de ensino que objetivem capacitar o sujeito a interpretar, compreender,

refletir e agir em uma sociedade que se apresenta em constante dinamismo econômico,

político, social e cultural.

É responsabilidade da escola orientar os sujeitos na produção de conhecimento e

na formação de valores que ultrapassem os limites da aprendizagem instrumental. A

disciplina de Língua Portuguesa orienta tal formação de conhecimentos e valores quando

tem como objeto de estudo as diversas linguagens, não apenas como formas de

comunicação e expressão estáticos, mas, também, como manifestações ideológicas que

variam historicamente.

Nesse sentido, Rojo (2009) afirma que é preciso expandir e democratizar as ações e

situações de letramentos1 que ocorrem na escola. A linguista propõe o trabalho com

letramentos múltiplos. Para isso o professor deve considerar a existência de:

uma multiplicidade de práticas de letramento que circulam em diferentes esferas da sociedade e a multiculturalidade, isto é, o fato de que diferentes culturas locais vivem essas práticas de maneira diferente (ROJO, 2009, p. 108-109).

Para a autora existem diversas condições que determinam as atividades letradas,

que se diferenciam em detrimento do espaço, do tempo, dos costumes, hábitos e valores

dos sujeitos. Por isso, o estudo da língua não deve ser reduzido à decodificação textual,

mas, estendido à compreensão do texto (Rojo, 2004). Para isso, é importante que o ato de

ler seja visto como uma interação entre o leitor e o autor, na qual o leitor, ao relacionar o

texto lido a textos que já possui referências, tem “possibilidades infinitas de réplica,

gerando novos discursos/textos” (ROJO, 2004, p.3).

Segundo Rojo (2004), discurso – ou texto – pode ser entendido como um: 1 Segundo ROJO (2004) o letramento incide sobre a apropriação da língua para além do conhecimento do aluno. Para a autora é um processo que perpassa pelas práticas sociais de leitura e de escrita e, naturalmente, pelas capacidades nelas envolvidas. Para SOARES (apud ROJO, 2004, p.3): “à medida que o analfabetismo vai sendo superado, que um número cada vez maior de pessoas aprende a ler e a escrever, e à medida que, concomitantemente, a sociedade vai se tornando cada vez mais centrada na escrita (cada vez mais grafocêntrica), um novo fenômeno se evidencia: não basta aprender a ler e a escrever. As pessoas se alfabetizam, aprendem a ler e a escrever, mas não necessariamente incorporam a prática de leitura e da escrita, não necessariamente adquirem competência para usar a leitura e a escrita, para envolver-se com as práticas sociais de escrita”. Nesse sentido, Rojo (2004), afirma que podemos considerar que há diferentes tipos e níveis de letramento da população em geral.

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(...) conjunto de sentidos e apreciações de valor das pessoas e do mundo, dependentes do lugar social do autor e do leitor e da situação de interação entre eles – finalidades da leitura e da produção do texto, esfera social de comunicação em que o ato da leitura se dá (p.3).

O texto é o “lugar da interação e os interlocutores, sujeitos ativos que –

dialogicamente – nele se constroem e por ele são construídos” (KOCH, 2006, p.43). Assim,

pode-se considerar toda manifestação da língua e da linguagem como construção textual

(discursiva) em constante elaboração.

Segundo Marcuschi (2003) os textos que circulam a vida cotidiana apresentam

“padrões sócio-comunicativos característicos definidos por sua composição, objetivos

enunciativos e estilo concretamente realizados por forças históricas, sociais, institucionais

e tecnológicas” (p.3-4). Nesse sentido, considera que os textos podem ser classificados em

gêneros e materializados nas diversas esferas comunicativas recorrentes. O gênero é um

“dispositivo que organiza, divulga, armazena, transmite e, principalmente, cria enunciados

em uma determinada esfera da comunicação” (CARETTA, 2008, p.18).

As esferas discursivas são a concretização da relação dos enunciados produzidos

pelo uso da linguagem. Segundo Caretta (2008), uma esfera de comunicação pode ser

“concebida como um conjunto de relações entre enunciados (...) por um processo

dialógico” (p.18). Para a autora:

No processo dialógico de constituição das esferas discursivas, o gênero se manifesta como memória criativa. Assim, ele carrega a responsabilidade de atualizar tradições genéricas, sempre mantendo as heranças de enunciados anteriores, mas renovando-se no contexto da comunicação social (CARETTA, 2008, p.18).

Os gêneros textuais permeiam as interações comunicativas, expressando o que já

faz parte da vida social. Distinguem-se onde há narrações, relatos, argumentos,

exposições de diferentes tipos de saberes e descrições de comportamentos e manifestam-

se em distintos domínios sociais de comunicação, como na cultura literária ficcional, em

documentos, discussões de problemas sociais, na construção de saberes e na instrução e

prescrição de ações (SCHNEUWLY E DOLZ, 2004). Expressam, portanto, as condições e

as expectativas dos sujeitos e da sociedade.

Dessa perspectiva, é congruente a proposta de utilização dos gêneros textuais

como objetos de ensino da Língua Portuguesa. Segundo Schneuwly e Dolz (2004), o

gênero textual “fornece um suporte para a atividade, nas situações de comunicação, e uma

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referência para os aprendizes” (2004, p. 75). Os autores entendem que, o professor, ao

enfatizar os enunciados textuais situando-os histórica e socialmente – além de seus

elementos linguísticos –, permitem aos alunos a compreensão do processo de construção

de conhecimento como ininterrupto e variável. Com isso, a formação dos estudantes,

também, é voltada a atitudes reflexivas e criativas sobre o meio em que vivem.

De acordo com esses mesmos estudiosos, os principais objetivos do trabalho com

gêneros textuais são fazer com que os estudantes possam:

Aprender a dominar o gênero, primeiramente, para melhor conhecê-lo ou apreciá-lo, para melhor saber compreendê-lo, para melhor produzi-lo na escola ou fora dela; e, em segundo lugar, desenvolver capacidades que ultrapassem o gênero e que são transferíveis para outros gêneros próximos ou distantes (SCHNEUWLY e DOLZ, 2004, p. 80).

Compreende-se que a escola é um “autêntico lugar de comunicação” em que as

situações “são ocasiões de produção e recepção de textos” (SCHNEUWLY E DOLZ, 2004,

p. 78). A fim de produzir um trabalho efetivo, o professor deve garantir meios de

operacionalizar o contato dos estudantes com novos conhecimentos, bem como

acompanhá-los em seu desenvolvimento.

Dessas considerações, Schneuwly e Dolz (2004) propõem que o ensino de práticas

de leitura aconteça por meio de Sequências Didáticas, estruturadas de modo a considerar

as referências linguísticas prévias dos alunos, bem como os conteúdos que ainda não têm

domínio, propondo um desenvolvimento progressivo do conhecimento. A sequência

didática é uma:

(...) sequência de módulos de ensino, organizados conjuntamente para melhorar uma determinada prática de linguagem. As sequências didáticas instauram uma primeira relação entre um projeto de apropriação de uma prática de linguagem e os instrumentos que facilitam essa apropriação (DOLZ E SCHNEUWLY, 2004, p.51).

Os autores apresentam a Sequência didática por meio do seguinte esquema:

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Tal esquema apresenta quatro etapas (e subetapas) a serem elaboradas pelo

professor: 1º) a apresentação da situação que será desenvolvida ao longo do trabalho; 2º)

a produção inicial dos alunos; 3º) o desenvolvimento de módulos de estudo; e 4º) a

produção final.

Primeiramente o professor apresenta detalhadamente o gênero (ou gêneros)

escolhido (situação) aos alunos. Essa apresentação é essencial para que os estudantes

estabeleçam relações entre os conhecimentos trazidos pelo professor e os seus.

Em sequência, solicita uma produção inicial, com intuito de verificar os

conhecimentos prévios que os alunos têm sobre o assunto. Tendo por referência essa

produção, em que avalia as dificuldades dos discentes, adapta as atividades que serão

realizadas nos módulos ao longo da sequência didática.

Após a avaliação inicial, o professor propõe atividades e exercícios por meio de

módulos, a fim de que os alunos compreendam o gênero escolhido. O ensino por meio de

módulos pressupõe avaliação constante do processo de aprendizagem, permitindo

readequações na sequência didática de acordo com o desenvolvimento dos estudantes.

Assim, a quantidade de módulos deve ser estabelecida de acordo com os objetivos

traçados pelo professor tendo em vista o ensino do gênero escolhido.

Na produção final, depois de aprofundado estudo acerca das particularidades do

gênero, o professor propõe aos alunos que redijam um texto em que apresentem domínio

sobre o conhecimento produzido. Ao avaliar o texto final o docente pode verificar em quais

aspectos os discentes progrediram e aperfeiçoaram suas capacidades linguísticas.

Segundo Dolz, Noverraz e Schneuwly (apud SCHNEUWLY e DOLZ, 2004), as

finalidades de trabalhar com sequência didática são as seguintes:

- preparar os alunos para dominar sua língua nas situações mais diversas da vida cotidiana, oferecendo--lhes instrumentos precisos, imediatamente eficazes, para melhorar suas capacidades de escrever e de falar; - desenvolver no aluno uma relação consciente e voluntária com seu comportamento de linguagem, favorecendo procedimentos de avaliação formativa e de autorregulação; -construir com os alunos uma representação da atividade de escrita e de fala em situações complexas, como produto de um trabalho de lenta elaboração (p.110).

Quando propõem o trabalho com gêneros textuais por meio de sequência didática,

os autores concebem os textos como meios comuns das relações cotidianas. Por isso,

como objetos de estudo da Língua Portuguesa possibilitam maior assimilação de

conhecimento. A contextualização do conhecimento imanente ao estudo dos gêneros

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proposto pelos autores amplia a possibilidade de apreensão do significado das

informações transmitidas pelos textos nas diversas esferas de comunicação.

Nesse sentido, o trabalho com gêneros textuais na disciplina de Língua Portuguesa

objetiva a aprendizagem das normas linguísticas e, também, a compreensão sobre a

situação histórica, social e cultural que o texto enuncia, capacitando o aluno a refletir e

intervir, de forma clara, crítica, criativa e promissora no meio em que vive. Ao ter contato

com usos formais e informais da língua e, também, com diferentes tipos de gêneros

textuais que perpassam as esferas comunicativas de forma progressiva e articulada com

conhecimentos prévios, o estudante tem possibilidade de adquirir experiências, seja por

meio de narrativas que se aproximem ou distanciem de sua vivência individual, seja por

meio de textos informativos que o previne de riscos.

2.2 A esfera comunicativa literária

Ao escolher um (ou mais) gênero textual para trabalhar em Língua Portuguesa, é

preciso que o professor delimite a esfera discursiva na qual o gênero circula que será

apresentada aos alunos. A SD analisada neste trabalho propõe como objeto de estudo o

gênero conto relacionado às esferas comunicativas literária e multimidiática.

A compreensão da esfera literária remete aos significados de literatura e

literariedade.

Fundamentalmente, na esfera literária circulam textos que apresentam

personagens, enredo, ambiência, linguagem, tempo e foco narrativo, tendo por base certos

critérios linguísticos, textuais ou estéticos (ABREU, 2006). Além desses aspectos

elementares que definem uma obra como pertencente à esfera literária, há “elementos

externos ao texto” utilizados como “critérios críticos em vigor”, tais como “nome do autor,

mercado editorial, grupo cultural” (ABREU, 2006, p. 41). Tanto os critérios internos, como

os externos ao texto, estabelecem a literariedade de uma obra literária (ABREU, 2006).

Segundo Candido (1995), literatura pode ser definida como:

Todas as criações de toque poético, ficcional ou dramático em todos os níveis de uma sociedade, em todos os tipos de cultura, desde o que chamamos folclore, lenda, chiste, até as formas mais complexas e difíceis da produção escrita das grandes civilizações (p. 174).

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O autor afirma que a literariedade de um texto está relacionada à poesia, ficção e

dramaticidade, elementos comuns do cotidiano de uma sociedade, manifestados nas

formas populares de expressão e, também, nos mais complexos modos de produção de

escrita. Nesse sentido, Candido (1995) salienta que, não havendo uma única pessoa que

não passe um só dia sem exercitar sua imaginação – através de um livro ou de uma

música, novela ou anedota –, a leitura é essencial para a formação do indivíduo.

É frequente a associação do significado de literatura à “Grande Literatura”, como se

apenas as obras canônicas, identificadas como manifestações humanas universais,

fizessem parte da esfera literária. Ao mesmo tempo, muito se ouve sobre a falta de

interesse que o jovem tem pela leitura de textos literários e que o brasileiro lê muito pouco

e quase nada sabe a respeito de textos do passado. Refutar esses entendimentos é dever

do professor de Língua Portuguesa, sobretudo, quando são em parte verdadeiros e em

parte falsos.

Segundo Rojo (2004),a escola brasileira “não leva à formação de leitores e

produtores de textos proficientes e eficazes” (p.1). Isso acontece porque:

as práticas didáticas de leitura no letramento escolar não desenvolvem senão uma pequena parcela das capacidades envolvidas nas práticas letradas exigidas pela sociedade abrangente (ROJO, 2004, p.1).

Para Rojo (2004), o ato de ler demanda procedimentos e capacidades relacionadas

às finalidades da leitura. Os procedimentos são “um conjunto mais amplo de fazeres e de

rituais que envolvem as práticas de leitura” (ROJO, 2004, p.2), como ler da esquerda para

direita e de cima para baixo na cultura ocidental. Segundo a autora, as capacidades de

leitura são a decodificação textual (identificação de fonemas e grafemas), a compreensão

do texto (conhecimento de práticas sociais e linguísticas) e a reflexão (atitude de se

colocar em relação ao texto produzindo novos textos/discursos). Nessa perspectiva, a

prática literária na escola deve ultrapassar o ensino baseado no “processo de repetir, de

revozear falas e textos de autor(idade) – escolar, científica – que devem ser entendidos e

memorizados para que o currículo se cumpra” (ROJO, 2004, p.1).

Identificar os textos que circulam e materializam a esfera literária integralmente

demanda uma formação que privilegie tanto os aspectos formais da língua e da linguagem,

como o contexto em que os discursos são enunciados. Desse modo, constatar e analisar

a esfera literária é:

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Escapar da literalidade dos textos e interpretá-los, colocando-os em relação com outros textos e discursos, de maneira situada na realidade social; é discutir com os textos, replicando e avaliando posições e ideologias que constituem seus sentidos; é, enfim, trazer o texto para a vida e colocá-lo em relação com ela (ROJO, 2004, pp.1-2).

Compreender a literatura é identificá-la, também, como um bem cultural, uma vez

que é a expressão comunicativa estética intrínseca aos sujeitos e às relações sociais.

2.3 A esfera comunicativa multimidiática

Nas últimas décadas, os avanços científicos impulsionaram novas formas de

comunicação. As Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) atuais permitem a

troca de informações em escala exponencial e global, fomentando novas formas de

organização espaço-temporais que influenciam as ações sociais, bem como a integração

entre comunidades e culturas. A eclosão das TICs está intrinsecamente relacionada às

perspectivas de visão de mundo dos sujeitos e, por isso, é fundamental que a escola

acompanhe e avalie os arranjos comunicativos delineados pelo seguimento tecnológico.

Cada meio de comunicação estabelece uma mediação específica da linguagem:

sonora, verbal ou imagética (RAMONET apud GUIMARÃES et al., 2010). Segundo Barreto

(apud GUIMARÃES et al., 2010) “atualmente, a tecnologia digital tem possibilitado a

veiculação em grande escala de textos multimidiáticos que articulam as linguagens verbal,

imagética e sonora” (p.3).

Do latim, media (meio) significa meio de comunicação ou o conjunto de veículos de

comunicação (UNISUL, 2011). Multimídia é a tecnologia que permite a combinação, em um

mesmo programa e sob forma digital, diversas mídias, tais como jornais impressos,

imagens em movimento, figuras, sons, etc (GUIMARÃES et al., 2010). Sinteticamente, ela

“permite a coexistência de distintas ordens de materialidade em um mesmo espaço"

(NUNES apud , GUIMARÃES et al., 2010, p.2). Assim, multimídia refere-se não apenas

aos meios, mas também aos produtos, processos e linguagens.

Ferreira (apud UNISUL, 2011) define multimídia como “apresentação de

informações em uma multiplicidade de formatos, ou o conjunto de informações assim

apresentadas” (s/p).

Exemplos de textos multimidiáticos podem ser visualizados na figura abaixo:

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Fonte: UNISUL, 2011.

Compreendendo que não há efetivação do ensino sem a garantia do processo de

aprendizagem, é preciso que o professor organize estratégias e adote instrumentos que

sejam condizentes com a realidade do alunado. Uma vez que a esfera multimidiática é

constante na vida dos estudantes, torna-se meio contingente para a apropriação de

conhecimentos. Além disso, por tratar de diversas linguagens e mídias que atingem os

sujeitos por meio dos sentidos (visão, audição, tato) concomitantemente, permite maior

retenção e processamento de informações, estendendo e diversificando as maneiras de

produzir conhecimento.

Segundo FERREIRA e SILVA JR. (apud GUERRA, 2011), ao realizarem pesquisa

sobre o modo como os estudantes aprendem relacionado ao uso dos sentidos, os alunos

retêm muito mais informações (50% a 90% a mais) quando veem e escutam, falam e

discutem, ou falam e realizam, ao que quando, ou apenas leem, ou apenas escutam, ou

apenas veem. Assim, apresentar a esfera multimidiática como referência no aprendizado é

relevante.

2.4 O gênero conto

O gênero textual conto apresenta funções e características discursivas que

favorecem a formação cognitiva, criativa, imaginativa e reflexiva do aluno.

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Segundo Curto et al. (apud MELO, 2006), o gênero textual conto:

Tem como função entreter, divertir, comunicar fantasias ou fatos extraordinários, transmitir valores culturais, sociais e também morais. Tem como características: a estrutura narrativa, que consiste no desenvolvimento de acontecimentos narrados numa sucessão de fatos ou ideias ordenados cronologicamente. O tempo verbal, em geral, é utilizado no passado, e as formas sintáticas na 3ª pessoa (p.3).

Labov e Walestsky (apud MELO, 2006) assinalam que uma sequência narrativa é

composta por cinco fases, quais sejam:

1) situação inicial – há a apresentação de um estado que pode ser considerado equilibrado; no decorrer da história é introduzida uma perturbação; 2) complicação – é introduzido um conflito, criando uma tensão; 3) ações – são apresentadas as ações que são desenvolvidas em função da fase anterior; 4) resolução – inserem-se acontecimentos que geram a resolução da tensão originada na fase da complicação; e 5) situação final – com a resolução é gerado um novo estado de equilíbrio (p.3).

Tendo em vista essas considerações a respeito do gênero conto, Melo (2006)

aponta para alguns fatores que favorecem a escolha desse gênero para propor práticas de

leitura e escrita.

Por tratar de narração de fatos ocorridos com a presença de personagens, o conto

aguça a curiosidade do leitor em compreender toda a trama que se desvela ao longo da

leitura. O texto narrativo permite que os sujeitos tomem o lugar das personagens durante a

apreciação da leitura, imaginando as descrições psicológicas, temporais, espaciais e

histórico-sociais trazidas pelo autor e enriquecendo suas experiências pessoais. A noção

temporal desenvolvida em uma sequência narrativa possibilita a abertura reflexiva do leitor

que, envolvido com o drama projeta, em resposta à leitura, considerações acerca de suas

próprias ações (MELO, 2006).

O gênero conto possibilita a proximidade do professor à realidade do aluno, uma

vez que se trata de narrativas literárias que abarcam situações psicológicas, históricas,

afetivas que podem servir de instrumento para propiciar as referências necessárias ao

desenvolvimento de experiências formativas significativas e esclarecedoras. A narrativa

expressa experiências que, assim como são significativas para o narrador, podem tornar-

se para o leitor. Concomitantemente, o leitor deve lembrar e associar as experiências

narradas com as suas a fim de compreendê-las e analisá-las.

Nesse sentido, o trabalho com gênero conto favorece a apropriação e reflexão sobre

experiências humanas, sejam elas pertencentes à ficção ou referências da realidade.

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3 ANÁLISE COMENTADA DA PROPOSTA DE SEQUÊNCIA DIDÁTICA

3.1 Informações gerais

A SD analisada tem por objeto de estudo o gênero conto relacionado às esferas

comunicativas literárias e multimidiática. É destinada aos alunos do 2º ano do Ensino

Médio e tem duração de 30 aulas.

A base das atividades propostas na SD é a leitura de diferentes tipos de conto

presentes na literatura e multimídias. A premissa da leitura desses contos em distintas

esferas de comunicação é a importância de situar os estudantes em experiências

narrativas que suscitem questionamentos sobre os comportamentos humanos, além de

capacitá-los a construir textos narrativos manifestando e refletindo sobre suas próprias

reminiscências e valores morais, de modo criativo.

A organização da SD é fundamentada em unidades de ensino, de modo que, entre

as unidades, o professor realiza avaliações contínuas a fim de verificar a pertinência das

atividades programadas de acordo com as assimilações e dificuldades de entendimento

apresentadas pelos discentes.

3.1.1 Objetivos esperado s

Tendo por referência as capacidades de leitura essenciais no processo da prática

letrada voltada à formação da cidadania, em que os sujeitos posicionam-se “em

permanente revisão e réplica” em relação aos textos com os quais têm contato proposto

por Rojo (2004), na SD os objetivos esperados estão organizados em:

I) objetivos voltados às capacidades de compreensão. Espera-se que o aluno

seja capaz de:

- identificar os elementos que estruturam o conto;

- identificar a narração como meio de compartilhar experiências;

- buscar instrumentos que o auxiliem na superação das dificuldades trazidas

durante a leitura.

Com este primeiro bloco de objetivos, a SD visa ao desenvolvimento das

capacidades estratégicas de leitura, necessárias ao entendimento do texto lido, tais como

a associação de um determinado texto a textos lidos anteriormente, bem como a

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apreensão de novos conhecimentos que ampliem o arcabouço de referência intelectual e

afetiva do aluno.

II) objetivos voltados às capacidades de interpretação e interação. Espera-se

que o aluno seja capaz de:

- identificar elementos de intertextualidade;

- identificar elementos de interdiscursividade;

- identificar os aspectos históricos e sociais como elementos implícitos nos

contos;

- argumentar sobre fatos sociais de modo a defendê-los logicamente;

- identificar o texto literário como fator de promoção dos direitos e valores

humanos atualizáveis na contemporaneidade;

- produzir um conto infantil;

- identificar as imagens como forma de linguagem;

- produzir um livro;

- usar adequadamente a norma padrão da Língua Portuguesa.

Por meio dos objetivos deste bloco, a SD almeja desenvolver capacidades de

apreciação e réplica do leitor em relação ao texto, tais como relacionar argumentos a

respeito de um tema em determinado texto a outros argumentos referentes ao mesmo

tema presentes em outros textos e, também, produzir seu próprio texto, levando em conta

as variações das estruturas discursivas.

3.1.2 Características da turma

O público-alvo da SD são estudantes do 2º ano do Ensino Médio. Uma das

principais características observadas dessa turma é a adolescência. Jovens, na média de

16 anos de idade geralmente apresentam-se como alunos questionadores e intensos em

suas relações, vorazes e inseguros na busca pela independência, no auge do

desenvolvimento hormonal, cheios de sonhos e desilusões.

Na SD analisada, são propostas atividades e exercícios que permitem aos alunos

pensarem sobre suas inquietações, além de expressá-las e compartilhá-las entre pares, o

Page 19: Monografia Carla Thomas

14

que permite que reconheçam-se como sujeitos capazes de agir para transformar a

realidade.

Para tanto, para a produção das atividades e exercícios propostos, a SD pressupõe

algumas noções prévias dos alunos sobre: tempos verbais, coesão e coerência para a

escrita de um texto, estrutura de textos dissertativos e argumentativos, uso de pontuação,

figuras de linguagem, acesso à Internet.

3.2 A organização da SD

A SD está organizada tendo por referência a proposta de Schneuwly e Dolz (2004),

a respeito do trabalho com gêneros textuais. É apresentada no seguinte esquema:

Referido esquema ilustra a divisão da SD em seis unidades. Cada unidade é

composta por diferentes tipos de textos e tarefas destacadas em diferentes cores e caixas

de texto de distintas formas. Quanto aos textos, são apresentados: textos introdutórios e

explicativos a respeito dos principais assuntos trabalhados nas unidades e textos literários

básicos para o estudo do conto (estes não estão em caixas de texto), textos multimidiáticos

(por meio da indicação de links de acesso à clips, videocasts, áudios e bibliotecas digitais),

trechos de textos de estudiosos do gênero conto (destacados em caixas de formato de

pergaminho) e textos biográficos (destacados em caixas de formato de folha virada). As

tarefas estão classificadas em: atividades para discussão em grupo (caixas de cor verde),

exercícios para resolução individual (caixas de cor azul), pesquisa (caixas de cor laranja),

orientações para autoavaliação (caixas de cor lilás) e quadros de orientação de produção

textual. Além dos textos e tarefas, a SD é ilustrada com figuras que aludem aos temas

estudados, o que propicia a aproximação dos estudantes com os assuntos trabalhados.

A organização das tarefas e textos em diferentes cores e formas de caixas

ilustrativas permite uma melhor visualização das ações realizadas ao longo da SD,

Apresentação da situação

(gênero conto)

Produção inicial

MÓDULO 2 O conto e os

conflitos humanos

MÓDULO 1 O contista

MÓDULO 3 O conto na Literatura

Produção final

Page 20: Monografia Carla Thomas

15

facilitando o acompanhamento e a avaliação, tanto do aluno quanto do professor, sobre o

trabalho.

3.3 As atividades propostas em cada unidade de trabalho

A seguir, apresenta-se sucintamente as atividades sugeridas na SD divididas pelas

unidades de trabalho, analisando-as quanto às possibilidades de alcance dos objetivos

traçados.

Na primeira unidade da SD em análise, é feita introdução do gênero conto,

indicando suas principais características. A atividade elementar dessa unidade é a análise

de um conto do tipo popular: O Barba de Ouro e a Carantonha (1949), de Luis Maria

Ferreira e um conto moderno: Noites de Almirante (1884), de Machado de Assis. As tarefas

propostas visam fazer com que os alunos sejam capazes de: I) identificar os elementos

que estruturam o conto; II) identificar a narração como meio de compartilhar experiências;

e iii) buscar instrumentos que o auxiliem na superação das dificuldades trazidas durante a

leitura.

A segunda unidade, Produção inicial, é elaborada com objetivo de avaliar o

conhecimento dos alunos acerca do gênero apresentado.

Na terceira unidade, denominada Módulo 1 – O contista, são propostas atividades e

exercícios que exploram a capacidade de resgatar lembranças, a potencialidade criativa e

a autorreflexão a respeito dos desejos e valores como elementos importantes para a

produção de textos narrativos. Nessa unidade é introduzida a esfera comunicativa

multimidiática, a fim de aproximar os alunos da literatura. Os objetivos potencialmente

alcançáveis nessa unidade são: I) identificar elementos de intertextualidade; e II) identificar

elementos de interdiscursividade.

Em sequência, no Módulo 2 – O conto e os conflitos humanos, ou quarta unidade, a

SD propõe atividades que promovem a reflexão sobre as intrigas e questionamentos

pessoais e sociais. Os textos básicos dessa unidade são: Negrinha, de Monteiro Lobato,

um conto moderno pertencente à esfera literária e o longametragem Preciosa – uma

história de esperança, concernente à esfera multimidiática. As tarefas propostas podem

empreender o aluno a ser capaz de: I) identificar os aspectos históricos e sociais como

elementos implícitos nos contos; e II) argumentar sobre fatos sociais de modo a defendê-

los logicamente. Além disso, permitem evidenciar o conto como modo de expressão para

Page 21: Monografia Carla Thomas

16

exprimir distintas experiências humanas, tais como as relacionadas aos conflitos

individuais e sociais (identificados, por exemplo, em situações de infidelidade, violência e

desprezo), bem como as relacionadas à cidadania (observadas, por exemplo, em atitudes

solidárias e de respeito ao outro).

Na quinta unidade, que abrange o Módulo 3 – O conto na Literatura, as atividades

sugeridas buscam evidenciar a narrativa como um direito de formação humana,

destacando a importância da literatura para a construção da cidadania. O principal objetivo

é levar os estudantes a identificar o texto literário como fator de promoção dos direitos e

valores humanos atualizáveis na contemporaneidade.

Na Produção final, sexta e última unidade, a SD propõe a conclusão da confecção

de um livro de conto infantil para ser doado a alunos mais novos. Por fim, espera-se que o

aluno, também, seja capaz de: I) produzir um conto infantil; II) identificar as imagens como

forma de linguagem; III) produzir um livro; e IV) usar adequadamente a norma padrão da

Língua Portuguesa.

Page 22: Monografia Carla Thomas

17

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Assim como o planejamento de conteúdos e atividades, a escolha de temas

propostos à reflexão dos alunos é de suma importância. Para tanto, o professor deve

conhecer o perfil dos discentes, a fim de instigá-los por questionamentos pertinentes aos

seus obstáculos e utopias.

É essencial que os estudantes apropriem-se do conhecimento, tomando-o por

referência em seu cotidiano, para além dos muros da escola. A educação escolar deve

orientar os sujeitos para a produção de conhecimento, não apenas para reprodução. Caso

contrário, propicia-se um ensino de caráter instrumental, limitado quanto ao

desenvolvimento pleno das potencialidades individuais e sociais que a escola pode

fomentar.

O trabalho na Língua Portuguesa tendo como pano de fundo gêneros discursivos e

esferas comunicativas distintas permite ao aluno, além de apropriar-se da estrutura e

funcionamento da língua, compreender que um texto é repleto de significados, mas, em

construção contínua.

A premissa da SD é de que a apropriação do gênero conto permite que os alunos,

adolescentes: I) identifiquem que muitas de suas indagações pessoais são, também, as de

outras pessoas, compartilhadas universalmente; II) observem que as atitudes pessoais,

assim como fatos sociais, trazem consequências individuais e coletivas; III) compreendam

que o processo de independência ocorre de acordo com as possibilidades de experiências

que permitem satisfazer as necessidades e ultrapassar os problemas cotidianos; IV)

reconheçam que os sonhos e desilusões, assim como textos de ficção e narrativas, são

importantes para o desenvolvimento da imaginação e da criatividade, bem como são

referências expressivas para autorreflexão.

O trabalho evidenciando a intertextualidade do conto presente nas esferas da

comunicação literária e multimidiática viabiliza modos de produção de conhecimento na

apropriação da prática de leitura e escrita, desobstruindo as barreiras impostas à leitura

literária e os fetiches a ela incorporados, tais como a ilusão fortemente promovida de que o

acesso, produção e compreensão da “grande literatura” é privilégio de uma elite de

intelectuais.

Entende-se que a proposta da SD vai ao encontro de questionamentos e soluções

de muitos problemas enfrentados pelos jovens, tais como as constantes mudanças e

descobertas inerentes ao processo de amadurecimento biológico, motor, afetivo e

Page 23: Monografia Carla Thomas

18

intelectual. Nesse sentido, a escolha pelo trabalho com gênero conto nas esferas

comunicativas literária e multimidiática proposto a alunos do 2º ano do Ensino Médio é

pertinente.

Page 24: Monografia Carla Thomas

19

REFERÊNCIAS

ABREU, M. Cultura letrada – literatura e leitura. São Paulo: UNESP, 2006. BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: Língua

Portuguesa. Brasília: MEC / SEF, 1998. Brasil. Ministério da Educação. Guia de livros didáticos PNLD 2008: Língua Portuguesa/ Ministério da Educação. – Brasília: MEC,2007. 152 p. – (Anos Finais do Ensino Fundamental).

CÂNDIDO, A. “O direito à Literatura”. In: CÂNDIDO, Antônio. Vários escritos. São Paulo:

Duas Cidades, 1995. GUERRA, R. A. T. (org.). Cadernos Cb Virtual. João Pessoa: Editora Universitária-

UFPB/BC, 2011. GUIMARÃES, G. et al. Textos multimidiáticos na escola. Texto apresentado no 33º

ENCONTRO DA ANPED CENTRO-OESTE, Caxambu, p.1-15. Disponível em <http://www.anped.org.br/33encontro/app/webroot/files/file/Trabalhos%20em%20PDF/

GT16-6325--Int.pdf>. Acesso em 10 nov. 2012. MARCUSCHI, L. A. “Gêneros textuais: configuração, dinamicidade e circulação”. In:

BRITO, K. S.; GAYDECZKA, B.; KARWOSKI, A. M. Gêneros textuais. Reflexões e ensino. 2.ed. Rio de Janeiro: Lucerna, 2006.

MORICONI, Ítalo (org.). Os cem melhores contos brasileiros. Rio de Janeiro: Objetiva,

2001. UNISUL. Compreendendo as novas mídias. OpenLearn-LabSpace, 2011. Disponível em

http://labspace.open.ac.uk/mod/oucontent/view.php?id=425896&section=1.2. Acesso em 10 nov. 2012

ROJO, R. Letramento e capacidades de leitura para a cidadania. Texto apresentado em

CONGRESSO DA SEE: CENP, São Paulo, p.1-8. _______. Letramentos múltiplos, escola e inclusão social. São Paulo: Parábola

Editorial, 2009. SCHNEUWLY, Bernard; DOLZ, Joaquim. Trad. e org. ROJO, Roxane; CORDEIRO, Glaís

S. Gêneros orais e escritos na escola. Campinas, SP: Mercado das Letras, 2004.

Page 25: Monografia Carla Thomas

20

ANEXO: A SD elaborada

SSeeqquuêênncciiaa DDiiddááttiiccaa eemm LLíínngguuaa PPoorrttuugguueessaa 22ºº aannoo ddoo EEnnssiinnoo MMééddiioo

PPrrooffªª CCaarrllaa TThhoommaass

AA AARRTTEE DDEE CCOONNTTAARR HHIISSTTÓÓRRIIAASS::

oo ccoonnttoo nnaa lliitteerraattuurraa ee nnaass mmííddiiaass

SSããoo PPaauulloo//CCaammppiinnaass 22001122

Page 26: Monografia Carla Thomas

2

SSuummáárriioo

INTRODUÇÃO (para o professor) ......................................................................................................................................... 4 APRESENTAÇÃO DA SITUAÇÃO (GÊNERO CONTO)

Aulas 1 e 2 – Para início de conversa .................................................................................................................................. 5 Texto 1 – O Barba de Ouro e a Carantonha, de Luiz Maria Ferreira ............................................................ 5 Atividade 1 – para conversar em grupo .................................................................................................................. 6 Atividade 2 – para pesquisar ....................................................................................................................................... 6

Aulas 3 e 4 – Apresentando o Conto... ............................................................................................................................... 8 Atividade 3 – para conversar em grupo ................................................................................................................. 9 Atividade 4 – pra criar .................................................................................................................................................... 9 Sequência narrativa ......................................................................................................................................................... 9 Exercício 1 – estudo do texto O Barba de Ouro e a Carantonha (I) ............................................................ 10

Aulas 5 e 6 - Características do narrador (o foco narrativo) ................................................................................ 11 Texto 2 – Noite de Almirante, de Machado de Assis .......................................................................................... 11 Atividade 5 – para conversar em grupo ................................................................................................................ 14 Atividade 6 – para pesquisar ...................................................................................................................................... 14 Exercício 2 – estudo do texto Noite de almirante (I) ....................................................................................... 14

Aulas 7 e 8 – Elementos da narrativa (enredo, tempo e espaço) ........................................................................ 15 Exercício 3 – estudo do texto Noite de almirante (II) ...................................................................................... 16 Exercício 4 – estudo do texto O Barba de Ouro e a Carantonha (II) .......................................................... 16

PRODUÇÃO INICIAL

Aulas 9 e 10 - Produzindo um conto infantil... ............................................................................................................. 17 Quadro de orientação para produção textual do gênero conto infantil .................................................... 18

Avalie seu conto ............................................................................................................................................................... 18

MÓDULO 1 – O CONTISTA Aulas 11 e 12 – Memória, criatividade e intenções do contista (1) .................................................................... 19

Atividade 7 – para conversar em grupo ................................................................................................................ 20 Exercício 5 – criação de imagens para ilustrar conto infantil ...................................................................... 21

Aulas 13 e 14 – Memória, criatividade e intenções do contista (2) .................................................................... 22 Atividade 8 – para conversar em grupo ................................................................................................................ 23

Exercício 6 – reelaboração de conto infantil ....................................................................................................... 23 MÓDULO 2 – O CONTO E OS CONFLITOS HUMANOS

Aulas 15 e 16 – O conto como centro de discussão sobre os conflitos humanos (1) .................................. 24 Texto 3 – Negrinha, de Monteiro Lobato ............................................................................................................... 24 Atividade 9 – para conversar em grupo ................................................................................................................. 27 Atividade 10 – para pesquisar .................................................................................................................................... 27 Exercício 7 – estudo do texto Negrinha (I) ........................................................................................................... 28

Figuras de linguagem ..................................................................................................................................................... 28 Exercício 8 – estudo do texto Negrinha (II) ......................................................................................................... 29

Aulas 17 a 20 - O conto como centro de discussão sobre os conflitos humanos (2) ................................... 30 Filme – Preciosa, de Lee Daniels ................................................................................................................................ 30

Atividade 11 – para conversar em grupo .............................................................................................................. 30 Exercício 9 – estudo do filme Preciosa – uma história de esperança .......................................................... 31

Page 27: Monografia Carla Thomas

3

MÓDULO 3 – O CONTO NA LITERATURA: A NARRATIVA COMO DIREITO HUMANO Aulas 21 e 22 – A importância da leitura na formação de cidadãos.................................................................... 32

Atividade 12 – para conversar em grupo .............................................................................................................. 33 Exercício 10 – finalizando a produção do conto infantil ................................................................................ 33

Aulas 23 e 24 – Estrutura do livro: texto e paratextos ............................................................................................. 34 Esquema para produção de um livro infantil ...................................................................................................... 34 Quadro de orientação para produção de um livro de conto infantil .......................................................... 35 Dicas para produção de um livro infantil .............................................................................................................. 36

PRODUÇÃO FINAL

Aulas 25 e 26 – Produzindo um livro de conto infantil ........................................................................................... 37 Avalie seu livro ................................................................................................................................................................. 37 Atividade 13 – para decidir ......................................................................................................................................... 37

Aulas 27 a 30 – Encerramento da sequência didática ............................................................................................... 38 Entrega de livro produzido para crianças em fase de alfabetização e avaliação da SD ..................... 38 Autoavaliação ................................................................................................................................................................... 38

REFERÊNCIAS

Referências bibliográficas..................................................................................................................................................... 39 Referências iconográficas ..................................................................................................................................................... 40 Referências de imagens em movimento ......................................................................................................................... 41 Referências sonoras ................................................................................................................................................................ 41

Page 28: Monografia Carla Thomas

4

INTRODUÇÃO

Alô, professor! Alô, professora! Nesta sequência didática (SD) o objeto de ensino é o gênero textual conto presente, sobretudo,

nas esferas comunicativas literária e multimidiática. A SD tem como público alvo alunos do 2º ano do Ensino Médio e duração de trinta aulas.

O objetivo geral da SD é fazer com que os estudantes sejam capazes de reconhecer os elementos

textuais específicos do gênero conto, presente na literatura e na multimídia, concebendo-o como forma de manifestação comunicativa ficcional que simboliza as mais íntimas experiências individuais e sociais. Além disso, espera-se que os alunos, ao identificar os elementos textuais do conto e explorar diferentes esferas comunicativas, instruam-se do funcionamento e estrutura da Língua Portuguesa.

Quanto aos objetivos específicos, são traçados tendo por referência as capacidades de leitura

essenciais no processo da prática letrada voltada à formação da cidadania proposto pela linguista Roxane Rojo (2004). São eles:

I) objetivos voltados às capacidades de compreensão. Espera-se que o aluno seja capaz de:

- identificar os elementos que estruturam o conto; - identificar a narração como meio de compartilhar experiências; - buscar instrumentos que o auxiliem na superação das dificuldades trazidas durante a leitura.

II) objetivos voltados às capacidades de interpretação e interação. Espera-se que o aluno seja

capaz de:

- identificar elementos de intertextualidade; - identificar elementos de interdiscursividade; - identificar os aspectos históricos e sociais como elementos implícitos nos contos; - argumentar sobre fatos sociais de modo a defendê-los logicamente; - identificar o texto literário como fator de promoção dos direitos e valores humanos atualizáveis na contemporaneidade; - produzir um conto infantil; - identificar as imagens como forma de linguagem; - produzir um livro; - usar adequadamente a norma padrão da Língua Portuguesa.

O trabalho na Língua Portuguesa tendo como pano de fundo gêneros discursivos e esferas comunicativas distintas permite ao aluno, além de apropriar-se da estrutura e funcionamento da língua, compreender que um texto é repleto de significados, mas, em construção contínua. Esta SD foi organizada de modo detalhado para que você tenha suporte para acompanhar e avaliar continuamente o desenvolvimento dos alunos e, consequentemente, articular práticas que o aproximem dos objetivos esperados. Espero que faças um ótimo trabalho, vivenciando experiências cativantes com seus alunos! Profª Carla Thomas

Page 29: Monografia Carla Thomas

5

AAPPRREESSEENNTTAAÇÇÃÃOO DDAA SSIITTUUAAÇÇÃÃOO ((GGÊÊNNEERROO CCOONNTTOO))

TEXTO 1: O BARBA DE OURO E A CARANTONHA

Havia um rei que tinha uma bonita barba de ouro. Um dia ele foi chamado ao quarto da rainha para ver a criança que acabava de nascer. Mas esse barba de ouro era encantado e mau. Assim que viu o lindo menininho, pegou e foi comendo-o à vista de todos.

A rainha, quando de novo estava esperando outra criança, combinou com a comadre para lograrem o rei. Arranjaram um coelhinho. Chamaram o Barba de Ouro e lhe apresentaram o filho. Ah! O rei comeu o coelhinho e gostou.

A comadre levou a criança, que era uma menina, para criar por uns camponeses em um outro reinado. A menina foi crescendo, crescendo. Os pais adotivos eram pobres, não sabiam o que fazer com ela. E já estava em ponto de casar.

Então mataram uma ovelha, tiraram-lhe a pele e vestiram com ela a mocinha, que ficou que nem um bicho. A madrinha, que era uma fada, pôs-lhe no dedo um anel que era para ela pedir o que precisasse. E subiram à água-furtada da casa, despediram-se da moça e, dizendo-lhe que se fosse com Deus, pelo mundo, empurraram-na da janela.

Aquela coisa foi, ao leu do vento e, enfim, caiu na floresta. O bicho ficou por ali, quieto. Ouvia as cornetas: tu, tu, ru, tu, e latidos dos cães. O rei estava à caça. E então apareceram os caçadores e já levavam a arma à cara, quando o rei ordenou: não atirem!

O rei desse reinado era moço e curioso. Achou esquisito aquele bicho que falava como gente. Levou-o para a cozinha do palácio e pôs-lhe o nome de Carantonha.

A Carantonha assistia às festas de longe.

Uma ocasião ouviu contar, na cozinha, de três grandes bailes que o rei ia dar em seguida, para escolher a sua noiva. Em todo o reinado, era um reboliço fora do costume e costureiras e alfaiates não tinham mãos a medir. As moças queriam ser princesas. O rei gostava de ver sempre a Carantonha, que lhe prestava serviços, muito humilde.

Carantonha segurava a bacia de prata para o rei lavar as mãos.

– Vossa majestade me deixa ir na festa?

- Tu, Carantonha?

O rei falou assim e borrifou o rosto dela, brincando. O que é que ela ia lá fazer? Carantonha saiu chorando para o seu cantinho da cozinha. Só então é que se lembrou do anel. Esfregou-o e disse:

- Anel, pelo poder que Deus te deu, quero que me arranjes um vestido cor da terra e uns chapins muito bonitos! – Imediatamente Carantonha viu-se transformada naquela princesa mais bonita e procurou as salas de baile sem que ninguém percebesse. Opa! Foi um sucesso! O rei dançou com ela e quase só com ela. Perguntou-lhe donde era e Carantonha respondeu:

- Eu sou da terra dos borrifos de água. E tratou de sair despercebida, para a cozinha, vestindo de novo a pele de ovelha.

No outro dia a criadagem não falava de outra coisa: da nova princesa que aparecera e ninguém sabia de que reinado era.

Quando ela foi apresentar a toalha ao rei, pediu-lhe licença para ir ao baile. O rei atirou-lhe a toalha: - Tu, Carantonha? - Lá foi a moça para o seu cantinho da cozinha, esfregou o anel, e:

Aulas 1 e 2: Para início de conversa...

Page 30: Monografia Carla Thomas

6

- Hoje quero um vestido cor de céu. E já estava como uma princesa. E foi entrando com jeito no salão. Opa! Que sucesso! O rei dançou com ela até a madrugada. Perguntou-lhe donde era.

– Eu? Eu sou da terra do joga a toalha. E tratou de escapulir-se. No terceiro dia, enquanto o rei lavava as mãos depois do jantar, Carantonha pediu-lhe outra vez a licença para ir ao baile.

– Tu, Carantonha? E o rei deu-lhe um tapinha na cara, brincando.

A moça pediu ao anel o vestido cor do mar, muito mais lindo que os outros. E entrou no salão. Já o rei foi recebê-la e dançaram, dançaram.

– Donde és, bela princesa? Quero casar-me contigo, disse-lhe o rei.

– Eu? Eu sou da terra do leva um tapa.

Mais tarde a Carantonha escapou e foi vestir sua pele na cozinha.

Estava acabando o baile. O rei resolveu descobrir o enigma. A princesa acabava de desaparecer. Devia estar ainda no palácio. O rei mandou a polícia ocupar todas as saídas e quando as moças iam saindo examinava uma por uma a ver-lhe o vestido cor do mar e as feições do rosto, que muito bem lembrava. Nada! Ninguém! Examinou depois as camareiras do palácio. Carantonha pediu ao anel o mesmo vestido cor do mar, cobriu-se com a pele e ficou esperando. O rei estava certo que ninguém saíra. E então só faltava examinar a Carantonha. Ele já andava desconfiado. Por isso chegou de repente, puxou a espada e rasgou-lhe um pedaço da pele. Apareceu o vestido – Ah! É assim? – disse o rei, riscou a pele de alto a baixo e Carantonha apareceu se rindo, nos modos e no porte de uma princesa.

Os cortesãos estavam admirados! Que coisa! Mas o rei, meio carrancudo, interpelou a moça:

– Tu estavas zombando de mim? Olha, que eu não sou para brincadeiras. Porque é que me dissestes que era da terra dos borrifos de água?

- Ué! Então vossa majestade não se lembra mais que quando pedi para ir ao baile da primeira noite me esborrifou a água no meu rosto?

- Ah! Tens razão. E porque na segunda noite disseste seres da terra do joga a toalha? - Porque vossa majestade, quando pedi para ir ao baile, me jogou a toalha.

– Ah! É verdade. E na terceira noite tu era da terra leva um tapa.

– Pois sim! Vossa majestade, quando lhe pedi para ir ao baile, me deu um tapa, brincando.

Em seguida, o rei apresentou a noiva aos cortesãos e convidados, marcou-se o dia das bodas. À hora do banquete, a nova rainha, como era costume, contou uma história. A história dela, a sua infância escondida, a caçada real, a madrinha boa fada. O Barba de Ouro era falecido, e a rainha mãe dela. Os pais adotivos vieram morar no palácio. Parece que ainda existem, arcadinhos, arcadinhos, mas contentes da vida! (Luís Maria Ferreira. In: Almeida, Aluísio de. "Três contos populares". O Estado de São Paulo, 4 set 1949).

Atividade 1 (para conversar) - EM GRUPO

1. Você já conhecia a história O Barba de Ouro e a Carantonha? Ela se assemelha a

alguma história que você conhece? Qual?

2. A que gênero de texto pertence O Barba de Ouro e a Carantonha? Qual é a

organização discursiva predominante – narrativa, descritiva, argumentativa,

conversacional ou expositiva?

3. Você se identifica com algum personagem da história? Qual? Por quê?

4. Essa história pode ser considerada real ou fictícia? Quais elementos descrevem

situações reais e imaginárias?

5. As palavras de Carantonha e Barba de Ouro parecem endossar uma perspectiva

machista dos relacionamentos amorosos? Por quê?

Atividade 2 - PARA PESQUISAR Procure em dicionários e registre no seu caderno o significado das palavras: - Lograr - Água-furtada - Chapim - Bodas - Arcado

Page 31: Monografia Carla Thomas

7

Raros são os dias em que não contamos ou ouvimos algum tipo de história, não é mesmo? Nas conversas com os amigos, na leitura de jornais, revistas, livros, televisão, Internet etc, em algum momento nos deparamos com uma história que nos desperta curiosidade e sentimentos marcantes, seja ela fictícia, seja relacionada a fatos reais.

Histórias chamam nossa atenção, pois no texto narrativo nos são apresentados acontecimentos de modo sequenciado, procurando criar uma impressão sobre a realidade. O escritor nos fornece uma sucessão de acontecimentos que, vividos por personagens, em tempo e lugar determinados, nos são contados por um narrador. O romance, o conto, a novela e, às vezes, o poema e a crônica constituem diferentes expressões narrativas.

O ato de contar histórias remonta a épocas antigas da humanidade, iniciado pelas tradições orais, chegando, nos últimos séculos, a se tornar uma manifestação artística, por meio da Literatura. Para uma boa leitura dos textos narrativos é preciso reconstruir os sentidos da história, atribuindo-lhes significados observados, também, nas entrelinhas. Ou seja: uma história tem muito a nos dizer, pois revela fatos sociais e psicológicos que o narrador quer nos transmitir. Por outro lado, quando contamos uma história, podemos expressar nossos sentimentos e registrar a visão que temos do mundo.

Nesta sequência didática produziremos atividades que permitirão a compreensão do gênero textual conto, evidenciando suas características linguísticas, bem como a identificação do que é necessário para a leitura e escrita de contos. O objetivo é possibilitar a construção criativa do conhecimento necessário para apreciação da arte de ler e contar histórias.

Um conto é um texto narrativo ficcional que se caracteriza, entre outros aspectos, por sua brevidade. Sua classificação como gênero textual narrativo é relativamente moderna: aparece em meados do século passado. A maioria dos historiadores da literatura atribui ao escritor norte-americano Edgar Allan Poe a determinação da forma desse tipo de texto: Poe havia escrito que um conto é um relato que deve ser lido “em um tiro”. Por isso, por mais simples que um conto possa nos parecer, há importantes detalhes de linguagem envolvidos que o tornam um gênero textual cativante.

Existe uma série de tipos de contos, tais como os contos de fadas, os contos de mistério, os contos de ficção, os policiais, os maravilhosos etc. Cada um dos tipos de conto apresenta especificidades nos assuntos e no modo como impulsiona os sentimentos e a imaginação do leitor.

O texto 1, O Barba de Ouro e a Carantonha, é um exemplo de conto popular, uma vez que foi narrado oralmente, em 1880 pelos avós do autor. Nas próximas aulas realizaremos leituras de outros tipos de conto a partir dos quais faremos comparações e observações que permitirão a apropriação desse gênero textual.

No que se refere à avaliação, ela será realizada constantemente, a partir da observação de seu empenho durante as aulas e, também, pelos registros que você fará. Ao final, espera-se que você seja capaz de produzir seu próprio conto.

Então vamos lá? O que você tem para contar?

Bom estudo!

Page 32: Monografia Carla Thomas

8

Nas aulas anteriores lemos o conto O Barba de Ouro e a Carantonha. Esse conto apresenta características semelhantes a uma história que nos contam desde a infância:

Cinderela. Você não acha?

Cinderela é um conto de fadas. Além dele você conhece mais algum? Vamos observar

algumas imagens para relembrar?

Aulas 3 e 4: Apresentando o Conto...

[Figura 3] [Figura 2] [Figura 1]

[Figura 5] [Figura 4]

[Figura 6]

[Figura 7]

[Figura 8]

Page 33: Monografia Carla Thomas

9

Ao iniciarmos nossas conversas sobre o gênero textual conto, vimos que sua principal característica é a brevidade. A brevidade do conto (de umas poucas linhas até umas trinta ou quarenta páginas) é um aspecto que limita todos os elementos que compõem a narração. Em razão de sua brevidade, um conto costuma apresentar um único conflito; poucos personagens, espaço temporal reduzido e um único ambiente.

Nos contos, como em toda narração, relata-se uma série de fatos relacionados entre si. A relação que se estabelece entre uma série de fatos se denomina sequência. Nas narrações, a sequência predominante é cronológica (temporal) e lógica (de causa e efeito). Isso significa que os fatos se desenvolvem sucessivamente. Além disso, em um mundo real ou verossímil, seria ilógico que alguém saísse de um lugar antes de chegar a ele. A sequência, então, apresenta-se de tal modo que cada um dos fatos é necessário para explicar o anterior e o seguinte. As sequências típicas de um conto podem ser resumidas em três momentos: uma situação inicial ou introdução, um conflito ou complicação (clímax) e um desfecho.

Atividade 3 (para conversar) - EM GRUPO

1. As imagens ilustram personagens típicos dos contos de fadas. Quais

são?

2. Os contos de fadas geralmente nos são apresentados com um começo

e um final típicos. Você sabe quais são?

3. Quais semelhanças e diferenças você consegue estabelecer entre os

personagens dos contos de fadas? Todos eles têm as mesmas

características psicológicas?

4. Existe conflito nos contos de fadas? Você consegue descrever algum?

5. Há algum conto de fadas que tenha marcado sua infância? Qual? Por

quê?

6. Você acha que a vida é como um conto de fadas? Por quê?

Atividade 4 - PARA CRIAR Reunido com dois colegas, faça o seguinte: um integrante escreve o início de um conto de fadas. Depois, passa-o a um companheiro para que desenvolva o conflito e, finalmente, o último deve resolvê-lo. Ao ler o resultado, vão descobrir diferentes alternativas que se apresen-tavam em cada núcleo e as escolhas que cada um realizou.

SSeeqquuêênncciiaa NNaarrrraattiivvaa

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Sequência narrativa

Quem conta um conto

Um conto é uma narrativa curta. Não faz rodeios: vai direto ao assunto.

No conto tudo importa: cada palavra é uma pista. Em uma descrição, as informações são valiosas; cada adjetivo é insubstituível; cada vírgula, cada ponto, cada espaço – tudo está cheio de significado.

Já se disse que o conto está para o romance assim como a fotografia está para o cinema: tanto o contista quanto o fotógrafo devem selecionar uma situação e extrair dela o máximo. Escritores, estudiosos e amantes da literatura em geral vêm há muito tempo tentando definir o que é, afinal o conto – mas esse debate, pelo jeito, está longe de acabar...

Enquanto isso, os contos vão sendo escritos. O Brasil tem uma lista extensa de muitos contistas: Mário de Andrade, Murilo Rubião, Guimarães Rosa, Rubem Braga, Clarice Lispector, Rubem Fonseca, Dalton Trevisan, Otto Lara Resende e inúmeros outros [...].

Exercício 1 (responda em seu caderno) – Estudo do texto O Barba de Ouro e a Carantonha (I)

1. O conto em estudo é um texto curto que pertence ao grupo dos textos narrativos ficcionais. Caracteriza-se por ser condensado, isto é, apresenta poucos personagens, poucas ações e tempo e espaço reduzidos. No conto O Barba de Ouro e a Carantonha:

a) Quem são os personagens envolvidos nos fatos narrados?

b) A história narrada no conto limita-se ao essencial. Tente resumi-la em uma linha.

2. Nos gêneros narrativos, a sequência dos fatos mantem entre si uma relação de causa e efeito.

a) Um dos mais importantes elementos dessa relação é o conflito: uma oposição de interesses que, ao criar uma tensão em torno da qual se organizam os fatos narrados, prende a atenção do leitor ou ouvinte. No conto em estudo, qual é o conflito?

b) Em busca de uma esposa, Barba de Ouro ofereceu aos moradores da cidade três dias de baile e encantou-se com uma moça que conheceu, mas, que ainda não sabia bem ao certo quem era já no terceiro dia de encontro. Nesse momento, o conto atinge o clímax, isto é, seu ponto de maior tensão. Em que consiste o clímax no conto?

c) Além da surpresa que teve ao ver que a moça que havia conhecido era Carantonha, Barba de Ouro questionou-a a respeito dos lugares de onde ela disse que vinha. Como acontece o desfecho do conto?

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Para contar uma história, o narrador pode se posicionar de maneiras diversas. Assim, dependendo da perspectiva do narrador, um conto pode ter:

Foco narrativo em terceira pessoa: quando o narrador é apenas uma voz que não se identifica; em outras palavras, quando o narrador não é um personagem.

Foco narrativo em primeira pessoa ou narrador-personagem: quando o narrador é um dos personagens que vive a história.

O narrador ainda pode ser:

Observador: quando narra de um ponto de vista exterior, como quem presencia ou testemunha os acontecimentos.

Onisciente: quando conhece e revela o interior dos personagens, seus pensamentos e emoções.

TEXTO 2: NOITE DE ALMIRANTE

Deolindo Venta-Grande (era uma alcunha de bordo) saiu do arsenal de marinha e enfiou pela rua de

Bragança. Batiam três horas da tarde. Era a fina flor dos marujos e, demais, levava um grande ar de felicidade nos olhos. A corveta dele voltou de uma longa viagem de instrução, e Deolindo veio à terra tão depressa alcançou licença. Os companheiros disseram-lhe, rindo:

— Ah! Venta-Grande! Que noite de almirante vai você passar! ceia, viola e os braços de Genoveva. Colozinho de Genoveva...

Deolindo sorriu. Era assim mesmo, uma noite de almirante, como eles dizem, uma dessas grandes noites de almirante que o esperava em terra. Começara a paixão três meses antes de sair a corveta. Chamava-se Genoveva, caboclinha de vinte anos, esperta, olho negro e atrevido. Encontraram-se em casa de terceiro e ficaram morrendo um pelo outro, a tal ponto que estiveram prestes a dar uma cabeçada, ele deixaria o serviço e ela o acompanharia para a vila mais recôndita do interior.

A velha Inácia, que morava com ela, dissuadiu-os disso; Deolindo não teve remédio senão seguir em viagem de instrução. Eram oito ou dez meses de ausência. Como fiança recíproca, entenderam dever fazer um juramento de fidelidade.

— Juro por Deus que está no céu. E você? — Eu também. — Diz direito. — Juro por Deus que está no céu; a luz me falte na hora da morte. Estava celebrado o contrato. Não havia descrer da sinceridade de ambos; ela chorava doidamente, ele

mordia o beiço para dissimular. Afinal separaram-se, Genoveva foi ver sair a corveta e voltou para casa com um tal aperto no coração que parecia que "lhe ia dar uma coisa". Não lhe deu nada, felizmente; os dias foram passando, as semanas, os meses, dez meses, ao cabo dos quais, a corveta tornou e Deolindo com ela. Lá vai ele agora, pela rua de Bragança, Prainha e Saúde, até ao princípio da Gamboa, onde mora Genoveva. A casa é uma rotulazinha escura, portal rachado do sol, passando o cemitério dos Ingleses; lá deve estar Genoveva, debruçada à janela, esperando por ele. Deolindo prepara uma palavra que lhe diga. Já formulou esta: "Jurei e cumpri", mas procura outra melhor. Ao mesmo tempo lembra as mulheres que viu por esse mundo de Cristo, italianas, marselhesas ou turcas, muitas delas bonitas, ou que lhe pareciam tais. Concorda que nem todas seriam para os beiços dele, mas algumas eram, e nem por isso fez caso de nenhuma. Só pensava em Genoveva. A mesma casinha dela, tão pequenina, e a mobília de pé quebrado, tudo velho e pouco, isso mesmo lhe lembrava diante dos palácios de outras terras. Foi à custa de muita economia que comprou em Trieste um par de brincos, que leva agora no bolso com algumas bugigangas. E ela que lhe guardaria? Pode ser que um lenço marcado com o nome dele e uma âncora na ponta, porque ela sabia marcar muito bem. Nisto chegou à Gamboa, passou o cemitério e deu com a

Aulas 5 e 6: Características do

narrador (o foco narrativo)

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casa fechada. Bateu, falou-lhe uma voz conhecida, a da velha Inácia, que veio abrir-lhe a porta com grandes exclamações de prazer. Deolindo, impaciente, perguntou por Genoveva.

— Não me fale nessa maluca, arremeteu a velha. Estou bem satisfeita com o conselho que lhe dei. Olhe lá se fugisse. Estava agora como o lindo amor.

— Mas que foi? que foi? A velha disse-lhe que descansasse, que não era nada, uma dessas coisas que aparecem na vida; não valia a

pena zangar-se. Genoveva andava com a cabeça virada... — Mas virada por quê? — Está com um mascate, José Diogo. Conheceu José Diogo, mascate de fazendas? Está com ele. Não

imagina a paixão que eles têm um pelo outro. Ela então anda maluca. Foi o motivo da nossa briga. José Diogo não me saía da porta; eram conversas e mais conversas, até que eu um dia disse que não queria a minha casa difamada. Ah! meu pai do céu! foi um dia de juízo. Genoveva investiu para mim com uns olhos deste tamanho, dizendo que nunca difamou ninguém e não precisava de esmolas. Que esmolas, Genoveva? O que digo é que não quero esses cochichos à porta, desde as aves-marias... Dois dias depois estava mudada e brigada comigo.

— Onde mora ela? — Na praia Formosa, antes de chegar à pedreira, uma rótula pintada de novo. Deolindo não quis ouvir mais nada. A velha Inácia, um tanto arrependida, ainda lhe deu avisos de

prudência, mas ele não os escutou e foi andando. Deixo de notar o que pensou em todo o caminho; não pensou nada. As ideias marinhavam-lhe no cérebro, como em hora de temporal, no meio de uma confusão de ventos e apitos. Entre elas rutilou a faca de bordo, ensanguentada e vingadora. Tinha passado a Gamboa, o Saco do Alferes, entrara na praia Formosa. Não sabia o número de casa, mas era perto da pedreira, pintada de novo, e com auxílio da vizinhança poderia achá-la. Não contou com o acaso que pegou de Genoveva e fê-la sentar à janela, cosendo, no momento em que Deolindo ia passando. Ele conheceu-a e parou; ela, vendo o vulto de um homem, levantou os olhos e deu com o marujo.

— Que é isso? exclamou espantada. Quando chegou? Entre, seu Deolindo. E, levantando-se, abriu a rótula e fê-lo entrar. Qualquer outro homem ficaria alvoroçado de esperanças, tão

francas eram as maneiras da rapariga; podia ser que a velha se enganasse ou mentisse; podia ser mesmo que a cantiga do mascate estivesse acabada.

Tudo isso lhe passou pela cabeça, sem a forma precisa do raciocínio ou da reflexão, mas em tumulto e rápido. Genoveva deixou a porta aberta, fê-lo sentar-se, pediu-lhe notícias da viagem e achou-o mais gordo; nenhuma comoção nem intimidade. Deolindo perdeu a última esperança. Em falta de faca, bastavam-lhe as mãos para estrangular Genoveva, que era um pedacinho de gente, e durante os primeiros minutos não pensou em outra coisa.

— Sei tudo, disse ele. — Quem lhe contou? Deolindo levantou os ombros. — Fosse quem fosse, tornou ela, disseram-lhe que eu gostava muito de um moço? — Disseram. — Disseram a verdade. Deolindo chegou a ter um ímpeto; ela fê-lo parar só com a ação dos olhos. Em seguida disse que, se lhe

abrira a porta, é porque contava que era homem de juízo. Contou-lhe então tudo, as saudades que curtira, as propostas do mascate, as suas recusas, até que um dia, sem saber como, amanhecera gostando dele.

— Pode crer que pensei muito e muito em você. Sinhá Inácia que lhe diga se não chorei muito... Mas o coração mudou... Mudou... Conto-lhe tudo isto, como se estivesse diante do padre, concluiu sorrindo.

Não sorria de escárnio. A expressão das palavras é que era uma mescla de candura e cinismo, de insolência e simplicidade, que desisto de definir melhor. Creio até que insolência e cinismo são mal aplicados. Genoveva não se defendia de um erro ou de um perjúrio; não se defendia de nada; faltava-lhe o padrão moral das ações. O que dizia, em resumo, é que era melhor não ter mudado, dava-se bem com a afeição do Deolindo, a prova é que quis fugir com ele; mas, uma vez que o mascate venceu o marujo, a razão era do mascate, e cumpria declará-lo. Que vos parece? O pobre marujo citava o juramento de despedida, como uma obrigação eterna, diante da qual consentira em não fugir e embarcar: "Juro por Deus que está no céu; a luz me falte na hora da morte". Se embarcou, foi porque ela lhe jurou isso. Com essas palavras é que andou, viajou, esperou e tornou; foram elas que lhe deram a força de viver. Juro por Deus que está no céu; a luz me falte na hora da morte...

— Pois, sim, Deolindo, era verdade. Quando jurei, era verdade. Tanto era verdade que eu queria fugir com você para o sertão. Só Deus sabe se era verdade! Mas vieram outras coisas... Veio este moço e eu comecei a gostar dele...

— Mas a gente jura é para isso mesmo; é para não gostar de mais ninguém... — Deixa disso, Deolindo. Então você só se lembrou de mim? Deixa de partes...

Page 37: Monografia Carla Thomas

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— A que horas volta José Diogo? — Não volta hoje. — Não? — Não volta; está lá para os lados de Guaratiba com a caixa; deve voltar sexta-feira ou sábado... E por que é

que você quer saber? Que mal lhe fez ele? Pode ser que qualquer outra mulher tivesse igual palavra; poucas lhe dariam uma expressão tão cândida,

não de propósito, mas involuntariamente. Vede que estamos aqui muito próximos da natureza. Que mal lhe fez ele? Que mal lhe fez esta pedra que caiu de cima? Qualquer mestre de física lhe explicaria a queda das pedras. Deolindo declarou, com um gesto de desespero, que queria matá-lo. Genoveva olhou para ele com desprezo, sorriu de leve e deu um muxoxo; e, como ele lhe falasse de ingratidão e perjúrio, não pôde disfarçar o pasmo. Que perjúrio? Que ingratidão? Já lhe tinha dito e repetia que quando jurou era verdade. Nossa Senhora, que ali estava, em cima da cômoda, sabia se era verdade ou não. Era assim que lhe pagava o que padeceu? E ele que tanto enchia a boca de fidelidade, tinha-se lembrado dela por onde andou?

A resposta dele foi meter a mão no bolso e tirar o pacote que lhe trazia. Ela abriu-o, aventou as bugigangas, uma por uma, e por fim deu com os brincos. Não eram nem poderiam ser ricos; eram mesmo de mau gosto, mas faziam uma vista de todos os diabos. Genoveva pegou deles, contente, deslumbrada, mirou-os por um lado e outro, perto e longe dos olhos, e afinal enfiou-os nas orelhas; depois foi ao espelho de pataca, suspenso na parede, entre a janela e a rótula, para ver o efeito que lhe faziam. Recuou, aproximou-se, voltou a cabeça da direita para a esquerda e da esquerda para a direita.

— Sim, senhor, muito bonitos, disse ela, fazendo uma grande mesura de agradecimento. Onde é que comprou?

Creio que ele não respondeu nada, não teria tempo para isso, porque ela disparou mais duas ou três perguntas, uma atrás da outra, tão confusa estava de receber um mimo a troco de um esquecimento. Confusão de cinco ou quatro minutos; pode ser que dois. Não tardou que tirasse os brincos, e os contemplasse e pusesse na caixinha em cima da mesa redonda que estava no meio da sala. Ele pela sua parte começou a crer que, assim como a perdeu, estando ausente, assim o outro, ausente, podia também perdê-la; e, provavelmente, ela não lhe jurara nada.

— Brincando, brincando, é noite, disse Genoveva. Com efeito, a noite ia caindo rapidamente. Já não podiam ver o hospital dos Lázaros e mal distinguiam a

ilha dos Melões; as mesmas lanchas e canoas, postas em seco, defronte da casa, confundiam-se com a terra e o lodo da praia. Genoveva acendeu uma vela. Depois foi sentar-se na soleira da porta e pediu-lhe que contasse alguma coisa das terras por onde andara. Deolindo recusou a princípio; disse que se ia embora, levantou-se e deu alguns passos na sala. Mas o demônio da esperança mordia e babujava o coração do pobre diabo, e ele voltou a sentar-se, para dizer duas ou três anedotas de bordo. Genoveva escutava com atenção. Interrompidos por uma mulher da vizinhança, que ali veio, Genoveva fê-la sentar-se também para ouvir "as bonitas histórias que o Sr. Deolindo estava contando". Não houve outra apresentação. A grande dama que prolonga a vigília para concluir a leitura de um livro ou de um capítulo, não vive mais intimamente a vida dos personagens do que a antiga amante do marujo vivia as cenas que ele ia contando, tão livremente interessada e presa, como se entre ambos não houvesse mais que uma narração de episódios. Que importa à grande dama o autor do livro? Que importava a esta rapariga o contador dos episódios?

A esperança, entretanto, começava a desampará-lo e ele levantou-se definitivamente para sair. Genoveva não quis deixá-lo sair antes que a amiga visse os brincos, e foi mostrar-lhes com grandes encarecimentos. A outra ficou encantada, elogiou-os muito, perguntou se os comprara em França e pediu a Genoveva que os pusesse.

— Realmente, são muito bonitos. Quero crer que o próprio marujo concordou com essa opinião. Gostou de os ver, achou que pareciam feitos

para ela e, durante alguns segundos, saboreou o prazer exclusivo e superfino de haver dado um bom presente; mas foram só alguns segundos.

Como ele se despedisse, Genoveva acompanhou-o até à porta para lhe agradecer ainda uma vez o mimo, e provavelmente dizer-lhe algumas coisas meigas e inúteis. A amiga, que deixara ficar na sala, apenas lhe ouviu esta palavra: "Deixa disso, Deolindo"; e esta outra do marinheiro: "Você verá." Não pôde ouvir o resto, que não passou de um sussurro.

Deolindo seguiu, praia fora, cabisbaixo e lento, não já o rapaz impetuoso da tarde, mas com um ar velho e triste, ou, para usar outra metáfora de marujo, como um homem "que vai do meio caminho para terra". Genoveva entrou logo depois, alegre e barulhenta. Contou à outra a anedota dos seus amores marítimos, gabou muito o gênio do Deolindo e os seus bonitos modos; a amiga declarou achá-lo grandemente simpático.

— Muito bom rapaz, insistiu Genoveva. Sabe o que ele me disse agora? — Que foi? — Que vai matar-se. — Qual o quê! Não se mata, não. Deolindo é assim mesmo; diz as coisas, mas não faz. Você verá que não se

mata. Coitado, são ciúmes. Mas os brincos são muito engraçados.

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— Eu aqui ainda não vi destes. — Nem eu, concordou Genoveva, examinando-os à luz. Depois guardou-os e convidou a outra a coser. —

Vamos coser um bocadinho, quero acabar o meu corpinho azul... A verdade é que o marinheiro não se matou. No dia seguinte, alguns dos companheiros bateram-lhe no

ombro, cumprimentando-o pela noite de almirante, e pediram-lhe notícias de Genoveva, se estava mais bonita, se chorara muito na ausência, etc. Ele respondia a tudo com um sorriso satisfeito e discreto, um sorriso de pessoa que viveu uma grande noite. Parece que teve vergonha da realidade e preferiu mentir.

(In: Machado de Assis. Histórias sem data. São Paulo: Ática, 1998.)

Exercício 2 (responda em seu caderno) – Estudo do texto Noite de almirante (I)

1. O conto é um estudo narrado em 3ª pessoa, isto é, o narrador conta os fatos sem participar deles. Observe, entretanto, estes trechos:

I. “Deixo de notar o que pensou em todo caminho; não pensou nada.” II. “A expressão das palavras é que era uma mescla de candura e cinismo, de insolência e simplicidade,

que desisto de definir melhor. Creio até que insolência e cinismo são mal aplicados.” III. “mas, uma vez que o mascate venceu o marujo, a razão era do mascate, e cumpria declará-lo. Que vos

parece?” IV. “Vede que estamos aqui muito próximos da natureza. Que mal lhe fez ele? Que mal lhe fez esta pedra

que caiu de cima?” V. “Quero crer que o próprio marujo concordou com essa opinião.”

a) Quanto à posição do narrador, o que ocorre nos trechos I, II e V? b) Nos trechos III e IV, o narrador conversa com o leitor. Com que propósito ele faz isso? 2. No trecho: “[...]pediu-lhe que contasse alguma coisa das terras por onde andara. [...] Que importava a esta rapariga o contador dos episódios?”, o narrador compara o relato dos episódios a um livro. a) Nesse caso, quem é o autor do livro? E o leitor? b) Levante hipóteses: o que o narrador sugere, nesses comentários, a respeito de Genoveva?

Atividade 6 – PARA PESQUISAR

Há Palavras no texto cujo significado você desconhe-ça? Releia o texto e sublinhe essas palavras. Depois disso, procure o significado no dicionário. Registre-as no caderno.

Atividade 5 (para conversar) - EM GRUPO

1. Deolindo, além do impulso que experimenta em relação a Genoveva, teve

duas outras intenções desesperadas, que, porém, não se concretizaram: matar

José Diogo e suicidar-se. O desfecho do texto confirma a afirmação de

Genoveva de que Deolindo “diz coisas, mas não faz”?

2. Que relação há entre essa caracterização de Deolindo e a de Genoveva

contida na afirmação do narrador de que “faltava-lhe o padrão moral das

ações”?

Page 39: Monografia Carla Thomas

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Vimos que o conto pertence ao grupo de gêneros narrativos ficcionais. Os textos narrativos apresentam alguns elementos em comum, como fatos, personagens, tempo, espaço, narrador. Nestas aulas serão apresentados mais alguns elementos da narrativa, também, presentes no gênero conto: o enredo, o tempo e o espaço.

Aulas 7 e 8: Elementos da narrativa

(enredo, tempo e espaço)

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Exercício 3 (responda em seu caderno) – Estudo do texto Noite de almirante (II)

1. O conto em estudo faz referência a lugares em que os personagens viveram os fatos.

a) Indique onde ocorreram os seguintes fatos:

- Deolindo e Genoveva conheceram-se e apaixonaram-se.

- Deolindo e Genoveva fizeram juramento de fidelidade. / Deolindo ficou sabendo da traição de Genoveva.

- Deolindo e Genoveva discutiram sobre a infidelidade.

Deolindo saiu ao encontro de Genoveva. / Deolindo voltou depois de visitar Genoveva.

b) Todos esses lugares localizam-se em uma cidade. Que cidade é essa?

2. No conto, o narrador faz algumas referências ao tempo em que ocorreram os fatos.

a) Indique o tempo de duração da viagem depois que Deolindo fez depois do juramento.

b) Que fato do presente fez Deolindo voltar ao passado?

c) Embora a narrativa traga o passado para o presente, qual é o tempo de duração entre a saíde de Deolindo do Arsenal da Marinha até o término da visita de Genoveva?

3. Observe a linguagem do conto em estudo.

a) Que tipo de variedade linguística foi empregada?

b) Que tempo verbal predomina?

Exercício 4 (responda em seu caderno) – Estudo do texto O Barba de Ouro e a Carantonha (II)

1. O conto O Barba de Ouro e a Carantonha (lido nas primeiras aulas), os fatos são narrados em sequência temporal e mantêm entre si relações de causa e efeito. Por exemplo: pelo fato do Barba de Ouro ser mau e comer todos os seus filhos que nasciam, a rainha resolveu vestir sua filha com a pele de uma ovelha para enganá-lo. Cite outros fatos do texto dispostos em sequência temporal e ligados a uma relação de causa e efeito.

2. Em qual momento do conto começa-se a criar uma expectativa no leitor?

3. Onde acontece a história?

4. Quais são as principais características das personagens (psicológicas, socioeconômicas, físicas)?

5. É possível indicar o tempo exato em que a história transcorre? Por quê? Cite alguns marcadores temporais utilizados no conto.

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PPRROODDUUÇÇÃÃOO IINNIICCIIAALL

Nas primeiras aulas desta sequência didática vimos que o conto tem origens antigas. Ele está ligado ao desejo de contar e ouvir histórias inerente à natureza humana e manifesta-se precocemente na História. Vem das narrativas orais dos antigos povos nas noites de luar, passa pelas narrativas dos bardos gregos e romanos, pelas lendas orientais, pelas parábolas bíblicas, pelas novelas medievais italianas, pelas fábulas francesas e chega até nós, em livros, como hoje os conhecemos.

Em sua trajetória, o conto vestiu-se de inúmeras roupagens, resultando numa riqueza de tipos de difícil classificação. É comum encontrarmos antologias que reúnem contos por nacionalidade, ou por regiões nacionais. Os contos ainda podem ser classificados por subgêneros (ou tipos), tais como os contos maravilhosos, de terror, de mistério, de ficção científica, ou por outros tipos de classificações, como o conto popular, o moderno, o tradicional, o contemporâneo etc.

Nesta sequência didática você escreverá e reescreverá um conto infantil sob orientação da professora. Ao final, produzirá um livro que será doado a crianças em fase de alfabetização.

Essa proposta baseia-se no fato de que, embora a leitura de todos os tipos de texto seja essencial para uma boa formação, muitos jovens, adultos e crianças brasileiras não têm oportunidade de ler (geralmente por falta de incentivo) e, a partir de leituras, ampliar seus conhecimentos sobre a realidade em que vivem.

Quando criança o ser humano adquire a base do conhecimento que continuará sendo desenvolvido pelo resto da vida. Por isso, o incentivo à leitura desde a infância é essencial.

Por meio da produção de um livro de conto infantil você terá oportunidade de situar-se como autor de obras literárias, prestigiar o ato da escrita e, consequentemente, difundir o que pensa sobre o mundo para as crianças. Para isso, deverá aprimorar seus conhecimentos sobre o conto por meio da leitura, da produção de textos e realização de outras atividades e exercícios que continuarão a ser propostos nas próximas unidades desta sequência didática.

Nas aulas de hoje você produzirá a primeira versão de seu conto infantil. No decorrer dos próximos encontros serão apresentados novos elementos desse gênero a fim de que você reelabore sua produção, aperfeiçoando-a.

Então, mãos à obra?

Para iniciar sua produção, preencha o quadro de orientação apresentado abaixo e, em seguida, escreva seu conto no caderno. Além disso, retome as atividades, exercícios e leituras realizadas nas aulas anteriores, bem como sua memória, resgatando fatos marcantes durante sua infância, na sua fase de alfabetização. Esses elementos o auxiliarão na elaboração de um texto que seja condizente com a realidade de crianças entre seis e sete anos de idade.

Aulas 9 e 10: Produzindo um conto

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QUADRO DE ORIENTAÇÃO PARA PRODUÇÃO TEXTUAL DO GÊNERO CONTO INFANTIL

Elementos básicos

Personagem(ns)

Sequência narrativa

Situação inicial

Conflito

Clímax

Desfecho

Foco narrativo

Você, como narrador se colocará:

( ) em terceira pessoa ( ) em primeira pessoa (narrador-personagem)

Como narrador de fatos, você será:

( ) observador ( ) onisciente

Elementos da narrativa

Enredo 1ª situação de causa e efeito: 2ª situação de causa e efeito: 3ª situação de causa e efeito:

Tempo Tempo cronológico: Tempo psicológico:

Espaço Espaço físico: Espaço social:

AVALIE SEU CONTO Após ter preenchido o quadro acima e escrito o conto infantil em seu caderno, observe se:

- sua narrativa é ficcional curta;

- apresenta poucos personagens;

- as ações são reduzidas, ou seja, bem delimitadas;

- a sequência narrativa está bem estruturada (situação inicial, conflito, clímax e desfecho);

- a linguagem empregada está de acordo com a faixa etária de crianças entre seis e sete anos de idade.

Registre as observações necessárias para que você aprimore sua escrita na reelaboração do conto.

Depois disso, entregue para a professora o texto na data prevista. Ela apontará outros pontos no texto que você deverá corrigir e fará sugestões para a continuação da elaboração de seu conto.

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MMÓÓDDUULLOO 11 –– OO CCOONNTTIISSTTAA

No dicionário, o verbete “memória” significa, entre outras acepções, lembrança, reminiscência, recordação. Todos nós temos do que lembrar e gostamos de recordar pessoas e acontecimentos passados.

Muitas das invenções humanas tiveram o objetivo específico de possibilitar a recordação: a máquina fotográfica, por exemplo, ao captar imagens de momentos importantes da vida das pessoas, os torna possíveis de serem retomados no futuro.

Registrar sua existência no mundo tem sido uma preocupação constante do ser humano de todas as épocas. O ato de contar histórias dos povos primitivos e, também, de nossos avós e pais, serviu à finalidade de passar oralmente para as gerações seguintes a tradição, os costumes, os modos de interpretar o mundo. Os livros e as bibliotecas, os arquivos de documentos presentes em todas as repartições públicas e privadas, as exposições de arte, os álbuns de fotografias são, também, modos de preservar a memória. Na atualidade, a tecnologia nos possibilita registrar na “memória do computador” tudo o que o conhecimento é capaz de produzir.

A escrita surgiu justamente da necessidade do ser humano de registrar de forma mais perene os acontecimentos da vida diária e suas ideias. Há mais de 5 mil anos, a argila já era usada para fazer esse registro; depois vieram o papiro, o pergaminho, o papel e, hoje, o computador.

Todos os textos escritos são, portanto, e em primeiro lugar, registros da memória individual e da diversidade cultural dos povos. Toda vez que, em qualquer lugar do planeta, alguém se puser a escrever, estará produzindo memória.

O gênero conto é uma forma específica de narrar histórias, como já vimos nas aulas anteriores. Ao contar, de modo conciso, uma história fictícia, focando em determinados fatos, tempo, espaço, com certos personagens de delimitadas características, além do modo como o narrador se situa (em primeira ou terceira pessoa, como observador ou de modo onisciente), o escritor expressa suas intenções do que pretende cativar nos leitores. Assim, por exemplo, nos contos populares (como o texto 1, lido anteriormente), cuja tradição é a transmissão oral de histórias, pretende-se evocar costumes e orientações morais relacionados à época em que o conto foi criado. Já no conto de Machado de Assis (o texto 2), é possível observar valores estéticos e ideológicos dos anos mil e oitocentos (o texto foi publicado em 1884) a respeito das relações amorosas, os quais o autor, com suas intenções e criatividade, procurava transgredir. Desse modo, o conto é uma forma peculiar de “memória” e ação na cultura em que o contista está inserido.

Como leitores ou ouvintes de contos, é importante, para a compreensão do texto, fazer uma leitura (ou interpretação) detalhada, observando todas as características da história narrada.

Aulas 11 e 12: Memória, criatividade e

intenções do contista (1)

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Também, é importante conhecer a biografia do autor, bem como a cultura na qual ele se situa (ou situava), a fim de entender a perspectiva da qual ele se dispunha a contar histórias. Além disso, é relevante elucidar vocábulos e expressões desconhecidas, esclarecer alusões e referências contidas no texto. Essas atitudes tornam o leitor mais sensível e esperto para identificar aspectos essenciais do conto que lê, uma vez que, assim, possui bases para comentar, comparar, atribuir valor e julgar a leitura (ou o que ouve) de modo bem fundamentado.

Nas aulas deste módulo (aulas 11, 12, 13 e 14) são propostas atividades de apreciação de leitura e produção de contos. O objetivo é estimular a criatividade e o desenvolvimento da capacidade interpretativa dos textos narrativos. Para isso observaremos alguns elementos que podem estar presentes no conto, tais como imagens, animações, além de outras referências implícitas e explícitas do texto a outros textos e tipos de discurso. Desse modo, é possível apreciar, tanto estética e afetivamente, quanto ética e politicamente os contos.

Comecemos, então, esta unidade da sequência didática, com a apreciação de uma versão mutlimidiática do conto Noite de Almirante, o qual já tivemos contato em seu modo “original”, isto é, na literatura. Acesse, na Internet, o link: http://youtu.be/zlWvgS0ESVE.

Atividade 7 (para conversar) - EM GRUPO

1. O video ilustra o conto de Machado de Assis, Conto de Almirante. Esse vídeo chama atenção para elementos

textuais, sentimentais ou psicológicos que você não havia reparado quando realizou a leitura do conto? Quais?

Por quê?

2. Quais são as diferenças e semelhanças entre a versão literária do conto e a multimidiática?

3. A literatura e a multimídia podem ser consideradas esferas comunicativas distintas, mas, que, também, podem

ser complementares. Você concorda com essa afirmação? Por quê?

4. Esse vídeo foi gravado por meio da técnica stop motion, por alunos do 2º ano do Ensino Médio de uma escola

em Campina Grande e hoje está disponível na Internet. Você acha válido, ao estudar na escola, poder, também,

produzir materiais sobre os assuntos que você aprende para compartilhar com outras pessoas? Por quê?

O conto por contistas

[...] Muitos escritores que dedicaram parte de sua obra ao gênero chegaram a conceber conceitos próprios sobre o “conto”. Cortázar ressaltava haver nas narrativas breves um poder latente entre “fugacidade” e “permanência”, capaz de criar uma tensão que venceria o leitor “por nocaute” e não “por pontos” (como ocorre nos romances). Machado de Assis, talvez o maior entre os nossos, alertava para a imensa complexidade que se esconde sob a tarefa aparentemente simples de elaborar em poucas páginas uma trama envolvente. Carnavalizando o debate, Mário de Andrade vaticinou: cabe ao próprio autor definir se o texto que criou pode ser considerado um conto ou não. Uma das mais precisas definições, contudo, veio do argentino Ricardo Piglia. Em suas “Teses sobre o conto”, ele enfatiza que a principal característica do gênero é narrar, paralelamente, duas histórias – uma aparente e outra secreta. Este fio que se desenrola quase que silenciosamente em algum

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Joaquim Maria Machado de Assis, cronista, contista, dramaturgo,

jornalista, poeta, novelista, romancista, crítico e ensaísta, nasceu na

cidade do Rio de Janeiro em 21 de junho de 1839. Filho de um

operário mestiço de negro e português, Francisco José de Assis, e de

D. Maria Leopoldina Machado de Assis, aquele que viria a tornar-se o

maior escritor do país e um mestre da língua, perde a mãe muito cedo

e é criado pela madrasta, Maria Inês, também mulata, que se dedica

ao menino e o matrícula na escola pública, única que frequentará o

autodidata.

De saúde frágil, epilético, gago, sabe-se pouco de sua infância e início

da juventude. Criado no morro do Livramento, consta que ajudava a

missa na igreja da Lampadosa. Com a morte do pai, em 1851, Maria

Inês, à época morando em São Cristóvão, emprega-se como doceira

num colégio do bairro, e Machadinho, como era chamado, torna-se

vendedor de doces. No colégio tem contato com professores e alunos

e é até provável que assistisse às aulas nas ocasiões em que não

estava trabalhando.

Mesmo sem ter acesso a cursos regulares, empenhou-se em aprender. Consta que, em São

Cristóvão, conheceu uma senhora francesa, proprietária de uma padaria, cujo forneiro lhe deu as

primeiras lições de Francês.

Exercício 5 (responda em seu caderno) – Criação de imagens para ilustrar conto infantil

1. Nas primeiras aulas desta sequência didática observamos algumas imagens que ilustram alguns contos de fada bem conhecidos, como Branca de Neve, Cinderela e A Bela Adormecida. Na aula de hoje assistimos a um vídeo que ilustra um conto de Machado de Assis. Ao observar as imagens e as possibilidades expressivas da esfera comunicativa multimidiática percebemos que as manifestações visuais artísticas acrescentam aspectos que chamam atenção do leitor/espectador sobre fatos marcantes das histórias narradas.

a) Observe novamente as imagens, classifique e descreva cada uma no que se refere ao enredo, tempo, espaço e aspectos físicos e psicológicos dos personagens dos contos infantis.

b) Assista novamente ao vídeo e observe a simplicidade da produção das imagens (desenhos feitos à mão). Depois disso, esboce ilustrações para o conto que você produziu. Antes de desenhar, escreva quais características e fatos principais do conto que você elaborou que devem ser destacados, levando em conta que o conto é um texto conciso e, portanto, as imagens devem evidenciar o que é mais importante na mensagem que você deseja transmitir com seu texto a crianças em fase de alfabetização (entre seis e sete anos de idade).

[Figura 9]

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(In: Arnaldo Nogueira Jr. Extraído do site releituras.com. Acesso em novembro de 2012).

Chapeuzinho Vermelho foi até a cabana da vovó, caiu na conversa do lobo e foi devorada. Para a sua sorte, apareceu um caçador que abriu a barriga do lobo e resgatou com vida a vovó e Chapeuzinho. O lobo? Morreu logo depois.

Foi assim que você conheceu essa história?

Bem, no princípio ela não era exatamente assim. A aventura de Chapeuzinho Vermelho vem dos contos da tradição oral, destinada aos adultos dos povoados, concebidos para o entretenimento noturno. Neste contexto, A História da Avó, compilada no século XIX, falava de uma menina que, sem querer, comeu a carne e bebeu o sangue da sua avó, ficou nua a pedido do lobo, mas, ao final, deixa-o a ver navios, pois usando de esperteza, foge para sua casa.

Com a publicação de Contos de Outrora, em 1697, livro do francês Charles Perrault, manteve-se a essência dos contos da tradição oral, porém, cortando e/ou modificando alguns elementos, censurando o que poderia chocar, dando a estas historias um ar mais popular, que chegaria a um público mais abrangente. No entanto, preciso é ressaltar que, mesmo na versão de Perrault, a história de Chapeuzinho Vermelho é muito mais trágica do que a versão contemporânea. Isso porque, naquela época, não se tinha a mesma acepção de infância que temos hoje em dia. Além disso, como dito, os contos pertenciam à tradição oral, destinados aos adultos, não às crianças.

De qualquer modo, os contos tratavam de valores morais como gentileza, paciência, obediência e respeito. Seguindo esses preceitos, havia sempre um prêmio, uma recompensa; caso contrário, uma punição. A finalidade dos contos era a de que quem transgredisse as regras, se expunha ao perigo. Ao final de cada história, Perrault colocava uma moral.

Atualmente, os contos são classificados em infantis e para adultos. Quando voltados às crianças são percebidos como portas que abrem a visão para o mundo, pois permitem o contato com sonhos, fantasias e imaginação de modo lúdico. Por meio das histórias, as crianças são

Aulas 13 e 14: Memória, criatividade e

[Figura 10]

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23

formadas a perceber que nem sempre a realidade condiz com as expectativas sonhadas e imaginadas, podendo pensar a respeito de suas inquietudes e curiosidades que as cercam.

Em realidade, essa, também, é a função do conto voltado ao universo adulto. Uma vez que o conto é a narração de experiências fictícias elaboradas com fim de evidenciar questões centrais humanas, possibilita a reflexão do leitor sobre os mais diversos assuntos da vida; desde a busca pelo amor plenamente realizado, como nos textos 1 e 2, lidos nas aulas anteriores, bem como na prevenção de cair nas armadilhas do cotidiano, como no caso de Chapeuzinho Vermelho que, ao falar com estranhos, colocou sua vida em risco.

Nos contos, as relações humanas são condensadas de modo a expressar os conflitos sociais, psicológicos, emocionais entre outros, que nem sempre estão expressos explicitamente, mas, que, por meio da criatividade do contista, ao ludibriar o leitor com a simplicidade de poucas palavras, geralmente visa despertá-lo indiretamente. Por isso, o conto é um gênero tão cativante!

Charles Perrault foi um escritor e poeta francês do século XVII,

que estabeleceu bases para um novo gênero literário, o conto de fadas, além

de ter sido o primeiro a dar acabamento literário a esse tipo de literatura,

feito que lhe conferiu o título de Pai da Literatura Infantil. Suas histórias mais

conhecidas são Le Petit Chaperon rouge (Chapeuzinho Vermelho), La Belle au

bois dormant (A Bela Adormecida), Le Maître chat ou le Chat botté (O Gato

Atividade 8 (para conversar) - EM GRUPO

1. Você sabia que muitos contos infantis são adaptações de contos transmitidos oralmente de

geração para geração, entre os adultos?

2. Nos últimos séculos muitas descobertas foram feitas a respeito do desenvolvimento humano, o

que acarretou em uma nova concepção acerca da infância. Você concorda que as crianças devem

receber uma formação específica, uma vez que o desenvolvimento nessa fase da vida é peculiar?

3. Você acha interessante fazer readaptações de textos ou trabalhar de modo intertextual, ou seja,

elaborar textos que dialogam com outros textos, criando novas histórias?

4. Pensando nas particularidades da infância, o que você acha essencial para a criança de hoje em

dia?

Exercício 6 (responda em seu caderno) – Reelaboração de conto infantil

Tendo por base a conversa em grupo que acabou de realizar e, também, a autoavaliação de sua produção inicial de um conto infantil, bem como as orientações feitas pela professora, somadas às informações sobre o gênero textual conto que você teve acesso até o momento e as ilustrações que começou a esboçar para seu livro, reescreva sua narrativa. Para isso, retome o quadro de orientações apresentado nas 9ª e 10ª aulas.

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[Figura 11]

de Botas), Cendrillon ou la petite pantoufle de verre (Cinderella),La Barbe

bleue (Barba Azul) e Le Petit Poucet (O Pequeno Polegar).

(In: Wikipédia, a enciclopédia livre. pt.wikipedia.org. Acesso em novembro de

2012)

MMÓÓDDUULLOO 22 –– OO CCOONNTTOO EE OOSS CCOONNFFLLIITTOOSS HHUUMMAANNOOSS

TEXTO 3: NEGRINHA

Negrinha era uma pobre órfã de sete anos. Preta?? Não. Fusca, mulatinha escura, de cabelos ruços e olhos assustados.

Nascera na senzala, de mãe escrava, e seus primeiros anos de vida, vivera-os pelos cantos escuros da cozinha, sobre farrapos de esteira e panos imundos. Sempre escondida, que a patroa não gostava de crianças.

Excelente senhora, a patroa. Gorda, rica, dona do mundo, amimada pelos padres, com lugar certo na igreja e camarote de luxo no céu. Entaladas as banhas no trono uma cadeira de balanço na sala de jantar, — ali bordava, recebendo as amigas e o vigário, dando audiências, discutindo o tempo. Uma virtuosa senhora, em suma — “dama de grandes virtudes apostólicas, esteio da religião e da moral”, dizia o padre.

Ótima, a D. Inácia.

Mas não admitia choro de criança. Ai! Punha-lhe os nervos em carne viva. Viúva sem filhos, não a calejara o choro da sua carne, e por isso não suportava o choro da carne escrava. Assim, mal vagia, longe na cozinha, a triste criança, gritava logo, nervosa:

— Quem é a peste que está chorando aí?

Quem havia de ser? A pia de lavar pratos?? O pilão?? A mãe da criminosa abafava a boquinha da filha e corria com ela para os fundos do quintal, torcendo-lhe em caminho beliscões desesperados:

— Cale a boca, peste do diabo!!

No entanto, aquele choro nunca vinha sem razão. Fome quase sempre, ou frio, desses que entanguem pés e mãos e fazem-nos doer...

Assim cresceu Negrinha — magra, atrofiada, com olhos eternamente assustados. Órfã aos quatro anos, ficou por ali, feita gato sem dono, levada a pontapés. Não compreendia a ideia dos grandes. Batiam-lhe sempre, por ação ou omissão. A mesma coisa, o mesmo ato, a mesma palavra provocava ora risadas, ora castigos. Aprendeu a andar, mas não andava, quase. Com pretexto de que, às soltas, reinaria no quintal, estragando as plantas, a boa senhora punha-a na sala, ao pé de si, num desvão de porta.

— Sentadinha aí, e bico!! Hem??

Negrinha imobilizava-se no canto, horas e horas. — Braços cruzados, já, diabo!!

Cruzava os bracinhos, a tremer, sempre com o susto nos olhos. E o tempo corria. O relógio batia uma, duas, três, quatro, cinco horas — um cuco tão engraçadinho! Era seu divertimento vê-lo abrir a janela e cantar as horas com a bocarra vermelha, arrufando as asas. Sorria-se, então, feliz um momento.

Puseram-na depois a fazer crochê, e as horas se lhe iam a espichar trancinhas sem fim.

Que ideia faria de si essa criança, que nunca ouvira uma palavra de carinho? Pestinha, diabo, coruja, barata descascada, bruxa, pata choca, pinto gorado, mosca morta, sujeira, bisca, trapo, cachorrinha, coisa ruim, lixo — não tinha conta o número de apelidos com que a mimoseavam. Tempo houve em que foi — bubônica. A epidemia andava à berra, como novidade, e Negrinha viu-se logo apelidada assim — por sinal, achou linda a

Aulas 15 e 16: O conto como centro de

discussão sobre os conflitos humanos (1)

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palavra. Perceberam-no e suprimiram-na da lista. Estava escrito que não teria um gostinho só na vida, nem esse de personalizar a peste...

O corpo de Negrinha era tatuado de sinais roxos, cicatrizes, vergões. Batiam nele os da casa, todos os dias, houvesse ou não motivo. A sua pobre carne exercia para os cascudos, cocres e beliscões a mesma atração que o ímã exerce para o aço.

Mão em cujos nós de dedos comichasse um cocre, era mão que se descarregaria dos fluidos em sua cabeça, de passagem. Coisa de rir, e ver a careta...

A excelente D. Inácia era mestra na arte de judiar de crianças. Vinha da escravidão, fora senhora de escravos e daquelas ferozes, amigas de ouvir contar o bolo e estalar o bacalhau. Nunca se afizera ao regímen novo — essa indecência de negro igual a branco; e qualquer coisinha, a polícia!! “Qualquer coisinha”; uma mucama assada ao forno, porque se engraçou dela o senhor; uma novena de relho, porque disse: — “Como é ruim, a sinhá!”....

O 13 de maio tirou-lhe das mãos o azorrague, mas não lhe tirou da alma a gana. Conservava, pois, Negrinha em casa como remédio para os frenesis. Simples derivativo.

— Ai! Como alivia a gente uma boa roda de cocres bem fincados!...

Tinha de contentar-se com isso, judiaria miúda, os níqueis da crueldade: cocres, mão fechada com raiva e nós de dedos que cantam no coco do paciente. Puxões de orelha: o torcido, de despegar a concha (bom! bom! bom! gostoso de dar!) e o a duas mãos, o sacudido. A gama dos beliscões: do miudinho, com a ponta da unha, a torcida do umbigo, equivalente ao puxão de orelha. A esfregadela: roda de tapas, cascudos, pontapés e safanões à uma — divertidíssimo! A vara de marmelo, flexível, cortante: para doer fino, nada melhor.

Era pouco, mas antes isso do que nada. Lá de quando em quando vinha um castigo maior para desobstruir o fígado e matar saudades do bom tempo. Foi assim com aquela história do ovo quente.

Não sabem?? Ora! Uma criada nova furtara do prato de Negrinha — coisa de rir — um pedacinho de carne que ela guardava para o fim. A criança não sofreou a revolta e atirou-lhe um dos nomes com que a mimoseavam, todos os dias.

— “Peste”?? Espere aí!! Você vai ver quem é peste. E foi contar o caso à patroa.

D. Inácia estava azeda, e necessitadíssima de derivativo. Sua cara iluminou-se.

— Eu curo ela! disse, desentalando as banhas do trono e indo para a cozinha, qual uma perua choca, a rufar as saias. — Traga um ovo!!

Veio o ovo. D. Inácia mesma pô-lo na chaleira de água a ferver e, de mãos à cinta, gozando-se na prelibação da tortura, ficou de pé uns minutos, à espera. Seus olhos contentes envolviam a mísera criança que, encolhidinha a um canto, trêmula, olhar esgazeado, aguardava alguma coisa de nunca visto. Quando o ovo chegou a ponto, a boa senhora exclamou:

— Venha cá!! Negrinha aproximou-se. — Abra a boca!!

Negrinha abriu a boca, como o cuco, e fechou os olhos. A patroa então, com uma colher, tirou da água “pulando” o ovo e zás! na boca da pequena. E antes que o urro de dor saísse, prática que era D. Inácia nesse castigo, suas mãos amordaçaram-na até que o ovo arrefecesse. Negrinha urrou surdamente, pelo nariz. Esperneou. Mas só. Nem os vizinhos chegaram a perceber aquilo. Depois:

— Diga nomes feios aos mais velhos outra vez!! Ouviu, peste??

E voltou contente da vida para o trono, a virtuosa dama, a fim de receber o vigário que chegava.

— Ah! Monsenhor! Não se pode ser boa nesta vida... Estou criando aquela pobre órfã, filha de Cesária; mas que trabalheira me dá!

— A caridade é a mais bela das virtudes! exclamou o padre.

— Sim, mas cansa...

— Quem dá aos pobres, empresta a Deus! A virtuosa senhora suspirou piedosamente: — Inda é o que vale...

Certo dezembro vieram passar as férias com “Santa” Inácia duas sobrinhas suas, pequenotas, lindas meninas louras, ricas, nascidas e criadas em ninho de plumas.

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Negrinha, do seu canto, na sala do trono, viu-as irromperem pela casa adentro como dois anjos do céu, alegres, pulando e rindo numa vivacidade de cachorrinhos novos. Negrinha olhou imediatamente para a senhora, certa de vê-la armada para desferir sobre os anjos invasores o raio dum castigo tremendo.

Mas abriu a boca: a sinhá ria-se também... Quê? Pois não era um crime brincar?? Estaria tudo mudado e findo o seu inferno — e aberto o céu??!

No enlevo da doce ilusão, Negrinha levantou-se e veio para a festa infantil, fascinada pela alegria dos anjos.

Mas logo a dura lição da desigualdade humana chicoteou sua alma. Beliscão no umbigo e nos ouvidos o som cruel de todos os dias:

— Já, para o seu lugar, pestinha!! Não se enxerga?? Com lágrimas dolorosas, menos de dor física que de angústia moral — sofrimento novo que se vinha somar aos já conhecidos, a triste criança encorujou-se no cantinho de sempre.

— Quem é, titia? perguntou uma das meninas, curiosa. — Quem há de ser?! disse a tia num suspiro de vítima. — Uma caridade minha. Não me corrijo, vivo criando essas pobres de Deus.. Uma órfã... Mas, brinquem, filhinhas!! A casa é grande. Brinquem por aí a fora!!

“Brinquem!!” Brincar! Como seria bom brincar! refletiu com suas lágrimas, no canto, a dolorosa martirzinha, que até ali só brincara em imaginação com o cuco!

Chegaram as malas; e logo:

— Meus brinquedos!! reclamaram as duas meninas. Uma criada abriu-as e tirou-os fora.

Que maravilha! Um cavalo de rodas!... Negrinha arregalava os olhos. Nunca imaginara coisa assim, tão galante. Um cavalinho! E mais... Que é aquilo? Uma criancinha de cabelos amarelos... que fala “papá”... que dorme...

Era de êxtase, o olhar de Negrinha. Nunca vira uma boneca e nem sequer sabia o nome desse brinquedo. Mas compreendeu que era uma criança artificial.

- É feita??... perguntou extasiada.

E, dominada pelo enlevo, um momento em que a senhora saiu da sala a providenciar sobre a arrumação das meninas, Negrinha esqueceu o beliscão, o ovo quente, tudo, e aproximou-se da criaturinha de louça. Olhou-a com assombro e encanto, sem jeito sem ânimo de pegá-la.

As meninas admiraram-se daquilo. — Nunca viu boneca??

— Boneca?? repetiu Negrinha. — Chama-se Boneca?? Riram-se as fidalgas de tanta ingenuidade.

— Como é boba! disseram. — E você, como se chama?

— Negrinha.

As meninas, novamente, torceram-se de riso; mas vendo que o êxtase da bobinha perdurava, disseram, estendendo-lhe a boneca:

— Pegue!!

Negrinha olhou para os lados, ressabiada, com o coração aos pinotes. Que aventura, santo Deus! Seria possível?? Depois, pegou a boneca. E muito sem jeito, como quem pega o Senhor Menino, sorria para ela e para as meninas, com relances de olhos assustados para a porta. Fora de si, literalmente... Era como se penetrara o céu e os anjos a rodeassem, e um filhinho de anjo lhe viesse adormecer ao colo. Tamanho foi o enlevo que não viu chegar a patroa, já de volta. D. Inácia entreparou, feroz, e esteve uns instantes assim, imóvel, presenciando a cena.

Mas era tal a alegria das sobrinhas ante a surpresa estática de Negrinha, e tão grande a força irradiante da felicidade desta, que o seu duro coração afinal bambeou. E pela primeira vez na vida soube ser mulher. Apiedou-se.

Ao percebê-la na sala, Negrinha tremera, passando-lhe num relance pela cabeça a imagem do ovo quente, e hipóteses de castigos piores ainda. E incoercíveis lágrimas de pavor assomaram-lhe aos olhos.

Falhou tudo isso, porém. O que sobreveio foi a coisa mais inesperada do mundo: estas palavras, as primeiras que ouviu, doces, na vida:

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— Vão todas brincar no jardim!! e vá você também!! mas veja lá!! Hem??

Negrinha ergueu os olhos para a patroa, olhos ainda de susto e terror. Mas não viu nela a fera antiga. Compreendeu e sorriu-se.

Se a gratidão sorriu na vida, alguma vez, foi naquela surrada carinha...

Varia a pele, a condição, mas a alma da criança é a mesma — na princesinha e na mendiga. E para ambas é a boneca o supremo enlevo. Dá a natureza dois momentos divinos à vida da mulher: o momento da boneca — preparatório, e momento dos filhos, — definitivo. Depois disso está extinta a mulher.

Negrinha, coisa humana, percebeu nesse dia da boneca que tinha alma.

Divina eclosão! Surpresa maravilhosa do mundo que ela trazia em si, e que desabrochava, afinal, como fulgurante flor de luz. Sentiu-se elevada à altura de ser humano. Cessara de ser coisa e de ora avante lhe seria impossível viver a vida de coisa. Se não era coisa! Se sentia! Se vibrava!...

Assim foi, e essa consciência a matou.

Terminadas as férias, partiram as meninas levando consigo a boneca, e a casa reentrou no ramerrão habitual. Só não voltou a si Negrinha. Sentia-se outra, inteiramente transformada.

D. Inácia, pensativa, já a não atenazava tanto, e na cozinha uma criada nova, boa de coração, amenizava-lhe a vida. Negrinha, não obstante, caíra numa tristeza infinita.

Mal comia e perdera a expressão de susto que tinha nos olhos. Trazia-os agora nostálgicos, cismarentos.

Aquele dezembro de férias, luminosa rajada de céu trevas adentro de seu doloroso inferno, envenenara-a. Brincara ao sol, no jardim. Brincara!...

Acalentara dias seguidos, a linda boneca loura, tão boa, tão quieta, a dizer papá e a cerrar os olhos para dormir. Vivera realizando sonhos da imaginação. Desabrochara-se de alma.

Morreu na esteirinha rota, abandonada de todos, como um gato sem dono. Ninguém, entretanto, morreu jamais com maior beleza. O delírio rodeou-se de bonecas, todas louras, de olhos azuis. E de anjos... E bonecas e anjos remoinhavam-lhe em torno dela, numa farândola do céu. Sentia-se agarrada por aquelas mãozinhas de louça, abraçada, rodopiada.

Veio a tontura, e uma névoa envolveu tudo. E tudo regirou em seguida, confusamente, num disco. Ressoaram vozes apagadas, longe, e o cuco pela última vez lhe apareceu, de boca aberta.

Mas, imóvel, sem rufar as asas.

Foi-se apagando. O vermelho da goela desmaiou... E tudo se esvaiu em trevas.

Depois, vala comum. A terra papou com indiferença sua carnezinha de terceira — uma miséria, quinze quilos mal pesados...

E de Negrinha ficaram no mundo apenas duas impressões. Uma cômica, na memória das meninas ricas:

— Lembras-te daquela bobinha da titia, que nunca vira boneca??

Outra de saudade, no nó dos dedos de D. Inácia: — Como era boa para um cocre!...

(Monteiro Lobato, In: Moriconi, Ítalo (org.). Os cem melhores contos brasileiros. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.)

Atividade 9 (para conversar) - EM GRUPO 1. De acordo com a Declaração dos Direitos da Criança e o Adolescente: 7º Princípio - [...] A criança terá ampla oportunidade para brincar e divertir-se, visando os propósitos mesmos da sua educação [...]. 3º Princípio - Toda criança tem direito a um nome e a uma nacionalidade (Estatuto da Criança e do Adolescente-ECA: Lei nº 8069, de 13 de julho de 1990). Na época em que Monteiro Lobato escreveu o conto Negrinha (em 1920), tal estatuto ainda não existia. No entanto, o autor já chamava atenção em relação ao tratamento dado às crianças, bem como aos negros. Atualmente o tratamento para com as crianças é diferente. O que você acha de uma lei prever o modo como os adultos devem tratar as crianças? Por que você acha que em 1990 foi necessária a promulgação do ECA? 2. Negrinha sofreu inúmeros maltratos por Dona Inácia. Você, em algum momento de sua vida, já se sentiu assim? Por quê?

Atividade 10 – PARA PESQUISAR Há Palavras no texto cujo significado você desconhe-ça? Releia o texto e sublinhe essas palavras. Depois disso, procure o significado no dicionário. Registre-as no caderno. Sugestão: Essa atividade pode ser feita em grupo.

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Exercício 7 – Estudo do texto Negrinha (I)

1. Examine as afirmações abaixo. I. As pessoas do convívio social de Dona Inácia, como o vigário, tinham dela opinião bastante positiva. II. Dona Inácia tinha uma opinião muito negativa de si. III. O narrador tem uma opinião favorável a respeito de Dona Inácia. Segundo o texto, é correto o que se afirma apenas em: a) I. b) II. c) III. d) I e II. e) II e III. Justifique sua resposta.

2. “Excelente senhora, a patroa.” Assinale a alternativa em que a vírgula foi usada com a mesma finalidade com que foi empregada na frase acima. a) “...fusca, mulatinha escura, de cabelos ruços e olhos assustados.” b) “Nascera na senzala, de mãe escrava”. c) “Gorda, rica, dona do mundo, amimada dos padres”. d) “Como é ruim, a sinhá...” e) “O 13 de maio tirou-lhe das mãos o azorrague, mas não lhe tirou da alma a gana.” Justifique sua resposta.

Figuras de linguagem

Prosopopeia ou personificação: consiste em atribuir a seres inanimados

predicativos que são próprios de seres animados.

Exemplo: “O jardim olhava as crianças sem dizer nada”.

Ironia: é a figura que apresenta um termo em sentido oposto ao usual,

obtendo-se, com isso, efeito crítico ou humorístico.

Exemplo: “Artur é tão esperto que trancou o carro com a chave dentro”.

Metáfora: consiste em empregar um termo com significado diferente do habitual, com base numa relação de similaridade entre o sentido próprio e o sentido figurado. Exemplo: “Meu pensamento é um rio subterrâneo”.

Figuras de lin-

guagem são recursos usados pelo falante/ escritor para re-alçar a mensa-gem que está transmitindo.

Metonímia: como a metáfora, consiste numa transposição de significado, ou seja, uma palavra que usualmente significa uma coisa passa a ser usada com outro significado. Exemplo: “Não tinha teto em que se abrigasse”.

Sinestesia: trata-se de mesclar, numa expressão, sensações percebidas por diferentes órgãos do sentido. Exemplo: A luz crua da madrugada invadia meu quarto.

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José Renato Monteiro Lobato (1882-1948), nasceu em Taubaté/SP e foi um escritor brasileiro. "O Sitio do Picapau Amarelo" é uma de suas obras de maior destaque na literatura infantil. Foi um dos primeiros autores de literatura infantil em nosso país e em toda América Latina. Tornou-se editor, criando a "Editora Monteiro Lobato" e mais tarde a "Companhia Editora Nacional". Metade de suas obras é formada de literatura infantil.

Como escritor literário, Lobato destacou-se no gênero "conto". O universo retratado, em geral são os vilarejos decadentes e as populações do Vale do Parnaíba, quando da crise do plantio do café. Em seu livro "Urupês", que foi sua estreia na literatura, Lobato criou a figura do "Jeca Tatu", símbolo do caipira brasileiro. As histórias do "Sítio do Picapau Amarelo", e seus habitantes, Emília,

Exercício 8 (responda em seu caderno) – Estudo do texto Negrinha (II)

1. Nas descrições que o narrador faz de Dona Inácia, predomina o tom a) irônico. b) agressivo. c) piedoso. d) benevolente. e) idealista.

2. No trecho: “A excelente dona Inácia era mestra na arte de judiar de crianças. (...) Certo dezembro vieram passar as férias com Santa Inácia duas sobrinhas suas, pequenotas, lindas meninas louras, ricas, nascidas e criadas em ninho de plumas”, percebemos forte presença da figura de linguagem: a) Prosopopéia b) Metáfora c) Ironia d) Metonímia 3. Releia o conto Negrinha, analise e registre os elementos básicos da narrativa como: narrador, discurso, tempo, espaço e enredo.

E aí, colega?!

Na próxima aula

faremos algo

diferente!

Acesse:

http://mais.uol.

com.br/view/66

[Figura 12]

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FILME: PRECIOSA – UMA HISTÓRIA DE ESPERANÇA

Ficha técnica

Título original: Precious (2009, Estados unidos)

Direção: Lee Daniels

Roteiro: Geoffrey Fletcher (baseado em Sapphire)

Elenco: Gabourey Sidibe / Mo'Nique / Paula Patton / Mariah Carey / Sherri Shepherd / Lenny Kravitz

Sinopse: Aos 16 anos, Claireece Preciosa Jones sofre todo tipo de abuso, em casa e nas ruas. Pobre, negra, obesa e semi-analfabeta, Preciosa encontra alento apenas em sua própria imaginação, onde se vê como uma famosa e glamourosa modelo. Uma história sobre adversidade e esperança.

Curiosidades 1: As filmagens ocorreram em apenas cinco semanas.

Curiosidades 2: Ganhou muitos prêmios, como Oscar de 2010, Globo de Ouro 2010, Festivais de Toronto e Estocolmo 2010 entre outros prêmios.

[Figura 13]

Dona Benta, Pedrinho, Tia Anastácia, Narizinho, Rabicó e tantos outros,

misturam a realidade e a fantasia usando uma linguagem coloquial e acessível.

(In: e-biografias.net. Acesso em novembro de 2012)

(In: adorocinema.com. Acesso em novembro de 2012)

Aulas 17, 18, 19 e 20: O conto como ponto de

discussão sobre os conflitos humanos (2)

Atividade 11 (para conversar) - EM GRUPO

1. De que modo os temas sociais abordados no filme se aproximam da realidade brasileira contemporânea?

2. Como essas atitudes sociais são reproduzidas em diversas situações?

3. Quais estratégias sociais e políticas poderiam combater essas atitudes?

4. De que modo o cinema contribui para a expansão do conhecimento dos textos narrativos?

5. Pensando no filme e na realidade da infância brasileira, você consegue destacar alguns assuntos que

seriam interessantes para ser mencionados no conto vem elaborando?

6. Quais semelhanças podem ser estabelecidas entre os textos lidos (1, 2 e 3) e o filme?

[Figura 14]

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Exercício 9 (responda em seu caderno) – Estudo do filme Preciosa – uma história de

esperança

1. Quais são os principais personagens do filme?

2. Qual é o enredo da história? Escreva em uma única frase.

3. Como é apresentado o foco narrativo?

4. Em quanto tempo se passa a história?

5. Onde se passa a história?

6. Qual é o principal conflito da história?

7. Quando esse conflito atinge o clímax?

8. Qual é o desfecho da história?

9. Se você pudesse mudar o final do filme, como faria?

10. Coloque-se no lugar de “Preciosa”, e escreva frases utilizando-se de figuras de linguagem, descrevendo seus sentimentos em relação ao tratamento dado a ela.

11. No filme, “Preciosa” afirma: "Não importa o quão ruim eu me sinta, meu coração não para de bater e meus olhos se abrem pela manhã."

a) Qual sentimento é expressado por meio dessa afirmação?

b) Reescreva a frase, reconstruindo-a em sentido oposto ao que é expressado em relação aos sentimentos.

c) Em qual parte do filme “Preciosa” fala essa frase? Por que ela fez essa afirmação?

d) Elabore uma resposta para essa afirmação de “Preciosa”.

12. Preciosa disse: “Queria ter um namorado de pele clara e cabelo bom. E queria ser capa de revista. Mas antes queria aparecer num dos vídeos da Bet. Minha mãe disse que eu não sei dançar. Falou que ninguém quer ver meu traseiro rebolando”. Segundo Godoi e Neves (2011), ao analisarem o filme, afirmam: “A adolescência é uma fase na qual o interesse por relacionamentos afetivos começa a se manifestar. “Preciosa” gostaria de ter um namorado branco e com o cabelo “bom”, ou seja, fica subentendido que ela percebe os negros e seus cabelos como ruins. Provavelmente, porque não é este tipo de beleza que é divulgado na mídia e valorizado pela sociedade. Seu corpo é a antítese do corpo apreciado nas sociedades ocidentais industrializadas” (p.3). O que você acha dessas afirmações? Escreva alguns aspectos valorizados pela mídia que você julga depreciarem a liberdade e a individualidade das pessoas.

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MMÓÓDDUULLOO 33 –– OO CCOONNTTOO NNAA LLIITTEERRAATTUURRAA:: AA NNAARRRRAATTIIVVAA CCOOMMOO DDIIRREEIITTOO HHUUMMAANNOO

Segundo Roxane Rojo (2004), estudiosa da formação de leitores (e outros estudos linguísticos), a escola é um lugar social de ensino-aprendizagem de conhecimentos acumulados pela humanidade, tais como informações, regras, modelos etc, mas, também, de formação social, da construção da ética e da moral, orientando os alunos a formarem-se como leitores cidadãos.

Para isso, você, estudante, deve compreender o conhecimento das leituras que realiza, indo além do “decoreba” dos conteúdos trazidos pelos professores. Isso porque ao compreender os textos ao seu alcance, pode explorar plasticamente as palavras do autor, mesclar-se a elas, podendo “adotá-las, contrariá-las, criticá-las, em permanente revisão e réplica” (ROJO, p. 8), ou seja, não apenas absorvendo os conhecimentos, mas, também, analisando-os e refletindo sobre eles em todos os momentos.

Essa estudiosa refere-se a todos os tipos de conhecimento que dizem respeito à compreensão da Língua Portuguesa, sua língua materna. No caso da sequência didática que vimos realizando, buscamos compreender o gênero conto. Durante as aulas foram sugeridas propostas que o fizessem compreender a estrutura textual desse gênero, desde o que se trata da estrutura linguística, até os meios de comunicação por onde ele circula, tais como livros, filmes e curta-metragens (como o conto Noite de Almirante, de Machado de Assis).

Para encerrarmos esta sequência didática, estudaremos o modo como o conto é difundido atualmente. Vimos que, inicialmente, nos primórdios da civilização e até alguns séculos atrás, o conto era transmitido pelas tradições orais. Nos dias atuais, esse gênero é concretizado, com maior evidência, por meio da Literatura.

A Literatura é considerada uma arte e, como toda arte, é modificada com o passar do tempo, uma vez que as questões que perpassam as relações humanas, também, são continuamente transformadas. Os textos que lemos são exemplos disso: na época em que Monteiro Lobato escreveu Negrinha, a escravidão ainda estava fortemente presente na cultura, política e economia brasileiras. Destaque-se que a escravidão foi abolida no país em 1888 e em pleno ano 1920, isto é, 32 anos depois, seus traços ainda eram latentes nas relações sociais, tais como nas manifestações preconceituosas contra negros. Aliás, como bem conversamos, embora atenuados, ainda há muito preconceitos a serem esclarecidos, você não acha?

Sendo constantemente produzida, a obra literária, utilizando a palavra, recria a realidade, a vida. Por um lado ela é invenção. O autor inventa uma realidade imaginária, fictícia, mas, o universo da ficção mantem relações vivas com o mundo real. Podemos dizer que “a literatura é uma imitação da realidade” (Amaral et al., 2000, p.18).

Quando refletem sobre a importância da literatura, muitos estudiosos dessa área indicam que a apropriação dessa esfera comunicativa e todos os gêneros textuais que por ela perpassam é

Aulas 21 e 22: A importância da literatura

na formação de cidadãos

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essencial para a formação de cidadãos vivamente atuantes no mundo; cidadãos que têm meios para expressar e registrar o que é melhor para a sociedade. Você, jovem, tem muito a dizer e intervir na realidade para que a cada dia os conflitos sociais sejam superados.

Pensando nisso, há semanas você vem sendo orientado a elaborar um conto infantil, buscando na memória, em seus pensamentos e convicções sobre a vida, modos de cativar as crianças ao gosto pela leitura. O trabalho com a produção textual está praticamente pronto. Nas próximas aulas veremos como podemos confeccionar um livro, a fim de que o conto que você elaborou seja difundido por meio da esfera comunicativa literária concretamente.

Antes disso, todavia, vamos ouvir a última entrevista concedida por Monteiro Lobato ao radialista Murilo Alves Mendes, da Rádio Record, em 1948, acessando o link: http://youtu.be/KD9LdEbvp1I. Essa entrevista é interessante para pensarmos sobre o papel dos autores como “artistas da palavra”.

Atividade 12 (para conversar) - EM GRUPO 1. Vamos analisar alguns trechos da entrevista de Monteiro Lobato? a) Trecho I: “Bom, agora eu vou falar aqui, não é? Nesse “canudo”. Eu não tenho prática nenhuma, de maneira que é possível que saia tudo errado”. A que se refere a palavra “canudo” mencionada por Monteiro Lobato? Você não acha interessante um autor formidável como ele, também, ter dificuldades como nós, afinal, ninguém sabe de tudo!

b) Trecho III: “Sobre o petróleo. Bom, é um assunto em que eu era muito versado antigamente. Eu levei dez anos entendendo de petróleo e tirando petróleo, furando a terra, etc… Hoje eu noto que o petróleo fez um grande “progresso”. Em vez de estarem furando a terra, tão querendo esmola. Virou mais um pobre”. Nesse trecho da entrevista, Monteiro Lobato fala sobre as condições econômicas e políticas brasileiras em relação à exploração do petróleo pelo governo no país. Em qual “tom”, ou seja, qual é a figura de linguagem utilizada pelo autor para adjetivar as questões relativas ao petróleo como “progressivas”?

2. Você escutou a última entrevista de Monteiro Lobato. Dois dias depois de ter ido à radio ele faleceu. Em uma entrevista, os convidados são questionados quanto ao que pensam sobre determinados assuntos. Isso quer dizer que devem relatar o que pensam, podendo citar fatos e elementos que confirmem seu ponto de vista. Sobre isso, pense e responda: mesmo que um entrevistado seja levado a narrar algum fato, ele pode ser considerado um “contista”? Por quê? Quais são as diferenças entre as esferas literária e jornalística? Quais são as diferenças entre o texto narrativo e o relato? 3. Na lousa, com auxílio da professora, escreva em quatro colunas as diferenças e semelhanças entre os gêneros textuais conto e informativo e entre as esferas comunicativas literária, jornalística e multimidiática.

Exercício 10 (responda em seu caderno) – Finalizando a produção do conto infantil 1. Como “atividade para casa” são sugeridos os seguintes exercícios: a) Rever o conto infantil que você escreveu, rememorando sua infância e refletindo sobre suas questões referentes às relações sociais, políticas e econômicas em que vivemos, bem como observando a estrutura textual do gênero conto e as normas padrão da Língua Portuguesa. b) Buscar livros infantis e observar seus moldes, tais como imagens, formatação de texto, materiais utilizados etc. c) Anote suas dúvidas e traga para a próxima aula. Estamos na reta final!

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EEssqquueemmaa ppaarraa pprroodduuççããoo ddee uumm lliivvrroo iinnffaannttiill

Para produzir um livro de conto infantil você deverá elaborar as seguintes partes: Primeira parte: elementos pré-textuais. Essa parte consiste de:

A. Capa (frente): deve ter seu nome (nome do autor) na parte superior da página e o título da história no meio;

B. Folha de rosto: deve ter o título do conto na parte superior da página; em seguida o nome do autor e do ilustrador das imagens; a data da elaboração do livro (mês e ano);

C. Página para dedicatória: você deverá escrever para quem dedica o livro (conto), na parte inferior da página, à direita; D. Segunda parte: o texto ilustrado. Sugere-se que você produza de 5 a 10 páginas nessa parte. Não se esqueça de numerar as páginas;

Terceira parte: elementos pós-textuais. Essa parte consiste de: E. Breve biografia do autor, com foto de rosto e, também, os meios de contato

(preferencialmente e-mail); F. Capa (atrás): deve ter o resumo do conto. Mas, não se esqueça de que o final não

deverá ser revelado nessa parte do livro, afinal, o interessante é que o leitor seja despertado a ler sua história.

Para melhor compreensão, observe as imagens abaixo, que ilustram como você deverá elaborar o livro:

QUADRO DE ORIENTAÇÃO PARA PRODUÇÃO DE UM LIVRO DE CONTO INFANTIL

Aulas 23 e 24: Estrutura do livro:

(Nome do autor)

(Título do livro)

Título: (Título do livro)

Escrito e ilustrado

por:

(nome do autor)

(mês, ano)

(Dedicatória)

[Imagem A] [Imagem B] [Imagem C]

(Conto ilustrado)

-------------------------

-------------------------

-------------------------

(Nº das páginas)

Foto do autor

(Breve biografia e

contato do autor)

(Resumo do conto

– sem contar o

final!)

[Imagem D] [Imagem E] [Imagem F]

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Agora que você tem referências para confeccionar um livro, utilize o quadro abaixo para planejar e organizar o seu tra

balho.

Elementos pré-textuais

Capa

Folha de rosto

Página de dedicatória

Texto

Materiais necessários para as ilustrações

Ilustrações que serão elaboradas

Elementos pós-textuais

Breve biografia do autor (não se esqueça da foto)

Contato do autor

Resumo do conto

Observações:

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[Figura 15]

O acesso à Literatura no Brasil vem, desde o século XIX, sendo difundido. Antes disso era estritamente restrito. Interessante é observar que tal fato pode ser constatado, também, na ausência de pinturas de artistas brasileiros que tenham retratado pessoas (crianças, jovens e adultos) com livros antes dessa época.

Assim como podemos identificar o surgimento do conto infantil em meados do século XVII, pelas obras de Charles Perrault quando, pela primeira vez na história da Literatura foram produzidos livros voltados às crianças, podemos supor que a ausência do retrato da Literatura nas artes plásticas brasileiras indica a ausência de referências que fizessem os pintores voltarem-se a esse tema. A primeira obra de um artista brasileiro a retratar o tema da Literatura foi José Ferraz de Almeida Júnior, que produziu a obra (à direita) “Moça com livro”. Embora não se tenha conhecimento sobre data em que a obra foi produzida,

DDIICCAASS PPAARRAA PPRROODDUUÇÇÃÃOO DDEE LLIIVVRROO IINNFFAANNTTIILL

Para ampliar as pesquisas que você realizou pensando na elaboração de seu livro infantil, tanto no que se refere aos assuntos que dizem respeito à infância, quanto às ilustrações do texto, sugere-se que você

1. Assista ao clipe da música Criança não trabalha do grupo artístico Palavra Canta, disponível em: http://youtu.be/u9aa7FqMcRU.

2. Além de visitar a biblioteca da escola e outras públicas, consulte bibliotecas

digitais, tais como: a) Domínio Público (do Brasil, sessão “Literatura infantil”), disponível em:

http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/PesquisaObraForm.do. b) Biblioteca de Livros Digitais (de Portugal), disponível em:

http://www.planonacionaldeleitura.gov.pt/bibliotecadigital/. Observação: Nessas bibliotecas, além dos livros de literatura infantil você pode

encontrar muitos outros livros de literatura voltados a jovens e adultos.

3. Busque e traga na próxima aula materiais diversos para a confecção do livro, tais como papéis coloridos dos mais variados tipos (inclusive papéis de presente), cola, caneta hidrocor, lápis de cor, giz de cera, tesoura, tintas, imagens em jornais e revistas, botões, linha e agulha, lã, tecidos, areia, cascas de lápis, adesivos e tudo o mais que possa deixar seu livro colorido e chamativo.

Espero que meus amigos não se esqueçam de trazer os materiais para confecção do livro na aula que vem...

Page 62: Monografia Carla Thomas

38

sabe-se que esse artista viveu entre 1850 e 1899. Nesse quadro podemos identificar a leitura como uma ação voltada ao despertar das emoções e do pensamento. O vestido da moça, caído, expressa a liberdade dos sentidos e o olhar para cima com a mão no queixo, o resgate da memória e a expansão da imaginação criativa a que a Literatura pode nos levar.

PPRROODDUUÇÇÃÃOO FFIINNAALL

Nas aulas anteriores e em sua casa, você deve ter anotado todos os detalhes importantes para confecção do seu livro e procurado os materiais necessários para realizar o trabalho. Hoje confeccionaremos o livro de conto infantil para ser doado a crianças em fase de alfabetização.

Pessoas mais velhas são as principais referências para as crianças. Por isso, lembre-se que seu “presente” terá grande valor e servirá de exemplo. Assim, ele deve estar limpo, bem montado e ilustrado, com letra legível (ou digitação correta) e espaçamento adequado entre as imagens e o texto. Não se esqueça de verificar, novamente, se o texto está escrito dentro das

normas padrão da Língua Portuguesa.

Aulas 25 e 26: Produzindo um livro de conto

infantil…

AVALIE SEU LIVRO

Após ter preenchido o quadro das aulas anteriores, anotando tudo o que precisava para confeccionar seu livro, bem como os pontos principais da organização textual, você se prontificou a realizar o trabalho final desta sequência didática.

Antes de entregar o livro verifique se não falta nenhum elemento importante: correções ortográficas, detalhes da confecção (veja se o livro está bem montado), a colagem de sua foto na parte da biografia do autor etc.

Para saber se, ao final, está tudo certo, pergunte-se: se eu fosse uma criança e recebesse este livro que fiz, teria curiosidade de ler? O conto serviria como uma boa referência literária para mim? Se a resposta for afirmativa, o trabalho está feito! Caso contrário, reveja os pontos faltantes, não se esquecendo de que a professora está sempre à sua disposição para tirar quaisquer dúvidas.

Atividade 13 – PARA DECIDIR Como o combinado, faremos uma doação dos livros confeccionados a crianças em fase de alfabetização. Pense em instituições onde podemos doar os livros, tais como: orfanatos, escolas, ou, se decidirmos, para crianças da família ou de amigos. Temos que decidir quais crianças presentearemos nas próximas aulas.

Page 63: Monografia Carla Thomas

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EEnnttrreeggaa ddee lliivvrroo pprroodduuzziiddoo ppaarraa ccrriiaannççaass eemm ffaassee ddee aallffaabbeettiizzaaççããoo ee aavvaalliiaaççããoo ddaa sseeqquuêênncciiaa ddiiddááttiiccaa

Nas aulas anteriores decidimos quais crianças presentearíamos com os livros que

confeccionamos. Hoje, entregamos os livros e podemos considerar encerrada esta sequência didática. Adorei! Você gostou das tarefas e leituras propostas nesta sequência didática?

AAuuttooaavvaalliiaaççããoo

Ao concluir trinta aulas de estudos acerca do gênero conto, enfatizando-o nas esferas comunicativas literária e multimidiática, podemos dizer que os seguintes objetivos deveriam ter sido alcançados. Ou seja, ao planejar esta sequência didática a professora almejava que ao final você pudesse:

- identificar os elementos que estruturam o conto; - identificar a narração como meio de compartilhar experiências; - buscar instrumentos que o auxiliem na superação das dificuldades trazidas durante a leitura. - identificar elementos de intertextualidade; - identificar elementos de interdiscursividade; - identificar os aspectos históricos e sociais como elementos implícitos nos contos; - argumentar sobre fatos sociais de modo a defendê-los logicamente; - identificar o texto literário como fator de promoção dos direitos e valores humanos atualizáveis na contemporaneidade; - produzir um conto infantil; - identificar as imagens como forma de linguagem; - produzir um livro; - usar adequadamente a norma padrão da Língua Portuguesa.

Tendo por referência esses objetivos, você foi continuamente avaliado. Agora é sua vez de autoavaliar-se: você considera que apreendeu os conhecimentos traçados nos objetivos da sequência didática? Por quê?

Aulas 27, 28, 29 e 30: Encerramento da

sequência didática - avaliação

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Caro(a) aluno(a), agradeço seu empenho no desenvolvimento das atividades propostas durante as trinta aulas desta sequência didática. Espero que na próxima aula, quando iniciaremos a próxima sequência, você possa aprender cada vez mais, aprimorando seu conhecimento acerca da Língua Portuguesa e das diferentes linguagens que perpassam pela

vida, contribuindo para uma sociedade melhor para você e a todos que o rodeiam!

Profª Carla Thomas

REFERÊNCIAS Referências bibliográficas ABAURRE, M. L.; PONTARA, M.; TATIANA, F. Coleção base: Português. Ensino Médio. Volume único.

1.ed.. São Paulo: Moderna, 2000. AMARAL, A.; FERREIRA, M.; LEITE, R.; ANTÔNIO, S. Português: novas palavras: literatura, gramática e

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GODOI, M. R.; NEVES, L. Corpo, violência sexual, vulnerabilidade e educação libertadora no filme

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Page 65: Monografia Carla Thomas

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<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-32832012000200010&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 24 nov 2012.

GOLDSTEIN, N. S. G. Português. Livro 8. São Paulo: Brasilform - Pueri Domus Escolas Associadas, 2006. MACHADO, A. A. et al. De conto em conto. São Paulo: Ática, 2003 MACHADO DE ASSIS, J. M. Noite de almirante. In: Histórias sem data. São Paulo: Ática, 1998. MONTEIRO LOBATO, J. B. R. Negrinha. In: Moriconi, Ítalo (org.). Os cem melhores contos

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. FIGURA 6. Príncipe encantado. Disponível em: <http://www.maisacao.com/>. Acesso em 15 nov.

2012.

Page 66: Monografia Carla Thomas

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FIGURA 8. Beijo do príncipe. Disponível em

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FIGURA 11. Charles Perrault. Disponível em <http://media.web.britannica.com/eb-media/65/9665-

004-DC95261B.jpg>. Acesso em: 19 nov. 2012. FIGURA 12. Sítio do Pica-Pau Amarelo. Disponível em

<http://renatoestudio.blogspot.com.br/2009_02_01_archive.html>. Acesso em: 19 nov. 2012. FIGURA 13. Monteiro Lobato. Disponível em <http://blogs.estadao.com.br/estante-de-

letrinhas/files/2012/09/Monteiro-Lobato1.jpg.> Acesso em: 06 nov. 2012. FIGURA 14. Preciosa. Disponível em <http://www.adorocinema.com/filmes/filme-

132242/curiosidades/>. Acesso em: 06 nov. 2012. FIGURA 15. ALMEIDA JR., J. F. de. Moça com livro. s/d. 1 pintura, óleo sobre tela, 50 cm x 61 cm.

Coleção do Museu de Arte São Paulo (MASP): Disponível em: <http://masp.art.br/masp2010/acervo_detalheobra.php?id=364>. Acesso em: 20 nov. 2012.

Referências de imagens em movimento CRIANÇA não trabalha (clip). Composição: Paulo Tatit e Arnaldo Antunes. CD Canções Curiosas.

Distribuição: Selo Palavra Cantada. 1998. (2´52´´). Disponível em <http://www.youtube.com/watch?v=u9aa7FqMcRU&feature=related>. Acesso em: 23 nov. 2012.

NOITE de Amirante. Adaptação do conto de Machado de Assis. (stopmotion) Produção: alunos do 2º

ano do Ensino Médio. Colégio Motiva. 2011. (1´´56´´). Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=zlWvgS0ESVE>. Acesso em: 17 nov. 2012.

PRECIOSA – uma história de esperança. (a) (trailer) Direção: Lee Daniels. Produção: Sarah Siegel-

Magness, Lee Daniels, Gary Magness. Intérpretes: Gabourey Sidibe, Mo'Nique, Paula Patton. Distribuição: PlayArte Pictures, 2009. (2´30´´). Disponível em <http://mais.uol.com.br/view/a56q6zv70hwb/trailer-do-filme-preciosa--uma-historia-de-esperanca-04029C3364DCA93326?types=A>. Acesso em: 24 nov. 2012.

PRECIOSA – uma história de esperança. (b) (longametragem) Direção: Lee Daniels. Produção: Sarah

Siegel-Magness, Lee Daniels, Gary Magness. Intérpretes: Gabourey Sidibe, Mo'Nique, Paula Patton. Distribuição: PlayArte Pictures, 2009. 1 DVD (110 min).

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Referências sonoras LOBATO, M. Última entrevista. Radialista: Murilo Antunes Alves. Rádio Record. 1948. (10´20´´).

Disponível em <http://www.youtube.com/watch?v=KD9LdEbvp1I&feature=youtu.be>. Acesso em: 23 nov. 2012.