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Escrevinhao n. 834
ENSINAR MENOS PARA SE APRENDER MAIS
Meditaes esparsas sobre o ensino de histria
Redigida em 22 de maio de 2010, dia de Santa Rita de Cssia.
Por Dartagnan da Silva Zanela
"A histria mula do tempo, repositriodos fatos, testemunha do passado, exemplo
do presente, advertncia do futuro".(Miguel de Cervantes)
- - - - - - - + - - - - - - -
curioso o quanto necessitamos de um elemento motivador
para realizarmos algo, porm, o que entendemos por motivao? Essa
uma palavra utilizada em demasia para finalidades totalmente
contrrias ao seu significado. Motivar no significa de modo algum a
apresentao daquelas frmulas capengas de auto-ajuda ou, melhor
dizendo, de auto-engano. Motivao significa saber o motivo, a razo,
que nos leva a estar fazendo algo, de estar vivendo. Trocando por
midos, todo elemento motivador real to s um exerccio que leve o
indivduo a compreender com clareza o seu lugar na ordem da vida e,
conseqentemente, consiga assim ordenar a sua prpria vida para que
seja capaz de viver plenamente o motivo que poder dar norte a sua
existncia.
Bem, por essa razo que sempre achei as palestras de
motivao, os vdeos e os livros deste gnero (auto-ajuda) sempre algo
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profundamente tediante e desmotivador, pois tais falas e palavras
escritas no apresentam de modo algum os elementos necessrios para
que um indivduo possa encontrar os reais motivos da vida humana.
Doravante, se nos perguntarmos sobre os reais motivos que
nos levam a estarmos fazendo isso ou aquilo, com grande probabilidade
de acerto ns no saberamos apresentar uma resposta razovel o que
reduz a natureza real de nossos atos a um chinfrim simulacro como o
a vida da maioria das pessoas na atualidade.
E, como este ensaio foi redigido para ser apresentado ao
grupo de trabalho de rede GTR que integro, proponho aqui apenas
uma pequena e sincera meditao sobre no to s os mtodos e
procedimentos utilizados no ensino da disciplina de histria, mas sim,
sobre o realmente motivo que nos leva a (i) ensinar histria para
crianas, (ii) de ns sermos professores e desta disciplina em especial e
(iii) quanto ao real motivo de estarmos aqui integrando esse grupo de
discusses virtual.
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Para comeo de prosa, iniciemos com a ltima questo. Isso
mesmo, por que realmente estamos fazendo esse GTR? E, nos permitam
ir um pouco alm desta pergunta e para indagarmos quanto ao motivo
que nos impeliu a realizarmos uma ps-graduao latu senso. Olha, o
bacana nisso seria se respondssemos a essas indagaes de maneira
franca para podermos meditar sobre os problemas reais da educao a
partir de onde estamos, a partir do extrato da realidade que est sendo
vivido e testemunhado por ns. Toda reflexo que vise realizar o
caminho inverso, no passar de uma reles empulhao. Nada mais e
nada menos do que isso, visto que, nada que desdenhem as
circunstncias reais em nome de um abstratismo terico e doutrinal
poder parir algo edificante.
Dito isso, se estivermos sendo sinceros responderemos sem
pestanejar que o motivo real de estarmos participando deste GTR para
podermos obter a gentil carga horria que ir nos auxiliar no avano de
nosso plano de carreira. Isso mesmo, para avanarmos as tais
casinhas e, deste modo, poder ser merecedor de uma elevao em
nossos ganhos, mesmo que essa elevao seja modesta. Com a ps-
graduao no muito diferente a regra, no mesmo? Tanto assim o
que o que torna uma ps-graduao atrativa aos olhos da clientela (
nis na fita mano) o fato de ela poder ser realizada em um curto prazo
de tempo. Para podermos aprender rpido tudo e assim podermos nos
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dedicar a outros estudos? No! Para podermos entregar o mais rpido
possvel o certificado junto a NRE e assim obtermos alguns louros
financeiros.
Esse o motivo primeiro, e no outro. No o amor ao
conhecimento que nos move a aqui estarmos, mas sim, este torpe
chamariz descrito acima. Para tanto basta vermos o zelo com que
dedicamo-nos na feitura das tarefas que nos foram incumbidas. Alis,
diga-se de passagem, veremos isso se formos to observadores e
crticos conosco mesmo como o somos com tudo o mais a nossa volta.
Amor ao conhecimento algo muito raro hoje em dia. To
raro quanto um trevo de quatro folhas em um jardim. Obviamente que
poder alguma alma incauta dizer no silncio de sua alcova que ela no
se dedica mais aos estudos porque no tem recursos. Neste caso digo
apenas: conversa fiada. Colquio flcido vulgar. E lhes digo a razo:
quando algo a fora motivadora que nos move na realizao de nossas
aes, este o elemento que nos ilumina e que nos leva a,
gradativamente, a nos tornarmos esse motivo. Ou, como poeticamente
nos diz Luiz de Cames, [...] o amador torna-se a coisa amada.
Quem realmente ama o conhecimento, procura-o mesmo
que tudo a sua volta conspire em contrrio. Os exemplos destas
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hercleas almas, graas a Deus, abundam nas pginas da MAGISTRA
VITAE, da histria. Se dedicarmo-nos a estudar a biografia dos grandes
Santos, Sbios, Filsofos (os de verdade, no essas pachorras
escarradas), Escritores e Cientistas veremos que eles, na maioria
absoluta dos casos, no tinham recursos materiais em abundncia e
muito menos o apoio das pessoas a sua volta e, mesmo assim,
tornaram-se quem eles se tornaram devido ao seu profundo amor
procura pela Verdade (no pelo aumento dos ganhos materiais). Eram
verdadeiros espritos livres.
So Toms de Aquino foi preso a mando de seus pais para
que ele no fosse monge. Fugiu da priso e realizou o motivo de sua
existncia. Viajava a p de uma biblioteca outra na procura do
conhecimento, como faziam todos os sbios de seu tempo. Pasteur,
durante anos de sua vida, tinha como laboratrio uma mesa que ficava
embaixo da escada da penso onde ele morava nos subrbios de Paris.
E ns, que sacrifcios fazemos em nome do conhecimento? Ah! Se
fossemos to sinceros como fingimos ser, no mesmo? Se fssemos
compreenderamos inmeros problemas que esto encalacrados em
nosso ofcio e em nosso ser.
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Segunda questo: por que, afinal, nos tornamos
professores? Por que nos tornamos professores de histria? Para tanto,
interessante que volvamos as nossas vistas para a nossa histria
pessoal, para que aquelas pginas ntimas de nossa biografia e, se
formos sinceros, nos defrontaremos com a seguinte verdade: na maioria
absoluta dos casos as pessoas tornam-se professores o foi por uma
segunda opo ou por no ter outra opo e no por uma vocao que
alimentada na alma do indivduo desde tenra idade pela famlia.
Isso mesmo. Olha, no sou to velho assim, mas o pai de
Zeus, Cronos, o Deus do tempo, j deixou algumas marcas
significativas nas carnes de minha face e no correr destas muitas luas,
conheci apenas uma nica pessoa que se tornou professora de histria
porque foi o que ela sempre quis fazer em sua vida e, na realizao
deste intento, foi profundamente apoiada pelos seus familiares. Para
lhes ser franco, eu mesmo entrei no magistrio por um acaso do
destino.
Entretanto, o que isso tem haver com a questo proposta no
incio desta missiva? Ora, simplesmente para demonstrar o quanto que
essa questo capital em nossa vida. Reformulo minha colocao: por
qual razo estamos em uma sala de aula? O que nos motiva estar na
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seara do magistrio e nos mantermos nela? Ser exatamente a mesma
motivao que nos moveu a entrar no magistrio se no correr de nossa
carreira no tivermos nos convertido a essa vocao que tenha
integrado nossa vida ou por acaso ou por falta de opo.
Uma pessoa que simplesmente encara o seu ofcio como
uma reles ocupao para ganhar a vida simplesmente uma pessoa
que alm de diminuir a realidade de sua humanidade, reduz a realidade
do papel que est ocupando e apresenta-se como um exemplo negativo
de humano. Explico-me: voc procuraria um mdico veterinrio que
simplesmente se preocupa em assinar os seus laudos, realizar as suas
lides ordinrias para tratar do seu animalzinho de estimao? E por que
no? Por que esse senhor no inspira confiana. De modo similar temos
esse sentimento com relao ao professor que simplesmente se
apresenta como professor, mas no um Professor. Como uma pessoa
que no acredita e no confia em si mesma e no que ela est fazendo
poder inspirar confiana?
Se o que afirmamos no est suficiente claro, permitam-nos
recorrer a um exemplo mais contundente. Imagine a figura de dois
padres. Um apenas aquele que seria o que chamamos de padre por
profisso, sem o ser por vocao e inspirao. O outro, um sacerdote
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da monta de um Santo Cura DArs. Com qual dos dois voc se
confessaria? Melhor, qual dos dois realmente um confessor.
O exemplo pode parecer extremado, mas no o . Ser
professor uma forma de apostolado. uma pessoa que tem sobre sua
responsabilidade a formao de inmeras almas e, por essa razo, no
exagero de modo algum nos vermos como pais intelectuais de
inmeras pessoas. Queiramos ou no temos uma responsabilidade para
com a vida de inmeras pessoas (de parca idade) que passam pelas
nossas vidas e ns, pelas vidas deles e, o que fazemos ou deixamos de
fazer ir marcar as suas vidas, gostemos ou no da idia.
Quanto afirmamos que te uma responsabilidade grave para
com a vida destes mancebos, no estamos dizendo que devemos ser
babacas que ficam passando a mo na cabea de irresponsveis,
posando de bonzinho, com toda aquela lengalenga populista destas
pedagogias infectadas at a medula de materialismo marxista e
psicologismo barato. Ser responsvel por esses jovens dizer-lhes o que
eles precisam ouvir, fazer o que deve ser feito mesmo que isso signifique
ir de encontro com as potestades Estatais e contra o consenso
idiotizante de nossos pares.
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Ensinar a viver na verdade vivendo de verdade. Isso
significa ser professor. Isso, justamente isso, o grande vcuo que h
na educao em nosso pas, porque ns, professores, que nos achamos
crticos e bl bl bl, no conhecemos nem mesmo a ns mesmos
porque tememos que a verdade sobre ns seja atirada em nossa face.
Ento, em um srdido mecanismo de defesa, fingimos nada ver para
que assim nada possamos ser. Lamentvel, mas assim o , no
mesmo?
Antes de partirmos para a questo primeira proposta para
meditao dessas laudas, cremos ser necessrio realizar um pequeno
parntese que se faz, penso eu, necessrio devido a uma questo que
deve estar pairando na mente de meus pares neste grupo de trabalho
de rede. Tudo isso que foi dito at aqui, o que tem haver com o uso de
fontes histricas no magistrio da Histria? Simplesmente tudo e j lhes
digo a razo, iniciando minha considerao com a indagao que segue:
como pode um professor de histria ensinar para um aluno a
importncia das fontes histricas para o aprendizado da disciplina de
Histria se ns desprezamos as fontes de nossa histria pessoal e no
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meditamos devidamente sobre essas? , meu caro. Rapadura doce,
mas no mole no.
Em nosso dia dia desprezamos olimpicamente o papel
irradiante que os exemplos tem na vida dos indivduos, sejam eles
infantes ou adultos. Todo gesto humano, toda palavra, que se faz
presente em nosso cotidiano ganha a fora de um arqutipo que passa a
inspirar-nos a agir e a justificar o nosso fazer. Justificando e moldando
tanto para o bem como para o mal. Tais gestos e palavras que se
propagam de maneira informal seriam o que os pedagogos chamam de
currculo no escrito da escola ou o que os psiclogos chamam de a
sombra da organizao. Trocando por midos: no o PPP escrito e os
planos de aula, bonitinhos, que inspiram e motivam as aes em nossas
Instituies de Ensino, mas sim, estes, no escritos.
Por fim, quanto metodologia, quanto ao uso de fontes
histricas no ensino de histria. Bem, este gesto pedaggico estar
necessariamente amarrado a tudo isso que expusemos at aqui, visto
que, o mtodo e seu emprego no esto desvinculados a pessoa do
professor. Estes so um reflexo do ser do professor do mesmo modo que
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o caderno de um aluno um elemento que simboliza quem o aluno
que o possui, que o utiliza. Isso mesmo, um caderno quando ca nas
mos de um garoto apenas um objeto desprovido de personalidade.
Aps isso, gradativamente vai sendo empregado nele a imagem de seu
dono que poder revelar muito sobre a pessoa que o tem em mos. Ora,
no temos a uma fonte histrica, pessoal, que pode ser objeto de
anlise, de reflexo e autoconhecimento?
Levar o aluno a perceber o quanto que deixamos marcas
indelveis sobre ns a todo o momento em todos os cantos por onde
passamos uma meta pedaggica interessante. Obviamente que, para
ensinarmos isso, temos que primeiro treinar o nosso prprio olhar.
Talvez o que eu esteja afirmando parea um tanto que distante, por
isso, ensaiemos uma reflexo: todos ns utilizamos, provavelmente, com
relativa freqncia a palavra dialtica, no mesmo? Todavia, quantos
de ns j realizamos alguma vez uma depurao dialtica de algo? No
estou falando de saber dcor aquela definio materialista vulgar que
aprendemos na graduao, mas sim, de saber e mesmo dominar o uso
desta tcnica filosfica. Ora, se no sabemos empregar uma tcnica
como poderemos efetivamente ensin-la?
Trabalhar com fontes histricas implica, necessariamente,
em estarmos ensinando aos nossos alunos como ler um documento
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histrico, a analisar e compreender uma imagem. isso que estaremos
ensinando aos nossos alunos de maneira direta e indireta. Para ensinar
uma tcnica ou o emprego de um mtodo necessrio que a
conheamos. Para ensin-la de maneira indireta, fundamental que,
alm disso, ns dominemos plenamente a circunstncia em que a
tcnica ser ministrada.
Porm, se quisermos, poderemos fazer tudo nas coxas,
como tudo o mais feito em nossa sociedade. Um mal monstruoso no
estaremos fazendo, porm nem de longe estaremos fazendo o bem que
imaginamos poder estar fazendo com nosso teatrinho de sombras e
fingimento.
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