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DILATAÇÃO no ESTÔMAGO THESE INAUGURAL APRESENTADA Á ESCOLA MEDICO-CIRURGICA DO PORTO POR ANTONIO EVARISTO D'ORNELLAS Barão d'Ornellas DOUTOR EM MEDICINA PELA FACULDADE DE PARIS PORTO JMPRENSA jMODERNA i— Rua do Carmo í .«886 J , 3.1/3 Bfi

no ESTÔMAGO - repositorio-aberto.up.pt · por cento, e quanto ao numero das moléstias ... coin a sua distensão, ... abaixar a grande tuberosidade do estômago

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DILATAÇÃO no

ESTÔMAGO THESE INAUGURAL

APRESENTADA Á

ESCOLA MEDICO-CIRURGICA DO PORTO

POR

ANTONIO EVARISTO D ' O R N E L L A S

Barão d'Ornellas

DOUTOR EM MEDICINA PELA FACULDADE DE PARIS

PORTO J M P R E N S A j M O D E R N A

i— Rua do Carmo — í

. « 8 8 6

J ,

3.1/3 Bfi

DIRECTOR

y i S C O N D E DE Q L I V E I R A

SECRETARIO f l l C A R D O D ' ^ L M E I D A ^JoRGE

CORPO GATHEDRATIGO LENTES CATHEDEATICOS

l.a Cadeira — Anatomia descriptiva e „ a f?eIay " „ ; : , • J o S o P e r e i ™ Dias Lebre. 2.» Cadeira —Physiologia Antonio d'Azevedo Maia. 8." Cadeira —Historia natural dos me­

dicamentos. Materia medica . . Dr. José Carlos Lopes. 4." Cadeira— Pathologia externa e the­

rapeutica externa Antonio Joaquim de Moraes Caldas. o." Cadeira—Medicina operatória. . Pedi'o Augusto Dias. 6.a Cadeira — Partos, doenças das mu­

lheres de parto e dos recemnas­„ * ■ •„ •„ .* , * : • • • • Dr. Agostinho A. do Souto. (Examina­i s Cadeira—Pathologia interna e the­ dor).

rapeutiea interna Antonio d'Oliveira Monteiro (Exami­nador).

8. Cadeira —Clinica medica . . . Manoel Rodrigues da Silva Pinto ­ (Examinador).

«."Cadeira —Clinica cirúrgica. . . Eduardo Herein Pimenta 10. Cadeira­Anatomia pathologica. Augusto Henrique d'Almeida Bran­11. Cadeira — Medicina le^al, hy­ dão.

giene privada e publica e toxico­12.aIOctdeir­a­­pathologia Veia, ; se­ ^ ' • " * ^ ^ <le G — ­ O s ó r i o .

meiologia e historia medica . . Illidio Ayres Tereira do Valle I hannacia I s i r t o r o d a P o n s e c a M o u r a >

LENTES JUBILADOS

o ( D r . Josó Pereira Reis. Secção medica João Xavier d'Oliveira Barros.

I Josó d'Andrade Gramaxo. Secção cirúrgica j Antonio Bernardino d1 Almeida.

) Visconde de Oliveira.

LENTES SUBSTITUTOS

Secção medica I Vceute Urbino de Freitas. / Antonio Placido da Costa.

Secção Girar*!., l í ' 0 ^ 0 d 'f Imeida ■Jor=e (Presidente), secção cirúrgica Cândido Augusto Correia de Pinho

( (Examinador).

Secção cirúrgica LENTE DEMONSTRADOR > . . . . Vago.

A Esel ola não responde pelas doutrinas expendidas na dissertação c enunciadas nas proposições.

(Regulamento ãa Escholx de 81 d'abril de 1840, art. Jõ5.°)

A' ESCriOLA

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Homenagem de reconhecimento.

vy anelou*

-

Morgagni foi o primeiro que cleu a conhe­cer a dilatação do estômago por uma observa­ção que publicou sob o titulo de Deslocação do Estômago; mas o primeiro trabalho espe­cial e completo sobre este interessante as­sumpto é devido ao Dr. A. Duplay, fallecido ha poucos annos, o qual o publicou nos «Ar­chives Générales de Médecine» com a rubrica de Ampliação do Estômago. Depois, e sobre­tudo modernamente hão estudado com grande talento esta doença outros medicos e, entre elles, forçoso é nomear por ordem chronolo-gica os Drs. Kussmaul, Faucher, Debove, Bou­chard, Malibran, e no anno passado o Dr. Gi-raudeau.

A dilatação do estômago, que geralmente vem como complicação d'outros estados mór­bidos, é também ás vezes uma entidade pa-thologica, e apresenta-se então sem lesão apre­ciável das paredes gástricas, em cujo caso é mais facilmente curavel. A consideração de

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ser uma moléstia especial não nos levaria a occupar-nos d'ella exclusivamente, se o trata­mento que actualmente lhe é applicavel não fosse muito proveitoso.

A Ectasia gástrica é frequente e fácil de diagnosticar. Esta moléstia encontra-se, quanto á totalidade dos doentes, na proporção de trinta por cento, e quanto ao numero das moléstias chronicas, na proporção de sessenta por cento. É de suppôr, e mesmo provável, que estes al­garismos estabelecidos pelo professor Bou­chard para a população parisiense, sejam ex­cedidos nos paizes cálidos, pois os climas quentes não são favoráveis ao exercido cor­poral, factor importantíssimo para uma boa digestão.

Considerações physiologicas — O ventrículo é uma bexiga em forma de gaita de folie, desti­nada a receber os alimentos por mais ou me­nos tempo para a sua elaboração.

As dimensões do estômago são tão variá­veis que é impossível fixal-as d'um modo certo. Baste-nos dizer que o estômago d'um adulto no estado d'ampliaçao occupa a maior parte do hypochondrio esquerdo, todo o epi-gastro, invade mais ou menos a região umbi­lical, sem jamais passar normalmente abaixo do embigo, pois que em geral se encontra dous centímetros acima.

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O estômago são no estado vasio mede vinte centímetros no seu maior diâmetro, que é o transverso,—oito centímetros no diâmetro anteroposterior, —e verticalmente o diâmetro pôde desapparecer pela applicação das duas paredes uma sobre outra.

O ventrículo dirige se horisontal e trans­versalmente no homem ; mas nas crianças, e nas mulheres, que abusam do espartilho, a sua direcção é obliqua de cima para baixo e da direita para a esquerda.

0 órgão que nos occupa, com as suas aberturas d'entrada (cardia) e de sahida (py-loro), tem paredes molles compostas de quatro tunicas: sôrosa, musculosa, cellulosa e mu­cosa. N'esta ultima se encontram as innumera-veis glândulas tubulosas, dispostas umas jun­to ás outras, que segregam o sueco gástrico.

Em toda e qualquer digestão ha por tanto a considerar os movimentos ou as contracções do estômago determinadas pela sua tunica musculosa e a acção chimica, principalmente de fermentação, produzida pelo sueco segre­gado das glândulas da tunica mucosa e pelos elementos epitheliaes destacados.

A tunica muscular produz movimentos pe-ristalticos lentos, excessivamente vagarosos que conduzem o conteúdo do estômago desde o cardia até o pyloro. Façamos abstracção do canal especialmente produzido pela gravata de

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suisso, por ser de formação passageira e de pouca importância para o nosso assumpto. Os movimentos peristaltieos, ainda que fracos, não deixam de ser importantes para despejar nos intestinos o conteúdo dõ estômago; mas as contracções antiperistalticas poucas vezes são bastante enérgicas para determinar a re­gurgitação ou o vomito, actos que são geral­mente produzidos pela compressão que o dia­phragma e as paredes musculares do abdo­men exercem sobre o ventrículo. O pyloro gosa d'uma grande motilidade, mas durante a digestão fica fechado. Segundo W. Oser (soc. imp. med. de Vienna, 4 Abril 1885) esta alter­nativa de occlusào e dilatação explica se pela innervaçào motora do estômago. Nas vivisec-ções o pyloro contrahe-se energicamente, quer o pneumogastrico ou o sympathico estejam in­tactos quer cortados, o que prova a existência d'um systema ganglionar particular e influente; mas as contracções tornam-se mais activas, e mesmo o pyloro se fecha, com a excitação do nervo vago, assim como ellas diminuem, e mes­mo o polyro se dilata, quando se excita o nervo sympathico. O nervo vago faz cóntrahir o py­loro, o splanchnico dilata-o.

O sueco gástrico é comparável á saliva; é ligeiramente acidulado pelo acido láctico, e a sua acidez augmenta no estado pathologico. Este liquido encontra se misturado com o mu-

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co estomacal, e o seu principio activo é a pe-psina associada a um acido livre. O sueco gás­trico segrega-se na presença d'um estimulo próprio, isto é das matérias albuminóides ; em quanto que o muco se separa quer no estado de vacuidade, quer na presença d'algum corpo estranho e mesmo no estado pathologico.

Um facto importantíssimo é que o sueco gástrico, e por tanto a pepsina, diminue e acaba por faltar no fim d'uma digestão labo­riosa ou nos estômagos dyspepticos, e que o ventrículo recupera a faculdade de formar nova pepsina com a introducção de certos ali­mentos peptogenes de fácil absorpção, ísomeri-cos da albumina e não precipitáveis pelos áci­dos,—na presença do caldo, por exemplo, ou duma solução de dextrina.

A peptonisação dos alimentos albuminóides, isto é, a reducçâo do cbymo em um liquido delgado, amarellento e solúvel (que é a aibu-minose ou peptona) é indispensável para a perfeita digestão; e este produeto não é absor­vido pelo estômago, mas transportado aos in­testinos, aonde os cnyliferos e mais vasos lymphaticos o absorvem, e o introduzem na circulação geral. No ventrículo faz-se a prin­cipal operação chimica da digestão dos ali­mentos, isto é a porphyrisação, liquefação e mudança final de côr.

N'uma palavra no estômago faz-se a pepto-

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nisação. Alli não só os farináceos completam a! sua transformação em assacar (pela continua­ção da acção da saliva) e as gorduras se emul­sionam pelos movimentos do estômago; mas as matérias albuminóides se peptonisam pela acção da pepsina.

Quanto ao estômago mesmo, se n'elle ha absorpçào, esta é pouco activa e de pouca im­portância comparada com a que se executa no duodeno.

Mechanismo e causas — Por haver-se geral­mente confundido a dilatação do estômago coin a sua distensão, não se ha prestado suf-ficiente attenção á primeira, senão n'estes úl­timos tempos. É portanto conveniente dizer em poucas palavras, em que se distinguem estes dous estados. A. dilatação gástrica é o estado pathologico permanente em que o estô­mago se encontra com augmento de capacidade sem pressão interior, ou durante a vacuidade, ou na plenitude.

O estômago dilatado augmenta pela grande curvadura, para baixo do embigo, e avança mais ou menos para o pubis e flancos. No estômago distendido o augmento de volume acompanha-se de pressão interior, mais ou me­nos devida aos inyesta e faz-se para cima pela pequena curvadura, paia baixo das costellas. Como muito bem diz o Doutor Malibran (The-

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se de Paris, 1885), o estômago dilatado acba-se pendurado na cavidade abdominal, emquanto que o estômago distendido bóia do lado da cavidade thoracica.

Na dilatação gástrica as matérias alimen­tícias retidas diária e continuamente tendem a abaixar a grande tuberosidade do estômago (grand cul de sac) em quanto que na disten­são a leveza dos gazes, e a sua tendência a elevar-se levantam a pequena curvadura do estômago.

A dilatação estomacal é de fácil apprecia-ção ; porque o órgão no estado de vacuidade apresenta-se enorme e com paredes frouxas, occupando a maior parte da cavidade abdomi­nal ; em quanto que na distensão o seu tama­nho é o mesmo que no estado de vacuidade, occupando os seus limites normaes.

Teria sido talvez conveniente haver indi­cado as variações da capacidade do estômago segundo as idades, pois esta apreciação é in­teressante, ainda que cremos a ectasia gás­trica rara nas crianças, não obstante a asser­ção dos Drs. Moncorvo, Comby e Blache que a crêem frequente na idade infantil, principal­mente nas creanças alimentadas com mama­deira. O Doutor Malibran pensa que a posição obliqua, quasi vertical, do estômago infantil é pouco favorável á dilatação. Certo é que o inolvidável e escrupuloso professor Parrot, que

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fez tantissimas autopsias de infantes e se occupon com tão feliz resultado das doenças das primeiras vias n'esta idade, não menciona a dilatação estomacal. Portanto nós tratare­mos da ectasia gástrica na idade adulta exclu­sivamente.

No estado physiologico os alimentos, á medida que se digerem, passam para o duo­deno, onde são absorvidos, porque o estômago só os peptonisa sem fazel-os entrar na circula­ção. Ora tudo quanto possa impedir ou retar­dar o curso das peptonas do estômago aos in­testinos, produzirá a accumulação dos alimen­tos no estômago e consecutivamente a disten­são do órgão. A accumulação continuando a repetir-se, os alimentos mal digeridos provo­cando uma fermentação digestiva viciosa e o desaguamento tornando-se progressivamente mais difficil, sobrevêm vómitos espontâneos ou provocados, que só remedeiam momenta­neamente o incommodo causado pela sensação de plenitude. As distensões repetidas fazem perder ao estômago a sua elasticidade, a tu­nica muscular perde a força de contracção, e o que ao principio não era mais que disten­são temporária, torna-se dilatação permanente.

Naturalmente com tal accumulação se transtorna mais e mais o trabalho chimico da digestão; d'ahi as indigestões agravarias pela diminuição da secreção do sueco gástrico, pois

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as matérias albuminóides, novamente ingeri­das n'uni estômago mais ou menos occupado pelos resíduos d'alimentos alterados e pelo muco destacado incessante e mais abundante­mente, não podem entrar em contacto com as glândulas gástricas, nem excital-as á secreção do sueco ou fermento digestivo (pepsina), que junto com as mesmas matérias albuminóides são o promotor natural das contracções da tunica muscular gástrica.

Se o mechanismo da ectasia gástrica é sem­pre o mesmo, quanto ao resultado, différentes são as suas causas. Assim é, que em muitos doentes os alimentos são retidos no estômago por causa dynamica, isto é, por retardação, diminuição e mesmo abolição do movimento peristaltico da tunica muscular, e noutros por causa mecânica, isto é, por obstáculo de­vido ao estreitamento do pyloro. Desde já se pôde comprehender que a dilatação do ventrí­culo augrnentará á medida que se torne mais intensa, ou que se prolongue por mais tempo qualquer das causas de accumulação, sendo certo que as duas causas, dynamica e mecâ­nica, podem existir separadamente, coexistir desde o principio, ou emfim associar-se pos­teriormente. É indubitável que os casos, em que o obstáculo mecânico se apresenta, são os mais frequentes e os mais graves.

A causa dynamica por diminuição dos mo-

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vimentos persistalticos é devida umas vezes á diminuição do estimulo natural do alimento sobre as extremidades nervosas sensíveis da mucosa gástrica (provavelmente ramos gástri­cos do pneumo gástrico) por abundância de muco no estômago, ou ao embotamento da sensibilidade das fibras nervosas (que existe principalmente na gastritis chronica alcoólica), outras vezes á paralysia das fibras musculares, devida quer á paralysia nervosa sine materia), como succède nas pessoas hystericas ou chlo-ro-anemicas, — quer á paralysia cum, materia et Isesione, como succède nos doentes atacados d'um trabalho pathologico appreciavel do sys-tema nervoso.

A causa mechanica encontra-se n'algum obstáculo do orifício pylorico, produzindo-se a dilatação pouco a pouco e com lucta da parte da tunica muscular que se hypertrophia ao mesmo tempo para compensação. O me-chanismo n'este caso é exactamente o mesmo que no caso de estreitamento d'um orifício cardíaco, como quando se produz a dilatação do coração com a hypertrophia muscular com­pensadora,— ou no caso de estreitamento do canal da uretra, em cujas circumstancias se produz a dilatação da bexiga urinaria com hy­pertrophia da tunica muscular propria. Em to­dos estes casos o desaguamento é embaraçado.

D'um modo análogo se produz a dilatação

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■estomacal com hypertrophia da tunica muscu­lar na polyphagia, e mesmo nas pessoas, que abusam de comidas copiosas repetidas. O py­loro é relativamente estreito para o serviço d'uma cavidade subitamente amplificada, e enor­memente cheia.

Além d'estas causas determinantes, e lo­caes d'ordem dynamica e mechanica, que te­mos estudado, é indispensável indicar outras predisponentes da ectasia gástrica, como o rheumatismo, a gotta, a syphilis, que todos têm uma acção visceral nociva bem conhecida, sem esquecer o paludismo, causas que pren­dem com a constituição individual.

Lesões.— A macropsia, assim como a histo­logia, na Ectasia gástrica, variam segundo a causa, e as lesões da moléstia.

Nas chloroticas, nos dyspepticos só se en­contra um estado anemico da mucosa gás­trica. Havendo existido durante a vida dimi­nuição de secreção do sueco gástrico, devido não só ao estado anemico, mas egualmente á falta de estimulo dos alimentos por penúria d'estes, pois esta espécie de doentes tem pouquíssimo apetite, a dilatação faz­se conse­cutivamente á estagnação de alimentos não di­geridos. N'esta sorte de dilatação deverá pro­vavelmente encontrar­se atrophiada a tunica muscular gástrica, isto é, haverá sem duvida

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diminuição do volume das fibras musculares, como o hão estabelecido Foerster e outros, nos casos d'atrophia do myocardio.

As mesmas lesões deverão apresentar-se, como é de suppôr à priori nos casos de para-lysia do estômago, á imitação do que acontece na simples paralysia da bexiga urinaria, isto é descollamento epithelial abundante,—estira­mento da tunica muscular,— e atrophia d'esta.

Nos casos de dilatação aguda do estômago as lesões devem ser acompanhadas de gastri­te aguda, ou catarrh o superficial. Sobre este particular nada se sabe, mas é indubitável que uma indigestão, que em certos indivíduos predispostos determina uma dilatação aguda do estômago, oceasiona desde logo não so­mente a dilatação forçada do órgão, com a per­da da sua elasticidade, mas um ligeiro estado inflammatorio, deixando vestigios. Assim nós explicamos a persistência dos accidentes no doente da observação N.° 23. Uma vez multi­plicadas as indigestões por excesso em quan­tidade, ou em qualidade dos alimentos, a dila­ção tende a augmentar. A experimentação so­bre os animaes demonstrou a existência da gastrite catarrhal. As injecções de emético e jaborandi, feitas nas veias por Beclard e La-borde, confirmaram os factos que nós mes­mo haviamos estabelecido com as injecções hypodermicas d'emetina (1873), isto é a exis-

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tencia d'uma gastro-enterite catarrhal aguda violenta. Nós pensamos que na dilatação aguda do estômago deve haver uma ligeira gastrite catarrhal superficial, com congestão da mu­cosa e tumefacção edematosa interglandular, mas ao principio sem lesão pronunciada das glândulas.

É tão provável, senão verdadeira, esta ex­plicação, que nada mais frequente do que a dilatação do estômago na gastrite chronica dos bêbados. A estimulação, repetida pelo con­tacto d'um liquido irritante sobre a mucosa gástrica, causa a inflammação, que pouco a pouco se propaga á tunica cellular submucosa e muscular, e esta ultima, desde que se alte­ra, não pode luctar contra a dilatação pro­gressiva, senão com desvantagem, e hypertro-phiando-se.

Com efíeito, na dilatação gástrica com gas­trite chronica não só se encontra uma quanti­dade de liquido composto de residuos d'ali-mentos, e d'uma grande abundância de muco cinzento, viscoso e adhérente que lubrifica a mucosa, mas também a alteração d'esta, que apresenta uma côr vermelha escura, e uma su­perficie irregular, mamillosa, coberta de nu­merosos pontos transparentes, que o micros­cópio demonstra serem glândulas dilatadas por um muco transparente. Alem d'isso encon-tra-se uma espessura considerável das pare-

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des do estômago, na qual tomam parte, e muito principalmente, a mucosa e o tecido conjunctive sub-mucoso e alé mesmo a tunica muscular, entre cujas fibras se inflammou o tecido cellular interposto (falsa hypertrophia muscular).

Nos casos d'obstaculo no pyloro, ou nos intestinos, a dilatação do estômago será acom­panhada das lesões do dito obstáculo. Umas vezes será o estreitamento do pyloro espas­módico, provocado por catarrho local, ou por erosões irritáveis (Kussmaul); outras vezes será o estreitamento mechanico, devido a uma cicatriz consecutiva a uma ulcera simples, — perfurante ou syphilitica (v. obs. 5 e 6) já cu­rada,— ou devido a um tumor canceroso (obs. 4), que é o mais frequente, ou a um tumor d'outra natureza como sarcoma, tumor ósseo, tumor cartilagineo com incrustações calcareas (obs. de J. Webster), flbro-myoma (obs. de Cornil), tumor syphilitico (obs. de Virchow, de Leudet, de Lancereaux, Galliard e principal­mente de Cornil, com autopsia), ou corpos es­tranhos (conchas de gryphea cymbrium). O que nos interessa n'estes casos é estabelecer que a principal lesão histológica, que acompa­nha a dilatação, é uma hypertrophia considerá­vel das tunicas do estômago, e muito especial­mente da tunica muscular, hypertrophia com­pensadora como acima indicamos já.

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N'este estado a hypertrophia da tunica muscular é devida a excesso de trabalho. Ora desde que Foerster demonstrou o augmenta de volume dos feixes primitivos das fibras musculares na hypertrophia do coração por obstáculo d'orificio, devemos admittir que no estômago se passa o mesmo em iguaes cir­cunstancias.

Assim pois,e em resumo, na dilatação gás­trica por causa dynarnica parece haver atrophia da tunica muscular, que provavelmente é de­vida a uma atrophia dos feixes primitivos de fibras musculares, consecutiva á pobresa de nutrição ou á falta de exercício, por ausência do influxo nervoso. Outra espécie de atrophia muscular das paredes estomacaes poderá apre-sentar-se também, a que é devida a um enve­nenamento pelo phosphoro, pelo arsénico ou a uma febre infecciosa, ou á visinhança d'urna lesão orgânica. Na dilatação por causa mecha-nica ha hypertrophia, que nos casos de gastri­te chronica é a pseudo-hypertrophia por in-flammação do tecido cellular interposto entre os feixes primitivos de fibras musculares; e nos casos d'obstaculo pylorico é uma verda-dadeira hypertrophia por engrossamento dos mesmos, consecutivo a um excesso de traba­lho compensador.

Symptomas—Antes de nos occuparmos dos

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symptomas da dilatação, digamos alguma cou­sa da distensão, que continuaremos a distinguir da primeira.

A distensão estomacal, quer seja aguda, quer seja sub-aguda ou mesma chronica (pois estas duas ultimas formas assim se chamam, por que se repetem a cada refeição) é o resul­tado do desenvolvimento de gazes n'uma di­gestão viciosa. A distensão manifesta-se por uma considerável ampliação da base do tho­rax, que é um puro tympanismo sub-costal, que em muitos casos obriga a afrouxar a rou­pa durante a digestão, e por eructações abun­dantes. A distensão não só é acompanhada de flatulência considerável, mas também de do­res espasmódicas gástricas, e de regurgitações que se apresentam ao mesmo tempo que os arrotos, e são promovidas por estes. Na dis­tensão estomacal ha sempre aperto de ventre; e o que mais caractérisa este estado, são os signaes de bradypepsia que desapparecem com a conclusão da digestão. A distensão gástrica é geralmente um phenomeno de atonia da tu­nica muscular, complicado de digestões imper­feitas. Como complemento diremos que na simples distensão gástrica, uma vez concluída a digestão, que é sempre longa, desapparecem os signaes physicos da dilatação : faltam o ruido de marulho e o tympanismo umbilical

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{ou infra-abdominal), que são constantes no estômago dilatado, mesmo em jejum.

Na dilatação do estômago todos, ou quasi todos os doentes, se queixam de gastralgia, de pyrosis, de antigas dyspepsias e mais que tudo de antigas bradypepsias acompanhadas do mau estar, que lhes é próprio, e das palpitações que tanto assustam os enfermos, e tão frequente­mente se repetem.

A dor falta geralmente na dilatação do es­tômago (obs. 2,15, 16,19, 21); mas ainda assim encontra-se com frequência a dor de cintura, extendendo-se ao vachis, e a dor das costellas. N'uns doentes a dor limita-se á região pylori-ca, n'outros ao epigastro, e n'um e n'outro caso é provavelmente devida, quando não existe tu­mor neoplasico, á acção de retesamento, que exerce o peso do ventriculo nos pontos da sua suspensão,—no cardia, no pyloro, e mesmo no epiploon gastro-hepatico.

Se na verdade os symptomas de bradype-psia e de dyspepsia são communs na dilatação do estômago, e os primeiros que na maioria dos casos se apresentam, não é nada raro ver doen­tes soffrendo de dilatação considerável do ven­triculo, que desconhecem absolutamente a sua moléstia, a qual passa tão despercebida para elles, como para muitos dos nossos collegas não prevenidos pela frequência d'esta doença. Não ha duvida alguma que na dilatação do es-

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tomago o vomito abundante, tardio, muitas ve­zes por alta noute ou de madrugada, espontâ­neo, ou provocado pela anciã e mau estar, ê o primeiro symptoma positivo e seguro, princi­palmente quando é symptoma teimoso, e quan­do os doentes lançam liquido abundante e pi-tuitoso, e em maior quantidade do que hão to­mado (obs. 45 e 25).

Os líquidos vomitados são umas vezes aquo­sos, e outras d'alimentos. Segundo o grau de di­latação varia a quantidade de liquido, que ás vezes chega a ser enorme. O liquido vomitado contem alimentos mais ou menos antigos e recentes, digeridos e meio digeridos (cuja natu­reza é fácil de reconhecer á simples vista ou ao microscópio), —mucosidades, — sporos ou sporidios semelhantes ás cellulas do fermento da cerveja, e sarcinas. Sem duvida estes ele­mentos de levadura são os que determinam a fermentação viciosa dos alimentos novamente ingeridos.

Em muitas dilatações não existem os vó­mitos tão pronunciados ; mas os arrotos e as regurgitações de liquidos ácidos ou pútridos se substituem a um ou outro vomito.

Quando os vómitos são repetidos, uma com­plicação se offerece ás vezes, que é a tetania das extremidades, e mesmo as convulsões.

Para nós, n'este caso, não é um pheno-meno reflexo, nem um phenomeno d'intoxica-

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cão; mas sim, como pensa Kussmaul, um phe-nomeno d'anemia dos centros nervosos, causa­do p'ela deshydratação do sangue. A prova é que a tetania só occorre depois de vómitos ex­tremamente frequentes, e abundantes, e que ella é algumas vezes precedida de lypothymia, sobretudo quando os doentes estão em pé, ou andando. Esta explicação parece corroborada pela existência da tetania nas amas de leite, depois d'uma longa amamentação, quando ellas se acham excessivamente debilitadas.

Marcha — É quasi sempre chronica desde o principio, por isso que o regimen, parte es­sencial do tratamento, torna-se de muito difflcil acceitação para os doentes. Esta doença, quan­do isenta de complicação, prolonga-se frequen­temente muitíssimo; a observação, N.° 15, mos­tra um exemplo de duração por dezeseis an-nos. A chronicidade é portanto a regra, a não ser que a causa da doença seja um estreita­mento neoplasico do pyloro.

Como o desenvolvimento da dilatação es­tomacal é muito insidioso nos dous terços dos casos, comprehende-se quanto a ausência dos symptomas seja inconveniente para o diagnos­tico e prognostico.

Complicações — A dilatação apparece fre­quentemente como complicação d'outras mo-

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lestias ; mas n'um terço dos casos constitue por si a moléstia principal. A dilatação é a conse­quência umas vezes da boulimia, ou da inflam-mação mais ou menos extensa da mucosa gás­trica por alcoolismo etc.; outras vezes da ulcera simples, ou de neoplasmas. De qualquer modo que seja, haja ou não estreitamento do pyloro, a constipação do ventre constitue uma compli­cação seria da doença.

Convém não dissimular que as névroses do estômago são também uma causa, e com­plicação séria, e frequente, da ectasia gástrica. Assim ha névroses por diminuição da força motriz no merycismo, na distensão gazosa in­termittente por formação d'acido carbónico, e na gastroplegia ; — por augrnento da força mo­triz no espasmo do cardia (como durante a passagem da sonda œsophagiana), no espasmo do pyloro, no gastro-espasmo, na agitação pe-ristaltica (peristaltiche Unruhe) de Kussmaul, e nos vómitos nervosos. Quanto ás névroses por sensibilidade do estômago na dilatação, são raras, com excepção da fome canina (que con­duz á boulimia), da sensação de desfalecimen­to, da hypersthesia com sensação de peso e da nevralgia coeliaca (Romberg e Opolzer); mas estas mesmas encontram-se principal­mente em casos de hysteria. Ha também, como complicação da dilatação do estômago, as névroses de origem secretória, as quaes pro-

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duzem a dyspepsia com catarrhe- e com pro-ductos digestivos anormaes (ambos irritantes da mucosa gástrica) ; e é indubitável que ha igualmente névroses vaso-motoras, como se prova pela gastrorrhagia de compensação, sup­plemental' das regras. Outras complicações convém citar: a sarcina ventriculi, as larvas de œestres (vivas ou mortas), as ascarides e mesmo hydatides, os polypos mucosos, os tu­mores cancerosos, sarcomas, gliomas, a con­gestão do fígado (com ectopia renal ás vezes, Bouchard), as exagerações, irregularidades e intermittencias das palpitações do coração, in­dubitavelmente por acção reflexa, e mesmo os accessos de angina pectoris e de asthma.

Bouchard, que referiu esta ultima compli­cação, admitte igualmente que, por transtornos da nutrição geral consecutivos á dilatação, se desenvolvem frequentemente rheumatismos, e que as nodosidades das articulações da se­gunda phalange dos dedos das mãos mesmo com desvio dos dedos, acompanham certa­mente a dilatação estomacal.

Também admitte este sábio, que na dilata­ção do ventrículo existe uma forma consumpti­va (aguda ou chronica), que simula a febre nervosa dos antigos e a tuberculose em poten­cia, etc.

Já se vê quanto é importante o diagnostico

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d'um estado pathologico tão complicado como silencioso.

Diagnostico — Em geral a dilatação gástrica passa despercebida, e não se apresenta com perturbações gástricas, nem outras manifesta­ções mórbidas bem claras. São os signaes physicos que têm aqui a maior importância, e, por terem passado ignorados até Duplay Se­nior, é que succedeu varias vezes confundir-se esta moléstia com a prenhez, e mesmo com a ascite. N'um caso de supposta ascite a para­centèse foi praticada, segundo conta Chaus-sier, e o doente succumbiu.

A percussão e o ruido de marulho são os dous signaes physicos capitães, e por assim di­zer d'um valor absoluto. A percussão praticada na posição declive do estômago, isto ó do pu­bis para o thorax, e do tórax, (quintas costel-las) para o pubis, dá um som baço, significati­vo da presença de líquidos ou d'alimentos no estômago. Se a grande curvatura se acha abai­xo do embigo num doente em jejum, a dilata­ção é evidente. Muitas vezes, para encontrar o limite inferior do estômago por meio da per­cussão é indispensável fazer beber ao doente um copo d'agua.

A mesma precaução se necessita frequen­temente para descobrir o ruido de marulho; e se este se produz em jejum no meio d'uma li­nha, que parta do embigo até o bordo dasulti-

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mas costellas esquerdas, um tal signal tem im­portante valor pathognomonic (Bouchard).

A percussão e o ruido de marulho ajudam-se mutuamente para a determinação d'esté dia­gnostico.

Dissemos que nos dous terços dos casos de dilatação estomacal, ha muitas complicações que seria da maxima importância poder reco­nhecer, pois d'ellas depende o prognostico. São d'isto exemplo as moléstias orgânicas do estô­mago, cuja gravidade a ninguém se occulta; porem não nos permitte o tempo apreciar lar­gamente esse assumpto. Bastará dizer que na simples dilatação estomacal não se descobre tumor na cavidade abdominal, nem se vêem vó­mitos de sangue puro ou de sangue alterado, nem dores abdominaes, nem cachexia, tudo symptomas de grande importância no diagnos­tico das lesões gástricas néoplasicas, etc. E, sem embargo, convém ter sempre presente que o diagnostico é geralmente difficil, e algumas vezes impossível, como o confessam os mais celebres clinicos, taes como Potain, Knssmaul etc., os quaes, mais d'uma vez têm vindo ho­nestamente referir erros bem desculpáveis pela obscuridade dos symptomas d'esses casos.

Prognostico — Variável segundo a duração da moléstia, não deixa de ser geralmente serio pela demora do tratamento e pela facilidade

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das recatadas. Com effeito os doentes poucas vezes são bastante tenazes para submetter-se ao regimen alimentício conveniente, sem o qual não é possível curarem-se. Se a dilatação é o resultado d'uma lesão orgânica do pyloro, ou se se acha complicada d'algum neoplasma, é evidente que a sua gravidade está na propor­ção dessa complicação ; mas se fôr simples, a vida dos doentes pode prolongar-se quasi inde­finidamente (obs. 6 — 15 — 21). Algumas vezes morrem d'inaniçao, ou de moléstia intercurren­te. Não occultemos comtudo que em casos ex-cepcionaes, e por descuidos dos doentes, os vómitos se repetem com uma tal frequência que a emaciação, e debilidade se accentuam rapidamente, e que os accidentes de tetania se declaram com força, sobrevindo a morte com inesperada promptidão.

Tratamento — Desde que o diagnostico da dilatação gástrica se faz com facilidade,—desde que Kussmaul estabeleceu a lavagem do estô­mago,— emfim, desde, que este processo se aperfeiçoou, o tratamento das moléstias do es­tômago tem feito grandes progressos.

A principal indicação é a evacuação dos re­síduos d'alimentos ou líquidos estagnados ; ora esta evacuação faz-se normalmente pelo pyloro, e d'um modo anormal pelo cardia; porém na dilatação estomacal o primeiro modo é difficil,

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e o segundo incommode». Não obstante, é indis­pensável diminuirás causas da estagnação para combater a ectasia. D'aqui dimanam três indi­cações principaes :

1.° favorecer a digestão estomacal; 2.° facilitar a passagem dos alimentos pelo

orifício do pyloro, estimulando as contracções do ventrículo.

3.° evacuar pelo cardia, quando necessá­rio, os resíduos d'alimentos ou líquidos altera­dos.

I. Para favorecer a digestão estomacal o regimen alimentício conveniente é o primeiro e mais poderoso meio, e sem elle todos os ou­tros são mais que insufficientes. Não é meu propósito entrar em minúcias acerca dos dif­férentes alimentos que convêm, e limitar-me-hei a fallar do mais efficaz de todos, ao qual quasi todas as moléstias do ventrículo obede­cem ; já se entende que trato do leite, o ali­mento mais completo que se conhece.

Antes d'isso deve-se considerar o horário para os alimentos, horário que desde o prin­cipio deve ficar perfeitamente estabelecido, fi-xando-se horas certas e regulares para os repas­tos. Assim pois, e d'um modo geral, se deverá determinar que o doente coma a horas regu­lares e a eguaes distancias.

No regimen lácteo exclusivo, que é o que melhor se supporta, o doente toma uma grande

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taça de leite de duas em duas horas, ou de três em três, segundo a facilidade com que o digere. O leite toma-se morno ou frio, com agua de Vichy ou agua de cal, segundo a suscepti­bilidade do órgão digestivo. O leite deverá ser de vacca por ser o mais alimentício, e ser fres­co, isto é, recentemente ordenhado, principal­mente no verão, por causa da facilidade com que se azeda. Se o doente toma bastante leite, uns três litros por dia, as suas forças não só não diminuem, mas augmentam com o peso do corpo. Muitas vezes succède que os vómitos são incessantes, e então pequenos pedaços de gelo ajudam a combater a nausea e o mesmo vomito. Poucas são as pessoas que se submet-tem de bom grado a este único alimento du­rante semanas e mezes ; mas a maior parte das vezes a auctoridade do medico, que comprehen-de toda a importância do regime lácteo exclusi­vo, basta para vencer as repugnancias mais pronunciadas.

Depois de muito tempo, d'alguns dias ou semanas, o medico poderá afrouxar o rigor d'esté regimen, permittindo uma farinha ligeira no leite por uma só vez ao dia ; mais tarde con­cedendo ovos frescos quentes, e mesmo pós de carne, ou carne de gallinha; mas estas con­cessões deverão fazer-se pouco a pouco, e só n'uma das comidas da manhã, e depois tam­bém n'alguma da tarde ; continuando-se sem-

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pre o leite em quantidade sufficiente, não só para alimentar e sustentar as forças do doente, mas igualmente para fazer augmentai' o seu peso. Mais tarde poder-se-ha entrar gradual­mente n'um regimen variado, sempre simples, com prohibição absoluta de bebidas alcoólicas por muitos annos, assim como de toda a espécie de estimulantes, vinho, café, etc., e também de alimentos geralmente considerados indigestos, legumes e toda a espécie de acipipes, de mo­lhos, etc. O regimen lácteo torna-se tanto mais indispensável, quanto a dilatação é acompa­nhada de gastrite aguda ou chronica, ou d'al-guma lesão estomacal.

Este regimen ás vezes não basta, e o tra­tamento reclama a lavagem mais ou menos frequente do estômago, por isso que a dilatação, sendo considerável, ha estagnação, e fermen­tação de resíduos alimentícios.

Ás vezes a dilatação é de tal modo grande, e a flaccidez das paredes gástricas tão irreme­diável, que convém então, para allivio do doen­te, recorrer ao regimen secco, o qual se propor­ciona varias vezes ao dia, acompanhado d'um pouco de descanço (duas ou três horas) na po­sição horisontal, depois dos repastos. Este me-thodo, do Dr. Leube de Wurzburgo, não só é perfeitamente tolerado, mas dá com frequên­cia uma grande melhora.

O regimen secco é precedido todas as ma-3

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nhãs da lavagem do estômago em jejum, quan­do o estado do órgão o reclama. A privação de líquidos não é completa, mas esses, somente se tomam a grande distancia das comidas, e em muito pequena quantidade (v. obs. n.° 15).

II. Quando não existe uma lesão do pyloro, a segunda indicação é mais fácil de'preencher, pois os laxantes taes como o aloes, os grãos de saúde de Franck, a magnesia e os seus saes, as aguas mineraes laxantes, provocam dejec­ções intestinaes, que excitam os movimentos peristalticos do ventrículo, e favorecem a pas­sagem dos alimentos do estômago para o duo­deno. Do mesmo modo as lavagens do colon, e as mesinhas purgantes favorecem a evacuação do estômago, combatendo a constipação do ventre, que é tão tenaz na ectasia gástrica.

O exercício corporal e a marcha, em que muito insistia Chomel, não só facilitam a diges­tão activando todas as funcções de nutrição, mas favorecem as contracções peristalticas es-tomacaes, e contribuem facilmente, como bem se comprehende, para esvasiar o estômago pela via natural.

III. A evacuação do estômago pelo cardia pôde effeituar-se de vários modos, por simples compressão do abdomen, o que é um meio sempre insufficiente ; —por vómitos naturaes ou provocados,—ou emfim pelo tubo e bom­ba estomacaes (meio hoje abandonado), ou pelo

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siphão de Faucher ou de Debove, meio facil, efficaz e innocente! E' com este ultimo ins­trumento que se pratica ao mesmo tempo a la­vagem do estômago.

Dissemos que o siphão é meio innocente; mas deve ser empregado com cuidado, pois no caso de lesão orgânica do esophago, ou do mesmo ventrículo, este instrumento acha-se contra-indicado, pelo receio de causar alguma ruptura.

O siphão emprega-se com preferencia em jejum, e diariamente, em quanto a agua da la­vagem, que se extrahe do estômago, traz com-sigo mucosidades ou pelliculas esbranquiçadas; e nunca se deve empregar muita agua a um tempo, um quarto de litro pouco mais ou me­nos, para não augmentai- a dilatação. Uma pe­quena quantidade de agua, repetida varias ve­zes seguidas, produz uma excellente lavagem. No fim de cada lavagem deixa-se no estômago uma egual quantidade de solução ligeira de bicarbonato de soda, ou d'agua de Vichy.

Até agora a quantidade de agua emprega-em cada lavagem era considerável, um litro de cada vez, mas havendo-se provado que essa exageração era prejudicial ao órgão dila­tado, hoje o professor Bouchard só introduz 250 grammas, que é suficiente, por cada vez.

Não pretendemos entrar nas minúcias do modus faciendi, visto achar se este descripto

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por todos, e ser tão fácil, sempre que o opera­dor seja prudente e paciente.

No caso de residuos putrefactos, uma la­vagem ligeiramente anti-septica com salicylate de soda está perfeitamente indicada, principal­mente se coexiste a indigose urinaria, sympto-ma de infeçâo da economia.

A dilatação gástrica pode-se combater tam­bém pela compressão do abdomen, por meio d'uma cintura elástica (meio adjuvante), da mas­sagem methodica das paredes abdominaes, ou da electricidade, como a pratica Boudet de Paris para a occlusão intestinal ; mas todos es­tes recursos deverão servir para ajudar o trata­mento, cuja base é o regime e a lavagem do estômago. Bem entendido que todos os meios, que havemos citado, achur-se-hão ainda me­lhor indicados no caso de coexistência de di­latação do colon, que, como pretende o Doutor E. Trastour é frequente.

Durante o tratamento, a residência no campo, tanto para obter ó bom leite, como o ar puro e a tranquilidade de espirito, é ne­cessária a uma cura tão difflcil como longa.

Observações:—Os doentes cujas historias pu­blicamos em seguida foram por nós observa­dos em Paris, tanto no hospital Beaujon, como na nossa clinica particular:

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Obs. I. —Dilatação gástrica.—A. S. mulher 24 annos—19 Janeiro 1884—vida caseira—soffre lia 2 annos e meio—os vómitos principiaram com um sus­to. — Grande emagrecimento. — Os vómitos occor-rem geralmente uma semana antes, e uma semana de­pois das regras.— Encontramos uma dilatação consi­derável do estômago com ruido de marulho.— Ne­nhuma outra moléstia.—Regimen lácteo, e restabele­cimento 15 dias depois.

Obs. 2.—Dilatação gástrica e Gastrite alcoólica— A. Gr. homem—52 annos—6 Junho 1884. Excessos al­coólicos, e dyspepsia pronunciada ha 5 annos, acom­panhada de pituita pelas manhãs, raras vezes de re­gurgitações de matérias alimentares, quasi sempre de constipação do ventre. Allivio durante o tratamento lácteo instituído pelo doutor Proust. Recahida em consequência de novos abusos alcoólicos, e trata­mento pelo doutor Audouit até a semana passada, por meio da lavagem do estômago e do regimen lác­teo ; mas com irregularidade.

N'esta data de 6 de Junho : pallidez e emaciação geral—inappetencia, mas sem repugnância para a carne—vómitos de todos os alimentos, excepto do leite, os quaes se produzem muito tempo depois de comer ; ás vezes vómitos de pituita, mas jamais de san­gue. Sensação do peso na bocca do estômago depois de comer, mas nenhuma dor. — Constipação de ven­tre constante. Nenhum cedema—nem albumina na urina. — Nenhum tumor abdominal. — Sonoridade do

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estômago muito extensa com ruido de marulho pro­vocado pelo abalo ou sacudimento do abdomen. Peso 51 kilogrammas. Eegimen lácteo.

25 Junho. Melhoras. Peso 56 kilogrammas. 7 Julho. Menos fraqueza, face rosada, resultado

muito satisfactorio só com o regimen lácteo. 9 Julho. Peso 60 kilogramas. 22 Agosto. O doente encontra-se restabelecido, e

torna a reassumir as suas occupações activas.

Obs. 3.—Dilatação do estômago e ataxia locomo-tris—L. (F). homem-48 annos—20 Junho 1884. Al­guns excessos alcoólicos, — e de fumar, — cancros phagedenicos ha dez annos, sem accidentes secundá­rios. — A moléstia actual principiou ha um anno por uma dor no epigastrio, do lado esquerdo, que se repe­tia, como uma crise, frequentemente seguida de vó­mitos biliosos e de pituita, e não produzia dificul­dade notável na respiração. Appetite normal. Du­rante os mezes de septembro e de outubro o regimen lácteo, a que o doente esteve submettido, em nada o alliviou. Desde outubro as dores repetem-se geral­mente cinco vezes por dia, estendem-se por todo o ventre até o hypochondrio esquerdo, e não offerecem relação alguma com as comidas. Nunca houve vómi­tos de alimentos, nem de sangue. As dores acalmam-se com as injecções hypodermicas de morphina. — Constipação de ventre persistente. Emmagrecimento e perda de forças mui notáveis. Nenhum tumor abdo­minal, mas dilatação do estômago, e ruido forte de

/

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marulho — Tratamento : Chloral — morphina — Bou­

ches frias, e regimen lácteo mitigado. A 3 de Julho o doente principia a sahir um pouco

melhorado, mas não pode occupar­se ainda no seu es­

criptorio. Ketirou­se de Paris.

Obs. 4. — Carcionoma pylorico. — Gr. T. homem — 58 annos — 23 Dezembro 1884. Trabalhador, sem antecedentes hereditários. Ha 2 mezes vómitos de tudo quanto coroe. Emmagrecimento extraordinário. Más digestões de um anno a esta parte. Arrotos in­

sípidos e inodoros. Nunca houve hematemesis, nem melœna. Constipação de ventre. Os pés não incham. Dilatação do estômago. Regimen lácteo.

24 Dezembro —descobre­se claramente um pe­

queno caroço endurecido perto do pyloro. Peso 55 kilogrammas. 10 Fevereiro 1885. (Edema das pernas, e das

«oxas. Um pouco de diarrhea. 11 Uma pequena nuvem d'albumina na urina. Peso 75 kilogrammas. 20 Março. O doente acha­se um pouco melhor.

Obs. 5. — Ulcera estomacal. — A. B. homem — 49 annos, — lavrador, — 16 Março 1885. Soffre do estômago ha dez annos, e teve, ha três, um ataque como o presente, o do qual se curou. Nada de alcoolis­

mo. Na segunda semana de janeiro ultimo vómitos ■escuros, como borra de café, sem dores epigastricas.

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Constipação de ventre. Emmagrecimento, que hoje é extremo. Agora o doente queixa se de dores vivas no epigastrio, que sobrevem principalmente depois da entrada dos alimentos no estômago, e que se acalmam com os vómitos. Dores que se transmittem ás apophyses espinhaes das ultimas vertebras dor-saes. Inappetencia absoluta. Nenhum tumor sensivel no epigastrio, nenhum ruido de marulho. Eegimen lácteo, e pílulas d'opio.

24 Março. Vomito pouco abundante, côr do páo do acaju, mezinha purgante, neve, leite frio, 2 pílulas d'opio 0,05 centigram.

26 Dores violentissimas, lingua branca secca, constipação de ventre rebelde.

2 Abril. Tosse, espectoração muco-purulenta, res­piração difficil na parte posterior do ápice do pul­mão esquerdo, e som obscuro.

28 (Edema dos membros inferiores e superiores. Erysipela do lado externo da coxa, e da anca di­reitas.

4 Maio. No mesmo sitio vasta collecção de pus, que é aberta nos dois pontos extremos, nos quaes se passa um «drain». Emaciação extraordinária, ma­rasmo. Face amarellenta.

13 morte. ' , 14 Autopsia. Ulcera no pyloro cicatrisada em

parte: nenhum estreitamento d'esta passagem, nenhu­ma dilatação notável do estômago. Nenhuns tubércu­los pulmonares.

M

Obs. 6. — Syphilis, Gastrite chronica ulcerosa,; e dilatação do estômago. — D. L. homem, 45 annos, trabalhador, entrou no hospital Beaujon a 6 d'abril 1885, enfermaria de S. Luiz K ° 10.

Blenorrhàgia aos 23 annos. Rheumatismo por 3 vezes. Syphilis em 1867, sendo militar, aos 29 annos de idade. N'esta epocha cancro duro tratado no hospital S. Martin pelo iodeto de potássio durante dous mezea, sem nenhum mercúrio, crê o doente. Seis semanas depois, erupção nas palmas das mãos, e padecimento de garganta, accidentes combatidos com vantagem durante sete semanas pelo iodeto de potássio e por banhos de sublimado. Em 1867 re­gresso do doente apparentemente curado, á ilha de Córsega, sua pátria.

Em 1869 o doente casa-se, e no fim do mesmo anno, apparecem-lhe ulcerações nas pernas. Foi tra­tado pelo iodeto de potássio e banhos sulphurosos durante seis mezes, sem padecer a menor dor no es­tômago, e conseguindo a cicatrisação das feridas das pernas um anno depois.

Em 1873, principio dos padecimentos do estô­mago n'uma epocha, em que o doente trabalhava de dia e de noute, como guarda d'uma fabrica do refi­nação de assucar. Durante seis semanas dores e caimbras no estômago, nauseas, e repentinamente, no fim d'esté praso, vómitos de sangue coalhado, abundantes, que abrandaram pelo uso da neve e do leite (sem mercúrio nem iodeto).

Em Agosto, 1875, dores violentas na bocca do

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estômago e nas costas, combatidas por sanguesugas, laxantes e carvão (sem mercúrio nem iodeto).

Em Janeiro 1876 novos ataques gastralgicos pe­nosos, vómitos alimentarios, combatidos por um ve­sicatório, e regimen lácteo com agua de Vichy (ne­nhum iodeto), e seguidos duma longa convalescença. No mez de Abril, melhoras consideráveis; o doente passou a trabalhar numa imprensa.

Durante o verão de 1882 outra vez botões, n'uma das pernas, contra os quaes o primeiro medico, que assistiu á syphilis, ignorando a gastralgia, pres­creveu durante um mez uma pomada e o iodeto, que provocou dores no estômago.

Em Outubro deste mesmo anno tornou a appa-recer a dyspepsia e a gastralgia, que foram combati­das pelo leite, agua de Vais e laxantes.

Em Março de 1883, novo accesso de gastralgia, e vómitos alimentares sem sangue. Melhorou pela agua de Vais e leite.

Na primavera de 1884 botdes na perna direita, para os quaes aquelle medico prescreveu uma pomada e o iodeto internamente, o qual exasperou a gas­tralgia. Pouco depois, em Novembro, as perturbações gástricas reappareceram, e logo novos botões nas per­nas. Iodeto somente poucos dias porque o doente não o pôde supportar, e a mesma pomada.

A 22 de Dezembro de 1884, o doente veio á con­sulta do hospital Beaujon, queixando-se de gastralgia ;

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e assim continuou soffrendo até á sua entrada defini­tiva que teve logar a 6 d'abril de 1885.

Ha symptomas manifestos de syphilis : antigas e numerosas cicatrizes nas pernas, na face interna e in­ferior da tibia esquerda, periostosis e tumores gommo-sos ; no peito e no abdomen placas extensas de syphi-lide pustulo crustácea, algumas das quaes estão ainda muito vermelhas, vinosas e salientes ; emfim glossite sclérosa superficial, que se estende ao órgão inteiro.

O estado geral não é mau, não obstante as do­res estomacaes que não lhe permittem fácil alimenta­ção. Os soffrimentos sobreveem, umas vezes depois da comida, e são então alliviados pelo vomito dos alimen­tos, outras vezes por accessos caprichosos independen­tes das funeções digestivas. Estes soffrimentos são pro­vocados pela pressão epigastrica, e existe um ponto dorsal doloroso. O estômago acha-se enormemente di­latado, pois o seu limite inferior desce dous dedos abaixo do embigo.

O doente só supporta o leite. Constipação do ven­tre, e urina clara sem albumina.

O figado está normal. Nunca houve cólicas he­páticas nem icterícia.

Não obstante um pequeno tumor do tamanho d'uma castanha na borda externa do musculo recto o Dr. Millard, que examinou e assistiu o doente, não admitte que haja carcinoma do pyloro, e hesita uni­camente entre dous diagnósticos : syphilis do estôma­go, ou gastrite chronica ulcerosa.

N'esta ideia prescreveu o regimen lácteo com l

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gramma de magnesia, e uma pillula thebaica de 0,05 centig. pela noute.

A 8 d'Abril institue tratamento especifico : fri­cções de 5 grammas de unguento napolitano, e inter­namente um gramma d'iodeto de potássio.

A 15 d'Abril, 2 grammas d'iodeto de potássio, mas no dia seguinte o tratamento é supprimido, por­que provoca crises dolorosas. Continua-se o regimen lácteo, e a magnesia. A lavagem do estômago, que se praticou duas vezes, foi mal tolerada.

18 d'Abril. Melhoras e augmento de peso. 8 Maio. Partiu para Vincennes, n'uni estado bas­

tante satisfatório. A 20 de Junho. D. L. submetteu-se de novo ás

lavagens do estômago, continuando sempre o regime lácteo (leite seis vezes ao dia, pão duas), tapioca em leite uma vez, e queijo fresco.

25, vómitos raríssimas vezes, e continuação do mesmo tratamento.

30 a lavagem do estômago ainda rejeita um li­quido um pouco turvo.

1 Setembro. Suspensão das lavageus aconselhada pelo Dr. Tapret, e continuação do mesmo regimen.

3 Setembro. Ao regimen lácteo agrega-se pós de carne pela manhã cedo uma vez ao dia.

5 Setembro. Pós de carne duas vezes ao dia (ás 6 h. a. m. e ás 4 h. p. m.)

8 Setembro. Desde antes do hontem permitte-se ao doente um pouco de carne assada, uma vez ao dia, ou uma sopa de leito com arroz.

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10 Setembro. Não se repetiram os vómitos, mas a constipação de ventre persiste, pois só ha dejecções de 3 em 3 dias com mesinhas de glycerina e agua.

15 Setembro. Melhora, e partida para o campo. O ruido de marulho continua, e o estômago desce ain­da dous centímetros abaixo do embigo. Os tumores gommosos da perna direita estão em via de cicatrisa-ção, e a lingua acha-se muito melhor.

28 Setembro. O doente começa a vomitar de novo, mas graças a duas lavagens do estômago, com dois dias de intervallo, e ao regimen lácteo, pão secco, melhora rapidamente.

A 20 Outubro. As melhoras sustentam-se com o mesmo regimen.

Obs. 7.— Dilatação do estômago e gastrite chro­nica.— Q. (D.) Homem — 60 annos — militar — 13 Maio 1885. Nem syphilis nem alcoolismo. Ha um anno gastralgia repentina e vómitos pituitosos que sobrevi-nham uma hora depois das comidas.

Nunca vómitos sanguíneos, nem melcena. Depois de 2 mezes de regimen lácteo absoluto o

doente curou-se. Em Setembro ultimo principiam as más digestões com peso no estômago, e um mez depois vómitos somente pituitosos. Sufficiente appetite, mas grande emagrecimento e perda de forças. Nenhum tu­mor no epigastrio, mas todos os signaes d'uma dilata­ção considerável do estômago, com ruido de glou glou.

14 Maio. Regimen lácteo. Lavagem de estômago e continuação do leite.

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16 Maio. Pepsina. 2 grammas. 19 Maio. Vomito do leite e o siphão não é sup-

portado por causa do esophagismo perto do cardia. 26 Maio. Perdemos o doente de vista.

Obs. 8. — Dilatação gástrica.— L. (S.) homem —-32 annos — trabalhador—22 Junho 1885. Exces­sos alcoólicos. Ha seis mezes dores epigastricas, arro­tos ácidos, vómitos pituitosos e alimentarios uma hora depois da comida. D'um mez a esta parte emagreci­mento com grande peiora da moléstia. Jamais henia-temesis, nem melœna. A dilatação do estômago é bas­tante pronunciada, com ruido de glou glou.

23 Junho. Lavagem do estômago uma só vez e regimen lácteo.

0 doente não voltou.

Obs. 9.— Dilatação do estômago.— A. (R.) Ho­mem — 50 annos — commerciante — 29 Junho 1885. Alcoolismo. Gastrites ha dous annos, curada. Novos excessos alcoólicos. Ha dois mezes princiaram as di­gestões difficeis e dolorosas. Os vómitos alimentarios e pituitosos repetem-se ha poucos dias, depois das co­midas. Nada de hematemesis, nem melœna. Dôr no estômago, mas nenhum tumor. Dilatação gástrica com ruido de glou glou. (Edema nas pernas sem albumina nas urinas. Peso 66 kilogrammas.

30 Junho. Regimen lácteo. 1 Julho. Lavagem do estômago duas vezes por

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dia. Continuação do leite. Pillula thebaica de 0,025 milligr.

7 Julho. O doente encontra-se melhor e pesa 68 kilos.

Obs. 10.— Dilatação estomacal.—G. — Homem — 46 annos —6 Julho 1885.

Dores no ventre e anus. Vómitos pituitosos e bi-liosos. Eepetidas vezes escarros de sangue, e agora mesmo sarridos no peito. Dilatação estomacal melho­rada em onze dias pelo regime lácteo somente.

Obs. 11.—Dilatação gástrica.—M. (R.), mu­lher — 27 annos — 20 de Julho de 1885. Ha um mez que a doente accusa dores de cabeça fortíssimas, inap-petencia e accessos de suffocação, aperto de ventre e sede intensa, pois a doente bebe 4 a 5 litros de li­quido por dia. Não se encontra vestígio de assucar na urina, mas sim todos os symptomas da dilatação do estômago.

Foi-lhe receitado um vomitivo, e, para a noute, 2 grammas de brometo de potássio.

26 Julho. Lingua ainda suja, e alguma dor de cabeça. Limonada de citrato do magnesia 50 gram.

28 Julho. Valerianato de quinina 0,30 centi-grammas.

1 Agosto. As dores de cabeça persistem, e pres-creveu-se-lho o iodeto de potássio.

3 Agosto. Melhoras das dores de cabeça. 10 Agosto. A doente encontra-se boa de todo.

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Obs. 12 .— Dilatação do estômago.—A. (D); homem — 23 annos — Caixeiro—10 d'Agosto 1885. Excessos alcoólicos, até em jejum muitas vezes. Tre­mor das mãos e da lingua. Pesadelos durante o so-mno. Ha seis mezes principiaram as nauseas, diges­tões lentas, azias, pyrosis. Ha cinco mezes hemateme-sis, o melsena abundantes. — Esta manhã palidez e grande debilidade depois d'uma nova hematemesis. Não ha tumor no epigastro, mas sim uma enorme di­latação do estômago, e uma dor correspondendo á 10." vertebra dorsal. Neve, leite e 10 gottas de per-chloreto de ferro.

12 Agosto. Suspenderam-se os vómitos. Prisão de ventre.

13 Agosto. Continuam as melhoras. 20 Agosto. Repetição do vomito de sangue de­

pois de comer um biscouto. Neve e perchloreto de ferro.

21 Agosto. Suppressão dos vómitos. 25 Agosto. Regimen lácteo absoluto, perfeita­

mente tolerado. 30 Agosto. Continuam as melhoras. 15 Setembro. Dous kilogrammas d'augmento de

peso. 17 Setembro. O bem estar continua, e o doente

já come bastante pão.

Obs. 13.—Dilatação gástrica e chlorose.—L. (8.), mulher — 23 annos—5 de Setembro 1885. Ha seis mezes a doente vomita quasi tudo quanto toma;

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vómitos sobrevindo três horas depois de comer ; acompanhados de dores no epigastro ; vertigens e palpitações quando anda. Nevralgia na queixada es­querda. Symptomas de dilatação considerável do es­tômago, e de chlorose.

Regimen lácteo e pílulas ferruginosas. A 30 de Setembro melhoras e a doente vae

para o campo.

Obs. 14.—Dilatação gástrica e cólicas hepáti­cas.— M. (R)—mulher — 25 annos — 6 Novembro 1885. Soffre do estômago ha annos. Suppressào das regras ha seis mezes, em consequência de um susto, e ao mesmo tempo forte dor no fígado, e ictericia. A dôr no fígado tem-se reproduzido frequentes ve­zes. Presentemente dôr constante na bocca do estô­mago, que em algumas occasiões se torna terebrante com pontos epigastricos e na espinha dorsal. Vómi­tos cor da borra do café (?) dizia a doente. Cutis côr de palha, terrosa. De quinze dias a esta parte nada pára no estômago, nem mesmo o leite, que a doente vomita duas horas depois de o tomar. Dilata­ção do estômago, que chega dous dedos abaixo do embigo.

Regimen lácteo, e banhos alcalinos. 9 Novembro. Lavagem do estômago, cuja agua

sahe bastante suja. 19 Douches frias. 29 Melhoras consideráveis e volta âs suas occu-

pações activas. i

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Obs. 15.— Dilatação estomacal. — A. S. G. —52 annos— banqueiro — 21 Novembro 1885. Grande ir­regularidade na alimentação, e abusos nas comidas, ha muitos annos. Desde 1870 que padece de desassocego depois das comidas, e de palpitações, incommodos en­tão attribuidos a uma moléstia do coração. N'algumas raras occasiões padecia de indigestões e vómitos. No verão do 1878, continuando a soffrer, consultou-me, e descobri uma dilatação enorme do estômago, que qua­si se estendia até o pubis e ás ilhargas, mas não en­contrei tumor algum no abdomen.

Melhorou com o regime lácteo. No inverno de 1879 recahiu em Madrid, mas d'esta vez os vómitos alimentarios eram frequentes. Passou de alli a Stras-burgo, aonde se achou bom com algumas lavagens do estômago feitas pelo Dr. Kussmaul, e com o regimen lácteo. Voltou depois a residir em Madrid, onde pas­sou bem até fins de 1884, quando uma ligeira reca-hida o obrigou a fazer umas lavagens do estômago, que elle mesmo praticava. No fim do verão de 1885 em Bagnères de Bigorre, principiou a soffrer de novo e quiz, mas não poude, fazer as lavagens por meio do siphão.

N'esta data de 21 de Novembro vimos o doente, de passagem em Paris para Strasburgo, o qual se achava n'um grande estado d'emaciaçao, vomitando todos os alimentos ; mas podemos assegurar-nos que nunca tinha tido hematemesis nem meloena, e que não havia suspeitas de tumor na bocca do estômago.

Prescrevemos-lhe as lavagens do estômago, o

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regime lácteo severo, e neve. Desde logo principiou a melhorar; mas em princípios d'esté anno alguns pe­

quenos desvios de regimen o obrigam a consultar de novo o Dr. Kussmaul. Este crê encontrar uma dure­

za no epigastrio, e suspeita por isso um neoplasma ; mas rapidamente abandonou essa ideia com o desap­

parecimento da dureza. Até fins de Maio d'este anno continuou a introduzir diariamente o siphão, e a lavar o estômago, e a tomar unicamente leite.

O allivio continua, não obstante algumas altas e baixas, a sua saúde consolida­se com as lavagens es­

tomacaes de dias a dias, e com uma dieta um pouco menos severa.

Nos fins de outubro nova recahida. G. foi tratar­

se com o Dr. Leube, em Wiirzburg, onde continua as lavagens diárias de estômago e um regimen, cuja se­

veridade de 15 dias a esta parte ha diminuído gra­

dualmente, pois o Dr. Leube não é partidário do regi­

men liquido absoluto, e gradua uma dieta secca muito ligeira ou «cost», segundo as forças digestivas dos seus doentes.

Por uma carta recebida nos fins de Novembro d'este anno sabemos que as melhoras progridem.

Obs. 16.— Dilatação do estômago.—J. B. S.— Trabalhador.— Entra a 23 Novembro 1885 no hos­

pital Beaujon. Antiga cardiopathia. (Edema dos mal­

leolus, e ligeira inchação da cara. Dores lombares e perturbação da vista. Atheroma arterial. Prolongação

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do primeiro ruido cardíaco na ponta, sem hypertro-phia.

25 Novembro. Dores lombares. Ventosas sar-jadas.

28 Novembro. Com maior attenção descobriu-se uma dilatação enorme do estômago, que desce abaixo do embigo dous dedos. O doente queixa-se de má. digestão, pyrosis, vómitos pituitosos todas as ma­nhãs. Jamais hematemesis, nem melœna. Regimen lácteo.

29 Novembro. Lavagem do estômago, e regimen lácteo.

30 Novembro. A lavagem traz uma grande quan­tidade de restos de alimentos c de mucosidades.

1 Dezembro. Mesmo tratamento. 10 Dezembro. Continuação da lavagem que se

pratica duas vezes ao dia. Augmento em peso 1:500 grammas.

3 Janeiro. As melhoras continuam.

Obs. 17.— Dilatação do estômago.— A. B.—-36 annos — abbade—-2 Dezembro 1885.

Ha annos que padece de más digestões, e ha seis mezes que vomita com frequência, quasi todos os dias, os seus alimentos, mas nunca sangue. Conserva as forças, assim como o appetite.

Nenhum tumor epignstrico, mas dôr antes de vo­mitar, o que geralmente succède pela noute.

Dilatação pronunciada do estômago. Regimen lucteo e lavagem do estômago.

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4 Dezembro. Hontem ensaiou diante de mim in­troduzir a sonda, mas não poude.

5 Dezembro. A sonda passou hoje perfeitamente, e por ella sahiu do estômago uma certa quantidade do liquido sujo, contendo matérias alimentícias.

7 Dezembro. Continuação da lavagem do estô­mago, que o doente pratica n'elle mesmo, o regimen lácteo absoluto.

9 Dezembro. O doente acha-se melhor. 18 Dezembro. Suspensão da lavagem estomacal. 26 Dezembro. Melhoras consideráveis. O doente

sente-se bom de todo. Regimen lácteo mitigado.

Obs. 18.— Dilatação do estômago.—P. (J.) ho­mem — 58 annos — mercador — 7 Dezembro 1885. Alcoolismo indubitável. Ha 4 mezes más digestões, vómitos alimentarios frequentes. Inappetencia e repu­gnância para a carne. A cutis não está amarellenta. Emmagrecimcnto considerável. Dilatação enorme do estômago com todos os seus symptomas. Figado vo­lumoso, sobresahindo de três dedos ao bordo das cos-tellas, e offerecendo uma superficie lisa. Nenhum tu­mor, mas dor espontânea na bocca do estômago. Re­gimen lácteo e pil. theb. 0,025 centigr.

9 Setembro. Desde que principiou o regimen lá­cteo não tornou a vomitar.

10 Setembro. Melhoras. 15 Setembro. Nenhuma dor, suppressao da pi-

lula.

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30 Setembro. Augmento em peso de 2 kilogram-mas.

Obs. 19.— Dilatação do estômago e jpleuresia.— A. (Gr.) homem — 31 annos—empregado n'um ca­minho de ferro — 12 Janeiro 1886. Excessos de meza, tanto em comida como em bebida. Desordens gástri­cos, e vómitos de matérias alimentarias com frequên­cia. Appetite conservado. Dilatação do estômago com ruido de marulho. Ha lõ dias principiou-lhe uma pon­tada do lado direito, e tosse.

Nenhuma dilatação do thorax. Som obscuro no terço inferior do pulmão direito. Attrito pleural, sem sopro nem febre.

Agua de Sedlitz, vesicatório, regime lácteo, pil. theb.

16 Janeiro. Menos attrito plenal. Nenhuns vó­mitos.

18 Janeiro. Melhoramento rápido. 22 Janeiro. Convalescente.

Obs. 20.—Dilatação do Estômago.—P. (R.), homem — 60 annos — Commerciante — 29 Janeiro 1886. Doente desde 1878. Digestões difficeis, vómi­tos, cólicas. Em 1885 foi tratado pelo Dr. Gaucher por meio do regimen lácteo e da lavagem do estôma­go. Em Setembro do mesmo anno proximo passado teve Vómitos cor de borra de café, jamais mekena. Pela noute o doente vomita todos os alimentos que toma durante o dia, e muitas vezes restos dos ali-

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mentos dos dias anteriores. Achava-se alliviado pelo tratamento acima indicado, mas ha um mez que vol­taram todos os accidentes. Excessiva magreza, ne­nhuma dôr no epigastro. Nenhum ruido de marulhada. Atheroma. Prolongação do 1.° ruido do coração no ápice.

Regimen lácteo mitigado. Banhos sulphurosos. Melhoras.

Obs. 21.—Dilatação do Estômago. — L. (X.) — 31 annos.—Engenheiro — 5 Fevereiro 1886. Nou­tro tempo cólicas hepáticas por três vezes. Ás vezes excessos de comida e muito principalmente irregula­ridade. Ha annos que vomita os alimentos. Jamais hematemotfis, nem melœna. De anno e meio a esta parte vómitos alimentarios diários. Nenhum tumor no ventre, e o fígado tem as dimensões normaes, achando-se escondido debaixo das costellas. Dores de cintura que correspondem ás vertebras dorsaes, e um pouco á direita. O doente chegou a um emma-grecimento extraordinário, e não tem forças para le-vantar-se, preferindo passar a maior parte do tempo na cama. Todas as noutes o modo de alliviar-se do estado de inquietação, em que se acha, é provocando o vomito, mettendo os dedos na garganta. Os vómi­tos são quasi sempre abundantes, e trazem restos de alimentos tomados vários dias antes. Grande dilata-, ção do estômago, que chega até quatro centímetros acima do pubis, e se estende até ás ilhargas. Ruido de marulho por quasi todo o ventre.

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Regimen lácteo absoluto. 7 Fevereiro. O doente resiste a tomar só leite,

mas cede finalmente á minha insistência. 9 Fevereiro. Algumas melhoras. Continua a pri­

são de ventre. 12 Fevereiro. Vómitos de noute. 13 Fevereiro. Lavagem do estômago por meio

da sonda de Debove que traz perto de 2 litros de liquido, contendo restos de alimentos.

14 Fevereiro. Melhoras e continuação do regimen lácteo absoluto. Rhuibarbo, 3 grammas em 6 ca chets.

16 Fevereiro. Continuação do allivio, diminuição do ruido de glou-glou.

18 Fevereiro. Leite com tapioca de tarde, e leite puro (dous litros e meio por dia).

25 Fevereiro. Pão duro uma vez ao dia, e leite puro com tapioca. Purgante de magnesia calcinada 6 grammas.

26 Fevereiro. Mesmo regimen, e carne assada uma vez ao dia. As comidas continuam com grande regularidade, e a horas certas.

28 Fevereiro. O doente ha dias que se occupa dos seus trabalhos, e se acha bom de todo.

2 Março. Estado satisfactorio. 12 Março. N'estes dias o doente regressa para a

sua terra, com recommendações rigorosas de conti­nuar o seu regime, e de levar comsigo o siphão para o caso de necessidade de lavagem.

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Obs. 22. — Dilatação do estômago. — B. (L.) — Modista—18 annos—16 Julho 1886. Febre ty-phoide ha seis annos. Erysipela no anno passado. Histerismo ligeiro com hemianesthesia pouco pronun­ciada. De seis mezes a esta parte peso e dores no estômago. Vómitos alimentarios meia hora depois de comer, jamais de sangue. Por temporadas de duas semanas, pouco mais ou menos, passa bem, mais pro­pensa a vomitar nas épocas menstruaes. Não pôde di­gerir peixe. Dilatação do estômago, que se acha um pouco abaixo do embigo

17 Julho. Douches frias e dieta ligeira. 22. Não havendo melhoras faço-lhe a lavagem

do estômago, que não manifesta retenção de matérias alimentarias. Como a doente não se sente peior, só prescrevi regimen lácteo mitigado, e as douches, que deram bom resultado.

Obs. 2 3 . — Dilatação aguda do estômago. — Gr. (Y.) Marceneiro — 18 annos — 6 Agosto 1886.

Febre typhoide na idade de 15 annos. Este ra­paz, que é d'uma moralidade mais que suspeitosa, em-bebeda-se ás vezes. A 19 de Junho ultimo almoçou abundantemente, e depois bebeu tanto até ás duas ho­ras da noute, que não sabe como se encontrou na sua cama. No dia seguinte ás 11 horas da manhã apercc-beu-se pela primeira vez que tinha a barriga enorme­mente inchada e muitas dores. Durante o dia vomitou consideravelmente por três vezes.

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Vendo que as dores o não deixam trabalhar, foi consultar o Dr. Tapret, que m'o manda como um exemplo de dilatação aguda do estômago.

Effectivamente encontrei o estômago descendo dous dedos a baixo do embigo, dando facilmente o ruido de marulho.

13 Agosto. Applicação de sonda œsophagiana, que nada nos indica, por que o doente não estava em jejum.

15 Agosto. A lavagem do estômago não traz res­tos de alimentos, apenas algumas mucosidades. Não obstante isso havia antes o ruido de marulho, menos pronunciado do que anteriormente.

Setembro 30. Este doente torna a vir ver-nos. O seu estômago está menos dilatado, pois o seu limite inferior não passa abaixo do embigo.

N'este estado continua sem novidade, apesar de estar mais magro pela insufficiencia da alimentação.

Obs. 24.— Gastrite alcoólica com dilatação.—J. (K.) cocheiro — 37 annos—6 Agosto 1886.

Nenhuns antecedentes hereditários, e excellente saúde. Ha vinte annos que é cocheiro de casa particu­lar. Somente é grande bebedor de vinho, cerveja, li­cores, havendo conservado sempre um excellente appe­tite.

Em 1884 as digestões tornam-se menos fáceis e o doente soffre de pituita pelas manhãs, de eructações frequentes depois da comida, e depois perde pouco a pouco o appetite, mas continua trabalhando, quando

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em Março 1886, acabando de subir á almofada, sentiu um atordoamento, que o obrigou a deixar o trabalho, e a metter-se na cama. O doente confessa que na vés­pera tinha commettido alguns excessos de bebida.

Pouco tempo depois principiam os vómitos abun­dantes, côr de borra de vinho e as fezes eram negras (mœlena provável).

N'este momento foi assistido pelo Dr. Oger, que lhe fez duas lavagens do estômago as quaes o allivia-ram a ponto de poder entregar-se aos seus trabalhos ordinários ; mas no fim do mesmo mez principiaram de novo os vómitos, por cujo motivo entrou na enferma­ria do Dr. Féreol, no hospital da «Charité».

Vómitos persistentes, insomnia tenaz e esfriamen­to. Então não se lhe fez lavagem alguma de estômago, e somente se lhe deram algumas gottas amargas e re­gimen lácteo. No fim de quinze dias sahe melhorado, e volta ao seu modo de vida, repetindo os mesmos ex­cessos.

No principio de Junho nova recahida, comtudo, acompanha os seus patrões a banhos do mar, onde faz soffrivelmente o seu serviço de cocheiro ; mas no seu regresso a Paris em Agosto apresenta nova recrudes­cência, que o obriga a entrar no hospital Beaujon.

Agosto 6. Vómitos incessantes d'um liquido vis­coso e bilioso. Intolerância absoluta de toda a espécie d'alimentos, mesmo do leite. Dilatação estomacal bas­tante marcada (succussão, sonoridade), insomnia per­sistente.

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Esfriamento e arrepios de frio. Faces enrugadas. Nem diarrhea, nem albumina na urina. Peso 59 k.

E'-lhe prescripto o regimen lácteo, e neve. Passa­dos alguns dias, supporta um pouco melhor o leite, mas vomita ainda muito.

Durante os mezes d'Agosto e Setembro o doente não sente grandes melhoras, emmagrece, e não segue um regimen rigoroso.

Outubro 5. O doente pesa 44 k. e vomita sem­pre. Faz-se-lhe uma lavagem do estômago ( l . a lava­gem) com agua pura, e depois agua bicarbonatada. O liquido, que sahe, é bilioso com uma espécie de peque­nas pelles brancas misturadas á serosidade.

Continuam-se as lavagens todos os dias seguin­tes, e submotte-se o doente ao regimen lácteo absoluto. Desde a quarta lavagem o liquido torna-se mais cla­ro, mas ainda ficam mucosidades e pelliculas esbran­quiçadas.

10 Outubro. Sexta lavagem. O doente recupera o appetite e principia a dormir bem. Já não vomita.

No dia 13 o doente bebe, sem licença, um copo dagua com vinho, e pouco depois principiam as nau­seas seguidas de vómitos, accidentes que desappare-cem depois d'uma lavagem estomacal.

Presentemente, 20 outubro, as lavagens fazem-se de 2 em 2, ou de 3 em 3 dias; o liquido sahe quasi limpido. O doente come e dorme bem, e engorda ma­nifestamente. O regimen lácteo é sempre absoluto, e de rigor.

22 Outubro. Vómitos biliosos e de leite coagula-

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do. O doente commetteu alguma nova infracção de regimen que não confessa. Magnesia um gramma, e re­gimen severo.

29 Outubro. Melhoras.

PROPOSIÇÕES

Anatomia.—A existência do nervo de Cyon (centrípeto) no coração prova-se pelos factos clínicos.

Physiologia.—Na medulla ha um centro car­díaco.

Materia medica.—Os anesthesicos são um va­lioso e importantíssimo recurso therapeutico.

Anatomia pathologica.—A tísica pulmonar tem na verdade um producto característico, e transmissor da doença?

Pathologia geral.—A doutrina parasitaria de Pasteur tem sido motivo d'importantes desco­bertas.

Pathologia externa.—E' vantajosíssimo o em­prego dos antisepticos nos curativos.

Pathologia interna. — A atrophia muscular progressiva pode ter duas causas, ou lesão medullar, ou dos próprios músculos.

Medicina operatória. — Os meios antisepticos elevem também empregar-se sempre durante as operações.

Partos.—A duração do trabalho do parto influe muito no seu resultado.

Hygiene.—A activade intellectual excessiva é tão prejudicial, senão mais do que o dema­siado trabalho physico.

Visto O P R E S I D E N T E ,

Ricardo Jorge.

Pôde imprimir-se o CONSELHEIRO-DIRECTOB

Visconde de Oliveira.

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