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O Grande Conto do Colesterol Eduardo Almeida, MD, PhD Em 1954, o cientista russo que vivia nos EUA, David Kritchevsky, publicou um artigo no Am.J Physiology (Jul-Sept, 1954), onde chamou a atenção dos cientistas para a emergência da epidemia de doença coronária (DC). Nos estudos revelava que o colesterol produzia arteriosclerose no coelho, e que as gorduras polinsaturadas poderiam reduzir os níveis de colesterol, propunha, assim, a redução do consumo de produtos animais. Entretanto, a placa apresentada pelo coelho era completamente diferente da placa do humano. Os coelhos (vegetarianos) eram alimentados com colesterol purificado e oxidado pelo processamento. Em 1954, Ancel Keys levantou a hipótese de que a doença coronária seria provocada pelo acúmulo de gorduras saturadas e colesterol. Usou para tal um cruzamento entre consumo de gorduras saturadas e DC em seis paises. A história dos seis paises que permitiu a Ancel Keys concluir sobre a relação direta entre consumo de gorduras saturadas e DC revela um fato interessante. A OMS diante das evidências do aparecimento da

O Grande Conto Do Colesterol

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Em 1954, o cientista russo que vivia nos EUA, David Kritchevsky, publicou um artigo no Am.J Physiology (Jul-Sept, 1954), onde chamou a atenção dos cientistas para a emergência da epidemia de doença coronária (DC). Nos estudos revelava que o colesterol produzia arteriosclerose no coelho, e que as gorduras polinsaturadas poderiam reduzir os níveis de colesterol, propunha, assim, a redução do consumo de produtos animais. Entretanto, a placa apresentada pelo coelho era completamente diferente da placa do humano. Os coelhos (vegetarianos) eram alimentados com colesterol purificado e oxidado pelo processamento. Em 1954, Ancel Keys levantou a hipótese de que a doença coronária seria provocada pelo acúmulo de gorduras saturadas e colesterol. Usou para tal um cruzamento entre consumo de gorduras saturadas e DC em seis paises. A história dos seis paises que permitiu a Ancel Keys concluir sobre a relação direta entre consumo de gorduras saturadas e DC revela um fato interessante. A OMS diante das evidências do aparecimento da arteriosclerose convocou, em 1954, um comitê de experts (First Expert Committess on Pathogenesis of Atherosclerosis). Participaram do comitê Paul Dudley White de Boston, Gunnar Bjork de Stocolmo, Noboru Kimura do Japão, George Pickering de Oxford e Ancel Keys de Minnesota. Durante uma exposição de Ancel Keys o professor Pickering o interrompeu e fez a seguinte pergunta: “professor Keys would be kind enough to cite for us the principle piece of evidence that you think supports this diet-heart theory of yours? (tradução: professor Keys poderia gentilmente citar para nós a peça principal de evidência que você pensa dar suporte a sua teoria dieta-coração?) O assistente de Keys Henry Blackburn nos conta: “O professor se sentiu muito mal com a pergunta. Ao invés de citar... bem essa teoria está baseada num corpo de evidências que temos percebido na clinica, no laboratório e em grupos populacionais, ele citou uma “peça destruida”. Ele saiu como alguém nocauteado e disse: “I will show those guys”. Selecionou os seis países e publicou como sendo a peça comprobatória.fonte:http://www.arzt.com.br/artigos/o-grande-conto-do-colesterol

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Page 1: O Grande Conto Do Colesterol

O Grande Conto do Colesterol

Eduardo Almeida, MD, PhD

Em 1954, o cientista russo que vivia nos EUA,

David Kritchevsky, publicou um artigo no Am.J

Physiology (Jul-Sept, 1954), onde chamou a atenção dos

cientistas para a emergência da epidemia de doença

coronária (DC). Nos estudos revelava que o colesterol

produzia arteriosclerose no coelho, e que as gorduras

polinsaturadas poderiam reduzir os níveis de colesterol,

propunha, assim, a redução do consumo de produtos

animais.

Entretanto, a placa apresentada pelo coelho era

completamente diferente da placa do humano. Os coelhos

(vegetarianos) eram alimentados com colesterol

purificado e oxidado pelo processamento.

Em 1954, Ancel Keys levantou a hipótese de que

a doença coronária seria provocada pelo acúmulo de

gorduras saturadas e colesterol. Usou para tal um

cruzamento entre consumo de gorduras saturadas e DC

em seis paises.

A história dos seis paises que permitiu a Ancel

Keys concluir sobre a relação direta entre consumo de

gorduras saturadas e DC revela um fato interessante. A

OMS diante das evidências do aparecimento da

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arteriosclerose convocou, em 1954, um comitê de experts

(First Expert Committess on Pathogenesis of

Atherosclerosis). Participaram do comitê Paul Dudley

White de Boston, Gunnar Bjork de Stocolmo, Noboru

Kimura do Japão, George Pickering de Oxford e Ancel

Keys de Minnesota. Durante uma exposição de Ancel

Keys o professor Pickering o interrompeu e fez a seguinte

pergunta: “professor Keys would be kind enough to cite for

us the principle piece of evidence that you think supports

this diet-heart theory of yours? (tradução: professor Keys

poderia gentilmente citar para nós a peça principal de

evidência que você pensa dar suporte a sua teoria dieta-

coração?)

O assistente de Keys Henry Blackburn nos conta:

“O professor se sentiu muito mal com a pergunta. Ao

invés de citar... bem essa teoria está baseada num corpo

de evidências que temos percebido na clinica, no

laboratório e em grupos populacionais, ele citou uma

“peça destruida”. Ele saiu como alguém nocauteado e

disse: “I will show those guys”. Selecionou os seis países

e publicou como sendo a peça comprobatória.

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Entretanto, se Ancel Keys tivesse feito esse

mesmo cruzamento entre os 20 paises em que esses

dados estavam disponíveis não encontraria qualquer

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relação substantiva. Segundo Kendrick se Keys tivesse

escolhido Finlândia, Israel, Alemanha, Holanda, Suiça e

Suécia os resultados seriam opostos.

Segundo Mary Enig, Ancel Keys declarou certa

vez que o óleo vegetal parcialmente hidrogenado com

seus ácidos graxos trans (AGs trans), eram os

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verdadeiros responsáveis pela DC. Isso foi dito em 1958.

A indústria alimentar ficou muito incomodada com tal

afirmação e passou da denúncia da gordura saturada

para a denúncia da carne e da gordura do leite como

responsáveis pela DC.

Em 1956, a American Heart Association (AHA)

comunicou a tese Lipídica em um painel transmitido pelos

três maiores canais de TV. Os panelistas recomendaram

a dieta de Prudent, que orientava para o consumo de

óleos vegetais, margarinas, galinha, ao invés de toucinho,

manteiga e ovos.

O Dr Dudley White, voz discordante nesse painel,

disse textualmente: ”Eu comecei a minha prática como

cardiologista em 1921, e eu nunca vi um infarto do

miocárdio até 1928. Nesse periodo as pessoas

consumiam predominantemente gordura animal, ninguém

havia ouvido falar em óleo de milho até então”.

Mas, antes disso, a AHA havia negado a tese

lipidica quando comentou: ”a alimentação antigordura e

anti-colesterol é não apenas futil e ingênua, mas traz

consigo também riscos”.

Após um intenso lobby da indústria alimentar a

AHA se rende a tese lipídica que dizia ser a alimentação

rica em gorduras saturadas e colesterol (animal) a

responsável pela DC, hipertensão arterial e derrame.

Page 6: O Grande Conto Do Colesterol

Prudent era o president da AHA, e enfrentou um racha no

board da AHA, entre os favoráveis e os contrários à tese

lipídica. Ele compunha o primeiro grupo.

Por essa razão a dieta que seguia os princípios da

tese lipídica recebeu o nome de dieta do coração ou dieta

de Prudent. Propunha evitar os alimentos com gorduras

saturadas e colesterol, e estimular o consumo das

gorduras polinsaturadas pobres em colesterol, sem fazer

menção aos carbohidratos e proteinas.

Ironicamente o Dr Prudent participou de um

estudo desenhado entre os membros da AHA. Ele

integrou o grupo que consumiu gorduras polinsaturadas

pobre em colesterol e veio a falecer de DC.

A Dieta Rica em Gorduras Saturadas aumentaria o

Colesterol Sanguíneo?

Em 1920, o Dr Paul Dudley White trouxe o

primeiro aparelho de ECG da Alemanha. Além da

curiosidade se comentou sobre a pouca utilização do

equipamento em virtude da baixa frequência de DC nos

EUA.

Entre 1910-1920, quando se consumia

basicamente gordura saturada, a DC era uma raridade.

Em 1970, a DC já era responsável por 40% das mortes

Page 7: O Grande Conto Do Colesterol

nos EUA.

Nesse periodo de 50 anos (1920-1970) o consumo

de gordura saturada caiu de 83% para 62%; o consumo

de manteiga caiu de 8Kg para 1,8 kg por pessoa/ano; o

consumo de colesterol aumentou 1%; o consumo de

óleos vegetais aumentou 400%; o consumo de açúcar

aumentou 60%.

Survey realizado em 1990 mostrou que homens

consumidores de manteiga, tiveram a metade do risco

coronário em relação aos que consumiam margarina (Nutr

Week, Mar 22, 1991, 21:12:2-3)

Estudos suecos publicados em 2004 revelaram

que o consumo de manteiga está negativamente

associado à DC. Ou seja, a manteiga protege o

coração (British J. Nutrition, 2004).

Na Índia, as populações do Norte consomem 7

vezes mais gorduras saturadas do que as do Sul. A

população do Norte têm 7 vezes menos DC (Malhotra,

S,Indian Journal of Industrial Medicine, 1968, 14:219)

A França possui alto consumo de gorduras

saturadas, e tem o menor índice de DC do Ocidente (145

mortes/100.000 hab). Na região de Gascony, onde se cria

gansos para produção de patês, a mortalidade é de

80/100.000 hab., enquanto nos EUA a mortalidade é de

315/100.000 hab.

Page 8: O Grande Conto Do Colesterol

A cidade de Framingham, Massachussetts, tem

sido a grande fonte para estudo prospectivo em relação

às doenças cardiocirculatórias desde 1948. Sua

população atual é de cerca de 67 mil habitantes. Os

diretores desse projeto ganham destaque na produção

científica na área. O Dr Castelli foi um dos primeiros

diretores. O Dr George Mann dirigiu por três anos o

Projeto Framingham, cujas conclusões deu origem ao

livro “Coronary Heart Disease – The Dietary Sense and

Nonsense” (1993), onde afirma de maneira categórica

que as gorduras saturadas não são as responsáveis pela

DC.

Estudo de Framingham num survey de 16 mil

homens saudáveis de meia idade, avaliados 6 anos após

(1981), revelou que aqueles com DC consumiam mais

óleos polinsaturados (vegetais).

São vários os estudos que contestam a tese

lipídica e a dieta de Prudent, mas a tese centrada no

colesterol comete uma “imprudência” ao chamar o

colesterol de gordura. O colesterol não é uma gordura e

sim um esterol (álcool) com estrutura semelhante a

hormônio, que se torna hidrossolúvel quando ganha a

capa de uma lipoproteina. Por esse motivo não adere à

placa ou à rugosidade endotelial. São os triglicérides que

aderem à rugosidade endotelial. O colesterol não está nas

Page 9: O Grande Conto Do Colesterol

gorduras e sim nas carnes (membrana celular).

É completamente insustentável a história de

colesterol bom (HDL) e ruim (LDL). O primeiro é a forma

de transporte do colesterol das células para o figado, o

segundo do fígado para as células. Ambos têm suas

funções específicas e essenciais. Foi o public relation

(PR) da indústria farmacêutica quem inventou esse conto.

O professor Ancel Keys afirmou textualmente: “In

the adult man the serum cholesterol level is essentially

independent of the cholesterol intake over the whole

range of human diets ... There is no connection

whatsoever between cholesterol in food and cholesterol in

blood. And we have known that all along. Cholesterol in

the diet does not matter at all unless you happen to be a

chicken or a rabbit." (Ancel Keys, Ph.D., professor

emeritus at the University of Minnesota, 1997) (tradução:

no homem adulto o nível de colesterol sérico é

essencialmente independente da ingesta de colesterol....

Não há conexão, portanto, entre colesterol no alimento e

colesterol no sangue. Nós sabemos disso faz tempo.

Colesterol na dieta não importa absolutamente, a menos

que você seja uma galinha ou um coelho).

O colesterol da Dieta responde apenas por cerca

de 30% do colesterol sanguíneo, os outros 70% são

Colesterol endógeno, produzido pelo próprio organismo.

Page 10: O Grande Conto Do Colesterol

Vários tecidos participam da produção do

colesterol endógeno - o fígado é responsável por 20%,

mas a síntese intestinal de colesterol é muito superior à

hepática.

Segundo Castelli: “Os valores de colesterol e

triglicerídeos séricos não estão positivamente

correlacionados com a seleção de constituintes da dieta

... No estudo de Framingham, Massachusetts, quanto

mais gordura saturada se comia, quanto mais colesterol

se ingeria, quanto mais caloria se comia, menor o nível de

colesterol sérico ... Nós constatamos que o indivíduo

que ingeria mais colesterol, comia mais gordura

saturada, ingeria mais calorias e comumente era

fisicamente mais ativo” (Dr William Castelli, 1992, director

do Framingham study).

Outro estudo populacional importante revelou o

seguinte: a) aqueles com níveis baixos de colesterol

sanguíneo consumiam em média 52g/dia de gordura

saturada; b) aqueles com níveis médios de colesterol

sanguíneo consumiam em média 54g/dia de gordura

saturada; c) aqueles com níveis altos de colesterol

sanguíneo consumiam em média 54g/dia de gordura

saturada (Cholesterol Intake and Blood Lipids - The

Tecumseh Study).

Page 11: O Grande Conto Do Colesterol

Porque a ingesta de gorduras saturadas não aumenta

o Colesterol?

O fígado não utiliza gorduras, saturadas ou não,

para produzir colesterol; o fígado não produz LDL e sim

VLDL. O LDL é um resíduo metabólico do VLDL; o VLDL

é convertido em LDL através da perda de triglicérides; os

níveis de VLDL e LDL são totalmente não relacionados.

Isso significa que a ingestão de gordura saturada não

afeta os níveis de LDL.

Colesterol e gorduras saturadas são compostos

não relacionados, ou seja, não existe processo químico

que produza colesterol a partir de gordura saturada ou

qualquer outro tipo de gordura.

O aumento do colesterol no sangue é na verdade o

aumento de LDL. O aumento de VLDL é chamado de

hipertrigliceridemia

A única conexão entre gorduras saturadas e

colesterol é que ambos não são hidrossolúveis e por esse

motivo têm que circular sob a forma de lipoproteínas.

Page 12: O Grande Conto Do Colesterol

Basta observar a estrutura química de um ácido

graxo e a do colesterol para perceber que um não se

transforma no outro.

O colesterol não é um tóxico e sim uma

substância vital ao organismo de todos os mamíferos. O

organismo produz 3 a 4 vezes mais colesterol do que

ingere. Produz diariamente cerca de 2000 mg de

colesterol, e aumenta a produção quando se ingere pouco

colesterol e diminui a produção quando se ingere muito.

A dieta de Prudent não consegue reduzir a taxa de

colesterol além de pequena percentagem.

Vários estudos revelam que o aumento da ingesta

de alimentos ricos em colesterol reduz o colesterol

sanguíneo.

Seria o Colesterol o responsável pelo processo de

Arteriosclerose no Homem?

Page 13: O Grande Conto Do Colesterol

Indivíduos com Colesterol normal ou baixo

desenvolvem placas do mesmo modo daqueles com

Colesterol alto. Mais da metade (60%) dos indivíduos com

Infarto apresentam nível normal de Colesterol.

Estudos revelaram que o Colesterol baixo

representa um risco cardiovascular muito maior que o

alto, em especial nos idosos (JAMA 272, 1335-1340,

1994). Estudo de Krumholz et al do departamento de

medicina cardiovascular de Yale seguiu durante 4 anos

997 idosos, e revelou que aqueles com colesterol baixo

tiveram uma mortalidade cardiovascular duas vezes maior

comparados com os com colesterol alto (Krumholz HM.

“Lack of association between cholesterol and coronary

heart disease mortality and morbity and all cause mortality

in persons older than 70 years”. JAMA 272, 1335-1340,

1994).

Os estudos de Framingham revelaram que níveis

altos de Colesterol têm efeito protetivo nas pessoas com

mais de 60 anos.

O estudo geral que contempla todas as idades

revelou aumento do risco coronário em pessoas com

colesterol alto apenas para homens adultos entre 29 a 47

anos, mesmo assim numa proporção que não ultrapassou

5%. Caso as pessoas com hipercolesterolemia familiar

fossem retiradas da amostra, não haveria diferença entre

Page 14: O Grande Conto Do Colesterol

os dois grupos.

A leitura do projeto Framingham que revelou o

aumento da morbidade cardiocirculatória entre homens de

29 a 47 anos, foi publicada no final da década de 50.

Esse estudo foi o grande patrocinador da tese Lipidica.

Entretanto, folllow up do mesmo projeto Framingham feito

16 anos após, revelou quase nenhuma diferença entre os

dois grupos (colesterol normal x alto). Outro follow up feito

30 anos após revelou que nos homens acima de 47 anos

a mortalidade não era alterada pelos níveis de

colesterol. Ainda mais surpreendente foi a revelação no

follow up de 30 anos, em que a diminuição do colesterol

no período, estava associada a um maior risco de morte

do que o incremento.

Estudo publicado recentemente, onde foram

acompanhados durante 30 anos 17 mil adultos que

apresentaram ganho significativo de peso na meia idade,

mas que sempre mantiveram níveis de colesterol dentro

da normalidade, como também nenhum outro fator de

risco, tiveram aumento significativo do risco

cardiocirculatório na ordem de 43% se comparado ao

grupo de peso normal (JAMA, Jan. 11, 2006; 295(2): 190-

198).

Os aborígenes australianos, os índios

americanos, os emigrantes indianos e paquistaneses

Page 15: O Grande Conto Do Colesterol

e grande porcentagem de homens russos, possuem

alto índice de DC e têm uma coisa em comum –

baixos níveis de LDL.

O indiano é o grupo étnico estudado talvez com

maior índice de DC, apesar de parcela significativa ser

vegetariana. A DC costuma ocorrer precocemente e com

curso maligno, apesar dos fatores de risco ser

significativamente baixos (Enas, Arch. Cardiol, March,

1995).

Na segunda metade do Sec XX observou-se uma

elevação expressiva da mortalidade por DC em homens

russos. O professor Shestov realizou amplo estudo e

descobriu que os baixos níveis de LDL foi o fator de risco

mais importante de mortalidade cardíaca, concluiu

dizendo: “The results disclose a sizeable subset of

hypocholesterolaemics in the population at increased risk

of cardiac death.” (tradução: Os resultados revelam um

subgrupo mensurável de hipocolesterolenêmicos em risco

elevado de morte cardíaca na população)

Quando se aplicou os parâmetros para DC do

Page 16: O Grande Conto Do Colesterol

“Framingham risk equation” para homens britânicos por

10 anos, observou-se que 84% das doenças cardíacas

ocorreram em homens classificados como de baixo

risco. Entretanto, 75% dos homens classificados em alto

risco estavam ainda livres de ocorrências de DC 10 anos

após (BMJ, 29 Nov. 2003; 327(7426): 1267).

No Japão nos últimos 50 anos os níveis de

colesterol aumentaram 20% e a incidência de acidente

vascular encefálico (AVE) caiu 600%.

O Dr Gregg Fonarow (University of California, Los

Angeles Medical Center ) publicou recentemente artigo

em que revela que cerca de 75% dos pacientes que

tiveram o primeiro evento coronariano tinham LDL abaixo

de 130 mg/dL, e cerca de 50% tinham LDL abaixo 100

mg/dL.

A tese Lipidica já poderia estar sepultada desde

1968, quando foi publicado no J. Lab Investigation o

resultado do “International Atherosclerosis Project”, que

reuniu 14 países, e foram realizadas 22.000 autópsias. O

estudo mostrou grau semelhante de ateroma nos vários

países, independente da dieta ser rica em gordura

saturada ou vegetal. No entanto, foi encontrada muito

mais obstrução arterial nas pessoas com colesterol baixo

comparadas às com o colesterol alto.

Estudos realizados no Canadá “Quebec

Page 17: O Grande Conto Do Colesterol

Cardiovascular Study”, que acompanhou durante 12 anos,

5.000 homens saudáveis de meia idade, revelou não

haver relação entre níveis de colesterol e DC.

A grande maioria dos estudos populacionais

revelaram que, entre as mulheres, independente da

idade, e mesmo com níveis elevados de colesterol na

ordem de 1000 mg/dL, o colesterol não pode ser

considerado um fator de risco. Pelo contrário, é o

colesterol baixo que consiste em fator de risco para as

mulheres (NHLB Institute; Circulation – 1992).

Estudo feito em Paris mostrou que as mulheres

longevas possuem colesterol elevado (Lancet, 1989).

Um survey conduzido pelo famoso cirurgião

Michael DeBakey na década de 60, não encontrou

relação entre os níveis de colesterol e a incidência de DC

(DeBakey, M, et al, JAMA, 1964, 1 89:655-59).

O professor George Mann, da Vanderbilt

University, ex diretor do Framinghham Project, estudou os

Masais do Quênia. Os Masais consomem

predominantemente leite, carne e sangue. Mann

descobriu que os Masais praticamente não apresentam

DC, e têm níveis baixos de colesterol. Além disso,

realizou 50 autopsias e, para a sua surpresa, encontrou

arteriosclerose em níveis semelhantes ao dos

americanos, mas o tipo de placa que causa obstrução foi

Page 18: O Grande Conto Do Colesterol

raramente encontrado. Não havia qualquer sinal de

isquemia nos 50 corações estudados (“Diet Heart,

End of an Era”, New England J Med, 297 (1977):

644). Em comentário posterior o professor Mann afirma

sobre a tese Lipídica: “Ela é a diversão pública número

um da saúde pública nesse Século..... O grande

escândalo da história da medicina”.

Em 1992, o professor Mann, organizou uma

conferência para tratar da questão Dieta/DC. Ele teve

dificuldade para arregimentar um número expressivo de

pesquisadores que temiam entrar na lista negra do

financiamento de pesquisas. Disse ele: “ I could show a

list of scientists who said to me, in effect, when I invited

them to participate: "I believe you are jeopardize my perks

and funding… for me, that kind of truth, that the Diet/Heart

hypothesis is wrong, but I cannot join you because that

critical hypothesis would response separates the scientists

from the operators …” (tradução: “Eu poderia mostrar uma

lista de cientistas, que me disseram, na ocasião que eu os

convidei para participar da conferência, o seguinte:’Eu

acredito que isso ameaça meus prestígio e

financiamentos.... para mim, essa espécie de verdade

sintetizada na hipótese dieta/coração está errada, mas eu

não posso juntar-me a você porque essa hipótese crítica

promoveria a separação dos cientistas dos operadores...

Page 19: O Grande Conto Do Colesterol

[financiadores].

Em 1967, o Dr SL Malhotra publicou estudo

envolvendo os trabalhadores da estrada de ferro na India.

Ele revelou que a DC era 7 vezes mais comum entre os

trabalhadores em Madras, comparados aos de Punjab.

Os trabalhadores de Punjab consomem 7 a 10 vezes

mais gorduras, fumam 8 vezes mais que os de Madras, e

vivem 20 anos mais que os predominantemente

vegetarianos de Madras (British Heart Journal, 1967).

Um estudo multicêntrico (Multiple Risk Factor Trial

(MRFIT) desenhado para demonstrar que o controle da

pressão arterial (PA), do colesterol e do tabagismo

diminuiria a mortalidade coronariana. Após screening de

350 mil homens de meia idade, selecionou-se 13 mil.

Esses últimos foram divididos em dois grupos, um

recebeu tratamento para os fatores de risco (PA<140/90),

outro recebeu medidas usuais (conservadoras). Após 10

anos e um gasto de 115 milhões de US$, não foi notado

qualquer diferença significativa entre os grupos. Pelo

contrário, a mortalidade no subgrupo hipertenso tomando

diurético foi maior (JAMA, 248 (1982):1465-1477)

O Prof Olson foi contratado para rever a literatura

sobre os efeitos tóxicos da alimentação rica em colesterol

pela American Research Agency. Concluiu que não havia

evidências para desaconselhar o uso das gorduras

Page 20: O Grande Conto Do Colesterol

saturadas (“Towards Healthful Diets”. Report to the US

Acad of Science, April, 1980).

O professor suiço Hans Mohles chegou a mesma

conclusão de Olsen e escreveu o livro: Cholesterin

Neurose. Frankfurt: Oto Sale Vlg, 1978. Outro estudo

publicado no JAMA mostrou que não há relação entre o

consumo de ovos e DC (JAMA, 281 (1999): 1387-94).

Em Maio de 1999, o Dr Walter Willet, professor

titular do departamento de nutrição de Harvard, deu um

seminário no National Institute of Health (NIH), Bethesda,

com o título: “Diet and Heart Disease: Have we misled the

Nation”? (Dieta e Doença cardíaca: Temos enganado a

Nação?). Concluiu na ocasião que os dados até hoje

disponíveis não dão suporte à tese de que “gorduras são

ruins para nós”. Aponta, pelo contrário, para os

carbohidratos com alto índice glicêmico como os reais

vilões.

Estudo recente comprova a tese de

Willet. Investigou-se o hábito alimentar de 48 mil pessoas

e se conclui que aquelas que consumiam mais

carbohidratos refinados tinham o dobro de risco de

apresentar DC (Archives of Internal Medicine, April 12,

2010;170(7):640-7).

O professor de patologia de Harvard Kilmer

McCully publicou os resultados de 194 autopsias

Page 21: O Grande Conto Do Colesterol

consecutivas em homens veteranos de guerra com

severa arteriosclerose, e encontrou uma porcentagem de

apenas 8% com colesterol acima de 250 mg/dL. A média

de colesterol entre eles era de 186 mg/dL (Am. J Med

Science, 299:217221,1990).

Recentemente a European Society of Cardiology

divulgou os resultados de um estudo extensivo

(EUROASPIRE) em toda a Europa para avaliar fatores de

risco cardiovascular. Na conclusão do relatório está

escrito: “ ...o tabagismo, DC prévia e o diabetes são

fatores risco significantes. Obesidade, baixa escolaridade,

hipertensão arterial, colesterol total alto, HDL baixo,

entretanto, não foram significantes no aumento da

mortalidade.

A tese Lipídica diz que a gordura saturada

degenera a estrutura arterial por deposição. A seguir

vamos mostrar a composição da parede arterial e a

composição da placa

Parede Arterial Normal

Fibras Colágenas 25 a 30%

Fibras de Elastina 30 a 40%

Musculatura e subst. fundamental 30 a 40 %

A subst. fundamental é composta de mucopolissacarídeos

que ficam entre as fibras colágenas e a elastinas

Page 22: O Grande Conto Do Colesterol

Composição da Placa de Ateroma

Ácidos graxos saturados em éster de colesterol: 26%

Ácidos graxos insaturados: 74% (38% Polinsaturados;

36% Monosaturados)

Fonte: Lancet,344:1195-1196,1994

O que os estudiosos centrados na tese Lipídica

não conseguem perceber, é que a doença

arteriosclerótica é um processo de degeneração da

artéria, e certamente os processos de degeneração do

organismo não ocorrem pela ingestão de gorduras

saturadas. Os processos de degeneração no organismo

ocorrem pelos vários tipos de stress/sobrecarga. O

organismo responde aos vários tipos de stress de uma

mesma forma, como nos mostrou Selye. Essa adaptação

envolve alterações hormonais que afetam o metabolismo

celular básico, mais especificamente, desvia o

metabolismo celular para o padrão catabólico –

dominância dos hormônios catabólicos (cortisol, tiroxina)

e baixa dos anabólicos (GH, hormônios sexuais). Por

esse motivo é que os estudos não comprometidos com a

tese lipídica têm sido claros em revelar que o consumo de

carbohidratos refinados (provocam alteração hormonal

com desvio catabólico) são os verdadeiros vilões da

alimentação moderna.

Page 23: O Grande Conto Do Colesterol

A medicina deveria ser avessa ao exotismo das

teses não sustentadas pelas leis e processos que regem

o funcionamento do organismo. Se assim procedesse,

não cairia tão fácil no conto do colesterol. O colesterol é

uma das substâncias mais importantes no funcionamento

do organismo. Como pode essa substância dar vida e ao

mesmo tempo degenerar esse organismo?

Vejamos algumas das principais funções do

colesterol:

a) Integridade estrutural da membrana celular

b) Precursor dos esteróides (cortisol e hormônios

sexuais) e Vitamina D

c) Produção dos sais biliares

d) Antioxidante poderoso

e) Sensibiliza os receptores serotonínicos e é

estratégico na ativação sináptica cerebral

f) Protege a mucosa intestinal

g) Leite materno é riquíssimo em Colesterol

Por que e para que baixar o Colesterol?

Vejamos como ocorre a síntese do colesterol. Três

moléculas de acetilcoenzima A (2 carbonos) se combinam

para formar o ácido hidroximetilglutárico (HMG – 6

carbonos). Em seguida, através da enzima HMG-CoA-

Page 24: O Grande Conto Do Colesterol

redutase, chega-se à cadeia do Mevalonato. Ao se

bloquear essa enzima, bloqueamos a formação não só do

colesterol, mas de pelo menos cinco substâncias

fundamentais além do colesterol, como mostra o quadro

abaixo.

A Coenzima Q10 é fundamental na respiração

celular e na biossíntese mitocondrial. Participa da

produção de ATP como carreador de eletrons para a

citocromoxidase. O coração demanda grande quantidade

Page 25: O Grande Conto Do Colesterol

de Coenzima Q10. Uma forma da Coenzima Q10 - a

ubiquinona - é encontrada em todas as membranas

celulares, e é de grande importância na manutenção da

condução nervosa e integridade muscular. A Coenzima

Q10 participa na formação do colágeno e da elastina, daí

o aumento da ruptura ligamentar em quem usa estatina.

No Canada o Liptor vem com uma advertência na

caixa de que a droga reduz os níveis de Coenz Q10 e L-

Carnitina.

O Dolichol participa da síntese protéica

intermediando as informações do DNA (auxilia a

transcriptação do DNA). É fundamental na síntese de

neuropeptideos. Dai os vários sintomas neuropsiquiátricos

nos usuários de estatina.

O Esqualeno é um precursor imediato do

Colesterol e tem reconhecida ação antineoplásica (Óleo e

Cartilagem de Tubarão).

O NFkappaB é uma citoquina proinflamatória.

Talvez aqui resida o pequeno efeito terapêutica das

estatinas – antinflamação. Mas, seria razoável usar uma

droga tóxica e cara simplesmente como um

antiinflamatório???

O filão das estatinas

O grupo farmacêutico das estatinas envolve

Page 26: O Grande Conto Do Colesterol

algumas substâncias semelhantes e outros tantos

medicamentos de marca como Liptor, Crestor,

Sinvastatina, Zocor, etc. A estatina é uma toxina de um

fungo do arroz vermelho chinês. Possui potente ação de

bloqueio da enzima HMG-coA-redutase e com isso reduz

drasticamente o colesterol e demais substâncias do ciclo

do mevalonato (vide acima).

Embora se consiga reduções drásticas nos níveis

do colesterol, os resultados na prevenção e regressão da

placa ateromatosa e doença arteriosclerótica são

modestos ou inexistentes, principalmente quando

analisado a médio e longo prazo.

Vamos analisar alguns dos principais estudos que

avaliaram a eficácia das estatinas. Comecemos pelos

estudos que mostram claramente o efeito protetivo do

colesterol em pessoas com mais de 56 anos.

O estudo conhecido como Honolulu Heart

Program com 20 anos de duração concluiu: “Nossos

dados são semelhantes aos de estudos prévios que

revelaram um aumento de mortalidade em pessoas

idosas com colesterol baixo, bem como mostraram que os

niveis persistentemente baixos de colesterol por longo

tempo aumentam o risco de morte. Assim, quanto maior o

tempo de vigência de colesterol baixo, maior o risco de

morte.”

Page 27: O Grande Conto Do Colesterol

O estudo “antihypertensive and lipid-lowering

treatment to prevent heart attack trial” (ALLHAT,

2002). Talvez o maior estudo nos EUA sobre os efeitos do

Lipitor, revelou a mortalidade após 3 e 6 anos de

tratamento (10.000 participantes). Conclusões: “Of the

5170 subjects in the group that received statin drugs, 28

percent lowered their LDL cholesterol significantly. And of

the 5185 usual-care subjects, about 11 percent had a

similar drop in LDL. But both groups showed the same

rates of death, heart attack and heart disease”.

O “prospective study of pravastatin in the elderly at

risk” (PROSPER, 2002), estudou o efeito da Pravastatina

em grupos de idosos: 56% sem episódios prévios de DC

sintomática, e 44% com episódios

prévios. Conclusões: “The Pravastatin did not reduce total

myocardial infarction or total stroke in the primary

prevention population, but did so in the secondary.

However, measures of overall health impact in the

combined populations, total mortality and total serious

adverse events were unchanged by pravastatin as

compared to the placebo and those in the treatment group

had increased cancer”.

O “Japanese lipid intervention trial” (J_LIT, 2002)

estudo Japonês de 6 anos, envolvendo 47.294 pacientes

tratados com a mesma dose de Sinvastatina,

Page 28: O Grande Conto Do Colesterol

concluiu: “No correlation between the amount of LDL

lowering and death rate at five years. Those with LDL

cholesterol lower than 80 had a death rate of just over 3.5

at five years; those whose LDL was over 200 had a death

rate of just over 3.5 at five years”.

O “Anglo-Scandinavian cardiac outcomes trial -

lipid lowering arm” (ASCOT-LLA 2003), avaliou o efeito da

atorvastatina (Lipitor) versus placebo em mulheres

hipertensas e com outros fatores de risco coronariano. O

estudo foi inicialmente desenhado para 5 anos, mas foi

interrompido em 3,3 anos devido a significativa redução

dos eventos cardíacos. No entanto, não houve qualquer

diferença em relação à mortalidade. As mulheres

apresentaram muitos efeitos colaterais (Sever PS and

others. Lancet 2003;361:1149-1158).

O que os leitores não sabem é como foi calculado

o índice de 27% na redução de AVE; 2,4% do grupo sem

estatina tiveram AVE; 1,7 % do grupo com estatina

tiveram AVE, ou seja, uma diferença de 0,7 pontos que

corresponderia a um índice projetado de 27%......

O “PRavastatin or AtorVastatin evaluation and

infection study” (PROVE-IT, 2004), foi uma pesquisa

realizada na Harvard University Medical School, que

obteve ampla divulgação na mídia. Veja a matéria de

alguns jornais.

Page 29: O Grande Conto Do Colesterol

"Study of Two Cholesterol Drugs Finds One Halts Heart

Disease" (N Y Times, November 13, 2003)

Editorial: "Extra-Low Cholesterol“ (New York Times,

March 10, 2003)

“Striking Benefits Found in Ultra-Low

Cholesterol” (Washington Post, March, 9, 2004)

O PROVE-IT introduziu uma nova questão na

prevenção da DC pela redução do cholesterol - o fim do

enfoque quantitativo na análise do colesterol. Ou seja,

não existe mais nível normal de colesterol, quanto mais

baixo melhor. Como foi dito na matéria da revista Veja na

época: “o chão é o limite”

Imediatamente, os médicos passaram a adotar a

conduta de aumentar a dose das estatina para quem já a

usava, e se sentiram à vontade para fazer a prevenção

com a estatina nas pessoas sem qualquer evento prévio

de DC.

Qual foi o resultado desse estudo para gerar

tamanho frisson? O estudo comparou duas drogas: Lipitor

(Pfizer) e Pravachol (Bristol Myers-Squibb - BMS). Este

último foi quem financiou a pesquisa. Investigou-se 4.162

Page 30: O Grande Conto Do Colesterol

pacientes que eram acompanhados por infarto ou angina

instável. Metade tomou Liptor e metade tomou Pravachol.

Os que tomaram Liptor tiveram uma redução maior do

LDL (62 contra 95). No grupo Liptor houve uma redução

de 32% no LDL e 16% em todas as causas de

mortalidade. Mas, os tais 16% foram uma redução do

risco relativo e não risco real. A redução absoluta da taxa

de mortalidade em ambos os grupos foi de 1% - uma

queda de 3,2% para 2,2% em dois anos. Ou seja 0,5% ao

ano. Portanto, foi a redução do risco absoluto de morte

em 0,5% ao ano que gerou a massiva campanha na

mídia, que usou a taxa de 16% que é uma taxa

projetada/relativa

A mídia não falou dos efeitos colaterais do estudo:

alteração das enzimas hepáticas: 3,3%; descontinuação

do tratamento durante a pesquisa por efeitos colaterais:

33%.

O estudo J-LIT publicado em 2002, com um

desenho muito mais sólido, envolvendo 10 vezes mais

pessoas, e três vezes maior em duração, não encontrou

qualquer relação entre o nível de queda do LDL e taxa de

mortalidade. Não é de se estranhar que esse estudo não

tenha encontrado qualquer repercussão na mídia

Pesquisadores do Beth Israel Medical Center in

New York City, em 2003, examinaram a placa

Page 31: O Grande Conto Do Colesterol

coronariana em 182 pacientes que tomavam estatina. Um

grupo usava doses altas (mais de 80 mg), enquanto outro

grupo usava doses habituais. Através do “Electron Beam

Tomography” avaliou-se o tamanho das placas antes e

depois do tratamento. Apesar da redução do LDL

colesterol, não houve diferença entre os grupos. Ao

contrário, houve um incremento na ordem de 9,2% no

aumento da placa em ambos os grupos (Hecht HS and

others. Am J Cardiol, 2003;92:334-336).

Num estudo feito na Cleveland Clinic

(REVERSAL, 2004), pacientes receberam Lipitor ou

Pravachol. Os que receberam Liptor tiveram uma queda

maior de LDL e mostraram uma “reversão” na agregação

da placa coronária, avaliada pelo ultrassom intravascular

na ordem de 0,4% a partir de 18 meses. O Dr. Eric Topol

da Cleveland Clinic como um animador de plateia disse

ser tais resultados espetaculares: "Herald a shake-up in

the field of cardiovascular prevention ... the implications of

this turning point - that is, of the new era of intensive statin

therapy - are profound. Even today, only a fraction of the

patients who should be treated with a statin are actually

receiving such therapy ... More than 200 million people

worldwide meet the criteria for treatment, but fewer than

25 million take statins". Esse tipo de espectativa,

absolutamente infundada, tem levado alguns especialistas

Page 32: O Grande Conto Do Colesterol

a sugerirem colocar estatinas nos reservatórios de água

potável das cidades. Já ouvi isso de mais de um

cardiologista. Certamente eles estavam ecoando

perspectivas como as do Dr Eric Topol. Não devemos

mais nos espantar com o delírio intervencionista da

medicina da química e da indústria farmacêutica. A

criatividade em propor o bloqueio do organism não tem

limites.

Em 2004 a Merck Schering-Plough antecipando-

se à perda do direito de patente do Zocor (Simvastatina),

começou a desenvolver o posicionamento do Vytorin

(Simvastatina+Ezetimibe). Para tal encomendou um

estudo esperando provar a eficácia da associação em

relação à formação de placa. Usou-se para esse fim a

avaliação de placa na carótida. Acompanhou 750

pacientes e o estudo terminou em 2006, e nada de

publicação dos resultados. O NY Times moveu uma

campanha para pressionar a Merck a divulgar os

resultados. Algumas pessoas entraram com ações na

Justiça. Finalmente, em Janeiro de 2008 os resultados

foram divulgados.Mas, para o desapontamento da Merck

o estudo revelou que o Vytorin além de ineficaz produziu

o dobro de crescimento da placa

carotídea(http://www.merck.com/newsroom/press_release

s/product/2008_0114.html)

Page 33: O Grande Conto Do Colesterol

O New York Times publicou em 14 de janeiro de

2008 matéria sobre o tema. Eis um trecho da material:

“Zetia, uma droga para baixar o colesterol prescrita para

cerca de 1 milhão de americanos a cada semana não

apresentou benefícios médicos de acordo com estudos

realizados pela própria indústria Merck e Schering-

Plough. Embora a droga tenha baixado o colesterol em 15

a 20%, os estudos não mostraram que o Zetia reduz

ataque cardíaco ou derrame, ou mesmo reduz as placas

nas artérias. Esse teste clínico que estudou se o Zetia

poderia reduzir o crescimento da placa, na verdade

revelou que as placas cresceram quase duas vezes mais

rápido naqueles tomando Zetia e Zocor do que naqueles

que tomaram apenas Zocor. Os pacientes que tomaram

Zetia mais Zocor receberam o medicamento chamado

Vytorin que é a combinação deles. Especialistas

classificaram os resultados como “chocantes” afirmando

que o Zetia só poderia ser prescrito caso outras drogas

falhassem. Esses resultados vieram agravar a

controvérsia em torno do atraso na divulgação desses

dados pela Merck e Schering-Plough. O estudo foi

concluido em Abril de 2006, com previsão de divulgação

dos resultados em Março de 2007. Entretanto, a

companhia não cumpriu os vários prazos assumidos, e só

concordou em divugá-los depois que a mídia passou a

Page 34: O Grande Conto Do Colesterol

cobrar os atrasos. Zetia and Vytorin respondem por 20%

do mercado de drogas para o colesterol no mercado

americano”.

O jornal O Globo transcreve a matéria do NYT em

15 de Janeiro de 2008 que diz: “estudo, realizado pelos

próprios laboratórios, acompanhou, por um período de

dois anos, 720 pessoas com problemas genéticos de alta

produção de colesterol. Um grupo tomou apenas uma

substância, a simvastatina (Zocor). O segundo grupo foi

medicado com as duas substâncias: ezetimibe e

simvastatina (Vytorin). O estudo concluiu que o grupo que

tomou os dois princípios ativos teve uma redução maior

no nível de colesterol, mas não houve diferença no

tamanho da placa.”

É interessante notar que a Merck e Schering-

Plough escolheram uma data estratégica para a

divulgação de dados desfavoráveis – o inicio do ano

quando a maioria das pessoas está em recesso de fim de

ano.

Os efeitos colaterais das estatinas são muito

freqüentes. Muitos estudiosos admitem que 100% dos

usuários têm algum tipo de efeito colateral, pois a maioria

deles seria oculto (assintomático). Dentre os efeitos

aparentes mais freqüentes temos: perda de memória e

perda cognitiva; dor e disfunção muscular; insuficiência

Page 35: O Grande Conto Do Colesterol

cardíaca; fadiga; neuropatia, anemia; acidose; febre

freqüente; cataratas; disfunção sexual (American J.

Cardiovascular Drugs, 2008;8(6):373-418).

O pesquisador alemão Pfrieger mostrou que a

falta de colesterol no cérebro provoca bloqueio

sináptico. O colesterol é uma molécula que não

ultrapassa a barreira hematoencefálica. O cérebro

depende essencialmente da produção de colesterol pelas

células da glia que são muito sensíveis às

estatinas (Pfrieger F. Science, 9 November, 2001).

David Gaist acompanhou cerca de 116 pacientes

em uso de estatina e comprovou um risco de

polineuropatia de 16 vezes maior. Esse risco é mais

intenso no diabético (Gaist, David. Neurology, 58:1333-

1337, 2002)

Dentre os efeitos colaterais menos

freqüentes temos: risco aumentado de câncer; supressão

do sistema imune; pancreatite, disfunção hepática,

rabidomiólise (destruição do músculo estriado) (American

J. Cardiovascular Drugs, 2008;8(6):373-418)

Poderíamos classificar, em termos didáticos, os

efeitos colaterais de acordo com a substância bloqueada

pela estatina, mas geralmente os efeitos tóxicos envolvem

vários mecanismos.

Baixa de Esteroides: perda da libido, disfunção erétil,

Page 36: O Grande Conto Do Colesterol

osteoporose, perda de cabelo

Inibição Glial: amnésia focal e global, confusão mental,

desorientação, senilidade

Baixa da Coenz Q10:

Baixa produção de energia: fadiga crônica,

insuficiência cardíaca, retenção de liquidos, dispnéia

Perda da integridade de membrana: hepatite,

pancreatite, miopatia, neuropatia, rabidomiólise

Excessiva Oxidação: danos mitocondrial,

mitocondriopatia adquirida, neuropatia permanente,

miopatia permanente, neurodegeneração

Baixa de Dolicol:

Disfunção de neuropeptídeos: agressividade,

hostilidade, irritabilidade, comportamento homicida,

depressão, suicídio.

Alteração da síntese de glicoproteinas:

Disfunção em vários processos celulares:

identificação alterada da célula, alteração da mensagem

celular, defesa imune alterada

Bloqueio da Selenoproteina: neuropatia, deficit cognitivo

Calcula-se o custo do tratamento com estatinas,

em doses habituais, entre 900 and 1.400 US$ por ano. As

estatinas já são a categoria de medicamento mais

vendida no mundo (6,5%); significa um faturamento US$

12,5 bilhões/ano (2004). O uso de estatinas aumentou

Page 37: O Grande Conto Do Colesterol

156% entre 2000 e 2005. O número de usuários passou

de 15,8 milhões para 29,7 milhões . O gasto passou de

7,7 bilhões de US$ para 19,7 bilhões de US$, embora

mais de 900 estudos tenham sido publicados mostrando a

toxidade dessa droga e sua baixíssima eficácia.

No melhor resultado pró estatina até hoje

publicado o “WOSCOP clinical trial”, patrocinado pela

indústria farmacêutica, a redução do LDL significou uma

redução da taxa de mortalidade em 5 anos de 0,6%, ou

seja, 165 pessoas saudáveis deveriam ser tratadas por

cinco anos para se estender a vida de apenas uma

pessoa por outros 5 anos. O custo dessa vida seria por

volta de US$ 1,2 milhões. Num cálculo otimista, o custo

para salvar um ano de vida de uma pessoa com DC seria

de cerca de US$ 10 mil.

Em suma, a estatina, pelo seu potencial tóxico e

pela sua baixa eficácia, é talvez uma das drogas

mais non sense do arsenal terapêutico da medicina atual.

Ao invés de ser deixada de lado pelos médicos, tornou-se

a droga mais vendida e a categoria farmacêutica de maior

faturamento. Como se pode notar há algo de muito errado

com essa medicina.

A insistência na tese lipídica ao longo de mais de

60 anos não conseguiu convencer os estudiosos éticos da

alimentação humana. A medicina centrada na doença que

Page 38: O Grande Conto Do Colesterol

pouco sabe sobre a alimentação e sobre os grandes

processos que mantêm a vida no organismo, tornou-se

uma presa fácil do public relation da indústria

farmacêutica. Estamos diante de um grande “conto do

vigário” que repetido a exaustão ilude o ouvinte e passa a

ser real. O colesterol deixa de ser a substância

estratégica para o funcionamento do organimo e passa a

ser o grande vilão do adoecimento humano. Você acredita

nesse conto?

Referências:

1. Ravnskov, U : "The Cholesterol Myths"

2. Colpo, A : "The Great Cholesterol Con" . 2007

3. Hartenbach W: "Die Cholesterin-Luege" 2006

4. Kendrick, M. “The Great Cholesterol Con”. 2007

5. Ellison, Shane. “Hidden Truth about Cholesterol-

Lowering Drugs”

6. Graveline, Duane. “Lipitor: Thief of Memory and

Statin Drugs”. 2006

7. Graveline, Duane. Statin Damage Crisis. 2009