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Os Movimentos Sociais - Donatella Della Porta.
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4. Os movimentos sociais.
UM NOVO ACTO DA PARTICIPAÇÃO
A abordagem pessimista ao papel dos grupos em política tem sido alvo de desconfiança desde o
aparecimento, sobretudo a partir dos anos 60 do século XX, de um novo actor de participação: os movimentos
sociais. Se no final dos anos 40 tinham sido discriminados "o nível cruelmente descritivo do conhecimento e a
relativa falta de teorias" [Strauss, 1947, 352], nos estudos sobre movimentos sociais, e nos anos 60 se
lamentava a reduzida atenção pelas formas não-convencionais de participação [Killian, 1964, 426], já em
meados dos anos setenta a investigação sobre o argumento era considerada "uma das áreas mais vigorosas da
sociologia" [Marx e Wood, 1975]. No final dos anos 80 falar-se-ia mesmo de "uma explosão, na última
década, de escritos teóricos e empíricos sobre os movimentos sociais e a acção colectiva", salientando a
importância da investigação sobre o tema em disciplinas desiguais como a Sociologia, a Ciência Política, a
História, a Economia e a Ciência das Comunicações [Morris e Herring, 1987, 138].
UMA DEFINIÇÃO DE MOVIMENTO SOCIAL
O que são, acima de tudo, os movimentos sociais? O conceito de movimento social refere-se a:
a) redes de interacção, predominantemente informais, baseadas em:
b) crenças partilhadas e solidariedade, que se mobilizam sobre:
c) temáticas conflituais através de:
d) um uso frequente de várias formas de protesto [Della Porta e Diani, 1997, cap. 1].
UMA ORGANIZAÇÃO INFORMAL
Em primeiro lugar, os movimentos sociais podem ser considerados redes de relações informais entre
uma pluraridade de indivíduos ou de grupos, mais ou menos estruturados, do ponto de vista organizativo. Se
os partidos e grupos de pressão têm limites organizativos muito precisos, sendo a pertença sancionada por um
cartão de inscrição numa organização específica, os movimentos sociais compõem-se de redes dispersas e
debilmente ligadas e indivíduos que se consideram parte de um esforço colectivo. Embora existam
organizações que fazem referência aos movimentos, estes não são organizações, mas antes redes de relações
entre vários actores, que incluem com frequência, consoante as condições, organizações dotadas de uma
estrutura forma. Uma característica peculiar dos movimentos é exactamente o poder de lher pertencer, com o
que se sentem envolvidos num esforço colectivo, sem terem de aderir automaticamente a uma organização
especifica.
UMA NOVA IDENTIDADE
Estas redes de relações assumem a função fundamental de permitir a circulação dos recursos
necessários para a acção colectiva, favorecendo a elaboração de novas interpretações da realidade. Estas são
consideradas pertencentes a um movimento social no sentido de que os seus membros partilham um sistema
de crença, que alimenta novas solidariedades e identificações colectivas. É característica dos movimentos a
elaboração de visões de mundo e sistemas de valores alternados em relação aos dominantes: estes contribuem
"para a formação de um vocabulário e emergência de ideias e oportunidades de acção que no passado eram
desconhecidas ou mesmo inconcebíveis" [Gusfield, 1981, 325]. Por isso, os movimentos foram considerados
protagonistas da mudança social.
CONFLITOS EMERGENTES
Os valores emergentes estão, pois, na base da definição dos conflitos para os quais os actores se
mobilizam. Em particular a partir dos anos 70 do século XX, começou a falar-se de novos movimentos como
actores de novos conflitos. Se as análises marxistas tinham apoiado tradicionalmente a centralidade do
conflito capital-trabalho, as transformações do segundo pós-guerra aumentaram a relevância de critérios de
estratificação social - como a espécie ou a geração - não baseados na colocação de classe. Os estudiosos dos
novos movimentos concordam em salientar a menor relevância do conflito entre capitalistas e classe operária.
Como escreve o sociólogo francês Alain Touraine [1978], uma classe popular e outra superior tinham-se
encontrado no seio da sociedade industrial, como acontecera nas agrárias e mercantis, e estaria a suceder nas
nossas sociedade programadas, onde novas classes sociais (burocracias tecnocráticas e novas camadas médias
intelectuais) substituiriam capitalistas e classe operária como actores centrais do conflito. As sociedades
contemporâneas são descritas como sistemas altamente diferenciados, que investem recursos crescentes para
fazer dos indivíduos centros de acção autónomos, mas exigem uma integração crescente, estendendo o
controlo às próprias motivações da acção humana [Melucci, 1989]. Aí, novos movimentos sociais tentariam
opor-se à penetração do Estado e do mercado na vida social, para reivindicar a reapropriação da sua
identidade, o direito de realizar a sua privada e afectiva contra a manipulação omnicompreensiva do sistema.
A diferença de espécie, defesa do ambiente natural, convívio entre várias culturas são alguns dos temas em
volta dos quais se constituíram recentemente movimentos sociais.
O PROTESTO
Finalmente, os movimentos sociais caracterizam-se por adoptar formas "invulgares" de
comportamento público. Muitos estudiosos definem a distinção fundamental entre os movimentos e outros
actores sociais políticos na utilização da parte dos primeiros do protesto como modo de exercer pressão
política [Rucht, 1994]. Entende-se por protesto uma forma de acção não-convencional que interrompe a rotina
quotidiana [cfr. cap. 3]. Quem protesta volta-se em geral contra a opinião pública ainda antes de se voltar
contra os representantes eleitos ou a burocracia pública. Carecendo de canais de acesso às instituições, os
movimentos sociais tendem a utilizar os mass media como caixa de ressonância: daí a necessidade de formas
de acção invulgares para atrair a atenção [cfr. cap. 3]. Com efeito, os movimentos caracterizam-se por mover
uma crítica fundamental à democracia representativa, desafiando os pressupostos institucionais dos modos
convencionais de fazer política em nome da democracia representativa.