23
Outro Flávio Martins

Outro - rl.art.br · O que é escrever ? Escrever é divagar devagar sobre o que há, sobre o virassê, sobre mim, sobre todos, sobre tudo ou nada . É marchar num exército de milhares

  • Upload
    lytram

  • View
    214

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Outro

Flávio Martins

O que é a poesia senão a energia que gera coisas e que governa o mundo?

Janeiro de 2008

o que é escrever?

no início

amala

a roda

truly

arre

ê mané

pode ser

tramela

belíssima

O que é escrever ?

Escrever é divagar devagar sobre o que há, sobre o virassê, sobre mim, sobre todos, sobre tudo ou

nada . É marchar num exército de milhares querendo não ser apenas mais um. É declarar o amor às letras

ainda que custe a própria vida. Escrever é morrer por não escrever. É estando morto renascer um

pouquinho a cada linha escrita, a cada parágrafo “redondinho”. Escrever é trazer pra fora o que deveria

estar dentro mesmo que machuque. Escrever é dar à luz mesmo sendo estéril ou homem. É plantar um

livro e criar uma árvore. É buscar respostas para o que já foi respondido, mas não atende às minhas

ambições. Escrever é lutar contra um inimigo invisível ou contra moinhos de vento cada vez maiores e

cada vez mais desafiadores. É brigar com o texto que reluta em não sair, a frase que insiste em ser

simplista, ser lugar comum. Escrever é buscar traduzir o indizível, é fazer nascer o inesperado, é registrar

o pensamento, é esculpir os sentimentos através de uns sinais impressos num papel ou exibidos nessa

tela de computador. Escrever é tentar capturar essa fumaça que paira sobre nós e que nos envolve e nos

fascina. Tentar capturar as palavras, estas que estão por aí, nos esperando para dar-lhes forma e chamá-

las de literatura. Escrever só se faz assim, escrevendo.

No inícioNo início a música é um azeite que melodia

Sem ver, sem sentir, constrói sentidoÉ como uma fúria lancinante que amacia

Embala, sacode, aperta, embulir.Minha música é de acalento, minha loucura é uma fúria breve.

A ma la

A ma laA ma la ama rra da na ca maA ca ma mel ada de amorA ama que ama o amoAma ram Maria MarioMas o mal ah o malO mal me lou a me lo diaE no fim do diaNão mais a amouMe teu a mão na ma laE se man dou

Aararo

a rodaa rodadaa rodadoa roda dói

a roda doidaa roda roda

rodaa dor

a dor doídadoidadóidó

dor!

(...)And truly in the dwellings of brave men I want to stay, if there it be, though I am afraid that in such place there is much more loneliness than I have once wondered or that I can stand. If it is so, it has to be Hell-land. It has to be. (...)

aararearrearremearremetea rê metearremeterarremetidaa rê metidaarrearremearremedoarre medoar e medoarremedaarremedararre. MERDA!!!

Ê mané !

Ê mané, acorda manésua mulher fugiua pinga acaboua TV pifoucortaram a luzteu cachorro morreuchuva, chuva, fudeuteu barraco caiuacorda mané !!

e agora, Jesus?Ê manéSeus amigos, que amigos?Amigos não tensDinheiro não tensFamília não tensO Lula sumiuO Collor fugiu

A globo pariuO galo faliuAcorda mané !Acorda bené!Cadê sua alegriaSem bolsa-famíliaSem amor sem um mé?

Quer passar o tempo,Adiantar as horas,Correr contra o relógio,Mas no seu tempo já não há horasMorreste mané, perdeste juzé,Acabou benéPerdeste o boné, o emprego, o caminho,Estás sozinho, sem paz, nem ninhoSem casa, sem consolo, sem comidaSem banho eSem alma, chuléAcorda!

...

pode ser

pode ser um soldado que deu um tiro errado ou um dicionário que vivia no armáriopode ser

pode ser uma minhoca que comia uma pipoca ou uma menina anã que queria um sutiãpode ser

pode ser um vendedor que seria professor vendendo conhecimento calejado sofrimentopode ser

pode ser uma estrela que brilhava na esquerda agora em queda livre nem sabe se sobrevivepode ser

pode ser o violeiro que canta no terreiro uma canção de amor mas que fala de dorpode ser

pode ser uma criança que balança a pança enquanto brinca no quintal lá em Bacabaupode ser

pode ser uma mulher que coa o café, marido vai trabalhar nao sabe se vai voltarpode ser

pode ser um jogador que sente imensa dor querendo ser artilheiro atingido por um zagueiro deslealpode ser

pode ser aquela doença que mata quem pensa e faz dormir os abastados que vivem atordoados pelo poderpode ser

pode ser pode ser e é

O Saci já não quer fogo pro cachimbo, ele tem é fome.

Tramela

Uma flor sem cor,

um par de algemas sem chaves,

um estilete cego,

um espelho redondo,

um par de sapatos rotos,

um passarinho que não canta,

uma garrafa meio cheia,

uma corda bamba,

uma cabeça de boneca,

um bicho em pânico.

Um suicídio.

1,2,3,4,5,6...

Belíssima Gatinha atlética de profissão protética escrava da estética faz intervenção cirúrgica de lipoaspiração. Dá

tudo errado tratamento inadequado tava de casamento marcado fica em coma por três meses. Melhora

vai pra casa fica anoréxica não come é morfética faz exame está diabética não melhora se descobre

aidética.Parece continha de aritmética, com conta e resultado, mas é a vida. Ou melhor, era. Morreu aos

19 anos. Magérrima.

Labirintite. Parkinson e seborréia. Tudo na mesma cabeça, na mesma idéia, na mesma pessoa. Esse ser

possuído e dominado. Luta, briga, insiste e no final não sabe mais.

Então. Acabei por me saber fragmental.

Pedras, caminhos, estradas, destinos. Acho que vou demaiar.

Se não podes mudar o vento, mude sua vela.

Flávio Martins

[email protected]

www.favelacultural.blogspot.com

www.slideshare.net/technomatics

quem dorme cedo morre menos a cada dia.