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Sobre as correções monetárias nas contas de FGTS.

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MANIPULAO DE NDICES DE CORREO MONETRIA DO F.G.T.S. - ILEGALIDADE DO PROCEDIMENTO - DIREITO DO TRABALHADOR A RECUPERAR EM JUZO A DIFERENA ENTRE OS NDICES DA INFLAO REAL E DA INDEXAO ALTERADA - P A R E C E R.

MANIPULAO DE NDICES DE CORREO MONETRIA DO F.G.T.S. - ILEGALIDADE DO PROCEDIMENTO - DIREITO DO TRABALHADOR A RECUPERAR EM JUZO A DIFERENA ENTRE OS NDICES DA INFLAO REAL E DA INDEXAO ALTERADA - P A R E C E R.

IVES GANDRA DA SILVA MARTINS,Professor Titular de Direito Constitucional da Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie.

CONSULTA

Consulta-me, a Consulente, sobre questes relacionadas com o Fundo de Garantia de Tempo de Servio, formulando-me as seguintes perguntas:

"1) Quais as defasagens sofridas pelas contas vinculadas do FGTS, nos ltimos anos?

2) De que forma ocorreram referidas perdas financeiras e qual o montante percentual em detrimento do trabalhador?

3) Qual a forma de agilizao judicial e de quem a competncia para ressarcimento dos danos sofridos pelo trabalhador em suas contas vinculadas e, ainda, quem seria o responsvel direto na polaridade passiva?

4) Se h possibilidade de o Sindicato, na figura de substituto processual previsto na Constituio Federal, intentar a ao, em nome de seus associados".

RESPOSTA

A resposta, que principio a ofertar em relao s perguntas apresentadas, passa, necessariamente, pela anlise preliminar da razo pela qual o Fundo foi criado, a natureza da contribuio que o mantm e a necessidade da preservao do valor de peclio por ndices medidores da inflao, que correspondam mais aproximada aferio possvel (1) Escrevi: "A expresso correo monetria no feliz. A moeda no se corrige. O que se corrige seu valor, ou seja, sua expresso nominal.A insuficincia vernacular j fora detectada por Bernardo Ribeiro de Moraes e Rubens Gomes de Sousa. Gilberto de Ulha Canto e ns mesmos tivemos dificuldade com o Prof. J. van Hoorn de encontrar a melhor verso da palavra para o ingls. A soluo intermediria, que no nos agradou, "Monetary Indexation" pareceu-nos, entretanto, mais feliz que aquela adotada no Brasil. Isto porque a indexao passa a ter um referencial vlido que a moeda, distinto de outros referenciais.A indexao no Brasil adota uma plenitude de referncias (UPC, INPC, IGP e muitos outros), razo pela qual a terminologia clssica e universal seria mais adequada que aquela pelo Brasil hospedada.Correo monetria a reposio do valor da moeda, com seu aumento quantitativo correspondente equivalncia qualitativa para o perodo considerado. A maior quantidade de moeda nominal no provoca a maior qualidade de seu valor intrnseco, que o efetivamente corrigido para uma nova expresso monetria.Diz-se que a velocidade a diviso da distncia pelo tempo. Correo monetria a diviso de sua expresso monetria atual pela expresso anterior. Desta diviso resulta o ndice referencial do valor no corrodo, ou na formulao manipulvel das apuraes economtricas, o ndice elaborado e sua multiplicao pela expresso nominal anterior resulta a expresso nominal atual.Pela lei 6423/77 est a correo monetria jungida aos ndices da ORTN, salvo raras e expressas excees nela expostas. Vale dizer, a perda da substncia do valor intrnseco da moeda s pode ser corrigida pelos ndices das obrigaes reajustveis do Tesouro Nacional.O que pretendemos, de forma perfunctria, demonstrar que tal lei est em evidente conflito com os textos constitucionais sobre correo monetria. A adjetivao na Carta Magna contida, sobre ser desconhecida, passou a ser objeto de solues infants, quando no cnicas, de expurgos e manipulaes de economistas que, aps terem gerado a maior inflao da histria brasileira, sentem-se na obrigao moral de correo de seus desmandos e insuficincias, atravs do manuseio de dados oficiais, alimentando a inflao real, que todos suportam, e fabricando uma inflao oficial expurgada, que aquela que tem, por fora de lei, valor.Em dois momentos cuida a Constituio Federal da correo monetria (artigos 153 22 e 161). Esto os dispositivos assim redigidos:"Art. 153 ... 22 - assegurado o direito de propriedade, salvo o caso de desapropriao por necessidade ou utilidade pblica ou por interesse social, mediante prvia e justa indenizao em dinheiro, ressalvado o disposto no art. 161, facultando-se ao expropriado aceitar o pagamento em ttulo da dvida pblica, com clusula de exata correo monetria. Em caso de perigo pblico iminente, as autoridades competentes podero usar da propriedade particular, assegurada ao proprietrio indenizao ulterior"."Art. 161. A Unio poder promover a desapropriao da propriedade territorial rural, mediante pagamento de justa indenizao, fixada segundo os critrios que a lei estabelecer, em ttulos especiais da dvida pblica, com clusula de exata correo monetria, resgatveis no prazo de vinte anos, em parcelas anuais sucessivas, assegurada a sua aceitao, a qualquer tempo, como meio de pagamento at cinquenta por cento de imposto territorial rural e como pagamento do preo de terras pblicas"(grifos meus).Em ambas as menes a expresso correo monetria foi adjetivada pela palavra "exata". A adjetivao , portanto, o elemento nuclear da indexao mencionada. Objetiva proibir aventuras economtricas e garantir a patrimonialidade daqueles que esto sujeitos soberania nacional (residentes, no residentes e cidados)" (Correo monetria e a Constituio Federal, Rev. FESPI, Ilhus/BA, 1984, p.77/79).

1).

Foi o Fundo de Garantia criado pela lei 5107/66, objetivando substituir sistema anterior, que ao outorgar direitos trabalhistas dependentes de um peclio do trabalhador em mos da empresa para a qual prestava servios, ensejava longas discusses judiciais. As empresas sem provises adequadas para enfrentar as indenizaes trabalhistas, muitas vezes optavam pela demorada via judicial, objetivando retardar o pagamento da justa indenizao ou chegar a um acordo aviltante para o trabalhador, sempre com menos recursos para suportar uma longa demanda judicial que seus empregadores ((2) Os artigos 2 e 11 da Lei 5.107 tinham a seguinte dico: "Art. 2 - Para os fins previstos nesta Lei, todas as empresas sujeitas Consolidao das Leis do Trabalho (CLT) ficam obrigadas a depositar, at o dia 20 (vinte) de cada ms, em conta bancria vinculada, importncia correspondente a 8% (oito por cento) da remunerao paga no ms anterior a cada empregado, optante ou no, excludas as parcelas no mencionadas nos artigos 457 e 458 da CLT. nico. As contas bancrias vinculadas aludidas neste artigo sero abertas em nome do empregado que houver optado pelo regime desta Lei, ou em nome da empresa, mas em conta individualizada, com relao ao empregado no optante".

2).

O direito a um salrio por ano de servio ou a dois aps 10 anos, com direito estabilidade, revelou-se, com o tempo, um instrumento gerador de pleitos judiciais interminveis, sobre desproteger o trabalhador, detentor, em tese, da garantia de 1 ou 2 salrios mnimos por ano de servio, mas, na prtica, sem condies de exercer adequadamente seu direito.

A criao do Fundo de Garantia por tempo de servio, de rigor, retirou a administrao do "peclio" do trabalhador das mos da empresa passando-a para as do "Poder Pblico", de tal forma que, em vez de fazer, o empregador, proviso para futuras indenizaes trabalhistas, passou a depositar o percentual correspondente a esta eventual indenizao em Fundo pelo governo administrado (3) Amauri Mascaro Nascimento ensina: "No regime da Constituio de 1967 e da Lei n 5.107, de 1966, ao ser admitido em cada emprego, cabia ao trabalhador fazer uma opo entre o sistema do fundo de garantia e o sistema anterior, da indenizao e estabilidade aps dez anos de trabalho. Optando, no teria direito indenizao, substituda pelos depsitos do fundo de garantia, nem obteria estabilidade aos dez anos. Coexistiriam, no entanto, a situao de optante e as estabilidades provisrias, cujos fins so outros. A opo atingiria a estabilidade decenal.A Lei n 5.958, de 1973, instituiu a opo retroativa. O empregado podia optar com efeitos retroativos a partir de 1967, se j era empregado da mesma empresa nesta data, ou de data posterior, coincidente ou no com o incio da relao de emprego, nunca, porm, anterior a esse termo inicial, j que as opes so eficazes para cada vnculo empregatcio. garantido o direito de retratao, que significa a desistncia da opo, observados certos requisitos, como o tempo --uma vez que s pode ser manifestada dentro de trezentos e sessenta e cinco dias da opo-- de no-movimentao dos depsitos, j que o empregado levantou os depsitos do fundo de garantia no poder retratar, e a inexistncia de transao, do tempo anterior opo, com o empregador, isto , no tendo sido paga indenizao ao trabalhador pelo mesmo empregador para liquidar tempo de casa anterior opo. A figura da retratao est em desuso. A figura da opo, desvirtuada; transformou-se em imposio pelo empregador, condio mesma para a admisso do trabalhador" (Direito do Trabalho na Constituio de 1988, Saraiva, 1989, p.92/930.

3).

Com a proposta, reduzia-se sensivelmente o volume das discusses protelatrias voltadas mais para reduzir a pretenso dos trabalhadores ou retardar sua adimplncia, sempre que as empresas no tivessem provisionado recursos para tais indenizaes, ou, mesmo que provisionados contabilmente, tivessem sido obrigadas a utilizar-se de tais recursos, em face da fungibilidade da moeda de pagamento.

evidncia, tornando facultativa a adeso ao Fundo, a lei instituidora facilitou o acordo do passivo trabalhista estvel das empresas, a fim de criar sistema gil e seguro para a relao entre empregadores e empregados.

O que cumpre realar que a idia matriz da criao do Fundo foi assegurar, atravs do poder pblico, o direito dos trabalhadores a uma indenizao real correspondente a aproximadamente um salrio por ano de trabalho, em caso de despedida injusta, sobre permitir a formao de peclio para a retirada do trabalho, alm do direito de sacar recursos do Fundo em determinadas hipteses elencadas na lei (4) Evaristo de Moraes Filho e Antonio Carlos Flores de Moraes esclarecem: "O Fundo de Garantia do Tempo de Servio foi criado entre ns pela Lei n 5.107 de 13/9/66, alterada pelo Decreto Lei n 20 de 14/9/66, regulamentados, respectivamente, pelos Decretos ns 59.820 de 20/12/66 e 61.405 de 28/9/67. Posteriormente, a matria passou a ser regida pela Lei n 7.839 de 12/10/89, que revogou a de n 5.107/66, e pelo Decreto n 98.813 de 10/01/90. Atualmente, o FGTS passou a ser regido pela Lei n 8.036 de 11/5/90, a qual revogou a de n 7.839/89, regulamentada pelo Decreto n 99.684, de 8/11/90.Com a criao do FGTS, a lei previu, de nicio, a situao do trabalhador com contrato vigente. Este, optando pelo novo sistema, passaria a ser regido por ele a partir da data da opo e, pelo antigo, antes dela. O trabalhador admitido aps a lei, optaria, no ato de sua admisso, por um dos dois sistemas.Na prtica, entretanto, o tratamento dado ao trabalhador no foi exatamente o previsto na lei. Isto porque a maioria das empresas, considerando o novo sistema mais vantajoso para elas, porquanto tornava inaplicvel o instituto da estabilidade, passou a pressionar o empregado no sentido de "optar". A "opo" passou a ser, at mesmo, condio para ser admitido em determinadas empresas. O empregado antigo, sem estabilidade, foi obrigado a "optar", sob pena de perder o emprego.Desta forma, s uma minoria, com estabilidade na data da criao do FGTS, pode optar pelo regime antigo e nele permanecer at hoje, porque a prpria lei, na ocasio, garantiu os direitos adquiridos.A Constituio de 1988 veio a adequar a lei realidade, adotando o FGTS como sistema indenizatrio nico. Resguardou, apenas, direitos adquiridos quanto aplicao do sistema antigo (art. 14, Lei n 8.036/90).Assim, aps a Constituio de 1988, terminou definitivamente a possibilidade de opo pelo regime antigo, passando o FGTS a ser o nico sistema indenizatrio do Pas, com exceo de trs hipteses: a) os empregados no optantes que tenham adquirido o direito estabilidade antes da data da promulgao da Carta Magna;b) o tempo de servio dos empregados no optantes, mesmo sem estabilidade, relativo ao perodo anterior a 5/10/88, especialmente os rurculas;c) a indenizao compensatria, devida na hiptese de despedida arbitrria" (Introduo ao Direito do Trabalho, 5 ed., Ed. LTr, 1991, p.355).

4).

Em outras palavras, sobre melhorar o direito do trabalhador a uma justa indenizao, as leis 5107/66 e posteriores asseguraram-lhe ter sempre um peclio pelo tempo de servio, fosse ou no despedido injustamente. O Poder Pblico substituiu a empresa na administrao dos recursos que, a partir da lei 5107/66, passaram a pertencer ao trabalhador e no mais ao empregador ou ao Estado. Por ela, a empresa deixou de administrar o "peclio" do trabalhador e o Poder Pblico principiou a administrar recursos, que no lhe pertenciam, pois da titularidade dos trabalhadores.

Por todo o exposto, verifica-se que a idia de substituir a garantia conjuntural por uma garantia definitiva norteou a criao do FGTS, passando o governo a ser um mero administrador de recursos, direta ou indiretamente, que no lhe pertenciam, mas exclusivamente aos trabalhadores, reais detentores das contas colocadas em mos do BNH, no princpio, e da Caixa Econmica Federal, depois, e de seus agentes financeiros (5) Celso Ribeiro Bastos lembra, na linha de outros doutrinadores, que: "O Fundo de Garantia do Tempo de Servio tem o seu nascimento atrelado deciso governamental de suprimir o antigo sistema da estabilidade. Como j vimos no inc. I deste artigo, o direito de permanncia no emprego vinha apresentando diversas deficincias, tais como fraudes, levadas a efeito atravs de negociaes ocultas, camufladas por uma forma de demisso espontnea; despedidas obstativas da aquisio da estabilidade e problemas psicolgicos de toda sorte a envenenar as relaes dentro da empresa.Num primeiro momento, pensou-se na mera criao do seguro-desemprego, mas ao depois partiu-se para uma idia mais ampla, porque nela passaram a entrar inclusive ingredientes de ordem financeira.
A partir de 1964, altera-se profundamente a poltica econmica do Pas, e o Estado passa a intervir de forma decisiva na conduo da economia. Nessas condies, viu-se a convenincia da instituio de um grande fundo, a ser administrado pelo Banco Nacional de Habitao, formado pelas contribuies mensais e obrigatrias do empregador. Esses depsitos, feitos em nome do empregado, so levantados por ocasio de sua dispensa, nisto constituindo, pois, a indenizao. certo que reaes havidas contra a supresso da estabilidade levaram a uma alterao da tese originria, mantendo-se a estabilidade para os que no optassem pelo novo sistema.A experincia posterior, em grande parte, demonstrou que a opo no era real. Em outras palavras, a opo pela legislao do Fundo de Garantia tornava-se obrigatria --no juridicamente, obvio, mas pelas circunstncias que enredavam a admisso do empregado--, o que fazia com que o empregado fosse naturalmente conduzido a fazer a opo permitida pelo novo sistema. No entanto, a regra geral continuava a ser a da aplicabilidade das normas anteriores, isto , a estabilidade segundo a CLT.Tanto assim que bastava o seu silncio para que se desse a aplicao da Constituio" (Comentrios Constituio do Brasil, 2 volume, Saraiva, 1989, p.418/419).

5).

Por outro lado, em um pas de elevada inflao, caberia ao governo, depositrio do dinheiro dos trabalhadores, garantir a indexao adequada para que o peclio, sobre no perder substncia monetria, pudesse propiciar um mnimo de rentabilidade e segurana ao seu titular.

Em outros termos, caberia, por imposio da lei, que a correo monetria fosse, o mais possvel exata -a exatido absoluta impossvel- a fim de que o peclio do trabalhador fosse preservado pelo Poder Pblico ((6) Geraldo de Camargo Vidigal ensina: "Ao longo do processo de substituio do regime nominalista por sistemas de restaurao do valor real das obrigaes, ao longo da experincia do processo inflacionrio, evoluiu progressivamente a jurisprudncia acompanhando, complementando, preenchendo claros da legislao. Da interpretao e do acolhimento que inicialmente tiveram as leis impondo solues de correo monetria, evoluram, gradativamente, os Tribunais, para o acolhimento da estipulao contratual de correes monetrias e para a definio jurisprudencial do direito correo de dbitos injustamente esvaziados pela desvalorizao da moeda. Os velhos critrios que distinguiam entre dvidas de dinheiro e dvidas de valor - estribados quer nas normas do CC que determinavam, em numerosas hipteses, a restituio de bens ou a do valor correspondente na data do pagamento, fundados quer na equiparao dos danos por ato ilcito s dvidas de valor, quer em antigas teorias doutrinrias de impreviso ou na doutrina de que nos contratos se deve entender implcita a clusula "rebus sic stantibus" - floresceram em incorporao gradual de diferentes figuras de dano esfera das que deveriam abranger-se na concesso de correo monetria, j pela extenso, aos danos materiais, de proteo que, inicialmente, s danos pessoais recebiam; j pela ampliao do significado da expresso "dvidas de valor" para abranger todas as indenizaes; j para abranger, no mbito das correes monetrias, as responsabilidades por impontualidade" (A Correo Monetria no Direito Brasileiro, Ed. Saraiva 1983, pg. 292).

6).

Sendo o Poder Pblico o administrador dos recursos do cidado, um trabalhador que tivesse trabalhado 10 anos recebendo o mesmo salrio, teria direito a receber do FGTS, se despedido injustamente, 10 salrios e os juros correspondentes remunerao do capital, com o que o sistema adotado, em regime de inflao, preservaria o valor dos depsitos pela correo monetria.

O princpio garantido na legislao mencionada tinha ainda maior relevncia em nvel de garantia, visto que a indexao reequilibradora da moeda em face da inflao era determinada pelo prprio Poder Pblico, de tal forma que a seriedade de sua correta aferio ofertava ao trabalhador a certeza de que seu peclio indenizatrio mantinha-se rigorosamente assegurado em seus valores reais, independente de manipulaes (7) Arnoldo Wald preleciona: "A correo monetria no , no caso, uma reviso, mas uma atualizao, ou seja, nada se modifica, mantendo-se, ao contrrio, a relao originria na sua pureza, afastando as distores decorrentes da depreciao monetria. Neste sentido, muito feliz a expresso introduzida no direito nacional pelo Prof. Hely Lopes Meirelles quando fala em recomposio de preos, significando o restabelecimento dos preos originrios devidamente atualizados. Alis, o STF teve o ensejo de salientar a distino bsica entre os juros e a correo, esclarecendo que esta no era um acrscimo, um plus, um acessrio, mas sim a prpria dvida atualizada, retificada na sua expresso monetria, ou seja, o dbito no seu aspecto dinmico" (A Correo Monetria no Direito Brasileiro, Ed. Saraiva, 1983, pg.19).

7).

De lembrar-se que, pela lei n. 5107/66, cujo princpio est reproduzido na atual, as empresas passaram a depositar o correspondente a exatamente 8% do salrio no Fundo de Garantia, todos os meses, a fim de assegurar a tranquilidade que o trabalhador poderia no ter, ao tempo em que estava sujeito a receber da empresa o correspondente indenizao de 1 ou 2 salrios por ano.

Pelo sistema adotado, as empresas desde 1966 passaram a depositar o correspondente a aproximadamente 1/12 do salrio anual indenizatrio, sendo este o valor real no momento do depsito, garantindo a Administrao Pblica, a correo monetria mais juros at o seu saque pelo trabalhador, o verdadeiro detentor do depsito (8) Manoel Gonalves Ferreira Filho, utilizando-se do vocbulo "peclio" refere-se ao Fundo de Garantia nestes termos: "Fundo de Garantia. Foi a Constituio de 1967 (art. 158, XVI; Emenda n. 1/69, art. 165, XIII) quem, por primeiro, previu o "fundo de garantia". Foi ele previsto como um dos instrumentos pelos quais se efetivava a garantia de emprego, sendo o outro a indenizao por tempo de servio. A vantagem do fundo de garantia em relao a esta era ser o seu montante acessvel ao empregado que perdia o emprego, independentemente de ser justa ou no a sua despedida (a indenizao s caberia se a demisso fosse sem justa causa). Para o empregador, o fundo de servio, constitudo de contribuies peridicas, permitia que dispensasse o empregado sem arcar com maiores nus, como os decorrentes de uma eventual indenizao. A Constituio em vigor desvinculou a garantia de emprego do fundo de garantia. Aquela se efetiva nos termos do disposto no inc. I deste artigo; este dado a todos, nos termos da lei regulamentadora, que fiquem sem emprego depois de terem estado empregados. Toma assim o fundo de garantia o carter de um peclio acumulado pelo trabalhador durante o perodo em que trabalha, cuja percepo independe da indenizao, agora sempre devida em caso de despedida arbitrria ou sem justa causa, e no exclui a percepo, ocorrendo o desemprego, do respectivo seguro" (Comentrios Constituio Brasileira de 1988 - Volume 1, Saraiva, 1990, pg. 93/94).

8).

Como se percebe, ao substituir, o Poder Pblico, a empresa e ao garantir a exata correo monetria, passou a ofertar segurana que o segmento privado no ofertava.

evidncia, todo o sistema passou a alicerar-se:

a) na "no manipulao" dos ndices aferidores da inflao;

b) na adequada aplicao dos recursos administrados;

c) na possibilidade de o trabalhador levantar com rapidez seus direitos, sempre que despedido injustamente ou nas hipteses legais (9) O "caput" do artigo 184 da Constituio Federal ao fazer meno correo monetria reala a necessidade de "preservao do valor real da moeda". Embora dirigido poltica agrria o princpio vlido para todo o ordenamento jurdico nacional, sempre em que no plo ativo da relao contratual estiver o Poder Pblico. Est assim redigido: "Compete Unio desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrria, o imvel rural que no esteja cumprindo sua funo social, mediante prvia e justa indenizao em ttulos da dvida agrria, com clusula de preservao do valor real, resgatveis no prazo de at vinte anos, a partir do segundo ano de sua emisso, e cuja utilizao ser definida em lei" (grifos meus).

9).

De longe, o primeiro fundamento era e o mais importante, visto que a manipulao de ndices pode implicar na apropriao de recursos do trabalhador pelo governo e pelo sistema, sem contrapartida, o que retiraria no s sua seriedade, mas a prpria razo de ser e a garantia que a lei procurou ofertar aos assalariados.

Reconheo que h dificuldade para a medio exata da inflao, mas uma medio aproximada perfeitamente possvel, razo pela qual, ao referir-me manipulao de ndices, referi-me quela manipulao grosseira, detectvel inclusive pelos no especializados, que transforma os ndices medidores em fantasiosos, monstruosos e falsos (10) lvaro Vilaa de Azevedo lembra que: "Breves consideraes e conceito de correo monetria - A correo monetria pertence Cincia Econmica e no se fez prevista, em nosso Cdigo Civil, tendo este acolhido o princpio do nominalismo, que mostra o interesse obrigacional como retratado no ttulo, nominado, estipulado, certo. O princpio da correo monetria, contudo, o da ampla indenizao, existindo com um sentido de justia, pois nivela as desigualdades econmicas. Como conceituamos, em nossa Teoria Geral das Obrigaes (ob. cit., pg. 322), a expresso correo monetria apresenta-se como um corretivo, que "tem por objeto manter atualizada, no tempo, em seu valor, determinada espcie de moeda" (Estudos de Direito Civil - Edit. Rev. dos Tribunais, 1979, pg. 232/233).

10).

Antes de passar a responder s questes formuladas, mister se faz uma rpida considerao sobre a contribuio ao FGTS.

Trata-se de uma contribuio social. So as contribuies especiais divididas em 3 espcies: de interveno no domnio econmico, no interesse das categorias profissionais e as sociais. Sempre tiveram natureza tributria.

O S.T.F., todavia, entre 1977 e 1988, entendeu que as contribuies sociais no seriam tributos, por fora da retirada de sua enunciao do captulo especfico do sistema tributrio e pela distino entre "tributos" e "contribuies sociais" no artigo 43 inciso X do texto pretrito (11) Escrevi: "Nosso entendimento, portanto, como da esmagadora maioria dos especialistas, o de que as contribuies sociais e as demais contribuies albergadas pelo Sistema tm natureza tributria, no tendo a retirada do captulo especfico, pela EC 8/77, daquelas tidas por sociais, representado qualquer perda de suas caractersticas fiscais. Todas as contribuies especiais, a nosso ver, continuam tendo natureza tributria dentro do sistema constitucional ptrio. Por que razo as contribuies manteriam tais caractersticas? Em funo de dois princpios inerentes ao Direito Tributrio, quais sejam: o da concreo sistmica e o da estruturalidade orgnica. Pelo primeiro princpio, se as regras gerais, que conformam a imposio tributria na Constituio Federal, no so alteradas, havendo apenas deslocao topogrfica de dispositivos no campo normado, as regras gerais prevalecem sobre a alterao formal, mormente considerando-se que o prprio desenho superior no comprime todas as disposies tributrias a um nico captulo. Com efeito, os princpios tributrios esto espalhados por toda a Constituio e no apenas concentrados no captulo sobre o sistema tributrio, de tal forma que a mera deslocao espacial nenhuma importncia oferta sua incluso, ou no, dentro do sistema. Em nvel constitucional, apenas se retiraria a natureza tributria das contribuies sociais houvesse o constituinte na referida emenda declarado que, a partir daquele comando, tais contribuies deixariam de ter natureza tributria. E tal no sucedeu. E tal no sucedendo, evidncia, as regras gerais que norteiam a conformao de todos os tributos terminam prevalecendo, visto que sua concreo sistmica s espcies espalhadas pelo texto constitucional continuou a mesma, antes e depois do deslocamento posicional das alteraes. Tais modificaes, portanto, luz de tal princpio so vistas como aperfeioamento expressional e no como alterao funcional e finalstica da norma. O segundo princpio examinado luz inversa, na medida em que a estruturalidade orgnica que determina a natureza intrnseca do tributo. Em outras palavras, no se examina o tributo sob o prisma das regras que lhe so aplicveis, mas contrariamente a estrutura intrnseca da matria sobre a qual incidir a norma que determina sua natureza jurdica. O art. 4 do CTN bem apreendeu a importncia do princpio da estruturalidade orgnica, ao explicitar, em nvel de norma geral, o seguinte: "Art. 4. A natureza jurdica especfica do tributo determinada pelo fato gerador da respectiva obrigao, sendo irrelevantes para qualific-la: "I - a denominao e demais caractersticas formais adotadas pela lei; "II - a destinao legal do produto da sua arrecadao" Ora, se a estrutura orgnica de matria tributvel que lhe empresta sua natureza jurdica, evidncia, sempre que tal estrutura se conformar s regras gerais que hospedam os princpios prprios do Direito Tributrio, sua natureza jurdica estrutural s pode ser tomada como tributria. As regras gerais no podem considerar, de um lado, como tributrias determinadas imposies, nem podem ter determinadas situaes os contornos definidos em lei como fiscais e, no obstante tal dupla viso fenomnica indicar a natureza daquela situao e da incidncia pertinente, pretender o intrprete que tal realidade no seja tributria. Ela tributria, em funo dos princpios, irrelevante o aspecto formal e acessrio do deslocamento indicativo no corpo legislativo constitucional" (Manual de Contribuies Especiais, volume 2, Ed. Rev. dos Tribunais, 1987, pg. 32/35).

11).

Aps a Constituio Federal de 1988, a dvida desapareceu e voltaram, em nvel de direito positivo, a ter natureza tributria, por fora do artigo 149 ((12) O artigo 149 da Constituio Federal tem o seguinte discurso: "Art. 149 - Compete exclusivamente Unio instituir contribuies sociais, de interveno no domnio econmico e de interesse das categorias profissionais ou econmicas, como instrumento de sua atuao nas respectivas reas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuzo do previsto no art. 195, 6, relativamente s contribuies a que alude o dispositivo. Pargrafo nico. Os Estados, o Distrito Federal e os Municpios podero instituir contribuio, cobrada de seus servidores, para o custeio, em benefcio destes, de sistemas de previdncia e assistncia social".

12).

A contribuio que os empregadores fazem ao FGTS , portanto, uma contribuio tributria e sua sonegao pode ensejar penalidades severas como determinam as leis 4729/85 e 8137/91.

Desta forma, a lei, sobre garantir ao trabalhador a administrao pelo Estado de seu "peclio indenizatrio", alicerado numa exata correo monetria com mdica remunerao, pune severamente o empregador que deixar, de forma fraudulenta, de recolher o tributo devido ao FGTS ((13) Ives Gandra da Silva Martins Filho, ao referir-se Smula 98 do T.S.T., esclarece: "O Fundo de Garantia do Tempo de Servio foi institudo pela Lei 5.107, de 13/9/66, num esforo de aperfeioamento do sistema vigente de indenizao por tempo de servio, quando vigia a Constituio de 46, que contemplava apenas a possibilidade da estabilidade no emprego, nos termos de seu art. 157, que estabelecia: "A legislao do trabalho e a da previdncia social obedecero aos seguintes preceitos, alm de outros que visem melhoria da condio dos trabalhadores:"...XII - estabilidade, na empresa ou na explorao rural, e indenizao ao trabalhador despedido, nos casos e nas condies que a lei estatuir".A lei ordinria, no caso a CLT, assegurava a estabilidade no emprego nos seguintes termos:"Art. 492 - O empregado que contar mais de 10 anos de servio na mesma empresa no poder ser despedido seno por motivos de falta grave ou circunstncias de fora maior, devidamente comprovadas".Enquando no Direito Comparado a tendncia maior no sentido de se anular a despedida arbitrria, em especial no caso do estvel, com a respectiva reintegrao no emprego, no Brasil criou-se um sistema de desestimular essas dispensas, mediante estabelecimento de vultosas indenizaes.Apresentava, no entanto, o instituto da estabilidade flagrantes pontos fracos. Como estabilidade apenas se chegava aos 10 anos de servio, a antecipao da dispensa, com o fito de impedir o empregado de alcanar o direito, tornara-se frequente. Mais: a simulao de acordos em fraude estabilidade passou a ser a regra geral nas empresas. Contribua para a formao de tal situao a verificao prtica do declnio de produtividade do trabalhador estvel, transformando-se a estabilidade, aos olhos do empregador, em escudo protetor de maus empregados.Verificou-se, portanto, que estava havendo uma abolio prtica da estabilidade, sendo que, em termos at estatsticos, o instituto no estava atingindo sua finalidade, uma vez que no chegava a 15% o nmero de empregados no Brasil que atingiam a estabilidade, quando seria de esperar que o bem da garantia de emprego se estendesse a um percentual muito maior da fora de trabalho nacional.Necessrio se fazia uma reforma. Em vez de sanar e corrigir o sistema vigente, preferiu o Poder Pblico criar uma nova sistemtica que, a princpio, iria substituir pura e simplesmente a estabilidade, mas que, pela aprovao do Projeto de Lei 10, que se transformou na Lei 5.107/66, foi introduzida para funcionar paralelamente ao antigo instituto. Caberia ao empregado optar entre eles.Como a ento vigente Constituio de 46 contemplava apenas o direito estabilidade no emprego e, nos termos da Lei 5.107/66, a opo pelo sistema do Fundo de Garantia do Tempo de Servio exclua a possibilidade de se vir a conseguir a estabilidade, a lei foi taxada de inconstitucional, uma vez que a opo obrigava renncia de um direito constitucionalmente assegurado.Com a Constituio de 67, e as alteraes trazidas pela EC 1/69, o propalado vcio teria sido sanado, pela incluso no texto constitucional do sistema do Fundo de Garantia do Tempo de Servio, frizando-se a idia de equivalncia entre este e o instituto da estabilidade.Assim, passou a dispor a Lei Maior, em seu artigo 165, que "a Constituio assegura aos trabalhadores os seguintes direitos, alm de outros que, nos termos da lei, visem melhoria de sua condio social: ...XIII - estabilidade, com indenizao ao trabalhador despedido ou fundo de garantia equivalente".O problema que se colocava ento era o da equivalncia entre os dois sistemas, uma vez que, matematicamente, esta inexistia, bastando ver que, para o empregado com mais de 10 anos de casa, os depsitos do FGTS so bastante inferiores indenizao que teria no sistema da CLT (dobrada).No dizer de Dlio Maranho, "sustentou-se a equivalncia econmica entre ambos os sistemas. O Tribunal Superior do Trabalho, atravs da Smula 98, entendeu que essa equivalncia "meramente jurdica", tirando da a consequncia de serem "indevidos quaisquer valores a ttulos de reposio de diferena". Ora bem. O empregado, ao optar pelo FGTS, renuncia estabilidade ou possibilidade de vir a obt-la. E f-lo, obviamente, por aceitar, como vantajosa, a substituio dessa garantia, prevista pela Consolidao, por outras prprias do sistema do FGTS. A equivalncia referida no art. 165, XIII, da Constituio entre a estabilidade e o Fundo de Garantia. Claro est que essa equivalncia , realmente, apenas jurdica, no sendo possvel quantificar, economicamente, os direitos estabilidade e as vantagens decorrentes da opo" (Manual de Contribuies Especiais, ob. cit., p.55/57).

13).

Feitas tais consideraes, passo pois a responder s questes formuladas.

Nada obstante tudo o que atrs disse e apesar de ter sido a inteno do legislador preservar o patrimnio do trabalhador nas despedidas, infelizmente o Governo Federal no tem honrado o desiderato legislativo, transformando-se, desde a criao do FGTS, em apropriador indbito do dinheiro dos trabalhadores ((14) nitidez, a apropriao indbita a que me refiro no a tipificada no direito penal. A semelhana, todavia, com a explicao de Bento de Faria sobre aquela plasmada no Cdigo Penal de 1890 marcante: "O Cdigo Penal de 1890, ora revogado, considerando -a apropriao indbita- como modalidade do crime de furto, a reputava existente quando algum convertia em proveito prprio, ou de outrm, coisa alheia mvel que ao mesmo tivesse sido confiada ou consignada com a obrigao de restituir ou de fazer uso determinado", acrescentando: "O dispositivo vigente, embora, evidentemente conceitue como "furtum improprium", limitou-se a punir quem se apropria de coisa alheia mvel de que tem a posse ou deteno, sem aludir ao proveito ou condio do uso determinado. Basta, portanto, em excluir essas possibilidades, que a apropriao se verifique nos termos supra referidos, pouco importando que ao agente fosse, ou no, imposto um uso especial ou que o resultado do ato criminoso lhe seja proveitoso" (Cdigo Penal Brasileiro, vol. IV, pgs. 111/112, 1943).

14).

Sempre que os ndices da correo monetria foram manipulados, o Governo Federal apropriou-se de dinheiro do trabalhador, do qual era administrador pelo BNH e, depois, pela Caixa e seus agentes financeiros, de forma definitiva, dilapidando seu patrimnio de forma ilegal, atica e irresponsvel (15) A lei 8.036/90 explicita em seu artigo 7 que: " Caixa Econmica Federal, na qualidade de agente operador, cabe: I. centralizar os recursos do FGTS, manter e controlar as contas vinculadas e emitir regularmente os extratos individuais correspondentes s contas vinculadas e participar da rede arrecadadora dos recursos do FGTS; II. expedir atos normativos referentes aos procedimentos administrativos operacionais dos bancos depositrios, dos agentes financeiros, dos empregadores e dos trabalhadores, integrantes do sistema do FGTS; III. definir os procedimentos operacionais necessrios execuo dos programas de habitao popular, saneamento bsico e infra-estrutura urbana, estabelecidos pelo Conselho Curador com base nas normas e diretrizes de aplicao elaboradas pelo Ministrio da Ao Social; IV. elaborar as anlises jurdicas e econmico-financeiras dos projetos de habitao popular, infra-estrutura urbana e saneamento bsico a serem financiados com recursos do FGTS; V. emitir Certificado de Regularidade do FGTS; VI. elaborar as contas do FGTS, encaminhando-as ao Ministrio da Ao Social; VII. implementar os atos emanados do Ministrio da Ao Social relativos alocao e aplicao dos recursos do FGTS, de acordo com as diretrizes estabelecidas pelo Conselho Curador. nico. O Ministrio da Ao Social e a Caixa Econmica Federal devero dar pleno cumprimento aos programas anuais em andamento, aprovados pelo Conselho Curador, sendo que eventuais alteraes somente podero ser processadas mediante prvia anuncia daquele colegiado".

15).

Em 1972, a Justia decidiu que a inflao real foi de 15% e o governo corrigira seus ndices em 12% ao ano. No ano de 1980, contra uma inflao de 100%, a Unio imps uma correo de 54%. Apenas de 1975 a 1985, a correo monetria foi 3 vezes inferior inflao, com o que todos os trabalhadores brasileiros com dinheiro depositado no FGTS foram expropriados, para no utilizar expresso mais pesada, em 2/3 de seu patrimnio. Apenas a Ministra Zlia, em dois meses, retirou parcela substancial daquele patrimnio, pois, contra uma inflao de 82% em maro de 1990, corrigiu os depsitos dos trabalhadores em 41% e, contra uma inflao de 22% em Abril, corrigiu-os em 0%.

Desta forma, criado o FGTS para ser administrado pelo Estado para proteo do trabalhador, tem sido o trabalhador pelo Governo confiscado, ano aps ano, de tal forma que seu "peclio indenizatrio" foi fantasticamente dilapidado pela incria, incompetncia e irresponsabilidade dos governos, que por no administrarem adequadamente o "deficit" pblico, de tempos em tempos, alteraram seus ndices de correo, reduzindo, por tal imoral artifcio, o volume de sua dvida com a sociedade (16) Antoninho Marmo Trevisan, em seu livro "Da sistemtica de correo monetria ao balano em moeda constante" (Ed. particular, 1985), apresenta o seguinte quadro demonstrativo da perda de substncia dos ndices oficiais em face da inflao e do dlar:

"ESTATSTICA ANUAL - NDICE

IGP-DI ORTNAno ndice Variao % ndiceVariao

1975 55,9 29,4 103,93 24,21976 81,7 46,2 179,68 37,31977 113,4 38,6 233,74 30,01978 159,7 40,8 318,44 36,21979 283,0 77,2 468,71 47,21980 595,0 110,2 706,70 50,81981 1.161,3 95,2 1.382,09 95,61982 2.319,4 99,7 2.733,27 97,71983 7.213,2 211,0 7.012,99 156,61984 23.357,1 223,8 22.110,46 215,31985* 40.709,1 74,3 42.031,56 90,1

Diferena Taxa InflaoIGP versus do dlar (venda) USA

Ano ORTN ndice Variao % Variao %

75 5,2 9,7 22,0 9,276 8,9 12,345 36,1 5,877 8,6 16,05 30,0 6,578 4,6 20,92 30,3 7,579 30,0 42,53 (1)103,3 11,080 59,4 65,5 54,0 13,581 (0,4) 127,8 95,1 10,482 2,0 252,67 97,7 3,983 54,4 984,0 (1)289,4 3,4 84 8,5 3.184,0 223,6 4,085 (15,8) 5.980,0 87,18 (2)1,9

(1) Maxidesvalorizao do cruzeiro(2) At maio de 1985 (IPC)

Variao acumulada dos ltimos 10 anos- IGP 942,3 vezes- ORTN 398,7 vezes- Dlar 804,8 vezes- Diferena IGP/ORTN = 136%

(*) At junho (p. 54)".

16).

No caso do FGTS a manipulao mais grave por no ter o trabalhador a alternativa de retirar seu dinheiro, apenas possvel nas expressas hipteses legais. As empresas pagam o correspondente a um salrio anual de indenizao, mas tal pagamento, em parte, fica para o empregado e, em parte apropriado pelo governo e seus agentes, reduzindo-se dramaticamente aquela reserva que o legislador pretendeu fosse intocvel.

Desta forma, o sistema criado, embora melhor na lei, que o sistema anterior, revelou-se autntica armadilha para o trabalhador, fraudado anualmente pelas manipulaes oficiais em busca de reduzir os "deficits" pblicos, no pela competncia administrativa de reduo de despesas, mas pela irresponsabilidade gerencial da administrao dos ndices medidores da inflao.

Como a lei, todavia, objetivou garantir o trabalhador em seu direito a 8% de salrio por ms de trabalho mais os juros remuneratrios, evidncia, a irresponsabilidade das manipulaes so ilegais, posto que implicaram sensvel reduo do patrimnio de todos os trabalhadores brasileiros que optaram por tal forma de "reserva indenizatria", desde que institudo o FGTS (17) Jos Martins Catharino escreve sobre o FGTS: "Lembremo-nos destas palavras de Albert Einstein, inseridas na nossa obras "O trabalhador rural brasileiro", de 1953: 'Para o prestgio de um Estado e para o de uma lei, nada h mais perigoso do que promulg-la e no estar em condies de impor o seu cumprimento'" (FGTS e a nova constituio, Repertrio IOB de Jurisprudncia, 1 quinzena de jan./89, n. 1/89, p. 16).

17).

Entendo, pelo prisma do que expus at o presente, que a Unio responsvel por tais manipulaes, devendo, sempre que pleito se colocar em juzo, devolver, atravs de sua controlada Caixa Econmica Federal, aos trabalhadores a diferena que retirou, por fora das manipulaes, de seu peclio indenizatrio. Em outras palavras, a "apropriao indbita" da diferena entre a correo monetria real e aquela manipulada, continua a pertencer aos trabalhadores, devendo ser reposta pela Unio sempre que pleitearem em juzo sua devoluo.

Em resumo, posso afirmar que a Unio, deliberadamente, ao manipular os ndices, apropria-se das reservas dos trabalhadores, de forma ilegal, causando-lhes prejuzos considerveis (18) A Caixa Econmica Federal assumiu as funes e responsabilidades do BNH, quando de sua extino. Sobre ser a Justia Federal competente para exame dos pleitos contra os rgos operadores do FGTS, leia-se a seguinte ementa: "Sendo o Banco Nacional da Habitao-BNH, o rgo gestor do fundo, a competncia da Justia Federal, de acordo com o art. 125, I, da E.C. 1/69, que revogou a parte final do art. 22 da lei 5107/66. (STF, RE-111.296-CE - Ac. 2 T., 24/3/87, Rel. Min. Djaci Falco)" (Ementrio LTr, VII, 1988/1990, p. 198).

18).

Reza o artigo 37 6 da Constituio Federal que:

"As pessoas jurdicas de direito pblico e as de direito privado prestadoras de servios pblicos respondero pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsvel nos casos de dolo ou culpa",

nitidez, obrigando o Poder Pblico a ressarcir todos os prejuzos que causar sociedade, sendo seus agentes, em caso de culpa ou dolo, responsveis pessoalmente pelos prejuzos causados.

farta a doutrina e jurisprudncia a respeito (19) Hely Lopes Meirelles ensina: "A indenizao do dano deve abranger o que a vtima efetivamente perdeu, o que despendeu, e o que deixou de ganhar em consequncia direta e imediata do ato lesivo da administrao, ou seja, em linguagem civil, o dano emergente e os lucros cessantes, bem como honorrios advocatcios, correo monetria e juros de mora se houver atraso no pagamento. A liquidao desses prejuzos feita de acordo com os preceitos comuns (Cd. Civil, arts. 1059 a 1064 e Cd. Proc. Civil, arts. 603 a 611). Uma vez liquidados os danos ou fixados na prpria sentena condenatria -o que sempre conveniente para evitar as delongas da execuo- segue-se a requisio do pagamento devido pela Fazenda Pblica, na forma preceituada pelo art. 117, da Constituio da Repblica e arts. 730 e 731 do Cd. de Proc. Civil. O no atendimento dessa requisio, autoriza o sequestro da quantia necessria, depois de ouvido o chefe do Ministrio Pblico e, se frustrada essa providncia, o caso ser de interveno federal na entidade devedora, por descumprimento da ordem ou deciso judicial, nos expressos termos dos arts. 10, 7; 15 3, "d"; e 117, 2 da Constituio da Repblica"(Direito Administrativo Brasileiro, 13 ed., p. 557).

19).

Acresce-se que os agentes que provocaram as manipulaes devem responder sempre pelos prejuzos que causarem, sendo imprescritvel a ao regressiva que o Estado pode contra eles iniciar, nos termos do artigo 37 5:

"A lei estabelecer os prazos de prescrio para ilcitos praticados por qualquer agente, servidor ou no, que causem prejuzos ao errio, ressalvadas as respectivas aes de ressarcimento" (20) Pinto Ferreira esclarece: "A expresso agente a palavra genrica, da qual a designao de servidor subdiviso ou espcie. O prefeito um agente, embora sem ser servidor pblico.A lei estabelecer os prazos de prescrio. A lei ordinria, a que alude o preceito, ser de nvel federal, estadual ou municipal, quando se tratar de prazos prescricionais para ilcitos administrativos. Ser federal nos casos de ilcito penal.As aes de ressarcimento ou as aes de responsabilidade civil, contudo, so imprescritveis. No se submetem ao disposto no art. 177 do CC, determinando que as aes pessoais prescrevem em 20 anos e as aes reais em 10 anos. No ocorrendo prescrio, o direito do Estado permanente para reaver o que lhe for ilicitamente subtrado" (Comentrios Constituio Brasileira, 2 vol., Ed. Saraiva, p. 396/397).

20).

Desta forma, todas as autoridades, que, na Administrao Direta ou Indireta, geraram tais prejuzos aos trabalhadores, so pessoalmente responsveis, nos termos do artigo 37 6, que reproduz o artigo 107 da E.C. n. 1/69 assim redigido:

"As pessoas jurdicas de direito pblico respondero pelos danos que seus funcionrios, nessa qualidade, causarem a terceiros. nico. Caber ao regressiva contra o funcionrio responsvel, nos casos de culpa ou dolo" (21) Manoel Gonalves Ferreira F sobre o direito anterior ensina: "Responsabilidade Objetiva do Estado: Mantm-se na Constituio vigente a soluo adotada na lei magna de 1946 (art. 194), ou seja, a responsabilidade, dita objetiva, do Estado por danos causados no exerccio de funo pblica a particulares. Em face desse princpio, quem sofreu o dano, para haver do Estado a reparao desse dano, apenas deve provar ter sido ele causado no exerccio de funo pblica. A reparao prescinde de prova de culpa ou dolo por parte do causador, depende exclusivamente de estar este no exerccio de funo pblica.Esta soluo de justia social. Visa a repartir de modo equitativo os encargos sociais. O custo do servio pblico, no qual se inclui o dano causado a particulares, deve ser repartido por todos. Se a vtima do dano arcasse com este ou tivesse de comprovar culpa ou dolo para v-lo ressarcido, estaria suportando mais do que sua parte, como integrante da comunidade" (Comentrios Constituio Brasileira, Ed. Saraiva, 1986, p. 443).

21).

Pergunta-se, agora: como obter judicialmente a tutela dos direitos atrs mencionados para que o Poder Pblico, atravs da sua empresa controlada, venha a ressarcir os trabalhadores da entidade consulente, que tiveram suas "reservas" reduzidas, por manipulao de ndices, no curso de todos estes anos?

Entendo que o caminho processual mais adequado uma ao ordinria de cobrana da diferena retirada do trabalhador, que poder ser proposta em litisconsrcio ativo, contra a Caixa Econmica Federal, que a administradora do Fundo e seu agente financeiro escolhido, ou seja, o Banco em que est o fundo, que formariam o plo passivo.

Nesta ao ordinria, pedir-se-ia, de imediato, o diferencial que deveria ser calculado entre a inflao real de cada perodo declarado pelo prprio governo e o ndice manipulado adotado. Sugiro que, para tal ao, o Sindicato obtenha de um dos Institutos de renome (FGV, DIESE, IPEA, FIPE etc.) um levantamento, desde a criao do FGTS, do fluxo da inflao no pas e os ndices de correo adotados, com o que poder instruir a ao ordinria com os diferenciais abrangendo todo o perodo (22) Celso Neves, ao contestar a substituio processual individual em direito do trabalho, escreve: "A prpria emenda a esse texto --da lavra do Senador Marco Maciel-- a despeito de falar em "substituto processual", no institua essa figura, porque as atribuies do Sindicato se restringiam "defesa dos direitos e interesses da categoria, individuais ou coletivos", referindo-se esta ltima qualificao aos direitos e interesses genricos, a que se reporta. No h, pois, nas atribuies do Sindicato, a defesa de interesses individuais de seus associados.Porque a Constituio no atribuiu, aos Sindicatos, a substituio processual de seus associados, a Medida Provisria n 190, de 31 de maio de 1990, intentou faz-lo, ao propor a alterao do art. 513, da CLT. O Supremo Tribunal Federal, entretanto, cassou-lhe a vigncia. Permanece, portanto, a disciplina constitucional, sob cujo imprio seria duvidosa a validade de lei ordinria que pretendesse ampliar os poderes restritos, supralegalmente estabelecidos. Os sindicatos tm, pois, a representao da categoria, nos termos do inciso II, do art. 8 da Constituio, sem a prerrogativa de substituir, processualmente, seus associados -poder que, ao rejeitar a emenda Marco Maciel, o constituinte teria feito inacessvel ao legislador ordinrio" (Curso de Direito Constitucional do Trabalho, volume 2, Ed. LTr, 1991, p.172). , de resto, a mais adequada interpretao do art. 8 inciso III da C.F. assim redigido: "ao Sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questes judiciais ou administrativas".

22), em nome dos litisconsorciados.

Afasto o mandado de segurana coletivo, por ser este um instrumento para sustar ou impedir coao e no para impor obrigao de fazer; a ao declaratria, cujo rito ordinrio leva-a a durar o mesmo tempo que a ordinria de cobrana, sem ter, todavia, a executoriedade que esta tem; e a ao civil pblica, por ser polmica a sua admissibilidade em face da qualidade dos interesses difusos que objetiva amparar. H autores, todavia, que a admitem, tendo sido escolhida pelo Ministrio Pblico na defesa do reajuste dos 147% dos aposentados mais de uma vez.

Paralelamente ao ordinria de cobrana, sugiro uma ao popular contra os administradores federais que manipularam tais ndices, iniciada por eleitores e interessados, posto que, ao assim agirem, agiram contra a moralidade pblica, apropriando-se de recursos dos trabalhadores, visto que meros administradores do patrimnio de todos os brasileiros nesta condio (23) Jos Cretella Jnior, ao comentar o artigo 5 inciso LXXIII da Constituio Federal, assim redigido: "LXXIII - qualquer cidado parte legtima para propor ao popular que vise a anular ato lesivo ao patrimnio pblico ou de entidade de que o Estado participe, moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimnio histrico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada m-f, isento de custas judiciais e do nus da sucumbncia", escreve: "H dois tipos de danos, o material, ou econmico, calculado, em dinheiro, em moeda corrente do pas, e o moral, mais difcil de ser captado. Escrevendo sob influncia do jurista argentino Rafael Bielsa (cf. o clssico trabalho A ao popular e o poder discriminatrio da Administrao, em RDA 38:42), os autores brasileiros que escreveram, nestes ltimos vinte anos sobre o tema, assim se exprimiram: "bem de ver no a cogitar de ao popular em defesa de interesses puramente morais da Administrao, cingindo-se ela proteo dos suscetveis de apreciao econmica" (cf. Paulo Barbosa de Campos Filho, Ao popular constitucional, 1968, p.65 nota 172). Hely Lopes Meirelles, j em 1964, em seu Direito administrativo brasileiro, ed. Rev. dos Tribunais, p.536 e segs., esclarecia que "lesivo abrange tanto o patrimnio material, quanto o moral", porque, entender-se, restritivamente, que a ao popular s protege o patrimnio material relegar os valores espirituais a plano secundrio e admitir que a nossa Constituio os desconhece ou os julga indignos da tutela jurdica, quando, na realidade, ela prpria os coloca sob sua gide (cf. Direito administrativo brasileiro, 1964, p. 538/539)" (Comentrios Constituio 1988, vol. II, Ed. Forense Universitria, 1989, p. 784).

23).

Isto posto, passo a responder as questes formuladas pela entidade consulente:

1) De 1975 a 1985 2/3 do valor de substncia. Em maro de 1990 metade de seu valor. A determinao absoluta deve ser, todavia, elaborada por Instituto de renome nacional, comparando a inflao real do pas desde a criao do FGTS e os ndices oficiais adotados.

2) Respondida acima.

3) A ao ordinria de cobrana em litisconsrcio ativo dos prejudicados contra a Caixa Econmica Federal e o Banco depositrio. A ao deve correr perante a Justia Federal.

4) Entendo que sim, em face do determinado no artigo 5 item 21, muito embora esta matria no esteja ainda definitivamente pacificada, nem na doutrina, nem na jurisprudncia. H, inclusive, proposta de emenda constitucional do governo alterando tal tipo de substituio.

Muito embora considere possvel, em face do disposto no referido dispositivo, a fim de evitar o levantamento das preliminares ao mrito, prefiro que o Sindicato obtenha a procurao de seus associados e em nome destes, ou seja, em litisconsrcio de todos eles, no plo ativo, ingresse com a ao ordinria de cobrana.

S.M.J.So Paulo, 2 de setembro de 1992.

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