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PERSONA Claudinho Coradini/JP Luta contra a corrupção e em defesa do Meio Ambiente Ângela Pessoa [email protected] R icardo Otto Leão Schmidt, 46, é engenheiro agrônomo formado pela Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz), da USP. Cursou ainda engenharia florestal na mesma instituição e três anos da Facul- dade de Direito na Unimep, sem entretanto ter concluído os dois últimos cursos. Devido ao enga- jamento ambiental e também influenciado pelo curso de enge- nharia florestal fundou a ONG (Organização Não Governamen- tal) Florespi, entidade que atu- almente preside. Engajado com questões sociais desde a universidade, Schmidt faz parte do movimento Reaja, que hoje conta com cerca de 100 pessoas e luta no comba- te a corrupção no seu sentido mais amplo, em Piracicaba. O Reaja conseguiu 25 mil assina- turas para um projeto de inicia- tiva popular que visa revogação do reajuste de salário dos vere- adores de Piracicaba, quase de 66%, que foi aprovado em julho de 2011 e passou a valer nessa le- gislatura. O documento será en- tregue a Câmara no dia 12. Você acha que os movi- mentos populares são o ca- minho para realmente mu- dar a política que temos, conseguir uma melhoria da qualidade de vida da popu- lação em geral? Acho que sim. As mobiliza- ções populares mostram que o ci- dadão está mais de olho e presti- giando as instituições políticas. A classe política deveria valo- rizar mais isso. Talvez não seja essa classe política que está hoje no poder, que é uma classe que muito mais se utilizou da popula- ção do que deu para a população, com exceção a regras que a gente não pode quantificar. E também toda a questão da reforma polí- tica, dos partidos e das próprias instituições que são políticas, a própria igreja, as entidades estu- dantis. Acho que todo este con- junto de instituições vai começar a rever as coisas porque se assus- tou com a população, que foi para a rua não se sentindo representa- da nem pelas centrais sindicais e nem por partidos, mas que ti- nha uma indignação extrema e foi uma população que ainda tem muitos benefícios da sociedade. Foi uma população da época do “Fora Collor”, que é uma popula- ção mais jovem. A gente tem essa percepção que essa faixa etária foi para rua, mas foram os mais velhos também. O que levou você a se espe- cializar na questão ambien- tal? O que mais me ajudou foi o curso de engenharia florestal. Eu fazia os dois cursos conjun- tamente (engenharia agrônoma e floresta). Na época a USP per- mitia que você fizesse os dois cur- sos juntos. Isso me fez ir para a militancia ambiental, dentro do movimento estudantil, que era o CAL (Centro Acadêmico) e tinha o CAEF que era a Coordenação Acadêmica de Engenharia Flo- restal e na faculdade nós discu- tíamos muito essa questão am- biental. Logo que eu me formei nós formamos um grupo e come- cei a militar na Sodemap (Socie- dade de Defesa do Meio Ambien- te de Piracicaba), que era uma ONG que trabalhava com a ques- tão ambiental e essa militância, junto com o curso, fez com que eu me apaixonasse pela área. Ti- nha um grupo de professores que até hoje eu trabalho e nós funda- mos a Florespi, que é uma ONG que hoje está fazendo 25 anos. Foi uma das primeiras ONGs na área ambiental, pós Sodemap. Meu trabalho logo no início da Flores- pi era mostrar a importância da preservação ambiental para agri- cultores e dar uma alternativa de consumo de madeira, no caso o eucalipto, dele estar consumindo isso na sua atividade porque ain- da tinha pequenos e médios agri- cultores naquela época. Quando chegou em Piracicaba?Quais os pontos que avalia como positivos na cidade? Sou paulistano e cheguei em 1984, com 17 anos, para cursar a Esalq. Acabei ficando e hoje sou mais piracicabano do que pau- listano. Eu vejo como uma cida- de muito bonita. A questão do rio atrai as pessoas desde a épo- ca que cheguei. Mesmo na épo- ca que a Rua do Porto não estava num processo de revitalização, o rio e a Esalq sempre foram mar- cos visuais, além da convivên- cia com o piracicabano. Quando você sai como estudante e vive a cidade é uma cidade que te traz benefícios em termos de qualida- de de vida. Eu sempre tive uma qualidade de vida ótima na cida- de. Eu acho que Piracicaba teve um crescimento muito grande, penso que foi de forma desorde- nada, mas é uma cidade que atrai. Muita gente que está em Piraci- caba não é piracicabano nato, são pessoas que vieram morar aqui por uma questão de trabalho ou por gostar da cidade. É uma cida- de que seduz, que atrai pela sua facilidade, infraestrutura, pelo seu desenvolvimento. Tem seus problemas como toda a cidade de médio porte, que poderiam ser minimizados, mas que atrai. O que você acha negativo em Piracicaba? O desenvolvimento muito desordenado, sem planejamen- to, sem seguir o plano diretor. O espalhamento da cidade. Jo- gando a periferia cada vez mais para a periferia, ao invés de tra- zer para o centro da cidade. En- tão, as pessoas não enxergam Pi- racicaba como ela é, só enxergam o roteiro turístico. Os bairros pe- riféricos estão cada vez mais dis- tantes tanto dos equipamentos de lazer quanto do local de tra- balho das pessoas. Os vazios ur- banos em razão do próprio pro- cesso de especulação imobiliária. A questão da mobilidade urbana é outro ponto negativo, que não é só Piracicaba. Existe uma de- manda muito grande por veícu- los e a gente percebe que as ci- dades estão sendo desenvolvidas para carros. Não se pensa em ou- tros tipos de mobilidade, desde a questão do transporte coletivo, das bicicletas, transportes inter- modais que não precisa o carro circular a cidade toda. Como você avalia a questão do transporte público? Essas mobilizações acaba- ram surgindo por causa da ques- tão do transporte público. É uma demanda da sociedade e tem que resolver rapidamente essa ques- tão do transporte público. Pira- cicaba é hoje uma cidade de mé- dio porte e tem trechos caóticos no trânsito. Não é só uma ques- tão de tempo, é uma questão de segurança, de qualidade de vida. Não é só o tempo que você está perdendo no trânsito. A mobilização para a re- dução da passagem, inclusi- ve em Piracicaba, que culmi- nou na redução da tarifa, foi um marco de conquista para os movimentos? Mostrou a força popular? Acho que a pressão popular é um processo em cons- trução. As pessoas começaram a acreditar que uma democracia participativa, a participação di- reta da população nas tomadas de decisões funciona, que foi o que ocorreu especificamente na pauta tarifa de ônibus. Na verda- de isso foi uma meia conquista porque o que se queria era a ta- rifa zero. O Pula Catraca também teve uma meia conquista porque não se reduziu a tarifa no pata- mar que estava antes. A mobi- lização está diretamente ligada às pessoas que utilizam ônibus e por isso que o apoio popular se manifestou de uma forma mais importante. Como surgiu o movimen- to Reaja? O Reaja começou antes disso. Surgiu no aniversário da cidade, em 1º de agosto de 2012. Na ver- dade as discussões começaram com a proposta da Controlado- ria Geral da União que estava promovendo as conferências em todas as áreas. No caso da Con- ferência de Transparência e Con- trole Social, que foi uma iniciati- va da CGU (Controladoria Geral da União), decidimos realizar uma conferência em Piracicaba. Já tínhamos feito algumas mani- festações com relação a contro- le social e combate à corrupção. Decidimos fazer uma conferên- cia em Piracicaba que tem tudo a ver com o combate à corrupção. Isso acabou culminando com o grupo de discussão falando que precisávamos implementar es- sas propostas de transparência e controle social no município. Foi aí que surgiu o movimento. Uma das pautas que nos pegamos foi o aumento de salários, que não foi só de vereadores, mas do prefeito, vice-prefeito e secretários. Que fizeram sem transparência, sem controle social e ninguém sabia. O Reaja teve todo esse crescimen- to porque ninguém sabia que eles tinham aumentado os pró- prios salários. O movimento tra- balha outras pautas de controle, das audiências públicas, da ficha limpa municipal. O Reaja desper- tou isso na população e já exis- te uma indignação com a classe política. O movimento acabou se fortalecendo com isso. Nós sem- pre pensamos o Reaja como um movimento, não tem lideranças, a gente busca a horizontalidade. Como você avalia as redes sociais nos movimentos popu- lares recentes? As redes sociais foram o gran- de diferencial desse tipo de mo- bilização. A gente tem utilizado a rede social para mobilização. Tanto para informar, como para educar, como para filtrar. Se sou- bermos usar bem essa ferramen- ta de mobilização, de saber, de co- nhecimento, do próprio cidadão saber filtrar o que é certo, o que é fofoca, acho que é uma grande ferramenta de mobilização, de in- formação, que ajudou muito e vai continuar ajudando. Tem que to- mar cuidado apenas sobre o que tem credibilidade e o que não tem credibilidade. E a questão dos Black Bloc? Postaram na nossa página (Reaja) alguém falando que era do Black Bloc. Aí você come- ça a procurar a pessoa e desco- bre que é perfil fake (perfil fal- so). É visto como um grupo que cria problema e pratica vandalis- mo. Na verdade, são grupos e in- divíduos autônomos que partici- pam das manifestações que são convocadas. Eles não são a ma- nifestação. O que eles fazem nós não respondemos. Não te- mos como responder. As manifes- tações do Reaja sempre tiveram essa preocupação com a seguran- ça das pessoas que estão partici- pando. Acho que é bom colocar isso porque as pessoas se afastam das manifestações com medo da violência. Tem as duas coisas - as pessoas se manifestando e os Bla- ck Bloc. Por exemplo, como eu li, no Rio de Janeiro, eles tem a fun- ção de abrir caminho. Os mani- festantes querem ir até o estádio, por exemplo, não conseguem porque tem a força policial bre- cando e a frente da Black Bloc vai tentar abrir e causa a confu- são. Tem a questão da desmilita- rização da polícia que você per- cebe que teve a força exagerada. É nítida a falta de preparo da Po- lícia Militar em lidar com pesso- as de bem, com cidadãos comuns que de repente tomam um tiro de borracha, spray de pimenta. Seu filho está na manifestação você fica totalmente transtornado com isso (reação da polícia). A reação das pessoas em relação a polícia acaba sendo exagerada por conta da própria ação da po- lícia que não escolhe quem está praticando algum crime, quem está manifestando. Você percebe um desprepa- ro da polícia em lidar com as manifestações aqui em Pira- cicaba? O movimento Reaja é pacífico? Eu acho que está havendo aí um processo de preparo desde o início das manifestações, pela experiência de todas as polícias, desde as municipais, como a PM, o Batalhão de Choque. Está ha- vendo aí um processo de saberem lidar com algo que eles nunca li- daram. Eles não tem a liderança para conversar. Nem sempre a pessoa que se apresenta como liderança realmente é. Tem outras pessoas partici- pando, outras lideranças com outros grupos. Então, estão co- meçando a compreender que a princípio não deve dispersar a manifestação. Ela tem que ocor- rer de forma pacífica. Aqui em Pi- racicaba foram raros os momen- tos (de confronto), no próprio dia 20 junho, no final da noite acon- teceram. Se eu fosse comandante da guarda eu abriria o Terminal Central e deixava o povo passar no dia 20. É patrimônio público aquilo. Você começa a ver gen- te lutando por transporte públi- co de qualidade, por tarifa mais barata de ônibus, detonar o pró- prio patrimônio público ligado a questão do transporte. Com cer- teza, iriam ser minorias mesmo, porque sempre vão ter minorias, criminosos no meio, que se infil- tram. Tem pessoas como a pro- posta anarquista dos Black Bloc de abrir caminhos com violência, que nos somos a princípio con- tra, mas é uma estratégia deles. Nos não temos o controle de toda a situação, o que nós podemos é trabalhar a situação. É um mo- vimento pacífico e vai continu- ar sendo. Isso é princípio do mo- vimento. O Reaja tem alguma liga- ção com o Pula Catraca? As ações do Pula Catraca nun- ca vieram pedir apoio ao Reaja e vice e versa. A diversidade dos movimentos para nós é impor- tante porque são movimentos livres, as pessoas participam se quiserem, quando quiserem. Só que um grande trunfo que temos é que temos 25 mil pessoas que pararam ou procuraram o Reaja para estar assinando seu nome a favor da redução do salário dos vereadores. Nós não precisamos nem discutir a questão se é le- gal ou ilegal. Esse tipo de pres- são vai continuar. Se eles acham que quando entregarmos o proje- to acabou, se a Câmara acha isso está enganada. Como o Reaja vê o caso Storel (Antonio Osvaldo Sto- rel, chefe de gabinete do vere- ador Paulo Camolesi (PV) que foi exonerado pela Mesa Dire- tora há alguns dias sem o co- nhecimento de Camolesi, de- pois de ter publicado artigos na imprensa)? Como é a situ- ação? O Reaja não pode ser confun- dido com um mandato coleti- vo, mas a questão Storel é uma questão de arbitrariedade abso- luta do presidente da Câmara. O João Manoel sempre, desde o início, teve reações com um res- quício de oligarquia, da síndro- me do pequeno poder. Tem por- que deram isso para ele e deram nessa relação Executivo e Legis- lativo do poder político local. En- tão, a questão do Storel foi a gota d"água. Acho que tem uma ques- tão de vingança, do corporativis- mo da Câmara de Piracicaba, dos funcionários da Câmara se prote- gendo, achando que os movimen- tos populares são uma ameaça a síndrome do pequeno poder, de manterem os cargos de confian- ça. Não percebem que esse tipo de reação é mais um tiro no pé. Se autodestroem e isso é muito tris- te. Os movimentos cada vez se fortalecem mais, quando a gen- te percebe esse mecanismo de au- todestruição. Esse cerceamento de entrada, que um vereador fez, com um ofício me impedindo de entrar e não fiz absolutamente nada. Esse tipo de armação, de situação para desqualificar o mo- vimento não dá. Eu já tive várias ameaças pessoais. Você já ocupou algum car- go público? Fui secretário municipal do Meio Ambiente na gestão do ex- -prefeito Machado (José Machado). Piracicaba, 8 de setembro de 2013 | CADERNO DE DOMINGO | 3

Persona do JP: Ricardo Schmidt - fundador e diretor da Florespi

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Fundador e atual Diretor da ONG Florespi, Ricardo Otto Leão Schmidt foi o entrevistado do "Persona" do Jornal de Piracicaba deste domingo (08/09/2013). Acompanhe a Florespi: www.facebook.com/ONG.Florespi

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Page 1: Persona do JP: Ricardo Schmidt - fundador e diretor da Florespi

PERSONA

Claudinho Coradini/JP

Luta contra a corrupçãoe em defesa do Meio AmbienteÂngela [email protected]

Ricardo Otto Leão Schmidt,46, é engenheiro agrônomoformadopela Esalq (Escola

Superior de Agricultura Luiz deQueiroz), da USP. Cursou aindaengenharia f lorestal na mesmainstituição e três anos da Facul-dade de Direito na Unimep, sementretanto ter concluído os doisúltimos cursos. Devido ao enga-jamento ambiental e tambéminfluenciado pelo curso de enge-nharia f lorestal fundou a ONG(Organização Não Governamen-tal) Florespi, entidade que atu-almente preside. Engajadocom questões sociais desdea universidade, Schmidt fazparte do movimento Reaja,que hoje conta com cerca de100 pessoas e luta no comba-te a corrupção no seu sentidomais amplo, em Piracicaba. OReaja conseguiu 25 mil assina-turas para um projeto de inicia-tiva popular que visa revogaçãodo reajuste de salário dos vere-adores de Piracicaba, quase de66%, que foi aprovado em julhode 2011 e passou a valer nessa le-gislatura. O documento será en-tregue a Câmara no dia 12.

Você acha que os movi-mentos populares são o ca-minho para realmente mu-dar a política que temos,conseguir uma melhoria daqualidade de vida da popu-lação em geral?

Acho que sim. As mobiliza-ções popularesmostramque o ci-dadão está mais de olho e presti-giando as instituições políticas.A classe política deveria valo-rizar mais isso. Talvez não sejaessa classe política que está hojeno poder, que é uma classe quemuitomais se utilizou da popula-ção do que deu para a população,comexceção a regras que a gentenão pode quantificar. E tambémtoda a questão da reforma polí-tica, dos partidos e das própriasinstituições que são políticas, aprópria igreja, as entidades estu-dantis. Acho que todo este con-junto de instituições vai começara rever as coisas porque se assus-tou comapopulação, que foi paraa rua não se sentindo representa-da nem pelas centrais sindicaise nem por partidos, mas que ti-nha uma indignação extrema efoi umapopulaçãoque ainda temmuitos benefícios da sociedade.Foi uma população da época do“Fora Collor”, que é uma popula-çãomais jovem. A gente temessapercepção que essa faixa etáriafoi para rua, mas foram os maisvelhos também.

O que levou você a se espe-cializar na questão ambien-tal?

O que mais me ajudou foi ocurso de engenharia f lorestal.Eu fazia os dois cursos conjun-tamente (engenharia agrônomae floresta). Na época a USP per-mitia que você fizesse os dois cur-sos juntos. Isso me fez ir para amilitancia ambiental, dentro domovimento estudantil, que era oCAL (Centro Acadêmico) e tinhao CAEF que era a CoordenaçãoAcadêmica de Engenharia Flo-restal e na faculdade nós discu-tíamos muito essa questão am-biental. Logo que eu me formeinós formamos um grupo e come-cei a militar na Sodemap (Socie-dade de Defesa do Meio Ambien-te de Piracicaba), que era umaONG que trabalhava com a ques-tão ambiental e essa militância,junto com o curso, fez com queeu me apaixonasse pela área. Ti-nha umgrupode professores queaté hoje eu trabalho e nós funda-mos a Florespi, que é uma ONGquehoje está fazendo 25 anos. Foiumadas primeirasONGsna áreaambiental, pós Sodemap. Meutrabalho logo no início da Flores-pi era mostrar a importância dapreservação ambiental para agri-cultores e dar uma alternativa deconsumo de madeira, no caso oeucalipto, dele estar consumindoisso na sua atividade porque ain-da tinha pequenos emédios agri-cultores naquela época.

Quando chegou emPiracicaba?Quais os pontos

que avalia como positivos nacidade?

Sou paulistano e cheguei em1984, com 17 anos, para cursar aEsalq. Acabei ficando e hoje soumais piracicabano do que pau-listano. Eu vejo como uma cida-de muito bonita. A questão dorio atrai as pessoas desde a épo-ca que cheguei. Mesmo na épo-ca que a Rua do Porto não estavanumprocesso de revitalização, orio e a Esalq sempre foram mar-cos visuais, além da convivên-cia com o piracicabano. Quandovocê sai como estudante e vive acidade é uma cidade que te trazbenefícios em termos de qualida-de de vida. Eu sempre tive umaqualidade de vida ótima na cida-de. Eu acho que Piracicaba teveum crescimento muito grande,penso que foi de forma desorde-nada,mas é umacidade que atrai.Muita gente que está em Piraci-cabanão épiracicabanonato, sãopessoas que vieram morar aquipor uma questão de trabalho oupor gostar da cidade. É uma cida-de que seduz, que atrai pela suafacilidade, infraestrutura, peloseu desenvolvimento. Tem seusproblemas como toda a cidadede médio porte, que poderiamser minimizados, mas que atrai.

O que você acha negativoem Piracicaba?

O desenvolvimento muitodesordenado, sem planejamen-to, sem seguir o plano diretor.O espalhamento da cidade. Jo-gando a periferia cada vez maispara a periferia, ao invés de tra-zer para o centro da cidade. En-tão, as pessoas não enxergam Pi-racicaba como ela é, só enxergamo roteiro turístico. Os bairros pe-riféricos estão cada vez mais dis-tantes tanto dos equipamentosde lazer quanto do local de tra-balho das pessoas. Os vazios ur-banos em razão do próprio pro-cesso de especulação imobiliária.A questão da mobilidade urbanaé outro ponto negativo, que nãoé só Piracicaba. Existe uma de-manda muito grande por veícu-los e a gente percebe que as ci-dades estão sendo desenvolvidaspara carros. Não se pensa em ou-tros tipos de mobilidade, desdea questão do transporte coletivo,das bicicletas, transportes inter-modais que não precisa o carrocircular a cidade toda.

Comovocêavaliaaquestãodo transporte público?

Essas mobilizações acaba-ram surgindo por causa da ques-tão do transporte público. É umademanda da sociedade e temqueresolver rapidamente essa ques-tão do transporte público. Pira-cicaba é hoje uma cidade de mé-dio porte e tem trechos caóticos

no trânsito. Não é só uma ques-tão de tempo, é uma questão desegurança, de qualidade de vida.Não é só o tempo que você estáperdendo no trânsito.

A mobilização para a re-dução da passagem, inclusi-ve em Piracicaba, que culmi-nou na redução da tarifa, foiummarco de conquista paraos movimentos? Mostrou aforça popular?

Acho que a pressão

popular é um processo em cons-trução. As pessoas começarama acreditar que uma democraciaparticipativa, a participação di-reta da população nas tomadasde decisões funciona, que foi oque ocorreu especificamente napauta tarifa de ônibus. Na verda-de isso foi uma meia conquistaporque o que se queria era a ta-rifa zero. OPulaCatraca tambémteve umameia conquista porquenão se reduziu a tarifa no pata-mar que estava antes. A mobi-lização está diretamente ligadaàs pessoas que utilizam ônibuse por isso que o apoio popular semanifestou de uma forma maisimportante.

Como surgiu o movimen-to Reaja?

O Reaja começou antes disso.Surgiu no aniversário da cidade,em 1º de agosto de 2012. Na ver-dade as discussões começaramcom a proposta da Controlado-ria Geral da União que estavapromovendo as conferências emtodas as áreas. No caso da Con-ferência de Transparência e Con-trole Social, que foi uma iniciati-va da CGU (Controladoria Geralda União), decidimos realizaruma conferência em Piracicaba.Já tínhamos feito algumas mani-festações com relação a contro-le social e combate à corrupção.Decidimos fazer uma conferên-cia em Piracicaba que tem tudoa ver como combate à corrupção.Isso acabou culminando com ogrupo de discussão falando queprecisávamos implementar es-sas propostas de transparência econtrole social nomunicípio. Foiaí que surgiu omovimento. Umadas pautas que nos pegamos foi oaumento de salários, que não foisó de vereadores,mas do prefeito,vice-prefeito e secretários. Quefizeram sem transparência, semcontrole social e ninguém sabia.OReaja teve todo esse crescimen-to porque ninguém sabia queeles tinham aumentado os pró-prios salários. O movimento tra-balha outras pautas de controle,das audiências públicas, da fichalimpamunicipal. O Reaja desper-tou isso na população e já exis-te uma indignação com a classepolítica. Omovimento acabou sefortalecendo com isso. Nós sem-pre pensamos o Reaja como ummovimento, não tem lideranças,a gente busca a horizontalidade.

Como você avalia as redessociais nosmovimentospopu-lares recentes?

As redes sociais foram o gran-de diferencial desse tipo de mo-bilização. A gente tem utilizadoa rede social para mobilização.Tanto para informar, como paraeducar, como para filtrar. Se sou-

bermos usar bem essa ferramen-ta demobilização, de saber, de co-nhecimento, do próprio cidadãosaber filtrar o que é certo, o queé fofoca, acho que é uma grandeferramenta demobilização, de in-formação, que ajudoumuito e vaicontinuar ajudando. Tem que to-mar cuidado apenas sobre o quetem credibilidade e o que nãotem credibilidade.

EaquestãodosBlackBloc?Postaram na nossa página

(Reaja) alguém falando que erado Black Bloc. Aí você come-ça a procurar a pessoa e desco-bre que é perfil fake (perfil fal-so). É visto como um grupo quecria problema e pratica vandalis-mo. Na verdade, são grupos e in-divíduos autônomos que partici-pam das manifestações que sãoconvocadas. Eles não são a ma-nifestação. O que eles fazem nósnão respondemos.Não t e -

mos como responder. Asmanifes-tações do Reaja sempre tiveramessa preocupação coma seguran-ça das pessoas que estão partici-pando. Acho que é bom colocarissoporqueaspessoas se afastamdasmanifestações commedo daviolência. Tem as duas coisas - aspessoas semanifestando e os Bla-ck Bloc. Por exemplo, como eu li,no Rio de Janeiro, eles tem a fun-ção de abrir caminho. Os mani-festantes querem ir até o estádio,por exemplo, não conseguemporque tem a força policial bre-cando e a frente da Black Blocvai tentar abrir e causa a confu-são. Tem a questão da desmilita-rização da polícia que você per-cebe que teve a força exagerada.É nítida a falta de preparo da Po-lícia Militar em lidar com pesso-

as de bem, comcidadãos comunsquede repente tomamumtiro deborracha, spray de pimenta. Seufilho está na manifestação vocêfica totalmente transtornadocom isso (reação da polícia). Areação das pessoas em relaçãoa polícia acaba sendo exageradapor conta da própria ação da po-lícia que não escolhe quem estápraticando algum crime, quemestá manifestando.

Vocêpercebeumdesprepa-ro da polícia em lidar com asmanifestações aqui em Pira-cicaba? Omovimento Reaja épacífico?

Eu acho que está havendo aíum processo de preparo desdeo início das manifestações, pelaexperiência de todas as polícias,desde asmunicipais, como a PM,o Batalhão de Choque. Está ha-vendoaí umprocessode saberemlidar com algo que eles nunca li-daram. Eles não tem a liderançapara conversar. Nem sempre

a pessoa que se apresentacomo liderança realmente é.Tem outras pessoas partici-pando, outras lideranças com

outros grupos. Então, estão co-meçando a compreender que a

princípio não deve dispersar amanifestação. Ela tem que ocor-rer de forma pacífica. Aqui emPi-racicaba foram raros os momen-tos (de confronto), no próprio dia20 junho, no final da noite acon-teceram. Se eu fosse comandanteda guarda eu abriria o TerminalCentral e deixava o povo passarno dia 20. É patrimônio públicoaquilo. Você começa a ver gen-te lutando por transporte públi-co de qualidade, por tarifa maisbarata de ônibus, detonar o pró-prio patrimônio público ligado aquestão do transporte. Com cer-teza, iriam ser minorias mesmo,porque sempre vão ter minorias,criminosos no meio, que se infil-tram. Tem pessoas como a pro-posta anarquista dos Black Blocde abrir caminhos com violência,que nos somos a princípio con-tra, mas é uma estratégia deles.Nos não temos o controle de todaa situação, o que nós podemos étrabalhar a situação. É um mo-vimento pacífico e vai continu-ar sendo. Isso é princípio do mo-vimento.

O Reaja tem alguma liga-ção com o Pula Catraca?

As ações do Pula Catraca nun-ca vieram pedir apoio ao Reaja evice e versa. A diversidade dosmovimentos para nós é impor-tante porque são movimentoslivres, as pessoas participam sequiserem, quando quiserem. Sóque umgrande trunfo que temosé que temos 25 mil pessoas quepararam ou procuraram o Reajapara estar assinando seu nome afavor da redução do salário dosvereadores. Nós não precisamosnem discutir a questão se é le-gal ou ilegal. Esse tipo de pres-são vai continuar. Se eles achamque quando entregarmos o proje-to acabou, se a Câmara acha issoestá enganada.

Como o Reaja vê o casoStorel (Antonio Osvaldo Sto-rel, chefe de gabinete do vere-adorPauloCamolesi (PV)quefoi exonerado pela Mesa Dire-tora há alguns dias sem o co-nhecimento de Camolesi, de-pois de ter publicado artigosna imprensa)? Como é a situ-ação?

O Reaja não pode ser confun-dido com um mandato coleti-vo, mas a questão Storel é umaquestão de arbitrariedade abso-luta do presidente da Câmara.O João Manoel sempre, desde oinício, teve reações com um res-quício de oligarquia, da síndro-me do pequeno poder. Tem por-que deram isso para ele e deramnessa relação Executivo e Legis-lativo do poder político local. En-tão, a questão do Storel foi a gotad"água. Acho que tem uma ques-tão de vingança, do corporativis-modaCâmara de Piracicaba, dosfuncionários da Câmara se prote-gendo, achando que osmovimen-tos populares são uma ameaça asíndrome do pequeno poder, demanterem os cargos de confian-ça. Não percebem que esse tipode reação émais umtironopé. Seautodestroem e isso é muito tris-te. Os movimentos cada vez sefortalecem mais, quando a gen-te percebe essemecanismode au-todestruição. Esse cerceamentode entrada, que um vereador fez,com um ofício me impedindo deentrar e não fiz absolutamentenada. Esse tipo de armação, desituação para desqualificar omo-vimento não dá. Eu já tive váriasameaças pessoais.

Você já ocupou algum car-go público?

Fui secretário municipal doMeio Ambiente na gestão do ex--prefeitoMachado (JoséMachado).

Piracicaba, 8 de setembro de 2013 | CADERNO DE DOMINGO | 3