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Preço € 1,00. Número atrasado € 2,00 L’O S S E RVATORE ROMANO EDIÇÃO SEMANAL Unicuique suum EM PORTUGUÊS Non praevalebunt Ano XLIX, número 6 (2.502) Cidade do Vaticano quinta-feira 8 de fevereiro de 2018 y(7HB5G3*QLTKKS( +:!z!$!"!]! Francisco denunciou na mensagem para a Quaresma a violência contra os nascituros, os idosos e os estrangeiros Não se apague a caridade Oração e jejum pela paz Proclamado um dia especial Dia mundial da vida consagrada Escolha contracorrente PÁGINA 3 Georges Rouault, «A caminho de Emaús» Na audiência geral o apelo contra o tráfico de seres humanos Uma chaga vergonhosa Quando se apaga a caridade e se rejeita a conso- lação de Deus, é fácil ceder à «violência que se abate sobre quantos são considerados uma amea- ça para as nossas “certezas”: a criança nascitura, o idoso doente, o hóspede de passagem, o estran- geiro, mas também o próximo que não correspon- de às nossas expetativas», escreveu o Papa na mensagem para a Quaresma de 2018, centrada numa expressão de Jesus, tirada do Evangelho de Mateus: «Porque se multiplicará a iniquidade, vai resfriar o amor de muitos» (24, 12). No texto da mensagem — apresentada na ma- nhã de 6 de fevereiro na Sala de imprensa da Santa Sé — o Papa chamou a atenção para os «falsos profetas» que, «como “encantadores de serpentes”, se aproveitam das emoções humanas para escravizar as pessoas, levando-as para onde eles querem». O Papa referiu-se a quantos se dei- xam influenciar pelas «adulações do prazer», ou pela «ilusão do dinheiro», mas também àqueles que oferecem aos jovens «o falso remédio da dro- ga, de relações “passageiras”, de lucros fáceis mas desonestos», ou que os enredam «numa vida completamente virtual, onde as relações parecem mais simples e ágeis, mas depois revelam-se dra- maticamente sem sentido». Trata-se de verdadeiros «impostores, porque oferecem coisas sem valor», pois «tiram aquilo que é mais precioso, como a dignidade, a liberda- de e a capacidade de amar». Por isso, cada um «é chamado a discernir, no seu coração, e verificar se está ameaçado pelas mentiras destes falsos profe- tas», reconhecendo, ao contrário, «o que deixa dentro de nós um sinal bom e mais duradouro, porque vem de Deus e visa verdadeiramente o nosso bem». Depois, convidando a identificar os «sinais de que o amor corre o risco de se apagar em nós», Francisco indicou antes de tudo «a ganância do dinheiro», que é a «raiz de todos os males», e re- cordou que «a própria criação é testemunha silen- ciosa deste resfriamento do amor: a terra está en- venenada por resíduos lançados por negligência e por interesses; os mares, também eles poluídos, devem infelizmente guardar os despojos de tantos náufragos das migrações forçadas; os céus são sul- cados por máquinas que fazem chover instrumen- tos de morte». Então, que fazer? O Papa disse que devemos encontrar mais uma vez «o doce remédio da ora- ção, da esmola e do jejum». A primeira permite «ao nosso coração identificar as mentiras secretas, com que nos enganamos a nós mesmos», a segun- da «ajuda-nos a descobrir que o outro é nosso ir- mão», enquanto que o terceiro «tira força à nossa violência, desarma-nos, constituindo uma impor- tante ocasião de crescimento». Concluindo, o Pontífice exortou também este ano a participar na iniciativa «24 horas para o Senhor», a qual «con- vida a celebrar o sacramento da Reconciliação num contexto de adoração eucarística». PÁGINAS 8 E 9 Discurso à Rota romana Inauguração do ano judiciário PÁGINA 5 O Santo Padre proclamou para 23 de fevereiro, sexta-feira da primeira semana de Quaresma, um «dia es- pecial de oração e jejum pela paz», em particular pelas populações da República Democrática do Congo e do Sudão do Sul. O anúncio foi dado pelo próprio Pontífice no An- gelus de domingo, 4 de fevereiro, convidando «até os irmãos e irmãs não católicos e não cristãos a parti- cipar nesta iniciativa, segundo as modalidades que considerarem mais oportunas». Aos fiéis reunidos na praça de São Pedro, o Papa pediu um exame de consciência, exortan- do-os a perguntar-se: «Que posso eu fazer pela paz?». Sem dúvida, «podemos rezar, mas não só: cada um pode dizer concretamente “não” à violência naquilo que depende de- le ou dela», pois «as vitórias alcan- çadas com a violência são falsas; en- quanto que trabalhar pela paz faz bem a todos». Antes da prece mariana, o Papa dedicou a sua meditação ao trecho litúrgico de Marcos, que descreve um dia passado por Jesus em Ca- farnaum. PÁGINA 2 tes e conceda a esperança de recon- quistar a liberdade a quantos so- frem» por causa da «chaga vergo- nhosa» do tráfico. Sucessivamente, falou sobre os Jogos olímpicos in- vernais na cidade coreana de PyeongChang, nos quais participam 92 países, frisando que a tradicional trégua olímpica este ano adquire «importância especial: delegações das duas Coreias desfilarão juntas sob uma única bandeira e competi- rão como uma única equipe», facto que «faz esperar num mundo em que os conflitos se resolvam pacifi- camente com o diálogo e no respeito recíproco, como ensina o desporto». PÁGINA 16 Dois apelos vigoro- sos — o primeiro na vigília do dia mun- dial contra o tráfico, o segundo por oca- sião das olimpíadas invernais que se abrem na Coreia do Sul a 9 de fevereiro foram lançados pelo Papa na au- diência geral de quarta-feira 7 de fe- vereiro. Aos fiéis reunidos na Sala Paulo VI o Papa pediu para re- zar «a fim de que o Senhor converta o coração dos trafican-

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Preço € 1,00. Número atrasado € 2,00

L’O S S E RVATOR E ROMANOEDIÇÃO SEMANAL

Unicuique suum

EM PORTUGUÊSNon praevalebunt

Ano XLIX, número 6 (2.502) Cidade do Vaticano quinta-feira 8 de fevereiro de 2018

y(7HB5G3*QLTKKS( +:!z!$!"!]!

Francisco denunciou na mensagem para a Quaresma a violência contra os nascituros, os idosos e os estrangeiros

Não se apague a caridade

Oração e jejum pela pazProclamado um dia especial

Dia mundial da vida consagrada

Escolha contracorrente

PÁGINA 3

Georges Rouault, «A caminho de Emaús»

Na audiência geral o apelo contra o tráfico de seres humanos

Uma chaga vergonhosa

Quando se apaga a caridade e se rejeita a conso-lação de Deus, é fácil ceder à «violência que seabate sobre quantos são considerados uma amea-ça para as nossas “certezas”: a criança nascitura, oidoso doente, o hóspede de passagem, o estran-geiro, mas também o próximo que não correspon-de às nossas expetativas», escreveu o Papa namensagem para a Quaresma de 2018, centradanuma expressão de Jesus, tirada do Evangelho deMateus: «Porque se multiplicará a iniquidade, vairesfriar o amor de muitos» (24, 12).

No texto da mensagem — apresentada na ma-nhã de 6 de fevereiro na Sala de imprensa daSanta Sé — o Papa chamou a atenção para os«falsos profetas» que, «como “encantadores deserp entes”, se aproveitam das emoções humanaspara escravizar as pessoas, levando-as para ondeeles querem». O Papa referiu-se a quantos se dei-xam influenciar pelas «adulações do prazer», oupela «ilusão do dinheiro», mas também àquelesque oferecem aos jovens «o falso remédio da dro-ga, de relações “passageiras”, de lucros fáceis masdesonestos», ou que os enredam «numa vidacompletamente virtual, onde as relações parecemmais simples e ágeis, mas depois revelam-se dra-maticamente sem sentido».

Trata-se de verdadeiros «impostores, porqueoferecem coisas sem valor», pois «tiram aquiloque é mais precioso, como a dignidade, a liberda-de e a capacidade de amar». Por isso, cada um «échamado a discernir, no seu coração, e verificar seestá ameaçado pelas mentiras destes falsos profe-

tas», reconhecendo, ao contrário, «o que deixadentro de nós um sinal bom e mais duradouro,porque vem de Deus e visa verdadeiramente onosso bem».

Depois, convidando a identificar os «sinais deque o amor corre o risco de se apagar em nós»,Francisco indicou antes de tudo «a ganância dodinheiro», que é a «raiz de todos os males», e re-cordou que «a própria criação é testemunha silen-ciosa deste resfriamento do amor: a terra está en-venenada por resíduos lançados por negligência epor interesses; os mares, também eles poluídos,devem infelizmente guardar os despojos de tantosnáufragos das migrações forçadas; os céus são sul-cados por máquinas que fazem chover instrumen-tos de morte».

Então, que fazer? O Papa disse que devemosencontrar mais uma vez «o doce remédio da ora-ção, da esmola e do jejum». A primeira permite«ao nosso coração identificar as mentiras secretas,com que nos enganamos a nós mesmos», a segun-da «ajuda-nos a descobrir que o outro é nosso ir-mão», enquanto que o terceiro «tira força à nossaviolência, desarma-nos, constituindo uma impor-tante ocasião de crescimento». Concluindo, oPontífice exortou também este ano a participar nainiciativa «24 horas para o Senhor», a qual «con-vida a celebrar o sacramento da Reconciliaçãonum contexto de adoração eucarística».

PÁGINAS 8 E 9

Discurso à Rota romana

Inauguraçãodo ano judiciário

PÁGINA 5

O Santo Padre proclamou para 23de fevereiro, sexta-feira da primeirasemana de Quaresma, um «dia es-pecial de oração e jejum pela paz»,em particular pelas populações daRepública Democrática do Congo edo Sudão do Sul. O anúncio foidado pelo próprio Pontífice no An-gelus de domingo, 4 de fevereiro,

convidando «até os irmãos e irmãsnão católicos e não cristãos a parti-cipar nesta iniciativa, segundo asmodalidades que considerarem maisoportunas». Aos fiéis reunidos napraça de São Pedro, o Papa pediuum exame de consciência, exortan-do-os a perguntar-se: «Que possoeu fazer pela paz?». Sem dúvida,«podemos rezar, mas não só: cadaum pode dizer concretamente “não”à violência naquilo que depende de-le ou dela», pois «as vitórias alcan-çadas com a violência são falsas; en-quanto que trabalhar pela paz fazbem a todos».

Antes da prece mariana, o Papadedicou a sua meditação ao trecholitúrgico de Marcos, que descreveum dia passado por Jesus em Ca-farnaum.

PÁGINA 2

tes e conceda a esperança de recon-quistar a liberdade a quantos so-frem» por causa da «chaga vergo-nhosa» do tráfico. Sucessivamente,falou sobre os Jogos olímpicos in-vernais na cidade coreana dePyeongChang, nos quais participam92 países, frisando que a tradicionaltrégua olímpica este ano adquire«importância especial: delegaçõesdas duas Coreias desfilarão juntassob uma única bandeira e competi-rão como uma única equipe», factoque «faz esperar num mundo em

que os conflitos se resolvam pacifi-camente com o diálogo e no respeitorecíproco, como ensina o desporto».

PÁGINA 16

Dois apelos vigoro-sos — o primeiro navigília do dia mun-dial contra o tráfico,o segundo por oca-sião das olimpíadasinvernais que seabrem na Coreia doSul a 9 de fevereiro— foram lançadospelo Papa na au-diência geral dequarta-feira 7 de fe-v e re i ro .

Aos fiéis reunidosna Sala Paulo VI oPapa pediu para re-zar «a fim de que oSenhor converta ocoração dos trafican-

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página 2 L’OSSERVATORE ROMANO quinta-feira 8 de fevereiro de 2018, número 6

L’OSSERVATORE ROMANOEDIÇÃO SEMANAL

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GI O VA N N I MARIA VIANd i re t o r

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O Papa proclamou para a sexta-feirada primeira semana de Quaresma, 23de fevereiro, um «dia especial deoração e jejum pela paz» oferecido emparticular pelas populações daRepública democrática do Congo e peloSudão do Sul. Francisco fez o anúnciodurante o Angelus de domingo, 4 defevereiro, na praça de São Pedro,depois da meditação dedicada ao trechoevangélico de Marcos (1, 21-39).

Amados irmãos e irmãs, bom dia!O Evangelho deste domingo conti-nua a descrição de um dia de Jesusem Cafarnaum, um sábado, festa se-manal para os judeus (cf. Mc 1, 21-39). Desta vez o Evangelista Marcospõe em relevo a relação entre a ativi-dade taumaturga de Jesus e o desper-tar da fé nas pessoas que encontra.De facto, com os sinais de cura querealiza para os doentes de todos ostipos, o Senhor quer suscitar a fé co-mo resposta.

O dia de Jesus em Cafarnaum co-meça com a cena do povo da cidadeinteira que se concentra diante dacasa onde Ele estava alojado, paralhe levar todos os doentes. A multi-dão, marcada por sofrimentos físicose por misérias espirituais, constitui,por assim dizer, “o ambiente vital”no qual se realiza a missão de Jesus,feita de palavras e de gestos que cu-ram e confortam. Jesus não veio tra-zer a salvação a um laboratório; nãofaz pregações de laboratório, afasta-do das pessoas: está no meio damultidão! No meio do povo! Pensaique a maior parte da vida pública deJesus foi vivida na rua, entre as pes-soas, para pregar o Evangelho, paracurar as feridas físicas e espirituais.É uma humanidade sulcada por so-frimentos, esta multidão, da qual oEvangelho fala tantas vezes. É umahumanidade sulcada por sofrimen-tos, fadigas e problemas: é a esta hu-manidade pobre que se destina aação poderosa, libertadora e renova-dora de Jesus. Assim, no meio damultidão até noite funda, conclui-seaquele sábado. E o que faz depois,Jesus?

Antes da alvorada do dia seguinte,Ele, sem ser visto, sai pela porta dacidade e retira-se num lugar aparta-do para rezar. Jesus reza. Desta ma-neira subtrai também a sua pessoa ea sua missão a uma visão triunfalis-ta, que interpreta mal o sentido dosmilagres e do seu poder carismático.Com efeito, os milagres são “sinais”,que convidam à resposta da fé; si-nais que estão sempre acompanha-dos pelas palavras, que os iluminam;e juntos, sinais e palavras, suscitam afé e a conversão mediante a força di-vina da graça de Cristo.

A conclusão do excerto de hoje(vv. 35-39) indica que o anúncio doReino de Deus por parte de Jesusreencontra o seu lugar mais apro-priado no caminho. Aos discípulosque o procuram para o reconduzir àcidade — os discípulos foram tercom Ele onde rezava e queriam quevoltasse para a cidade — o que res-ponde Jesus? «Vamos às aldeias vizi-nhas, para que eu ali também pre-gue» (v. 38). Foi este o caminho doFilho de Deus e será este o caminhodos seus discípulos. E deverá ser ocaminho de cada cristão. O cami-nho, como lugar da boa nova doEvangelho, coloca a missão da Igre-ja sob o sinal do “ir”, do caminho,sob o sinal do “movimento” e nuncada imobilidade.

A Virgem Maria nos ajude a serabertos à voz do Espírito Santo, queestimula a Igreja a armar cada vezmais a sua tenda no meio das pes-soas para levar a todos a palavra res-tabelecedora de Jesus, médico dasalmas e dos corpos.

No final da prece mariana o Pontíficerecordou a beatificação de TeresioOlivelli, que teve lugar no dia anteriorem Vigevano, e o dia pela vida que secelebrava nesse domingo em Itália. Emseguida, depois do anúncio do dia deoração e jejum, saudou os diversosgrupos presentes na praça.

Ontem, em Vigevano, foi proclama-do Beato o jovem Teresio Olivelli,morto devido à sua fé cristã em 1945,no campo de concentração de Hers-

bruck. Ele deu testemunho de Cristono amor para com os mais débeis ejunta-se à grande multidão dos már-tires do século passado. E o seu sa-crifício heroico seja semente de espe-rança e de fraternidade sobretudopara os jovens.

Celebra-se hoje na Itália o Diapela Vida, que tem por tema «OEvangelho da vida, alegria para omundo». Associo-me à Mensagemdos Bispos e manifesto o meu apre-ço e encorajamento às diversas reali-dades eclesiais que, de tantas manei-ras, promovem e apoiam a vida, emparticular o Movimento pela Vida,do qual saúdo os representantes aquipresentes, não muito numerosos. Eisto preocupa-me; não são muitos osque lutam pela vida num mundoonde todos os dias se constroemmais armas, todos os dias se fazemmais leis contra a vida, todos os diasvai em frente esta cultura do descar-te, de descartar o que não serve, oque incomoda. Por favor, rezemos afim de que o nosso povo seja maisconsciente da defesa da vida nestemomento de destruição e de descarteda humanidade.

Desejo garantir a minha proximi-dade às populações do Madagáscar,recentemente atingidas por uma for-te tempestade, que causou vítimas,desabrigados e ingentes danos. OSenhor as conforte e as ampare.

E agora um anúncio. Diante datrágica persistência de situações deconflito em diversas partes do mun-do, convido todos os fiéis a um es-

pecial Dia de oração e jejum pelapaz, a 23 de fevereiro próximo, sex-ta-feira da primeira semana de Qua-resma. Oferecemo-lo em particularpelas populações da República De-mocrática do Congo e do Sudão doSul. Como noutras ocasiões seme-lhantes, convido também os irmãose as irmãs não católicos e não cris-tãos a associarem-se a esta iniciativanas modalidades que consideraremoportunas, mas todos juntos.

O nosso Pai celeste ouve sempreos seus filhos que a Ele bradam nador e na angústia, «cura os atribula-dos de coração e ata-lhes as feridas»(Sl 147, 3). Dirijo um urgente apelopara que também nós ouçamos estebrado e, cada um de nós, em cons-ciência, diante de Deus, nos pergun-temos: «O que posso fazer pelapaz?». Certamente podemos rezar;mas não só: cada um pode dizerconcretamente “não” à violência, namedida em que depende dele ou de-la. Porque as vitórias obtidas com aviolência são vitórias falsas; enquan-to que trabalhar pela paz faz bem ato dos!

Saúdo todos vós, fiéis de Roma eperegrinos vindos da Itália e de vá-rios países. Saúdo o grupo da dioce-se de Cádiz e Ceuta (Espanha) osalunos do Colégio “Charles Péguy”de Paris, os fiéis de Sestri Levante,Empoli, Milão e Palermo, e a repre-sentação da Cidade de Agrigento, àqual manifesto apreço pelo compro-misso de acolhimento e integraçãodos migrantes. Obrigado! Obrigadopelo que fazeis. Uma saudação cor-dial aos voluntários e aos colabora-dores da associação “Fraterna Do-mus”, que trabalha em Roma há 50anos, pelo acolhimento e a solidarie-dade.

A todos desejo bom domingo.Por favor não vos esqueçais de rezarpor mim. Bom almoço e até à vista!

A preocupação manifestada pelo Pontífice durante o Angelus

Poucos lutam pela vidaUm dia de oração e jejum pela paz proclamado para 23 de fevereiro

Visita «ad limina»dos bispos caldeus

Agata Baltyzar, «Orações pela paz»

Na manhã de 5 de fevereiro, o Papa Francisco recebeu os pastores da Igreja caldeiapor ocasião da visita «ad limina Apostolorum»

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número 6, quinta-feira 8 de fevereiro de 2018 L’OSSERVATORE ROMANO página 3

Festa da apresentação e dia mundial da vida consagrada

Escolha contracorrenteCada caminho de consagração nasce deum encontro com o Senhor e com opovo de Deus, recordou o Papa nahomilia da missa celebrada na basílicade São Pedro na tarde de 2 defevereiro, festa da apresentação doSenhor no Templo, dia mundial davida consagrada.

Quarenta dias depois do Natal, cele-bramos o Senhor que, entrando notemplo, vem ao encontro do seu po-vo. No Oriente cristão, esta festa échamada precisamente «Festa doEncontro»: é o encontro entre oDeus Menino, que traz vida nova, ea humanidade à sua espera, repre-sentada pelos anciãos no templo.

No templo, verifica-se ainda outroencontro: o encontro entre dois pa-res humanos, ou seja, os jovens Ma-ria e José, por um lado, e os anciãosSimeão e Ana, por outro. Os an-ciãos recebem dos jovens, os jovensaprendem dos anciãos. Com efeito,no templo, Maria e José encontramas raízes do povo, o que é importantepois a promessa de Deus não se rea-liza individualmente e de uma vezsó, mas conjuntamente e ao longoda história. E encontram também asraízes da fé, porque a fé não é umanoção que se deve aprender num li-vro, mas a arte de viver com Deus,que se recebe da experiência dequem nos precedeu no caminho. As-sim, encontrando os anciãos, os doisjovens encontram-se a si mesmos. Eos dois anciãos, caminhando já parao fim dos seus dias, recebem Jesus,sentido da sua vida. Assim, este epi-sódio cumpre a profecia de Joel:«Os vossos anciãos terão sonhos, eos vossos jovens terão visões» (3, 1).Naquele encontro, os jovens veem asua missão e os anciãos realizam osseus sonhos; e tudo isto porque, nocentro do encontro, está Jesus.

Olhemos o nosso caso, amados ir-mãos e irmãs consagrados! Tudo co-meçou pelo encontro com o Senhor.De um encontro e de uma chamada,nasceu o caminho de consagração. Épreciso recordá-lo. E, se nos recor-darmos bem, veremos que, naqueleencontro, não estávamos sozinhoscom Jesus: estava também o povode Deus, a Igreja, jovens e anciãos,como no Evangelho. Neste, há umdetalhe interessante: enquanto os jo-vens Maria e José observam fielmen-te as prescrições da Lei — o Evange-lho repete-o quatro vezes — e nuncafalam, os anciãos Simeão e Anaacorrem e profetizam. Parece quedevia ser o contrário! Geralmentesão os jovens que falam com entu-siasmo do futuro, enquanto os an-ciãos guardam o passado. No Evan-gelho, sucede o contrário, porque,quando nos encontramos no Senhor,chegam pontualmente as surpresasde Deus. Para permitir que as mes-mas aconteçam na vida consagrada,convém lembrar-nos que não se po-de renovar o encontro com o Senhorsem o outro: nunca o deixes paratrás, nunca faças descartes geracio-nais, mas diariamente caminhai ladoa lado, com o Senhor no centro.Porque, se os jovens são chamados aabrir novas portas, os anciãos têm aschaves. E a juventude de um institu-to [de vida consagrada] encontra-se

indo às raízes, ouvindo as pessoasanciãs. Não há futuro sem este en-contro entre anciãos e jovens; não hácrescimento sem raízes, e não há flo-rescimento sem novos rebentos. Ja-mais profecia sem memória, jamaismemória sem profecia; mas que sem-pre se encontrem!

A vida agitada de hoje induz-nosa fechar muitas portas ao encontroe, com frequência, por medo do ou-tro. As portas dos centros comerciaise as conexões de rede estão sempreabertas. Mas, na vida consagrada,não deve ser assim: o irmão e a irmãque Deus me dá são parte da minhahistória, são presentes que devoguardar. Que não nos aconteça olharmais para o ecrã do telemóvel doque para os olhos do irmão, ou fi-xar-nos mais nos nossos programasdo que no Senhor. Com efeito,quando se colocam no centro osprojetos, as técnicas e as estruturas,a vida consagrada deixa de atrair ecomunicar-se a outros; não floresce,porque esquece «aquilo que tem de-baixo da terra», isto é, as raízes.

A vida consagrada nasce e renascedo encontro com Jesus assim comoé: pobre, casto e obediente. A linhasobre a qual caminha é dupla: porum lado, a amorosa iniciativa deDeus, da qual tudo começa e à qualsempre devemos retornar, e, por ou-tro, a nossa resposta, que é de amorverdadeiro quando não há «se» nem«mas», quando imita Jesus pobre,casto e obediente. Deste modo, en-quanto a vida do mundo procuraacumular, a vida consagrada deixaas riquezas que passam, para abraçarAquele que permanece. A vida domundo corre atrás dos prazeres eambições pessoais, a vida consagra-da deixa o afeto livre de qualquerpropriedade para amar plenamente aDeus e aos outros. A vida do mundoaposta em poder fazer o que se quer,a vida consagrada escolhe a obe-diência humilde como liberdademaior. E, enquanto a vida do mun-do depressa deixa vazias as mãos e ocoração, a vida segundo Jesus enchede paz até ao fim, como no Evange-lho, onde os anciãos chegam felizes

diário da graça. Deixar-se encontrarpor Jesus, fazer encontrar Jesus: é osegredo para manter viva a chamada vida espiritual. É o modo paranão ser absorvido numa vida asfixia-dora, onde prevalecem as queixas, aamargura e as inevitáveis deceções.

Encontrar-se em Jesus como irmãose irmãs, jovens e anciãos, para supe-rar a retórica estéril dos «bons ve-lhos tempos» — aquela nostalgia quemata a alma — para silenciar o «aquinada funciona». O coração, se en-contrar cada dia Jesus e os seus ir-mãos, não se polariza para o passa-do nem para o futuro, mas vive o«hoje» de Deus em paz com todos.

No final dos Evangelhos, há outroencontro com Jesus que pode inspi-rar a vida consagrada: o das mulhe-res no sepulcro. Foram para encon-trar um morto, o seu caminho pare-cia inútil. Também vós caminhais,no mundo, contracorrente: a vida domundo facilmente rejeita a pobreza,a castidade e a obediência. Mas, co-mo aquelas mulheres, continuai paradiante, não obstante as preocupa-ções com as pedras pesadas a remo-ver (cf. Mc 16, 3). E, como aquelasmulheres, primeiro encontrai o Se-nhor ressuscitado e vivo, estreitai-oao coração (cf. Mt 28, 9) e, logo aseguir, anunciai-o aos irmãos, comolhos que brilham de grande alegria(cf. Mt 28, 8). Sois, assim, a alvora-da perene da Igreja: vós, consagra-dos e consagradas, sois a alvoradaperene da Igreja! Desejo que hojemesmo possais reavivar o encontrocom Jesus, caminhando juntos paraEle: e isto dará luz aos vossos olhose vigor aos vossos passos.

O Papa ofereceu uma prímulaàs religiosas

que trabalham no VaticanoUma prímula a cada religiosa quetrabalha no Vaticano: foi esta a ho-menagem do Papa Francisco, atra-vés do seu esmoler, por ocasião doDia mundial da vida consagrada.Quem o revelou foi o próprio arce-bispo Konrad Krajewski que, namanhã de 2 de fevereiro, levouuma dessas plantinhas para ornar oaltar montado num barracão daárea industrial, onde celebrou comos operários dos serviços técnicos amissa na festa da Apresentação doS e n h o r.

A prímula, uma das primeirasflores que brotam depois do inver-no, é símbolo de vida e de juventu-de. E a imagem da flor, que «dis-pensa gratuitamente beleza» e que«cresce rumo ao alto, olhando parao Senhor», foi utilizada pelo prela-do na homilia, para convidar ospresentes a oferecer a Deus a pró-pria vida — trabalho, família, ale-grias e sofrimentos — do mesmomodo como fizeram Maria e José,levando ao templo o seu tesouromais precioso, o filho Jesus.

Ao lado do arcebispo esmolerconcelebraram o diretor do serviçostécnicos do Governatorato, padreRafael García de la Serrana Villalo-bos, e o pároco de Santa Ana noVaticano, o agostiniano Bruno Sil-vestrini. Juntamente com os operá-rios, conduziram a tradicional pro-cissão da Candelária, desde a car-pintaria até à oficina mecânica, on-de foi celebrada a Eucaristia. Nasua meditação, D. Krajewski voltoua falar sobre o tema do trabalhoquotidiano e convidou os presentesa visitar todos os dias, ainda queseja por poucos segundos, a vizi-nha igreja de São Peregrino:«Quando nos oferecemos ao Se-nhor, tudo se transforma, porqueEle pensa na nossa vida». No finaldo rito, o prelado agradeceu aosoperários a ajuda concreta prestadaàs atividades da esmolaria a favordos pobres e dos desabrigados.

ao ocaso da vida, como Senhor nos seus bra-ços e a alegria no cora-ção.

Como nos faz bemter o Senhor «nos bra-ços» (Lc 2, 28), à seme-lhança de Simeão! Nãosó na mente e no cora-ção, mas também nasmãos, ou seja, em tudoo que fazemos: na ora-ção, no trabalho, à me-sa, ao telefone, na esco-la, com os pobres, portodo o lado. Ter o Se-nhor nas mãos é o antí-doto contra o misticis-mo isolado e o ativismodesenfreado, porque oencontro real com Jesusendireita tanto os senti-mentalistas devotos co-mo os ativistas frenéti-cos. Viver o encontrocom Jesus é o remédiotambém contra a parali-sia da normalidade,abrindo-se ao rebuliço

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página 4 L’OSSERVATORE ROMANO quinta-feira 8 de fevereiro de 2018, número 6

Queridos irmãos e irmãs!Dou-vos as boas vindas e agradeçoao Presidente as suas amáveis pala-vras. Elas permitiram repensar onascimento do vosso Movimento, ainspiração que vos sustenta e os ob-jetivos que estabeleceis. A Cruz Ver-melha desempenha em toda a Itáliae no mundo um serviço insubstituí-vel, precioso quer pelo trabalho quematerialmente cumpris, quer pelo es-pírito com o qual o realizais, quecontribui para difundir uma mentali-dade nova, mais aberta, mais solidá-ria.

Além disso, a vossa ação mereceainda mais a gratidão de cada cida-dão porque se realiza nas mais di-versas situações, tendo que enfrentardificuldades e perigos de vários ti-pos. É assim no caso da assistênciaprestada às vítimas dos terramotos ede outras calamidades naturais, quealivia o sofrimento das populaçõesatingidas, representando um sinal daproximidade de todo o povo italia-no. O mesmo se diga no respeitanteao empenho que dedicais ao socorrodos migrantes durante o seu difícilpercurso no mar, e em receber quan-tos desembarcam e esperam ser aco-lhidos e integrados. A mão que lhesestendeis e que eles agarram é umsinal nobre, que deveria ser traduzi-do da seguinte forma: “Não te ajudosó neste instante, para te salvar daságuas do mar, mas garanto-te queestarei presente e levarei muito apeito a tua sorte”. Por esta razão, avossa presença ao lado dos migran-tes representa um sinal profético, tãonecessário na nossa época. Disse apalavra “sinal profético”: o profeta —usando uma língua que todos com-preendemos — é aquele que “esb ofe-teia"; com o seu modo de viver, como serviço que presta e com as pala-vras... “esb ofeteia”: desperta, dá ver-dadeiras bofetadas ao egoísmo so-cial, ao egoísmo da sociedade. E fazdespertar o melhor que há no cora-ção! Mas dai a bofetada com a pala-vra e com o testemunho, não com amão!

A missão do voluntário, chamadoa inclinar-se sobre quem se encontraem necessidade e a prestar-lhe opróprio socorro de forma amorosa edesinteressada, evoca a figura evan-gélica do Bom Samaritano (cf. Lc 10,25-37). É uma parábola de Jesus cujariqueza inesgotável nos oferece umaluz preciosa sobre a vossa ação e so-bre os valores estabelecidos no vossoEstatuto.

O primeiro princípio fundamentalque o Estatuto afirma é o de “huma-nidade”, que leva a «prevenir e ali-viar em todas as partes o sofrimento

humano» (Art. 1.3). A “humanida-de”, em virtude da qual assumis aresponsabilidade dos sofrimentos demuitas pessoas, é a mesma que im-pele o Bom Samaritano a inclinar-sesobre o homem ferido e deitado nochão. Ele sente compaixão e torna-seseu próximo: sem compaixão, estariadistante, e o homem que se deparoucom os bandidos permaneceria paraele um sujeito sem rosto.

Quantos são, também no nossomundo, as crianças, os idosos, asmulheres e os homens cujo rostonão é reconhecido como único e ir-repetível, e que permanecem invisí-veis porque escondidos na penum-bra da indiferença! Isso impede dever o outro, de ouvir a sua chamadae de perceber o seu sofrimento. Acultura do descarte — hoje muitoatual — é uma cultura anónima, semlaços e sem rostos. Ela cuida só dealguns, excluindo muitos outros.Afirmar o princípio de humanidadesignifica então tornar-se promotoresde uma mentalidade enraizada novalor de cada ser humano, e de umapraxe que ponha no centro da vidasocial não os interesses económicos,mas o cuidado das pessoas. Não odinheiro no centro, não: as pessoas!

O segundo princípio afirmado noEstatuto é a “i m p a rc i a l i d a d e ”, que le-va a não basear a própria ação em«distinção alguma de nacionalidade,raça, credo religioso, classe ou opi-nião política». Ela tem como conse-quência a “n e u t ra l i d a d e ” — o terceiroprincípio — pelo qual o Movimentonão se pronuncia a favor de qual-quer uma das partes nos conflitos enas controvérsias políticas, raciais oureligiosas. Este critério de ação con-trasta a tendência, hoje infelizmentetão generalizada, a distinguir quemmerece atenção e apoio de quem, aocontrário, não é digno. Mas vós ten-

des uma política: esta é a vossa polí-tica. E qual é o vosso partido políti-co? O presidente afirmou-o: vós soisdo partido político dos mais necessi-tados, dos que têm mais necessida-de. O Samaritano do Evangelho agecom imparcialidade: ele não interro-ga o homem deitado no chão antesde o ajudar, para saber quais são asua proveniência e a sua fé, ou paracompreender se foi atingido injusta-mente ou com razão. Não. O BomSamaritano não submete a examepreventivo algum, não o julga e nãosubordina o seu socorro a prerroga-tivas morais e muito menos religio-sas. Simplesmente, alivia as suas fe-ridas e depois confia-o a uma hospe-daria, cuidando antes de tudo dassuas necessidades materiais, que nãopodem ser adiadas. O Samaritanoage, paga pessoalmente — gosto dedizer que o diabo entra pelos bolsos,mas também as virtudes saem dosbolsos: paga para ajudar o outro — oSamaritano ama. Por trás da sua fi-gura sobressai a do próprio Jesus,que se inclinou sobre a humanidadee sobre cada um daqueles a quemchamou irmãos, sem fazer qualquerdistinção, mas oferecendo a sua sal-vação a cada ser humano.

A Cruz Vermelha Italiana partilhaos princípios de humanidade, impar-cialidade e neutralidade com o Mo-vimento Internacional da Cruz Ver-melha e da Meia Lua Vermelha que,reunindo 190 movimentos nacionais,constitui uma rede internacional ne-cessária para coordenar e “globali-zar” os socorros, a fim de promove-rem «a compreensão recíproca, aamizade, a cooperação e a paz dura-doura entre os povos» (cf. Estatuto,1, 3). Sejam sempre estas palavras osentido da vossa missão: a constru-ção de uma compreensão recíprocaentre as pessoas e os povos, e o nas-cimento de uma paz duradoura, quesó pode fundar-se num estilo de co-operação, que deve ser incentivadaem todos os âmbitos humanos e so-ciais, e em sentimentos de amizade.De facto, quem olha para os outrosusando os óculos da amizade e nãoas lentes da competição nem doconflito, torna-se construtor de ummundo mais vivível e humano.

Não quero concluir sem um pen-samento dirigido a quantos de entrevós perderam a vida no exercício damissão de ajuda. Perdoai-me: não aperderam, não a perderam, mas doa-ram-na! São os vossos mártires, sãoos vossos mártires. E Jesus diz-nosque não existe amor maior que dar avida pelos outros; tende estes entrevós. Que eles nos inspirem, vos ins-pirem, vos ajudem, vos protejam docéu.

E peçamos que o Espírito do Res-suscitado, que é Espírito de amor epaz, nos ensine este caminho e nosajude a realizá-lo. Peço por isso abênção de Deus sobre todos vós —Deus Pai de todos nós, Pai de todasas confissões — invocando-a em par-ticular para quantos perderam a vidano desempenho do próprio serviço epelos seus entes queridos. Recomen-do-me também eu às vossas orações.O brigado.

Aos voluntários da Cruz vermelha italiana

Contraa indiferença

Visita «ad limina»da Conferência episcopal

da Bielo-Rússia

Na manhã de 1 de fevereiro, o Papa Francisco recebeu em audiência

os membros da Conferência episcopal da Bielo-Rússia

por ocasião da quinquenal visita «ad limina apostolorum»

Dirigindo-se aos sete mil voluntários da Cruz vermelha italiana recebidos emaudiência na manhã de sábado, 27 de janeiro, na Sala Paulo VI, o PapaFrancisco propôs-lhes como modelo a figura evangélica do Bom Samaritano,convidando-os «a tornar-se promotores de uma mentalidade enraizada no valorde cada ser humano, e de uma praxe que ponha no centro da vida social não osinteresses económicos, mas o cuidado das pessoas».

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número 6, quinta-feira 8 de fevereiro de 2018 L’OSSERVATORE ROMANO página 5

Salvaguardar a consciência cristãDiscurso à Rota romana para a inauguração do ano judiciário

Uma reflexão «sobre a centralidade daconsciência» foi oferecida pelo Papaaos participantes na audiência aoTribunal Apostólico da Rota romana,que teve lugar na manhã de segunda-feria, 29 de janeiro, na SalaClementina, por ocasião dainauguração do ano judiciário.

Estimados Padres Auditores!Saúdo-vos cordialmente, começandopelo Decano, ao qual agradeço assuas palavras. Juntamente convoscosaúdo os oficiais, os advogados e to-dos os colaboradores do TribunalApostólico da Rota romana. Façovotos de que o Ano judiciário quehoje iniciámos corra bem.

Gostaria de refletir agora convos-co sobre um aspeto qualificador dovosso serviço judiciário, ou seja, so-bre a centralidade da consciência, queé ao mesmo tempo a de cada um devós e a das pessoas de cujos casosvos ocupais. Com efeito, a vossa ati-vidade expressa-se também comoministério da paz das consciências erequer ser exercida em total consciên-cia, como expressa bem a formulacom a qual as vossas sentenças sãoemanadas ad consulendum conscientiaeou ut consulatur conscientiae.

No respeitante à declaração denulidade ou validade do vínculo ma-trimonial, vós colocais-vos, num cer-to sentido, como peritos da cons-ciência dos fiéis cristãos. Neste pa-pel, sois chamados a invocar inces-santemente a assistência divina paradesempenhar com humildade e me-dida a grave tarefa que a Igreja vosconfiou, manifestando assim a liga-ção entre a certeza moral, que o juizdeve alcançar ex actis et probatis, e oâmbito da sua consciência, conheci-do unicamente pelo Espírito Santo epor Ele assistido. Com efeito, graçasà luz do Espírito é-vos concedidoentrar no âmbito sagrado da cons-ciência dos fiéis. É significativo quea antiga oração do Ad s u m u s , que eraproclamada no início de cada sessãodo Concílio Vaticano II, seja recitadacom tanta frequência no vosso Tri-bunal.

O âmbito da consciência foi mui-to querido aos Padres dos últimosdois Sínodos dos Bispos, e ressooude modo significativo na Exortaçãoapostólica pós-sinodal Amoris laeti-tia. Isto derivou da consciência queo Sucessor de Pedro e os Padres si-nodais amadureceram acerca da ne-cessidade impelente de escuta, daparte dos Pastores da Igreja, das ins-tâncias e das expetativas daquelesfiéis que tornaram a própria cons-ciência muda e ausente durante lon-gos anos e, a seguir, foram ajudadospor Deus e pela vida a reencontrarum pouco de luz, dirigindo-se àIgreja a fim de obter a paz para asua consciência.

A consciência assume um papeldecisivo nas escolhas empenhativasque os noivos devem enfrentar paraacolher e construir a união conjugale, por conseguinte, a família segun-do o desígnio de Deus. A igreja,mãe terníssima, ut consulatur cons-cientiae dos fiéis necessitados de ver-dade, entreviu a necessidade de con-

vidar quantos trabalham na pastoralmatrimonial e familiar a ter umaconsciência renovada em ajudar osnoivos a construir e preservar o san-tuário íntimo da sua consciênciacristã. A este propósito, apraz-mefrisar que nos dois Documentos emforma de motu proprio, emanados pa-ra a reforma do processo matrimo-nial, exortei a instituir a averiguaçãopastoral diocesana de modo a tornaro processo não só mais solícito, mastambém mais justo, no devido co-nhecimento de causas e motivos queestão na origem da falência matri-

laetitia, tiveram um percurso e umafinalidade orbigatórios: como salvaros jovens dos estrondos e barulhosensurdecedores do efémero, que osleva à renúncia de assumir compro-missos estáveis e positivos para obem individual e coletivo. Um condi-cionamento que silencia a voz da sualiberdade, daquela cela íntima — p re -cisamente a consciência — que sóDeus ilumina e abre à vida, se permi-tirmos que ele entre.

Quanto é preciosa e urgente aação pastoral de toda a Igreja para arecuperação, a salvaguarda, a preser-

dar a “regula fidei”» (Insegnamenti XV[1977], 663), que ilumina a consciên-cia e não pode ser ofuscada nem mi-nada. Para fazer isto — diz aindaPaulo VI — «é necessário evitar osextremismos opostos, quer da partede quem se apela à tradição parajustificar a própria desobediência aosupremo Magistério e ao Concílioecuménico, quer da parte de quantosse desenraízam do humus eclesialcorrompendo a doutrina genuína daIgreja; ambas as atitudes são sinalde subjetivismo indevido e talvez in-consciente, quando não até, infeliz-mente, de obstinação, de teimosia,de desequilíbrio; trata-se de posiçõesque ferem o coração da Igreja, Mãee Mestra» (Insegnamenti XIV [1976],500).

A fé é luz que ilumina não só opresente mas também o futuro: ma-trimónio e família são o futuro daIgreja e da sociedade. Por conse-guinte, é necessário favorecer um es-tado de catecumenado permanente, afim de que a consciência dos batiza-dos esteja aberta à luz do Espírito.A intenção sacramental nunca é fru-to de um automatismo, mas semprede uma consciência iluminada pelafé, como resultado de uma combina-ção entre humano e divino. Nestesentido, a união esponsal pode serconsiderada verdadeira unicamentese a intenção humana dos espososestiver orientada para aquilo quequerem Cristo e a Igreja. A fim detornar cada vez mais conscientes dis-to os futuros esposos, é necessária acontribuição dos bispos e dos sacer-dotes, e também de outras pessoascomprometidas na pastoral, religio-sos e fiéis leigos corresponsáveis namissão da Igreja.

Queridos juízes da Rota Romana,a estreita ligação entre o âmbito daconsciência e o dos processos matri-moniais dos quais vos ocupais dia-riamente, requer que eviteis que oexercício da justiça seja reduzido aum mero desempenho burocrático.Se os tribunais eclesiásticos caíssemnesta tentação, atraiçoariam a cons-ciência cristã. Eis por que, no proce-dimento do processus brevior, estabe-leci que seja não só tornado maisevidente o papel de vigilância doBispo diocesano, mas também queele mesmo, juiz nativo na Igreja quelhe foi confiada, julgue em primeirainstância os possíveis casos de nuli-dade matrimonial. Devemos impedirque a consciência dos fiéis em difi-culdade, no respeitante ao seu matri-mónio, se feche a um caminho degraça. Alcança-se esta finalidadecom um acompanhamento pastoral,com o discernimento das consciên-cias (cf. Exort. ap. Amoris laetitia,242) e com a obra dos nossos tribu-nais. Esta obra deve ser desempe-nhada na sabedoria e na busca daverdade: só assim a declaração denulidade produz uma libertação dasconsciências.

Renovo a cada um a minha grati-dão pelo bem que fazeis ao povo deDeus, servindo a justiça. Invoco aassistência divina para o vosso traba-lho e concedo de coração a BênçãoAp ostólica.

monial. Por outro lado, na Exorta-ção apostólica Amoris laetitia, foramindicados percursos pastorais paraajudar os noivos a entrar sem receiono discernimento e na consequenteescolha do futuro estado de vidaconjugal e familiar, descrevendo nosprimeiros cinco capítulos a riquezaextraordinária do pacto conjugal es-tabelecido por Deus nas Escrituras evivido pela Igreja durante a história.

É necessária como nunca uma con-tínua experiência de fé, esperança ecaridade, para que os jovens voltem adecidir, com consciência segura e se-rena, que a união conjugal aberta aodom dos filhos é grande alegria paraDeus, para a Igreja, para a humani-dade. O caminho sinodal de reflexãosobre o matrimónio e a família, e asucessiva Exortação apostólica Am o r i s

batismal, isto é, radicado no batis-mo, e ao mesmo tempo na vida, ne-cessita do caráter permanente, sendopermanente a g ra ç a do sacramentomatrimonial, que precisamente porser g ra ç a é fruto do mistério, cuja ri-queza não pode deixar de ser preser-vada e assistida na consciência doscônjuges como indivíduos e comocasal. Trata-se, na realidade, de figu-ras peculiares daquela incessante cu-ra animarum que é a razão de ser daIgreja, e em primeiro lugar de nósPa s t o re s .

Contudo, a cura das consciênciasnão pode ser compromisso exclusivodos Pastores, mas, com responsabili-dades e modalidades diversas, é mis-são de todos, ministros e fiéis batiza-dos. O Beato Paulo VI exortava à«fidelidade absoluta para salvaguar-

Leslie Nolan, «Choose to walk here»

vação de uma consciên-cia cristã, iluminada pe-los valores evangélicos!Será um empreendi-mento longo e não fá-cil, o qual exige quebispos e presbíteros tra-balhem incansavelmentepara iluminar, defendere apoiar a consciênciacristã do nosso povo. Avoz sinodal dos PadresBispos e a sucessivaExortação apostólicaAmoris laetitia garanti-ram um ponto primor-dial: a relação necessá-ria entre a regula fidei,ou seja, a fidelidade daIgreja ao magistério in-tocável sobre o matri-mónio, assim como so-bre a Eucaristia, e aatenção urgente da pró-pria Igreja aos proces-sos psicológicos e reli-giosos de todas as pes-soas chamadas à opçãomatrimonial e familiar.Acolhendo os votos dosPadres sinodais, já tivea oportunidade de reco-mendar o compromissode um catecumenadomatrimonial, no sentidode um itinerário indis-pensável dos jovens edos casais destinado afazer reviver a sua cons-ciência cristã, apoiadapela graça dos dois sa-cramentos, batismo ematrimónio.

Como afirmei outrasvezes, o catecumenadoé em si único, por ser

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página 6 L’OSSERVATORE ROMANO quinta-feira 8 de fevereiro de 2018, número 6

Recorrer a Deus para justificar a violência é blasfémia

Na religiãonão há espaço para ódio

«Uma das maiores blasfémias é chamar Deus como garante dos próprios pecadose crimes», reiterou o Papa aos participantes na conferência «Tackling violencecommitted in the name of religion», recebidos em audiência na manhã de 2 defevereiro, na sala Clementina.

Por isso, é preciso comprometer-sejuntos, líderes políticos e responsá-veis religiosos, professores e agentesnos campos da educação, da forma-ção e da informação, para admoestarquem quer que seja tentado por for-mas perversas de religiosidade des-viada, que elas nada têm a ver como testemunho de uma religião dignadeste nome.

Isto ajudará quantos de boa von-tade procuram Deus a encontrá-loverdadeiramente, a encontrar Aqueleque liberta do medo, do ódio e daviolência, que deseja servir-se dacriatividade e das energias de cadaum para propagar o seu desígnio deamor e de paz, destinado a todos.

Gentis Senhoras e Senhores, ex-primo novamente o meu apreço pe-la vossa vontade de reflexão e dediálogo sobre um tema tão dramati-camente importante, e por terdesoferecido uma contribuição tão qua-

lificada para o crescimento da cul-tura da paz, fundamentada sempresobre a verdade e o amor. Deus vosabençoe, bem como o vosso traba-lho.

O brigado!

Prezados amigos!Dou-vos as boas-vindas e agradeço-vos a vossa presença. É muito signi-ficativo que os responsáveis políticose os chefes religiosos se encontrem edebatam entre si sobre o modo decontrastar a violência cometida emnome da religião.

Gostaria de recordar aqui o quepude afirmar em várias circunstân-cias, de maneira particular por oca-sião da minha viagem ao Egito:«Deus, amante da vida, não cessa deamar o homem e, por isso, exorta-oa contrastar o caminho da violên-cia... Para atuar este imperativo, sãochamadas em primeiro lugar, sobre-tudo nos dias de hoje, as religiões,porque, encontrando-nos na necessi-dade urgente do Absoluto, é impres-cindível excluir qualquer absolutiza-ção que justifique formas de violên-cia. Com efeito, a violência é a nega-ção de toda a religiosidade autênti-ca... Devemos denunciar as violaçõescontra a dignidade humana e contraos direitos humanos, trazer à luz dodia as tentativas de justificar toda aforma de ódio em nome da religiãoe condená-las como falsificação idó-latra de Deus» (Discurso aos partici-pantes na Conferência internacional emprol da paz, Al-Azhar ConferenceCentre, Cairo, 28 de abril de 2017).

A violência propagandada e atua-da em nome da religião não podedeixar de causar descrédito em rela-ção à própria religião; como tal, de-veria ser condenada por todos e comconvicção especial, pelo homem au-tenticamente religioso, o qual sabeque Deus é unicamente bondade,amor, compaixão, e que n’Ele nãopode haver espaço para o ódio, orancor e a vingança. A pessoa reli-giosa sabe que uma das maioresblasfémias é chamar Deus como ga-rante dos próprios pecados e crimes,de o chamar a justificar o homicídio,o massacre, a escravização, a explo-ração em todas as suas formas, aopressão e a perseguição de pessoase de populações inteiras.

A pessoa religiosa sabe que Deusé o Santo e que ninguém pode pre-tender apelar-se ao seu nome parapraticar o mal. Cada líder religioso échamado a desmascarar qualquertentativa de manipular Deus para fi-nalidades que nada têm a ver comEle e com a sua glória. É necessáriomostrar, sem se cansar, que cada vi-da humana tem em si mesma um ca-ráter sagrado, e merece respeito,consideração, compaixão e solidarie-dade, prescindindo da etnia, da reli-gião, da cultura e da orientaçãoideológica ou política.

A pertença a uma determinada re-ligião não confere dignidade algu-ma, nem direitos suplementares aquem a ela adere, assim como a não-pertença não lha tira nem a diminui.

Corrupção e cultura da morteIntenção de oração para o mês de fevereiro

«Oremos juntos para que todos osque têm o poder material, políticoou espiritual não se deixem domi-nar pela corrupção»: eis o apelolançado pelo Papa Francisco namensagem vídeo com a intençãopara o mês de fevereiro, confiada àrede mundial de oração e difundidana internet (www.thepopevi-d e o . o rg ) .

«O que está na base da escravi-dão, do desemprego, do abandonodos bens comuns e da natureza?»,interroga-se o Pontífice, enquanto

passam imagens de semblantes mar-cados pelo sofrimento e de ruínasde guerra. «A corrupção», respon-de Francisco, definindo-a «um pro-cesso mortal que nutre a cultura damorte» e recordando que «a cobiçado poder e do ter não conhece li-mites». As palavras do Papa sãoacompanhadas por instantâneas quedescrevem alguns dos dramas hu-manos e sociais dos nossos tempos:prostituição, poluição e máfia. «Acorrupção — insiste o Pontífice —não se combate com o silêncio. De-

vemos falar sobre ela, denunciar osseus males e entendê-la, para podermostrar a vontade de fazer valer amisericórdia sobre a mesquinhez, abeleza sobre o nada».

Assim, concluiu convidando anão se deixar «dominar pela cor-rupção», com sugestivos pormeno-res da Capela Sistina e da “Pieda-de”, de Miguel Ângelo, que prece-dem as imagens de um menino quecorre num campo de trigo.

Como os precedentes, traduzidoem nove línguas, o vídeo foi prepa-rado pela agência La Machi, que seocupa da produção e da distribui-ção, em colaboração com VaticanMedia, que o gravou. Pela primeiravez colaborou na sua realização umorganismo da Cúria romana, o Di-castério para o serviço do desenvol-vimento humano integral. Comefeito, esta iniciativa constitui umaetapa do percurso começado pelomesmo dicastério, no dia 15 de ju-nho do ano passado, com o debateinternacional sobre a corrupção,que teve lugar na sede da Pontifíciaacademia das ciências.

E foi significativa a escolha deprojetar o vídeo em público, duran-te o congresso sobre “C o r ru p ç ã o ,apocalipse da democracia”, realiza-do no bairro “Scampia” de Nápo-les, na tarde de 3 de fevereiro, naescola intitulada a Attilio Romanò,vítima da organização criminosa“camorra”. No encontro intervieramo padre Luigi Ciotti, presidente efundador de “Libera. Associazioni,nomi e numeri contro le mafie”; oarcebispo Silvano Maria Tomasi; opadre Raffaele Grimaldi, inspetor-geral dos capelães dos cárceres ita-lianos; e Vittorio V. Alberti, oficialdo Dicastério para o serviço do de-senvolvimento humano integral.

Encontro com a presidênciada Conferência episcopal argentina

O Papa recebeu em audiência, na manhã de 3 de fevereiro,a presidência da Conferência episcopal argentina: o presidente, D. Óscar Vicente Ojea,

bispo de San Isidro; o cardeal Mario Aurelio Poli, arcebispo de Buenos Aires, primeiro vice-presidente; D. Marcelo Daniel Colombo, bispo de La Rioja, segundo vice-presidente;

e D. Carlos Humberto Malfa, bispo de Chascomús, secretário-geral

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número 6, quinta-feira 8 de fevereiro de 2018 L’OSSERVATORE ROMANO página 7

A usura é um «pecado grave» que«humilha e mata»: esta forte denúnciaesteve no centro do discurso dirigidopelo Papa Francisco aos membros daConsulta nacional italiana antiusura,recebidos em audência na manhã de 3de fevereiro, na sala Clementina.

Caros irmãos e irmãs!Estou feliz por vos receber e porpartilhar convosco este momento dereflexão sobre um flagelo, infeliz-mente difundido e ainda muito sub-merso: a usura. Agradeço ao Presi-dente as suas amáveis palavras, e di-rijo o pensamento ao Padre Massi-mo Rastrelli, ausente porque enfer-mo, que em 1991 constituiu a primei-ra Fundação antiusura.

Acompanho com particular aten-ção o vosso percurso de luta contraa usura, que se torna cada vez maisqualificado e concreto com a expe-riência e a constituição de novasFundações, distribuídas em todo oterritório nacional através de cente-nas de Centros de escuta. São ba-luartes, escolas de humanidade e deeducação para a legalidade, fruto deuma sensibilidade que encontra naPalavra de Deus a sua inspiração ilu-minadora e age silenciosa e laborio-samente na consciência das pessoas.

Nos vossos primeiros vinte e seisanos de serviço salvastes mais devinte e cinco mil famílias da pressãoda dívida usurária e do risco da usu-ra; salvando-lhes a casa, e por vezesa pequena empresa, ajudaste-as a re-cuperar a dignidade da qual tinhamsido expropriadas. E isto merecegrande reconhecimento. Obrigado,muito obrigado!

A usura humilha e mata. A usuraé um mal antigo e infelizmente ain-da submerso que, como uma serpen-te, estrangula as vítimas. É necessá-rio preveni-la, libertando as pessoasda patologia da dívida, contraídapara a subsistência ou para salvar aempresa. E pode ser evitada, edu-cando para um estilo de vida sóbrio,que saiba distinguir entre o que ésupérfluo e aquilo que é necessário,e que responsabilize a não contrairdívidas para adquirir coisas às quaisse poderia renunciar. É importanterecuperar as virtudes da pobreza edo sacrifício: da pobreza, para nãose tornar escravo das coisas; e do sa-crifício, porque da vida não se podereceber tudo.

É necessário formar uma mentali-dade fundamentada na legalidade ena honestidade, nos indivíduos e nasinstituições; incrementar a presençade um voluntariado motivado e dis-ponível para com os necessitados, afim de que eles se sintam ouvidos,aconselhados e orientados, para sairda sua condição humilhante.

Na base das crises económicas efinanceiras há sempre um conceitode vida que põe em primeiro lugar olucro, e não a pessoa. A dignidadehumana, a ética, a solidariedade e obem comum deveriam estar sempreno centro das políticas económicaspostas em prática pelas instituiçõespúblicas. Delas se espera que desin-centivem com medidas adequadas,instrumentos que, direta ou indireta-mente, são causa de usura, como por

exemplo o jogo de azar, outro flage-lo. Eu vi, tomei conhecimento demulheres idosas que, em Buenos Ai-res, iam ao banco para receber a re-forma e dali se dirigiam ao local dojogo de azar. É uma patologia quete domina e te mata!

A usura é um pecado grave: mataa vida, espezinha a dignidade daspessoas, é veículo de corrupção eimpede o bem comum. Ela debilitatambém os fundamentos sociais eeconómicos de um país. Efetivamen-te, com tantos pobres, tantas famí-lias endividadas, tantas vítimas decrimes graves e tantas pessoas cor-ruptas, nenhum país pode progra-mar uma retomada económica sériae, muito menos, sentir-se seguro.

Estimados irmãos e irmãs, bem seique o serviço que prestais é árduo:trata-se de colaborar para que o sis-tema económico-social seja humanoe que a mensagem evangélica possailuminar o coração e a alma das pes-soas, como certo dia aconteceu comZaqueu, rico e corrupto chefe dos“publicanos” de Jericó (cf. Lc 19, 1-10), e como o seu colega Mateus,que Jesus fitou com misericórdia eescolheu como discípulo, e que háum ano é Padroeiro das Fundaçõesantiusura (cf. Mt 9, 9-13). Uma bo-nita peregrinação que podeis fazer,para ver a alma de um homem ape-gado ao dinheiro, à usura, é a SãoLuís dos Franceses, a Conversão deMateus, de Caravaggio. Mateus fazassim com o dinheiro [traça um ges-to], como se fosse seu filho. Isto re-presenta bem a atitude do homemapegado ao dinheiro. O Senhor ins-pire e ajude as Autoridades públicas,a fim de que as pessoas e as famíliaspossam usufruir dos benefícios dalei, assim como de todas as outrasrealidades económicas; inspire eapoie os responsáveis do sistemabancário, para que vigiem sobre aqualidade ética das atividades dasinstituições de crédito. Vale a penaressaltar que muitos bancos nasce-ram e se difundiram no mundo exa-tamente para libertar os pobres dausura, mediante empréstimos sempenhor e sem juros.

Prezados irmãos, o vosso serviçoexige que sejais homens e mulheresde encontro, de escuta e de proximi-dade. Por isso, exorto-vos a mantero olhar e o coração fixos em Jesus, ameditar as páginas do Evangelhonas quais Ele se encontra com ospobres e os mendigos, os leprosos e

os paralíticos, “re e rg u e n d o - o s ”, resti-tuindo-lhes dignidade e futuro. En-frentanto a usura e a corrupção,também vós podeis transmitir espe-rança e força às vítimas, a fim deque elas consigam recuperar confian-ça e satisfazer as suas necessidades.Para as instituições, sois um estímu-lo para garantir respostas concretas aquantos se sentem desnorteados, àsvezes desesperados e não sabem co-mo fazer para manter a sua família.Para os especuladores, podeis seruma chamada ao sentido de huma-nidade e de justiça, para adquiriremconsciência de que, em nome do di-nheiro, não se podem matar os ir-mãos!

Além disso, encorajo-vos a dialo-gar com quantos têm responsabilida-des no campo da economia e das fi-nanças, a fim de que sejam promovi-das iniciativas que concorram para aprevenção da usura. Não compete amim citar exemplos concretos: vóssabeis quais são; mas trata-se sempre

de respeitar os indivíduos, de colo-car realmente no centro a pessoa e afamília, não com palavras mas comações.

As pessoas que fizestes sair da usu-ra podem testemunhar que a escuri-dão dentro do túnel por elas atraves-sado é densa e angustiante, mas exis-te também uma luz mais forte quepode iluminar e dar alívio. Sede umareferência de esperança para os po-bres, para as pessoas endividadas epara as empresas em dificuldade.Continuai o vosso serviço com perse-verança e coragem: trata-se de umfermento precioso para a sociedadeinteira. Bem o sabem as vítimas dausura e do jogo de azar, que vieramaqui com uma sua representação.Saúdo-as e animo-as, porque sei queelas empreenderam um caminho no-vo com a ajuda de Deus e com a so-lidariedade de numerosos irmãos.Transmiti a vossa coragem às pessoasque ainda se encontram dentro da-quele túnel, narrando a vossa expe-riência e testemunhando que é possí-vel sair da usura e do jogo de azar.

Juntos, façamos apelo a favor deum renovado humanismo económi-co, que «ponha fim à economia daexclusão e da iniquidade», à econo-mia que mata, a sistemas económi-cos em que homens e mulheres jánão constituem pessoas, mas são re-duzidas a instrumentos de uma lógi-ca do descarte que gera profundosdesequilíbrios (cf. Mensagem ao Sim-pósio internacional sobre a economia,26 de novembro de 2016).

Agradeço-vos a vossa presença e ovosso trabalho e, abençoo-vos de co-ração, bem como a vossa labuta. E,por favor, não vos esqueçais de rezarpor mim. Obrigado!

A usura humilha e mataO Pontífice denunciou o fenómeno e invocou iniciativas de prevenção

Audiênciaao presidente da Turquia

Na manhã de 5 de fevereiro, o Papa recebeu em audiência, no Palácioapostólico do Vaticano, o presidente da República da Turquia, Sua Exce-lência o senhor Recep Tayyip Erdoğan, o qual em seguida se encontroucom o cardeal Pietro Parolin, secretário de Estado, acompanhado pelo ar-cebispo Paul Richard Gallagher, secretário para as Relações com os Esta-dos.

Durante os colóquios cordiais foram evocadas as relações bilaterais en-tre a Santa Sé e a Turquia e falou-se da situação do país, da condição daComunidade católica, do compromisso de acolhimento dos numerosos re-fugiados e dos desafios com ele relacionados. Depois, foi tratada a situa-ção do Médio Oriente, com especial referência ao estatuto de Jerusalém,realçando a necessidade de promover a paz e a estabilidade na Regiãocom o diálogo e a negociação, no respeito dos direitos humanos e da le-galidade internacional.

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número 6, quinta-feira 8 de fevereiro de 2018 L’OSSERVATORE ROMANO página 8/9

Mensagem para a Quaresma

Não se apague a caridadeFrancisco denunciou a violência contra os nascituros, os idosos e os estrang e i ro s

Quando a caridade se apaga e se rejeita a consolação deDeus, é fácil ceder à «violência que se abate sobrequantos são considerados uma ameaça para as nossas“certezas”: o nascituro, o idoso doente, o hóspede depassagem, o estrangeiro, mas também o próximo que nãocorresponde às nossas expetativas», escreveu Francisco namensagem para a Quaresma de 2018, centrada sobreuma expressão de Jesus referida pelo Evangelho deMateus: «Porque se multiplicará a iniquidade, vairesfriar o amor de muitos» (24, 12).

Outros falsos profetas são aqueles«charlatães» que oferecem soluçõessimples e imediatas para todas as afli-ções, mas são remédios que se mostramcompletamente ineficazes: a quantos jo-vens se oferece o falso remédio da dro-ga, de relações “passageiras”, de lucrosfáceis mas desonestos! Quantos acabamenredados numa vida completamentevirtual, onde as relações parecem maissimples e ágeis, mas depois revelam-sedramaticamente sem sentido! Estes im-postores, ao mesmo tempo que ofere-cem coisas sem valor, tiram aquilo queé mais precioso como a dignidade, a li-berdade e a capacidade de amar. É oengano da vaidade, que nos leva a fa-zer a figura de pavões para, depois, nosprecipitarmos no ridículo; e, do ridícu-lo, não se volta atrás. Não nos admire-mos! Desde sempre o demónio, que é«mentiroso e pai da mentira» (Jo 8,44), apresenta o mal como bem e o fal-so como verdadeiro, para confundir ocoração do homem. Por isso, cada umde nós é chamado a discernir, no seucoração, e verificar se está ameaçadopelas mentiras destes falsos profetas. Épreciso aprender a não se deter no ní-vel imediato, superficial, mas reconhe-cer o que deixa dentro de nós um rastobom e mais duradouro, porque vem deDeus e visa verdadeiramente o nossob em.

Um coração frio

Na Divina Comédia, ao descrever oinferno, Dante Alighieri imagina o dia-bo sentado num trono de gelo;2 habitano gelo do amor sufocado. Interrogue-mo-nos então: como se resfria o amorem nós? Quais são os sinais indicado-res de que o amor corre o risco de seapagar em nós?

O que apaga o amor é, antes de maisnada, a ganância do dinheiro, «raiz detodos os males» (1 Tm 6, 10); depoisdela, vem a recusa de Deus e, conse-quentemente, de encontrar consolaçãon’Ele, preferindo a nossa desolação aoconforto da sua Palavra e dos Sacra-mentos.3 Tudo isto se permuta em vio-lência que se abate sobre quantos sãoconsiderados uma ameaça para as nos-sas «certezas»: o bebé nascituro, o ido-so doente, o hóspede de passagem, oestrangeiro, mas também o próximoque não corresponde às nossas expeta-tivas.

A própria criação é testemunha silen-ciosa deste resfriamento do amor: a ter-ra está envenenada por resíduos lança-dos por negligência e por interesses; osmares, também eles poluídos, deveminfelizmente guardar os despojos detantos náufragos das migrações força-das; os céus — que, nos desígnios deDeus, cantam a sua glória — são sulca-

dos por máquinas que fazem choverinstrumentos de morte.

E o amor resfria-se também nas nos-sas comunidades: na Exortação apostó-lica Evangelii gaudium procurei descre-ver os sinais mais evidentes desta faltade amor. São eles a acédia egoísta, opessimismo estéril, a tentação de se iso-lar empenhando-se em contínuas guer-ras fratricidas, a mentalidade mundanaque induz a ocupar-se apenas do quedá nas vistas, reduzindo assim o ardormissionário.4

Que fazer?

Se porventura detetamos, no nossoíntimo e ao nosso redor, os sinais aca-bados de descrever, saibamos que, a

par do remédio por vezes amargo daverdade, a Igreja, nossa mãe e mestra,nos oferece, neste tempo de Quaresma,o remédio doce da oração, da esmola edo jejum.

Dedicando mais tempo à o ra ç ã o , pos-sibilitamos ao nosso coração descobriras mentiras secretas, com que nos enga-namos a nós mesmos,5 para procurar fi-nalmente a consolação em Deus. Ele énosso Pai e quer para nós a vida.

A prática da esmola liberta-nos daganância e ajuda-nos a descobrir que ooutro é nosso irmão: aquilo que pos-suo, nunca é só meu. Como gostariaque a esmola se tornasse um verdadeiroestilo de vida para todos! Como gosta-ria que, como cristãos, seguíssemos oexemplo dos Apóstolos e víssemos, na

possibilidade de partilhar com os ou-tros os nossos bens, um testemunhoconcreto da comunhão que vivemos naIgreja. A este propósito, faço minhas aspalavras exortativas de São Paulo aosCoríntios, quando os convidava a to-mar parte na coleta para a comunidadede Jerusalém: «Isto é o que vos con-vém» (2 Cor 8, 10). Isto vale de modoespecial na Quaresma, durante a qualmuitos organismos recolhem coletas afavor das Igrejas e populações em difi-culdade. Mas como gostaria tambémque no nosso relacionamento diário,perante cada irmão que nos pede aju-da, pensássemos: aqui está um apelo daProvidência divina. Cada esmola é umaocasião de tomar parte na Providênciade Deus para com os seus filhos; e, sehoje Ele se serve de mim para ajudarum irmão, como deixará amanhã deprover também às minhas necessidades,Ele que nunca se deixa vencer em ge-n e ro s i d a d e ? 6

Por fim, o jejum tira força à nossaviolência, desarma-nos, constituindouma importante ocasião de crescimen-to. Por um lado, permite-nos experi-mentar o que sentem quantos não pos-suem sequer o mínimo necessário, pro-vando dia a dia os aguilhões da fome.Por outro, expressa a condição do nos-so espírito, faminto de bondade e se-dento da vida de Deus. O jejum des-perta-nos, torna-nos mais atentos a

Deus e ao próximo, reanima a vontadede obedecer a Deus, o único que saciaa nossa fome.

Gostaria que a minha voz ultrapas-sasse as fronteiras da Igreja católica, al-cançando a todos vós, homens e mu-lheres de boa vontade, abertos à escutade Deus.

Se vos aflige, como a nós, a difusãoda iniquidade no mundo, se vos preo-cupa o gelo que paralisa os corações ea ação, se vedes esmorecer o sentido dahumanidade comum, uni-vos a nós pa-ra invocar juntos a Deus, jejuar juntose, juntamente connosco, dar o que pu-derdes para ajudar os irmãos!

O fogo da Páscoa

Convido, sobretudo os membros daIgreja, a empreender com ardor o cami-nho da Quaresma, apoiados na esmola,no jejum e na oração. Se por vezes pa-rece apagar-se em muitos corações oamor, este não se apaga no coração deDeus! Ele sempre nos dá novas oca-siões, para podermos recomeçar a amar.

Ocasião propícia será, também esteano, a iniciativa «24 horas para o Se-nhor», que convida a celebrar o sacra-mento da Reconciliação num contextode adoração eucarística. Em 2018, aque-la terá lugar nos dias 9 e 10 de março —uma sexta-feira e um sábado — inspi-

rando-se nestas palavras do Salmo 130:«Em ti encontramos o perdão» (v. 4).Em cada diocese, pelo menos uma igre-ja ficará aberta durante 24 horas conse-cutivas, oferecendo a possibilidade deadoração e da confissão sacramental.

Na noite de Páscoa, reviveremos osugestivo rito de acender o círio pascal:a luz, tirada do «lume novo», pouco apouco expulsará a escuridão e ilumina-rá a assembleia litúrgica. «A luz deCristo, gloriosamente ressuscitado, nosdissipe as trevas do coração e do espíri-to»,7 para que todos possamos reviver aexperiência dos discípulos de Emaús:ouvir a palavra do Senhor e alimentar-nos do Pão eucarístico permitirá que onosso coração volte a inflamar-se de fé,esperança e amor.

Abençoo-vos de coração e rezo porvós. Não vos esqueçais de rezar pormim.

Vaticano, 1 de novembro de 2017Solenidade de Todos os Santos

1 Missal Romano, 1º Domingo da Qua-resma, Oração Coleta.2 «Imperador do reino em dor tamanho/ saía a meio peito ao gelo baço» (In-ferno X X X I V, 28-29).3 «É curioso, mas muitas vezes temosmedo da consolação, medo de ser con-solados. Aliás, sentimo-nos mais segu-ros na tristeza e na desolação. Sabeisporquê? Porque, na tristeza, quase nossentimos protagonistas; enquanto, naconsolação, o protagonista é o EspíritoSanto» (An g e l u s , 7 de dezembro de2014).4 Cf. nn. 76-109.5 Cf. Bento XVI, Carta enc. Spe salvi,33.6 Cf. Pio XII, Carta enc. Fidei donum,III.7 Missal Romano, Vigília pascal, Lucer-nário.Mary Freeman, «Quaresma»

Uma criança nadano meio de garrafas de plástico e lixo

perto de Manila (Reuters)

O grande motorO «grande motor» da vida cristã é «oamor» e por conseguinte é precisoprestar atenção aos diversos obstáculosque se podem encontrar na vida diáriae que «impedem a nossa resposta àchamada do amor». Assim o cardealPeter Kodwo Appiah Turkson sinteti-zou o conteúdo da mensagem escritapelo Papa Francisco para a quaresma.Ao intervir na conferência de apresen-tação da mensagem, realizada na Salade imprensa da Santa Sé na manhã de6 de fevereiro, o prefeito do Dicastériopara o serviço do desenvolvimento hu-mano integral ilustrou brevemente odocumento e o seu conteúdo. Eviden-ciou em particular que Francisco ad-verte o homem contemporâneo contraos «falsos profetas» e indica a impor-tância dos instrumentos tradicionaisda oração, do jejum e da esmola.

Juntamente com o purpurado parti-ciparam na conferência de imprensamonsenhor Krzysztof Marcjanowicz,oficial do Pontifício conselho para apromoção da nova evangelização, eNatalia Peiró, secretária-geral da Cári-tas da Espanha. O prelado ilustrou ainiciativa “24 horas para o Senhor”, re-

cordada também pelo Papa no finalda mensagem. Trata-se, explicou, deum encontro organizado já há cincoanos por iniciativa do Dicastério e queprevê, nas dioceses de todo o mundo,um dia de abertura contínua de algu-mas igrejas com o convite a celebrar osacramento da reconciliação num con-texto de adoração eucarística. Umafórmula simples, acrescentou monse-nhor Marcjanowicz, que contudo semostrou capaz de responder à sede demisericórdia das pessoas. O lema esco-lhido para este ano foi tirado do sal-mo 129: «Em vós encontra-se o per-dão».

Natalia Peiró falou em nome de to-dos os voluntários da Cáritas espanho-la que ajudaram cerca de três milhõesde pessoas no último ano. Referiu-se aquantos são testemunhas de gratuiti-dade para com os outros e a quantosencontram dificuldade na vida e pe-dem respeito pelos próprios direitos.A Cáritas, com os seus voluntários evoluntárias e com quantos trabalhamnela, disse Natalia Peiró, é a expressãoda alegria na verdade de quem lutacontra a injustiça e se rebela contra a

desigualdade. A verdadeira prioridadedo anúncio do reino passa pela parti-lha da alegria e da bem-aventurança,mas também das dificuldades e das in-certezas das mulheres e dos homensdo nosso tempo.

Respondendo às perguntas dos jor-nalistas, o cardeal Turkson entrou nospormenores da mensagem e frisou aforça com que o Papa Francisco adver-te contra a «difusão da iniquidade»:às vezes, explicou, trata-se de compor-tamentos sociais, outras vezes são asescolhas políticas dos vários países.Inserem-se neste alerta também as di-versas respostas ao problema dos mi-grantes: «há quem propende para“permanecer na varanda” e não se sen-tir envolvido» ou então quem se aban-dona a formas de fechamento ou atéde violência. E sobre o tema da vio-lência, o purpurado quis especificarquanto é importante despertar asconsciências: «O Papa — disse — falade vários tipos de violência. Não só deguerra ou de violência física». De fac-to, é violência tudo aquilo que põe emquestão e fere a dignidade humana».

Todos somos chamadosa nos comprometermos a proteger

os menores no mundo digital

(@Pontifex_pt)

«Porque se multiplicaráa iniquidade, vai resfriar

o amor de muitos» (Mt 24, 12)

Amados irmãos e irmãs!Mais uma vez vamos encontrar-noscom a Páscoa do Senhor! Todos osanos, com a finalidade de nos prepararpara ela, Deus na sua Providência ofe-rece-nos a Quaresma, «sinal sacramen-tal da nossa conversão»,1 que anuncia etorna possível voltar ao Senhor de todoo coração e com toda a nossa vida.

Com a presente mensagem desejo,este ano também, ajudar toda a Igrejaa viver, neste tempo de graça, com ale-gria e verdade; faço-o deixando-me ins-pirar pela seguinte afirmação de Jesus,que aparece no Evangelho de Mateus:«Porque se multiplicará a iniquidade,vai resfriar o amor de muitos» (24, 12).

Esta frase situa-se no discurso quetrata do fim dos tempos, pronunciadoem Jerusalém, no Monte das Oliveiras,precisamente onde terá início a paixãodo Senhor. Dando resposta a uma per-gunta dos discípulos, Jesus anunciauma grande tribulação e descreve a si-tuação em que poderia encontrar-se acomunidade dos crentes: à vista de fe-nómenos espaventosos, alguns falsosprofetas enganarão a muitos, a pontode ameaçar apagar-se, nos corações, oamor que é o centro de todo o Evange-lho.

Os falsos profetas

Escutemos este trecho, interrogando-nos sobre as formas que assumem osfalsos profetas.

Uns assemelham-se a «encantadoresde serpentes», ou seja, aproveitam-sedas emoções humanas para escravizaras pessoas e levá-las para onde elesquerem. Quantos filhos de Deus aca-bam encandeados pelas adulações deum prazer de poucos instantes que seconfunde com a felicidade! Quantoshomens e mulheres vivem fascinadospela ilusão do dinheiro, quando este,na realidade, os torna escravos do lucroou de interesses mesquinhos! Quantosvivem pensando que se bastam a simesmos e caem vítimas da solidão!

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página 10 L’OSSERVATORE ROMANO quinta-feira 8 de fevereiro de 2018, número 6

Entrevista ao secretário do Dicastério para os leigos, a família e a vida

A experiência de AparecidaNICOLA GORI

A próxima edição da Jmj será reali-zada no sinal de Maria, para que aIgreja aprenda cada vez mais a sermãe que ouve, acompanha e cami-nha com os jovens. Disto está con-victo o padre Alexandre Awi Mello,desde junho passado secretário doDicastério para os leigos, a família ea vida. Faltando um ano para o en-contro do Panamá, nesta entrevista aL’Osservatore Romano, o sacerdotebrasileiro falou sobre a missão queFrancisco lhe confiou.

Nos próximos dois anos os jovens serãoprotagonistas de dois grandes eventos: oSínodo e a Jmj. Como valorizar estecontributo?

Nos meus dezasseis anos de vidasacerdotal, sempre fui assistente dapastoral juvenil, dentro e fora domovimento de Schoenstatt. Aprendia acreditar nos jovens e a deixar-mesurpreender por eles. Penso quepoucas vezes na história da Igrejauniversal os jovens tenham sido pos-tos tão no centro das preocupações,das reflexões e das ações eclesiais.Seria grave se os pastores não apro-

veitassem esta oportunidade parapromover o protagonismo dos jo-vens; especificamente: deixando-osfalar, ouvindo-os, levando a sério assuas inquietações, apoiando-os a fimde que sejam eles os artífices da mu-dança que propõem, acompanhan-do-os nos sucessos e nas falências,dando-lhes espaço e confiança, dei-xando que nos surpreendam com asua criatividade e generosidade. A

Jornada mundial da juventude de2019 foi colocada pelo Papa sob osinal de Maria, de quem devemoscontinuar a aprender a ser uma Igre-ja mãe, que confia nas potencialida-des dos seus filhos, os acompanha,os educa e promove o seu protago-nismo.

Qual foi a sua experiência em Apareci-da ao lado do então cardeal Bergoglio?

Sem dúvida foi a pessoa que maisme impressionou na Conferência doepiscopado latino-americano. Na-quela época dei testemunho disto,sem nunca imaginar que ele poderiatornar-se Papa. Foram apenas vintedias de atividades juntos, tendo sidoeu um dos secretários da comissãode redação do documento final queele presidia, mas suficientes para tera graça de experimentar a sua hu-mildade, a sua lucidez intelectual, asua capacidade de trabalho em gru-po, a sua sensibilidade humana e es-piritual, além do seu profundo senti-do de responsabilidade eclesial.

Que contributo a sua experiência pas-toral na América Latina pode dar àatividade do dicastério?

Com o Papa Francisco a experiên-cia eclesial latino-americana está aconfluir na Igreja universal. A ricatradição dessa Igreja de periferiaagora chega ao centro da Igreja. De“Igreja recetiva” a América Latinapode, num certo sentido, ser “I g re j afonte” para a catolicidade, segundoconceitos propagados por AlbertoMethol Ferré, grande amigo do car-deal Bergoglio. O dinamismo ecle-sial, a vitalidade do laicado, o entu-siasmo juvenil, o grande apreço dainstituição familiar, o amor profundopor Maria, a força evangelizadora dapiedade popular, o compromissoprofético com os pobres são, entreoutros, contributos da Igreja da qualprovenho e com os quais tambémme identifico.

Como recebeu a decisão do Pontífice delhe confiar o cargo de secretário do di-castério?

Sinceramente devo dizer que rece-bi o seu convite com muita resistên-cia interior, pois estou bem cientedos meus limites para desempenharum cargo deste alcance; além disso,nunca pensei nem desejei trabalharna Cúria. Venho da pastoral e pensoque ali seja o meu lugar, mas prefiroacreditar que a decisão do cardealprefeito Farrell, confirmada peloSanto Padre, seja a expressão davontade de Deus. Confiando nisto esabendo que a obra é de Deus, nãominha, aceitei o cargo.

Quais são as suas competências especí-ficas que porá ao serviço do dicastério?

Espero principalmente pôr a mi-nha pessoa ao serviço do dicastério,com as minhas capacidades e limi-tes. Sei que o que vou aprendendono dia a dia é mais daquilo que pos-so oferecer. Penso que é mais impor-tante sobretudo estar à disposição daIgreja universal: do Papa, dos bis-pos, dos leigos, das famílias, dos jo-vens, das associações e movimentos;impelido pelo amor pela Igreja. Di-lexit ecclesiam é a frase que sintetiza avida do meu fundador, padre JosefKentenich (1885-1968), e que memotiva nesta nova missão.

Do que se ocupa exatamente?

Estou ainda numa fase de apren-dizagem das minhas funções, masposso dizer que, em geral, o secretá-rio ajuda o prefeito em todas as tare-

Cidades mais solidáriasO empenho das comunidades eclesiais de base no Brasil

Trabalhar a favor de uma Igreja misericordiosa, proféti-ca e missionária dedicada à formação, especialmentedos leigos como sujeitos na vida eclesial e social»: esteé um dos principais compromissos assumidos pelosparticipantes no décimo quarto encontro das Comuni-dades eclesiais de base (Ceb) do Brasil, lê-se no docu-mento divulgado no final dos trabalhos da grande as-sembleia eclesial que nos dias passados teve lugar emLondrina, no Estado do Paraná, na qual participarammais de três mil pessoas, vindas de quase todas as dio-ceses do país e de muitas outras regiões da AméricaLatina.

Durante este encontro foi abordado o tema dos «de-safios do mundo urbano», ao qual o Papa Francisco,mediante uma mensagem assinada pelo cardeal secretá-rio de Estado, Pietro Parolin, não deixou de transmitiro seu encorajamento. Inspirando-se no leit motiv doencontro — «Vi e ouvi o grito do meu povo, e desci pa-ra o libertar» (Êx 3, 7-8) — o Pontífice recordou que«Deus nunca é indiferente ao sofrimento do seu po-vo», exortando «as Comunidades eclesiais a serem, nasociedade e nação brasileira, um instrumento de evan-gelização e promoção da pessoa humana», a fim decontribuir para evitar «os terríveis efeitos da cultura dodescarte». Uma perspetiva amplamente sentida duranteos trabalhos, nos quais foi realçado particularmente opapel não secundário dos leigos: «No espírito do anonacional dos leigos, que estamos a viver — lê-se no co-municado final — imploramos a Deus que o protago-nista leigo que vimos neste encontro possa ser aindamais ativo em todas as situações difíceis do nosso país,

especialmente no mundo urbano, onde a Ceb está pre-sente, anunciando a “alegria do Evangelho”».

O encontro das Comunidades eclesiais de base, quese realiza a cada quatro anos (o próximo terá lugar em2022 em Rondonópolis, no Estado de Mato Grosso),representa um momento fundamental de celebração ereflexão no qual, além de prelados, sacerdotes e religio-sos, participam a grande maioria dos leigos e represen-tantes de outras confissões cristãs. «O encontro dasComunidades eclesiais de base do Brasil — explicou àagência Fides o arcebispo de Londrina, D. GeremiasSteinmetz — é uma chamada à renovação na prática devida, sobretudo no serviço evangélico nas periferias ur-banas, quer em sentido metodológico, quer na aplica-ção, de modo que se possa atuar uma verdadeira pas-toral urbana».

Com efeito, o principal objetivo das Comunidadeseclesiais de base consiste, ressaltou o prelado, em«construir uma cidade cada vez mais justa, fraterna esolidária». Um desafio pastoral que já não se podeadiar, sobretudo se tivermos em consideração que 84por cento da população brasileira vive nas cidades.

O encontro de Londrina desenvolveu-se em volta detrês pontos fundamentais — casa, trabalho e jovens —abordando temáticas igualmente cruciais como toxico-dependência, violência e segurança, mobilidade e de-semprego. Cientes de que, explicaram os organizado-res, todos os desafios urbanos estão relacionados entresi e que a desigualdade social, e não exclusivamente apobreza, está na origem destes problemas que afligemas cidades.

«A nossa missão consiste em globalizar a civilizaçãodo amor através do encontro e das obras de misericór-dia. Isto exige um discernimento permanente e umamudança de mentalidade, de estilo de vida e de estru-turas já obsoletas», observou o arcebispo de Aparecida,D. Orlando Brandes, que exortou sobretudo a «seruma Igreja voltada para fora e que procure respeitar osdireitos à terra, ao teto e ao trabalho, como convida oPapa Francisco». D. Brandes considera que as Comu-nidades eclesiais de base, precisamente graças à sua ca-pacidade de estar no meio do povo, podem animar to-da a comunidade cristã, convidando a Igreja a ir ao en-contro dos necessitados nos seus ambientes de vida.«Evangelizar as cidades é um desafio — disse — p orqueelas se caraterizam pela indiferença». CO N T I N UA NA PÁGINA 11

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número 6, quinta-feira 8 de fevereiro de 2018 L’OSSERVATORE ROMANO página 11

CO N T I N UA Ç Ã O DA PÁGINA 10

A experiência de Aparecida

Fragilidade de DeusUm tema audacioso para a teologia

JOSÉ TOLENTINO MEND ONÇA

Oexcerto de 1 Coríntios 1, 25 — «Pois a lou-cura de Deus é mais sábia do que os ho-mens, e a fraqueza de Deus é mais forte

do que os homens» — provoca desde sempre, tan-to ao longo dos séculos como no tempo presente,a mesma inesgotável admiração. Nele o apóstolotrata nada menos que o desconcertante tema dafragilidade de Deus, fazendo-o de maneira ines-quecível.

Não faltam as traduções que tentam ocultar adificuldade, procurando mascarar o seu descon-forto com perífrases e sintaxes forjadas justamentepara evitar a linguagem da «loucura de Deus» ouda «fraqueza de Deus», preferindo um dispositi-vo moderador: «o que os homens acreditam serloucura», «o que é considerado fraqueza».

O ponto é que a literalidade de 1 Coríntios 1, 25levanta muitas questões perturbadoras. Um doscomentários clássicos deste trecho é de Teódotode Ancira, um teólogo do século V que resumiuesta apreensão suscitada por São Paulo deste mo-do: «Mas como pode ser frágil o criador doscéus? Qual fragilidade pode ser aquela que comuma só palavra criou todas as coisas? O que é afragilidade de Deus?» (cf. Homilias cristológicas emarianas, 1992). Mais adiante, o próprio Teodotoindica uma resposta: Deus é frágil porque «assu-miu sobre si as minhas fragilidades, pondo fim àsnossas fragilidades». Contudo, cada vez que le-mos este trecho as perguntas apresentam-se nova-mente.

sujeitos humanos e jamais a Deus. A loucura éum traço dos ímpios; a fragilidade é vista comouma inutilidade ou um défice, nunca como umbem ou virtude.

Sobre a segunda questão — de ponderação maiscomplexa — há, porventura, que refletir o seguin-te: o que vemos insinuado em 1 Coríntios 1, 25 so-bre a fragilidade de Deus perderia o seu impactoprojetivo se a nossa preocupação fosse saber sePaulo está mesmo a dizer que Deus é louco e frá-gil, afirmação que não se pode deduzir em ne-nhum passo do pensamento paulino. Ela torna-sesim positivamente desafiadora quando acompa-nhamos o modo de raciocinar de Paulo que pro-cura — e consegue — no recurso ao paradoxo,mais do que no tratamento lógico e sistemáticodos argumentos, um fortíssimo efeito persuasivo.

À luz do que foi dito, qual é o modo em quePaulo comunica neste versículo 25? Se observar-mos bem, com os adjetivos m o ro s e asthenes oapóstolo não se limita a anunciar o juízo erradodo mundo que, baseando-se na própria e limitadaexperiência, avalia Deus insuficientemente. Aliás,Paulo testemunha um fervoroso paradoxo, emque o louco e o frágil são os sinais de uma reali-dade inaudita. O evento do crucificado insere arevelação de Deus em modelos novos. O itinerá-rio da busca humana de Deus possui agora noCristo crucificado, e naquilo que Ele significa, oseu critério definitivo.

judaicos. Podemos dizer que 1 Coríntios 1, 25 é acoroação da argumentação desta subsecção.

A loucura e a fraqueza são relativas ao próprioevento da cruz, e reinterpretam o nosso conheci-mento acerca da sabedoria e da força de Deus. Aloucura e a fragilidade são o novo regime da teo-fania, uma nova gramática do divino à qual é pre-ciso obedecer. A obstinada focalização de Paulosobre a cruz é bem sugerida no versículo 25, masde uma forma que as traduções têm dificuldadeem interpretar. Os termos loucura e fragilidadenão são substantivos abstratos, mas adjetivos an-corados no concreto. E, no contexto atual, é a in-teira humanidade (e não este ou aquele povo) quese encontra diante da ação de Deus que se mani-festa em Jesus Cristo crucificado.

Quanto à caraterização estilística, parece aceitá-vel a tese de Raymond F. Collins (First Corin-thians, 1999) que evidencia o recurso da figuradas lítotes, a qual exprime retoricamente umaideia através do seu contrário, e deste modo abrea uma semântica de segundo nível. Dizendo a fra-gilidade de Deus, Paulo paradoxalmente está aafirmar a sua força. Mas é importante compreen-der que neste versículo 25 não temos simplesmen-te um tour de force retórico. É a acentuação, comoafirma Richard B. Hays, de «um ponto teológicofundamental» do evangelho de Paulo: o modo emque a própria cruz, enquanto evento salvífico noqual Deus se revela, desconstrói as expetativashumanas.

A mensagem da cruz confunde tanto os judeuscomo os gregos, que esperam sinais credíveis depoder ou argumentos persuasivos de sabedoria. OMessias poderia ser simplesmente um «profetapoderoso em obras e em palavras» (Lucas 24, 19)que distribui provas sobrenaturais do favor deDeus. Ou, em estilo helénico, um sábio mestre deverdades filosóficas. Contudo, o apóstolo nadatem para lhes oferecer neste sentido. Põe-nos sim-plesmente diante do «Messias crucificado» (1 Co-ríntios 1, 23).

Deus desconstrói deste modo o que pareciamser as expetativas e os critérios consolidados emrelação ao seu agir. E o seu Messias o revelará pe-lo avesso — um avesso que nos desarma incessan-temente — quando morrer como um criminosoderrotado pelo castigo da cruz. A convivência ro-tineira com a linguagem de Paulo (que é uma lin-guagem tensa, transparente e excessiva, como elemesmo é) talvez tenha atenuado em nós o escân-dalo desta mensagem. Mas não nos esqueçamos:proclamar um Messias crucificado significa ence-nar o teatro do absurdo, deslocar o quadro dasconvicções sobre Deus aos antípodas, habitar oarrepio e o desconcerto. Os ouvidos mediterrâ-neos que ouviam Paulo sabiam bem o que signifi-cava uma crucificação. Todos a compreendiam co-mo uma punição extrema e macabra que os roma-nos impunham como castigo exemplar, sobretudoaos agitadores e rebeldes que punham em questãoa pax romana. Enfim, era uma forma pública detortura e de extermínio para garantir que nin-guém ousasse, mesmo só pelo horror especial queela inspirava, desafiar o poder constituído.

O topos da fragilidade de Deus é, por muitasrazões, um motivo delicado, para não dizer de ca-ráter inaudito. As reservas e as atenuações queacompanharam historicamente a receção do nossoversículo afirmam precisamente isto. Mas há umaquestão dupla que se impõe quando lemos 1 Co-ríntios 1, 25 com este propósito: como chegouPaulo a este arriscado topos da fragilidade deDeus?, neste versículo a fragilidade de Deus érealmente enfrentada por Paulo ou ela faz umaaparição puramente instrumental no desenvolvi-mento argumentativo de outra questão mais emsintonia com a teologia tradicional (a questão dopoder de Deus, por exemplo)?

Em relação à primeira das interrogações há quereconhecer que Paulo não chega ao tema atravésda via bíblica. Quando, na revelação escriturística,surgem os vocábulos que descrevem loucura oufragilidade eles estão exclusivamente atribuídos a

Salvador Dalí, «O Cristo de San Juan de la Cruz» (1951)

Publicamos amplos excertos do ensaioescrito pelo teólogo português tirado darevista «Vita e Pensiero»

Vita e Pensiero

O texto do versículo 25 está naturalmente inse-rido num contexto. Ele abrange uma primeiragrande unidade literária que corresponde aos pri-meiros quatro capítulos iniciais (1, 10-4, 21) daPrimeira Carta aos Coríntios. Um marcador daunidade desta ampla exortação que abre a carta éo verbo p a ra k a l ó (exorto) que aparece no início (1,10) e quase no final da secção (4, 16). Partindodaqui, podemos dizer que o tom do discurso, nãopor acaso bem estruturado, reflete uma preocupa-ção prática e pastoral, a mesma que certamenteimpeliu Paulo a escrever toda a epístola.

Ora, a grande unidade literária formada por 1,10-4, 21 inclui diversas secções. E existe um con-senso em situar o nosso excerto de 1 Coríntios 1,25 na segunda secção.

Depois de ter tratado, numa primeira etapa, osconflitos e as divisões no âmbito da comunidadede Corinto, o apóstolo passa a desenvolver outrotopos, que o versículo 18 sintetiza muito bem: «Alinguagem da cruz é loucura para os que se per-dem, mas, para os que foram salvos, para nós, éuma força divina». Os dois termos palavra (logos)e cruz, realçados, estão em relação evidente com aexpressão final «poder de Deus», assim como seencontram também reciprocamente ligados entresi «loucura» e «os que se perdem». É por issoque Paulo fala de loucura e sabedoria, de fraque-za e de força.

Deve-se mencionar ainda que 1 Coríntios 1, 25se insere na subsecção 1, 18-25, que trata a loucurae a fragilidade da cruz como sabedoria e força deDeus. Com um gesto perentório, o apóstolo en-frenta o escândalo do Messias crucificado. E in-troduz no discurso uma novidade decisiva: a cruznão é um absurdo, mas é uma linguagem de rutu-ra que inaugura de novo a revelação de Deus. Acruz abate, como diz Christophe Senft, os edifí-cios do conhecimento da verdade religiosa que es-tavam em vigor até Jesus, fossem eles pagãos ou

fas. É um cargo de coordenação interna de to-dos os funcionários e do seu trabalho, e decorresponsabilidade com o prefeito por todo odicastério, e eventualmente também de repre-sentatividade externa.

Como influenciaram o carisma e a espiritualidadede Schoenstatt a sua formação?

Devo em grande medida à aliança de amorcom Maria e ao carisma de padre José Kente-nich a minha personalidade e a minha vida es-piritual, isto é, o que sou como sacerdote e co-mo ser humano. A pertença a uma família es-piritual federativa ajuda também a viver e tra-balhar em comunidade, a cultivar uma culturado encontro, que chamamos «cultura da alian-ça», em todas as dimensões da vida. Schoens-tatt é um movimento essencialmente missioná-rio, pedagógico e mariano. Deste modo, esperocontribuir com este carisma para o serviço detodas as realidades que se relacionam com odicastério.

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página 12 L’OSSERVATORE ROMANO quinta-feira 8 de fevereiro de 2018, número 6

Missas matutinas em Santa MartaSegunda-feira, 29 de janeiro

Regra de ouro

A “regra de ouro” consiste em saberviver as humilhações com uma atitu-de de esperança e confiança emDeus, sem recorrer a fingimento ejustificações falsas prêt-à-porter. Maso Papa Francisco, na missa de hoje,sugeriu ao cristão verdadeiramentehumilde que agarre a coragem comambas as mãos e, repropondo os en-sinamentos de santo Inácio, rezeprecisamente para ter as humilha-ções, para deste modo «se asseme-lhar mais ao Senhor».

«Na primeira leitura — observou oPapa referindo-se ao trecho do se-gundo livro de Samuel (15, 13-14.30;16, 5-13) — ouvimos o sofrimento deDavid, a fuga de David, a derrota deDavid». E «David é grande: tinhavencido o filisteu e as mulheres lou-vavam-no; tinha consolidado o rei-no, estava a caminho» e «acabarápor o reunificar». David, prosseguiuFrancisco, «tinha uma alma nobre:por duas vezes podia ter matadoSaul e não o fez». Portanto, tinha«aquela nobreza de alma: era gran-de, mas também pecador, um peca-dor que cometera pecados graves: oadultério, o assassinato de Urias, odo censo».

Em síntese, David tinha cometido«pecados graves». Contudo, «é san-to: a Igreja — afirmou o Papa — ve-nera-o como santo» não obstante«estes pecados, porque ele é santo,porque ele se deixou transformar pe-lo Senhor, se deixou perdoar peloSenhor, ouviu a voz do Senhor, arre-pendeu-se, foi capaz de fazer peni-tência, de chorar». Tinha «aquelacapacidade não muito fácil de reco-nhecer que era pecador: “Sou peca-dor”».

No trecho bíblico da liturgia, ex-plicou o Pontífice, «vemos a humi-lhação de David: o filho faz uma re-volução contra ele, o próprio filho,como ele afirma «que saiu das mi-nhas vísceras”, o próprio filho; e di-zem-lhe: “O coração dos israelitasestá com Absalão: ele tem a maioria.Tu estás derrotado. Que fazemos?”».Nesta circunstância, afirmou o Papa,David «não pensou na própria pes-soa: pensou na cidade, no povo, notemplo e na arca, para que não fos-sem destruídos».

E David «faz aquele gesto que pa-rece cobarde, mas é corajoso: foge,para salvar a cidade, o povo, o tem-plo e a arca». Ele diz: «Levantai-vos, e fujamos da cidade, para quenão se apresse Absalão e nos alcan-ce, e lance sobre nós algum mal, efira a cidade a fio de espada». Porconseguinte, David ordena aos seuscompanheiros para fugirem e deixa-rem a cidade. Eis, portanto, «aquelaimagem de David» que, recordouFrancisco, «subia o monte das Oli-veiras — isto faz-nos pensar em algo— subia chorando e caminhava coma cabeça coberta e os pés descal-ços». O Antigo Testamento narraque David «chorava, descalço, coma cabeça coberta em sinal de peni-tência» e «toda a gente que estavacom ele tinha a cabeça coberta e, su-bindo, chorava».

Este é «o pranto de David: umhomem capaz de reconhecer os pró-

prios pecados». E «o Senhor tinha-opreparado para este momento: hu-milhado. O grande David, humilha-do, aquele que tinha vencido o filis-teu, humilhado». E, reafirmou oPontífice, tinha-o «humilhado com aderrota, a fuga e também com o in-sulto, porque este Simei não lhe di-zia coisas agradáveis: «Vai-te embo-ra, vai-te embora homem sanguiná-rio e celerado! O Senhor fez cair so-bre a tua cabeça todo o sangue dacasa de Saul, no lugar de quem rei-nas; o Senhor entregou o reino nasmãos de Absalão, teu filho, e eis queagora estás arruinado, porque és umsanguinário».

Enquanto Simei «insultava» Da-vid, «os seus companheiros queriamdefendê-lo». Mas ele impediu-lhesque o fizessem e diz claramente aAbisai que o deixem fazer, porque«é o Senhor que inspira os insultos.Vamos em frente, talvez o Senhor te-nha piedade de mim e este insultocomova o coração do Senhor e meabençoe». E «com esperança» Da-vid continua o seu caminho.

«David humilde, David humilha-do» insistiu o Papa, refletindo sobreaquela imagem quando ele «subiaao monte das Oliveiras». Mas tam-bém «David profeta, porque esta éprecisamente a profecia de Jesus, su-bindo ao Calvário para dar a vida:insultado, deixado de lado, não ou-vido». Portanto, «David, profeta deJesus; mas o cerne deste trecho é ahumilhação, a humildade», reiterouFrancisco. E assim «quando Paulofala de Jesus diz: “humilhou-se, ani-quilou-se”». E esta é a «profecia deJesus: a humildade de Jesus».

«Por vezes — realçou o Papa —pensamos que a humildade significacaminhar tranquilos, andar talvez decabeça baixa, olhando para o chão.Mas também os porcos caminhamde cabeça baixa: esta não é humilda-de. Esta é aquela humildade fingida,prêt-à-porter, que não salva nempreserva o coração». E assim «ébom — acrescentou — que pensemosnisto: não há verdadeira humildadesem humilhação, e se não fores ca-paz de tolerar, de carregar aos om-bros uma humilhação, não és humil-de: finges, mas não és».

«David carrega às suas costas ospróprios pecados, não pensa nas coi-sas boas que tem» explicou o Pontí-fice. E «também Jesus carrega sobreos ombros os próprios pecados: Pau-lo diz-nos que assumiu os nossos pe-cados e que se fez pecado». Portan-to, disse o Papa, «David é santo; Je-sus, com a santidade de Deus, érealmente santo. David é pecador,Jesus é pecador mas com os nossospecados. Contudo, ambos humilha-dos».

«Há sempre — reconheceu Fran-cisco — a tentação de lutar contraaquele que nos calunia, contra aque-le que nos humilha, que nos faz en-vergonhar, como este Simei» que notrecho bíblico insulta gravementeDavid. Mas «David diz “não”, o Se-nhor diz “não” aquele não é o cami-nho». Ao contrário, «o caminho é ode Jesus, profetizado por David: car-regar as humilhações». E pensar que«talvez o Senhor olhe para a minhaaflição e me confira o bem em trocada maldição de hoje». Em síntese,«carregar as humilhações na espe-rança». Porém, especificou o Papa,

«se eu, diante de qualquer ofensa,de qualquer humilhação, me justificoimediatamente e procuro parecerbom ou fazer, como se diz, “caligra-fia inglesa”, esta não é humildade».E assim, acrescentou, «pensemosnisto de forma correta: se não sabesviver uma humilhação, não és hu-milde e esta é a regra de ouro».

Na conclusão, o Pontífice convi-dou a pedir «ao Senhor a graça dahumildade, mas com humilhação».E, recordou, «havia aquela religiosaque dizia: “sou humilde, sim, mashumilhada, nunca!”. Não, não! Nãohá humildade sem humilhação».Portanto, afirmou ainda Francisco,«peçamos esta graça e também, sealguém for corajoso, pode pedir —como nos ensina Santo Inácio — quelhe envie humilhações, para se asse-melhar mais ao Senhor».

«Certa vez — confidenciou o Papa— um santo sacerdote, que acompa-nhava assim o seu povo, disse-me:“as pessoas são cansativas: chego aofim do dia cansado”. E eu respondi-lhe: “Mas feliz?” — “Sim!”». E«aquele pastor não precisava decomprimidos para dormir: dormiamuito bem, porque estava deverascansado, mas com o cansaço real,não ideal; o cansaço de quem traba-lha, daquela pessoa que trabalha eassim acompanha o povo».

No trecho do Evangelho, realçouFrancisco, «lemos cinco vezes o ver-bo “to car”». Jesus «é “to cado” p elopovo». Mas «também hoje vemos,quando o bispo, ou o pároco, vaiem visita pastoral, as pessoas tocampara receber graças». Pois, acrescen-tou, «o povo é assim e se tu és pas-tor e estás no meio do povo, devessentir isto». Na realidade, continuouo Pontífice, o Evangelho de hoje«diz mais: “Uma numerosa multidãoo seguia e o apertava”». E quando amultidão «o aperta Jesus não diz:“não, estai ali”». Como se hoje dis-séssemos: «não toques no sacerdote,por favor, abri espaço que ele vem,quer seja o bispo ou o sacerdote». Eassim, eis que Jesus «estava ali, nomeio: era mais do que um sacerdotee do que um bispo, Jesus», e «dei-xava-se tocar, apertar: sentia todos».

No meio daquela multidão, narraMarcos no seu Evangelho, «inseriu-se este chefe da Sinagoga» de nomeJairo «e diz-lhe: “Mestre, a minha fi-lha está a morrer». Como resposta«Jesus vai, caminha; não disse: “tra-zei-ma”», mas respondeu: «vou».Por conseguinte, «o pastor vai ondehá problemas, vai onde estão as ove-lhas, vai onde existem dificuldades».Responde sempre: «vou».

Ao prosseguir a releitura do excer-to evangélico, Francisco indicou a fi-gura «daquela velhota que, coitadi-nha, não sabia como se curar dadoença: tinha fé, aquela mulher, efaz esta brincadeira “se eu tocar”» omanto de Jesus. Com efeito, pensa-va: «Se eu conseguir apenas tocar assuas vestes, serei salva». E Jesus«apercebe-se» daquele gesto da mu-lher, «porque Jesus estava atento aosgestos do povo». E «ao coração deJesus nunca veio a ideia: “estas pes-soas ignorantes, que não sabem teo-logia, esta gente supersticiosa...”,nunca!». Eis, ao contrário, a suapergunta de pastor: «Quem me to-cou?». E imediatamente a garantia:«Não temas. Vai em paz. A tua fé tesalvou». E «assim resolve os proble-mas».

Francisco sugeriu uma meditaçãotambém acerca do momento em que,na narração evangélica, «chega a no-tícia da morte da menina». Ao pai,Jesus recomenda: «Não temas, so-mente tem fé!». E vai a casa da me-nina. «Parece que a Jesus — explicouo Papa — agrade ir ao encontro dasdificuldades, dos problemas, quandoas pessoas pedem».

Quando chegou «àquela casa»,Jesus «tem que pagar a entrada: aentrada da ironia, do escárnio, por-que as pessoas estavam ali, estavamali as carpideiras que choravam, gri-tavam, como se fazia no oriente nasvigílias noturnas, nos velórios». Epede para não chorar, porque a me-nina dorme, não está morta. Comestas palavras, prosseguiu o Papa,

Terça-feira, 30 de janeiro

Pastor entre o povo

«Proximidade e ternura» são as ati-tudes do verdadeiro pastor que estásempre no meio do povo, preocu-pando-se com os problemas concre-tos, deixando-se tocar e indo pes-soalmente onde é chamado, até aoesgotamento físico se for necessário.E sem nunca se armar em profeta,consulente espiritual ou curador,com horários de visita e lista de pre-ços. E foi precisamente a figura dopastor, modelado no testemunho deJesus sempre a caminho entre o po-vo, que o Papa Francisco quis repro-por na missa deste dia.

O Pontífice iniciou a sua reflexãopartindo de um excerto do Evange-lho que «é mais para contemplar doque para refletir», como observoureferindo-se ao trecho de Marcos (5,21-43). «Contemplar», portanto,«como era uma jornada na vida deJesus: Deus prometera que acompa-nharia o seu povo, caminharia comele, e Deus acompanhou o seu povoe enviou Jesus para levar este cami-nho à plenitude».

Jesus, explicou o Pontífice, acom-panha «o povo como um pastor.Não abre um escritório de consultasespirituais com um cartaz: “o profetarecebe segundas-feiras, quartas esextas das 3h00 às 6h00. A entradacusta X ou, se preferirdes, podeisdar uma oferta”». O Senhor «nãofaz assim», afirmou o Papa, «nemsequer abriu um consultório médicocom o aviso: “os doentes vêm em taldia e serão curados”». Nada de tudoisto. Aliás, «Jesus anda no meio dop ovo».

«Quase toda a vida de Jesus, a vi-da pública, foi a caminho com aspessoas — disse Francisco — e quan-do ensinava havia sempre aquela pa-lavra que se repete: “havia umagrande multidão”, a multidão que oseguia». E «ele preocupava-se queas pessoas compreendessem bem, etambém se preocupava se tinham fo-me: dar de comer». Jesus estavasempre «no meio do povo: é assim opastor, é esta a figura de pastor queJesus nos dá e diz-nos a nós, pasto-res, como as pessoas devem seracompanhadas: no meio do povo».

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número 6, quinta-feira 8 de fevereiro de 2018 L’OSSERVATORE ROMANO página 13

Jesus aceita a ironia, mas «em silên-cio vai em frente, paga com o esfor-ço, com o cansaço, até com a vergo-nha, paga para fazer o bem».

E «depois, no final, com aquelegesto — afirmou — restitui à vida ajovem e entrega-a aos pais. E nãodiz: “o Senhor vos abençoe”, nãofaz uma cerimónia». Diz simples-mente: «Dai-lhe de comer». De res-to, explicou Francisco, «Jesus estáatento às pequenas coisas: isto vem àminha mente quando ressuscita o fi-lho da viúva em Naim». E a narra-ção do «Evangelho acaba assim: “Erestituiu-o à sua mãe”». Jesus «dá,também aquela filha, restitui-a».

Estes são para mim os vestígiosdo modo de agir de Jesus, de cami-nhar com o seu povo, no meio doseu povo: proximidade e ternura»reafirmou o Pontífice. «Deus —acrescentou — esteve sempre próxi-mo do seu povo, caminhou com oseu povo; foi terníssimo, como umamãe: ele mesmo o diz através dosprofetas». E também «Jesus, Deus ehomem, faz com que esta proximi-dade do Pai seja real e concreta, as-sim como esta ternura».

«O pastor é ungido com o óleono dia da sua ordenação: sacerdotale episcopal» afirmou o Papa. Mas«o verdadeiro óleo, o interior, é oóleo da proximidade e da ternura».Ao contrário, ao «pastor que não sa-be fazer-se próximo falta algo: talvezseja um dono do campo, mas não éum pastor». Porque «um pastor aoqual falta ternura será um homem rí-gido, que pune as ovelhas».

Por conseguinte, servem «proxi-midade e ternura; vemo-lo» na pági-na do evangelho de Marcos propos-ta pela liturgia: «Jesus era assim e opastor, como Jesus, termina o diacansado, mas cansado por praticareste bem». Por isso «proximidade eternura» são as «atitudes de um ver-dadeiro pastor».

«Hoje poderíamos rezar na missapelos nossos pastores — sugeriu oPapa — para que o Senhor lhes con-ceda esta graça de caminhar com opovo, de estar presentes para o povocom muita ternura, com muita pro-ximidade». E «quando o povo en-contra o seu pastor, tem aquela sen-sação especial que se sente só napresença de Deus». Recorda istoprecisamente a conclusão do excerto

do Evangelho quando descreve ossentimentos dos presentes: «Eles fi-caram estupefactos». É «a estupefa-ção de sentir a proximidade e a ter-nura de Deus no pastor».

minho, não somos itinerantes, nemhomens e mulheres num labirinto».Não, estamos «a caminho, devemosfazer assim». Mas, avisou o Papa,«há a tentação do momento que seapodera da vida e te leva a ir erran-do no momento, neste labirintoegoísta do momento sem futuro,sempre ida e volta, ida e volta». E«o caminho acaba na morte, comotodos sabemos».

Por este motivo, observou o Pon-tífice, «a Igreja procurou sempre fa-zer refletir sobre este nosso fim: amorte». A tal propósito, o Papa su-geriu uma sua recordação pessoal:«Quando estávamos no seminário,mandavam-nos fazer o exercício daboa morte: assustava um pouco,porque parecia um necrotério». Mas«há um exercício da boa morte quecada um pode fazer dentro de simesmo: não sou o dono do tempo;há um facto: morrerei. Quando?Deus sabe». Mas certamente «mor-re re i » .

«Repetir isto ajuda», disse o Pa-pa, porque é um dado «puramenterealista» que «nos salva da ilusão domomento, de levar a vida como umacorrente de momentos sem sentido».Ao contrário, a realidade é que «euestou a caminho e devo olhar emf re n t e » .

Sempre dando espaço à confidên-cia, Francisco compartilhou a «re-cordação» de quando, «ainda crian-ça, aprendia a ler: eu tinha quatroanos. Uma das primeiras coisas queaprendi a ler, porque a avó me fezler, foi um cartaz que ela conservavadebaixo do cristal da mesa de cabe-ceira, e rezava assim: “Pensa queDeus te vê. Pensa que te vê. Pensaque morrerás e não sabes quando”».Aquela frase, revelou o Papa, «aindahoje me recordo dela, e fez-me mui-to bem, nos momentos de suficiên-cia, de fechamento, onde o momen-to era o rei». Portanto, «o tempo, ofacto: todos nós morreremos».Quando a morte se aproxima, Daviddiz ao seu filho: «Vou-me pelo cami-nho de cada homem sobre a terra».E assim aconteceu.

A segunda ideia é «a herança».Muitas vezes acontece que quando,ao morrer, alguém tem a ver com

«uma herança, chegam imediata-mente os netos, para saber quantodinheiro o tio deixou para este eaquele». E «esta história é tanto an-tiga quanto a história do mundo».Na realidade, o que conta é «a he-rança do testemunho: que herançadeixo eu?».

Voltando ao trecho bíblico de ho-je, «que herança deixa David?».Francisco recordou que David foi«um grande pecador, cometeu tan-tos erros!». Mas foi também «umgrande arrependido» até ser «umsanto», apesar «dos grandes erroscometidos». E David é santo, expli-cou o Papa, «porque a herança é aatitude de se arrepender, de adorar aDeus antes de si mesmo, de voltarpara Deus: a herança do testemu-nho». Eis que é sempre oportuno in-terrogar-se sobre «qual herança dei-xarei aos meus entes queridos?».Certamente, «a herança material,boa porque é o fruto do trabalho».Mas, insistiu o Papa, «que herançapessoal, de testemunho? Como a deDavid, ou vazia?». Por isso, à per-gunta «o que deixou?» não se deveresponder só indicando «as proprie-dades», mas antes de tudo «o teste-munho de vida».

«É verdade que se vamos a umvelório — prosseguiu o Pontífice — omorto era sempre santo», a pontoque «existem dois lugares onde ca-nonizar as pessoas: a praça de SãoPedro e os velórios, porque é sempreum santo e porque já não te amea-ça».

Portanto, «a verdadeira herança»é o testemunho de vida. Assim, éoportuno «interrogar-nos que heran-ça» deixaria «se Deus me chamassehoje? Que herança deixarei comotestemunho de vida?». Esta «é umaboa pergunta a fazer», afirmou oPapa, e assim «preparar-nos porquenenhum de nós ficará “como relí-quia”: não, todos nós iremos por es-se caminho». Com a questão funda-mental: «Qual será a herança quedeixarei como testemunho de vi-da?».

A terceira ideia — além do «facto»e da «herança» — que o Papa suge-riu a respeito da morte é a «memó-ria» porque, explicou, «até o pensa-mento da morte é memória, mas me-mória antecipada, memória do pas-sado». Portanto, «memória» e «tam-bém luz neste momento da vida».Mas a pergunta que devemos fazeré: «Quando eu morrer, o que gosta-ria de fazer hoje, nesta decisão quedevo tomar hoje, no modo de viverhoje?». Esta «é uma memória ante-cipada que ilumina o momento dehoje». Substancialmente, trata-se de«iluminar com o facto da morte asdecisões que devo tomar cada dia».

«É bonito este trecho do capítulo2 do primeiro livro dos Reis», con-cluiu o Pontífice. «Se hoje tiverdestempo, lede-o, é muito bonito, far-vos-á bem», sugeriu. E convidou«também a pensar: estou a caminho,é um facto, “m o r re re i ”; qual será aherança que deixarei e como me aju-da a luz, a memória antecipada damorte, sobre as decisões que devotomar hoje». Uma meditação, garan-tiu, que «fará bem a todos nós».

Shane Coffey«Orgulho e humildade»

Quinta-feira, 1 de fevereiro

Não somos eternosnem efémeros

A morte é «um facto, uma herança euma memória» e recorda-nos quenão somos «donos do tempo», nem«efémeros», nem «eternos», salvan-do-nos do risco de permanecer «pre-sos no labirinto egoísta do momentopresente». Mas é precisamente oolhar sobre a morte que ajuda a vi-ver bem: eis a mensagem que o Papapropôs na missa celebrada em SantaMarta.

«A primeira leitura fala-nos damorte: a morte do rei David», obser-vou o Pontífice, referindo-se ao tre-cho tirado do primeiro livro dosReis (2, 1-4.10-12). «Os dias de Da-vid aproximaram-se da morte» por-que, afirmou Francisco, também«ele, o grande rei, o homem que ti-nha consolidado o reino, deve mor-rer, não é dono do tempo: o tempoprossegue e ele continua noutro esti-lo de tempo, mas continua. Está acaminho».

De resto, explicou o Papa, «nãosomos nem eternos nem efémeros:somos homens e mulheres a cami-nho no tempo, tempo que começa etempo que termina». E «isto faz-nospensar que é bom rezar e pedir agraça do sentido do tempo, para nãonos tornarmos prisioneiros do mo-mento que está sempre fechado emsi mesmo». Assim, afirmou, «diantedeste trecho do primeiro livro dosReis», que narra «a morte de David,gostaria de propor três ideias: amorte é um facto, a morte é uma he-rança, a morte é uma memória».

Antes de tudo, explicou, «a morteé um facto: podemos pensar emmuitas coisas, até imaginando quesomos eternos, mas o facto aconte-ce». Mais cedo ou mais tarde a mor-te chega e «é um facto que cabe atodos nós». Porque «estamos a ca- «Arrependimento do rei David» CO N T I N UA NA PÁGINA 14

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página 14 L’OSSERVATORE ROMANO quinta-feira 8 de fevereiro de 2018, número 6

Beatificado Teresio Olivelli

Um santo leigo e moderno«Um santo leigo e moderno»: eis operfil atualíssimo de Teresio Olivelli,beatificado no dia 3 de fevereiro, pe-lo cardeal Angelo Amato, prefeito daCongregação para as causas dos san-tos, durante o rito presidido, em re-presentação do Papa Francisco, nopavilhão desportivo de Vigevano.

Aluno do colégio Ghislieri e estu-dante da Universidade de Pavia,«seriamente motivado a viver a pró-pria fé — evidenciou o purpurado,recordando as raízes de Olivelli —participou na Ação católica e na SãoVicente, onde teve modo de amadu-recer um estilo de vida baseado nu-ma grande generosidade». Formou-se em direito, tornando-se assistentena universidade de Turim mas «ocompromisso cultural e político nãosubstituiu o seu fervor caritativo eassistencial, continuando por exem-plo a visitar os doentes de turbercu-lose terminais, lavando-os, preparan-do as suas camas, dando-lhes de co-mer, tendo sido notável o seu serviçoaos enfermos do Cottolengo».

«Em fevereiro de 1941 — contou ocardeal — alistou-se como voluntárioe partiu para a Rússia como oficialdos alpinos. A sua caridade heroicamanifestou-se, com singular evidên-cia, durante a desastrosa retirada doexército italiano: interrompia a suamarcha para socorrer os feridos e oscongelados, arriscando até a própriavida, e cuidava da assistência espiri-tual aos moribundos, consolando-osnos momentos extremos». Ao regres-

sar para a Itália, prosseguiu, «os ale-mães prenderam-no, encarcerando-oem campos de concentração. Contu-do, ele conseguiu escapar e voltar àItália, depois de uma longa fuga so-litária». Em seguida «colaborou coma constituição das “fiamme verdi”[chamas verdes], formação partidáriade cunho católico e, em fevereiro de1944, fundou o jornal Il ribelle, ela-borando programas de reconstruçãoda sociedade depois da tragédia daguerra».

«Tendo sido preso e posto no cár-cere de San Vittore em Milão», Oli-velli «sofreu pesadas humilhações etorturas que continuaram no campode Fossoli. Ali o seu nome foi inseri-do numa lista de prisioneiros quedeveriam passar pelas armas, masconseguiu livrar-se. Então, foi trans-ferido para o campo de Gries depoispara Flossenbürg, na Baviera, e porfim para Hersbruck». Em todos es-tes contextos, reconheceu o prefeito,ele «conservou íntegra a fé e, comesperança corajosa, cuidou dos com-panheiros, tentando aliviar os seussofrimentos, curando as suas feridas,ajudando-os a sobreviver privando-se das próprias escassas rações ali-mentares. Já enfraquecido, assistiuOdoardo Focherini, hoje beato,morrendo alguns dias depois dele, a17 de janeiro de 1945, após os golpesrecebidos de um militar alemão: pro-curou servir de escudo com o pró-prio corpo a um jovem prisioneiroucraniano brutalmente espancado».

O seu corpo foi queimado no fornocrematório de Hersbruck.

Portanto, Teresio Olivelli foi «umjovem entusiasta da própria fé eamante da sua pátria», disse o pur-purado. Assim como Focherini, Fras-sati e muitos outros, «demonstra quenem todos os santos são sacerdotesou religiosos: a santidade pertence atodos os batizados». O cardeal insis-tiu sobre a atualidade do testemu-nho do jovem, do qual «se celebra ocentenário do nascimento, ocorridoa 7 de janeiro de 1916».

«Olivelli tem um perfil virtuosoexcepcional» afirmou o cardealAmato. A sua vontade «era orienta-da lucidamente para o bem de mo-do heroico; é um jovem que tenta aescalada ao céu, praticando o bem eevitando o mal, eleva-se gradual-mente ao amor eterno de Deus».Portanto, viveu «como santo: santoleigo, moderno, dinâmico, corajoso,forte. A sua tensão para o bem ali-mentava-se na oração e na Eucaris-tia».

«Durante a guerra na frente russaou na prisão dos campos de concen-tração — prosseguiu o purpurado —surpreendia a genuinidade da sua fé,simples, convicta, manifestada empalavras e ações: encorajava, apoia-va, consolava, confortava». Olivelli«rezava e fazia rezar: na dolorosa re-tirada da Rússia havia o capelão,mas os soldados encontravam acolhi-mento e conforto religioso em Tere-sio». Evidentemente «as dificuldades

não o abatiam, mas reforçavam oseu espírito de fé e amava Deus,amava a Igreja, amava o Papa, ama-va os outros com aquela caridadeevangélica que Jesus nos ensinou:amar o próximo como a si mesmo».Deveras «a caridade era o tecido dasua vida».

Os testemunhos diretos do seu es-tilo de vida nos l a g e rs são impressio-nantes. Até ao fim. As suas últimaspalavras foram: «Ó Jesus, amei-te naterra, sofrendo: amar-te-ei no céu,rejubilando». Era o dia 17 de janeirode 1945. Tinha vinte e nove anos. Asua herança, concluiu o cardealAmato, «é essencialmente evangéli-ca: amai-vos uns aos outros como euvos amei; ninguém tem maior amordo que aquele que dá a sua vida pe-los seus amigos».

Augusto Colombo, «Teresio Olivellino campo de concentração de Hersbruck»

Segunda-feira, 5 de fevereiro

Ensinar a adorarOs cristãos devem aprender a «ora-ção de adoração». E os pastores de-vem ter a peito a formação dos fiéisnesta fundamental forma de oração,frisou o Papa Francisco na missa ce-lebrada nesta quinta-feira, na qualparticipou um grupo de párocos no-meados recentemente. Dirigindo-sediretamente a eles, o Pontífice exor-tou-os: «ensinai o povo a adorar emsilêncio» porque «assim aprendemdesde agora o que faremos todos lá,quando pela graça de Deus chegar-mos ao céu».

A adoração como objetivo do «ca-minho» do crente esteve no centroda homilia de Francisco, que se ins-pirou na primeira leitura do dia (1Rs 8, 1-7.9-13), na qual se narra dorei Salomão que «convoca o seu po-vo para subir aos montes do Senhor,rumo à cidade, ao templo», levandoem procissão a arca da aliança aoSanto dos Santos.

Neste caminho que previa umpercurso em subida, difícil — «o ca-minho fácil é na planície», observouo Papa — o povo levava consigo «aprópria história, a memória da elei-ção, a memória da promessa e a me-mória da aliança». E com esta cargade memória aproximava-se do tem-plo. Não só: o povo, acrescentouFrancisco, levava também «a nudez

da aliança», isto é, simplesmente as«duas tábulas de pedra, nua, assimcomo tinha sido de Deus» e não co-mo a tinham aprendido «dos escri-bas, que a “barro quizaram” com tan-tas prescrições». Aquele era o seu te-souro: «a aliança nua: amo-te, amas-me. O primeiro mandamento, amar

a Deus; segundo, amar o próximo.Nua».

Depois, continuou o Pontífice,«com aquela memória de eleição, dapromessa e da aliança, o povo sobee leva a aliança. Ao chegar em cima“quando eram todos idosos, levarama arca, introduziram a arca no san-

da adoração dá-nos nobreza e gran-deza».

E àquela experiência na qual seantecipa a vida no céu, acrescentou,só podemos chegar «com a memóriade termos sido eleitos, de ter dentrodo coração uma promessa que nosimpele a ir, com a aliança na mão eno coração». Portanto «sempre a ca-minho: caminho difícil, em subida,mas rumo à adoração», rumo àquelemomento em que «as palavras desa-parecem diante da glória de Deus:não se pode falar, não se sabe o quedizer».

As únicas palavras que emergemdeste trecho da Escritura serão evi-denciadas na liturgia de 6 de feverei-ro, na qual prosseguirá a leitura doexcerto do livro dos Reis. Ao obser-var isto o Papa antecipou que o rei«Salomão ousa dizer só duas pala-vras, no meio da adoração: “Ouve ep erdoa”, só isto. Não se pode dizermais. Adorar em silêncio com toda ahistória que temos» e pedir a Deus:«Ouve e perdoa».

Concluindo a sua meditação, oPapa sugeriu: «Far-nos-á bem hojededicar um pouco de tempo à ora-ção» e fazer «memória do nosso ca-minho, a memória das graças recebi-das, a memória da eleição, da pro-messa, da aliança». Um percurso in-terior no qual «se procura subir, ru-mo à adoração, e no meio da adora-ção com tanta humildade recitarapenas esta pequena oração: “O uvee perdoa”».

Missas em Santa Marta

tuário e na arca nada haviaexceto as duas tábulas de pe-dra”». Eis a «nudez da alian-ça». E no excerto bíblico lê-se que «quando os sacerdotessaíram, a nuvem encheu otemplo do Senhor». Era «aglória do Senhor» que faziamorada no templo. Naquelemomento, explicou o Papa, o«povo entrou em adoração»,passando «da memória paraa adoração, caminhando emsubida». Assim começou aadoração «em silêncio». Eis opercurso realizado pelos Is-raelitas: «dos sacrifícios quefaziam no caminho em subi-da, ao silêncio, à humilhaçãoda adoração».

Precisamente neste ponto oPontífice relacionou a palavrade Deus com a realidadeatual das comunidades cris-tãs: «Muitas vezes penso quenós não ensinamos o nossopovo a adorar. Sim, ensina-mos-lhe a rezar, a cantar, alouvar a Deus, mas a ado-rar...». A oração de adoração,disse, «nos aniquila sem nosaniquilar: no aniquilamentoCharles-Clos Olsommer, «Adoração» (1930-1939)

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número 6, quinta-feira 8 de fevereiro de 2018 L’OSSERVATORE ROMANO página 15

INFORMAÇÕESAudiências

O Papa Francisco recebeu em audiên-cias particulares:

A 1 de fevereiroD. Luis Francisco Ladaria Ferrer,Prefeito da Congregação para aDoutrina da Fé; D. Miguel MauryBuendia, Núncio Apostólico na Ro-ménia e na Moldávia; D. WojciechZałuski, Núncio Apostólico no Bu-rundi; D. Giancarlo Maria Breganti-ni, Arcebispo de Campobasso-Boia-no (Itália); e os seguintes Preladosda Conferência Episcopal da Bielo-Rússia, em visita «ad limina Aposto-lorum»: D. Tadeusz Kondrusiewicz,Arcebispo de Minsk-Mohilev, comos Auxiliares D. Yuri Kasabutski eD. Aliaksandr Yasheuski; D. Alek-sander Kaszkizwicz, Bispo de Grod-no, com o Auxiliar D. Josif Staneus-ki; D. Antoni Dziemianko, Bispo dePinsk, com o Auxiliar D. KazimierzWielikosielec; D. Aleh Butkevich,Bispo de Vitebsk; e o Rev.do Pe. Ar-quimandrita Jan Sergiusz Gajek,M.I.C.

A 2 de fevereiroD. Désiré Tsarahazana, Arcebispo deToamasina, Presidente da Conferên-cia Episcopal de Madagáscar, comD. Marie Fabien Raharilamboniaina,Bispo de Morondava, Vice-Presiden-te, e D. Jean Claude Randrianarisoa,Bispo de Miarinarivo, Secretário-Ge-ral, e o Rev.do Pe. Gabriel Randria-nantenaina, Subsecretário; D. CarlosJosé Tissera, Bispo de Quilmes (Ar-gentina); D. Hugo Nicolás Barbaro,Bispo de San Roque de PresidenciaRoque Sáenz Peña (Argentina); e oR e v. do Pe. Julián Carrón, Presidenteda Fraternidade de Comunhão e Li-b ertação.

A 3 de fevereiroOs Senhores Cardeais Marc Ouellet,Prefeito da Congregação para osBispos; e Robert Sarah, Prefeito daCongregação para o Culto Divino ea Disciplina dos Sacramentos; e D.Léon Kalenga Badikebele, NúncioApostólico em El Salvador e Belize;Observador Extrarregional da SantaSé junto do Sistema de IntegraçãoCentro-Americana; e os seguintesPrelados da Conferência Episcopalda Argentina: D. Óscar VicenteOjea, Bispo de San Isidro, Presiden-te, com o Senhor Cardeal Mario Au-relio Poli, Arcebispo de Buenos Ai-res, primeiro Vice-Presidente; D.Marcelo Daniel Colombo, Bispo deLa Rioja, segundo Vice-Presidente, eD. Carlos Humberto Malfa, Bispode Chascomús, Secretário-Geral damesma Conferência Episcopal.

A 5 de fevereiroSua Ex.cia o Senhor Recep TayyipErdoğan, Presidente da Repúblicada Turquia, com a Ex.ma Esposa e oSéquito.Os seguintes Prelados da Igreja Cal-deia em visita «ad limina Apostolo-rum»: Sua Beatitude Louis RaphaëlI Sako, Patriarca de Babilónia dosCaldeus (Iraque), com os AuxiliaresD. Shlemon Warduni e D. Basel Yal-do; D. Michel Kassarji, Bispo de

Beirute dos Caldeus (Líbano); D.Thomas Meran, Arcebispo de Ur-myā dos Caldeus, Bispo de Salmasdos Caldeus (Irão); D. Ramzi Gar-mou, Arcebispo de Teerão dos Cal-deus, Administrador Patriarcal deAhwaz dos Caldeus (Irão); D.Mikha Pola Maqdassi, Bispo de Al-quoch dos Caldeus (Iraque); D.Rabban Al-Qas, Bispo de Amadiyahe Zaku dos Caldeus (Iraque); D.Yousif Thomas Mirkis, Arcebispo deKe r k ūk dos Caldeus (Iraque); D.Bashar Matti Warda, Arcebispo deArbil dos Caldeus (Iraque); D. Ha-bib Hermiz Jajou Al Nawfali, Arce-bispo de Baçorá dos Caldeus (Ira-que); D. Antoine Audo, Bispo deAlepo dos Caldeus (Síria); D. FrankY. Kalabat, Bispo de Saint ThomasThe Apostle of Detroit dos Caldeus(Estados Unidos da América); D.Amel Shamon Nona, Arcebispo-Bis-po de Saint Thomas the Apostle ofSydney dos Caldeus (Austrália); D.Emanuel Hana Shaleta, Bispo deSaint Peter the Apostle on San Die-go dos Caldeus (Estados Unidos daAmérica); D. Saad Sirop, VisitadorApostólico para os fiéis caldeus resi-dentes na Europa; D. Bawai Soro,Bispo de Mar Addai de Toronto dosCaldeus (Canadá); o CorepíscopoPhilip B. Najim, Administrador Pa-triarcal do Cairo dos Caldeus (Egi-to); e o Rev.do Pe. François Yakan,Administrador Patriarcal de Diarbe-kir dos Caldeus (Turquia).

Renúncias

O Santo Padre aceitou a renúncia:

No dia 1 de fevereiroDe D. Francis Joseph Christian, aocargo de Auxiliar da Diocese deManchester (Estados Unidos daAmérica).

No dia 2 de fevereiroDe D. Valentín Reynoso Hidalgo,M.S.C., ao cargo de Auxiliar da Ar-quidiocese de Santiago de los Cabal-leros (República Dominicana).De D. Juan Humberto Gutiérrez Va-lencia, ao cargo de Auxiliar da Ar-quidiocese de Guadalajara (México).

No dia 3 de fevereiroDe D. Arturo de Jesús Correa Toro,ao governo pastoral da Diocese deIpiales (Colômbia).

No dia 5 de fevereiroDe D. Cesare Bonivento, P.I.M.E., aogoverno pastoral da Diocese de Va-nimo (Papua-Nova Guiné).

Nomeações

O Sumo Pontífice nomeou:

A 2 de fevereiroBispo da Diocese de Chartres (Fran-ça), o Rev.do Pe. Philippe Christory,até hoje Pároco de Sainte-Trinité emPa r i s .

D. Philippe Christory nasceu a 28de fevereiro de 1958, em Lille (Fran-ça). Recebeu a Ordenação sacerdotalno dia 27 de junho de 1992.

Auxiliares de Guadalajara (México):os Rev.dos Padres Juan Manuel Mu-ñoz Curiel, O.F.M., até agora Minis-tro Provincial da Província dos San-tos Francisco e Santiago em México;Héctor López Alvarado, do clero damesma Arquidiocese, até hoje Páro-co de Nuestra Señora de Bugambi-lias e Vigário Episcopal; e Engelber-to Polino Sánchez, do clero da mes-ma Arquidiocese, até esta data Páro-co de San Bernardo e Coordenadorda Secção Diocesana de Pastoral So-cial, respetiva e simultaneamenteeleitos Bispos Titulares de Tucci, deSereddeli e de Vazari-Didda.

D. Juan Manuel Muñoz Curiel,O.F.M., nasceu em Guadalajara (Mé-xico), no dia 12 de março de 1958. Foiordenado Sacerdote a 3 de julho de1993.

D. Héctor López Alvarado nasceuno dia 13 de dezembro de 1970, emGuadalajara (México). Recebeu a Or-denação sacerdotal a 19 de maio de2002.

D. Engelberto Polino Sánchez nas-ceu em Jalisco (México), a 14 de mar-ço de 1966. Foi ordenado Sacerdote nodia 1 de junho de 1997.

A 3 de fevereiro

Bispo de Ipiales (Colômbia), oR e v. do Pe. José Saúl Grisales Grisa-les, do clero da Diocese de Son-són–Rionegro (Colômbia), até à pre-sente data Vigário-Geral da mesmaSede.

D. José Saúl Grisales Grisales nas-ceu em Sonsón (Colômbia), no dia 12de abril de 1964. Recebeu a Ordena-ção sacerdotal a 12 de novembro de1989.

Bispo de Istmina-Tadó (Colômbia),o Rev.do Pe. Mario de Jesús ÁlvarezGómez, do clero da Diocese de San-ta Rosa de Osos (Colômbia), atéagora Diretor Nacional das Pontifí-cias Obras Missionárias.

D. Mario de Jesús Álvarez Gómeznasceu em Palmitas (Colômbia), a 19de outubro de 1959. Foi ordenado Sa-cerdote no dia 19 de novembro de1985.

A 5 de fevereiro

Bispo de Vanimo (Papua-Nova Gui-né), o Rev.do Pe. Francis Meli, doclero da Diocese de Rabaul, até ago-ra Vigário Judicial de Rabaul e páro-co da Catedral de Sacred Heart emVunap op e.

D. Francis Meli nasceu em Poi Is-land (Papua-Nova Guiné), a 21 dejulho de 1962. Recebeu a Ordenaçãosacerdotal no dia 24 de novembro de1991.

Auxiliar de Atlanta (Estados Unidosda América), o Rev.do Pe. Joel M.Konzen, S.M., da Sociedade de Ma-ria, Diretor da «Marist School» emAtlanta, simultaneamente eleito Bis-po Titular de Leavenworth.

D. Joel M. Konzen, S.M., nasceu nodia 6 de novembro de 1950, em OakHarbor (Estados Unidos da América).Foi ordenado Sacerdote a 19 de maiode 1979.

A 6 de fevereiro

Arcebispo Coadjutor de Kinshasa(República Democrática do Congo),D. Fridolin Ambongo Besungu, atéesta data Arcebispo de Mbandka-Bi-k o ro .

A 7 de fevereiro

Bispo da Diocese de Lages (Brasil),D. Guilherme Antônio Werlang,M.S.F., até à presente data Bispo deIpameri.

Bispo de Keetmanshoop (Namíbia),o Rev.do Pe. Willem Christiaans,O.S.F.S., até agora AdministradorDiocesano da mesma Sede e DiretorNacional da Pontifícias Obras Mis-sionárias na Namíbia.

D. Willem Christiaans, O.S.F.S.,nasceu a 12 de fevereiro de 1961 emGabis (Namíbia). Foi ordenado Sacer-dote no dia 10 de dezembro de 1988.

Início de Missãode Núncios Apostólicos

D. Emil Paul Tscherrig, ArcebispoTitular de Voli, na República de SanMarino (9 de janeiro).

Em resposta ao apelo do Pontífice

Religiõesem prol da paz

«O pontifício Conselho para o diálogo inter-religioso agradece aos ir-mãos e às irmãs de outras religiões que quiserem» participar no Diamundial de oração e de jejum pela paz, proclamado pelo Papa Fran-cisco para sexta-feira, 23 de fevereiro, e dedicada de maneira particularàs populações da República Democrática do Congo e do Sudão doSul.

No dia seguinte ao lançamento do apelo do Sumo Pontífice, ocorri-do na terça-feira, 6 de fevereiro, o Dicastério do Vaticano responsávelpela promoção do diálogo com os seguidores de outros credos voltoua propor o conteúdo de tal apelo, exortando todos a «viver momentosde oração, de jejum e de reflexão, em conformidade com as respetivastradições e nos próprios lugares de culto», conscientes de «que as reli-giões podem contribuir enormemente para a consecução e a consolida-ção da paz».

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página 16 L’OSSERVATORE ROMANO quinta-feira 8 de fevereiro de 2018, número 6

Na audiência geral o Papa recomendou homilias que não superem dez minutos

Deus dialoga com o seu povoE fez votos de que as olimpíadas de PyeongChang alimentem a paz

«Na Liturgia da Palavra, através do Evangelho e da homilia, Deus dialoga como seu povo», frisou o Papa na audiência geral de quarta-feira 7 de fevereiro nasala Paulo VI. Dando continuidade às reflexões sobre a importância da missa navida cristã, Francisco meditou sobre a proclamação da última leitura, tirada deum trecho evangélico, e sobre o seu comentário por parte do sacerdote celebrante,com uma recomendação: que a pregação não supere dez minutos.

come parte da própria Liturgia,7 ahomilia não é um discurso de cir-cunstância — nem sequer uma cate-quese, como esta que agora faço —nem uma conferência, nem sequeruma lição; a homilia é outra coisa.O que é a homilia? É «um retomareste diálogo que já está estabelecidoentre o Senhor e o seu povo»,8 paraque seja posta em prática na vida. Aautêntica exegese do Evangelho é anossa vida santa! A Palavra do Se-nhor termina a sua corrida fazendo-se carne em nós, traduzindo-se emobras, como aconteceu em Maria enos Santos. Recordai aquilo que eudisse na última vez, a Palavra do Se-nhor entra pelos ouvidos, chega aocoração e vai às mãos, às boas obras.E também a homilia segue a Palavra

cia a homilia deve estar consciente deque não faz algo próprio, mas pregadando voz a Jesus, prega a Palavrade Jesus. E a homilia deve ser bempreparada, deve ser breve, breve! Di-zia-me um sacerdote que certa vez ti-nha ido a outra cidade, onde mora-vam os pais, e o pai disse-lhe: “Sa-bes, estou feliz, porque com os meusamigos encontramos uma igreja ondese celebra a Missa sem homilia!”. Equantas vezes vemos que na homiliaalguns adormecem, outros conver-sam, ou saem para fumar um cigar-ro... Por isso, por favor, que a homi-lia seja curta, mas bem preparada. Ecomo se prepara uma homilia, carossacerdotes, diáconos, bispos? Comose prepara? Com a oração, com o es-tudo da Palavra de Deus e fazendouma síntese clara e breve, não devesuperar 10 minutos, por favor! Con-cluindo, podemos dizer que na Litur-gia da Palavra, mediante o Evange-lho e a homilia, Deus dialoga com oseu povo, que o ouve com atenção eveneração e, ao mesmo tempo, reco-nhece-o presente e ativo. Portanto, se

No final da audiência geral o Papalançou um novo apelo contra o tráficode seres humanos e fez bons votos paraque as olimpíadas invernais dePyeongChang alimentem as esperançasde diálogo e paz no mundo.

Saúdo os peregrinos de língua por-tuguesa, em particular os seminaris-tas da Administração Apostólica SãoJoão Maria Vianney, acompanhadospelo seu Bispo. Queridos amigos, navossa preparação para o MinistérioOrdenado, de bom grado fazei daBíblia o alimento diário do vossodiálogo com o Senhor, para que,quando fordes enviados a proclamaresta Palavra divina, as pessoas en-contrem na vossa vida o testemunhomais eloquente da sua eficácia.Obrigado pela vossa visita e rezaipor mim.

Amanhã, 8 de fevereiro, memórialitúrgica de Santa Josefina Bakhita,celebra-se o Dia Mundial de Ora-ção e Reflexão contra o Tráfico. Otema deste ano é: «Migração semtráfico. Sim à liberdade! Não aotráfico!». Dispondo de poucas pos-sibilidades de canais regulares, mui-tos migrantes decidem aventurar-sepor outros caminhos, onde com fre-quência os esperam abusos de todosos tipos, exploração e redução à es-cravidão.

As organizações criminosas, quevivem do tráfico de pessoas, usamestas rotas migratórias para esconderas suas vítimas entre os migrantes eos refugiados. Portanto, convido to-dos, cidadãos e instituições, a uniras forças para prevenir o tráfico egarantir proteção e assistência às ví-timas.

Oremos, todos, a fim de que oSenhor converta o coração dos trafi-cantes — esta palavra é horrível, tra-ficantes de pessoas — e conceda a es-perança de reconquistar a liberdadea quantos sofrem devido a esta cha-ga vergonhosa.

Depois de amanhã, sexta-feira 9de fevereiro, começarão os XXIII Jo-gos Olímpicos Invernais, na cidadede PyeongChang, na Coreia do Sul,com a participação de 92 países.

Este ano, a tradicional tréguaolímpica adquire importância espe-cial: delegações das duas Coreiasdesfilarão juntas, sob uma únicabandeira, e competirão como umaúnica equipa. Isto faz esperar nummundo onde os conflitos se resolvempacificamente com o diálogo e norespeito recíproco, como também odesporto ensina.

Dirijo a minha saudação ao Comi-té Olímpico Internacional, aos atle-tas e às atletas que participam nosJogos de PyeongChang, às Autori-dades e ao povo da Península daCoreia. Acompanho todos com aoração, enquanto renovo o compro-misso da Santa Sé a apoiar todas asiniciativas úteis a favor da paz e doencontro entre os povos. Que estasOlimpíadas sejam uma grandiosafesta da amizade e do desporto!Deus vos abençoe e vos proteja!

do Senhor, fazendo inclusive estepercurso para nos ajudar, a fim deque a Palavra do Senhor chegue àsmãos, passando pelo coração.

Já abordei o tema da homilia naExortação Evangelii gaudium, onderecordei que o contexto litúrgico«exige que a pregação oriente a as-sembleia, e também o pregador, parauma comunhão com Cristo na Euca-ristia, que transforme a vida».9

Quem profere a homilia deve cum-prir bem o seu ministério — aqueleque prega, sacerdote, diácono ou bis-po — oferecendo um serviço real atodos aqueles que participam naMissa, mas também quantos o ou-vem, devem desempenhar a sua par-te. Antes de tudo, prestando a devidaatenção, ou seja, assumindo as justasdisposições interiores, sem pretensõessubjetivas, consciente de que cadapregador tem qualidades e limites. Seàs vezes há motivos para se entediar,porque a homilia é longa, ou não es-tá centrada, ou é incompreensível,outras vezes, ao contrário, o obstácu-lo é o preconceito. E quem pronun-

nos pusermos à escuta da “boa notí-cia”, seremos convertidos e transfor-mados por ela e, consequentemente,capazes de transformar a nós mesmose ao mundo. Porquê? Porque a BoaNotícia, a Palavra de Deus entra pe-los ouvidos, vai ao coração e chegaàs mãos para fazer boas obras.

1 Ordenamento Geral do Missal Ro-mano, 62.2 Introdução ao Lecionário, 5.3 Cf. Ordenamento Geral do MissalRomano, 60 e 134.4 Sermão 85, 1: PL 38, 520; cf. tam-bém Tratado sobre o Evangelho deJoão, XXX, I: PL 35, 1632; CCL 36,289.5 CONC. ECUM. VA T. II, Const. Sa-crosanctum concilium, 33.6 Cf. Ordenamento Geral do MissalRomano, 65-66; Introdução ao Lecio-nário, 24-27.7 Cf. CONC. ECUM. VA T. II, Const.Sacrosanctum concilium, 52.8 Exort. ap. Evangelii gaudium, 137.9 Ibid., n. 138.

Prezados irmãos e irmãs, bom dia!Continuemos as catequeses sobre aSanta Missa. Tínhamos chegado àsLeituras.

O diálogo entre Deus e o seu po-vo, desenvolvido na Liturgia da Pa-lavra da Missa, alcança o ápice naproclamação do Evangelho. Precede-o o cântico do Al e l u i a — ou então,na Quaresma, outra aclamação —com o qual «a assembleia dos fiéisacolhe e saúda o Senhor que estáprestes a falar no Evangelho».1 Domesmo modo que os mistérios deCristo iluminam toda a revelação bí-blica, assim, na Liturgia da Palavra,o Evangelho constitui a luz paracompreender o sentido dos textosbíblicos que o precedem, tanto doAntigo como do Novo Testamento.Com efeito, «de toda a Escritura, as-sim como de toda a celebração litúr-gica, Cristo é o centro e a plenitu-de».2 Jesus Cristo está sempre nocentro, sempre.

Por isso, a própria liturgia distin-gue o Evangelho das outras leituras,circundando-o de honra e veneraçãoesp eciais.3 Com efeito, a sua leitura éreservada ao ministro ordenado, queno final beija o Livro; pomo-nos àescuta de pé, traçando um sinal dacruz na testa, nos lábios e no peito;os círios e o incenso honram Cristoque, mediante a leitura evangélica,faz ressoar a sua palavra eficaz. Des-tes sinais a assembleia reconhece apresença de Cristo, o qual lhe dirigea “boa notícia” que converte e trans-forma. Tem lugar um discurso direto,como atestam as aclamações com asquais se responde à proclamação:«Glória a Vós, ó Senhor» e «Louvora Vós, ó Cristo». Levantamo-nos paraouvir o Evangelho: ali é Cristo quemnos fala. É por isso que prestamosatenção, porque se trata de um diálo-go direto. É o Senhor quem nos fala.

Portanto, na Missa não lemos oEvangelho para saber o que aconte-ceu, mas ouvimos o Evangelho paratomar consciência do que fez e disseJesus outrora; e aquela Palavra é vi-va, a Palavra de Jesus que está noEvangelho é viva e chega ao meucoração. Por isso, ouvir o Evangelhoé muito importante, com o coraçãoaberto, porque é Palavra viva. SantoAgostinho escreve que «a boca deCristo é o Evangelho. Ele reina nocéu, mas não cessa de falar na ter-ra».4 Se é verdade que na Liturgia«Cristo ainda anuncia o Evange-lho»,5 consequentemente, participan-do na Missa, devemos dar-lhe umaresposta. Nós ouvimos o Evangelhoe devemos dar uma resposta na nos-sa vida.

Para transmitir a sua mensagem,Cristo serve-se inclusive da palavrado sacerdote que, após o Evangelho,pronuncia a homilia.6 Recomendadavivamente pelo Concílio Vaticano II