Upload
lytuong
View
215
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
1
Carta de Natal 2011 do Abade Geral
A figueira e as raízes
Caríssimos Irmãos e Irmãs Cistercienses, A minha longa viagem ao Vietnam permitiu-‐me aprofundar posteriormente o conhecimento da nossa Ordem, da nossa vocação e missão. Tudo é graça que nos desafia a seguir e continuar um caminho que só o Espírito nos pode permitir percorrer. Em contato com a vitalidade, o acolhimento afetuoso, a pobreza e simplicidade dos nossos irmãos e irmãs na Ásia, e do seu povo, tomei maior consciência do compromisso que o Senhor pede a todos nós, em qualquer condição ou cultura que nos encontremos. Onde quer que seja é urgente que aprofundemos a experiência e a formação da nossa vocação monástica cenobítica para poder verdadeiramente oferecer a nós mesmos, a quem se une a nós, e à sociedade que nos circunda, um testemunho verdadeiro da humanidade nova que o Filho de Deus tornou possível fazendo-‐se homem. A humanidade de Cristo se fez para nós experiência de vida nova que nos reconduz ao Pai no sopro do Espírito Santo. Mas para que isto torne-‐se verdadeiro para nós é preciso que nos abandonemos a esta experiência seguindo o Senhor em profundidade. Seguir Jesus é a regra de todas as regras, e são Bento é para nós, como para os nossos padres e madres cistercienses, o guia carismático que nos ensina o seguimento de Cristo: “Cingidos os rins com a fé e o cumprimento das boas obras, sigamos pela sua estrada sob a guia do Evangelho, para que nos seja dado ver Aquele que nos chamou ao seu Reino”. (RB, Pról. 21) Nesta experiência, neste seguimento, onde quer que seja nos sentimos um pouco cansados e hesitantes. Dei-‐me conta de que os problemas das grandes e jovens comunidades vietnamitas são muito semelhantes aos problemas das pequenas e
2
anciãs comunidades ocidentais. No fundo a todos nos custa um pouco abandonarmo-‐nos com simplicidade ao caminho que o Verbo de Deus nos propõe fazendo-‐se homem e chamando-‐nos a segui-‐lo. Por que esse custo? Por que essa hesitação em ser simples? “De onde me conheces”? Os primeiros discípulos de Jesus seguiram-‐no porque foram atraídos pelo fascínio da sua pessoa e da sua palavra. O encontro com Ele era um acontecimento que arrastava a sua vida no desejo de permanecer sempre com Ele. Este fascínio, ninguém conseguia explicá-‐lo, mas era uma experiência que não podiam mais negar, nem mesmo sendo-‐lhe infiéis, renegando-‐o ou traindo-‐o. Aquilo que lhes tocava em Jesus era que o encontro com Seu mistério revelava o mistério deles mesmos, o mistério da sua própria vida, da sua origem e do seu destino. Quando viu Natanael vir-‐lhe ao encontro, Jesus disse: “Eis um verdadeiro Israelita no qual não há falsidade”. Então Natanael, espantado, perguntou a Jesus: “De onde me conheces?” (Jo 1,47-‐48) Com esta pergunta, Natanael mostra intuir que em Jesus se lhe revela o mistério da sua vida. “De onde me conheces?”: Jesus nos conhece a partir de uma Origem de nós mesmos que nós não conhecemos, porque é uma Origem que nos precede na eternidade do desígnio do Pai que nos cria à imagem do Filho. Jesus dá a Natanael uma resposta misteriosa, “Antes que Felipe te chamasse, eu te vi quando estavas debaixo da figueira” (Jo 1,48), mas aquilo que Natanael compreende é que só escutando e seguindo Cristo de perto lhe será possível voltar àquela Origem e alcançar aquele Fim do qual Jesus mostra conhecê-‐lo. De fato Jesus anuncia e promete logo aos seus discípulos esta revelação e experiência n’Ele do seu Destino: “Em verdade, em verdade vos digo: vereis o céu aberto e os anjos de Deus subirem e descerem sobre o Filho do homem.” (Jo 1,51) A percepção deste mistério de nós mesmos no encontro com o mistério de Cristo poderia limitar-‐se a uma admiração, a uma maravilha que o primeiro encontro com Jesus suscita em nós e não ter seguimento na nossa vida se, também atraídos pelos fascínio de Cristo, não nos colocássemos a escutá-‐lo e a segui-‐lo com humilde fidelidade. Para ver o céu aberto e os anjos de Deus subirem e descerem sobre o Filho do homem nos é pedido um caminho com Jesus no cotidiano na nossa vida. São Bento diria que temos necessidade de percorrer o caminho da escada da humildade: “Se queremos tender a uma humildade plena, e alcançar rapidamente aquela exaltação divina pela qual se sobe através da humildade da vida presente, progredindo nas nossas ações devemos construir uma escada como aquela que apareceu a Jacó em sonho, sobre a qual ele viu os anjos descerem e subirem. (...) A escada erigida é a nossa vida no mundo: ela será elevada por Deus ao céu se o coração se humilha.” (RB 7,5-‐8)
3
É este caminho que nos conduz àquele conhecimento verdadeiro e humilde de nós mesmos que coincide sempre mais com o conhecimento que Cristo tem de nós à luz do mistério do Pai, à luz do mistério da Trindade da qual Jesus nos conhece como conhece Natanael. Debaixo da figueira A primeira resposta de Cristo ao cético Natanael, “Antes que Filipe te chamasse, eu te vi quando estavas debaixo da figueira.” (Jo 1,48), que provocou nele uma confissão de fé imediata e plena de entusiasmo: “Rabbi, tu és o Filho de Deus, tu és o rei de Israel!” (Jo 1,49), faz parte daqueles mistérios do Evangelho que esperamos alcançar no Céu para saber do que se tratava, um pouco como aquilo que Jesus escreveu na terra no evangelho da adúltera (Jo 8,6-‐8), ou aquilo que disse a são Pedro na última cena do evangelho de João (Jo 21,19). Na espera de saber o que fazia Natanael debaixo da figueira, podemos talvez porém banalmente intuir que debaixo da figueira estão as suas raízes, e que de qualquer modo Natanael, à sombra daquela árvore, teve uma atitude que radicou particularmente a sua vida na verdade da vocação do povo de Israel: “Eis um verdadeiro Israelita no qual não há falsidade.” (Jo 1,47) Durante a minha estadia no Vietnam tocou-‐me na Liturgia o evangelho da paciência de Deus que permite que uma figueira estéril seja deixada na terra ainda um ano, a fim de que o vinhateiro possa cavar em volta do tronco e colocar o adubo (cfr. Lc 13,6-‐9). Aquilo que faz o vinhateiro é uma intervenção em favor das raízes: cava em torno da figueira e ali coloca o adubo a fim de que as raízes recebam a nutrição necessária para dar vida a toda a árvore e permitir-‐lhe dar fruto. Esta imagem exprime bem a natureza e a missão da nossa vocação monástica, em qualquer forma que ela seja vivida, porque a nossa vocação é viva e fecunda só se trabalhamos nas raízes. A nossa vocação dá fruto se permitirmos à nossa observância monástica nutrir as raízes da nossa pessoa. O trabalho das raízes é escondido, silencioso, profundo. Não o vemos, mas dele depende toda a vida, a beleza e a fecundidade da árvore. É neste sentido que são Bento nos pede antes de tudo para sermos radicados em uma comunidade pela estabilidade, e para cultivarmos cada dia, pessoalmente e conjuntamente, aquilo que nutre a nossa pertença ao Senhor que nos chamou a sermos árvores fecundas na vinha do seu Reino. O monge, a monja, que se dedica ao trabalho profundo das raízes torna-‐se vivo e fecundo, não só para si mas para toda a comunidade, para a Igreja e o mundo inteiro. Tudo a que somos chamados a viver na nossa comunidade monástica cava a terra e a nutre para alimentar as nossas raízes. Nesta carta de Natal gostaria de
4
insistir sobre um aspecto deste trabalho vivificante sobre as raízes da nossa vocação que creio deveria ser objeto de maior empenho em toda parte na Ordem, se queremos dar os frutos que Deus nos promete e pede. Trata-‐se da nossa formação permanente a partir da escuta da palavra de Deus. “Lâmpada para os meus passos é a tua palavra” São Bento e os nossos padres e madres cistercienses atribuem uma grande importância à escuta silenciosa e humilde de Deus, do Deus que está presente na nossa vida e que nos fala constantemente na palavra da Sagrada Escritura, na Liturgia e nos Sacramentos, no ensinamento do superior da comunidade, na tradição dos santos padres e madres da vida monástica. Quando escutamos no silêncio e com humildade Deus que nos fala, que fala ao nosso coração, tornamo-‐nos capazes de escutar o Senhor que nos interpela através de tudo, através de todos os encontros e todas as circunstâncias. Tenho a impressão que na vida das nossas comunidades a lectio divina não seja suficientemente cultivada, como leitura lenta e meditada da Palavra de Deus. Temos frequentemente tantas práticas espirituais e de piedade, e sobretudo muitas atividades, mas frequentemente tudo isso não me parece suficientemente alimentado pela escuta da palavra da Bíblia. A lectio divina busca cada dia na leitura meditada da Sagrada Escritura a palavra que Deus quer nos dizer hoje, nas circunstâncias presentes, para ajudar-‐nos a viver na Sua vontade, no Seu amor, à Sua luz e em relação com Ele. Como o exprime o Salmo 118: “Lâmpada para os meus passos é a tua palavra, luz sobre o meu caminho.” (v. 105) A palavra de Deus é a luz que ilumina cada passo que damos no seguimento de Cristo e que nos permite avançar com confiança, também através das noites e da neblina. Cada dia devemos buscar com a lectio divina a palavra de Deus que nos ajude a deixar-‐nos formar por Deus em todas as circunstâncias que devemos viver, boas ou desagradáveis. A palavra de Deus que nos ajude portanto a responder-‐Lhe, a dialogar com Ele em uma oração contínua. Quando o nosso coração é alimentado pela escuta da palavra de Deus, pela escuta do Evangelho, pela Palavra de Deus que é Jesus Cristo, o Verbo feito carne, observar o silêncio não é mais difícil; um silêncio profundo, também quando estamos em meio ao rumor ou devemos falar com os outros. A lectio divina vivida e cultivada deste modo permite também escutar-‐nos melhor uns aos outros, estar mais atentos aos nossos irmãos e irmãs, e dialogar entre nós em profundidade. As partilhas comunitárias sobre a Palavra de Deus são particularmente frutuosas porque escutar o que Deus sugere a um irmão ou a uma irmã nos torna mais atentos à palavra que Deus quer dizer-‐nos pessoalmente.
5
Para são Bento, e para todos os padres cistercienses como são Bernardo, não há nunca meditação sem escuta da Palavra de Deus. A meditação cristã é sempre uma escuta da Palavra para dialogar com o Senhor. Os nossos padres e as nossas madres nos ensinam a meditar partindo sempre da Palavra de Deus. Isto favorece também a alegria intetior que nos permite estar contentes com tudo. Façamos a experiência dos discípulos de Emaús que, escutando Jesus enquanto explica a eles as Escrituras, sentiam o seu coração encher-‐se de alegria ardente e renunciam à tristeza sombria, desiludida e murmurante na qual estavam afundando antes de encontrarem e escutarem Jesus, Jesus que é a Palavra, o Verbo, que ilumina todas as Escrituras (cfr. Lc 24,13-‐31). Também nós, graças à escuta meditada da Palavra de Deus, podemos descobrir que das raízes profundas do nosso coração a vida vem animar toda a árvore, os ramos, as flores e os frutos da nossa pessoa e da nossa comunidade. Se não há esta vida interior na escuta de Deus que nos fala, toda a vida no mosteiro se reduz a formas vazias, que podem ser belas esteticamente, mas que por fim não bastam para justificar as renúncias e os sacrifícios que a nossa vocação comporta, e então se começa a fugir na busca de compensações e de distrações. As fontes da formação permanente A Palavra de Deus para são Bento é a nascente profunda e constante da nossa formação monástica. Ela dá sentido a tudo aquilo que vivemos e nos permite viver tudo com profundidade e verdade na memória viva de Cristo, Verbo de Deus. Esta nascente nos é porém transmitida por toda a tradição da Igreja, e é importante não esquecer ou descuidar desta dimensão da Revelação, porque reduziríamos a nossa formação a um biblicismo abstrato. No último capítulo da Regra é como se são Bento fosse tomado da repentina preocupação de não ver-‐nos cair em uma espécie de fundamentalismo redutivo das fontes da nossa fé e da nossa vocação monástica. Diz que a Regra não diz tudo e que para vivê-‐la com sua justa dimensão é necessário nutrir a nossa observância alcançando toda a tradição “da doutrina dos santos Padres” (RB 73,2). São Bento apresenta pois este trabalho de formação monástica permanente como um alcançar uma fonte que, por assim dizer, nos transmite a água da nascente bíblica através de dois reservatórios: o reservatório dos “santos Padres católicos” e aquele dos Padres monásticos: “Qual página ou qual palavra inspirada por Deus, do Antigo ou do Novo Testamento, não é retíssima norma da vida humana? Ou de qual livro dos santos Padres católicos não ecoa um convite para avançar pelo reto caminho em direção ao nosso Criador?
6
E as Colações dos Padres, as Instituições e as suas Vidas, como a mesma Regra de nosso santo pai Basílio, que outra coisa são senão instrumentos de virtude para os monges que vivem bem e na obediência?” (RB 73, 3-‐6) A água viva da Palavra de Deus nos atinge diretamente, mas o nosso alcançá-‐la é enriquecido se a acolhemos também através de toda a tradição patrística e monástica que a Igreja nos oferece. Nesta passagem do capítulo 73 da Regra é importante notar as motivações que são Bento sublinha para atingir a cada nível da fonte da Revelação e Tradição cristãs. Diz antes de tudo que a Bíblia é para nós “rectissima norma vitae humanae – retíssima norma de vida humana”. A Palavra de Deus nos ensina a ser homens, não só a sermos religiosos, a sermos piedosos; não só a rezar ou a meditar. Deus nos fala para que se cumpra em nós antes de tudo a nossa vocação humana, o desígnio que Ele tem ao criar cada homem à sua imagem e semelhança. A Palavra de Deus deve então formar-‐nos em toda a nossa humanidade, em todos os aspectos da nossa humanidade. E são Bento nos ilustra esta obra longa e integral da escuta da Palavra de Deus quando cita a Escritura quase a cada capítulo da Regra a propósito de tudo, também dos aspectos mais materiais e banais da vida cotidiana. A Palavra de Deus ilumina e guia os passos de toda a aventura humana e nos permite viver tudo na unidade do projeto amoroso do Pai. Assim como o Verbo se fez carne e viveu e vive conosco a perfeição e plenitude da nossa humanidade, também na nossa vida a Palavra de Deus quer encarnar o desígnio bom do Pai de conformar-‐nos em tudo ao Filho através da graça do Espírito Santo. São Bento nos diz pois que os escritos dos Padres da Igreja nos ensinam o caminho reto para chegar ao nosso Criador. Os Padres nos ensinam portanto a voltar ao Pai, a reencontrar Aquele que nos cria, a nossa verdadeira Origem. A doutrina dos Padres nos permite portanto andar retamente ao nosso destino, caminhar na direção do objetivo da nossa existência que é reencontrar na comunhão eterna com Deus a nossa imagem perdida com o pecado. Também os Padres portanto são uma fonte que alimenta a verdade e o cumprimento da nossa vida humana. Por “santos Padres católicos” devemos entender todos os autores que a Igreja reconhece conforme a verdade da Revelação que recebeu de Cristo e que nos transmite no curso dos séculos e, evidentemente, todo o Magistério eclesial até hoje. Para voltar já desde agora ao Pai que nos cria temos necessidade da fé da Igreja, e de uma ajuda constante para ser-‐lhe fiel na verdade e na liberdade. Enfim, são Bento nos pede para alcançar a tradição monástica. Como os Padres e as Madres da Igreja nos transmitem a Palavra de Deus para caminhar com verdade até o nosso destino, os Padres e Madres da vida monástica nos
7
transmitem, a partir das mesmas fontes, a tradição da Igreja que nos ajuda a viver com verdade a beleza a nossa vocação. Além das fontes monásticas que são Bento podia citar em seu tempo, podemos acrescentar todos os escritos que até hoje nos são oferecidos para ajudar-‐nos a aprofundar a nossa vocação específica, e a vida de todos os monges e monjas que nos servem de exemplo. Nós evidentemente deveremos acrescentar os nossos autores e santos cistercienses. Os seus escritos e as suas vidas – porque a sua doutrina é sempre experiência de vida – são “instrumentos de virtude para os monges que vivem bem e na obediência”. Uma forma vocacional, como é aquela monástica, dá cumprimento à existência quando se torna “virtude”, isto é um valor que a graça encarna na pessoa, um “viver bem” que torna boa, justa, verdadeira, bela a pessoa que vive esta forma de seguimento de Cristo. Este “viver bem” é sempre fruto de uma obediência, porque a nossa vocação não foi inventada por nós. Se nós a inventássemos, não seguiríamos Cristo, seguiríamos a nós mesmos, e não há pior forma de “vocação” do que aquela que reflete a si mesma, que escuta só a si mesma, que “obedece” a si mesma. Crê-‐se avançar, e ao contrário gira-‐se sobre si mesmo caminhando sobre o lugar sem progredir nunca. Mas se isso acontece, é talvez porque frequentemente a nossa obediência e o nosso seguimento da Regra não estão suficientemente nutridos e banhados até a raiz da nossa consciência e liberdade pelas fontes de formação monástica que são Bento elenca aqui. É importante que tenhamos consciência disso e que nos ajudemos a entrar nestas fontes pessoalmente e comunitariamente. Não se trata de conhecer integralmente a Bíblia e de ler todos os Padres. Cada um deve simplesmente dar-‐se conta de que há necessidade de um acesso, também simples e mínimo, mas fiel e constante, a estas três fontes de formação que a Igreja nos oferece e transmite. Só assim as raízes da árvore da nossa vocação serão banhadas e nutridas, e seremos mais fecundos de frutos não só para nós mesmos, mas para a Igreja toda e o mundo, porque a vida monástica tem na Igreja sobretudo a vocação das raízes, escondidas mas indispensáveis à vida, beleza e fecundidade de toda a árvore. “Faça-se em mim segundo a tua palavra!” São Bento nos pede para dedicarmo-‐nos a esta formação permanente para melhor percorrer o caminho da vida monástica cenobítica que a Regra propõe (cfr. RB 73). A escuta e o aprofundamento da Palavra de Deus é para a vida: a Palavra de Deus torna-‐se verdadeira para nós se lhe permitimos encarnar-‐se por obra do Espírito na nossa vida humana quotidiana. Nisto a Virgem Maria é para nós Mãe e Mestra. Tudo para ela se concentra na resposta ao anjo Gabriel: “Faça-‐se em mim segundo a tua palavra!” (Lc 1,38). A liberdade humilde e acolhedora da Virgem permite à Palavra de Deus tornar-‐se nela acontecimento, o acontecimento de Jesus Cristo que se faz homem para salvar o mundo. A Palavra de Deus que escutamos e meditamos quer tornar-‐se
8
acontecimento na nossa vida. Só então ela atinge o seu objetivo, que é o realizar-‐se em nós do desígnio de amor da Trindade. A nossa mesma vida torna-‐se acontecimento de Cristo, sinal e instrumento da sua presença e do seu amor. “Como de fato a chuva e a neve descem do céu e para lá não retornam sem ter irrigado a terra, sem tê-‐la fecundado e feito germinar, para que dê a semente ao semeador e pão de comer, assim será com a palavra saída da minha boca: não retornará a mim sem efeito, sem ter operado o que desejo e sem ter cumprido aquilo para o qual a mandei.” (Is 55,10-‐11) Como Maria, nos é pedido confiar no poder do Espírito Santo que habita a Palavra de Deus que nos é pedido acolher humildemente e deixá-‐la germinar na terra da nossa pobre humanidade. A Palavra de Deus não é uma idéia, um conceito difícil de compreender, porque é Alguém, é o Filho de Deus que aparece no mundo como Menino que nasce e cresce em nós e entre nós. É Ele que realiza em nós a coincidência da Palavra e do acontecimento, da verdade e da vida, nos sacramentos e na vida da Igreja. É Ele o Verbo que faz novas todas as coisas (cfr. Ap 21,5), que recria tudo aquilo que nos parece velho, estéril, morto. É Ele a Raiz de Jessé (Is 11,1) da qual renasce todo o Povo de Deus, e da qual renasce sempre a vida das nossas pessoas, das nossas comunidades e de toda a Ordem. É esse renascimento contínuo de nós em Cristo e de Cristo em nós que desejo a todos para o próximo Natal e cada dia do novo ano, no qual estarei feliz de encontrar-‐vos, ou então de continuar unido a vós no nosso humilde e feliz caminho de escuta e seguimento da presença do Emanuel! Com fraterno afeto, vosso
Fr. Mauro-Giuseppe Lepori Abade Geral OCist
Roma, 8 de dezembro de 2011 Solenidade da Imaculada Conceição