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Relação com a arte, cultura, poesia Antes de falarmos do slam, algumas perguntas sobre as formas como utilizas o teu tempo, sobre as tuas actividades. 1. Quais são as tuas áreas de interesse, os teus hobbies, actividades de tempos livres? Então o que é que eu faço nos tempos livres? Trabalho para a comunidade onde eu vivo. Sei lá… Podes explicar melhor? Moro na República. É preciso manter a casa, trabalhar em grupo, a dinâmica…tratar de assuntos da casa…agora com a Lei do Arrendamento e tudo o mais. Andar aí sempre para trás e para a frente. Mais…hobbies., hobbies…viajar claro, bastante. Bastante mesmo. 2. No que toca à cultura, à arte, como usa(s) o teu tempo? Que actividades fazes? Sei lá. Música no geral. Ouvir música, todo o tipo de música e mais algum. Poesia. Estamos aqui a falar de poesia. É lógico, também. Mais? Já há muito tempo que ninguém me fazia uma pergunta assim. Isto faz-me lembrar aquelas coisas quando éramos putos. Tento ir sempre que posso a concertos. Não vou a cinema. Não gosto de cinema. Sei lá, exposições. Sempre que posso, algumas coisas, sempre que o dinheiro permite. Mas…sei lá, como é que ocupo o meu tempo? Geralmente, ocupo o tempo a aprender coisas que não sei. Ou a tentar descobrir culturas que não estou muito por dentro, conhecer um bocado mais. Sei lá…é o enriquecimento pessoal. 3. Lês poesia? Já li mais, já li mais. Mas ainda leio alguma. 4. Tens algum autor/a (conhecido ou não, consagrado ou não), poema preferido? Não. Poemas preferidos não tenho, acho eu. Autores, também é assim, no geral, no geral não tenho. Não tenho. Se calhar era muito Português dizer que Fernando Pessoa e tudo o mais, não é?

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Relação com a arte, cultura, poesia

Antes de falarmos do slam, algumas perguntas sobre as formas como utilizas o teu tempo, sobre as tuas actividades.

1. Quais são as tuas áreas de interesse, os teus hobbies, actividades de tempos livres?

Então o que é que eu faço nos tempos livres? Trabalho para a comunidade onde eu

vivo. Sei lá…

Podes explicar melhor?

Moro na República. É preciso manter a casa, trabalhar em grupo, a dinâmica…tratar

de assuntos da casa…agora com a Lei do Arrendamento e tudo o mais. Andar aí

sempre para trás e para a frente. Mais…hobbies., hobbies…viajar claro, bastante.

Bastante mesmo.

2. No que toca à cultura, à arte, como usa(s) o teu tempo? Que actividades fazes?

Sei lá. Música no geral. Ouvir música, todo o tipo de música e mais algum. Poesia.

Estamos aqui a falar de poesia. É lógico, também. Mais? Já há muito tempo que

ninguém me fazia uma pergunta assim. Isto faz-me lembrar aquelas coisas quando

éramos putos. Tento ir sempre que posso a concertos. Não vou a cinema. Não gosto

de cinema. Sei lá, exposições. Sempre que posso, algumas coisas, sempre que o

dinheiro permite. Mas…sei lá, como é que ocupo o meu tempo? Geralmente, ocupo

o tempo a aprender coisas que não sei. Ou a tentar descobrir culturas que não estou

muito por dentro, conhecer um bocado mais. Sei lá…é o enriquecimento pessoal.

3. Lês poesia?

Já li mais, já li mais. Mas ainda leio alguma.

4. Tens algum autor/a (conhecido ou não, consagrado ou não), poema preferido?

Não. Poemas preferidos não tenho, acho eu. Autores, também é assim, no geral, no

geral não tenho. Não tenho. Se calhar era muito Português dizer que Fernando

Pessoa e tudo o mais, não é?

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E há algum tipo de poesia que gostes mais?

Todo o tipo de poesia que não é de quadra e que não rime. (risos) todo o tipo de

poesia mais para o experimental, não é? Quanto mais experimental melhor, nesse

sentido.

5. Em que momentos lês poesia? É uma leitura regular ou de momentos?

Lês à noite, antes de dormir? Numa caminhada, numa pausa do trabalho, num sítio

especial, etc.)?

Sei lá, viagens de autocarro, comboios, tempos mortos né? Para ocupar o tempo,

para preencher o tempo. Sei lá. Agora ando muito a ler poesia, por exemplo,

Africana. Por causa das cadeiras (disciplinas) que tenho. Também muito…poesia

angolana, Agostinho Neto por exemplo. Alguma moçambicana, cabo-verdiana e

são-tomense. É mais por causa das cadeiras que tenho né? Também quero fazer o

Mestrado sobre isso, sobre Literatura Africana. Pronto. Neste momento ando

mesmo mais virado para a poesia africana, para a poesia do negro e do mestiço.

6. Compras livros de poesia? Onde? O que te faz comprar um livro de poesia/como

escolhes?

Sim. olha ainda no outro dia a Leya estava em liquidação total ali na Baixa. Estava

em liquidação total, então de repente dei por mim a comprar a antologia de poesia

moçambicana por 1,95 euros. Comprei a antologia da Maria Teresa Horta. Custava

para aí 50 euros ou assim uma coisa pornográfica. Comprei por 15 euros. Comprei

Conceição Lima de São Tomé.

E numa situação que não seja de saldos ou promoções, onde é que costumas

comprar livros de poesia?

Geralmente é ao acaso. Alfarrabistas, claro. Um bocado mais numa de “não

conheço este ou aquele”.

E o que é que te leva a dizer “vou comprar este livro”?

Normalmente é o cheiro. Se cheirar bem, logo que não cheire industrial (risos).

Primeiro é o cheiro, yah. Levo muito pelo cheiro e pela capa em si. Sou um bocado

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convencido pelo marketing (risos). Mas…sei lá, tento, ando a tentar comprar mais

poesia feminina. Que é um erro que tenho andado a reparar que há. Eu gosto muito

de poesia mas procuro sempre homens. As mulheres ficam sempre lá atrás. Ando a

tentar agora preencher a biblioteca com poesia do feminino. Sei lá. Geralmente

ando à procura de nomes que não sejam conhecidos vá. Para…também para…

7. Lês poesia na Internet? Tens/Vais a algum site/blogue?

Não. Sou info-excluído. Sou info-excluído. Eu não tenho computador. Eu só vou ao

computador 5 min, 10 por dia no máximo. É o tempo máximo de utilização. Gmail,

Facebook, vá tchau, não há novidades. E não leio mesmo, blogues ou isso. Não faço

ideia, não tenho mesmo esse hábito.

8. Escreves poesia? Se sim, quando começaste a escrever? Costumas partilhar o que

escreves com alguém? Tens algo publicado em papel, suporte digital (cd, dvd), na

web (blogue, site, etc.)?

Já escrevi mais, também. Neste momento é mesmo só para o slam. Eu e o Carapau

juntamo-nos. Neste momento só ando a fazer poesia para o slam. Comecei a

escrever para aí no 10º ano práí, no 11º. A poesia do coração, do romantismo, toda

bonita. Partilhava muito o que escrevia. Na verdade, comecei a escrever poesia por

causa de uma professora minha, naquela “ah, não sei quê, escreves…”

relativamente bem que eu era de Desporto. Não era difícil alguém de Desporto

escrever bem. Então pronto, eu era dos que tinha mais à vontade com a escrita

naquele curso. A professora começou a dizer “ah, escreve, escreve.” E “tens uma

dicção fixe”. E partilhava muito com ela na verdade. Era só quase com ela. Depois

com as namoradas da altura né? Com a minha mãe, uma ou outra, aquelas que que

convinha, só para dar aquele toque. (risos) aquele toque de adolescente em

construção. É verdade.

Alguma vez fizeste algum tipo de publicação? Papel, digital?

Não, não. Só neste caso os vídeos que temos lá da Equi. Não tenho mais

publicações. Já pensei, aqueles sonhos que toda a gente tem, aqueles

sonhos…ideias não é?

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Quando digo publicações falo de várias opções, independente, policopiada, etc.

Não, nunca publiquei mesmo nada. Neste momento nem estou para aí virado, na

verdade. Não estou muito…sei lá. Para já não quero viver da poesia. Nem quero, no

geral, sei lá, publicar. Não tenho muito…na verdade a poesia que eu tenho neste

momento nós não temos os textos dela. Eu não tenho os textos dela. Não faço ideia

mesmo. Depois do slam acabamos por perder os textos. A minha actividade poética,

hoje em dia, está muito dependente do slam, digamos. É aquela periodicidade que

temos, uma vez por mês vamos fazer, vamo-nos juntar e vamos fazer uma

brincadeira qualquer. Brincadeira entre aspas. De resto não.

9. Que tipo de eventos culturais frequentas? Onde?

10. Que eventos relacionados com poesia frequentavas e/ou continuas a frequentar?

Pois, é uma boa pergunta. Ia àqueles sarauzitos não é? Saraus caseiros entre aspas

de café. Cheguei a ir…é um dos eventos mais bonitos que eu guardo na minha

memória que é poesia com os presos em Paços de Ferreira. E foi cá fora, assim

mesmo no centro do Concelho. Foi das coisas mais bonitas, dos contactos mais

bonitos que eu tive com a poesia. Foi esse.

Mas estiveste na preparação disso?

Não. Era essa tal minha professora. Estou agora é a iniciar aqui em Coimbra. Estou

aqui a criar em Coimbra. E depois desses saraus da treta, enchi-me rapidamente

deles e comecei a tentar organizar. No 11º ano já organizei também lá na terra uma

coisa com os poetas locais, vá que seja, e com miúdos, miúdos das escolas. Fiz isso

durante 2 anos, no 11º e no 12º e no 1º ano da Faculdade, 3 anos. Com os putos, com

vários temas e não-sei-quê. Depois fiz aqui em Coimbra uma conferência sobre o

Eugénio de Andrade com o António Oliveira que era um professor meu de Santo

Tirso. É poeta também. Depois fiz o ano passado…o ano passado não, há 2 anos,

com os miúdos da Brotero, surdos-mudos em Língua Gestual. E agora tou a fazer

isto aqui…tou há um ano a tentar iniciar isto aqui na prisão. Basicamente é isso. Não

tenho ido a muitos…fui ao slam do Porto, vou aqui aos de Coimbra, fui àquele em

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Famalicão que vocês também foram. Aliás, foi por vossa causa que eu fui, não é? E

de resto não fui assim a muitas coisas. Porque também me enchi rapidamente.

Cansei-me muito rápido daquela poesia da Florbela e do Camões e do Pessoa pá.

Isso dá sono. Preferi começar a organizar algumas coisas do que propriamente…

11. Já organizaste ou organizas eventos culturais/artísticos? Quais?

Depois organizei também em Santo Tirso o 1º Torneio de Basquetebol adaptado, em

cadeira de rodas, no 12º ano, 4 equipas. Um evento de um dia inteiro, um Sábado. E

depois organizei as poesias. Exacto. Estive a ajudar lá na organização através da Câmara

de Santo Tirso. Aqui digamos que só fiz esses 2: a conferenciazita com a exposição e

textos originais e inéditos do Eugénio, porque esse professor era amigo do Eugénio

e…um amigo dele que é o Dario. E o Dario é que tem o espólio todo dele, tudo, tudo,

tudo. É incrível, assustador mesmo. O gajo é fanático pelo Eugénio, é mesmo uma

cena…é uma pessoa que vale a pena conhecer. E…depois foi a tal com os miúdos da

Brotero em Língua Gestual. Ao mesmo tempo eu estava a dizer os poemas e eles

estavam a…eles estavam a fazer em Língua Gestual e alguns a tocar música também.

Foi uma experiência muito bonita. Na altura tive a parceria também da UCTV e eles

ficaram de editar os vídeos e eu nunca mais fui lá buscar aquilo. E quero agora fazer com

os presos também um bocado…um bocado digamos que embalado por aquela

experiência que eu tive em Paços de Ferreira. Pronto, quero desenvolver com eles.

Estamos em projecto, a aprovação do Ministério, não-sei-quê.

12. E como artista? Participas, trabalhas, actuas? Em que áreas?

Relação com o Poetry Slam

1. Quando ouviste, leste, etc. sobre o Poetry Slam pela 1ª vez?

Oh, foi com vocês. Quando começaram a organizar aqui, desde a 1ª edição. Foi a partir

daí que eu tive contacto. Não sabia minimamente. Só depois é que fiquei a saber de

Lisboa e não-sei-quê. Porque não…não tinha ideia por acaso. Lá está, estou-me a info-

excluir.

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2. E por que é que ficaste interessado no Poetry Slam?

Para já porque era uma organização independente né? Ou seja, não há Câmaras, não há

editoras a dizer “vamos organizar isto”. E só por aí dava para prever um tipo de, um tipo

de apresentação e de público digamos diferente, mais descontraído, mais…pronto é

isso, mais descontraído, mais tranquilo. E porque dava para prever que não era a poesia

do coração nem a da rima. Ou seja, era uma oportunidade de brincar com as palavras,

digamos, tar ali, juntar e experimentar outras coisas, outras formas de apresentar a

poesia. Mais independente.

3. Achas que há uma relação entre o teu envolvimento na arte e na cultural em geral

e o teu envolvimento no poetry slam? Há uma relação entre o papel da arte e da cultura

na tua vida e o interesse que tens pelo poetry slam? /achas que o interesse que tens

pela arte e cultura em geral condiciona o interesse que tens, que sentiste pelo poetry

slam?~

4. Conheces Poetry Slams de outros pontos do país? E de outros países?

Fui ao Porto uma vez, à edição 1. Eles tinham feito a edição Zero né? fui ao Porto. Neste

caso só fui ao Porto também. Estamos a pensar agora ir, temos vindo a falar e estamos a

pensar ir ao de Lisboa para…pronto, para testar outros públicos, digamos. Embora não

seja um objectivo do concurso em si mas também ter uma opinião crítica daquilo que

fazemos, outras formas de estar, outros impactos. Quase como…eu sei lá, espalhar a

palavra por aí, quase como os profetas.

Já ouviste falar de Slams de outros países?

Já ouvi falar mas não conheço praticamente nenhum.

5. Participas no slam X em que vertentes: organização, slammer, público, júri?

Até agora temos sido participantes, como slammers. Basicamente é isso. Até agora, a

todos os que fomos. Nunca fomos fazer parte do júri.

6. Em que outros Poetry Slams já participaste? Como slammer, público, júri,...?

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No Slam do Porto, como slammer.

7. (se respondeu sim à pergunta anterior) Que semelhanças existem entre os Poetry

Slams em que já participaste? E diferenças?

Acima de tudo é a inexperiência dos organizadores, não é? Do Porto. Neste caso no

Porto. Notava-se a boa vontade e ao menos ainda se faz alguma coisa mas notava-se

uma certa inexperiência. Também é normal, era a 2ª vez que estavam a apresentar, num

sítio com bastante público no geral. Não só pelo slam né? a inexperiência deles.

Estavam muito atrapalhados, muito à nora. O sistema de concurso em si. Por exemplo,

aqui em Coimbra é cada poema uma eliminatória, não é? Eles lá fizeram, pelo menos

naquela edição, cada slammer dizia 2 poemas e depois fazia-se a média e passava. Nem

tinham, se não me engano, a questão de anular a pontuação mais alta e a mais baixa.

Acho que não tinham. Era mesmo…contava tudo. Naquele dia foi um bocado

assustador a escolha do júri. Por exemplo, aqui faz-se “quem é que quer ser júri?”. Tudo

bem que já se possa saber que não há ninguém que queira à partida. Mas eles lá foi “tu

vais ser júri. Tu vais ser júri”, assim uma coisa mesmo muito “wow, assim tão rápido?”. E

pronto, outras diferenças. O próprio ambiente em si. Sei lá, estamos a falar do Maus

Hábitos, um sítio hippie-freak-chique no Porto, com cerveja a 2 euros. Olha, outra

diferença, eles ofereciam 2 cervejas aos participantes. Lá no Maus Hábitos. Não sei se

era a organização, se era do bolso deles ou do Café em si. Um ambiente muito…um

bocado selecto, eu achei. Uma coisa muito…também tinha…tinha havido a

apresentação de um livro de poesia. Assustou-me isso. Cheguei lá e estava a ouvir a

apresentação do livro e o Genesis ao mesmo tempo. E a poesia. Assustou-me um

bocado. E pronto, só por aí dá para ver o tipo de público que lá estava, né? uma coisa

cheia de estilo, muito…embora não seja, não fosse da rima. Tinha lá um concorrente ou

outro que era da rima, vá. Mas…estava uma coisa assim muito…muito estranha, um

ambiente muito estranho. Também, agora olhando para trás, acho que é normal

porque…é uma coisa que as pessoas estão a ter contacto agora lá, ou seja, não há uma

ideia formada. As pessoas também estão lá assim, tentam fazer a sua poesia. Acima de

tudo é isso que se pretende, não é? Mas pronto, tava ali um bocado…notava-se que as

pessoas ainda não estarem ambientadas com aquela situação.

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Semelhanças…semelhanças…que eu assim tenha visto…é que, na verdade, não houve

assim muitas semelhanças. Mesmo. Não houve muitas semelhanças. Eu pelo menos

achei. Para não falar no sistema da cotação, pronto. O júri votava né? mas não notei

assim muitas, muitas semelhanças. Sei lá. Eles, por exemplo, tinham um DJ lá. Tava lá a

pôr música, não-sei-quê. Um projector com as cotações e não-sei-quê. Uma cena

muito…muito forma entre aspas. Outras semelhanças…não…não notei. Por exemplo,

não havia mulheres lá. Não havia mulheres a…não havia mulheres como slammers.

Éramos 8 concorrente e todos homens. Não havia nenhuma equipa também. Não havia

nenhuma equipa, era tudo individual. Acima de tudo, eram pessoas jovens. Eram. Havia

um estrangeiro, também, como na última vez aqui em Coimbra. De resto, não havia

assim…não achei muitas semelhanças. E depois foi muito cansativo porque notava-se

perfeitamente que eles eram 2 amigos e que…eu acho que eles têm um blog ou um

Facebook qualquer de poesia deles. Ou um deles está mais assim virado para essas

coisas de…videoarte e poesia ao mesmo tempo. E eles apresentavam sempre um

poema, assim uma coisa mesmo…entre cada série. Apresentavam um poema deles ou

um poema que eles queriam dizer de não-sei-quem. Eh pa, estavam ali como que

digamos, a vender o peixe deles quase. É um bocado essa a impressão que eu tive. Ao

mesmo tempo, numa de organização mas de autopromoção entre aspas. E semelhanças

é mesmo isso. Não noto, pronto, a não ser a questão do público, mais ou menos

descontraído ao mesmo tempo que era formal, quando se trata de poesia. Neste

sistema de concurso que um vai para a frente, outro vem, não-sei-quê. Estava ali uma

coisa mais ou menos descontraída. Não é aqueles saraus de poesia terríveis. Mas

estava…e não vi muitas mais semelhanças, na verdade.

8. Como descreverias o poetry slam?

Acima de tudo é um espaço. É um espaço onde as pessoas, individual ou

colectivamente, têm oportunidade de dizer a sua poesia. Em que, dependendo da

vontade de cada um, podem levar aquilo muito a sério no sistema de competição

apenas por divertimento. Eu acho que, acima de tudo, deve ser um divertimento.

Defendo que as pessoas deviam ir para o Slam para se divertirem, não é? Para

conhecermos outras formas. E que, pronto, é um ambiente descontraído, as pessoas

estão ali na boa, não sentem aquela pressão de “vou fazer disto a minha vida depois de

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ganhar isto. Depois de participar nisto vou ter atrás de mim 30 mil editoras a querer-me

pôr não-sei-aonde” sei lá…acho que não, não é por aí. Basicamente é isso. É um espaço

onde as pessoas podem, podem espalhar a palavra digamos. E mostrar-se um bocado

aos outros e contribuir para…para uma continuidade oral, pelo menos, da poesia. Que é

uma coisa que cada vez menos existe, a tradição oral poética. Cada vez mais isso é um

mito, tá uma coisa muito escondida, só para os grande senhores que tÊm voz grande e

que sabem declamar o Camões e não-sei-quê. Acima de tudo é isso. É é uma forma de

fazer chegar, através de sítios usuais, diários, uma forma…e assim sim, os slams ganham

muito, que é: não vão para as salas de chá nem para os salões nobres. Acho que é esse o

caminho que a poesia deve tomar enquanto iniciativa cultural. É mesmo isso, é

aproveitar os sítios mais caseiros e triviais, digamos, para fazer as pessoas, os que lá vão

de propósito ou desprevenidos, para fazer pensar um bocado e desenvolver um espírito

crítico sobre a poesia. Acho que é mais ou menos isso que eu diria. E quanto mais não

seja, a possibilidade de ganhar uma garrafa qualquer. Quanto mais não seja, por isso. À

partida é sempre…essa foi outra diferença. Porque, por exemplo, no Porto o prémio, o

1º lugar ganhou os livros e o 2º lugar ganhou a garrafa. Ou seja, compensa mais ficar em

2º lugar do que em 1º. Eu dei uma vista de olhos nos livros, aquilo era terrível. “não vinha

para aqui de maneira nenhuma tentar ganhar isto”. E o próprio vencedor disse “”se eu

sabia, queria ficar em 2º”. O vinho do Porto era realmente bom. Sei lá, aquela poesia

provavelmente encontravas no blog qualquer. Claro que tás a alimentar o vício que é

não comprar poesia, é uma verdade. Tou a ter uma posição um bocado contraditória

mas…mas pronto, naquele caso os livros não valiam muito a pena e era preferível

mesmo o vinho do Porto.

Organizador/a

1. Podes fazer uma caracterização breve do Poetry Slam X (data de início, entidade

organizadora, local de realização, frequência)

2. Como foi o processo de criação deste Poetry Slam?

3. Podes falar-me de como correu o 1º poetry slam que organizaste?

4. Que situações e/ou circunstâncias foram obstáculos/dificuldades na criação do

Poetry Slam?

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5. E que situações e/ou circunstâncias foram facilitadoras?

6. Existiram/existem apoios e/ou parcerias na criação e organização periódica do

Poetry Slam?

7. O Poetry Slam X costuma ter convidados? De que áreas artísticas?

8. É importante para vocês, organizadores, ter a participação de pessoas de outras

áreas artísticas? Porquê?

9. Que tipo de reacções e comentários tens tido da comunidade?

10. Como descreves a relação entre os Poetry Slams de Portugal? (slammers,

organizadores, público)?

11. Como vês o futuro do Poetry Slam X? E o futuro do Poetry Slam em Portugal?

Slammer

1. Já leste ou fizeste performances com a tua poesia, o teu trabalho noutros eventos

para além do Poetry Slam?

Em casa com o Carapau. Quando não podemos ir…aliás, sempre que nós não

podemos ir ao Poetry Slam tentamos fazer uns comunicados, digamos. Uns

comunicados “à imprensa”. À partida fazemos isso. Lá está, tendo em vista

sempre…

E no passado?

Não, no passado não. Não fazia…

E na Oficina de Poesia?

Mas na própria Oficina de Poesia nunca tive nenhuma apresentação, por exemplo.

Ou pelo menos eu nunca fui. Nunca fui a nenhuma apresentação. Tivemos lá,

estivemos a fazer os exercícios e não-sei-quê, não-sei-que-mais mas

não…performances e assim não.

2. O que significa ser slammer, para ti? Como descreves a participação enquanto

slammer no Poetry Slam?

Muito positiva. Muito positiva. É um sítio onde me sinto bem, é um…pelo menos

são umas horas em que me sinto particularmente bem. Ainda para mais aqui em

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Coimbra ao Sábado está tudo morto. É uma forma de dar uma outra cor ao fim de

semana. Também porque o grosso das pessoas são nossas conhecidas, ou seja,

estamos ali à vontade mesmo, na boa. Não vamos para aquela de concurso, não

vamos para aí, vamos só numa de…se calhar ao fim de alguns prémios, talvez. “se

calhar este poderá dar para ganhar”. Mas não é esse o objectivo né? é mesmo

aquela coisa crítica. E…como é que eu descrevo? Gosto. Gosto bastante. Também

porque acho que há uma grande diferença entre…uam grande diferença não em

termos qualitativos, nem quero pegar por aí. Não pego por aí. Proque acho que pelo

menos nós conseguimos…também quanto mais não seja somos só nós em equipa

não é? Uma equipa, que é uma coisa…só por aí é diferente. É uma coisa distinta.

Mas pela forma…a nossa poesia distingue-se um bocado dos outros, na forma de

estar distingue-se. E por aí também me sinto…sentimo-nos acho eu, o Carapau para

acompanhar é porque também deve sentir.

3. O que é a escrita do Poetry Slam? Como é escrever para participar num Poetry

Slam?

4. Como é que vocês escolhem os textos que vais usar num slam?

Isso é muito engraçado. Sabes que nós já pensámos fazer um texto com os

estatutos da nossa equipa. E geralmente até agora foi sempre assim. Juntamo-nos

tipo sábado, sábado à tarde e quanto mais perto da hora mais as coisas saem. “olha,

eh pá, o que é que vamos fazer?”. Por exemplo, na 1ª edição em que éramos a

Equipa, tínhamos a Carol, a 3 é um bocado mais complicado porque, sei lá, não

temos um…não tínhamos o hábito de poesia experimental, se é que assim

podemos chamar vá. Sei lá. Partimos do cadáver esquisito, por exemplo. Tentar sair

dali, tentar juntar alguma coisa. A partir daí, dessa experiência também, não

desenvolvendo a técnica da interlocução digamos, nós não desenvolvemos

praticamente. Lá está, se praticássemos mais durante o mês, talvez poderíamos ter

uma facilidade maior e um outro tipo já de apresentação. Mas normalmente é isso.

“eh pá olha, quem é que vamos…em quem é que vamos dar na cabeça agora?”. É

àquele, é àquela coisa ou à Igreja ou ao político. E pronto, e depois tentamos

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arranjar uma forma…por exemplo, “eh pá, eu pensei numa coisa porreira. Vamos

fazer só com a 1ª sílaba e tentar fazer uma brincadeira”. Fazemos um conjunto de

palavras, digamos. Depois, “olha, o que é que tu queres dizer?” “dizes isto. Quem é

que diz isto, quem é que diz aquilo?”. Uma coisa muito…e depois ensaiamos,

geralmente. Como por exemplo…ensaiámos no próprio Slam já. Já aconteceu. “eh

pá, esta merda ainda não acabou. Temos que ir jantar.”. eu vou jantar, depois

encontramo-nos Às 22h e decidimos. Já aconteceu várias vezes ensaiarmos no

próprio Pop Fresh, por exemplo. Já aconteceu isso várias vezes, assim mesmo

naquela. Oh pá, não levamos aquilo a sério do ponto de vista do concurso. Isso não

interessa. O que interessa mesmo é fazer as pessoas pensar e fazer pensar a nossa

forma de estar com a poesia e a nossa relação com a poesia, de que modo é que a

queremos transmitir. Acho que é basicamente isso. Há coisas que saem mais giras

do que outras. Também funciona muito o acaso, o que também é engraçado. Por

exemplo, aquele vídeo “A Equi queimou-se”…pá aquilo foi uma cena incrível. Foi de

um exame electroencefalográfico meu. Nós fizemos e pensámos “olha, como é que

vamos dizer isto?” e começámos os 2 a falar ao mesmo tempo, assim naquela

tipo…de repente, “isso tá fixe. Isso encaixa fixe”…encontrámos ali uma forma…e

de repente “olha, podíamos fazer um vídeo como da outra vez”. “vamos fazer”,

“ok”. Pusemos a câmara a gravar e ficámos calados à frente. E depois o que é que

aconteceu? As coisas coincidiam. O que foi brutal. Incrível. Nós primeiro fizemos o

texto, ou ao contrário. Mas acho que foi primeiro o texto. Gravámos o texto. Depois

gravámos o vídeo e juntámos. E dava uma diferença de 10 segundos no final. A

imagem tinha mais 10 segundos que a gravação, o que só por si é brutal e depois há

muitas partes no vídeo que coincidiam e nós a pensar “parece que foi feito mesmo

de propósito”. É mesmo o acaso. Fazemos uma coisa, gostamos daquilo, oh pá tá

bom. Não queremos ganhar o Prémio Camões com a poesia que fazemos nem eu

quero ganhar o Prémio Camões no geral. Apesar de serem 100 mil euros não quero

ganhar. Mas…pronto. É mesmo isso. É uma coisa muito…e acho que nesse sentido

contribui muito a experiência poética do Carapau, em termos de leitura. É uma

pessoa muito mais velha que conhece muito mais poesia do que eu, muito mais e

uma poesia subversiva só por si, muito subversiva. E então pronto, ele diz “uma vez

vi isto. Vamos tentar fazer? Vamos tentar adaptar?” ou “podíamos fazer uma coisa”,

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“de repente saiu-me aqui uma coisa”. Digamos que…não vou…vou um bocado

atrás dele…como disse é um bocado arbitrário, é uma coisa que surge por acaso. Eu

acho que é normal. Ele tem mais experiência, tem mais…acaba por…e eu

concordando com as ideias dele não vejo qualquer entrave. Não é que é só ele que

faz a poesia, de maneira nenhuma. Mas quase sempre parte dele o 1º passo. Parte

sempre dele “oh pá vamos começar a fazer isto”. A gente faz. Não é assim

muito…e pronto, é aquilo, crítica, crítica e fazer as pessoas pensar através de uma

outra forma, sei lá, que não a normal de estarem ali 2 pessoas de mãos cruzadas a

dizer poesia, um fala, o outro fala. Não. Vamos dizendo, vamos (inaudível). logo que

a gente se divirta a fazer aquilo e que tenha algum prazer e acho que é uma boa

forma de passar a mensagem que queremos. Não nos preocupamos muito. É

mesmo só…na verdade nunca falei disto com o Carapau. Nunca falei disto com o

Carapau, que poesia é que nós fazemos, o que é que vamos fazer. Geralmente até

gozamos muito. “eh pá cuidado que já ganhámos o último. Temos que fazer uma

cena. E agora vai tar lá uma editora”, gozamos muito com isso. Mas é engraçado,

nunca falámos mesmo. Não tenho ideia de alguma conversa com o Carapau sobre

que poesia é que queremos fazer. Porque acho que é um fruto do relacionamento

que tenho extra-poesia com ele. Sei lá, damo-nos bem, partilhamos muitos espaços,

muitas opiniões. Então, por naturalidade as coisas, as coisas vão surgindo e vamos

estando em acordo e vamos de encontro um ao outro.

Podes dizer que a forma como vocês falam de alguns temas enquanto discussão se

transpõe um bocadinho para outro formato?

Sim, sim.

Na poesia falam daquilo que falam também quando estão a discutir a actualidade?

Sim, sim, sim. é mesmo resultado disso. Resultado de conversas que a gente tem e

que vai tendo, do mundo que está À nossa volta. E acho que temos formas de estar

na vida muito parecidas, no geral. Embora sejamos, ainda assim, pessoas muito

diferentes, temos uma forma de estar bastante parecida e idêntica. E depois acaba

por surgir com muita originalidade.

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5. Preparas-te, de alguma forma, para a tua participação no Poetry Slam?

6. E como te preparas?

7. Consideras-te poeta? Porquê?

8. (para slammers que não são organizadores) Como é que descreverias o teu

envolvimento, a tua relação com o Poetry Slam?

Isso é um bocado…(risos). Então como é que vejo isso? Acho engraçado o próprio

sistema, a ligação entre o concurso, digamos, que não é, nunca chega a ser um

concurso a sério, não é? Hmmm…

Por exemplo, há pouco dizias que uma vez por mês te juntas com o Nuno para

fazerem alguma coisa para o slam.

Exacto, olha.

Como é que te vês dentro do Poetry Slam?

Essencialmente por um trabalho em equipa. Essencialmente com o Carapau. Damo-

nos bem, relativamente bem. E é giro porque também é a 1ª vez ou foi a partir daí

que comecei a criar poesia em grupo, em conjunto. Pronto, e é engraçado…o

envolvimento…através do Nuno, né? através da Equi, é engraçado e acho que é um

envolvimento um bocado crítico para um Poetry Slam. É uma oportunidade digamos

de fazer outro tipo de poesia.

Público

1.0 (para organizadores e slammers) Também participas no Poetry Slam como parte do

público? Sim, na verdade qualquer slammer em si é sempre um público, está sempre atento ao que

os outros estão a dizer não é? Acho que sim. desse ponto de vista também me considero público porque também estou interessado em ouvir outras coisas. Não estou preocupado “eh pá, vamos arrumar agora e vamos embora”. Não. Sei lá. Estamos lá também para conhecer outras, outras poesias e desenvolver o nosso espírito crítico em relação à poesia. Também parte muito daí – aquilo que nós não queremos fazer, aquilo que nós não queremos transmitir ou não queremos, sei lá, pronto. É certo que somos anti-poesia tradicional, da quadra. Isso é ponto assente. Nem pensar. Mas pronto. Nesse ponto de vista sou público, sim.

1. (se não é slammer) Como soubeste da existência do Poetry Slam?

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2. Por que escolhes o poetry slam em relação a outros eventos ou outras actividades

que poderias fazer à mesma hora e dia do slam?

Basicamente porque é poesia, na verdade. E…sendo a poesia uma coisa com a qual

me identifico e trabalho em função dela e em prol dela, pelas coisas que tenho

vindo a organizar, mas não só por aí, por me identificar bastante com a poesia e por

defender que se deve contribuir para a continuidade de oportunidades como essas.

De a gente poder, ainda assim, ter espaços de…sei lá…para bares e estar em

esplanadas tenho a semana inteira e o mês inteiro para ir. Não custa nada. É uma

coisa que…até faz bem, não é? Tás ali, na boa. É um programa diferente. Embora

nos conheçamos todos e sejamos todos amigos, é sempre um programa diferente e

um programa pelo qual nós, né?, queremos que continue sempre, que é para haver

sempre a contra-cultura também. Um gajo tem que insistir. Porque senão, então,

isto torna-se terrível. Ainda para mais numa cidade tão reacionária como Coimbra,

tchiii.

3. (só para público) como definirias a tua participação no Poetry Slam?

4. Pensas participar no slam numa das outras vertentes: organizando, competindo ou

fazendo parte do júri? Se sim, porquê?

Porque não? Porque não? E já pensei várias vezes em Santo Tirso inclusive. Via-me

facilmente a…organizar. Dependendo do tempo que tenha ou não. Já pensei nisso.

Acho que é uma boa forma de abordar a poesia em si. Apesar de toda aquela coisa

do tempo e não-sei-quê. Pronto, fora isso. Mesmo nós nunca respeitamos isso. É

raro, por exemplo, termos um cronómetro. Escrevemos e sabemos mais ou menos

que vai dar para ali. Se der…também porque o nosso tipo de poesia é muito

objectivo e não convém estar ali a perder muito tempo. Nunca é perder tempo mas

pronto. Não estamos ali com muitos rodeios. Preferimos…prefiro… acho que

posso falar pelo Nuno também, preferimos muita objectividade, muita crítica. Acho

que…é mais ou menos isso.

5. Já fizeste parte do júri de um slam?

Não.

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Júri

1. Como decides a pontuação a dar?

2. Quais são as tuas principais dificuldades?

Relação com o Poetry Slam

O Poetry Slam tem, geralmente, uma parte de competição e uma parte de open mic. A

primeira tem algumas regras e uma certa ordem. A segunda pressupõe uma participação

com menos limites (tempo, adereços) e não tem a atribuição de pontuação.

1. O que pensas sobre o formato de competição?

Do formato de competição? Já pensei algumas vezes sobre isso. Para falar verdade,

já pensei algumas vezes sobre isso. Até que ponto é que o tal sistema de concurso

pode afastar ou não as pessoas, pode levar ou não as pessoas a querer participar. E

acho que a conclusão a que eu cheguei é que, feliz ou infelizmente, essa

competitividade, embora não tão estática no sentido de competitividade e de

competição, é uma forma das pessoas criarem mais, das pessoas…pronto, pode

levar…no nosso caso não mas pode levar as pessoas a desenvolver mais, a pensar

“eh pá, olha agora para o 2º vou ter que fazer um mega poema porque quero

passar, quero ir à final”. Acho que acima de tudo pode ser um motivo para as

pessoas trabalharem mais. E embora sendo competição e embora tendo a garrafa

como prémio o vencedor, também só por si pode levar, pode arrastar as pessoas a

fazer poesia. Depende de como cada um aborda a competição e os frutos que cada

um quer tirar daquilo né? mas sim. eu penso “estamos ali no poetry slam, a gente

conhece-se praticamente toda, é como se estivéssemos no café da aldeia. Olha, tem

concurso. Que tenha. Que tenha. É exactamente a mesma coisa. Até porque há

open mic”. Se nós não quisermos…se não passarmos ou não-sei-quê, nada nos

impede de continuar a…nada nos impede de continuarmos a dizer a nossa poesia.

Não é por falta de liberdade que deixamos de…agora o concurso também é um

sistema engraçado. Lá está, é o outro lado engraçado do concurso, que são as

bocas, que é muito fixe. “ei, não mereces isso”, “ei, ele é teu amigo”, “é teu

namorado”. Pronto. Até porque acaba por criar um ambiente assim mais

descontraído. Claro, há pessoas que ficam mais chateadas do que outras, né?

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mas…há pessoas que ficam mais chateadas mas no geral até cria assim um

ambiente mesmo…já cheguei a fazer um paralelismo, é quase como se

estivéssemos a ver a bola, “eh pá, é falta”, “não é nada”, “ei, não digas isso”. E os

silêncios e as coisas…acho que sim. acho que faz falta. Ainda para mais, sendo

conctracultura, digamos, ainda para mais com isso é uma forma de incentivar e de

chamar mais pessoas e…só a partir do momento em que…eu já pensei que o ideal

era não haver competição mas para chegarmos a esse ponto temos que criar uma

base, tem que se criar uma base de participantes e uma regularidade de

participantes e depois as pessoas dizem “olha, já não é preciso. Vamo-nos juntar”. E

se calhar até já não é ao 1º sábado e já é tipo, de repente por mensagem “olha,

vamo-nos juntar ali, vamos fazer poesia”, por exemplo. Mas até lá chegar é preciso

criar uma regularidade e um sistema e esquematizar a coisa mais ou menos bem e

criar nas pessoas um hábito, que é uma coisa, ainda para mais com a poesia não há.

E também por isso, que é contracultura, não há esse hábito, não há o hábito da

poesia de café, não há o hábito de nada disso. Pronto, tem que ser. Acho que é,

acho que é quase inevitável contornar isso. Agora lá está, eu tou a dizer isto do

ponto de vista aqui de Coimbra. É aquele que eu conheço mais a sério. Fui aquela

vez ao Porto mas pronto. Mas se calhar se conhecesse outros slams já teria um

outro ponto de vista, né? se calhar…eh pá, somos 70 aqui, vamos ter que…não vai

toda a gente dizer agora “cada um tem 20 min para dizer um poema”, né? se calhar,

há sítios em que a competição faz mesmo falta para normalizar…é uma forma de

teres um padrão, cada um tem os seus 3 min. É uma forma também de…não vão

todos dizer um poema ao mesmo tempo. Era muito bonito, se calhar, mas tem que

haver uma ordem ainda assim. Embora não seja muito a favor da ordem, há coisas

que tem que haver a sua ordem. E se calhar aí faz todo o sentido porque,

independentemente das formas que as pessoas possam abordar em competição, é

uma forma de haver uma organização lógica dos inscritos. Digo eu.

Achas que isso também permite a quem está como público de poder ususfruir

melhor, ou mais, tendo em conta que está estruturado?

Pois. Poderá, poderá perfeitamente. Na verdade, toda…todas as competições…ou

toda a actividade competitiva tem fases, não é? Então também é uma forma de o

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próprio público se interessar, “eh pá, não vou à fase de grupos. Só vou à meia final

ou à final porque ali é que deve estar mesmo a cena”. E se calhar uns dizem “eh pá,

olha, não vou à final ou não-sei-quê. Vou só aqui a estes porque se calhar ouço mais

poesia. Não está tão…” acho que sim. poderá também criar no público a…

1.1. A utilização deste formato no poetry slam faz-te repensar o conceito de

competição?

2. E o que achas da parte de open mic, microfone aberto?

3. O que pensas do papel, da função do júri?

É um papel engraçado. É um papel…interessante, na verdade. Porque, pronto.

Dependendo sempre do júri que calha. Acho que a posição do júri, tratando-se de uma

posição que as pessoas não estão habituadas nem acostumadas ao que é poesia ou À

poesia contracorrente ou À poesia não-comum…pronto, é um confronto do pessoal, da

educação que também é outro problema – a educação poética que todos nós temos, que é

terrível – é um confronto e depois vai muito no gosto ou não gosto, apenas. Acho

que…pelos públicos…pelos júris que temos tido acho que não há muito aquele senso,

aquele senso do poeticamente aceitável, do poeticamente bom mas há muito o “gosto ou

não gosto”, “identifico-me ou não me identifico”.

Por que é que achas isso?

Acho que, essencialmente, a culpa é da Educação poética que tivemos que é muito

castradora, na verdade. Então, só por si, limita as pessoas a horizontes poéticos

muito…limita mesmo. Tou um bocado perdido nas ideias. Mas limita muito as pessoas

de…sei lá, por exemplo, eu noto perfeitamente, já cheguei a notar isso em alguns poemas

que tivemos, a questão do engraçado ou do não-engraçado. Num critério poético, à partida

não entra, é engraçado ou não é engraçado…à partida vai-se pensar “o que é que estes

gajos tentaram dizer?”, “como é que eles transmitiram a mensagem?”, “transmitiram

bem?”, “o que é que poderiam ter feito para transmitir melhor?”. Acho que, se calhar, os

critérios seriam outros. Aliás, nota-se perfeitamente isso no voluntariado do público. É

quase zero.

Por que é que achas que é assim?

Porque as pessoas realmente não estão habituadas a ouvir poesia. Acho

essencialmente isso. Porque as pessoas não estão habituadas a ouvir poesia e têm

medo de avaliar. E também porque o público não é assim tão grande quanto isso

que permita estender-se além dos amigos e dos conhecidos. Que também é muito

isso. O júri tem-se baseado nos conhecidos que vão por arrasto dos participantes.

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Que á partida pode criar uma certa tendência, pontual ou não, não discuto isso.

Mas…essencialmente é isso. O à vontade de estar a ajuizar alguma coisa também é

uma coisa muito comum. As pessoas darem algum juízo de valor sobre as outras. As

pessoas têm medo do que o outro possa pensar “ihh, eu vou-lhe dar 6 pontos. Que

coisa terrível” “vou estar ali mesmo À frente de todos a olhar para eles”. Não sei.

Na verdade nunca perguntei a nenhum júri por que é que ele foi júri.

4. Achas que deviam ser dados critérios prévios ao júri para a avaliação que fazem?

Não. Não. Acho que aí perderia muito a essência.

E achas que o júri devia ter algum tipo de formação na área da poesia?

Não vamos aqui pedir currículos, né?

Mas achas que seria positivo ou achas que não deve, de todo, ser assim?

Agora fizeste-me lembrar uma coisa do Porto. Eles fazem um poema piloto. Isso

para mim, eu acho que isso é terrível. Eu acho isso terrível. Acho isso terrível porque

é quase como virar-se para o júri e dizer “olha, este tipo de poesia, que pontuação é

que vocês vão dar a este tipo de poesia?”. Por muito que a boa vontade seja para

treinar e para as pessoas ensaiarem e não-sei-quê. Acho que acaba por limitar muito

os critérios do próprio júri. Porque o júri, quanto mais desprevenido for mais sincero

é porque mais reproduzirá os seus estereótipos e os seus preconceitos. Agora,

quando chegas lá e dizes, não é?. Por exemplo, suponhamos que há um concorrente

que chega e que está a pensar dizer um poema só com um A. Se o poema piloto for

o A e o júri votar tudo zero, o concorrente já não o vai dizer. Eu penso assim. À

partida vai limitar logo a participação de alguém porque sabe que aquele formato

deu aquela pontuação. Por muito que seja a organização, por muito que seja quem

seja, sabem que têm aquela, aquela pontuação. Agora critérios não, nem pensar. É

uma coisa que para mim…acho que é mesmo, é mesmo, acho que aí perderia o

carácter de livre arbítrio e passaria a ser uma coisa imposta. Já chega perfeitamente

o regulamento para os participantes e o resto, eh pá, “olha, têm até 10 e 2 casas

decimais”, chega perfeitamente. Ou seja, já que os participantes são livres, o júri

também deve ser livre e é interessante haver esse confronto. Para aqueles que

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levem a competição mais a sério. “olha, aquele ali vai-nos queimar”. Já sabes que

aquele ali não gostou nada. “o próximo vai ter que ser um bocado diferente”. Pode

acontecer isso. E nós conseguimos perceber isso através dos primeiros poemas que

se dizem – aquele não gosta, aquele já é mais assim, aquele já é mais assado, aquele

achou piada e não-sei-quê. É isso. Os critérios, não sou nada a favor disso.

5. Como é que é o público do poetry slam?

6. O que pensas sobre a condição de os textos terem que ser da autoria do slammer

para que possa participar na competição?

7. Na tua opinião, qual foi a razão para se criar um evento desta natureza, com estas

características?

8. Qual a tua opinião sobre os textos que são lidos, performados no poetry slam?

Pois…então? Se naquelas primeiras edições estava habituado àquela poesia mais,

mais ritmada, mais…disciplinada, digamos, mais, mais sonora do ponto de vista

rimático, acho que tem-se caminhado lá está, aqui em Coimbra, tem-se caminhado

muito…por exemplo, a própria Bárbara que tem, apresentou aquela coisa do Cage,

apareceu aquelas raparigas que também eram da Oficina. Também foi a 2ª equipa

que participou, não foi? Acho que tem havido uma alteração do ponto de vista dos

textos. Já há mais…não há tanto…até os próprios MC’s também. Acho que tem

havido uma maior abertura para fugir ao padrão normal.

9. Achas que há um tipo de texto, um tipo poesia do poetry slam, que tem mais a ver

com o poetry slam? (se sim) Podes descrever, dizer como é, esse tipo de texto?

Não. Não. Acho que, essencialmente, é uma convicção individual que as pessoas

têm. Também por as pessoas saberem que vão encontrar outros tipos de poesia,

também tÊm o à vontade de…e é bom que não haja esse padrão. É bom que não

haja esse padrão porque foi o medo que eu tive no Porto, que se criou, que foi estar

ali uma poesia muito tendencial para aquilo, muito…virada para aquele…para uma

poesia mais regular, mais bem comportada digamos. E, de resto, não há padrão.

Nós temos o nosso padrão, cada um tem o seu padrão., é lógico. Mas lá não há

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nenhum texto que seja padrão porque cada um sente-se à vontade de dizer coisas

completamente diferentes. Há pessoas muito distintas lá. Mesmo coisas, desde o

Valinhas àquela rapariga que apareceu na 1ª edição. Depois a Carolina também. Lá

está, são formatos completamente diferentes e acho que isso é que é a coisa mais

interessante e mais bonita do próprio slam. É as pessoas terem o à vontade de tar

ali, dizem a sua cena, quem gosta gosta, quem não gosta temos pena. As pessoas

divertem-se, acho eu. Há os que ficam zangados e não aparecem mais, não é? Mas ,

sei lá, acho que não há padrão. Não há padrão, não. Nem há um texto indicado

para…quanto muito as pessoas podem alterar a ordem dos textos em função da

ordem de participação e em função da eliminatória do júri. Quanto muito as pessoas

podem fazer isso. Agora no geral não.

10. O que gostas mais no Poetry Slam?

Poder trabalhar em equipa com o Carapau. Ter sido um motivo para trabalhar com o

Carapau. Trabalhar poesia com ele e criar um projecto poético os 2. Ter sido um

motivo para criarmos um projecto poético. Além disso, o que possa gostar? É o que

temos vindo a falar. O carácter descontraído, estarmos ali muito informalmente,

dizer poesia, sentirmo-nos bem, podermos fumar onde dizemos poesia, que é muito

bom (risos) e beber. E…acho que é isso.

11. O que gostas menos?

Pá, é da falta de participantes. Basicamente é isso. O que eu gosto menos é…se

calhar tinha criado uma expectativa na 1ª edição de que nunca iria haver slams, fora

épocas de exames ou épocas natalícias, em que não houvesse concurso, em que

não houvesse gente suficiente para a poesia. Pensei “ai e tal, aqui, fim de semana,

as pessoas…podem ter um pretexto para ficarem cá ao Sábado uma vez por mês”.

Mas basicamente é isso que eu não gosto. E, sei lá, agora ali no Base Tango mete-

me confusão pôr o cú no chão. É um bocado terrível. De resto é isso. O que é que eu

não gosto? Claro que se calhar é uma posição…tudo bem, à partida somos os que

menos temos a dizer sobre o que não gostamos porque temos tido…temos ganho

algumas edições mas…mas no geral não há nada que eu não goste, a não ser a falta

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de participantes e a falta de movimento social poético, digamos. É disso que eu não

gosto porque poderia estar melhor, poderia crescer.

12. Já falaste sobre o Poetry Slam com pessoas que não ouviram falar ou nunca

estiveram num? O que dizes?

“Olha, vou ao Slam Poetry”. Não vou dizer que vou a um concurso de poesia porque

não queria um hábito no ouvido das pessoas. É importante ter o nome. E tendo em

conta que é um movimento…é um movimento que passa Coimbra e que passa

muitas fronteiras, é importante dizer isso. E que me vou lá divertir com um colega

de equipa, vou espalhar a palavra, vamos espalhar a palavra, vamos brincar com as

palavras e que é um sítio descontraído onde as pessoas estão lá e conhece-se várias

poesias e que é um bom sítio para começar uma noite. Pronto.

Já falaste com pessoas que não sabiam o que era?

Sim, muitas.

E o que é que as pessoas te dizem?

“e o que é isso?” “eh pá, olha, havendo as pessoas suficientes as pessoas fazem um

concurso. tÊm 3 minutos, tem tempo limitado, têm eliminatórias, há um júri que

vem público (que é importante) e que vota. Um júri aleatório, ou mais ou menos

aleatório dependendo do voluntariado que existe e pronto, as pessoas estão ali,

dizem poesia e depois vai para um para o seu canto no final. E é mais um programa,

é mais uma coisa diferente num dia de uma pessoa”. Acho que basicamente é isto

que eu digo, geralmente. É o júri, é o tempo limitado, é isso. E que é num café,

pronto. E que é num café.

13. Na tua opinião, o que é que atrai as pessoas, público e slammers, no Poetry Slam?

14. Na tua opinião, para que serve o Poetry Slam?

15. No mundo da poesia, o Poetry Slam é um evento mainstream (de massas, popular)

ou underground, de contracultura (é uma sub-cultura com normas e valores que se

opõe àquilo que é mainstream, ex: Beat generation, hippies)?

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Sim (é de contracultura). Para já porque é um formato em que as pessoas não estão

habituadas a ver a poesia. É um formato diferente. Ainda para mais, é contracultura

em Portugal, ou aqui em Coimbra, porque é uma coisa que não é…que não está

presente logo à primeira na cabeça das pessoas. Aí, se já seria cultura e não

contracultura, por estar num plano inferior de conhecimento das pessoas ou de…é

contracultura, claro que sim. o próprio formato de concuros. Não há nenhum

concurso em 2 horas, assim de repente…em 2 horas com 3 minutos é. É uma coisa

completamente distinta do resto. Por esses saraus fora basta ver perfeitamente que

é uma contracorrente. É o único espaço que eu conheço, e embora não seja o mais

conhecedor do que por aí fora se faça, é um espaço onde vários tipos de poesia se

juntam. À partida, não há assim muitas oportunidades de se organizar um sarau

poético ou um encontro poético em que coisas tão diferentes se juntem com

linguagem tão livre e sem qualquer tipo de restrição. Até o próprio sistema de

inscrição, por exemplo. É uma coisa muito…não é leviana mas é uma coisa muito

soft. É assim mesmo muito tranquilo, muito…é contracultura para mim.

16. Achas que existe uma comunidade em torno do Poetry Slam em Portugal? Porquê?

17. Achas que há grupos/comunidades de diferentes tipos de poesia?

18. Identificas algum tipo de relação entre as pessoas dos Poetry Slams de Portugal?

Apercebes-te de circulação de pessoas entre slam´s? (excepto para organizadores)

19. (excepto para organizadores?) Achas que o Poetry Slam é influenciado por outras

áreas artísticas (excepto poesia, performance)? Como?

20. Baseando-te na tua experiência de frequentadora de eventos de poesia, podes

fazer uma comparação entre o poetry slam e outros eventos de poesia em que há

leituras e performances de poesia?

Então, como é que eu comparo? Acima de tudo, a forma como se aborda a poesia. O

facto de não haver, lá está, um padrão textual e performativo, embora havendo

limitação de não poder levar adereços. Faz com que várias formas poéticas se

encontrem…ou desencontrem. E…

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Comparativamente com outros eventos? Achas que isso não acontece noutros

eventos?

Pelo menos os que eu tenho conhecimento não. Porque geralmente quando há uma

organização poética, tem sempre um fim à vista. Ou é para fazer a abertura da

exposição ou é para dar os Parabéns aos Bombeiros Municipais ou…percebes? Ou

para o lançamento de uma revista ou de um jornal, é giro meter lá uns gajos a dizer

poesia porque a poesia é muito fixe. Acho que acima de tudo é isso. É diferente,

mesmo. Dá oportunidade, não é uma coisa imposta, muito arbitrária, muito flexível

e…pronto. Permite, com isso, que as pessoas vão lá e digam a sua cena. Acho que é

mais ou menos isso.

E a poesia do Poetry Slam comparando com a poesia na sua generalidade aqui em

Portugal?

Pois…é uma poesia que…tanto quanto o que tenho percebido é uma poesia…que

não é, do ponto de vista literário editável, digamos. Ou comprável, no sentido

de…porque não há esse hábito, porque não há esse hábito, precisamente. Sei lá, o

próprio caso…o vosso caso, aranhiças & elefantes, vocês vão lá dizer, que hábito é

que existe de poesia experimental aqui?, que hábito é que existe de comprar um cd

poético a não ser na FNAC, do Fernando Pessoa, do Cesário Verde? Não há esse

hábito. Ao mesmo tempo é mau, pronto, é por isso. E é por isso que não é

comprável, porque não há o hábito das pessoas estimularem esse tipo de coisas. E

nesse sentido, é uma poesia que se distingue da poesia comercializada. É uma

poesia que está um pouco à margem. E acima de tudo é uma posição em relação À

poesia de promoção, que é muito bom. Que é “oh pá, todos nós estamos fartos de

conhecer o autor X ou a autora Y mas não conhecemos o vizinho do lado, o que ele

diz”. “Todos nós vamo-nos juntar e pegar no livro de não-sei-quem e vamos dizer

poesia”. Não. É bom conhecer a pessoa que está ao nosso lado, que poesia é que tu

tens. É uma forma de incentivo e, acima de tudo, lá está, a promoção,

independentemente de que estilo seja, da poesia em si. E como não é uma poesia

muito comum faz com que…estimula à criação poética e acaba por fazer, obrigar as

pessoas a fazer uma poesia diferente. Como, à partida, os públicos são mais jovens,

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né?, estão alguns mais cansados dos formatos tradicionais, faz com que as pessoas

criem uma outra poesia. Acho que é isso.

Como é que comparas a poesia do Slam com a poesia que se estuda?

Não tem nada a ver (risos). Não tem nada a ver. pelo menos no geral, embora haja

nitidamente aqueles casos em que tu vês “olha, este ainda não se desprendeu da

poesia salmística da Bíblia” mas no geral não tem mesmo…pronto. A própria

questão da rima, o facto de…de não haver ali um rigor de júri ou isso faz com que as

pessoas tenham poesias completamente diferentes. Não sei. É uma boa pergunta. E

especialmente comparando a nossa poesia que nós fazemos e aquela que estamos

habituados a ouvir (inaudível). não há praticamente, não há muitas semelhanças.

Acho que não há mesmo…não há a cultura da contrapoesia ou da poesia…neste

momento estamos muito…e eu próprio tou muito virado para a poesia do ponto de

vista experimental. Acho que não há. Tenho a certeza que não há. Não há mesmo

essa…

Achas que a poesia de um slammer poderia ser estudada na Universidade?

Na verdade, isso é o que faz falta. Não propriamente em termos de um slammer ou

o que quer que seja mas no sentido de estudar poesia. Que é uma coisa que não se

faz. Estudam-se poetas. Já estão enterrados e maior parte deles não faz falta já. E

geralmente não se estuda poesia, reproduz-se poesia. Eu acho. Também por isso, há

uma falta de sensibilidade e uma…uma postura inculta muito grande. Também em

consequência disso. Claro que se poderia estudar, perfeitamente, como, sei lá. Da

mesma maneira que defendo que se devia estudar poesia feminina, que é uma coisa

que não se estuda por exemplo. As Novas Cartas Portuguesas, um dos livros mais

importantes da Literatura Portuguesa do séc. XX, é um assunto tabu. Mesmo na

própria Faculdade. É um assunto tabu, que não existe. Da mesma forma que

defendo que se deva estudar outras formas de poesia, defendo que se deva estudar

a poesia do slammer. Agora, claro que é a credibilidade, é a questão da

credibilidade. “será que ele tem credibilidade? Quem é esta pessoa? Vamo-nos pôr

agora a estudar a poesia que uma pessoa faz num guardanapo? Isso agora é

poesia?” sim, sim, é poesia. Isso é uma forma de desconstruir o próprio sentido de

Page 26: Relação com a arte, cultura, poesia - Repositório da ...repositorio.ul.pt/bitstream/10451/28007/4/EntrevistaNo1.pdf · Relação com a arte, cultura, poesia Antes de falarmos do

poesia, o espírito crítico da poesia. Eu defendo perfeitamente que se deva estudar,

claro que sim. no geral, é um princípio para criar um hábito poético diferente do que

existe hoje. Há muitas pessoas que estão presas às referências ponto. Estão presas

àquelas referenciazinhas, àqueles nomes e aparece-lhes um poema…por exemplo,

eu vejo muito isso em Literatura Africana. Há um poema qualquer de…aparece um

formato diferente, as pessoas não sabem interpretar. “isto é poesia? O que é isto?”

qualquer estudo de poesia que não seja a padrão e a que vem do Básico e da

Primária, é boa para se estudar porque faz as pessoas pensar no que é a poesia e

para que serve a poesia. Até que ponto a poesia nos faz questionar coisas e nos

levanta problemas.

21. (excepto para organizadores) Como vai ser o futuro do Poetry Slam em Portugal?

Gostarias de acrescentar alguma coisa?

Talvez uma maior…se houvesse uma maior divulgação. Não tou a dizer só no vosso

caso em concreto. Mas sei lá. Por exemplo, gostava de ver, como vocês tentaram

fazer, não sei se em Lisboa também é assim ou não, mas a questão de juntar os vídeos,

tentar juntar os vídeos e isso. Poderia pensar num formato Slam Poetry interarte. Estar

várias pessoas ali. Digamos que o slam seria um pretexto para as pessoas fazerem

alguma coisa para apresentar. Cruzar coisas. Acho que isso é muito importante. Apesar

de que, claro, já estamos a partir do princípio de que só a poesia não chega para

prender as pessoas. Mas acho que a poesia deve ser inclusiva e quanto mais estímulos

tiver…quanto mais não seja e uma actividade cultural. É uma actividade cultural…da

mesma forma que não gosto de ir a um concerto e só ouvir música. Gosto de ver o

cartaz que tenho à porta ou o que é que tenho na casa de banho escrito. Também

gostava de ver slams com…se calhar para isso, para criar um hábito poético digamos

que diferente, poderia passar pela televisão, pela RTP2. Eles há pouco tempo fizeram

aquela coisa, os 30 segundos de poesia. Sei lá, poderia perfeitamente fazer referência

ao poetry slam.