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Relatório RECREAÇÃO – 1º e 2º ano FORMAÇÃO COMPLEMENTAR 2º semestre/2019 Professora: Camila Martins Posso Professora Auxiliar: Maria Cristina da Silva Moreira Coordenadora: Giselle C. Gaudencio Vale Diretora Pedagógica: Maria Aparecida Lima Leme No início do semestre, retomei algumas leituras que compuseram minha trajetória formativa. Dentre as bibliografias revisitadas, estava o livro “A Paixão de Conhecer o Mundo 1 ”, autoria de Madalena Freire. O relato da autora sobre as práticas pedagógicas que desenvolvera com uma turma de Educação Infantil da Escola da Vila, no ano de 1981, convidou-me a reestruturar meu processo de planejamento. A preocupação em estar atenta aos interesses que as crianças demostram direta e indiretamente no brincar, ainda que já existisse, acentuou-se e dessa maneira, passei a compreender o planejamento como um ato que é eminente da turma, que ultrapassa, portanto, a figura do professor. Diante dessa perspectiva, as curiosidades surgidas no cotidiano escolar tornam- se fundamentais e, para que pudéssemos registrá-las, criamos um quadro de planejamento, no qual escrevíamos as atividades que queríamos fazer, as atividades que estávamos fazendo e as atividades que já havíamos feito. A elaboração do quadro funcionou de duas maneiras: partindo da minha percepção acerca do interesse da turma por algum assunto e por iniciativa direta das crianças. Em ambos os casos, as propostas de atividades eram apresentadas para a turma e, caso aceitas, registrávamos no quadro. O segundo ano estava trabalhando com linha pela manhã e notei que algumas crianças estavam muito interessadas em fazer trabalhos manuais com materiais desse tipo. Contei a elas que eu sabia fazer crochê e que poderia ensinar um ponto para fazermos pulseiras e colares. Uma parte da turma aceitou a proposta e ensinei-os o ponto básico de crochê enquanto o restante do grupo brincava no parque. O ponto básico foi aprendido com muita facilidade, de modo que houve uma grande produção de apetrechos; mantivemos essa atividade por algumas semanas, permitindo que toda a 1 FREIRE, Madalena. A Paixão de conhecer o mundo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.

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Relatório RECREAÇÃO – 1º e 2º ano FORMAÇÃO COMPLEMENTAR

2º semestre/2019

Professora: Camila Martins Posso Professora Auxiliar: Maria Cristina da Silva Moreira Coordenadora: Giselle C. Gaudencio Vale

Diretora Pedagógica: Maria Aparecida Lima Leme

No início do semestre, retomei algumas leituras que compuseram minha

trajetória formativa. Dentre as bibliografias revisitadas, estava o livro “A Paixão de

Conhecer o Mundo1”, autoria de Madalena Freire. O relato da autora sobre as práticas

pedagógicas que desenvolvera com uma turma de Educação Infantil da Escola da Vila,

no ano de 1981, convidou-me a reestruturar meu processo de planejamento. A

preocupação em estar atenta aos interesses que as crianças demostram direta e

indiretamente no brincar, ainda que já existisse, acentuou-se e dessa maneira, passei a

compreender o planejamento como um ato que é eminente da turma, que ultrapassa,

portanto, a figura do professor.

Diante dessa perspectiva, as curiosidades surgidas no cotidiano escolar tornam-

se fundamentais e, para que pudéssemos registrá-las, criamos um quadro de

planejamento, no qual escrevíamos as atividades que queríamos fazer, as atividades que

estávamos fazendo e as atividades que já havíamos feito. A elaboração do quadro

funcionou de duas maneiras: partindo da minha percepção acerca do interesse da turma

por algum assunto e por iniciativa direta das crianças. Em ambos os casos, as propostas

de atividades eram apresentadas para a turma e, caso aceitas, registrávamos no quadro.

O segundo ano estava trabalhando com linha pela manhã e notei que algumas

crianças estavam muito interessadas em fazer trabalhos manuais com materiais desse

tipo. Contei a elas que eu sabia fazer crochê e que poderia ensinar um ponto para

fazermos pulseiras e colares. Uma parte da turma aceitou a proposta e ensinei-os o

ponto básico de crochê enquanto o restante do grupo brincava no parque. O ponto

básico foi aprendido com muita facilidade, de modo que houve uma grande produção de

apetrechos; mantivemos essa atividade por algumas semanas, permitindo que toda a

1 FREIRE, Madalena. A Paixão de conhecer o mundo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.

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turma experimentasse o crochê. Notei, todavia, que o interesse cessara quando demos

início à aprendizagem de pontos mais complexos, assim, decidimos registrar o crochê

na coluna de atividades finalizadas do nosso quadro de planejamento.

Durante o horário de parque, algumas crianças começaram a brincar com cones

que haviam sido esquecidos, olhando-se por meio deles. Perguntei se eu também podia

ver como era o parque visto através dos cones e eles deixaram; percebi que a turma

poderia se interessar por olhar a escola de um jeito diferente e até registrar esse novo

olhar. Essas crianças aceitaram propor para a turma fazer a atividade de olhar a escola

usando os cones e depois, com a minha ajuda, tirar foto das visões que lhes chamaram

mais atenção. A turma aceitou a proposta e fizemos a atividade. O resultado nos

instigou a pesquisar sobre fotografia e sobre como fabricar câmeras fotográficas. Ao

longo do semestre, todavia, o surgimento de novas curiosidades se sobrepôs a esse

projeto, de modo que não conseguimos colocar em prática todas as nossas ideias.

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Durante todo o semestre, as crianças trouxeram demandas de realizarmos

diferentes brincadeiras. Estas passavam pelo mesmo processo de serem propostas para

turma e, caso aceitas, serem registradas no quadro de planejamento. As propostas foram

diversas: banho de esguicho, queimada, brincar de cozinhar com areia, amarelinha,

combate de beyblade, pular corda, dentre muitas outras. Observando o desenvolvimento

da turma, foi possível constatar que o ato de propor as brincadeiras não só para mim,

mas para toda a turma, permitiu que as crianças compreendessem a atuação ativa que

detinham sob o nosso processo de planejamento. Tal fato evidencia-se na colocação “-

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mas é para ser atividade com a turma toda” que, não raro, acompanhava as propostas de

brincadeiras.

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No semestre passado havíamos trabalhado a temática Sentimentos e Sensações

por meio da discussão da série “Um Menino Muito Maluquinho”. Observando a

maneira como ocorrera a atividade, avaliei-a como um bom modo de despertar diálogos

acerca de sentimentos e como acolhe-los. Também no semestre anterior, foi possível

perceber o interesse da turma pelo desenho animado “Irmão do Jorel”, produção

nacional de autoria de Juliano Enrico. Conhecendo a animação, percebi a possibilidade

de ser realizado um novo cine debate. Diante da proposta, a turma dividiu-se entre

aqueles que estavam animados e aqueles que estavam receosos; ainda assim a atividade

foi aceita. Os episódios assistidos traziam majoritariamente a contraposição entre medo

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e coragem, de modo que pudemos discutir e refletir com maior profundidade acerca do

sentimento de medo e as possíveis formas de enfrentá-lo.

Observando os momentos de parque, percebi que uma parte da turma estava

vivenciando a brincadeira de produzir um filme. Essa brincadeira teve uma longa

duração, de modo que a vi como uma possibilidade de proposta de atividade. Propus

que fizéssemos o seguinte jogo teatral: a turma seria dividida em dois grupos e a cada

grupo eu falaria um local onde a cena deveria ocorrer, os grupos teriam tempo para criar

a cena e ensaiá-la; depois apresentariam uns aos outros. Assim, a brincadeira consistia

em o grupo que estivesse como plateia descobrir qual fora o local sugerido ao grupo que

estava apresentando. Essa atividade manteve-se no nosso cotidiano com uma

periodicidade, permitindo que ambos os grupos, que se dividissem naturalmente em

primeiro e segundo ano, e, se aprimorassem a prática, guardadas as devidas proporções,

de criação cênica. Esse desenvolvimento ficou evidente nas apresentações do primeiro

ano. No início, o grupo compreendia a cena como uma mera brincadeira no parque, com

o desenrolar da atividade, perceberam a importância de delimitar os personagens e criar

um enredo que tivesse uma sequência de começo, meio e fim.

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A ideia de criarmos um museu de insetos surgiu durante o horário de lanche,

quando encontramos uma borboleta embaixo da mesa de madeira. As crianças se

mostraram muito interessadas na borboleta, dessa maneira, enxerguei esse momento

como uma oportunidade de darmos início a um novo projeto. Naquele mesmo dia

discutimos o que poderíamos fazer com o inseto. Surgiram algumas ideias: permitir que

todos o levassem para casa, criar um laboratório nosso ou construir um museu.

Conversando, percebemos que a possiblidade que mais nos intrigara, fora a do museu, e

a partir daí demos início ao projeto. Em princípio, a turma concentrou-se em selecionar

insetos encontrados na escola, mas não demorou para que começassem a encontrar

bichos interessantes em suas casas, de modo que passaram a trazê-los também. O

procurar por insetos despertou igualmente a curiosidade para observar flores e plantas

que se destacassem por algum motivo. Dessa forma, demos início ao museu de plantas,

cujo funcionamento era análogo ao funcionamento do museu de animais.

A organização dos museus acontecia espontaneamente, sempre que achávamos

bichos ou plantas interessantes. Nesses momentos, sentávamos com a nossa cartolina e

nomeávamos o inseto, colando-o no museu juntamente com um registro de como fora

encontrado. Ao se tratar de plantas, registrávamos a data em que fora encontrada, com o

objetivo de tentarmos perceber se a mesma planta ou flor eram encontradas em

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diferentes períodos. Esse processo sempre emanara do entusiasmo das crianças, de

modo que seu resultado caótico - marcado pelas mãos sujas de areia, pelo erro

ortográfico logo corrigido e pelas diversas direções nas quais os escritos foram

registrados - representaram com precisão a vivacidade e espontaneidade que

caracterizam o olhar curioso da turma.

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Uma criança pegou um livro na biblioteca e foi me mostrar animada que havia

uma página inteira falando de um inseto que fazia parte do nosso museu. Algumas

crianças do segundo ano quiseram ver também; assim, acabamos folheando todo o livro

de animais juntos. Um tempo depois, esse grupo de crianças me fez uma proposta:

queriam estudar animais específicos. Eu aceitei na hora, assim como a turma, então

fomos escrever os nomes dos animais no nosso quadro de planejamento. De início,

queriam estudar o cangambá, a kookaburra e o martim-pescador. Enquanto escrevíamos

esses nomes no quadro de planejamento surgiu uma ideia: por que não fazermos o nosso

livro de animais? A turma gostou novamente e demos início ao projeto na semana

seguinte. Apesar de não estar na lista, propus que o primeiro animal estudado fosse a

cigarra, tendo em vista que estávamos encontrando muitas cigarras pela escola.

A ideia era que usássemos os espaços da biblioteca e da informática para

realizarmos as pesquisas, entretanto, com o andamento do projeto, a turma trouxe a

demanda de usarmos exclusivamente a informática. Dessa maneira, desenvolvemos um

processo caracterizado por um estudo prévio do animal escolhido, responsabilidade

minha, que, por sua vez, serviria de base para a pesquisa que a turma realizaria em

duplas na informática, sendo que cada dupla era responsável por encontrar uma

informação. Com as informações em mãos, sentávamos em roda para compartilha-las e

depois produzíamos uma página do livro, composta por escrita e desenho. A turma

envolveu-se profundamente na pesquisa de animais, de modo que a lista registrada no

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quadro de planejamento sempre ganhava mais um item. Assim, com o objetivo de

atender todas as solicitações, optamos por priorizar essa atividade no final do semestre;

trabalhando-a mais de uma vez na semana.

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Observando as atividades realizadas, constata-se que, partindo do interesse e das

demandas da turma, foi possível atender todas as temáticas propostas para a Formação

Complementar: Sentimentos e Sensações; Eu Que Fiz; Brincadeiras de Quintal; Corpo e

Movimento e Exploradores da Natureza. É válido ressaltar que tais temáticas foram

abordadas não só explicitamente, mas também no que tange as entranhas e

profundidades do cotidiano escolar. As atividades e brincadeiras são permeadas de

momentos de fartas aprendizagens. Cativar o caráter ativo da turma dentro do

planejamento das atividades fez despertar nas crianças um olhar autônomo e curioso.

Diante disso, cabe retomar a ideia apresentada por Freire, a fim de colocar como

principal aprendizagem o exercício da curiosidade e a paixão de conhecer o mundo.