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DQ e DPE – FFCLRP – USP Resenha Crítica de Pedagogia da Autonomia de Paulo Freire Plínio Alexandre dos Santos Caetano nº USP 5630371 Licenciatura em Química 1 Universidade de São Paulo Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto Departamento de Psicologia e Educação e Departamento de Química Licenciatura em Química RESENHA CRÍTICA DE “PEDAGOGIA DA AUTONOMIA” (PAULO FREIRE) Profa. Dra. Elaine Assolini Plínio Alexandre dos Santos Caetano Abril, 2009.

Resenha Critica Pedagogia Da Autonomia Paulo Freire

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Licenciatura em Química

1

Universidade de São Paulo

Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto

Departamento de Psicologia e Educação e Departamento de Química

Licenciatura em Química

RESENHA CRÍTICA DE “PEDAGOGIA DA AUTONOMIA”

(PAULO FREIRE)

Profa. Dra. Elaine Assolini

Plínio Alexandre dos Santos Caetano

Abril, 2009.

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1. Resenha Crítica

Dados sobre o livro

Livro: Pedagogia da Autonomia

Autor: Paulo Freire

Editora: Paz e Terra

Edição: 39ª

1.1 Capítulo I – Não há docência sem discência

Neste primeiro capítulo, Freire tem o intuito de fomentar ao educador que, não

apenas durante seu processo de formação inicial, como também de modo contínuo, reflita

sobre sua prática. Para tanto, aponta que ensinar exige:

� Rigorosidade metódica;

� Pesquisa;

� Respeito aos saberes dos educandos;

� Criticidade;

� Estética e ética;

� A corporeificação das palavras pelo exemplo;

� Risco, aceitação do novo e rejeição a qualquer forma de discriminação;

� Reflexão crítica sobre a prática; e

� O reconhecimento e a assunção da identidade cultural.

Freire norteia bastante firmemente que ao docente não é vergonhoso não saber,

mas que é belo o fato de admitir que não saiba dado conteúdo e se propor a buscar para

esclarecê-lo em situação futura. Aponta ainda que, ao professor compete incorrer em defesa

ao educando, tal como no exemplo de uma banca onde um aluno deva apresentar um

trabalho1 e, ao ser criticado por um examinador por alguma falha ou não clareza de discurso.

Há ainda ressalva para o fato de que o educador deve estar sem nenhuma

vestimenta de preconceito e, que leve em consideração a cultura do educando e as

identidades características ao local no qual leciona.

Freire coloca, bastante oportunamente, que se faz necessária pureza nas palavras do

professor, de modo a propiciar a criação de um ambiente no qual seja possível se vivenciar a

1 Freire coloca o exemplo de um educando apresentando sua tese de pós-graduação

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experiência de ser uma pessoa social, sendo – na projeção de um educador progressista2 - que

ao educador compete criar situações para tal atitude.

1.2 Capítulo II – Ensinar não é transferir conhecimento

Para continuar a tecer sua obra, Freire enfoca outras exigências da ação de ensinar:

� Consciência do Inacabamento;

� Reconhecimento de ser condicionado3;

� Respeito à autonomia do Educando;

� Bom senso;

� Humildade, tolerância e luta em defesa dos direitos dos educadores;

� Apreensão da realidade;

� Alegria e Esperança;

� A convicção de que a mudança é possível; e

� Curiosidade.

Talvez este capítulo seja, sem sombra de dúvidas, o mais politizado do livro. Nele o

autor aponta para crimes cometidos do administrativo de escolas públicas e privadas para com

os professores. Aponta ainda que, os fatores externos e internos podem influenciar e culminar

no andamento do processo de aprendizagem, ressaltado pelo autor que não deve ser tão

somente uma transmissão de conteúdos, mas como criador de possibilidades para a

construção do conhecimento, o aprendizado deve ser recíproco (já no capítulo I, há uma crítica

dura ao bancarismo4). Numa de suas colocações, (Freire) coloca que ao educador compete a

necessidade de fazer com que o aluno deixe de ser dependente do professor (heteronomia) e

passe a interagir com o conhecimento (objeto), chegando à autonomia5. Na fala do autor,

evidencia-se ainda um pedido forte – cujo teor está nas crenças do próprio autor – para que o

educador não ‘pode’ ao educando, sendo que para tal é necessária a valorização da

curiosidade do educando e não sua repreensão – sendo que esta poderá culminar na

construção de imaginação e da criatividade, tornando ao educando assim o próprio agente da

transformação.

2 Freire é notoriamente um educador de esquerda, o que é bastante evidente em seu diálogo, sendo

que para ele é estritamente necessário - ainda que isto não esteja explícito – a formação de educandos

para a cidadania. 3 Nota-se aqui uma relação com a Psicologia, Pavlov – condicionamento clássico, condicionamento

operante. 4 Método de ensino que entendo o educando como uma tabula rasa, onde não há conhecimentos

prévios, mas apenas um grande espaço para aprender mecanicamente (decorando). 5 Todos sendo sujeitos de sua própria história.

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1.3 Capítulo III – Ensinar é uma especificidade Humana

Neste capítulo, exatamente na página 107 da edição do presente livro, encontramos

a frase que mais chama atenção – “Ninguém é sujeito da autonomia de ninguém” – onde,

Freire nos aponta que a autonomia se constrói a partir da experiência e de inúmeras decisões

que tomamos. Freire chama a atenção para o fato de que não é do dia para a noite que se

obtém conhecimento, mas que com os erros ocorre – a certo modo – uma maturação.

O capítulo também é todo particionado, sendo que, (Freire) aponta também mais

algumas exigências do Ensinar:

� Segurança, competência profissional e generosidade;

� Comprometimento;

� Compreender que a educação é uma forma de intervenção no mundo;

� Liberdade e autoridade;

� Tomada consciente de decisões;

� Saber Escutar;

� Reconhecer que a educação é ideológica;

� Disponibilidade para o diálogo; e

� Querer bem aos educandos.

Uma vez que o conhecimento é auxiliado – e talvez, melhor dizendo mediado por

seres não neutros (educadores), este não tem como ser considerado neutro. A educação tem

alguns objetivos (e na maioria das vezes o(s) objetivo(s) são da minoria que é a classe

dominante), mas ao educador compete mudar o foco dos objetivos, durante a ação docente.

Além da questão de quem e para quem se ensina, tópicos intrinsecamente

relacionados com o currículo6, Freire denota em suas palavras que a prática educativa é um

exercício contínuo em prol da produção e do desenvolvimento da autonomia de educadores e

de educandos – cuja finalidade não seja, conforme citado desde o capítulo I, a mera

transmissão de conhecimentos, mas sim a construção, redescoberta e ressignificação do

conhecimento. Neste ponto, é possível traçar um paralelo com Vygostky, ao ilustrar que o

autor entende que as realidades pessoais devem ser pessoais, históricas, existenciais e sociais

da experiência cotidiana.

6 Notoriamente, aqui é perceptível que o currículo ensinado pelo educador progressista é,

invariavelmente bem diferente do proposto – denominado assim de currículo oculto.

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Ainda que melhor elucidado no item 2 desta resenha, a questão do saber ouvir é

retratada por Freire como necessária para a ação docente, mas não como uma forma

assistencialista e sim como uma forma de se partir de um conhecimento prévio (senso

comum), para se chegar a um conhecimento científico, mais especializado7.

Não poderíamos deixar de enunciar ainda que, o autor reconhece as dificuldades da

carreira de um educador, sendo que remunerações injustas e descaso (já mencionado da parte

administrativa), além de formas de avaliação que nada avaliam. Contudo, o autor aponta que

há sim sujeitos educadores que o fazem por ideal8. E já que foi falado em ideal, claro que a

ação educativa é tecida por ideais e, mais que isso, muitas vezes seu discurso nos faz ‘míopes’.

O fato é que Freire aponta durante todo o seu discurso esquerdista para o fato de

que é realmente, como combate para que se tenha esperança, possível a mudança e que –

ainda que um professor não faça milagres com seus poucos educandos – aos poucos a

mudança começa, mas que com este pouco, ela será completa um dia.

Ainda que seja ruim como existe hoje, é preferível tê-la a sua inexistência.

(Comentário já muito conhecido pelo professor Elmir de Almeida9, sobre a Escola).

2. Escolha de trecho e comentário

Fragmento:

“ (...) Sem bater fisicamente no educando o professor pode golpeá-lo,

impor-lhe desgostos e prejudicá-lo no processo de sua aprendizagem. A resistência do

professor, por exemplo, em respeitar a “leitura de mundo” com que o educando chega à

escola, obviamente condicionada por sua cultura de classe e revelada em sua linguagem,

também de classe, se constitui um obstáculo à sua experiência de conhecimento. Como

tenho insistido neste e em outros trabalhos, saber escutá-lo não significa, já deixei isto claro,

concordar com ela, a leitura do mundo ou a ela se acomodar, assumindo-a como sua.

Respeitar a leitura de mundo, do educando não é também um jogo tático com que o

educador ou educadora procura tornar-se simpático ao educando. É a maneira correta que

tem o educador de, com o educando e não sobre ele, tentar a superação de uma maneira

mais ingênua por outra mais crítica de inteligir o mundo. Respeitar a leitura de mundo do

educando significa tomá-la como ponto de partida para a compreensão do papel da

curiosidade, de modo geral, e da humana, de modo especial, como um dos impulsos

7 Novamente perceptível a recorrência do autor à Psicologia, desta vez é possível traçar uma relação

com Piaget (partindo de um nível de conhecimento menos especializado, para um de maior

especializabilidade). 8 “Vocacionados”, termo não muito correto, haja vista o fato que ao educador não é exigida a vocação,

mas a boa vontade e o conhecimento. 9 Professor do Depto de Psicologia e Educação da FFCLRP – USP.

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fundantes da produção do conhecimento. É preciso que, ao respeitar a leitura de mundo do

educando para ir mais além dela, o educador deixe claro que a curiosidade fundamental à

inteligibilidade do mundo é histórica e se dá na história, se aperfeiçoa, muda

qualitativamente, se faz metodicamente rigorosa. E a curiosidade assim metodicamente

rigorizada faz achados cada vez mais exatos. No fundo, o educador que respeita a leitura de

mundo do educando, reconhece a historicidade do saber, o caráter histórico da curiosidade,

desta forma, recusando a arrogância cientificista, assuma a humildade crítica, própria da

posição verdadeiramente científica.”

(pág. 122-3, 3.6 – Ensinar exige saber escutar)

2.1 Comentário

Neste fragmento, Freire mostra o quão importante se faz, na ação docente, que o

educador saiba ouvir ao aluno, valorizar suas experiências, mas que este ao discordar –

coloque-se em um primeiro instante como ouvinte das impressões do educando. Mas o saber

ouvir também não deve ser entendido como função de psicólogo, ou conselheiro: sendo que a

partir das impressões iniciais do educando, é possível partir para um nível de conhecimento

mais específico ou mais científico. Em ciências, ou mesmo em química propriamente dito, a

valorização da curiosidade e de como o educando pode explicar ou construir uma explicação a

um dado fenômeno é essencial – sendo que a partir deste conhecimento prévio é que poderão

ser levantadas as estruturas de um conhecimento mais lapidado.

Ao educando, esta gradação no conhecimento científico é bastante importante,

principalmente porque o conhecimento não surge do nada e, em verdade, os modelos

vigentes que explicam ao fenômeno se sustentam em modelos que já não mais explicam bem

certas questões (fator de historicidade, na construção do conhecimento).