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Responsabilidade Civil do Médico

Responsabilidade Civil do Médico · à reestruturação do estado modificado pelo agir antijurídico. Se frente à sociedade recebe sempre a reprimenda moral quando afronta a ordem

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Responsabilidade Civil do Médico

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1ª edição — Do Autor2ª edição — Do Autor3ª edição — 20064ª edição — 2014

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Fabrício Zamprogna MatielloNasceu em Marau-RS, no mês de março de 1968. Graduado pela Faculdade de Direito da

Universidade Federal de Pelotas no ano de 1991, passou a lecionar na mesma instituição em 6 de setembro de 1993, na disciplina de Direito Civil. Foi aprovado em cinco concursos públicos para o magistério superior nas áreas de Direito Civil, Direito Constitucional e Direito Administrativo. É doutorando em Direito Civil pela Universidade de Granada, Espanha. Antes de publicar a coleção

intitulada Curso de Direito Civil, o autor publicou outras oito obras, que vêm sendo constantemente reeditadas: Aborto e Direito Penal; Dano Moral, Dano Material e Reparação; União Estável;

Mandado de Segurança; Responsabilidade Civil do Médico; Responsabilidade Civil em Acidentes de Trânsito; Código Civil Comentado; e Defeitos do Negócio Jurídico.

ResponsabilidadeCivil do Médico

4ª Edição

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R

EDITORA LTDA.

Rua Jaguaribe, 571CEP 01224-001São Paulo, SP — BrasilFone (11) 2167-1101www.ltr.com.br

Setembro, 2014

Todos os direitos reservados

Índice para catálogo sistemático:

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Matielo, Fabrício ZamprognaResponsabilidade civil do médico / Fabrício Zamprogna

Matielo. — 4. ed. — São Paulo : LTr, 2014.

(Direito) I. Título.

14-08848 CDU-347.56:61

1. Médicos : Responsabilidade : Direito civil347.56:61

2. Responsabilidade civil médica : Direitocivil 347.56:61

Versão impressa - LTr 5127.1 - ISBN 978-85-361-3071-2Versão digital - LTr 8445.2 - ISBN 978-85-361-3154-2

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Para Geane, por tudo o que representa.

A todos os que aliamo Direito à Justiça,

porque dessa conjugaçãoé que emerge a razão

de ser da ciência jurídica.

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APRESENTAÇÃO

Houve uma época em que a palavra do médico era soberana e ninguém ousaria contestar seus procedimentos no tratamento de um paciente. Tudo que o médico fazia era visto como justo, bom, indispensável e necessário, mercê da aura de sacerdócio que envolvia o seu trabalho. As pessoas tinham a convicção de que ele estava sempre lançando mão de todos os recursos da medicina, que eram ainda bastante limitados. E quando sobrevinha o malogro do tratamento ou um desenlace menos feliz, as pessoas compreendiam que aquilo só poderia ser obra do destino

Entretanto, a evolução da ciência em geral e da medicina em particular trouxe consigo diversas alterações na realidade do médico. As pesquisas, as descobertas, as novas técnicas e um instrumental cada vez mais complexo e sofisticado foram aumentando os poderes do médico na prevenção e na cura de enfermidades. O exercício do sacerdócio passou a se revestir de maiores responsabilidades, tornando cada vez mais estreita a faixa dos infortúnios antes atribuídos à obra do destino.

Assim, da irresponsabilidade jurídica absoluta, passou o médico a se tornar o alvo preferencial de investigações, desconfianças e demandas fo-renses, em muito alimentadas pelas deficiências da formação universitária, pelo desinteresse dos recém-formados em buscar especializações e ainda pela falta de reciclagem dos profissionais mais antigos, no tocante aos avan-ços científicos e ao correto manejo da aparelhagem tecnológica colocada à sua disposição.

Apesar de todos os avanços, a ciência médica ainda impõe limitações, por vezes intransponíveis. O homem também tem seus próprios limites, variáveis de pessoa para pessoa, resultando daí diferentes aptidões para a execução desta ou daquela tarefa. Conhecer essas limitações é o primeiro e fundamental passo para a prevenção de erros em medicina.

Mas quando o erro ocorre, os lesados já estão aprendendo a buscar o Poder Judiciário para resguardo dos seus direitos. Como os norteamentos de ordem moral ainda são escassos, a submissão dos ofensores ao crivo da Justiça certamente é fator inibitório de investidas despreocupadas e inconsequentes de maus profissionais, preservando aqueles que agem de modo sensato e consciente.

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Por outro lado, os exageros de pacientes e familiares que se julgam atingidos por erros médicos devem ser coibidos, visando a preservação da dignidade dos profissionais que efetivamente se dedicam com rigor ao tratamento das moléstias e à amenização do sofrimento.

O controle da qualidade dos serviços tem na prevenção seu maior aliado, e no proceder seguro do Poder Judiciário o freio necessário para impedir a proliferação de atentados contra a dignidade dos pacientes.

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SUMÁRIO

Parte I RESPONSABILIDADE CIVIL ................................................................. 11 Responsabilidade subjetiva ..................................................................... 14 Responsabilidade objetiva ....................................................................... 16 Classes de danos........................................................................................ 19

Limites do dever de indenizar ou de reparar ....................................... 23Cláusula de não indenizar ....................................................................... 25

Parte II RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO ........................................ 31O médico em juízo .................................................................................... 31Natureza contratual da relação ............................................................... 33Características básicas do contrato médico ........................................... 36Substituição do profissional contratado ................................................ 38Obrigação de meios e obrigação de resultado ...................................... 41Cirurgias plásticas e obrigações geradas ............................................... 45Demonstração da culpa como pressuposto ........................................... 50Relevância da omissão .............................................................................. 55Nexo de causalidade ................................................................................. 57Aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ......................... 59

Parte III RESPONSABILIDADE DE HOSPITAIS, CLÍNICAS E AFINS........... 64Fundamentos básicos ................................................................................ 64Responsabilidade nos planos de saúde ................................................. 68

Parte IV PRÁTICA MÉDICA À LUZ DO DIREITO ............................................ 71Considerações preliminares..................................................................... 71Erro de diagnóstico e erro de tratamento .............................................. 73Autorização para tratamento e aceitação de riscos .............................. 80Experimentos e improvisação como fontes de erros ............................ 87

Parte V PROCEDIMENTOS CIRÚRGICOS EM GERAL .................................. 90Cirurgia e responsabilidade .................................................................... 90Cautelas básicas no pré-operatório ......................................................... 92Considerações sobre a anestesia ............................................................ 94Cautelas básicas no pós-operatório ........................................................ 98

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Prioridades em cirurgia ............................................................................ 99Contraindicações cirúrgicas ..................................................................... 100Cirurgias realizadas por equipes ............................................................ 102Procedimentos de urgência e de emergência ........................................ 105Achados operatórios ................................................................................. 108Complicações cirúrgicas ........................................................................... 110

Parte VI INFECÇÃO HOSPITALAR ..................................................................... 112

Parte VII PROVA DO ERRO MÉDICO ................................................................... 119Considerações preliminares..................................................................... 119Depoimento pessoal do demandado ...................................................... 121Prova documental ..................................................................................... 122Prova testemunhal .................................................................................... 127Prova pericial ............................................................................................. 128Produção antecipada de provas .............................................................. 129Limites do julgador na análise das provas ............................................ 131

Parte VIII REPERCUSSÕES DA SENTENÇA PENAL SOBRE A RESPONSA-BILIDADE CIVIL ...................................................................................... 133Sentença penal condenatória ................................................................... 135Sentença penal absolutória ...................................................................... 137Absolvição com fundamento no art. 386, I, do CPP ............................. 138Absolvição com fundamento no art. 386, II, do CPP ........................... 139Absolvição com fundamento no art. 386, III, do CPP .......................... 140Absolvição com fundamento no art. 386, IV, do CPP .......................... 140Absolvição com fundamento no art. 386, V, do CPP ........................... 141Absolvição com fundamento no art. 386, VI, do CPP .......................... 142Absolvição com fundamento no art. 386, VII, do CPP ........................ 144

Parte IX QUANTIFICAÇÃO DOS DANOS ......................................................... 146Limites temporais e pecuniários da condenação .................................. 150

Parte X LEGITIMIDADE ATIVA E PASSIVA ...................................................... 157

Parte XI APONTAMENTOS SUBSTANTIVOS E PROCESSUAIS .................... 161Valor da causa e honorários advocatícios .............................................. 161Prescrição da ação indenizatória ou reparatória .................................. 165Violação a dever ético ............................................................................... 166Seguro da atividade médica .................................................................... 168

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................... 171

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PARTE I

RESPONSABILIDADE CIVIL

A reparação dos danos não prescinde, para perfeito entendimento do seu mecanismo de funcionamento, da análise de questões primárias atinentes ao direito, como a da origem da responsabilização civil dos indivíduos e as variantes dos sistemas ao longo do tempo.

Ao indivíduo é dado agir, em sentido amplo, da forma como melhor lhe indicar o próprio discernimento, em juízo de vontade que extrapola as previsões legais e independe destas. Pode inclusive contrariar o ordenamento jurídico na amplitude desejada, valorando, diferentemente das normas legais, os fatos e os eventos. Mas, ainda que normatização inexista a regular o caso, o homem é sempre responsável por toda e qualquer conduta que adotar, ao menos em termos morais e de prestação de contas à consciência.

Quando opta por determinada atitude, o ser humano pode provocar a reação da sociedade ou fazer passar ao largo desta o seu atuar, conforme acarrete resultados positivos ou negativos, úteis ou danosos, bons ou maus aos olhos do referencial social adotado pela comunidade. Uma determinada conduta assume contornos e recebe qualificações a partir exatamente da repercussão causada, levando a reações postadas em diversos níveis, desde a aceitação pura e simples até o mais profundo repúdio. Contudo, somente importará ao Direito se provida de potencial lesivo, ocasião em que desencadeará o mecanismo de recuperação dos males verificados ou o complexo repressivo e pretensamente ressocializador representado pela legislação criminal.

Se porventura a atuação se dá ao amparo da legislação, ou de modo a não contrariá-la, tem-se o chamado ato jurídico, conduta juridicamente permitida ou, na pior das hipóteses, não defesa em lei. Pode também ser denominado como negócio jurídico, apesar de doutrinariamente este vocábulo estar reservado para a esfera contratual das relações interpessoais, de tal sorte que negócio haveria sempre que ato relativo ao âmbito contratual; do contrário, seria genericamente tido por ato jurídico. Já o agir que se opõe ao regramento normativo é denominado ato ilícito, autorizando os eventuais lesados a buscar junto ao Estado a devida recomposição do seu patrimônio, ou satisfação pecuniária em função da provocação de danos de qualquer ordem.

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Ato ilícito e ato jurídico distanciam-se bastante em termos de efeitos produzidos por um e por outro. Enquanto aquele tem força suficiente para dar origem a direitos e/ou a deveres a quem o pratica, este somente poderá acarretar deveres, por ser dissociado da ordem posta. Em uma contratação, por exemplo, aos contratantes criar-se-ão faculdades e obrigações, como ocorre com o adquirente de mercadoria, que tem o direito de recebê-la e, em contrapartida, o dever de satisfazer o preço estabelecido entre as partes. Em sentido oposto, aquele que danifica materialmente um bem alheio ao desabrigo de qualquer das excludentes previstas na legislação sujeita-se ao correspondente ressarcimento, mas nenhum direito lhe assistirá, exatamente porque obrou em dissonância com o que determina a lei.

Ao postar-se contrariamente às normas jurídicas, o indivíduo assume o risco de se ver responsabilizado pelos atos praticados, levado compulso-riamente a suportar os efeitos da incidência da norma pertinente destinada à reestruturação do estado modificado pelo agir antijurídico. Se frente à sociedade recebe sempre a reprimenda moral quando afronta a ordem jurí-dica, perante esta sucede que será obrigado a reparar os danos porventura ocasionados, fruto da necessidade de manutenção plena da viabilidade da vida comunitária. Essa obrigação — ou dever — via de regra resume-se ao preenchimento monetário da lacuna patrimonial ou extrapatrimonial que teve origem no âmbito jurídico alheio em virtude da conduta ilegítima. Isto, evidentemente, quando não ferido o ordenamento penal, situação ensejadora de maior movimentação estatal com vistas à responsabilização prevista na legislação específica.

À evidência, a responsabilidade civil embasa-se na previsão legal que a admite, eis que nunca emergirá unicamente porque pretendida alguma forma de reparação daquele que se portou de forma considerada indevida, mas sem esteio na legislação. Aliás, ressalte-se que somente a violação da norma, seja direta ou indiretamente, tem força suficiente para conduzir o transgressor ao dever de reestruturar os direitos ou interesses atingidos; do contrário, restará apenas a reprimenda moral, que, contudo, não passa ao âmbito econômico de qualquer dos envolvidos, quer para prejudicar ou beneficiar.

Ao danificar um veículo alheio, por exemplo, o agente fica obrigado a indenizar em razão da incidência da regra geral contida no art. 186 do Código Civil, cujo teor é o seguinte: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. Por outro lado, melhor sorte não lhe caberá se descumprir uma regra contratual, estipulada livremente entre as partes contratantes, vindo com isso a provocar danos. Seja contratual ou não, a obrigação de reparar deflui do ordenamento jurídico aplicável a cada situação em particular.

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Não obstante à primeira vista possa parecer, não é somente o ato ilícito que gera o dever de indenizar ou de reparar, mesmo que se deva reconhecer que, no mais das vezes, a iliceidade da conduta é que determina o nascimento da obrigação. Às vezes, o próprio agir lídimo dá nascedouro ao dever de recomposição da seara jurídica alheia atingida, pois a ideia de ressarcimento é muito extensa e admite que a responsabilidade civil possa ter origem no fato de outrem, ou no fato das coisas, desde que observados determinados requisitos normativamente estatuídos. Se a teoria da responsabilidade civil ficasse invariavelmente atrelada à ocorrência de ilicitudes, grande parcela dos episódios danosos legaria apenas prejuízos ao ofendido, sem possibilidade de recuperação pecuniária. Assim, v. g., os pais são também responsáveis pela reparação civil quando os filhos menores causarem prejuízos a terceiros, ainda que em nada tenham contribuído para o evento lesivo, com base na existência e exercício do pátrio poder. Não se poderá dizer que a responsabilidade civil em relação especificamente aos pais esteja vinculada a uma ilicitude por eles praticada; todavia, o legislador preferiu atribuir o dever de reparação aos progenitores para impedir que o lesado fique ao desamparo jurídico em virtude da previsível ausência de condições pecuniárias dos filhos menores para suportar os ônus decorrentes da ilicitude concretizada. Logo, se na origem é vislumbrada a ocorrência de iliceidade, o repasse da obrigação de indenizar se dá com lastro e causa diversa, atingindo pessoas que não tiveram qualquer conduta antijurídica, mas que ficarão ligadas ao dever de reparar por força do agir ilícito dos filhos.

Do plano da irresponsabilidade geral — datado de remotas eras — pas-sou-se ao do integral amparo ao lesado, consubstanciado na multiplicidade de regras que protegem os que sofrem indevida ingerência em seu campo jurí-dico. Contudo, até hoje não foi possível dissociar a ideia de responsabilidade civil da noção de dano, ou seja, prejuízo de ordem material ou, pelo mínimo, moral. Esta última modalidade é inconfundível com a reprimenda moral, que não acarreta repercussão alguma sobre o patrimônio pecuniário do autor do dano. Ao contrário, trata-se de norteamento que estabeleceu a reparabilidade dos danos à moralidade através da condenação do lesante ao pagamento de verba determinada ao prejudicado, por afronta à seara extrapatrimonial, à margem do grau de imoralidade (em sentido vulgar) da conduta perpetrada, eis que unicamente adstrita às previsões legais disciplinadoras do tema.

A responsabilidade civil tem seus tentáculos voltados precipuamente para a reparação do dano, embora a isso não esteja limitada, porque também é dotada de conteúdo punitivo em determinadas situações, como, v. g., no caso de condenações por danos morais puros. A constante evolução do sistema de indenização e reparação faz com que se aperfeiçoem formas e bases das teorias conhecidas respeitantes ao assunto, motivo pelo qual é necessária rápida incursão nos alicerces lançados no direito nacional, a fim de melhor

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compreensão do seu estudo. Por ocasião da publicação da obra Dano Moral, Dano Material e Reparações (Porto Alegre: Sagra Luzzatto Editores, 1995. p. 12), expressou-se o pensamento seguinte, em referência ao dano como ato ou fato produtor de lesões: “É evidente que, apreciado sob esse prisma, o dano é mera constatação, despido ainda da ideia de reparabilidade ou reposição do statu quo ante, estado anterior das coisas. Esta exsurge da conjunção de fatores subjetivos e/ou objetivos, normalmente vinculada à noção de culpa, embora por exceção possa ser dispensada a sua presença”.

RESPONSABILIDADE SUBJETIVA

O liame entre dano e responsabilidade é fundamental para a existên-cia da obrigação de reparar, vista aquela sob o ângulo subjetivo; logo, é imprescindível a presença do elemento culpa, vínculo de caráter interno a demonstrar a imputabilidade do resultado ao agente, gerando o dever de restabelecer a situação anterior ao prejuízo. É a chamada responsabilidade subjetiva, ou com culpa, modalidade adotada com destaque pelo ordena-mento jurídico pátrio, embora não exclusivamente dedicado a ela e aberto a exceções as mais variadas. Essa espécie é dita subjetiva porque estratificada na convicção de que está presente, no caso concreto, a ligação psíquica do agente com o resultado danoso, de modo que este quer diretamente produzir o efeito que efetivamente veio a ser constatado, ou no mínimo se porta de modo a aceitar como perfeitamente viável a ocorrência do evento a partir da conduta assumida.

À primeira espécie denomina-se dolo direto, ação ou omissão cons-ciente direcionada ao alcance de um resultado certo; é querer deliberadamente infringir dever fixado normativamente. À segunda, dolo eventual, assunção consciente do risco de que o evento danoso venha a produzir-se; ainda que ciente disso, o agente toma a possibilidade abstrata da causação do prejuízo como parte integrante da sua ação e prossegue rumo ao que deseja, disso podendo resultar muito proximamente o dano a alguém.

Pode restar patente a culpa, ainda, nas clássicas definições de imprudência, negligência ou imperícia, diferenciando-se das demais na medida em que não se pretende exatamente o dano, nem se assume explicitamente o risco de se o ver concretizado, mas fica certo que o prejuízo somente teve lugar em função do comportamento ilícito do lesante, mesmo que por vezes seja extremamente tênue o liame subjetivo verificado.

Por imprudência entende-se a falta de cuidados básicos, de cautelas ordinárias que necessariamente deveriam ter sido tomadas em dado caso particular. É atuação irrefletida, intempestiva, como a de conduzir veículo que se sabe sem freios, ultrapassar propositadamente semáforo com sinal