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Universidade de São Paulo Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” ESALQ/USP RESUMO EXECUTIVO Projeto de pesquisa: SISTEMAS AGROFLORESTAIS COM CACAU PARA RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS, EM SÃO FÉLIX DO XINGU – PA Daniel Palma Perez Braga Me.S. em Conservação de Ecossistemas Bacharel em Engenharia Florestal Universidade de São Paulo - ESALQ/USP Prof. Dr. Flávio Bertin Gandara Mendes Departamento de Ciências Biológicas Universidade de São Paulo (ESALQ/USP) Piracicaba Julho 2015

Resumo Executivo SAF SFX - imaflora.org · plantio e cultivo do cacau. Em São Félix do Xingu, a maior parte das lavouras de cacau ocorre através do emprego de SAFs, com tamanho

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Universidade de São Paulo Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”

ESALQ/USP

RESUMO EXECUTIVO

Projeto de pesquisa:

SISTEMAS AGROFLORESTAIS COM CACAU PARA RECUPERAÇÃO DE

ÁREAS DEGRADADAS, EM SÃO FÉLIX DO XINGU – PA

Daniel Palma Perez Braga Me.S. em Conservação de Ecossistemas

Bacharel em Engenharia Florestal Universidade de São Paulo - ESALQ/USP

Prof. Dr. Flávio Bertin Gandara Mendes

Departamento de Ciências Biológicas Universidade de São Paulo (ESALQ/USP)

Piracicaba

Julho 2015

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SISTEMAS AGROFLORESTAIS COM CACAU PARA RECUPERAÇÃO DE

ÁREAS DEGRADADAS, EM SÃO FÉLIX DO XINGU – PA

Estudo realizado com apoio do projeto executado pelo Imaflora e apoiado pelo

Fundo Vale e parceiros estratégicos, IEB, ADAFAX e CAMPAX: “Produção e

Mercado de Cacau com Responsabilidade Socioambiental: São Felix do Xingu como

um Local de Disseminação de Práticas Inovadoras para a Amazônia”.

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Conteúdo 1. APRESENTAÇÃO.............................................................................................4

2. INTRODUÇÃO..................................................................................................4

2.1 Definições para o estudo............................................................................7

3. OBJETIVO.......................................................................................................10

4. RESULTADOS E CONCLUSÕES...................................................................10

4.1 Parte I: Contexto Socioeconômico e Ambiental........................................10

4.2 Parte II: Solo.............................................................................................12

Fertilidade.................................................................................................12

Macroinvertebrados do solo.....................................................................13

4.3 Parte III: Vegetação..................................................................................16

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1. APRESENTAÇÃO

Este Resumo Executivo é resultante do projeto de pesquisa intitulado de

“Sistemas Agroflorestais com Cacau para Recuperação de Áreas Degradadas, em

São Félix do Xingu – PA”, realizado para obtenção do título de Mestre em Ciências

pelo Programa de Recursos Florestais com opção em Conservação de

Ecossistemas Florestais, Universidade de São Paulo (ESALQ/USP). O projeto foi

financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp),

nº do processo: 2012/25335-2, com apoio do Instituto de Manejo e Certificação

Florestal e Agrícola (Imaflora). Seu conteúdo consiste na síntese dos principais

resultados obtidos. A dissertação completa está disponível na Biblioteca Digital de

Teses e Dissertações da USP, pelo link:

http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/11/11150/tde-23062015-135642/

2. INTRODUÇÃO

As florestas brasileiras vêm sendo derrubadas sob justificativas de pouco

respaldo técnico, científico e até mesmo econômico. Segue-se um modelo de

desenvolvimento insustentável semelhante às devastações históricas, registradas

desde o período colonial. Suas causas são complexas, todavia, costuma haver

alguns padrões. Na Amazônia, após a abertura de estradas, o desmatamento

normalmente ocorre através de queimadas e frequentemente culmina em usos de

baixo retorno econômico, geralmente pastagens pouco produtivas, perdendo-se uma

das maiores biodiversidades do planeta.

A bacia do Xingu é uma região de históricos conflitos sociais em seu processo

de colonização. A emancipação municipal de São Félix do Xingu ocorreu em 1961 e

hoje se estima que existam cerca de 106.940 habitantes na área de 84.212,426 km2,

com densidade demográfica de 1,08 hab./km2, IDH de 0,594 e a educação também

está abaixo da meta nacional, apesar de 77% da população ser considerada

alfabetizada. O município encontra-se a 1.050 km da capital do Estado do Pará, a

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uma latitude 06º 38' 41" sul e a uma longitude 51º 59' 42" oeste, com altitude de 220

metros.

A origem de São Félix do Xingu está relacionada com a produção de borracha

(Hevea brasiliensis), extrativismo de castanha (Bertholletia excelsa), garimpo,

comércio de pele animal, e com a caça, pesca e agricultura de subsistência (arroz,

milho, feijão, mandioca e etc.). O desmatamento em grande escala teve início com o

projeto e a efetivação da rodovia PA-279. Após a estrada, a população cresceu

exponencialmente e sua origem amazônica deixou de predominar. Inúmeros

conflitos territoriais foram registrados, a pesca ficou escassa e a economia se

sustentou no comércio ilegal de madeira, principalmente o mogno (Swietenia

macrophylla), em maiores atividades mineradoras (especialmente ouro e cassiterita),

folhas de jaborandi (Pilocarpus jaborandi) e principalmente a pecuária de gado. Em

geral, as ações do governo não acompanharam o ritmo do crescimento, ou seja, o

provimento das condições básicas de saneamento, eletricidade, saúde e educação

ainda são deficientes, principalmente na zona rural.

Segundo dados do IBGE, o município possui a receita de R$ 59 milhões, com

despesas de 55 milhões. Hoje, a economia é pautada pelas atividades de mineração

e agropecuárias. O PIB é de aproximadamente R$ 704 mil, sendo 47% representado

pelas atividades agropecuárias, predominantemente a pecuária (com 98,5% da

produção), o que faz de São Félix do Xingu um dos três municípios detentores do

maior rebanho bovino do país. Por outro lado, desde 2001 o município também

lidera os rankings de maiores taxas de desmatamento, sofrendo embargo ambiental

pelo Ministério do Meio Ambiente. Diversas medidas para controle do desmatamento

foram colocadas em prática por iniciativas do governo e do terceiro setor, uma delas

é o Projeto Pacto Xingu.

A hidrografia é formada pela bacia do rio Xingu. A zona de clima é Equatorial

Quente (média > 18º C todos os meses do ano) e Úmido (com 3 meses secos). a

temperatura média é de 25,4°C, variando entre 16,4°C e 36°C e a pluviosidade

média de 1.622 mm/ano, variando entre 700 e 2.377 mm. Predominam solos de

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fertilidade mediana com boas características físicas e/ou morfológicas: Argissolos

Vermelhos-Amarelos Distróficos, Nitossolos Vermelhos Distróficos e Eutróficos e

Neossolos Litólicos Distróficos. Situados em relevo plano a suave ondulado, com

variação entre cotas de 200 e 500 metros de altitude ao nível do mar. A vegetação

pertencente ao Bioma Amazônico, com tipos de Floresta Ombrófila Densa (Floresta

Tropical Pluvial) e Floresta Ombrófila Aberta (Faciações da Floresta Ombrófila

Densa).

Em São Félix do Xingu, a agricultura familiar comumente realiza a produção

de cacau, cujo plantio inicial ocorre em consórcio com demais plantas agrícolas,

principalmente a mandioca, o milho e a banana. A qual perdura no sistema até

aproximadamente o sexto ano, quando o cacau já está bem estabelecido, e é

gradualmente removida ao passo que as árvores nativas vão ocupando seu lugar no

dossel, promovendo o sombreamento do cacau em um segundo momento. Este

agroecossistema, também denominado de sistema agroflorestal com cacau (SAF-

cacau) é um modelo amplamente abordado pela literatura científica, o qual ocorre

em diversas regiões tropicais, exercendo um importantíssimo papel na busca pela

sustentabilidade, em função de sua sinergia com os aspectos econômicos,

ambientais e sociais.

Tratando-se do contexto onde está inserido torna-se ainda mais relevante,

uma vez que o município de São Félix do Xingu esteve recentemente entre os

líderes do desmatamento no Brasil. Ademais, há pouco vem se consolidando a Lei

Nº12.651/2012, que trata da proteção da vegetação nativa, determina o tamanho

mínimo da Reserva Legal; prevê a recuperação de áreas degradadas e o

pagamento por serviços ambientais; dispõe sobre os Programas de Regularização

Ambiental (PRAs) e cria o Cadastro Ambiental Rural (CAR), dentre outras

especificações.

Neste âmbito, tenho o objetivo de responder à principal questão: qual é o

potencial do SAF-cacau para recuperação de áreas degradadas em São Félix do

Xingu, PA? Tratando-se de um tema com múltiplas abordagens, podemos visualizar

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duas esferas que sustentam essa ideia: o solo e a vegetação. Partindo desses dois

componentes, conduzi o enfoque da pesquisa para outros dois aspectos que

caracterizam cada um deles. Para o solo, analisei a fertilidade (físico-químico) e os

macroinvertebrados (biológico). Para a vegetação, analisei a estrutura florestal e a

diversidade florística. Por fim, para embasar o conteúdo abordado, considerei os

aspectos socioeconômicos e ambientais, através de entrevistas e revisão

bibliográfica.

2.1 Definições para o estudo

Recuperação de Áreas Degradadas (RAD): refere-se indistintamente a diferentes

técnicas aplicáveis visando reverter à situação de um ecossistema degradado para

um estado desejável, independentemente do nível de degradação. Apesar do termo

“reabilitação” caber adequadamente a este estudo.

Os solos da região estudada ainda não apresentam degradação severa a

ponto de impedir por completo a sucessão ecológica ou atividades agropecuárias.

No entanto, a mudança do uso do solo (Figura 2), de floresta para pastagem, pode

ser considerada uma degradação, ao remover complemente a estrutura da

vegetação.

Figura 1 – Usos de solo em uma típica pequena propriedade rural de São Félix do Xingu

Floresta nativa madura (com sinais de degradação): ecossistemas

florestais que possuem sua área maior do que 20 ha, desconhecendo a idade, mas

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certamente com mais de 50 anos, e que não são intactas, ou seja, sofreram com

ações diretas de extração de madeira e/ou queimadas parciais em passado recente

de duas décadas. Estão fragmentadas e inseridas em um contexto de paisagem cuja

matriz é pastagem.

Pasto: Áreas com 10 a 20 anos de idade, entre 10 e 20 ha, onde há o

predomínio de gramíneas cultivas para a atividade de pecuária bovina, podendo

haver algumas árvores isoladas.

SAF-cacau: lavoura de cacau é qualquer área, maior que 0,5 ha, onde haja o

plantio e cultivo do cacau. Em São Félix do Xingu, a maior parte das lavouras de

cacau ocorre através do emprego de SAFs, com tamanho entre 3 e 8 ha, onde há o

sombreamento do cacau composto usualmente por “árvores de sombra” e/ou

bananas. Ao mesmo tempo em que o sombreamento é importante ao

desenvolvimento do cacaueiro, ele também promove a melhoria da ciclagem e

disponibilização de nutrientes, além de diversos serviços ambientais.

• Sombra Inicial (SI): lavoura de cacau com 3 a 5 anos de idade,

implantadas após 3 a 13 anos de uso com pastagem, consorciando o cacau com

culturas anuais, como milho e mandioca, e culturas perenes, como mamão e

banana. Ao mesmo tempo, os produtores vão selecionando algumas árvores

regenerantes e conduzindo seu crescimento ao longo do tempo. A esta fase

caracteriza-se pela presença expressiva de bananas (Figura 2).

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Figura 2 - SAF-Cacau SI, 4 anos de idade, São Félix do Xingu – PA

• Sombra secundária (SS): lavoura de cacau com 6 a 13 anos de idade,

podem ter sido implantadas após 4 anos de roça ou após 3 a 15 anos de uso com

pastagem. Quando as árvores jovens da regeneração natural, que foram conduzidas

assim como descrito na fase de sombra inicial (SI), atingem o dossel e ultrapassam

o cacau, normalmente após o quinto ano, quando se reduz gradualmente a

densidade de bananas e forma-se a sombra secundária (SS). Nesta categoria, já

não há mais a presença de bananas (Figura 3).

Figura 3 - SAF-Cacau SS, 9 anos de idade, São Félix do Xingu – PA

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• Sombra abandonada (A): áreas com 3 a 5 anos de idade, cujo cacau

foi implantado após uso de 11 anos com pastagem ou 9 anos com roça (Figura 4).

Áreas abandonadas após a implantação em função da alta mortalidade das plantas

de cacau e baixa produtividade possuem alta densidade de regeneração natural

ocupando o dossel e sombreando o cacau.

Figura 4 - SAF-Cacau A, 4 anos de idade, São Félix do Xingu - PA

3. OBJETIVO

Quantificar o potencial de SAF-cacau para RAD em São Félix do Xingu - PA em

três perspectivas: (I) Socioeconômica e ambiental; (II) Solo; (III) Vegetação.

4. RESULTADOS e CONCLUSÕES

4.1 Parte I: Contexto Socioeconômico a Ambiental

Pergunta: qual a percepção socioeconômica e ambiental dos produtores

rurais, dentro dos objetivos maiores de aplicação do SAF-cacau como ferramenta de

RAD?

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Hipóteses: os produtores consideram que o SAF-cacau pode: (a) ser usado

em RAD; (b) trazer maior retorno financeiro que a pecuária; por unidade de área (c)

trazer mais benefícios ambientais (solo, fauna e flora) do que a pecuária.

Métodos: Realizei uma entrevista com questionário estruturado. Foi

entrevistado apenas o(a) produtor(a) responsável pelo SAF-cacau de cada

propriedade analisada.

Resultados: (1) A maioria dos produtores considera que o SAF-cacau pode

ser utilizado para RAD; (2) A maioria dos produtores entende que o SAF-cacau traz

mais benefícios ao meio ambiente do que a pastagem. (3) Figura 5; (4) Para

complementar a percepção dos produtores, estimei a produção a partir de dados

pelo método Ceplac (adaptado). Neste caso, para SAF-Cacau SS, a produção média

para safra de 2014 seria de 471,4 ±166,0 kg de amêndoas/ha. Considerando o

preço do cacau na região, na época de R$ 5,90 (hoje em ascensão), o produtor

obteria uma renda bruta de R$ 2.781,26 /ha. As estimativas de produção média (P)

em São Félix do Xingu podem ser consideradas medianas, dependendo do

referencial, mas ainda dentro dos padrões esperados. (5) Em média, após o sexto

ano SAF-cacau pode gerar renda líquida de 4 a 6 vezes maior (por unidade de área)

do que a pecuária e ocupar uma área até 7 vezes menor (Segundo relato dos

produtores e referências bibliográficas, é possível alcançar mais de 1.000 kg/ha.ano

através da melhoria das de práticas de manejo)

Figura 5 - Análise dos valores médios de custos e renda bruta (R$/ha.ano), estimativa baseada na

percepção dos produtores, considerando Pasto e SAF-Cacau SI e SS.

Mín. Máx. Média Mín. Máx. Média

Pasto 33,33 281,25 91,33 66,67 1248,00 532,46 441,13

SAF-Cacau SI 0,00 500,00 239,49 0,00 1250,00 778,85 539,36

SAF-Cacau SS 0,00 538,46 286,15 400,00 4500,00 2165,29 1879,14

(R$/ha.ano)Custo Renda Bruta Renda

líquida

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Conclusões:

• O contexto socioeconômico e ambiental para os pequenos produtores é

propício para a implementação do SAF-cacau como ferramenta de RAD,

podendo trazer mais benefícios que a pecuária em diversos aspectos.

• Há uma potencial sinergia entre o manejo de sombra, a diversificação da

produção e a conservação da diversidade florística.

• Observa-se no SAF-cacau um potencial para atender ao mercado de

produtos orgânicos e com certificado socioambiental, além do pagamento

pelos serviços ambientais.

• Diversos grupos de animais silvestres frequentam os SAF-cacau, mas nem

sempre este é um aspecto positivo, necessitando-se de maiores estudos

sobre seus impactos.

4.2 Parte II: Solo

Fertilidade

Pergunta: no contexto de São Félix do Xingu, qual o potencial do SAF-cacau

para recuperar os atributos químicos do solo em áreas degradas?

Hipótese: o SAF-cacau pode recuperar completamente a fertilidade do solo.

Método: realizei o diagnóstico de algumas das propriedades químicas (pH, P,

K, Ca, Mg, Zn, B, Cu, Mn, CTC e V%) e físicas (areia, silte e argila) do solo em SAF-

cacau e comparei com áreas de pastagens e florestas adjacentes. Coletando

amostras retiradas em duas profundidades: 00-20 e 20-40 cm, em cada uso do solo

estudado nas propriedades. No total, encaminhei 40 amostras de solo (24 em cacau,

8 em floresta e 8 em pasto) para o Laboratório de Análise Química para fins de

Levantamento de Solo da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”

(ESALQ/USP), em Piracicaba – SP.

Resultados: (1) não houve diferenças significativas de textura e nem dos

indicadores de fertilidade do solo entre os usos do solo. (2) A Floresta apresentou

maior teor de matéria orgânica do que o Pasto, na profundidade de 20-40 cm. (3) O

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Pasto apresentou teores de K mais elevados, podendo estar relacionado à

disponibilização deste nutriente pelas recentes ações de queimadas.

Conclusões:

• Os solos estudados são altamente semelhantes nos aspectos físicos e em

praticamente todos os aspectos químicos avaliados. Portanto, a hipótese

deste sistema produtivo poder recuperar completamente a fertilidade do solo

não pode ser comprovada, uma vez que esta característica não foi diferente

das áreas de referência nos solos estudados de São Félix do Xingu.

Macroinvertebrados do solo

Pergunta: no contexto de São Félix do Xingu, qual o potencial do SAF-cacau

para recuperar os atributos biológicos do solo em áreas degradas?

Hipótese: o SAF-cacau pode recuperar completamente a riqueza/diversidade

de grupos de macroinvertebrados.

Métodos: realizei a coleta de macroinvertebrados do solo (Ex. insetos,

aranhas, anelídeos e etc.) em SAF-cacau e comparei com áreas de pastagens e

florestas adjacentes. Identifiquei-os em grupos (taxonômicos), de forma a quantificar

sua densidade e riqueza naquele ambiente. Para isso, cada amostra de uso do solo

(Cacau, Floresta e Pasto) foi composta por 3 pontos de coleta, coletando os animais

presentes na superfície do solo e em blocos de terra (monolitos) com dimensão de

25x25x25 cm. O levantamento foi feito em dois períodos distintos, set-nov/2013

(verão/“seca”) e fev-mar/2014 (inverno/“chuva”). No total foram 60 blocos, cuja

coleta foi identificada em nível de grandes grupos (nomenclatura taxonômica) em

laboratório, com auxílio de lupa, pincel, régua e chaves de identificação, sendo

posteriormente revisada no Departamento de Taxonomia do Museu de Entomologia

na Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”.

Resultados: (1) Os grupos Isoptera (cupins), Hymenopetra (formigas) e

Oligochaeta (minhocas) estão presentes e representam a maioria dos indivíduos em

todos os usos do solo, possivelmente contribuindo com a melhoria dos atributos

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físico-químicos, em função do seu reconhecido papel como “engenheiros do

ecossistema’’. (2) Enquanto que no Pasto predomina o grupo Hymenoptera, nos

SAF-cacau e na Floresta predominam o grupo Isoptera. (3) A riqueza total de grupos

não teve grandes diferenças entre os usos do solo. Porém, analisando as estações

separadamente, observa-se um importante incremento de 7 grupos do Pasto para o

SAF-Cacau SS, no verão. (4) A Floresta possui maior densidade entre os usos do

solo, sendo fortemente influenciada pela abundante população de Isoptera (79%).

Este grupo também é o mais abundante nos SAF-Cacau SI e SAF-Cacau SS, sendo

sua densidade relativa de 47% e 56%, respectivamente. Por outro lado, o Pasto

apresentou maior densidade relativa para Hymenoptera (52%). (5) A densidade total

de macroinvertebrados entre as estações do ano não apresentou variação

significativa. (6) analisando os usos do solo em cada estação do ano

(separadamente), apenas a Floresta e o Pasto diferenciaram-se entre si, somente

quando comparados no verão. (7) o único uso do solo influenciado pela estação do

ano foi o Pasto, ou seja, sua densidade de macroinvertebrados aumentou

significativamente do verão para o inverno. Figuras a seguir.

Figura 6 - Densidade média de macroinvertebrados do solo em função do uso do solo, para

as estações de verão e inverno.

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Figura 7 - Riqueza de grupos taxonômicos por uso do solo e por estação do ano (períodos de

coleta)

Figura 8 - Valores percentuais das variáveis estudadas em relação à Floresta, como

referência. Densidade (ind./m2); S: riqueza de espécies; H’: Índice de Shannon; D: Índice de

Simpson; J’: Índice de Pielou.

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Figura 9 - Inversão do predomínio de grupos entre SAF-Cacau SS e Pasto, considerando o Índice de

Valor de Importância (adaptado). Maior riqueza de grupos no SAF-Cacau SS do que no Pasto.

Conclusões:

• O SAF-cacau, assim como a floresta, é capaz de manter a densidade total de

macroinvertebrados mais estável entre as estações do ano.

• Não é possível afirmar a hipótese de que o SAF-cacau pode recuperar a

riqueza total ou a diversidade de grupos de macroinvertebrados do solo na

região estudada, sendo recomendado maiores estudos em São Félix do

Xingu.

4.3 Parte III: Vegetação

Pergunta: qual o potencial dos SAF-cacau para recuperação da estrutura

florestal e da diversidade florística, no contexto de São Félix do Xingu?

Hipóteses: o SAF-cacau é capaz de recuperar parcialmente: (a) a estrutura

florestal; (b) a riqueza/diversidade de plantas.

Métodos: em cada uso do solo (Pasto, Floresta, SAF-Cacau) realizei a coleta

de dados em amostras compostas por 2 parcelas (Figura 10). No total foram

amostrados 12 produtores e montadas 40 parcelas (24 em cacau, 8 em floresta e 8

em pasto), abrangendo uma área de 4 ha, nas regiões de Tancredo Neves e Xadá

do município de São Félix do Xingu – PA. Nelas foram coletados dados referentes à

estrutura florestal e à diversidade florística, incluindo as variáveis: densidade, área

basal, altura do dossel, altura do cacau, cobertura de copa, estratificação e, no caso

do SAF-Cacau e Pasto, incluiu também a composição florística das espécies

sombreadoras. Para a coleta das variáveis de regeneração natural e cobertura de

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gramíneas aloquei sistematicamente sub-parcelas (de diferentes tamanhos) dentro

dessas parcelas.

Figura 10 - Uma parcela (10x100 m) e suas sub-parcelas (2x3 m e 2x10 m)

Resultados: (1) Durante a fase de Sombra Inicial (SI), a banana (Musa sp.) é

um componente do SAF-Cacau que possui influências significativas, tanto nas

variáveis de estrutura florestal, quanto nas de fitossociologia. Em média ela

representa cerca de: 36% da densidade; 55% da área basal; 58% da abundância

relativa; e 29% do índice valor de importância. (2) As plantas de cacau dos SAF-

Cacau SI e SS, considerando apenas CAP ≥15 cm, representam 16% e 55% da

área basal, e 48% e 45% da altura do dossel, respectivamente. (3) As Figuras a

seguir mostram os demais resultados, comparando as variáveis entre os usos do

solo.

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Figura 11 - Comparativo percentual dos usos do solo em relação à Floresta (100%) para as variáveis

de estrutura florestal: Densidade (D); Área Basal (G); Cobertura de Dossel (CD); Altura de Dossel

(HD); Densidade de Regenerantes (D-RN). 1= H>1,30 m e 2= H<1,30 m

Figura 12 - Comparativo percentual dos usos do solo em relação à Floresta (100%) para as variáveis

de riqueza (S), diversidade (H’) e equitabilidade (J’)

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Conclusões:

• O SAF-Cacau SS apresentou melhorias significativas com relação ao Pasto

em todos os parâmetros e assemelha-se aos valores de florestas nativas

maduras em quase todos, mostrando-se inferior apenas em área basal (G),

altura de dossel (HD), riqueza (S) e diversidade (H’). Todavia, a tendência

dessas variáveis estruturais é crescente e o manejo adequado do

sombreamento pode propiciar a melhoria dos indicadores de diversidade,

futuramente tornando os SAF-Cacau ainda mais próximos dos ecossistemas

florestais nativos. Sendo assim, os SAF-Cacau consistem em uma potencial

ferramenta de recuperação de áreas degradadas, tendo como verdadeiras as

hipóteses de que esse sistema produtivo é capaz de recuperar parcialmente

os aspectos de estrutura florestal e de diversidade florística, em São Félix do

Xingu.

• Os SAF-cacau contribuem com a provisão de diversos serviços ambientais,

dentre eles: a proteção do solo; a manutenção e/ou recuperação da

biodiversidade florística e o estoque de biomassa arbórea.

• Considerando a riqueza da composição florística da região, SAF-cacau pode

ampliar o uso de espécies nativas no sombreamento. Nesse sentido, ressalto

a importância de maiores estudos sobre o seu manejo e, principalmente, com

enfoque na manutenção da biodiversidade através da melhoria dessa

composição em relação às florestas nativas.