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in ter la ço #1 Luiza Oliveira

Revista Interlaço

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interlaço#1

Luiza Oliveira

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çointroducao

os sapatinhos

vermelhos

luiza

oliveira

feita

a mao

Vida/acao

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revista

interlaço

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O indivíduo contemporâneo encontra-se carente de laços . A velocidade e mobilidade, características necessárias ao modo de vida de nossa so-ciedade capitalista faz com que o sujeito se “desen-raíze” culturalmente. Os ob-jetos que predominam hoje, são os que nos ajudam a viver de forma mais prática, e não aqueles com os quais estabelecemos vínculos sub-jetivos.

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Partindo desta problemática, Revista Interlaços percebe e procura retomar os elos em e entre vocês, leitores, através de manifestações artísticas atuais. Nesta primeira edição, o enfoque está na relação direta entre os laços subje-tivos e os presentes na obra de Luiza Oliveira, nossa primeira artista retratada.

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OS SAPATINHOS VERMELHOSEra uma vez uma pobre órfã que não tinha sapatos. Essa criança guardava os trapos que pudesse encontrar e, com o tempo, conseguiu costurar um par de sapatos vermelhos. Eles eram grosseiros, mas ela os adorava. Eles faziam com que ela se sentisse rica, apesar de ela passar seus dias procurando alimento nos bosques espinhosos até muito depois de escurecer. Um dia, porém, quando ela vinha caminhando com di�cul-dade pela estrada, maltrapilha e com seus sapatos vermelhos, uma carruagem dourada parou ao seu lado. Dentro dela, havia uma senhora de idade que lhe disse que ia levá-la para casa e tratá-la como se fosse sua própria �lhinha. E assim lá foram elas para a casa da rica senhora, e o cabelo da menina foi lavado e penteado. Deram-lhe roupas de baixo de um branco puríssimo, um belo vestido de lã, meias brancas e reluzentes sapatos pretos. Quando a menina perguntou pelas roupas velhas, e em especial pelos sapatos vermelhos, a senhora disse que as roupas estavam tão imundas e os sapa-tos eram tão ridículos que ela os jogara no fogo, onde se reduziram a cinzas. A menina �cou muito triste, pois, mesmo com toda a fortuna que a cercava, os modestos sapatos vermelhos feitos por suas próprias mãos haviam lhe dado uma felicidade imensa. Agora, ela era obrigada a �car sentada quieta o tempo todo, a camin-har sem saltitar e a não falar a não ser que falassem com ela, mas uma chama secreta começou a arder no seu coração e ela continuou a suspirar pelos seus velhos sapatos vermelhos mais do que por qualquer outra coisa. Como a menina tinha idade su�ciente para ser crismada no dia do sacramento, a senhora levou-a a um velho sapateiro aleijado para que ele �zesse um par de sapatos especiais para a ocasião. Na vitrina do sapateiro havia um par de lindíssimos sapatos vermelhos do melhor couro. Eles praticamente refulg-iam. Pois, apesar de sapatos vermelhos serem

escandalosos para se ir à igreja, a menina, que só sabia decidir com seu coração faminto, escolheu os sapatos vermelhos. A vista da velha senhora era tão fraca que ela, sem perceber a cor dos sapatos, pagou por eles. O velho sapateiro piscou para a menina e embrulhou os sapatos. No dia seguinte, os membros da congregação �caram alvo-roçados com os sapatos da menina. Os sapatos vermelhos brilhavam como maçãs polidas, como corações, como ameixas tingidas de vermelho. Todos olhavam carrancudos.Até os ícones na parede, até as estátuas não tiravam os olhos reprovadores dos sapatos. A menina, no entanto, gostava cada vez mais deles. Por isso, quando o bispo começou a salmodiar, o coro a cantarolar, o órgão a soar, a menina não achou que nada disso fosse mais belo que os seus sapatos vermelhos.Antes do �nal do dia, a velha senhora já estava informada dos sapatos vermelhos da sua protegida. — Nunca, nunca mais use esses sapatos vermelhos! — ameaçou a velha. No domingo seguinte, porém, a menina não conseguiu deixar de preferir os sapatos vermelhos aos pretos, e ela e a velha senhora caminharam até a igreja como de costume. À porta do templo estava um velho soldado com o braço numa tipóia. Ele usava uma jaqueta curta e tinha a barba ruiva. Ele fez uma mesura e pediu permissão para tirar o pó dos sapatos da menina. Ela estendeu o pé, e ele tamborilou na sola dos sapatos uma musiquinha compassada que lhe deu cócegas nas solas dos pés. — Lembre-se de �car para o baile — disse ele, sorrindo e piscando um olho para ela. Mais uma vez, todos lançaram olhares reprovadores para os sapatos vermelhos da menina. Ela, no entanto, adorava tanto esses sapatos que brilhavam como o carmim, como framboe-sas, como romãs, que não conseguia pensar em mais nada,

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que mal prestou atenção no culto. Estava tão ocupada virando os pés para lá e para cá para admirar os sapatos que se esque-ceu de cantar. — Que belas sapatilhas! — exclamou o soldado ferido quando ela e a velha senhora saíam da igreja. Essas palavras �zeram a menina dar alguns rodopios ali mesmo. No entanto, depois que seus pés começaram a se movimentar, eles não queriam mais parar; e ela atravessou dançando os canteiros e dobrou a esquina da igreja até dar a impressão de ter perdido total-mente o controle de si mesma. Ela dançou uma gavota, depois uma csárdás e saiu valsando pelos campos do outro lado da estrada.O cocheiro da velha senhora saltou do seu banco e correu atrás da menina. Ele a segurou e a trouxe de volta para a carru-agem, mas os pés da menina, nos sapatos vermelhos, continu-avam a dançar no ar como se ainda estivessem no chão.A velha senhora e o cocheiro começaram a puxar e a forçar, na tentativa de arrancar os sapatos vermelhos dos pés da menina. Foi um horror.Só se viam chapéus caídos e pernas que escoiceavam, mas a�nal os pés da menina se acalmaram. De volta à casa, a velha senhora en�ou os sapatos vermelhos no alto de uma prateleira e avisou a menina para nunca mais calçá-los. No entanto, a menina não conseguia deixar de olhar para eles e ansiar por eles. Para ela, eles eram o que havia de mais lindo no planeta. Não muito tempo depois, o destino quis que a velha senhora caísse de cama e, assim que os médicos saíram, a menina entrou sorrateira no quarto onde eram guardados os sapatos vermelhos. Ela os contemplou lá no alto da prateleira. Seu olhar tornou-se �xo e provocou nela um desejo tão forte que a menina tirou os sapatos da prateleira e os calçou,na crença de que eles não lhe fariam mal algum. Só que, no instante em que eles tocaram seu calcanhares e seus dedos, ela foi

dominada pelo impulso de dançar. E saiu dançando porta afora e escada abaixo, primeiro uma gavota, depois uma csárdás e em seguida giros arrojados de valsa em rápida sucessão. A menina estava num momento de glória e não percebeu que enfrentava di�culdades até que teve vontade de dançar para a esquerda e os sapatos insis-tiram em dançar para a direita. Quando ela queria dançar em círculos, os sapatos teimavam em seguir em linha reta. E, como eram os sapatos que comandavam a menina, em vez do contrário, eles a �zeram dançar estrada abaixo, atravessar os campos enlameados e penetrar na �oresta soturna e sombria. Ali, encostado numa árvore, estava o velho soldado de barba ruiva, com o braço na tipóia e usando sua jaqueta curta. — Puxa — disse ele —, que belas sapatilhas! Apavorada, a menina tentou tirar os sapatos, mas por mais que puxasse, eles continuavam �rmes. Ela saltava primeiro num pé, depois no outro, para tentar tirá- los, mas o pé que estava no chão continuava dançando assim mesmo e o outro pé na sua mão também fazia seu papel na dança. E assim, ela dançava e dançava sem parar. Por sobre os montes mais altos e pelos vales afora, na chuva, na neve e ao sol, ela dançava. Ela dançava na noite mais escura, no amanhecer e continuava dançando também ao escurecer. Só que não era uma dança agradável. Era terrível, e não havia descanso para a menina. Ela entrou no adro de uma igreja e ali um espírito guardião não quis permitir que ela entrasse. — Você irá dançar com esses sapatos vermelhos — proc-lamou o espírito — até que �que como uma alma penada, como um fantasma, até que sua pele pareça suspensa dos ossos, até que não sobre nada de você a não ser entranhas dançando. Você irá dançar de porta em porta por todas as aldeias e baterá três vezes a cada porta.

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E, quando as pessoas espiarem quem é, verão que é você e temerão que seu destino se abata sobre elas. Dancem, sapatos vermelhos. Vocês devem dançar. A menina implorou misericórdia mas, antes que pudesse continuar a suplicar, os sapatos vermelhos a levaram embora. Ela dançou por cima das urzes, através dos riachos, por cima de cercas-vivas, sem parar. Ainda dançava quando voltou à sua antiga casa e viu pessoas de luto. A velha senhora que a havia abrigado estava morta. Mesmo assim, ela passou dan-çando. Dançava porque não podia deixar de dançar. Total-mente exausta e apavorada, ela entrou dançando numa �oresta onde morava o carrasco da cidade. E o machado na parede começou a tremer assim que pressentiu que ela se aproximava. — Por favor! — implorou ela ao carrasco quando passou pela sua porta. — Por favor, corte fora meus sapatos para me livrar desse destino horrível. O carrasco cortou fora as tiras dos sapatos vermelhos com o machado, mas os sapatos não se soltaram dos pés da menina. Ela se lamentou, então, dizendo que sua vida não valia mesmo nada e que ele deveria amputar-lhe os pés. Foi o que ele fez. Com isso, os sapatos vermelhos com os pés neles continuaram dançando �oresta afora e morro acima até desaparecerem. A menina era, agora, uma pobre aleijada e teve de descobrir um jeito de sobreviver no mundo trabalhando como criada. E nunca mais ansiou por sapatos vermelhos.

Versão do conto retirada do livro “Mulheres que correm com lobos”, de Clarissa Pinkola Estés

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Luiza Oliveira

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Luiza Oliveira (sao Paulo – SP, 1994) cursou o tecnico em Comunicacao

Visual pelo Centro Paula Souza e

cursa atualmente o setimo semestre

do Bacharelado em Artes Visuais no

Centro Universitario Belas Artes.

Trabalhou como assistente de arte

em agencia de publicidade e como

educadora no Instituto de Arte Con-

temporanea.

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Feita à mão (2014)

A partir de um ou alguns novelos feitos de retalhos de tecido e juntados por nós, a performer Luiza Oliveira realiza o tricô de braço, formando uma trama cada vez mais longa. Em alguns mo-mentos, ela se desloca, levando a pesada trama consigo, arra-stando- a ou envolvendo-a em seu corpo para poder se mover.A seguir, a artista fala sobre a obra, suas ideias e seus proces-sos de criação. 11

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Tomo como referência para este trabalho em específico o conto “Os sapatinhos vermelhos” - pu-blicado nesta edição da Interlaços – retirado do capítulo “Preservação do Self “ do livro “Mulhe-res que Correm com Lobos”, onde este tem pontual importância. Neste livro, a autora analisa psicológicamente o conto dos sapatinhos, e reaviva a importância daquilo que se cria sozinho, priorizando a experiência do fazer e o processo antes do produto final, a partir de uma atividade repetitiva, mas de forma não-mecânica. O sapato feito à mão representa um mundo individual, a cri-ação imaginária de uma felicidade, de um mundo suportável.A performance “Feito a mão” consiste em sair por aí e recolher o máximo de retalhos de tecido pos-sível, pedindo a pessoas conhecidas e lugares em que estes retalhos serão descartados. Há aí relação com o processo de construção dos sapatos feitos a mão pela garota do conto. A partir destes retalhos faço, remendando-os com nós ou costuras, uma longa linha, que primeiramente torna-se um grande novelo, e que posteriormente serve de matéria prima para a feitura de um tricô com os braços, sem agulhas, apenas com o corpo. Com o tempo, a trama vai ficando cada vez maior. Além disso, em alguns momentos da ação, desloco-me tendo de levar a trama comigo, seja arrastando-a ou envolvendo-a em meu corpo para que seja viável a locomoção.

Neste trabalho procuro expressar a tentativa de reavivar o feito à mão, relacionando-o com o co- nhecimento feminino e suas tradições, mas de modo a refletir sobre a importância de uma construção do self , do gênero feminino a partir de retalhos, de pedaços de vida simplórias que são juntadas a longo prazo e que vão aos poucos formando uma identidade pessoal, identidade essa que em momento algum é única ou imutável, e sim complexa, múltipla, e em constante mudança e crescimento. Devir. O sapato feito à mão pode não ser algo tão deslumbrante quanto o belo sapato do sapateiro do conto, mas suscita muito mais questões contemporâneas do que este, sendo portanto “mais belo”.

A manufatura é algo novo, porém importante na minha percepção do mundo. Minhas vivências com a ar-tesania não são recentes, vejo minha avó costurar, bordar e tricotar desde que me conheço por gente. Já minha percepção das potências e das possíveis atualizações destes modos de criação são de pouco tempo atrás, iniciaram-se em 2012 quando fiz um curso de tricô contemporâneo com Cris Bertolucci, uma das integrantes do Coletivo Feito à Mão; o coletivo realiza intervenções urbanas integrando ao espaço da cidade em postes, árvores, etc. artesanias como o tricô e o crochê.

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O curso pretendia trazer para questionamentos da atualidade tal atividade de tradição doméstica, porém a primeira coisa que me causou estranhamento foi a falta de inserção dessas questões durante o curso, o qual tinha 90% de suas alunas senhoras ou donas de casa, e apenas eu, artista visual, e uma estudante de moda.

Me fascina o fato de a maior parte dos conhecimentos de minha avó Vivi vir das atividades manuais, mas me preocupa o posicionamento que essa atividade tem em sua condição como mulher em relação ao mundo. Ao lado de seu marido, meu avô Timo, ela sustentou sua família com a costura e o bordado. E isso me fascina! Por outro lado, me preocupa a submissão frente à postura machista de meu avô que, por exemplo, batia nela.

A partir de minhas pesquisas, vi que a migração das atividades tradicionalmente domésticas (em es-pecial as artesanias), para o ambiente artístico contemporâneo, vem desde os anos 60 no circuito internacional, como a norte-americana Faith Wilding, tendo relação com a introdução da mulher no campo profissional e com o feminismo. Já no Brasil, tal inserção se inicia a partir dos anos 80 e 90, com artistas como Leonilson, Eva Hesse, Edith Derdyk, Lia Mena Barreto, Tunga, entre outros.Com essas pesquisas sobre as práticas de tradição cultural não hegemônica, como a artesania, e também sobre o feminismo, percebi significados que a sociedade paradigmaticamente atribui à esfera do feminino. As definições dos papéis sociais de gênero dizem muito quanto à sociedade machista e seus relacionamentos de poder, e dizem também quanto à nossa necessidade de atribuir significados, palavras e imagens às coisas, nesse caso, às artesanias em geral. A artesania não é a única ativi-dade feminina tida como submissa (há também a culinária, por exemplo), mas dentre as muitas ex-istentes é a que mais me atrai por possuir possibilidades mais amplas de criação a partir da mate-rialidade e minha relação com esta.

O gênero feminino é caracterizado por algumas complexidades identitárias específicas pelo fato de simplesmente “ser mulher”, mas também por se encontrar num mundo em que isso ainda é menor do que o “ser homem”. Vejo o ato de tramar o tecido com caráter de complexidade, mas a relação entre a com-plexidade da mulher contemporânea e a complexidade da trama devem ser subjetivas, não meramente metafóricas. Chega a me afligir o caráter ilustrativo que o trabalhar com manufaturas pode adquirir ao se tratar da condição feminina atual, da minha condição. A relação performance/artesania é tanto explícita quanto subjetiva. Me interessam métodos de criação que permitem a proximidade corpórea entre artista e obra.

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Me interessa o ato não-instantâneo de formar uma trama, o ato de formar um extenso conjunto de elos ao se tricotar ou crochetar. A forma final carrega um registro do processo relacional entre o meu corpo e a matéria. Não só do corpo, mas de mim. Eu, Luiza, ser humano, vinte e um anos, su-jeito que vive no mundo contemporâneo, mulher, brasileira – descendente de indígenas, negros e italianos, (mas definida como apenas “branca” pelo Estado) - neta de Vivi, classe média, estudante de artes, e por aí vão as multiplicidades. Em visita ao ateliê da artista Lidia Lisboa, e a partir de nossas conversas, percebi que a necessidade de se trabalhar com a artesania no âmbito da arte vem não da configuração de hobby (algo praticado por prazer), e sim de sentimentos duros, difí-ceis, da angústia, da dor, de traumas sofridos, da opressão, da Hambre del Alma (termo retirado do livro Mulheres que Correm com Lobos; a alma faminta é aquela que é privada do alimento da alma, da relação com a Mulher Selvagem, da vida natural e criativa).

A vontade de fazer em si não é negativa, mas o porquê fazer não tem característica prazerosa. O lento e repetitivo processo de tricotar me interessa tanto quanto o resultado final. Os pensamen-tos de Edith Derdyk, que trabalha com a costura, têm grande relação com os meus; substituindo-se a palavra “costura” por “tricô de braço”, sinto que a artista traduz em palavras meus pensamentos; ela diz que “a percepção da costura como um ato performático me enriquece, me faz conhecer melhor a Matéria, a Arte: Arte não se sabe, se faz para perceber; e me faz conhecer a mim mesma: Só sei o que sou quando já passou. Resíduos. Os vestígios do ato são registros de minha vivência, que me lembram quem sou e o que falo. A repetição própria do ato da costura reafirma o caráter per-formático de minha obra e rebaixa a importância visual da mesma”. Gosto de pensar que corpo e ma-téria não estão hierarquizados em meu trabalho, e sim que ambos se relacionam, nunca um dominando o outro, mas sim se entrelaçando.

A dimensão em grande escala, diferindo da artesania tradicional me são importantes, para que seja mais efetivo o relacionamento com o espaço, e também com a concepção atualizada, fungindo de es-tereótipos desta criação.

Me interessa a historicidade dos tecidos e as histórias que eles possuem, vejo beleza não na qualidade, preço, ou na beleza superficial do tecido, e sim no processo de juntar pequenos pe-daços de histórias para construir a minha, seja por nós ou por remendos. Me interessa a costura, são como que suturas entre pedaços de vida.

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17Registro de performance por Pedro Kazakevicius

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Registros do processo: emendo e enovelamento

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Luiza deixa claro em seus trabalhos a rela-

cao com seu questionamento sobre seu eu no

mundo, com interesse no que e feito a mao,

artesanalmente. Suas obras de pintura,

gravura e escultura dialogam de forma bem

direta com o ser humano e suas vivências, porem, em performance ela atinge de forma

mais limpa o “feito a mao” e deixa claro

isso. Primeiramente foram juntados du-

rante o processo o máximo de retalhos de

tecidos, esses retalhos foram cortados e

emendados formando uma grande linha

grossa feita da miscigenaco dos tecidos, uma

linha organica. A tecnica do trico e a

mesma so que substituindo as agulhas pelos

proprios braços, mantendo a essência do tra-balho manual, construindo uma manta que e

feita ponto por ponto. A performance foi re-

alizada em tres dias (31 de outubro, 7, 14 de

novembro de 2014) no Centro Universitario

Belas Artes, o primeiro na parte de fora da

área de convivência, o segundo dentro do espaco Di Grado e o terceiro foi bem efe-

mero, um pouco em cada lugar, o importante

e destacar que nos deslocamentos do ter-

ceiro dia ela carregava sua propria produ-

cao sozinha. A constrcao da manta ponto por

ponto e caracteristica da tecnica do trico

so que nesse caso a apropriacao que ela faz

da tecnica funciona, passa uma ideia forte

sobre a construcao manual, evidencia o

esforco e o valor do objeto construido pe-

las maos, com paciencia. A cada ponto feito e

a cada conjunto de pontos que fazem a

manta crescer um pouco mais, parece que

mais uma etapa foi vencida, tem uma rela-

cao muito forte com a vida onde cada

aprendizado e mais um crescimento, e assim

vai ate que a malha se construa. O interes-

sante e que a acao ja e bonita por natureza,

e a construcao acontecendo bem ali na sua

frente e ainda mais quando o resultado

disso fica interessante tambem, ha uma

troca intensa entre ela e o objeto sendo

construido, o dois aprendem muito um com o

outro, isso fica evidente, afinal a constru-

cao e nua e crua, pois nao ha agulha ou tear,

e sim somente o tecido e o braco. No ultimo

dia em que ela carrega a propria artesania

fica explicito o quanto ela produziu durante

o processo, a manta fica gigante chegando a

aproximadamente 14 metros de extensao por

1 metro de largura, a tentativa de carre-

gar tudo isso enrolado, atrelado ao seu

corpo e profunda, e como carregar sua cruz.

O trajeto percorrido, passando pelas salas

dos computadores, areas de convivencia ex-

terna e interna demonstra a vontade de

caminhar com sua producao. No objeto final

o corpo dela esta intrinseco a obra apesar

de nao visivelmente de fato.

por pedro kazakevicius

vida / acao

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