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Ano XI • N.º 35 • 22 de Março a 21 de Junho 2011 Esta Revista faz parte integrante da edição do Jornal de Notícias e não pode ser vendida separadamente • Distribuição gratuita Countdown: Riparian Forest Interview: Moss, the detail is everything Report: Madagascar Contra-relógio BOSQUES RIBEIRINHOS Entrevista MUSGOS: O PORMENOR É TUDO Reportagem MADAGÁSCAR Ano Internacional das Florestas

Revista PARQUES E VIDA SELVAGEM n.º 35, Primavera de 2011

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As traves-mestras desta publicação são a educação ambiental e a conservação da natureza.A revista PARQUES E VIDA SELVAGEM sai com o JORNAL DE NOTÍCIAS.A revista PARQUES E VIDA SELVAGEM é produzida trimestralmente pelo Parque Biológico de Gaia.

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Ano XI • N.º 35 • 22 de Março a 21 de Junho 2011

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Countdown: Riparian ForestInterview: Moss, the detail is everythingReport: Madagascar

Contra-relógioBOSQUES RIBEIRINHOSEntrevistaMUSGOS: O PORMENOR É TUDOReportagemMADAGÁSCAR

Ano Internacional

das Florestas

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FICHA TÉCNICARevista “Parques e Vida Selvagem” · Direc-

tor Nuno Gomes Oliveira · Editor Parque

Biológico de Gaia · Coordenador da Re-

dacção Jorge Gomes · Fotografias Arquivo

Fotográfico do Parque Biológico de Gaia ·

Propriedade Águas e Parque Biológico de

Gaia, EEM · Pessoa colectiva 504763202 ·

Tiragem 120 000 exemplares · ISSN 1645-

2607 · N.º Registo no I.C.S. 123937. Dep. Le-

gal 170787/01 · Administração e Redacção

Parque Biológico de Gaia · Rua da Cunha

· 4430-681 Avintes · Portugal · Telefone

227878120 · E-mail: revista@parquebiologico.

pt · Página na internet http://www.parque-

biologico.pt · Conselho de Administração

José Miranda de Sousa Maciel, Nuno Gomes

Oliveira, Serafim Silva Martins, José António

Bastos Cardoso, Brito da Silva · Publicidade

Jornal de Notícias · Impressão Lisgráfica -

Impressão e Artes Gráficas, Rua Consiglieri

Pedroso, 90 · Casal de Santa Leopoldina ·

2730 Barcarena, Portugal · Capa Ranúnculo

aquático, foto de João L. Teixeira.

Esta revista resulta de uma parceria entre o Parque Biológico de Gaia e o “Jornal de Notícias”

Primavera 2011

SUMÁRIO 3

Os conteúdos editoriais da revista PARQUES E VIDA SELVAGEM são produzidos pelo Parque Biológico de Gaia, sendo contudo as opiniões nela publicadas da responsabilidade de quem as assina.

Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 3

20 BOSQUE RIBEIRINHOcontra-relógioNo ano internacional centrado nas florestas, entre outros tipos de bosques, destacam-se os bosques ribeirinhos. Também lhes chamam ripícolas e, na região Norte, nas áreas de escassa altitude, há espécies que temos o dever de lhe apresentar.

34 MUSGOS entrevistaSeja em troncos, taludes ou muros, os musgos são tapetes verdes fundamentais no quadro da biodiversidade. As investigadoras Helena Hespanhol e Cristiana Vieira, craques em briófitas, grupo em que se enquadram os musgos, conversam connosco.

38 MADAGÁSCARreportagemNo oceano Índico, Madagáscar configura um espaço único, com numerosas espécies que não existem em mais nenhum lado da Terra. Ricardo Rocha visitou o Parque Nacional de Ranomafana e, com o olhar de naturalista, partilha essa experiência consigo.

SECÇÕES

9 Ver e falar

10 Cartoon

11 Ver e falar

12 Fotonotícias

14 O voo das aves

15 Portfolio

18 Quinteiro

20 Contra-relógio

22 Dunas

25 Espaços verdes

45 Retratos naturais

52 Actualidade

55 Biblioteca

62 Crónica

Afonso Petronilho

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4 • Parques e Vida Selvagem Primavera 2011

Nesse documento fixavam-se, de modo original e inédito, os objectivos do projecto: mostrar a natureza, sem fazer uma reserva

natural; mostrar a fauna, sem fazer um jardim zoológico; mostrar a flora selvagem, sem fazer um jardim botânico; preservar e mostrar o património cultural, sem fazer um museu ou ecomuseu.A instalação arrancou nesse ano, o Parque Biológico teve a primeira visita de estudo em 21/3/1983 e o seu nome foi registado como Marca Nacional N.º 338.327 em 28/02/2000.O registo fez-se para evitar que a designação pudesse ser abusivamente usada por outros equipamentos que não respeitassem os princípios éticos e legais da conservação da natureza; nunca com carácter mercantilista ou de promover um qualquer franchising.Tanto assim é, que há anos cedemos o direito de uso da marca ao “Parque Biológico de Vinhais” e ao “Parque Biológico de Lamego” e, em Abril deste ano, ao “Parque Biológico de Lousada”, sem qualquer outra contrapartida que não um protocolo em que as partes se comprometem a cumprir os princípios acima referidos.Nos anos recentes surgiram em alguns locais do país iniciativas que usaram a marca “Parque Biológico” e que foram sendo notificadas da irregularidade desse uso.Uma dessas iniciativas persistiu no uso da

marca, o que nos obrigou em 28/12/2010 a apresentar no Tribunal da Lousã uma acção requerendo que a referida instituição abandonasse o uso da designação “Parque Biológico”. Consideramos esta acção de defesa da marca muito importante, sob pena de se banalizar um conceito criado há quase 30 anos, e de se perder todo o trabalho feito por nós, e por outros. Se a marca não for salvaguardada poderemos ter (e já temos) espaços que usam esse nome e em nada respeitam a ética ambiental.Na audiência de julgamento, que se prevê para breve, irão testemunhar em defesa do registo da marca alguns dos mais conhecidos ambientalistas e investigadores portugueses e alguns antigos governantes da área do ambiente.

Centro Interpretativo do Património da AfuradaComeçou em Janeiro a reabilitação de um antigo armazém de aprestos de pesca, existente na localidade piscatória da Afurada (Vila Nova de Gaia), com o objectivo de o transformar no Centro Interpretativo do Património do Lugar da Afurada.O espaço é propriedade da APDL (Administração dos Portos do Douro e Leixões), que estabeleceu um protocolo com

o Parque Biológico com vista à recuperação e musealização do espaço, numa acção co-financiada pelos fundos comunitários, através do QREN.Quando, para meados de 2012, abrir ao público, este espaço vai permitir compreender melhor a geografia, a história, as tradições piscatórias e a cultura deste lugar tão característico.Luís Filipe Menezes, Presidente da Câmara Municipal de Gaia, e João Paulo Matos Fernandes, Presidente da APDL, lançaram a primeira pedra de obra em 18 de Fevereiro.

Fundamentalismos I: quando as árvores caemNos últimos tempos tem sido notícia, um pouco por todo o lado, a queda de árvores, com consequências mais ou menos trágicas: Porto, 16 de Fevereiro, um homem morreu atingido por um choupo, na Rua Delfim de Lima; Porto, 16 de Fevereiro, um plátano caiu no Jardim da Arca de Água e danificou 16 viaturas; Coimbra, 17 de Fevereiro, queda de árvore no parque de estacionamento dos Hospitais da Universidade danifica três carros, e na Conchada, outra árvore, derruba um poste e danifica uma viatura.Também em Gaia tem havido alguns casos, o que levou a desenvolver uma vasta acção de prevenção, diagnosticando precocemente

Por Nuno Gomes OliveiraDirector da Revista “Parques e Vida Selvagem”

4 EDITORIAL

Em defesa da marca“Parque Biológico” O conceito “Parque Biológico” foi apresentado em 1982,

em documento enviado pelo Núcleo Português de Estudo e Protecção

da Vida Selvagem, à Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 5

todas as situações de risco com árvores públicas, e procedendo ao seu abate preventivo, sempre que necessário.Estas situações de risco têm como causas comuns maus-tratos infligidos às árvores, durante décadas: podas que não deviam ter sido feitas, corte de raízes devido a intervenções no solo (arranjo de arruamentos, condutas de saneamento, água, electricidade, etc.) e espécies desadaptadas ao solo e ao espaço aéreo e subterrâneo disponível.Infelizmente há pessoas que, nunca tendo dito nada em defesa das árvores quando lhes eram infligidos esses maus-tratos vêm, agora, protestar contra o abate preventivo, não percebendo os riscos que, assim, se pretende evitar para pessoas e bens.Estamos a pagar erros do passado, e seria um erro do presente não os corrigir. Devem-se abater as árvores doentes e com problemas de podridões e, sempre que possível, devem replantar-se espécies adequadas ao local.

Fundamentalismos II: A. R. quer institucionalizar os animais vadiosPela Resolução n.º 69/2011, publicada no “Diário da República” de 4/07/2011, a Assembleia da República (A. R.) “Recomenda ao Governo uma nova política de controlo das populações de animais errantes”; até aqui, nada de mal, antes pelo contrário,

pois é urgente pôr cobro aos prejuízos causados pelos animais errantes (penso que a resolução da A. R. se refere exclusivamente a cães e gatos, esquecendo outras espécies domésticas, igualmente errantes, que também necessitam de controlo urgente, como sejam pombos ou psitacídeos).Mas continuando a ler o texto da resolução fácil é perceber que os seus autores ignoram que os animais a que chamam “errantes” são um dos maiores flagelos para a biodiversidade, particularmente em meio urbano e suburbano, ao destruírem quantidades incontáveis de aves, pequenos mamíferos como esquilos e coelhos, répteis e anfíbios, borboletas, ninhos, etc.W(*)

Sem ter em conta a conservação da biodiversidade, a saúde e segurança públicas, no ponto 8 dessa resolução a A. R. institucionaliza o cão ou gato vadio, recomendando que o Governo “... institua o conceito de «cão ou gato comunitário» que garanta a protecção legal dos animais que são cuidados num espaço ou numa via pública limitada cuja guarda, detenção, alimentação e cuidados médico-veterinários são assegurados por uma parte de uma comunidade local de moradores.” Ou seja, passaríamos, ao invés de todos os países civilizados, e ao arrepio da legislação, a ter animais vadios com direitos de cidadania, que poderiam continuar livremente a ser alimentados nas ruas e a escavarem e defecarem em jardins públicos.Nada temos contra o estabelecimento de direitos para animais domésticos e de

companhia, mas isso não se pode fazer retirando garantias à biodiversidade autóctone de Portugal.

Novas espécies Ainda se descobrem novas espécies de plantas na Península Ibérica: investigadores do Departamento de Biologia, da Universidade de San Pablo-CEU, de Madrid, coordenados por Antonio Galán de Mera, identificaram duas novas espécies de Dente-de-leão, o Taraxacum decastroi e Taraxacum lacianense, a primeira dos Pirenéus e a segunda da Cordilheira Cantábrica.

Extinção em massaTodos os anos são descobertas 16 a 18 mil novas espécies (na maioria microscópicas), que se vêm juntar a 1,9 milhões de espécies conhecidas pela ciência; mas o problema é que o ritmo de extinções está a aumentar a cada dia, reduzindo significativamente a biodiversidade e pondo em risco o futuro – a longo prazo – da vida na Terra.Cientistas da Universidade da Califórnia, em Berkeley, estimam, com base da evolução da extinção de mamíferos (nos últimos 500 anos extinguiram-se 80 das 5 570 espécies conhecidas e várias das existentes estão em risco), que, a continuar este ritmo, dentro de três a 22 séculos se possa dar uma extinção em massa.Seria a 6.ª conhecida a ocorrer no Mundo; a

Encostas das serras Amarela e Gerês: o solo ficou gravemente exposto NGO

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última extinção em massa foi há 65 milhões de anos, e levou ao desaparecimento de cerca de 76% das espécies que existiam na Terra, entre elas os dinossauros. E a recuperação é lenta, pois a formação de novas espécies demora centenas de milhar de anos.

Tribunal Europeu e parques zoológicosConheceu-se há pouco a sentença do Tribunal Europeu de Justiça, de 09/12/2010, que condena o Reino de Espanha por incumprimento parcial da Directiva que regula a manutenção de animais selvagens em cativeiro (Directiva 1999/22/CE do Conselho, de 29 de Março de 1999). O Estado espanhol foi condenado por não encerrar os zoos sem licença e por, em algumas regiões, não emitir autorizações de funcionamento.Esta é uma boa notícia para a regularização do tráfico de animais para fins de exibição ao público, um sério problema para algumas espécies mais raras e, portanto, mais apetecíveis para exposição. Importa dizer que em Portugal, graças à actuação da Direcção-Geral de Veterinária e do Instituto de Conservação da Natureza e da Biodiversidade, a situação está praticamente regularizada.

Descoberta nova utilidade dos pirilamposQuando se aproximam as tradicionais “Noites dos Pirilampos”, que todos os anos se realizam, com enorme sucesso, no Parque Biológico de Gaia, surge mais uma descoberta sobre estes simpáticos insectos; cientistas da Faculdade de Ciências e Tecnologia Universidade de Coimbra estão a estudar, a partir da molécula que produz o brilho dos pirilampos, um marcador para aplicações biomédicas.

Áreas protegidas locais A criação de áreas protegidas locais, possibilidade criada pelo novo Regime Jurídico da Conservação da Natureza e da Biodiversidade, continua. Desta feita, é a Câmara Municipal de Oliveira de Azeméis que publica no “Diário da República” de 4/4/2011 a criação da Paisagem Protegida Local do Rio Antuã, que justifica do seguinte modo: “O rio Antuã engloba um conjunto de elementos/características que podem ser observadas em quase toda a sua extensão e são marcas da sua paisagem, hoje já quase extintas e degradadas, das quais são exemplos os açudes, pontes antigas de alvenaria, moinhos, vegetação ripícola e a tradição dos socalcos adjacentes ao rio para actividade agrícola. Devido ao seu actual estado debilitado, fazendo-se notar principalmente pela poluição que abrange quase todo o seu perímetro e pela descaracterização contínua associada a uma fragilidade visual aparente, fruto de um crescimento económico acelerado e um planeamento territorial ecologicamente menos cuidadoso, o rio Antuã necessita urgentemente de uma intervenção capaz de recuperar e salvaguardar a sua beleza paisagística/ecológica e estima de outros tempos.”Esta nova área protegida local vem juntar-se ao Estuário do Douro, Mindelo e Paul da Tornada; parabéns à Câmara Municipal de Oliveira de Azeméis e bom trabalho.

Alteração das árvores mediterrânicasJosep Peñuelas, Director da Unidade de Ecologia Global do Conselho Superior deInvestigações Científicas de Espanha, alertou, em artigo publicado numa revista científica, que a sua equipa descobriu que na última década, devido às alterações climáticas, as árvores têm menos folhas, por entrarem em

stress, devido à seca; com o prolongar da situação, podem morrer e, assim, assistir-se à diminuição de árvores na região mediterrânica.Com essa diminuição da folhagem, diminui a fotossíntese e a absorção da CO2 pelas árvores, com consequências graves para o efeito de estufa. O aumento da temperatura também permite o desenvolvimento de novas e mais frequentes doenças nas árvores.

Apagar incêndios florestais não chegaNo Verão passado o país florestal voltou a arder, como já é habitual há umas décadas, fruto de erradas opções do passado. Ardeu, e houve um enorme esforço humano e material para circunscrever esses fogos à menor área possível. Mas terá valido a pena? Atente-se na foto junta, das encostas das serras Amarela e Gerês, no vale de Vilarinho das Furnas, obtida em 27 de Fevereiro deste ano; tudo ardeu, o solo ficou gravemente exposto à erosão e nem um sinal de replantação. E podemos observar esta situação um pouco por todo o país.É evidente que, se a floresta é um recurso natural importantíssimo, mais importante é o solo que permite a sua existência; se for arrastado pela erosão das chuvas ficaremos com serranias rochosas, sem capacidade de receber nova floresta, e com rios e albufeiras assoreadas, com todos os problemas inerentes. De facto, só vale a pena o esforço dos bombeiros se, apagado o incêndio, se proceder, logo no Inverno seguinte, à replantação da área ardida, como temos visto os nossos vizinhos espanhóis fazer. Outra actuação, não passa de puro espectáculo mediático.

(*) Para mais informações pode descarregar “Gatos e

Vida Selvagem”, em: http://www.parquebiologico.

pt/doc.php?id=147&PAG=Outras%20

publica%E7%F5es

6 EDITORIAL

6 • Parques e Vida Selvagem Primavera 2011

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 7

OPINIÃO 7

Sustentabilidade é um termo que cada vez mais tem de estar no discurso

e na prática dos decisores e corresponde a um conceito que temos presente

em todas as opções e projectos de Vila Nova de Gaia

Gaia sustentável

Por sustentabilidade entende-se o uso dos recursos, naturais, económicos e culturais de modo que esses recursos não entrem

em ruptura e garantam o bem-estar dos vindouros, numa atitude que encara o mundo não como um bem exclusivamente nosso mas, também, das gerações futuras.Para uma acção ser sustentável, tem de reunir várias condições: ser ambientalmente correcta, socialmente justa e equilibrada e economicamente viável.São estes, entre outros, os princípios que têm orientado a gestão do Município de Gaia e que queremos ver cada vez mais aplicados, desde a acção ou intervenção mais modesta,

até ao grande projecto urbano.O PDM (Plano Director Municipal) de Gaia compagina estes princípios e é um guia rigoroso do desenvolvimento dos 170 km2 do nosso território.Muitos projectos realizados ou em curso são decisivos para a sustentabilidade de Vila Nova de Gaia: o Metro, que permite a redução do tráfego automóvel e a diminuição da poluição atmosférica e do ruído urbano; o tratamento das Encostas do Douro, que assegura o melhoramento da qualidade ambiental e paisagística, favorecendo a economia, através do turismo no Douro; ou a construção de novas acessibilidades, que aumentam a fluidez do trânsito, aumentando

a qualidade de vida das pessoas e reduzindo aos emissões de CO2.Num tempo de recursos financeiros escassos, desenvolvimento sustentável é, também, promover projectos privados de interesse público, como a rede de parques de estacionamento em construção ou o teleférico de Gaia, sem afectar o orçamento municipal e, portanto, sem deixar encargos para o futuro.Desenvolvimento sustentável é continuar a fazer de Vila Nova de Gaia uma cidade moderna, arrojada e competitiva e, ao mesmo tempo, conservar a natureza e a biodiversidade na nossa Reserva Natural Local do Estuário do Douro.

Por Luís Filipe MenezesPresidente da Câmara Municipalde Vila Nova de Gaia

João L. Teixeira

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 9

OPINIÃO 9

Associativismo florestal em Gaia, porque não?

Vila Nova de Gaia não é, se comparado com outros municípios do país, um território de vocação florestal; no entanto cerca de 30%

da sua área (cerca de 5 mil hectares) ainda apresenta manchas florestais dispersas, na sua generalidade associadas ao passado agro-florestal de parte considerável do concelho.Ora essa floresta tem um papel importante a desempenhar no desenvolvimento de Gaia, nomeadamente de enquadramento paisagístico; a sua manutenção e melhoria, nas Encostas do Douro por exemplo, é fundamental para evitar a erosão e, também, para qualificar a paisagem marginal da importante via de circulação turística que é, hoje, o Rio Douro.

Também no litoral a presença de maciços florestais contribui de forma importante para amenizar os efeitos dos ventos marítimos e nas áreas edificadas para a regulação do clima urbano e a fixação de poeiras e poluentes.Por isso é intenção do Município promover a floresta, tendo sido lançada, aquando da recente inauguração da exposição comemorativa do Ano Internacional da Floresta, patente no Parque Biológico, a ideia de criar uma forma de associativismo florestal, enquadrada pela legislação em vigor para o sector, e que permita preservar e melhorar o que temos, recorrendo ao PRODER e outros fundos comunitários disponíveis.O processo está em curso e constitui uma forma activa e positiva de assinalar no nosso concelho o Ano Internacional da Floresta.

Por Marco António CostaVice-presidente da Câmara Municipalde Vila Nova de Gaia

Não é por estarmos

no Ano Internacional

da Floresta que damos

mais importância

a este recurso natural

fundamental. O Ano

Internacional da Floresta

é, apenas, um sinal

de alarme para o estado

de sobre-exploração

a que chegaram

as florestas do mundo,

com consequências

graves, nomeadamente

ao nível da diminuição

da sua função

de sequestro

de Carbono

OcupaçãO flOrestal em 2003

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10 • Parques e Vida Selvagem Primavera 2011

10 VER E FALAR

cartoon

10 CARTOON

PSP reduz emissões de carbonoO Comando Metropolitano do Porto da PSP apresentou em 10 de Março no Parque Biológico de Gaia um estudo sobre as suas emissões de carbono. «O objectivo foi passar a mensagem da instituição PSP como defensora da opção Carbono Zero», afirmou Vítor Oliveira, responsável pela pesquisa, e acrescentou que «a PSP quer alargar este tipo de acções a diversas esquadras com o objectivo de reeducar os elementos policiais e também passar a mensagem para a população em geral, apontando os cuidados que devem ter em questões ambientais».Na sessão presidida pela governadora civil do Porto, Isabel Santos, ficou a saber-se que a PSP já levou a efeito uma série de acções no intuito de reduzir as emissões de carbono, indo estas desde a redução de consumo energético à utilização de energias alternativas, de que é exemplo o uso de carros eléctricos.«No distrito do Porto, 40% do solo é florestal, o que ultrapassa largamente a média mundial: 32%. Mais solo florestal é

A plantação desta árvore corporifica uma mensagem-chave: compensar as emissões de carbono

sinónimo de maior qualidade de vida», disse Isabel Santos.Houve lugar ainda a uma visita à exposição comemorativa do Ano Internacional das

Florestas, seguindo-se a plantação de diversas árvores que corporificam esta mensagem-chave: tratar de compensar as emissões de carbono para a atmosfera.

João

L. T

eixe

ira

Por Ernesto Brochado

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 11

VER E FALAR 11

Ainda há leitores que encontram a «Parques e Vida selvagem» pela primeira vez! Foi o caso de António Fernandes. Diz-nos por e-mail em 26 de Janeiro, dia de distribuição da revista com o «Jornal de Notícias»: «Foi neste momento que desfolhei a vossa revista “Parques e Vida Selvagem” penso eu pela primeira vez, e com muito agrado. Um abraço, e grato pela vossa revista».De Aveiro, Romualdo Gregório, escreve no mesmo dia: «Boa tarde! Sou um grande apreciador da vossa revista, em relação à qual mantenho uma grande expectativa quanto às novas publicações. Gostaria que a frequência da mesma fosse maior». Emanuel Sousa manifesta-se: «Devo felicitar-vos pelo trabalho fantástico que têm feito. Guardo todas as edições da vossa magnifica revista».Em 27 de Janeiro, Pedro Pereira escreve, sucinto: «Felicito-os pela Revista, muito bom trabalho».De Esposende, Jorge Silva escreve: «Saúdo a elegância da capa que, de certa forma, traduz a qualidade gráfica de toda a revista. É minha opinião, e de muitas pessoas próximas, que o efeito visual resultou muito bem. Enquanto apaixonado por História Natural, assim que a PVS me chegou às mãos, dediquei a primeira leitura ao tema de capa: foi um deleite! Como micófago inveterado e micólogo curioso apreciei especialmente a entrevista com Gabriela Santos e, já com água na boca, através das palavras quase senti o paladar das iguarias servidas no Jantar Lusitano. Confesso que

tomei a liberdade de me associar ao vosso esforço de divulgação desta edição nas redes sociais, de onde me chegaram ecos de que esta se está a tornar numa revista de culto junto de muitos leitores a procurarem números antigos (exactamente o sentimento que experimentei quando contactei pela primeira vez com a PVS, já lá vão alguns anos)».

Sanguessuga e efemerópteroEm 5 de Fevereiro Rafael Moreira diz por e-mail: «Olá! Desde já os meus parabéns pela edição anterior. Venho colocar algumas questões esperando com isto ficar esclarecido e ajudar a esclarecer os leitores que já se tenham interrogado sobre os mesmos assuntos. A primeira questão é sobre o pequeno “bicho” que está agarrado à rã-ibérica, será um parasita? A segunda é sobre o pequeno “bichinho” da imagem 4894 que apesar de se parecer mais com uma trilobite a única ideia plausível é que seja uma ninfa de libélula, estarei errado? As fotos foram feitas no rio Bestança, Cinfães, Viseu».A resposta foi dada por José Manuel Grosso-Silva, investigador do Cibio da Universidade do Porto: «O que está sobre a rã-ibérica é uma sanguessuga e o insecto é uma ninfa (forma juvenil) de um efemeróptero; pelo que dá para ver pela foto a minha primeira opção vai no sentido de uma espécie do género Rhithrogena (família Heptageniidae)».

Rede social Pelo Facebook, Araújo da Silva comentou

A falar é que a gente se entendeOs comentários dos leitores surgiram assim que a revista

de Inverno se soltou das páginas do «Jornal de Notícias»

esta edição da revista: “Está deliciosa!!!”. Longe de ser o único, José Tavares escreveu: “Mais uma revista e está excelente, como todas as outras que tenho. Infelizmente também não as tenho todas”. Manuela Oliveira escreveu: “Já comprei e gostava de ter as edições anteriores também. Muito interessante, já conheço o Parque Biológico de Gaia e tenho belíssimas fotos que irei colocar em breve aqui. E viva o Ano Internacional das Florestas. Espero que seja o mote para a preservação deste recurso natural que, embora renovável, infelizmente continua a ser dizimado pela acção “castradora” do próprio Homem!”.

Mais revistasContinuam a chegar-nos pedidos de aquisição de revistas mais antigas, por parte de vários leitores.Como entretanto já não há exemplares em armazém para atender a todos os pedidos, a alternativa de reunir uma colecção completa recai-se na internet: basta ir ao site www.parquebiologico.pt, procurar Recursos e aí Revistas — as anteriores edições da revista «Parques e Vida Selvagem» estão aí disponíveis.

Rafael Moreira

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12 FOTONOTÍCIAS

12 • Parques e Vida Selvagem Primavera 2011

12 FOTONOTÍCIAS

Todos nós a determinada altura nos admiramos com a realização de tais feitos por seres aparentemente simples e desprovidos de

tecnologia. As aves são geralmente as protagonistas mais conhecidas dessas longas deslocações, mas não estão sós, pois mesmo entre os insectos existem viajantes de longa distância.São bem conhecidas as migrações realizadas por certas espécies de borboletas como a da famosa monarca, Danaus plexippus (Linnaeus, 1758), que migra do Canadá para o México, atravessando para isso grande parte do continente americano. Também entre as libélulas existem espécies que percorrem grandes distâncias.Nas nossas libélulas também algumas espécies podem praticar amplas movimentações, mas uma em particular quer

pelo seu carácter migratório quer por ter parte dos registos no nosso território numa altura do ano que não associamos a libélulas, destaca-se e chama com isso a atenção: a Anax ephippiger (Burmeister, 1839), parente da mais conhecida Anax imperator (Leach, 1815) que faz parte da paisagem no Verão, voando sobre lagos e rios.A Anax ephippiger é um Aeshnideo tropical algumas vezes colocado no género Hemianax. Com uma distribuição algo alargada, vai do Mediterrâneo à Índia, colonizando ilhas oceânicas no Índico e penetrando na Europa, com registos para a Islândia.É presença assídua no Algarve e costa alentejana, e sabe-se que pelo menos esporadicamente se reproduz em Portugal. Tem um ciclo mais curto de vida larvar do que a generalidade das suas congéneres,

de dois e meio a quatro meses, e utiliza muitas vezes charcas temporárias para se reproduzir, estando assim equipado para ser um colonizador de novos habitats.A norte do rio Tejo tem registos ocasionais e por vezes em épocas aparentemente desconcertantes.É assim que se vão encontrando indivíduos desta espécie a voar em pleno Inverno. As últimas observações foram em Janeiro deste ano quando o autor observou vários exemplares (sete no total), fotografando alguns deles. Estes encontros deram-se nos dias 19, 21 e 24 desse mês, no Parque da Cidade do Porto e nas Dunas de Mindelo, quando as temperaturas oscilavam entre os zero graus nocturnos e os dez graus à uma hora da tarde, tudo indicando que se tratava de indivíduos errantes, de passagem.O que para muitos de nós pode ser uma

A libélula que veio no frio

São épicas as

grandes movimentações

ou migrações que

levam vários grupos

de animais a percorrer

longas distâncias por

vezes com amplitude

intercontinental

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 13

visão desconcertante, como observar uma libélula a voar contra o vento do Litoral Norte numa manhã fria de Janeiro, é um testemunho da espantosa adaptabilidade destes insectos ao meio e uma visão magnífica para desenjoar da monotonia invernal.Apesar do carácter especial desta novidade do início do ano, surgem agora os melhores momentos para apreciar este grupo de insectos, até porque estão já a aparecer as primeiras do ano no estado adulto, altura em que batem asas e evidenciam comportamentos assaz interessantes. Enriqueça os seus passeios na natureza quando deparar com estes e outros animais, em nada menos interessantes do que um elefante ou um leão em África.

Texto e foto: Albano Soares

O Programa para o Ambiente das Nações Unidas (UNEP) declarou que 2011 é também o Ano Internacional do Morcego. Misteriosos e mal-amados, os mamíferos voadores juntam-se assim às variadas iniciativas do Ano Internacional das Florestas.

Embora em países tropicais haja espécies de morcego que são polinizadoras e dispersam sementes, as duas dúzias de espécies existentes no nosso país alimentam-se de insectos.De acordo com fontes oficiais o facto de serem animais da noite dá-lhes um cariz particular e abre espaço às mais elaboradas lendas, deixando de lado aspectos fundamentais como o seu papel no equilíbrio ecológico. As espécies que se adaptaram às áreas urbanas podem chegar a consumir perto de treze toneladas de insectos numa só noite, segundo dados de quem os estuda. Os morcegos são predadores primários de insectos que voam de noite, sendo uma boa fatia destes alguns dos que custam aos agricultores muito dinheiro em perdas de produção ano a ano. A diminuição destas populações de morcegos faz aumentar a necessidade de aplicar pesticidas em produtos como o arroz ou o milho, o que não é nada bom.Segundo o portal na internet do Instituto de Conservação da Natureza e da Biodiversidade, em Portugal «existem nove espécies» de morcego «consideradas em perigo de extinção, todas elas com hábitos cavernícolas. São várias as razões apontadas para esta situação de ameaça, incluindo a perseguição directa, o uso de pesticidas, o desaparecimento de biótopos de alimentação, e a perturbação e destruição dos abrigos».Veja mais em www.icnb.pt ou em www.yearofthebat.org.

Rosa Borges

O ano dos morcegos

January Travelers The Anax ephippiger (Burmeister, 1839), is a Tropical dragonfly. With a wide distribution, they are found from the Mediterranean to India, colonizing the oceanic islands in the Indian Ocean and penetrate into Europe, with records as far north as in Iceland. In Portugal, they are constantly present in the Algarve and the Alentejo coastal regions where they occasionally breed.

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14 BATER DE ASA

14 • Parques e Vida Selvagem Primavera 2011

Aberto todos os dias das 9h às 18hPraia da Aguda • Vila Nova de Gaia

Aquário e Museu das Pescas

GAIvoTA-de-AsA-esCurA Larus fuscusAnilha n.º NOS 4228930 (Stavanger Museum – Noruega)

Anilhada, ainda juvenil no ninho, em 21/07/2010 no Sul da Noruega, foi encontrada morta em Gaia, na praia de Miramar, em 30/09/2010; em 71 dias tinha percorrido 2 212 km. Esta espécie nidifica principalmente no Centro e Norte da Europa, ocorre em Portugal durante todo o ano, mas em maior número no Inverno; é de fácil observação na Reserva Natural Local do Estuário do Douro.

O voo das aves Continuamos

a registar o “voo

das aves”, ou seja,

as suas migrações,

através da recolha

de anilhas de

aves capturadas

por caçadores,

encontradas mortas

ou acidentalmente

capturadas, dando

continuação a uma

antiga tradição da

imprensa portuguesa,

que se perdeu, com

prejuízo para o estudo

das migrações

Tordo-Comum Turdus philomelosAnilha n.º 22Z35218(Museu de Bruxelas)

Anilhado em 13/10/2009, perto de Bruxelas, na Bélgica, foi abatido a tiro em 13/12/2009 em Parada, Bragança, tendo percorrido em 2 meses certos 1 375 km, na sua migração para sul, quando os tordos do Norte vêm invernar no Sul da Europa e Norte de África; a espécie também nidifica em Portugal, onde pode ser vista todo o ano.

Por Nuno Gomes Oliveira

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 15

PORTFOLIO 15

É já pelo 9.º ano consecutivo que esta revista lança o seu concurso nacional de fotografia da natureza com a finalidade levar mais longe

o seu esforço de educação ambiental.Como os leitores e diversas comunidades fotográficas lhe têm respondido de uma forma cada vez mais positiva, surge agora, renovada, a edição anual deste certame de fotografia da natureza. Afinal, trata-se de uma ferramenta capaz de levar os participantes a um melhor conhecimento do património natural lusitano, gerando afectos em torno da temática da conservação da biodiversidade. Como seria possível querer proteger o que se desconhece? Nestas páginas, obviamente com trabalhos do ano passado, reunimos alguns representantes do grupo (ainda) minoritário dos juniores, ou seja, dos concorrentes com menos de 15 anos de idade. Tendo visto esta categoria criada há apenas dois anos, 2010 assinalou uma adesão significativa, o que levou a criar em 2011, só neste item, três prémios: Prémio A – equipamento no valor de cem euros; Prémio B e C – conjunto de livros sobre natureza. A boa resposta das restantes idades levou a que se seccionasse o leque temático: Prémio na categoria Arte Fotográfica – equipamento fotográfico no valor de 700 euros; Prémio na categoria Registo Documental – equipamento no valor de 300 euros; Prémio na categoria Paisagem – equipamento no valor de 150 euros; Prémio na categoria Flora, Líquenes e Fungos – equipamento no valor de 150 euros; Prémio na categoria Fauna – equipamento no valor de 150 euros. No que toca ao concurso deste ano, embora o prazo termine só em 30 de Setembro, seja mais novo ou mais velho, não deixe de aproveitar esta brisa primaveril para observar melhor os motivos viáveis e, se decidir concorrer, leia o regulamento antes de preencher a ficha de inscrição (grátis)! Para o obter basta ir ao site www.parquebiologico.pt e aí procurar o botão Actividades, restando depois clicar em Fotografia. Clic!

Novo concursode fotografia

“Gamo”, de Marta Vasconcelos, 14 anos

“À espreita”, de Rui Casa Nova, 12 anos

“Asas de neve”, de Afonso Petronilho, 8 anos

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16 PORTFOLIO

16 • Parques e Vida Selvagem Primavera 2011

16 PORTFOLIO

“Flamingos”, de Catarina Araújo, 4 anos

“Fishing”, de Gonçalo Amaral, 11 anos

“Na praia”, de Ana Fernandes, 14 anos “Guincho”, de Pedro Cardoso, 14 anos

“Walking on fire”, de Manuel Malva, 14 anos

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 17

“Mosca-abelha”, de João Nunes, 10 anos

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18 QUINTEIRO

18 • Parques e Vida Selvagem Primavera 2011

Há vidas

secretas no seu jardim?

No que toca às aves

selvagens que visitam

o seu lar, cuidar da prole

é a preocupação central

nesta época, mas,

a julgar pelos dados

que estão a surgir

no que diz respeito

à sagaz raposa, fique

atento: já estiveram mais

longe de aparecer nas

redondezas...

Não julgue que é capaz de contar apenas pelos dedos os visitantes secretos do seu quintal. A natureza é surpreendente! Enquanto vê televisão depois do jantar, esvoaçam morcegos à cata de insectos alados e uma toupeira procura alimento nos túneis que escava terra fora. O sapo não deixa agora escapar um certo escaravelho e o ratinho-das-hortas cuida do que ninguém faz por ele… Se vive no subúrbio, as surpresas serão capazes de esticar a corda e, quem sabe, dar-se-á o caso de deparar com uma raposa a explorar as oportunidades ao pé da sua

porta. A fazer fé na pesquisa que se processa um pouco por todo o Globo, e em Portugal também, este cenário é mais verosímil do que poderia imaginar. Alexandre Valente, professor do Departamento de Biologia da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, chefia a equipa que está a desenvolver um estudo sobre populações de raposa que se adaptam a uma vida nas cidades: «Queremos responder a algumas perguntas sobre a raposa nos ecossistemas urbanos», diz. Algumas das indagações são estas – Onde existem e qual a sua abundância? Que habitats escolhem? Qual a área de que precisam para sobreviver? Como se adaptam ao ambiente urbano?Através do relato de observações pontuais, a verdade é que as raposas se conseguiram adaptar e chegam até a reproduzir-se nalgumas áreas das nossas cidades.

Além disso, juntam-se outros dados que reforçam a evidência, como as datas de entrada destes animais, geralmente juvenis, por exemplo, no Centro de Recuperação de Fauna Selvagem do Parque Biológico de Gaia, entre Abril e Julho. É precisamente este período do ano que corresponde às primeiras explorações juvenis além da toca destes espertos animais selvagens. «Em Vila Nova de Gaia a investigação sobre a ocorrência de raposas está em curso desde Outubro do ano passado», afirma o biólogo e continua: «A equipa contactou autoridades e as instituições adequadas nesse sentido e disponibiliza questionários no site do projecto»(1), o que aumenta a possibilidade de registo de observações de raposa. Embora à primeira vista possa causar surpresa, o fenómeno não justifica espanto. Adianta Alexandre Valente que, «se tivermos em linha de conta as necessidades territoriais

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 19

À medida que a vegetação gera flores e folhas, uma miríade de pequenos animais a que o ser humano não costuma dar importância acelera o ciclo de vida e torna-se o prato preferido até de aves que estamos habituados a ver à volta dos comedouros instalados para elas no jardim, como sejam diversos chapins, verdilhões, pardais, tentilhões e muitos outros.Seja na capacidade de oferecer alimento seja na de proporcionar ninhos artificiais para as aves que gostam de nidificar em orifícios, nem sempre tudo são rosas. É disso que nos fala Ernesto Brochado, chamando-lhes casos de fracasso: «Envio foto de um ninho com ovos (os pais terão morrido) e caixas-ninho constantemente alargadas. Tenho de colocar argolas de metal. Tentei tirar uma foto a um esquilo na caixa-ninho, querendo perturbá-lo o menos possível. Não se vê nada a não ser uma bola de pêlo. Repare que ele predou um ninho de chapim. Nota-se o tapete de cotão feito pelas aves, a que o esquilo acrescentou cascas e caruma», acrescenta.A predação de ninhos faz parte das cadeias alimentares que se constituem na natureza. Quando instala caixas-ninho no seu jardim entra nesses circuitos, que fazem parte do equilíbrio entre espécies. Outras vezes as caixas-ninho acabam por ser preteridas pelas aves e adoptados, por exemplo, por abelhões, o que na verdade não é um prejuízo, uma vez que os serviços que estes insectos prestam são valiosos, sobretudo na área da fertilização das flores, o que aumenta a produção de frutos e sementes.

Caixas-ninho

Garden & Wildlife The main concern of the wildlife in your garden is the taking care of the offspring. Judging by recent data, the shrewd fox is approaching the vicinity of the Park. Alexandre Valente leads a team that is developing studies on fox populations that have adapted to urban life.

e de alimentação das raposas suburbanas, podemos concluir que o habitat ainda é viável, apesar da redução e fragmentação do mesmo nas últimas décadas», o que não obsta a que «se torne necessário juntar com urgência mais informação sobre estes carnívoros que vivem perto de cidades». A adaptação das raposas à urbe foi estudada pela primeira vez na Grã-Bretanha(2), na década de 1930. Apesar de se saber que a raposa é um animal abundante na Inglaterra, a verdade é que se gerou um efeito em cadeia, sendo esta espécie de canídeo objecto de investigação noutros países da Europa, na América do Norte, Austrália e até em cidades asiáticas. No que diz respeito à península Ibérica, «está a fazer-se agora o primeiro ponto da situação», afirma. Se quiser pode mesmo colaborar no estudo fornecendo aos investigadores informações sobre locais onde tenha visto raposas.

«Haver uma raposa à porta de casa», diz Valente, «não é motivo de preocupação. São poucas as doenças que a raposa pode transmitir aos nossos animais domésticos (cães e gatos) e são todas facilmente tratáveis».Ainda assim, «não queira transformar uma raposa num animal doméstico, por muito que lhe pareçam bonitas». Se aparecer alguma, poderá acontecer que se habitue «a visitá-lo regularmente, se lhe disponibilizar alimento no seu jardim (comem praticamente de tudo)». A raposa depressa se habituará à sua presença e voltará à procura de uma refeição fácil.

Texto: Jorge Gomes

[1] http://raposa-pt.fc.up.pt

[2] Harris, S. and Baker, P. (2001), Urban

foxes,Whittet Books, Stowmarket, Suffolk.

Mais: [email protected]

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Florinda Oliveira Florinda Oliveira

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20 • Parques e Vida Selvagem Primavera 2011

20 CONTRA-RELÓGIO

Bosque ribeirinho À partida, fica apenas

um som seco no ouvido,

esquecida a raiz

da palavra. Salgueiros,

Amial, Freixieiro…

O significado destas palavras enterrou-se no tempo, geração após geração. Se alguém lhe pergunta, por

exemplo, onde vai, sendo o caso dirá mecanicamente: «Vou a Salgueiros, lá para os lados da praia, em Canidelo».Na verdade, há um certo tempo terá existido ali um salgueiral, cúmplice de ribeiras que escoam para o mar.Mais tarde ou mais cedo, responderá de outra maneira à mesma pergunta, «Vou ao Amial», e deixará longe a ideia de que o nome teve a ver com um bosque de amieiros existente naquele sítio. Ou ainda: «Tenho de ir a Freixieiro, a Oliveira do Douro», local onde um ou mais freixos foram protagonistas da paisagem… Quando passar nos Carvalhos, dispara outra referência toponímica a um carvalhal, um bosque de carvalho-alvarinho.As florestas marcaram desde sempre a paisagem, âncoras da água que nutre a vida.Ainda que o cenário se transforme os nomes ficam, nascidos de uma realidade antiga. No ano internacional centrado nas florestas, entre outros tipos de bosques, um grupo especial agrega os bosques ribeirinhos.Também lhes chamam ripícolas e, na região Norte, nas áreas de escassa altitude,

ripícolas nas quais as copas de uma e outra margem se entrelaçam. Este facto cobre o ribeiro de sombra, reduzindo a temperatura da água, o que faz com que esta retenha óptimos níveis de oxigénio dissolvido. Toda a vida aquática lhe fica grata por isso – insectos, anelídeos, peixes, anfíbios, mamíferos, aves… – e, como se não bastasse, as raízes, ao mergulharem no leito do rio, absorvem nutrientes da água, ajudando a purificá-la. Característicos da região Atlântica, os amiais estão protegidos por lei, o que dispersa benefícios gerais alargados a toda a galeria ripícola.Ao ouvir a brisa que abana a folhagem perceberá: os amieiros são generosos a ponto de abrigarem outras espécies. É o caso dos salgueiros, do sanguinho-de-água ou do

No Ano Internacional das Florestas o bosque ribeirinho é incontornável

há espécies que temos o dever de lhe apresentar.Quando passeia no Parque Biológico de Gaia encontra a identificação de uma série de vegetação mais emblemática e, apesar de conhecer alguns desses nomes de ouvido, pode fruir do prazer de olhar directamente estas espécies do património florístico lusitano.Nas margens dos rios levantam-se os amieiros, a árvore ex-líbris deste bosque ribeirinho. Agora vê-os com as suas novas folhas ovais a abanar ao sol, passada a floração. Em ramos diferentes, cada árvore possui flores femininas e masculinas. Com a ajuda do vento, as pequenas “pinhas” recebem o pólen que as vai fecundar. Chamam-lhes por isso os botânicos espécie monóica.Os bosques de amieiro são amiais, manchas características de planícies aluvionares e das margens dos cursos de água permanentes. Ocupam solos profundos, permanentemente encharcados ou muito húmidos. Estas árvores podem também viver em solos pobres, já que as suas raízes têm talento para fixar azoto atmosférico. De crescimento rápido, o amieiro chega a atingir cem anos de idade. Quando densos, os amiais criam as chamadas galerias

Cuco

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 21

loureiro e de arbustos como o sabugueiro, de herbáceas como o canabraz, as violetas-bravas ou, entre outros, os ranúnculos...Merece também destaque o feto-real, espécie típica destes habitats.

Correm à vistaEssas linhas marcam a paisagem pela vegetação que procura com rigor o desenho da água e abrem caminho aos chamados corredores verdes.Na natureza nada existe isolado, nem mesmo o ser humano, ao contrário do que se pensava há séculos.Um equilíbrio subtil e delicado de interdependência une seres ínfimos e organismos superiores num roteiro de colaboração intrínseca.Se quase esquecemos peixes diversos, como

as enguias que vindas do mar sobem os rios, pelo ar são inúmeras as aves que percorrem longas distâncias, agora na Primavera vindas de centenas ou milhares de quilómetros a sul.Embora a maior parte dessas espécies escapem a quem não está atento, há serviços que permitem detectar esses movimentos.Foi isso que aconteceu quando já por várias vezes, em pleno Verão, uma das redes de anilhagem científica de aves selvagens nas margens do rio Febros capturaram cucos, uma espécie que, após o período de reprodução, se dirige para África, onde passa a época mais fria do ano.Não são caso único. Discretos, os rouxinóis-bravos são outra espécie de ave que, esta no Inverno, foge do frio dos rios em altitude rumo a terras brandas, aparecendo nestas outras

margens, como aconteceu em Setembro com o rouxinol-bravo, Cettia cetti. Não é de admirar. Se com um esforço de imaginação se puser no lugar de uma ave selvagem que tem de fazer pela vida todos os dias, sem férias, a empreender grandes migrações, quando lá de cima avista um corredor destes, chega ali atraída por um poderoso íman, onde encontra cama, mesa e, se não tem roupa lavada, pode tratar das penas que tem à exaustão, não vá cair uma noite fria.Estes bosques ribeirinhos, além de estabilizarem as margens do rio, aumentam a qualidade da água, consolidam habitats necessários à vida e reprodução de peixes de evidente valor comercial. Se tal função ecológica é inestimável, o seu valor económico também merece consideração total.Resta referir uma função lúdica e educativa, para que se consiga aprender o mais cedo possível que nem só aquilo que é pago é indispensável à sobrevivência e o que temos como certo poderá não estar sempre a gerar a valia a que nos habituámos.

Texto: Jorge Gomes e Henrique N. Alves

Sanguinho-de-água

Salgueiro-negro

Amieiro

Riparian Forest In the “International Year of Forests”, the Riparian Forest stands out! Here, there are species to be found that we feel obliged to present to you. When visiting the Biological Park of Gaia, you will be able to identify a whole series of the more emblematic varieties. Although you may have only previously heard the names of the Iberian Flora, here at the Park you can see them in close proximity.

Feto-real

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22 DUNAS

22 • Parques e Vida Selvagem Primavera 2011

Cordão dunar

A maior parte das pessoas que agora passeiam nos passadiços do cordão de dunas de Vila Nova de Gaia não terá decerto

ideia dos percalços de causados pelas marés-vivas da época mais fria do ano.Quer as secções dos passadiços desfeitas pelas ondas quer as movimentações de areia teriam sido bem mais drásticas se não fosse o sistema de dunas. A agressividade marinha abranda ao encontrar a areia

agregada pelas plantas típicas destes espaços à beira-mar.Agora, quando numa visita aos passadiços do cordão dunar se vê tanta gente a desfrutar da paisagem, fica na ideia este facto: o litoral é encarado em primeira linha por quem o visita como um espaço de lazer.É natural. A proximidade do mar e a paisagem característica atraem inúmeras pessoas que ali recarregam energias, se descontraem e fazem exercício, esticando o

passo ao longo dos seus 14 quilómetros de extensão.Mas ao contrário do que se possa imaginar a verdade é que o lazer é só um dos aspectos associados a esta faixa costeira.A diversidade biológica que é própria destes habitats não deve ser esquecida, até porque foram as características deste habitat e as espécies locais que lhe atribuíram, segundo leis da Comunidade Europeia, estatuto de protecção, a partir da Directiva Habitats.

Agora que dezenas de plantas das dunas abanam ao vento as suas flores, também os borrelhos-de-coleira-interrompida defendem neste habitat, casal a casal, os seus territórios de nidificação.Aqui e ali, sempre atentos a quem põe o pé nos passadiços para um agradável passeio, está um ou outro inofensivo sardão, sobretudo machos que não querem perder a oportunidade de namoricar, agora que chegou a época do romance.Face a esta mão-cheia de biodiversidade, o Parque Biológico de Gaia organiza uma observação de aves no Parque de Dunas da Aguda em 8 de Maio, domingo, entre as dez e o meio-dia. Nessa altura estarão ali técnicos do Parque para ajudar nas observações que os visitantes queiram realizar. Com entrada livre, basta-lhe aparecer para dar as suas espreitadelas de Primavera. Esta pequena reserva natural visa explicar a necessidade de se proteger as dunas e a sua biodiversidade.

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Borrelho-de-coleira-interrompida

Parque de Dunas da Aguda

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DUNAS 23

Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 23

Os moluscos

são um dos mais

importantes grupos

de animais

da zona-entre-marés,

quer pela extensão das

áreas colonizadas quer

pela sua abundância

A maioria apresenta uma concha endurecida com carbonato de cálcio e outros minerais ex-traídos da água do mar, que protege e sustenta as partes moles do corpo. Os sexos podem ser separados e o ciclo da vida inclui geralmen-te uma forma larvar pelágica.

Os quítones (polyplacophora) são comuns no litoral rochoso mas não se detectam fa-cilmente porque estão bem camuflados nas rochas, nas quais se arrastam à procura das algas. Lepidochitona cinerea abriga-se nos agregados de mexilhões e encontra-se debai-xo das pedrasfig. 1.

A classe dos gastrópodes está bem repre-

sentada em todos os níveis da zona-entre-marés. As lapas Patella spp. são autênticas ventosas agarradas às rochas que só se sol-tam involuntariamente quando apanhadas de surpresa e antes que o pé musculoso as fixe ao substratofig. 2. Cada lapa passa a maior parte do tempo numa pequena cavidade na rocha, que lhe fornece maior segurança e que ela própria escava com o bordo da concha. Alimentam-se de algas marinhas fixadas à rocha e para isso afastam-se lentamente da sua residência prin-cipal, deixando rastos característicos.

O caramujo Monodonta lineata aparece na parte superior do eulitoralfig. 3, enquanto na par-te média o burrié Gibbula umbilicalis é mais co-mumfig. 4. Ambas as espécies são herbívoras. O búzio Nucella lapillus é um predador de cracas, bálanos e mexilhões, abundante desde o euli-toral médio até à franja sublitoral, onde deixa tufos de ovos amarelosfig. 5.

As vinagreiras-do-mar possuem uma pe-quena concha interna, recoberta pelo manto. O corpo é mole e o pé apresenta dois gran-des parápodes, que normalmente se unem na região posterior e permitem a natação. A cor é muito variável e quando incomodadas, ejectam um líquido púrpura. Aplysia depilans encontra-se nas poças do eulitoral com vege-tação, especialmente na Primavera, quando vêm à costa para desovarfig. 6. As posturas de milhões de ovos, brancos ou cor-de-rosa, têm

a forma de cordões que podem atingir vários metros.

Os bivalves incluem animais filtradores como os mexilhões, as vieiras e ostras, que utilizam as brânquias para capturar partículas orgânicas em suspensão na água. O mexi-lhão Mytilus galloprovincialis é a espécie mais importante, formando bancos muito extensos no eulitoral médio que, por vezes, se estendem até ao sublitoralfig. 7.

Os cefalópodes são caracterizados por um corpo em forma de saco e pela ausência de concha interna. O pé sofreu uma modificação extrema, dividindo-se em oito tentáculos, pro-vidos de ventosas e unidos na base por uma membrana de pele. Estão representados pelo polvo Octopus vulgaris que abunda entre e de-baixo das pedras nas poças do eulitoral infe-rior e na franja sublitoralfig. 8. Possui um cérebro bem desenvolvido e olhos muito complexos. Move-se rapidamente e é um predador activo de crustáceos, sobretudo à noite.

Por Mike Weber e José Pedro Oliveira

Flora e fauna marinhas do litoral de Vila Nova de Gaia

ELA - Estação Litoral da AgudaRua Alfredo Dias, Praia da Aguda,4410-475 Arcozelo • Vila Nova de Gaia

Tel.: 227 536 360 / Fax: 227 535 [email protected]

1. Quítones, Lepidochitona cinerea 2. Lapas, Patella sp. 3. Caramujo, Monodonta lineata 4. Burrié, Gibbula umbilicalis

6. Vinagreira-do-mar, Aplysia depilans 7. Mexilhões, Mytilus galloprovincialis 8. Polvo, Octopus vulgaris 5. Búzios, Nucella lapillus

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apareceu também uma lontra no rio Douro, na ribeira de Vila Nova de Gaia, mas desta vez num cenário de crime, já que apareceu morta com dezenas de chumbos de caçadeira, conforme demonstra o raio-x.

Novas observaçõesEm 3 de Abril observou-se um picanço-barreteiro, Lanius senator, na Reserva Natural Local do Estuário do Douro (RNLED). Trata-se do primeiro registo da espécie nesta reserva, aumentando para 189 o número de espécies de aves cuja ocorrência está confirmada. Do dia 17 ao dia 23 de Março observaram-se sete espécies diferentes de aves de presa: águia-de-asa-redonda, águia-

24 DUNAS

24 • Parques e Vida Selvagem Primavera 2011

Ao longe nem se percebem, mas com um olhar mais atento, nos domingos de 8 de Maio e 5 de Junho, se visitar

a Reserva Natural Local do Estuário do Douro entre as dez e as 12h00, sentirá a ajuda de um técnico na identificação das

muitas e diferentes aves do Litoral que ali ocorrem. Embora estes animais não tenham compromisso com o ser humano, poderá decerto ver gaivotas e garças de várias espécies, borrelhos, maçaricos, cartaxos, andorinhas-do-mar e muitas outras aves que agora se deslocam para Norte ou

se preparam para nidificar neste espaço protegido. O centro de interpretação desta Reserva está aberto todos os dias, de segunda a sexta-feira, das 9h30 às 13h00 e das 14h00 às 16h30; aos sábados e domingos abre das 9h30 às 13h00 e das 14h00 às 17h00. A entrada é grátis!

As fotografias de registo são mesmo assim: um clic rápido a nadar em imprevistos. E a luz? É pouca? É a luz do momento breve e terá de servir. Quanto à focagem, seja a que aprouver à máquina...Foi o que protagonizou pelas quatro da manhã de 1 de Fevereiro o vigilante de uma obra a decorrer em Canidelo. Com o dispositivo fotográfico do telemóvel, ao ver uma lontra a passar do rio Douro para os campos das proximidades, clic! Activa de noite, supõe-se que esta lontra durma de dia numa toca perto da margem do rio e procure alimento ao luar. Foi a primeira vez que esta espécie foi fotografada na Reserva Natural Local do Estuário do Douro, em Gaia.Em 26 de Março, noutra circunstância,

Estuário do Douro

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Águia-calçada

calçada, milhafre-negro, açor, falcão-peregrino, peneireiro, gavião. Só no dia 17 ocorreram cinco delas correspondendo a sete indivíduos. Isto revela que a reserva apresenta uma melhoria de condições de habitat. Todas estas espécies estão no topo da cadeia trófica, sendo a sua presença indicadora de condições relacionadas com o número de presas.

Lontras no estuárioPicanço-barreteiro na RNLED

Page 25: Revista PARQUES E VIDA SELVAGEM n.º 35, Primavera de 2011

Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 25

ESPAÇOS VERDES 25

No topo do parque a casa da Eira irá acolher uma exposição temática

Entrada do Parque da Lavandeira, junto a um amplo espaço para estacionamento Estufa restaurada com silhuetas de aves para que não colidam com os vidros

Agora que a Primavera vai de vento em popa, sabe ainda melhor visitar em Crestuma este parque botânico e arqueológico

associado ao lazer. Com a subida da temperatura e a chuva que vai caindo, uma primeira vaga de plantas apressa-se a florir.Nalgumas partes, consegue ver Sedum,

silenes a pintalgarem de tons rosa as rochas ou o solo e, entre muitas outras, em contrapartida, as abróteas erguem a sua flor branca, cheia de néctar que atrai muitos insectos. É possível ver toda aquela esta vegetação em festa porque na criação do parque se tirou partido da vegetação preexistente, socalco a socalco, o que lhe dá uma feição singular.

Sedum sp.: as plantas silvestres parecem até brotar do xisto, sem mais nem menos

Situado em Oliveira do Douro, este Parque oferece-lhe várias vertentes de lazer, como percursos pedestres, zonas de

merendas e jardins temáticos.Além disso, aos sábados de manhã, há venda de legumes sem pesticidas: “As mulheres do campo vêm à vila”.

Às quartas e sextas-feiras às 9h45 há yoga, com orientação da responsabilidade da Dr.ª Luísa Bernardo, que proporciona a actividade em regime de voluntariado.Também a associação Ilha Mágica irá em breve desenvolver actividades no interior do Parque, mas para já pode contar nos domingos de 8 de Maio, de 5 de Junho e de 3

de Julho com uma Feira de Artesanato. Sendo a entrada grátis, este espaço verde de cerca de 11 hectares está aberto todos os dias, do nascer ao pôr-do-sol.Produto da aquisição pelo Município gaiense da antiga Quinta da Lavandeira, abriu ao público em Agosto de 2005.

Parque da Lavandeira

Entre outras espécies encontra ali freixos, sobreiros, carvalhos autóctones, medronheiros e também alguns endemismos, como, do Norte de Portugal, com as suas flores azuis, a Omphalodes nitida.Aberto ao público há dois anos, este espaço verde resultou da aquisição por parte do Município de Vila Nova de Gaia de uma velha quinta abandonada. Na margem Sul do rio Douro, o Parque Botânico do Castelo oferece uma paisagem assaz agradável a quem o visita.Aberto todos os dias, a entrada neste parque é gratuita.

Parque Botânico do Castelo

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26 • Parques e Vida Selvagem Primavera 2011

26 ESPAÇOS VERDES

Ano Internacional das FlorestasNa manhã de 4

de Fevereiro abriu

uma nova exposição

no Parque Biológico

de Gaia, subordinada

ao tema forte de 2011,

as florestas

Ao lado de um mapa do Globo, com as áreas a verde e a vermelho a representarem a regressão da floresta no tempo, aparecem dados preocupantes: a desflorestação da Terra regista uma média de 13 milhões de hectares por ano. As consequências correm no sentido dos mais variados desequilíbrios climáticos.O tema foi lançado pelas Nações Unidas para 2011 no intuito de fazer reflectir em torno do valor real dos bosques. Na abertura da exposição, o vice-presidente do Município de Vila Nova de Gaia, Marco António Costa, apelou a que os diversos órgãos de comunicação social presentes divulgassem este trabalho, já que na sua perspectiva se trata de «um importante espaço de educação cívica e de complemento pedagógico, que serve de alerta à visível atitude predadora humana, face aos recursos naturais do planeta e à necessidade de preservação florestal». Quem visitar esta mostra, consegue palmilhar uma síntese da evolução da floresta, do seu elevado valor, das suas características e funções essenciais. No discurso, Marco António Costa falou da criação no concelho da Liga dos Amigos da Floresta, medida institucional que irá agregar entidades públicas e privadas em torno do património florestal: «Na prática, pretende constituir um serviço técnico de aconselhamento e apoio aos proprietários privados de Gaia, para uma boa gestão das suas unidades territoriais e um maior cuidado na manutenção das florestas. É mais um passo na nossa intervenção

ambiental, agora no âmbito privado», sublinhou. Nuno Oliveira, do Parque Biológico de Gaia, disse que este trabalho visa numa primeira linha «sensibilizar as escolas e a população em geral para um grande problema que aflige a humanidade, o decréscimo das florestas», algo que está «directamente relacionado com o aquecimento global», bem como alertar para «a necessidade de proteger e aumentar a área florestal e com isso garantir qualidade de vida».Esta mostra pode ser visitada no Parque Biológico de Gaia, todos os dias, no seu horário de abertura.

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 27

Ano Internacional das Florestas Centro Interpretativoda Afurada

Quando visitar dentro de um ano a vila piscatória da Afurada, vai poder visitar um novo espaço museológico cuja primeira pedra foi lançada no passado dia 18 de Fevereiro por Luís Filipe Menezes, presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia.Arranca assim o núcleo museológico sobre a actividade piscatória local, que vai aproveitar antigos armazéns de aprestos. O surgimento deste espaço resulta de uma parceria entre o Município, a Administração

dos Portos do Douro e Leixões (APDL) e o Parque Biológico de Gaia. Menezes disse tratar-se «de uma obra importante para a população e uma forma de os turistas conhecerem melhor a vida dos afurenses». Por sua vez, Matos Fernandes, presidente da APDL, sublinhou que «tendo em conta que era importantíssimo reabilitar o património, decidimos enveredar por um projecto mais ambicioso». A ideia é criar um espaço onde se possa preservar o património do estuário do Douro.

João L. Teixeira

Livro sobre empresas municipaisEm 27 de Janeiro, o Parque Biológico de Gaia lançou o livro de Catarina Siquet intitulado “Empresas municipais: enquadramento jurídico, contabilístico, fiscal e auditoria”.Tendo sido enquadrado ainda dentro das celebrações dos 10 anos de empresa municipal, ocorridos em Julho passado, a autora referiu que «as empresas municipais se multiplicaram na década

de 90 e nasceram para gerir serviços públicos que, mesmo assim, conseguem ter uma maior eficiência se forem geridos de uma forma individualizada. Reduz-se a burocracia, é tudo mais ágil», disse. Em termos de gestão, «há situações mais difíceis de tratar, neste caso não é matemática pura», pois «lida-se com colecções de seres vivos, sejam eles animais ou plantas».

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28 ESPAÇOS VERDES

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28 ESPAÇOS VERDES

Agenda

Oficinas de PrimaveraDecorrem hoje e amanhã, 21 Abril, das 9h00 às 17h30, e destinam-se a crianças dos 6 aos 15 anos. Veja mais: www.parquebiologico.pt indo a Actividades Campos de férias e Oficinas. Inscrição necessária.

Observação de aves selvagens na Reserva Natural Local do Estuário do DouroNos domingos de 8 de Maio e 5 de Junho, entre as 10h00 e o meio-dia, vá à baía de S. Paio, no estuário do rio Douro, do lado de Gaia. Com telescópio, estará um técnico do Parque para ajudar os presentes a identificar as aves do Litoral.

Noites dos Pirilampos Sempre sujeitas a marcação, este ano as visitas nocturnas decorrem nas seguintes datas: noites de 10 e 11 de Junho, de 13 a

18 do mesmo mês e logo a seguir nos dias 20, 21, 22 e 25. O início da actividade está marcado para as 22h00, seguindo-se então a observação de pirilampos e outros animais nocturnos (reserva obrigatória). Nessas noites, das 23h00 até às 23h30, há também observações astronómicas. O self-service do Parque serve jantares (reserva também obrigatória).

Percursos de descoberta: GerêsDia 21 de Maio, sábado, o Parque organiza uma saída de campo a esta área protegida. Inscrição obrigatória!

Observação de aves selvagens no Parque de Dunas AgudaDomingo, 8 de Maio, entre as 10h00 e as 12h00, com telescópio e guia de aves, encontrará técnicos do Parque Biológico para ajudarem os presentes a identificar as aves selvagens que ali ocorrem.

Exposição colectiva de fotografia da natureza “Paisagens Naturais”Abre em 4 de Junho, sábado, às 15h00.As paisagens reflectem os habitats que sustentam o universo dos seres vivos. Além do vínculo vital, entrevisto em segundo plano, estes espaços apreciam-se pela estética.

Labirinto abertoAté 17 de Junho pode ver esta exposição do fotógrafo holandês Niels K. Salventius.

Oficinas e campos de VerãoPara crianças e jovens dos seis aos 15 anos de idade, as oficinas decorrem nas semanas de 4 a 8, de 18 a 22 de Julho, de 1 a 5, de 15 a 19 de Agosto e de 29 Agosto a 2 de Setembro; entrada diária às 9h00 e saída às 17h30. Os campos abrangem crianças e jovens das idades referidas, em regime residencial e não residencial, alargando-se

A breve prazo, veja aqui os destaques das iniciativas do Parque Biológico de Gaia...

Para passar um fim-de-semana diferente com a família ou com os amigos, nos primeiros sábados de cada mês o Parque Biológico prepara um programa diferente e contempla os seus visitantes com várias actividades.O próximo Sábado no Parque é já dia 7 de Maio. Às 11h00 há o atelier “Paparoca da bicharada”. Aqui os visitantes terão um contacto directo com alguns dos animais do parque, o que permite distinguir as espécies em pormenor, alguns comportamentos típicos e as diferentes ementas. Depois do almoço, às 14h30, decorre uma conversa sobre “As dunas litorais”, seguindo-se às 15h30 a visita guiada pelos técnicos do Parque e percurso ornitológico. Entre as 22h00 e as 23h30, há ainda observações astronómicas (inscrição necessária).Em 4 de Junho, o programa varia no atelier, onde entra “Viver no Campo”, bem como na conversa que neste dia será sobre o ambiente e o homem. Outra novidade é a exposição de fotografia que abre às 15h00, “Paisagens naturais”.

Sábado no Parque

Gamos: atelier “Paparoca da bicharada”

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a idades dos 14 aos 18 anos, em regime residencial - 1.º campo: 9 a 16 de Julho; 2.º campo: 23 a 30 de Julho; 3.º campo: 6 de Julho a 13 de Agosto; 4.º campo: 20 a 27 Agosto (só “veteranos”).

Receba notícias por e-mailPara os leitores saberem das suas actividades a curto prazo, o Parque Biológico sugere uma visita semanal a www.parquebiologico.pt. A alternativa será receber os destaques, sempre que oportunos, por e-mail. Para isso, peça-os a [email protected]

Quer ser nosso amigo no Facebook?

Mais informações Gabinete de [email protected] directo: 227 878 138www.parquebiologico.pt

A breve prazo, veja aqui os destaques das iniciativas do Parque Biológico de Gaia...

Que será isto?

O leitor mais rápido a dar uma resposta correcta foi Ivo Coelho, mas como ainda não passou um ano sobre uma sua vitória

anterior... manda o regulamento que os prémios se atribuam aos dois concorrentes seguintes. Por isso, no mesmo dia em que a revista foi distribuída com o «Jornal de Notícias» seguiu-se Pedro Maurício, de Valongo, que nos diz em e-mail recebido às 9h02: «Bom dia, o mamífero apresentado na vossa revista é uma gineta (Genetta genetta)».A 3.ª resposta a chegar foi a de Manuel António Neves, de São João da Pesqueira, às 9h28 do mesmo dia: «Animal - Gineta (Genetta genetta). Planta - Loureiro ou Louro (Laurus Nobilis)». Este leitor acrescenta: «Gostaria de perguntar se a revista pode ser assinada, pois acho que tem artigos muito interessantes sobre a natureza e sobre como a preservar. Nunca a deixem de publicar. Obrigado por nos fazerem participar, pois embora soubesse a resposta, mesmo assim fui investigar na internet e isso é uma forma

de tomarmos consciência da fauna que nos rodeia; neste caso da Gineta e do Louro, são formas de vida que existem muito no meio onde vivo, em Várzea de Trevões e nesta zona do Alto Douro Vinhateiro».Como a revista não tem preço de capa não tem assinantes, mas fica sempre disponível em versão electrónica no site do Parque Biológico de Gaia. O prémio, o livro “Manual do cultivo e confecção do linho”, foi enviado pelo correio.Para esta edição de Primavera, temos os grupos das borboletas e das aves. É capaz de identificar estas duas espécies? Se for, não deixe de nos dizer.As fotografias publicadas são sempre de vida selvagem que já foi observada na região de Vila Nova de Gaia. As respostas mais rápidas recebem como prémio um livro editado pelo Parque, neste caso a obra “Manual do cultivo e confecção do linho”, de Domingos Quintas Moreira.As respostas devem indicar um dos nomes vulgares reconhecidos ou, melhor ainda, o nome científico. Se na sua resposta acertar numa só de ambas as espécies, é igualmente considerada no ranking das mais rápidas. Envie-nos o seu e-mail ([email protected]) ou carta (Parque Biológico de Gaia - Revista PVS 4430-681 Avintes)!O prazo para as respostas termina em 9 de Maio de 2011.Os leitores já premiados em edições anteriores só o serão se não houver outra resposta certa (este item só é válido durante um ano a partir da atribuição do prémio).

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Novidades de flora

Campylopus introflexus (Hedw.) Brid.

Quando se pensa em espécies invasoras talvez o mais natural seja pensar em plantas de grande porte como, por

exemplo, as acácias. Poucas pessoas imaginarão que uma espécie de musgo poderá ser invasora, mas o que é certo é que Campylopus introflexus comporta-se como tal, ocupando o habitat de outras espécies autóctones. Esta capacidade relaciona-se com a sua estratégia de vida – o musgo está quase sempre fértil, produzindo anualmente grandes quantidades de esporos muito leves levados pelo vento, animais ou pessoas e produz também muitos propágulos vegetativos, ou seja, pequenos

fragmentos que podem funcionar como “semente”.É um musgo que forma colónias de grandes dimensões verde-escuras e pardacentas. Os tufos podem atingir facilmente os 5 cm de comprimento e os filídeos (pequenas folhas) têm até 6 mm de comprimento, cada um com um longo pêlo hialino (quase branco) fortemente dentado. Quando os tufos estão secos, o reconhecimento desta espécie de musgo é bastante fácil, pois os longos pêlos na parte terminal dos filídeos ficam dispostos num ângulo de 90 graus em relação ao tufo. Desta característica surge o nome comum da espécie, já que, vistos de cima, os tufos terminam em pêlos dispostos em estrela. Quando está fértil pode ter

Musgo estrela-dos-matos

vários esporófitos (estrutura de produção e dispersão de esporos) de cor amarelada ou acastanhada em cada indivíduo. Estes esporófitos também são muito típicos, pois as sedas (estruturas de suporte das cápsulas

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onde se formam os esporos) são curvas, daí o nome do género (campylos = curvo). Este musgo pode encontrar-se numa grande variedade de situações, porém ocorre frequentemente em solos

(*) filme de colonização da Europa por Campylopus introflexus:

http://www.youtube.com/watch?v=lLZTKBMDR00&feature=

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descarbonatados e em locais bastante expostos à luz solar (daí apresentar pêlos hialinos bem desenvolvidos para reflectir a luz solar). Em Portugal, é fácil observar esta espécie em solos arenosos, expostos ou húmidos fazendo parte de comunidades florestais, geralmente degradadas ou com influência de fogos e pastoreio. Está também presente em solos húmidos de montanha ou em matos atlânticos, em bordos de pântanos, em dunas, em jardins e caminhos, em zonas de telhados que acumulam terra e em tocos de árvores em decomposição. No Parque Biológico de Gaia já foram encontradas algumas populações desta espécie, muitas delas abundantemente férteis, no solo de manchas florestais de coníferas e eucaliptos.Esta espécie de musgo é um dos exemplos mais típicos de uma neófita, ou seja, uma planta que teve uma introdução recente no continente europeu, sendo a sua origem o hemisfério Sul, em países da América e África, Austrália e ilhas do Atlântico e

Pacífico Sul. Desde a sua introdução pelo Homem na Europa (o 1.º registo foi na Inglaterra em 1941) tem vindo a espalhar-se rapidamente por muitos países*. Em Portugal, foi registado desde 1996, em regiões com influência atlântica como as províncias da Estremadura, Minho e Douro Litoral. É, portanto, uma espécie que provoca decréscimos dos níveis de biodiversidade de flora e fauna e altera os ciclos de nutrientes e as cadeias alimentares, sendo muito difícil de erradicar. Mais um exemplo de como o Homem tem sido responsável pela alteração dos ecossistemas, apenas por ter movido uma espécie de local… Texto e foto: Cristiana Vieira e Helena Hespanhol (CIBIO-UP)

Sábado, 12 de Março, o Parque Biológico de Gaia organizou um percurso de descoberta à serra de Arga. Queria-se um tempo de feição. Embora não tenha chovido o dia inteiro, o sol recusou-se a aparecer. A serra guardou os seus segredos e envolveu-se em nevoeiro. Desceu-se para os matos atlânticos, habitat listado na directiva da Comunidade Europeia, de Afife e Montedor. Emergiram espécies botânicas e arqueologia, enquanto pintarroxos namoricavam entre flores de salgueiro-anão. Em 9 de Abril o destino foi a Paisagem Protegida da Albufeira do Azibo. Iniciado na aldeia de Santa Combinha, este percurso revelou aspectos da flora mediterrânica, aves, répteis e invertebrados típicos da região. A próxima visita centra-se no Gerês – serra da Peneda – dia 21 de Maio, com inscrição obrigatória.

Percursos de descoberta

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Vigilantes da Natureza

O XVI Encontro Nacional de Vigilantes da Natureza teve lugar de 4 a 6 de Março no Parque Biológico de Gaia e contou na abertura com o discurso de Humberto Rosa, secretário de Estado do Ambiente. Os cerca de 60 membros presentes no evento concordaram que, apesar de Portugal ter 230 vigilantes da natureza no Continente e Regiões Autónomas, precisa de mais 500 para fazer face às necessidades do território.Estes vigilantes fiscalizam zonas de risco de fogos, focos de poluição, tráfico de espécies, para além de acções de educação ambiental.

Humberto Rosa, secretário de Estado do Ambiente

Paisagem Protegida da Albufeira do Azibo

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O Observatório Astronómico do Parque Biológico de Gaia organizou os seus primeiros cursos de iniciação à Astronomia, tendo o primeiro deles decorrido em Fevereiro passado.Sem exceder os vinte elementos, os inscritos aprenderam a fotografar o céu e a observá-lo, explorando também o software de astronomia.Estes cursos abrangem matérias que vão desde a iniciação ao assunto propriamente dita até à aquisição de competências para observações mais avançadas.

Cursos: Observatório Astronómico

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32 ESPAÇOS VERDES

Centro de RecuperaçãoChegados a Abril, ficam para trás as aves de rapina vitimadas pelas armas dos amigos-do-gatilho

Entrou no Centro de Recuperação do Parque Biológico de Gaia em 10 de Dezembro, pela mão da GNR/SEPNA, um açor,

identificado com duas anilhas: uma do Ministério da Agricultura espanhol, n.º 8012112; a outra, verde, onde se lia N7. Esta ave, apesar de estar protegida por lei, chegou num triste estado, politraumatizada. Feito um exame radiográfico a causa estava ainda mais à vista: 11 chumbos, da pata ao pescoço da rapina.O caso mais recente foi o de uma águia-de-asa-redonda, com mais de 20 chumbos identificados na radiografia, entrado em Fevereiro.Terminada a época da caça, em que para alguns tudo o que mexe leva chumbo, chega a vez da natureza renovar gerações.A acreditar nos ritmos de outros anos, o que estará para acontecer é que algumas espécies de aves selvagens que nidificam perto das habitações irão surpreender os vizinhos humanos. Casos típicos são os andorinhões e as crias de coruja.Os andorinhões são aves fantásticas,

migradoras notáveis que acabam de chegar de África, onde passaram o Inverno.Extremamente adaptados ao meio aéreo, dizem os entendidos que se alimentam de insectos no ar, acasalam e até dormem no ar, só não conseguem fazer ninho nesse patamar, obviamente, e por isso procuram arribas, edifícios altos com frestas onde possam criar.Quando os juvenis de andorinhão começam a sair dos ninhos há alguns que não controlam bem o talento de voar, por inexperiência. Isso leva a que por vezes algum apareça no chão durante um passeio pelo jardim ou pela rua. Quem depara com uma destas aves pensa que está ferida. Não é assim: se não estiver enfraquecida, basta atirá-la com jeito para cima e logo ela retomará o voo, piando pelos pais. Mas por que razão não terá ela tomado a iniciativa sozinha como fazem os pardais?É que a anatomia delas é peculiar. As patas têm tarsos muito curtos e as asas uma envergadura proporcional bastante grande. Resultado? Não conseguem alçar-se

Em 26 de Fevereiro deu entrada uma coruja-do-mato (Strix aluco) no Centro de Recuperação do Parque Biológico de Gaia.A ave foi encontrada (e entregue) por Joaquim Rodrigues (na foto) junto da doca, em Leça da Palmeira, Matosinhos.Após cerca de duas semanas de recuperação, foi devolvida à natureza próximo do local em que foi encontrada. A foto é de Sara Loio, médica-veterinária, e diz respeito ao momento imediatamente anterior à libertação.

Coruja recuperada

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Andorinhão juvenil

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Centro de RecuperaçãoChegados a Abril, ficam para trás as aves de rapina vitimadas pelas armas dos amigos-do-gatilho

É certo que os melros não se preocupam com as brancas como acontece com muitos humanos. A não ser assim, o facto não teria ocorrido na sessão de anilhagem científica de aves selvagens de 5 de Março, sábado, quando o grupo de trabalho anilhou um melro-preto, Turdus merula, que apresentava uma mancha branca na cabeça e uma pena da asa esquerda completamente branca.Sem que seja propriamente raro, foi explicado nessa oportunidade que o fenómeno ocorre por variadas razões. Uma

Entre 25 e 27 de Fevereiro o Parque Biológico de Gaia acolheu a terceira edição do Curso de Educação e Maneio de Asininos, organizado pela instituição anfitriã e pela Associação para o Estudo e Protecção do Gado Asinino.O programa constou de apresentações sobre o uso do burro na actualidade, novas interpretações do seu papel no mundo rural e citadino, adiantando-se informação sobre a sua reprodução, bem como a valorização do gado asinino através de actividades agrícolas, lúdicas, terapêuticas, turísticas, ambientais, pedagógicas e criativas.

Educação e maneio de asininos

para baterem as asas com eficiência no arranque do voo. Outro caso típico liga-se às corujas e mochos. É próprio as crias destas espécies saírem dos ninhos precocemente em relação a outras aves. Ainda assim os progenitores ficam de olho nelas e vão-nas alimentando. Num bosque são miméticas, mas no ambiente urbano não se confundem no cenário e ficam expostas, podem até aparecer-lhe num passeio de alguma avenida como já aconteceu.Se um gato ou um cão vir a cria primeiro, ninguém saberá de nada, morre ali. Mas se for alguém que se enterneça com o achado, irá recolhê-lo e levá-lo a um centro de recuperação que o possa tornar um sobrevivente.Contudo, não havendo risco de ataque de felinos ou atropelamento, estas crias devem ser deixadas ali, pois estão sob os melhores cuidados do mundo, os de quem os gerou.

Anilhagem científica de aves selvagens

pode ser genética. Neste caso, na muda de pena reaparece a mesma cor branca. Outra pode ser resultado de nutrição deficiente. Se for esta a causa, a anomalia cromática desaparece, voltando o animal à sua veste rigorosamente negra.

Crias de coruja

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34 ENTREVISTA

34 • Parques e Vida Selvagem Primavera 2011

o pormenor é tudo À primeira vista nem estão ali.

Ou, se os vir, dirá que é tudo igual.

Puro engano: se juntar a uma lupa

alguma curiosidade, de repente,

estas plantas primitivas abrem-lhe

um novo mundo...

Tudo terá começado há muito, muito tempo, com o devaneio de algas marinhas que sonharam viver enxutas, fora do mar.

De tanto tentarem, geração após geração, acabaram por se transformar em musgos. Abriu-se assim uma nova auto-estrada à evolução das plantas.Craques das briófitas – o grupo de plantas em que os botânicos encaixam musgos, hepáticas e antóceros – as biólogas Cristiana Vieira e Helena Hespanhol desenvolvem trabalho no CIBIO da Universidade do Porto.Embora haja espécies ameaçadas, é importante sublinhar que «os musgos não se restringem a um número reduzido de habitats: podemos encontrá-los entre os paralelos de uma rua e no carvalhal mais intocado, no rio mais poluído e na cascata mais idílica», acentua Cristiana. Estamos diante de um muro cheio de sol, recheado de plantas espontâneas. As flores brancas das saxífragas saltam à vista, acabam de despontar. À partida, musgos de aspecto diferente sugerem espécies distintas: uns erguem

filamentos afiados, atiram tonalidades acastanhadas. Outros, verdes, até sem lupa deixam perceber que terminam em bastonete, à boa maneira dos cotonetes lá de casa.

Encostar o narizNo universo das plantas os musgos geram um fascínio especial e tudo começa na sua escala: são muito pequenos. É frequente este mundo passar ao lado das pessoas porque estas «vêem tudo de cima». Diz Cristiana: «Há que encostar o nariz à terra. Se víssemos um carvalhal da Lua também não notávamos as folhas, não é?». Depois, o detalhe que fascina «vem com as lupas. Vêem-se os pêlos e até algumas células».Helena reforça: «Não há uma pessoa que ponhamos à lupa que não fique maravilhada». Através de pequenos pormenores, «a capacidade de incorporar todas as funções de crescimento, de reprodução e ainda o fenómeno de latência, de poder estar na natureza sem crescer, à espera do melhor momento para voltar a desenvolver-se, é fantástico!».E tudo isto «numa planta que tem apenas

folhas, um pequeno caule e alguns pelinhos a lembrarem raízes», com engenho para se «perpetuar durante milhares de anos na face da Terra». Dentro deste grupo, houve espécies que evoluíram e outras permanecem iguais há milhares de anos.

Compressas e almofadas Os musgos acompanharam a saga da história humana. No horizonte medieval as habitações contavam com estas plantas para calafetar paredes. Além do isolamento, «pensava-se que atrasavam a acção do fogo. Serviram para calafetar barcos, forrar botas, colchões e almofadas, sendo o seu uso estendido a fraldas e compressas para retardar infecções, como ocorreu durante os combates da I Grande Guerra». Não foi por acaso: «Os musgos têm capacidades absorventes, antibióticas e antifúngicas». Aliás, «actualmente continuam a ser investigadas em laboratório as capacidades farmacêuticas de várias espécies de briófitas.

Musgos

Musgo: Homalothecium sericeum

Detail is Everything Biologists Cristiana Vieira and Helena Hespanhol develop work at CIBIO at the University of Porto. Although Bryophytes have some endangered species, it is important to emphasize that mosses are not restricted to a limited number of habitats. They may be found between cobblestones on the streets, in a pristine oak forest, in the most polluted river and even in an idyllic waterfall.

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 35

ENTREVISTA 35

«O uso mais promissor foca a engenharia genética. Algumas espécies têm sido cultivadas em laboratório para produzir proteínas humanas através de manipulação genética», explica Helena.É de referir que este interesse por musgos entre botânicos não é recente: «A primeira flora de briófitas portuguesas foi escrita no início do século XX por um filho de Bernardino Machado, presidente da República. O botânico António Machado deixou uma obra fundamental que tinha uma escrita científica, mas sempre com observações em linguagem pragmática com dicas para o reconhecimento das espécies no campo».

Antenas do ambienteO aspecto fofo dos musgos ultrapassa a mera sensação táctil e estabelece uma medida da poluição e da pureza do ambiente em que vivem: «Os musgos são autênticas esponjas e, como tal, revelam-se bons bio-indicadores ao acumularem tudo o que passa à sua volta», sublinha Cristiana. Como «estas plantas não têm mecanismos de excreção, quando absorvem metais

pesados da atmosfera criam bolsas, dentro das células, onde acumulam essas substâncias, isolando-as». Ao ficarem ali acumuladas, «quando um investigador pega numa amostra e mede a quantidade de metal que está armazenado nas células, esta quantidade é directamente proporcional à que tem estado na atmosfera nos últimos meses. Eis porque lhes chamamos antenas da poluição, em tempo real», completa.Mas há mais: como estas plantas primitivas não sabem mentir, está em crescimento uma área ainda pouco ventilada: a botânica forense. «Estas plantas», diz Cristiana, «podem ajudar. Quando são encontradas provas como roupas ou outros objectos relacionados com as vítimas ou suspeitos colonizadas por musgos, é possível estimar se as provas de crime são recentes ou se foram movidas. Com base na etapa de colonização ou a análise das espécies de musgos a crescer sobre estas provas, pode estabelecer-se um período de permanência mínimo no local ou perceber se as provas estiveram

depositadas noutros lugares antes de serem encontradas».

NutrirOs musgos fixam-se através de pequenas raízes, chamadas rizóides. Ao contrário das plantas a que estamos mais habituados, não é por aí que se alimentam: «Os rizóides só servem para fixar a planta». Leva já muito tempo a adaptação dos musgos — é uma eficiência diversificada nos milénios: «A rocha erodida em contacto com a água da chuva proporciona uma solução nutritiva com os iões, mais ou menos ácidos. Essa solução nutritiva, que numa planta vascular é absorvida pelas raízes, nos musgos é absorvida por todo o corpo da planta, pelos filídeos (pequenas folhas) e pelo caulóide (caule). Cá está a simplicidade dos musgos a resultar. É como se estivéssemos a alimentar-nos pela pele», destaca Helena. «Assim, existem comunidades diferentes de musgos em xistos, granitos ou calcários, porque existem espécies com adaptações diferentes a estes tipos de substrato», explica.Ao pé do rio Febros, distingue-se num tronco

Helena Hespanhol e Cristiana Vieira

Musgo: Tortula sp.

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uma mancha escura – é uma hepática do género Frullania: «Está um pouco seca, logo as folhas encolhem-se. Para além disso possuem folhas em forma de saco para guardar gotas de água que escorrem pelo tronco». Defendem assim a preciosa água. Não são só vantagens habitar no tronco de uma árvore: «É desconfortável para estes musgos crescerem num substrato que pode descascar e estar sazonalmente exposto ao sol», refere. Nos troncos das árvores, nas partes mais expostas e secas, dominam os líquenes. Nas mais sombrias e húmidas aparecem musgos. Basta reparar na diferença entre o lado do tronco voltado a Norte ou as zonas mais sombrias da floresta, tal como um escuteiro faria... Um olhar conhecedor dá outras dicas: «Este amieiro, mais novo, apresenta no tronco espécies pioneiras; o outro, mais velho, apresenta espécies dependentes do envelhecimento do tronco e da acumulação

de pequenas partículas de solo e humidade na sua superfície».Quem lida com briófitas quase tem de aprender duas floras – há que reconhecer a espécie quando está molhada e quando está seca: «Quando as células estão cheias de água obrigam as folhas a expandirem-se e as cores e a disposição dos tufos alteram-se muito...».

Sucessão ecológicaQualquer ecossistema, das dunas às florestas, começa com a instalação de bactérias e algas. Os musgos não tardam, e «as suas raízes, por mais fininhas que sejam, sustentam taludes, terras, estabilizam solos e os seus tufos criam esponjas de humidade». Afirma Helena: «Se formos a uma duna, os musgos têm adaptações notáveis. Para

36 ENTREVISTA

As briófitas – que agregam musgos, antóceros e hepáticas – estão entre as plantas que iniciaram a colonização da superfície terrestre não submersa pelo mar. Conhecidas em geral por “musgos”, este grupo reúne cerca de 5% das plantas de todo o planeta…• A primeira briófita surgiu na Terra há 375

milhões de anos.

• Há 14 mil espécies de briófitas conhecidas.

• A nível europeu 10% das espécies de briófitas estão ameaçadas de extinção.

• A primeira “Lista Vermelha” para as briófitas portuguesas surgiu em 1994

• Em 2006 foi publicada a “Lista Vermelha para a Península Ibérica” onde figuram as briófitas portuguesas em extinção.

• A próxima “Lista Vermelha” de Portugal está a ser preparada por briólogos portugueses.

• Na Península Ibérica 120 espécies de musgos e 50 de hepáticas encontram-se ameaçadas.

• O número de espécies de briófitas conhecidas no território português aponta 666 espécies.

aguentarem a radiação solar e armazenarem a máxima quantidade água, as suas folhas estão normalmente enroladas e possuem pêlos brancos para reflectirem os raios solares. Há musgos que aguentam bem a deposição de areia e, quando surge humidade, conseguem desenrolar as suas folhas e fazem saltar toda a areia que está em cima, podendo assim começar o processo de fotossíntese». Estas investigadoras contaram já, no Parque Biológico, à volta de 60 espécies de briófitas.Por isso, para que a diversidade não se perca, deixam um apelo ligado aos afectos predadores: «Quando se apanham tufos de musgo do tamanho da palma da mão pode-se estar a apanhar meia dúzia de espécies, algumas das quais em extinção. É assim, mesmo que seja num ambiente próximo de casa».

Texto: Jorge GomesFotos: Cristiana Vieira

Musgo: Pseudoscleropodium purum

Musgo: Sphagnum auriculatum

Antócero: Phaeoceros laevisHepática: Targionia hypophylla

Musgo: Pterogonium gracile

Briófitas em números

36 • Parques e Vida Selvagem Primavera 2011

Page 37: Revista PARQUES E VIDA SELVAGEM n.º 35, Primavera de 2011

Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 37

Das 1200 espécies

de plantas que habitam

os Açores, 70 são

plantas endémicas, só

existem no arquipélago

Na busca de alguns exemplares, procuramos a ajuda de Maria João, botânica da Universidade dos Açores.Algumas destas plantas endémicas servem de alimento a muita fauna.Desde logo o feto-do-botão, que no Inverno é muito procurado pelo priolo, uma ave também endémica dos Açores que já esteve à beira da extinção e que continua sob o estatuto de ameaça.Maria João explica: “O feto-do-botão chegou cá aos Açores pelos seus próprios meios. Aliás, é uma espécie protegida pela Convenção de Berna. Tem muita importância porque serve para a alimentação de algumas aves, nomeadamente o priolo. É um dos elementos que faz parte das comunidades vegetais nativas dos Açores”. A busca continua no meio deste paraíso verdejante.Estacionamos junto a uma outra planta

Plantas endémicas dos Açores

que só se pode encontrar aqui e que serve também de alimento a algumas aves.Chama-se uva-da-serra. Maria João tem uma explicação curiosa para o seu aparecimento no arquipélago açoriano: ”Trata-se de um neo-endemismo, é uma espécie que surgiu de novo no nosso território. Provavelmente os seus antepassados terão tido origem na Ilha da Madeira. Terão sido as aves que terão ingerido os frutos que são umas pseudo-bagas e que depois terão sido transportadas até aqui, até ao arquipélago”.

Para os botânicos os Açores são um verdadeiro laboratório a céu aberto.A caminhada interrompe-se de novo por causa de um outro tesouro da botânica, uma planta endémica com características muito particulares.É uma planta enorme, uma Labiacea: “Trata-se de uma das espécies mais raras e por isso tem um estatuto de protecção especial, um estatuto de protecção elevado. É muito difícil encontrar estes exemplares. Uma das suas maiores ameaças é que esta planta hibrida com outras espécies do mesmo género e depois as características perdem-se. O que tem de mais invulgar e interessante é que é uma espécie gigante”. Mas entre a imensa variedade de vegetação há outras espécies gigantes, só que essas não são endémicas. Os fetos arbóreos, uma das primeiras plantas a colonizarem a Terra, foram introduzidos nos jardins românticos dos Açores no século XIX por famílias abastadas que gostavam de plantas exóticas.Há locais, como a Caldeira Velha, na Ilha de São Miguel, por exemplo, carregados de fetos arbóreos. Transportam-nos para um outro tempo, para uma outra dimensão. Por Luís Henrique Pereira, jornalista da RTP Fotos: Marcos Prata

REPORTAGEM 37

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38 REPORTAGEM

Junto à estrada, um vendedor-ambulante faz o seu melhor para conquistar o próximo cliente. As distracções multiplicam-se mas

não temos tempo a perder. Terminamos de acomodar as nossas bagagens ao topo da carrinha e damos início à viagem de 400 quilómetros que nos levará até ao nosso destino.É difícil desviar os olhos da janela. Tudo é novo e exótico mas os sentimentos que se nos despertam são ambíguos. Por um lado somos cativados pelas crianças que brincam ao canto da estrada e pela beleza dos arrozais e das habitações tradicionais, mas por outro, não conseguimos deixar de sentir um aperto no coração ao nos apercebermos que, para onde quer que olhemos, não conseguimos ver o mais pequeno vestígio do coberto vegetal nativo da região. Mas tudo muda na última das dez horas de viagem. As paisagens agrícolas começam timidamente a dar lugar a floresta e, avançados alguns quilómetros, estamos mergulhados numa profusão de verdes que pintam os montes e vales que nos rodeiam. Chegamos. Este é o Parque Nacional de Ranomafana.A nossa casa durante o próximo mês será o Centro Valbio, uma das mais avançadas estações de investigação tropicais da qual a Universidade de Helsínquia é uma das fundadoras.

Parque Nacional de Ranomafana

Os dias começam

cedo em Antananarivo:

ainda nem são sete

da manhã e a cidade

já está em completo

alvoroço – ao fundo

ouve-se a agitação

do mercado, música

pop e o som de buzinas

marcam o ritmo

do trânsito caótico

A magia do Centro não se tarda a fazer notar. Para alegria de várias osgas que se passeiam pela parede, as luzes do edifício funcionam como um íman para dezenas de espécies de borboletas nocturnas, besouros e outros insectos mais ou menos exóticos e, por entre a vegetação, distingue-se o coaxar de outros predadores anfíbios.

A manhã seguinte rompe ao som de uma verdadeira sinfonia ornitológica. Os responsáveis? Beija-flores, bulbuls, drongos, tecelões, papa-moscas-do-paraíso e outros quantos seres alados. Pertencem na sua maioria a grupos de aves característicos do continente africano mas, as espécies que por aqui se fazem esvoaçar são diferentes.

38 • Parques e Vida Selvagem Primavera 2011

Madagascar In the Indian Ocean, Madagascar configures a unique space, with numerous species that do not exist anywhere else on Earth. Biologist, Ricardo Rocha visited this unspoiled natural environment and shares this experience with you.

Boophis madagascariensis

Calumma oshaughnessyi

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 39

Parque Nacional de RanomafanaDas 209 aves nidificantes na ilha, 109 não podem ser encontradas em nenhum outro sítio do planeta. São endémicas. Para dizer a verdade apenas uma pequena minoria da fauna e flora nativa de Madagáscar não é exclusiva da ilha. As taxas de endemismo são particularmente exuberantes no grupo dos mamíferos e dos anfíbios onde a totalidade

das espécies nativas é endémica e os valores são igualmente impressionantes para os répteis, onde 92% das mais de 400 espécies actualmente conhecidas são exclusivas da ilha.É com dois desses répteis endémicos que nos cruzamos quando descemos para o pequeno-almoço. Na mesma parede em que

na noite anterior tínhamos encontrado osgas nocturnas do género Hemidactylus (que também pode ser encontrado em Portugal), hoje encontramos as bem mais exóticas Phelsuma, osgas diurnas de um verde vivo pintalgado de pequenas manchas vermelhas. São um dos grupos de lagartos mais diversos da ilha e aqui, em Ranomafana, podem ser encontradas duas espécies: Phelsuma lineata e P. quadriocellata que, tal como o nome indica, distinguem-se por possuírem uma linha ou então quatro pequenas manchas negras nos flancos. A poucos metros de distância um camaleão Calumma amber de belos tons azulados e laranja avança furtivamente em busca de insectos. Numa árvore próxima, um outro camaleão da mesma espécie descansa por entre ramos, adornado de cores negras e amarelas.O calor tropical já se faz sentir quando por fim chega a hora por que todos aguardávamos. Botas apertadas, máquinas fotográficas em punho e acompanhados de Dina Herilala, guia de natureza ao serviço do Centro Valbio, lá partimos em busca dos tesouros que a floresta nos reserva. As perguntas atropelam-se, mas quase todas apresentam um denominador comum: lémures. “São 12 as espécies de lémures existentes cá em Ranomafana. Alguns, como lémure-castanho e lémure-de-barriga-vermelha são relativamente fáceis de observar mas outros, como o lémure-dourado-do-bambu, são bem mais raros e encontrá-los, só com uma boa dose de sorte”, diz-nos Dina e acrescenta “mas não se preocupem, há muito para ver. São conhecidas para o parque mais de uma centena de espécies de aves e anfíbios, e os répteis, com mais de 60 espécies, também se encontram bem representados”.Poucos minutos depois eis que chegamos a uma ponte. A paisagem é sublime. O verde da floresta é rasgado pelas águas castanhas do rio Namorona e um estrangulamento rochoso transforma o leito tranquilo numa série de rápidos que desaguam numa pequena cascata. Ao fundo, entre as pedras, passeia-se um casal de alvéolas e, na outra margem, um ponto azul metálico denuncia a presença de um guarda-rios. Subitamente o declive que até aqui tinha sido meigo acentua-se e somos rápidos a perceber que o ar abafado dos Trópicos e subidas estão longe de constituir uma combinação perfeita. Valia-nos os estímulos

Eulemur rufus

Brookesia supercilliaris

Leptopterus chabert

Spinomantis aglavei

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40 REPORTAGEM

40 • Parques e Vida Selvagem Primavera 2011

constantes, que nos davam razões para parar a marcha e ter um curto, mas merecido descanso. Um olho mais atento nota movimento entre as folhas caídas e eis que uma voz excitada grita “Brookesia, é um Brookesia!” – e há mesmo razões para tamanha excitação – trata-se nem mais nem menos de um dos mais pequenos répteis do mundo, um Brookesia supercilliaris, espécie na qual os adultos não ultrapassam os 9 mm de comprimento máximo. Um contraste bem claro com o quase meio metro do camaleão Calumma oshaughnessyi que também se passeia por estas florestas.Outro réptil de tamanho considerável que pode ser encontrado em Ranomafana é a boa Sanzinia m. madagascariensis, que

pode chegar a uns generosos dois metros de comprimento. Esta serpente, à semelhança da maioria das suas parentes da ilha, é incapaz de produzir veneno e tem de recorrer à constrição para matar as suas presas. Não são esquisitas no que toca à alimentação. Roedores, aves, anfíbios e até lémures fazem parte do menu. Mas um menu variado não implica capturas fáceis. Numa floresta com tantos perigos a evolução não se poupou a esforços para dotar as espécies com os mais elaborados estratagemas defensivos. Um dos mais impressionantes é a camuflagem da osga-cauda-de-folha. De cor e textura semelhante à de uma folha morta, esta pequena osga mantém-se completamente imóvel, fundindo-se na perfeição com o seu

meio. Nem queríamos acreditar quando alguém no grupo anuncia ter encontrado uma na base de um tronco. A verdade é que ela lá estava, com todo o seu ar de personagem de ficção científica.Continuando a nossa marcha e eis que nos cruzamos com uma árvore que, graças à sua semelhança com um enorme leque, se destaca de todas as outras. É uma árvore-do-viajante, o símbolo da companhia aérea malgaxe. E, junto a esta… lémures! Por fim. Uma família de lémure-de-barriga-vermelha alimenta-se junto ao trilho – aqui está: o postal típico de Madagáscar. Que belo fim para um dia de caminhada.

Texto e fotos: Ricardo Rocha

Propithecus edwardsi

Dicrurus forficatus

Phelsuma quadriocellata

Uroplatus phantasticus Terpsiphone mutata

Sanzinia m. madagascariensis

BP. 2 – Fivondronana Ifanandiana, 312 Ranomafana - MadagascarPhone : + (261 20) 75 523 02 / (261 33) 01 228 55E-mail : [email protected]: www.wildmadagascar.org/conservation/parks/Ranomafana.html

Parc National Ranomafana

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MEMÓRIA 41

Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 41

No ano 1977 miraba eu entusiasmado pola xanela do diminuto

posto de vixilancia do Pedreiriño (onde hoxe hai unha magnífica estatua

do San Rosendo, nado en Santo Tirso e morto en Celanova,

sempre na Gallaecia), no remonte da serra que aló chaman

a Montaña de Queguas, moitos metros por riba da vila de Entrimo

O Xurés – xénese

A vista que espallaba ao lonxe, coa fronte espetada na fronteira de Portela do Home, era impresionante, máis propia do

mundo onírico dos soños que do mundo real. Marcaban a liña do horizonte os cotos afiados do Xurés e logo a mole impoñente da Serra de Santa Eufemia. Por baixo corría, decidido e vital, o meu Limia, o Río da Vida da miña nenez. Pola dereita o Monte Quinxo ocultaba Olelas e logo serpeaba o camiño da Ameixoeira e do Castro Laboreiro, terra de afamados cans cos que librar do servizo militar os do Castelo do San Rosendo. Ás miñas costas, invisible por tras das enormes

penedías luídas, erguía alto e silandeiro o Planalto, a penechaira indómita onde fungan os ventos ceibes da serra e que eu entendo do Leboreiro por ser terra de lebres, coa Casiña da Moura que levou na cabeza aquela meiga fiando sete mazarocas, e a Pena de Anamán e a virxe recóndita, da cabalo da Raia, sempre roldando a Raia, na inmensa e feraz ferradura que pecha a Raia… e o meu mundo interior. Alguén me dixo, cando baixei da montaña á vila na procura de alimentos, que aló, do outro lado da Raia, fixeran había poucos anos un gran parque nacional, o único de Portugal, e que todos o tiñan como a xoia da coroa do patrimonio natural luso. E

eu pensei: “E por que non deste lado da Raia tamén?”.Dez anos máis tarde, en 1987, comecei a traballar no proxecto de creación do parque natural do Xurés. Pero tres anos máis tarde, cando levei importantes altos cargos da nova Xunta de Galicia ver o Xurés, dixéronme algo así como que aquel proxecto eran cousas do “meu corazón”. E eu pensei que se todas aquelas manifestacións semellantes ás do Gerês, inda que a escala máis reducida, non eran abondo para ser parque natural, que o era entón? E cavilei naquelas paisaxes extraordinarias, nos tan variados ecosistemas que alí había, dende o leito do Limia pasando

Margen Fotografía S.L.

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42 MEMÓRIA

42 • Parques e Vida Selvagem Primavera 2011

polos mestos bosques de ribeira, polos socalcos de Prencibe e de Olelas, polas veigas recendentes da Terrachá, polos soutos e carballeiras de Muíños, polo val de Riocaldo que crearan os xeos dez mil anos atrás, polas penechairas espidas do Leboreiro, polas ducias de aldeas esparexidas creando espazos de singular beleza e fermosura, por aquel patrimonio material e inmaterial que chegara ata nós nun estado de pureza inesperado “grazas” ao illamento secular da Raia dende tempos inmemoriais, como a Vía Nova de Bracara Augusta a Asturica Augusta, do conxunto de miliarios máis impresionante do imperio romano, do campamento e as mansións viarias, de campos tumularios con cinco milleiros de anos no val do Salas e no planalto con mámoas como estrelas aboiando no firmamento, das ermidas do Xurés, a Clamadoira, o San Bieito, a Nosa Señora do Viso e a Santa Eufemia que é padroa de Ourense. Tanta riqueza naquel mundo tan diverso e vital onde xuntan os ambientes atlánticos e mediterráneos, con toxos, carpazas, uces, xestas, carballos, rebolos, sobreiras e oliveiras, incluso teixos, cancereixos, bidueiros, pradairos, aceviños, érbedos e acereiros. De montes onde vivía o lobo e a aguia real e na memoria das xentes aínda camiñaban as sombras de osos e cabras montesas. Como que non era abondo tanta riqueza? Entón cavilei que quizais non había máis solución que abrir a vía portuguesa, porque era consciente da ilusión dos meus veciños por nós protexer o seu outro lado da Raia, das súas montañas, do seu Parque Nacional. Non teño máis que recordos agarimosos daquel breve e intenso tempo, daqueles portugueses que me axudaron no proxecto: Henrique Regalo, Antonio Oliveira, Miguel

Pimenta, Nuno Almeida, Luís Braga da Cruz e Tito Costa, sobre de todo Tito Costa. Esta conexión: Tito – Braga da Cruz – Mario Soares – Fraga Iribarne, países, rexións, partidos e ideoloxías á parte, funcionou á perfección, ou o que é o mesmo: entre Celanova, Braga, Porto, Lisboa e Santiago pechamos o círculo, con gran sorpresa para todos aqueles altos cargos da Xunta e algún ilustrado que non acreditaban. O 22 de febreiro de 1993 nacía por fin o parque natural galego da Baixa Limia – Serra do Xurés. E comezamos un camiño cheo de ledicia e desafíos, cun equipo novo absolutamente comprometido e ilusionado con este traballo. O primeiro resultado foi conseguir para o período 1995-1999 o programa INTERREG II da Unión Europea, un programa que presentamos ante Bruxelas e que foi tan meritorio que mesmo apareceu nunha publicación da UE como un dos dez mellores exemplos de bo uso dos fondos europeos para o medio natural nese período. E con eses fondos, vitais naquelas primeiras etapas, comezamos a traballar. Creamos unha sede digna para o Parque Natural nunha vella e gran casa de Lobios, e tamén infraestruturas de uso público, programas de educación ambiental, estudos para afondar no coñecemento das especies e dos ecosistemas, obras de melloras nalgunhas aldeas do parque. Gardo un grato recordo

daquela cooperativa de apicultores que creamos para venda de mel como produto de calidade do parque e da compra da aldea abandonada de Salgueiros con todos os seus montes. E lembro con especial ilusión aquel mes de novembro de 1997, cando soltamos en Salgueiros as primeiras cabras salvaxes logo de máis dun século da súa extinción, nos cotos graníticos próximos ás picas da fronteira, dos Fontefría

e das Gralleiras, e ver logo como en anos sucesivos aqueles individuos progresaban e se reproducían naquel hábitat case de xeito milagreiro. Este asunto das cabras tivo os seus detractores e o seu lado escuro, porque as cabras eran “hispánicas” e non “ibéricas”. Unha vez me chamaron de Madrid para me preguntar se había algún “perigo” de que as cabras cruzasen a fronteira, e eu respondín que ningún porque onde as ía soltar non era nin España nin Portugal senón o vello reino de Galicia, ou sexa a Gallaecia, e que as cabras andarían por alí tranquilamente, unha horas comendo dun lado e outras durmindo a sesta e facendo a dixestión do outro. Naquel tempo tamén asinamos un documento de colaboración cos colegas lusos, creamos unha comisión mixta, fixamos obxectivo comúns e mesmo tivemos un día de gloria na Portela do Home, coa presenza de moitos altos cargos políticos e do presidente de EUROPARC que chegou dende Alemaña para ratificar o seu compromiso para con este parque internacional.Nos últimos anos e con motivo do meu paso polo goberno galego entre 2005 e 2009 achegamos o parque natural ata os límites con Montalegre e Castro Laboreiro, fixemos obras na aldea de Salgueiros para convertela na primeira “aldea ambiental” de Galicia, creamos o Camiño do San

Margen Fotografía S.L.

Ben

ito R

eza

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A história da Cabra-brava em Portugal, quer da sua extinção, quer do seu regresso, está, ainda, mal contada.

Mantêm-se dúvidas quanto à verdadeira data de extinção (ver pág. 55), que talvez seja posterior à data “oficial”, que é 1892.

Mas se havia dúvidas quanto ao modo como reapareceu em Portugal, Xosé Benito Reza vem, agora, esclarecê-las: soltou-as ele, em Novembro de 1997, em Salgueiros, perto de Muíños, na Galiza, e rapidamente apareceram em Portugal. Coisa de cabras, que não agradou às autoridades espanholas, que não queriam perder o exclusivo da espécie.

Não se tratou da mesma subespécie extinta no século XIX em Portugal, a Capra pyrenai-ca lusitanica, mas sim um parente próximo, a Capra pyrenaica victoriae, vinda do Parque Natural “O Invernadoiro”, em Orense, também na Galiza, que Xosé Benito dirigiu.

Xosé Benito Reza Rodríguez, nascido em Celanova (Orense) em 16/04/1956, é um en-

genheiro florestal que se dedicou à gestão e conservação de espaços naturais, chegando a ser Director-geral de Conservação da Natureza da Galiza (2005-2009). É, também, um excelente escritor, tendo, entre outras obras, “Memorias do Pedal – O camiño portugués a Santiago” e “Vivir en Ancares”.

Em 17/09/2007 visitou o Parque Biológico de Gaia (foto junta), na companhia do amigo comum Pablo Alvarez, procurando ideias e parcerias para os projectos que estava, e está, a desenvolver na sua Galiza.

Por Nuno Gomes Oliveira

Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 43

Rosendo para xunguir o Xurés con Ourense, Lugo e Asturias, e conseguimos da UNESCO a declaración da primeira Reserva Internacional da Biosfera Ibérica, boa cousa esta tanto polo propio recoñecemento internacional do valor destas montañas e da cultura destas xentes como para a consecución de fondos da UE que nos son tan precisos. De todos os xeitos a miña maior felicidade foi procurar unha oportunidade a estes territorios esquecidos baseada nos seus recursos naturais, crear algúns postos de traballo directos para os seus habitantes, dar algunhas obriñas ás pequenas empresas da zona, atraer algúns turistas, mellorar algunhas aldeas e conservar aqueles tesouros, sempre dentro das tan limitadas posibilidades. Longa vida a O Gerês e a O Xurés (palabras que son a mesma cousa e que falan da mesma montaña: UGERÉS), vaian aló velo porque é unha marabilla, como poucas en Iberia e no vello reino suevo da Gallaecia que xa saben tiña a capital en Braga pero chegaba deica á Coruña, inda que para mantelo, conservalo e loitar contra o abandono das aldeas é preciso moita forza e compromiso, moita convicción e estratexia, para que os políticos non se esquezan da xente que vive no colo destas montañas, co Limia sempre aló deitado no fondo, presidindo tan soberbio escenario, ese meu río da vida xa tan mortiño e abafado, tan morno e desnaturalizado pola cobiza das hidroeléctricas dos dous lados.

Texto: Xosé Benito RezaEx-director do PN do Xurés

Ex-director xeral de Conservación

da Natureza de Galicia

A Cabra-brava Ben

ito R

eza

A última Cabra-brava do Gerês, cuja captura se conhece, em 1890, “Illustração Portugueza” 3/8/1908

Arq

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44 BLOCO DE NOTAS

Talvez Wallace, pai da ciência que se propõe estudar a distribuição das espécies

pelas diferentes regiões deste planeta, não acreditasse que estamos no Sul da Europa

Ocidental se tivesse visitado este pedaço do litoral minhoto durante o último Inverno

Passando o exagero, não deixa de ser verdade que esta teimosia da ciência em arrumar a vida como se estivéssemos a dispor as peças num tabuleiro de xadrez, depara com certos embaraços quando a alternância das estações do ano e os rigores do clima obrigam algumas aves a colocarem-se na “casa errada”.Foi assim, com espanto, que nesta quadra, e após a chegada do já anunciado ganso-grande-de-testa-branca (Anser albifrons), se viram três mergansos-grandes (Mergus merganser) oriundos de latitudes mais setentrionais, a procurarem refúgio na serenidade do Cávado. Depois, ainda das regiões árcticas e como que à boleia no trenó do Pai Natal, chegou uma inesperada mobelha-grande (Gavia immer) de hábitos sobretudo marinhos e que, confiante, ancorou

nestas águas abrigadas, enquanto os molhes de pedra da foz garantiam segurança e alimento a uma escandinava petinha-marítima (Anthus petrosus). E quando a época de reprodução, que se apressava, apelava a todos estes forasteiros para partirem, eis que três improváveis gansos-de-faces-brancas (Branta leucopsis) também por cá fizeram escala rumo ao Norte.Entretanto, a contagem decrescente para o equinócio primaveril era acompanhada por uma sucessão de espécies não classificadas como raridades mas igualmente singulares, perspectivando-nos um cortejo onde o mote deverá ser “a multiplicidade”. A descoberta de um jovem açor (Accipiter gentilis) numa pequena mata aluvial, lembrou-nos que a ógea (Falco subbuteo) não tardará.

Por sua vez, a insólita aparição de alfaiates (Recurvirostra avosetta) ao rebentar das primeiras folhas sugeriu-nos que os pernas-longas (Himantopus himantopus) e até os ostraceiros (Haematopus ostralegus) poderão privilegiar-nos com as suas visitas. E, finalmente, os primeiros borrelhos-de-coleira-interrompida (Charadrius alexandrinus) a prepararem as núpcias nas areias costeiras já vaticinam o regresso das alvéolas-amarelas (Motacilla flava), a passagem dos grandes bandos de maçaricos-galegos (Numenius phaeopus) e os festins aéreos das andorinhas-das-barreiras (Riparia riparia) a celebrarem a renovação da vida.

Texto e fotos: Jorge Silvawww.verdes-ecos.blogspot.com

Avifauna do Estuário do Cávado

44 • Parques e Vida Selvagem Primavera 2011

Alfaiates

Mobelha-grande Petinha-marítimaMerganso-grande

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 45

Ilustração científica – imagem sobre-o-natural

Se bem que se há duas décadas alguém falasse em desenho biológico, ou pior ainda, em ilustração científica, tinha como resultado um franzir inquiridor do sobrolho, ainda hoje, a percepção que se tem sobre o que verdadeiramente representa este domínio dificilmente corresponde à realidade.

Mitos e realidades de um domínio gráfico De facto, nem sempre que se desenha a anatomia interna ou externa de um animal ou de uma planta, ou se ilustra um fóssil, ou se a partir deste se projecta a reconstituição de como esse organismo extinto poderia ter sido em vida, estamos a fazer ilustração científica – tudo depende do rigor, da correcção e da objectividade inerente a essa figuração de acordo com o conhecimento científico aceite nesse momento... Por outro lado, quem cria um simples gráfico ortogonal onde se expressa uma relação entre duas variáveis,

está implicitamente a fazer uma ilustração científica — pois é possível inferir informação variada, obtida através da experimentação científica, a partir da leitura de uma única curva... Mais, uma ilustração científica tanto tem cabimento num livro para crianças de tenra idade, com pendor didáctico ou pedagógico, como tem numa revista de divulgação de factos e curiosidades científicas ou ainda num banal jornal diário, estes últimos destinados a um público mais generalizado e adulto — isto é, o seu alcance vai para além do “nicho” editorial de eleição que são os manuais técnico-científicos, ou os livros e revistas de Ciência.Na realidade, o “paradigma” daquilo que é uma ilustração científica não se compadece da maior ou menor quantidade de linhas, ou riscos, nem do ser mais ou menos bela. Também não é uma ilustração necessariamente elitista e complexa, indecifrável para todos menos para os “iluminados” investigadores que labutam nos

pólos universitários e centros de pesquisa científica. Não tem nem mistérios, nem enferma de feudalismos ou ainda de “dons” artísticos intrínsecos ao indivíduo — tal como acontece com a Ciência ou com a Arte, descobre-se, aprende-se e molda-se. De facto, nem a Ciência para ser válida e útil precisa de ser complexa e hermética em si, nem a Arte precisa de se mostrar eclética ou “mística”, se pensada num pendor de expressão de criatividade. Ambas, enquanto manifestações do pensamento humano, podem ser conciliatoriamente prestantes, potenciando-se uma à outra. É deste inter e intra-cruzar de valências e competências que a ilustração científica acaba por erigir a sua própria identidade e domínio, à medida que historicamente expurga a subjectividade (decorrente de testemunhos não-científicos) e se afasta da mestiçagem cultural e dos entendimentos místicos na figuração das entidades e dos fenómenos que determinam e regem a Natureza — ou da maneira como

“Converter Ciência em Imagem desenhada é, antes de tudo, um exercício

de reflexão e interpretação, uma incessante procura de contornos heurísticos,

da Universalidade e do Imediatismo, da Comunicabilidade. Só depois é traço e cor”

RETRATOS NATURAIS 45

Cagarro (Calonectris diomedea ssp. borealis)

Page 46: Revista PARQUES E VIDA SELVAGEM n.º 35, Primavera de 2011

46 RETRATOS NATURAIS

46 • Parques e Vida Selvagem Primavera 2011

a entendemos presentemente, já que o conhecimento científico está em constante construção e evolução.

Ilustração científica – a imagem útil, credível e honestaA melhor definição que se pode dar sobre o que é a Ilustração Científica talvez esteja compreendida no entendimento do que é uma Imagem Útil — ou seja, que cumpre um fim objectivamente delimitado (transmitir uma mensagem, uma parcela do conhecimento científico, na forma de uma narrativa gráfica) – e Honesta (que é implicitamente credível, isto é, em que acreditamos ser factualmente verídica). Da Ciência, herdou o culto pelo rigor, pelos métodos e protocolos, pela explicação; da Arte, o incentivo daquilo que ao olhar causa impacto visual, pelo que é esteticamente belo e apelativo, gerador de sensações. De ambas, a necessidade de ser criativa e Universal, procurando ser acessível e passível de ser entendida e utilizada por todos — tanto aqui em Portugal, como em qualquer outro parte de Mundo.Uma ilustração científica é sempre uma imagem pensada e estrategicamente construída (desenha e/ou pintada) com um fim bem definido e objectivo — não é o resultado de um ímpeto ou do riscar de uma ideia espontânea. Regra geral, representa com rigor assuntos estudados pelas Ciências — como a Biologia, a Geologia, a Antropologia, a Paleontologia, a Arqueologia, a Medicina, etc. Representar graficamente os resultados e interpretações científicos encerra em si um estudo, uma investigação — ela própria

adopta a linguagem estruturante, hierárquica e sequencial do método científico, que constitui a coluna vertebral da imagem, mas adorna-a com o sabor e o saber da Estética. O objectivo fundamento científico é revestido q.b. pelo subjectivo do Belo, transformando a ilustração na arte de criar o “veículo” visual ideal para transmitir esse Saber. Fazer-se ilustração científica é uma incessante procura, não só da Universalidade (diluindo barreiras e obstáculos à passagem do Conhecimento pelos vários sectores sociais a que se destina), como do Imediatismo (ausência de tradutores/tutores que descodifiquem essa mensagem traduzida em imagem) e da Comunicabilidade (criando canais que facilitem a troca de informação e incrementem o progresso científico).Este tipo particular de imagens respeitam sempre três premissas basilares e simultâneas: 1) reunirem, em si mesmas, a Informação, de forma objectiva (não especulativa), clara e precisa (COMPILAR/INFORMAR); 2) ser capaz de, por si só, veicular a observação/mensagem científica a desconhecedores (TRANSMITIR); e 3) criar no receptor a empatia sensorial necessária para fomentar a apreciação deste registo imagético, facilitar a sua análise, promover a percepção dos seus códigos gráficos e agilizar a sua rápida interpretação (decifração) e consequente apreensão do conhecimento nela encapsulado (ESTIMULAR).

As origens e a alfabetização visualPortugal foi, desde o séc. XV e enquanto potência náutica impulsionadora dos Descobrimentos, um dos países que mais contribuiu para o erigir de uma

nova profissão — os desenhadores, ou riscadores, naturalistas. Entre os séc. XV-XVIII ajudou ainda a criar a primeira corrente de alfabetização visual, apoiada na necessidade de registar patrimónios naturais além-fronteiras e ultramarinos, já que os centros decisores do Reino se encontravam na outra ponta do Mundo conhecido; era preciso “ver” à distância, para ajuizar sem prejuízo e avançar com as melhores estratégias de conquista e exploração de recursos naturais que continuassem a trazer riqueza e prosperidade ao império.De facto, os fenómenos expansionistas podem ser considerados os genuínos responsáveis pela primeira vaga de Ilustradores-naturalistas e do emergir das bases fundamentais da Ilustração científica, tal como hoje se entende.

Perdiz-cinzentaPerdix perdix

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Curiosamente e já por então, o Poder estaria concentrado na Imagem desenhada…Estes aventureiros artesões do desenho, que acompanharam as primeiras expedições científicas, acabaram por estabelecer os cânones e directrizes do que se pode considerar os “protótipos” dos primeiros “ilustradores científicos” – um técnico multidisciplinar, com enraizados conhecimentos nos domínios das Artes e treinado nos afazeres da Ciência, capaz de narrar o discurso científico através da imagem desenhada.

Saber Fazer e fazer o SaberPara criar uma ilustração científica torna-se imperativo Educar o Olhar e o modo de Ver (não só do sujeito que desenha, como também do que lê essas imagens), para depois se reaprender a Observar (olhar atentamente, examinar, cumprir fielmente) e estar assim apto a fazer uma Interpretação objectivamente correcta, ou ser fiel na figuração da entidade orgânica (um ser vivo ou um seu constituinte, como um órgão, ou uma célula, ou uma molécula) ou inorgânica (como um vaso que expressa uma cultura material, um mineral ou rocha, um fóssil, etc.)Neste ponto, por exemplo, facilmente se compreende que em ilustração biológica tanto se representa a anatomia externa (morfologia), como a interna, a nível macroscópico (a olho nu) ou microscópico (com auxílio de instrumentos de ampliação), sejam eles de organismos contemporâneos, ou já extintos (vertebrados, invertebrados, plantas ou outros). Assim, a ilustração científica abrange campos

de intervenção bastante vastos, diversificados e motivadores, conciliando a CIÊNCIA e a ARTE num único modelo de comunicação, o qual constitui uma ferramenta extremamente útil e poderosa para a aprendizagem. De facto, não só contribui para a construção do conhecimento cognitivo (intrínseco ao individuo), como também para a perpetuação/memória do conhecimento científico (História da Ciência). A ilustração científica intervém tanto ao nível da troca de informação entre investigadores (COMUNICAÇÃO), como pode espelhar a democratização da Ciência a outros domínios sociais (DIVULGAÇÃO). Assim, um ilustrador científico reúne em si algo mais que o saber de um técnico especialista — é um naturalista e cronista da Natureza e, simultaneamente, um artista e agente promotor na área do marketing científico. Oriundo do campos das Ciências e complementando os seus conhecimento com a prática e teoria artística, ou vice-versa, mostra-se capaz de abrir preciosas “janelas” sobre o conhecimento e alargar os horizontes do entendimento, expressando-o em algo tão simples como meros riscos que habilmente conjuga com manchas de cor. No final obtém uma imagem que vive da dualidade — deleita e ensina — e que tanto é apreciada por artistas, como por cientistas, ou ainda os entusiastas e curiosos que por elas se deixam arrebatar e se sentem impelidos a também fazerem um ensaio gráfico sobre-o-natural...

Texto e ilustrações: Fernando CorreiaBiólogo e Ilustrador científico

Dep. Biologia, Universidade de Aveiro

[email protected]

www.efecorreia-artstudio.com

Entre estes, destacaram-se os Navegantes-desenhadores ou “cartógrafos-náuticos”, que, nas primeiras explorações marítimas, eram responsáveis pelo registo da realidade geográfica e posterior concretização imagética nas preciosas cartas de navegação marítima — desde os primeiros “portulanos”, ainda executados sem recurso às coordenadas geográficas (latitude e longitude) e construídos somente com base nas rectas de rumo (linhas loxodrómicas), até às mais modernas cartas marítimas dos séculos seguintes. Estas primeiras ilustrações cartográficas eram de tal forma importantes que passavam a constituir autênticos segredos da Coroa, guardados a sete chaves. Este seria mais um episódio que atestaria a verdade popular milenar : “o verdadeiro Poder está no Conhecimento”.

Aparelho reprodutor de uma cadelaCanis lupus spp. familiaris

Lagarto-que-causa-espanto Tarbosaurus bataar

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48 RETRATOS NATURAIS

Vamos desenhar... um pardal“Ilustrar uma ave é compreender e figurar não só a sua anatomia externa,

mas também a sua maneira de estar e de interagir, tipificada na sua pose.

Ilustrar cientificamente uma espécie da avifauna é traduzir em traços e/ou cores

um ser “ideal” — isto é, criar uma imagem capaz de reunir em si o máximo

de informação taxonómica.”

Um dos erros mais comuns e que frequentemente remete uma ilustração que se pretende científica (rigorosa, sintética e objectivamente correcta) para o campo da ilustração genérica (ou ensaio gráfico) reside no facto de o autor pecar por deficit de informação sobre aquela espécie em particular. Esta situação ocorre devido ao facilitismo observado em dois tipos de procedimentos: 1) apoiar todo o exercício de ilustração numa única referência visual (um desenho preexistente ou uma única fotografia — no primeiro caso, pode acabar por clonar erros do primeiro ilustrador e no

segundo pode estar a trabalhar tendo por base a fotografia de um indivíduo que é atípico para a espécie); 2) cingir-se apenas à informação visual, que possui ao seu dispor, e descurar a pesquisa de informação descritiva (suplementar ou complementar da primeira) que caracteriza a espécie em causa.Na rubrica que hoje se inicia, vamos procurar induzir paulatinamente métodos para criar ilustrações científicas, retratando a Natureza que podemos observar num qualquer passeio ou saída de campo. Para fazermos estes pequenos exercícios introdutórios podemos recorrer aos lápis de cor, às tintas acrílicas, às

aguarelas transparentes e opacas (guaches), à tinta-da-china e a muitos outros materiais de expressão plástica — mas em todas elas iremos sempre utilizar o vetusto lápis de grafite, para riscar as formas e as silhuetas, os limites dos contornos, criando o nosso primeiro esboço, ou preliminar. Só depois de termos resolvido todos os potenciais problemas nos ensaios preliminares é que estamos aptos a partir para a arte-final, minimizando assim os erros que poderíamos plasmar na nossa ilustração.O primeiro modelo que iremos utilizar será o simpático e pululante pardal, um passeriforme

Pardal-comum, Passer domesticus

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sedentário que nos habituámos a ver distribuído por todo o território nacional, associado à presença humana e bastante prolífico nas regiões mais urbanizadas. Nestas, não só encontra refúgio, como também abundantes locais para nidificar e se alimentar — quem ainda não observou estes intrépidos aventureiros a debicar restos de comida numa qualquer esplanada? Sociais, andam em bando, e no Verão, ocupam aos milhares as copas dos plátanos das avenidas, onde estabelecem os seus dormitórios estivais (e local de pasto para muitas corujas-das-torres, que provocam o pânico e a debandada geral quando resolvem fazer uma incursão nocturna nestes “bairros sociais” arbóreos, à procura de uma dieta alternativa).A leitura deste parágrafo levar-nos-ia a concluir que a escolha deste cenário para a ilustração científica que abre este artigo não teria sido muito feliz, já que induziria o leitor em erro sobre o habitat. Contudo, uma leitura atenta da informação disponível também nos indica que no Inverno pode ser visto em grandes bandos, por vezes mistos com outras granívoras, em terrenos baldios ou pastagens. Atentando assim ao cenário, a cor do céu, estrategicamente escolhida para condizer com os matizes dos castanho do pardal, e as árvores despidas transportam-nos para essa mesma época do ano e para esses locais à primeira vista “atípicos”. Esta imagem, este pequeno exercício de reflexão, permite-nos compreender a importância do cenário de fundo, muitas vezes relegado para simples adorno. A sua importância é tal que pode alavancar a estética de uma composição, mas, se mal escolhido (não sustentado por informação correcta), pode arruinar uma

ilustração científica (por melhor que a espécie esteja representada) — algo que não escapa ao olhar analítico e crítico de um especialista.

A(r)riscarO primeiro passo para figurar esta espécie será pois consultar alguma bibliografia, ou um especialista (ornitólogo), e discriminar todas as características que permitem fazer a diagnose e a identificação deste ubíquo animal. Será também importante estudarmos a forma do corpo, da cabeça, o tipo de bico (grosso, típico dos granívoros) e as poses comummente adoptadas, antes de partirmos para o estudo do padrão formado pelas penas, nas várias partes do corpo, nas asas e na cauda.Uma ave pode ser representada em várias poses, vistas ou normas, mas sendo um animal com simetria bilateral, ao longo do maior eixo, basta apenas desenhar metade do corpo — donde não é raro observar as aves desenhadas em norma lateral. É pois

importante conhecermos também os vários tipos de penas a que temos que dar atenção na representação de cada espécie já que estas variam em número, na extensão, na forma (comparar, por exemplo, com a topografia do Picanço).Interiorizada esta informação basilar estamos prontos para a acção. Aproveitando uma ida à esplanada de um bar e os dias primaveris que se aproximam, depois de nos sentarmos comodamente e enquanto bebericamos um café e debicamos um guloso queque, toca a puxar pelo nosso caderno de desenho (de folhas brancas e gramagem generosa) e do nosso lápis de grafite (ou lapiseira), para riscar sem medo e retratarmos o nosso vizinho emplumado que, olhando de soslaio, se aproxima saltitante querendo o seu quinhão...

Texto e ilustrações: Fernando CorreiaBiólogo e Ilustrador científico

Dep. Biologia, Universidade de Aveiro

[email protected]

www.efecorreia-artstudio.com

Picanço-de-dorso-vermelho, Lanius collurio

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50 MIGRAÇÕES

É no oceano que o sável sente necessidade de voltar

às origens: já lá vão entre quatro a seis anos que dá

à barbatana neste mundo maior chamado Atlântico

Agora, é tempo de voltar ao berço, no rio em que nasceu.Não se lembrará nessa altura das ramagens ondulantes dos salgueiros que da beira-rio sombreavam a água, mas poderá vagamente recordar o embalo peculiar desse caudal de maneira única. O certo é que alguns estudos genéticos assinalam o que os cientistas designam como comportamento de “homing”. Isto quer dizer que regressam ao rio em que nasceram para ali se reproduzirem e, quase sempre, morrerem.Este facto faz da viagem do sável algo bem mais complexo do que uma simples migração. Se bem que entre o mar do Norte e a costa portuguesa possam contar-se 2 mil quilómetros, o sável tem de se adaptar progressivamente da água doce à salgada e vice-versa, anos depois, quando quer desovar. Por volta de Março e Abril, o sável passa no seu maior tamanho — meio metro — nos estuários, gordo. O corpo destes peixes pouco a pouco transforma-se com vista ao acto reprodutivo. Para a maioria destes animais será última festa, ou nem isso, quando não conseguem passar obstáculos que surgem entretanto pelo caminho, como as barragens sem dispositivo de trânsito para peixes migradores.O sável traz reservas energéticas para a reprodução. No regresso às origens já não se alimenta. Se gastar estas reservas a ultrapassar barreiras artificiais, o processo de reprodução está fragilizado.A meta que estes cardumes traçam a si próprios consiste em chegar ao habitat adequado, mais para montante. Aí, no areão lavado a perto de um metro de profundidade, as fêmeas porão os ovos e os machos fertilizam-nos.Há cumplicidades subtis entre a água que corre e a vegetação ribeirinha que consolida o habitat, até porque esta tem o seu papel no desenvolvimento dos juvenis. As raízes consomem nutrientes da água e purificam-na, as folhas atraem insectos e criam sombras no rio sem as quais o oxigénio dissolvido periclita. Se tudo correr bem, a postura eclode em menos de uma semana, dependendo da temperatura da água. Os alevins, nome dado aos pequenos peixes, vivem por ali meio ano. Nesse período alimentam-se de zooplâncton, talhado para a sua boca. À medida que crescem atiram-se aos insectos aquáticos e passadas algumas semanas descem o rio com a corrente, ficando-se então pelos estuários. Só seguem para mar aberto na Primavera do ano seguinte.O estatuto do sável lê-se preto no branco: em perigo. As razões essenciais desdobram-se no Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal: «Admite-se que a redução da população nos últimos 15 a 18 anos tenha atingido 50% do número de indivíduos maduros e prevê-se que possa atingir 70% nos próximos 15 a 18 anos».Há quem diga que, em Portugal, o sável está no grupo das espécies mais ameaçadas em termos de conservação. É importante, por isso, que não se esgote um recurso que é de todos.A península Ibérica está no limite Sul de distribuição desta espécie e os rios que ainda abrigam esta peça do património lusitano, com grande valor comercial, centram-se na subpopulação da bacia do rio Mondego.Por estes dias, quando visitar um estuário, quem sabe se sob o tecto de água não estará a passar um cardume de sável, no ritmo sazonal da biodiversidade de que todos dependemos?

Ilustração: Ernesto BrochadoTexto: Jorge Gomes

Sável Alosa alosa (Linnaeus, 1758)

Bibliografia: «Rede Natura 2000: Peixes Dulciaquícolas de Interesse

Comunitário», edição ICNB. «Peixes do Parque Natural do

Vale do Guadiana», ed. ICN.

Muito mais do que uma grande viagem

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• O sável pode cruzar-se na natureza com um parente: a savelha, Alosa fallax. Isso faz com que a capacidade reprodutora efectiva e a integridade genética da espécie diminua. A génese do problema está sobretudo nos obstáculos à migração deste peixe, que tenderia a ir mais longe na desova do que a savelha.

• Há legislação nacional e internacional de conservação que protege o sável. Aliás, uma parte dos rios Minho, Lima, Vouga, Tejo e Guadiana foram designados para a Lista Nacional de Sítios, de acordo com a Directiva Habitats, devido à presença deste peixe.

• Há populações não migradoras aprisionadas em albufeiras. É o caso das de Castelo do Bode (rio

Zêzere) e Aguieira (rio Mondego). Os pescadores que apanham estes peixes apelidam-nos de raquíticos.

• A continuidade longitudinal dos rios é essencial para que o sável não desapareça. A criação de passagens para peixes nas barragens poderia permitir o acesso do sável e de outros peixes migradores às zonas de desova.

Much More than a Trip The Shad senses the call of their roots even in the ocean. They have swum in the Atlantic Ocean for between four to six years but now it is time to return to the river where they were born. Some genetic studies point to what Scientists call “homing” behaviour, which refers to returning to the river where they were born to reproduce. This makes the Shadsí trip somewhat more complex than a simple migration.

Muito mais do que uma grande viagem

Curiosidades

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A dispersão deste insecto para fora da sua zona geográfica de origem iniciou-se no Médio Oriente (Irão, Arábia Saudita e Egipto)

na década 1980-90 e continuou na Europa, tendo sido detectado em Espanha (1993), na Itália (2004), na Grécia e em França (2006) e em Portugal (2007), estando associada ao comércio de palmeiras. (DGADR, 2008).Este insecto tem como principais hospedeiros várias espécies de palmeiras da família da Arecaceae. Na bacia mediterrânica como hospedeiros principais temos a Phoenix canariensis, vulgarmente designada por palmeira das Canárias, palmeira-tamareira e, mais raramente, a Washingtonia (DGADR, 2008).Dado o insecto ser causador de graves devastações em palmeiras e existir um elevado risco da sua introdução e dispersão na Comunidade, a Comissão Europeia, em Maio de 2007, publicou a Decisão 2007/365/CE, alterada pela Decisão 2010/467/EU de 17 de Agosto, onde constam a medidas de emergência fitossanitária contra a introdução e a propagação do Rhynchophorus ferrugineus (Olivier).Atendendo ao aparecimento do Rhynchophorus ferrugineus (Olivier) na região de Entre Douro e Minho em finais de 2010, alertarmos a comunidade em geral para a participação na implementação de uma estratégia de controlo integrada, através do recurso a diferentes instrumentos. Neste contexto, apresentamos uma breve caracterização do insecto, os principais sintomas da sua presença no hospedeiro,

e por fim um conjunto de medidas de protecção fitossanitária a serem aplicadas no seu combate.

Caracterização do insectoO insecto adulto tem a forma de um besouro, medindo o macho entre 2 e 4,5 cm de comprimento e 0,8 a 1,6 cm de largura. Geralmente o corpo tem uma coloração vermelha-alaranjada, podendo variar entre o castanho-alaranjado a um tom cinzento-escuro, sendo as patas da mesma cor do corpo. As larvas, no final do seu desenvolvimento, poderão medir 5 cm de comprimento e 2 cm de largura. Têm uma coloração que varia entre o branco-marfim e bege-claro. A cabeça é castanha-escura, brilhante, com mandíbulas curvas e fortes. Não possuem patas.As pupas medem 4 a 5 cm de comprimento e formam-se no interior de um casulo feito a partir das fibras da palmeira.

BioecologiaTodos os estádios de desenvolvimento do insecto (ovo, larva, pupa e adulto) coexistem no interior de uma mesma palmeira. Os adultos são atraídos por compostos voláteis resultantes de feridas em palmeiras (por exemplo, feridas causadas pela poda) e por feromonas de agregação.As larvas alimentam-se dos tecidos do hospedeiro, mantendo-se no interior do espique. No final do desenvolvimento, as

52 • Parques e Vida Selvagem Primavera 2011

52 ACTUALIDADE

Insecto exótico destrói palmeiras Originário das zonas tropicais da Ásia

e da Oceânia o Rhynchophorus ferrugineus (Olivier)

é um coleóptero da família dos curculionídeos

larvas utilizam as fibras vegetais para tecerem o casulo.A duração do ciclo de vida do insecto é de cerca de 75 a 130 dias, dependendo do hospedeiro, disponibilidade de alimento e factores climáticos.

Principais sintomas no hospedeiroAs palmeiras numa fase avançada da infestação apresentam as folhas muito curvadas em direcção ao solo, com uma torção na zona média da nervura central. As folhas centrais, da coroa, amarelecem e secam. As folhas mais externas, com galerias e orifícios na base resultantes da presença de larvas e casulos, desprendem-se facilmente da planta. Poderão observar-se no espique, junto à coroa, orifícios de saída de adultos.As palmeiras que apresentam os sintomas descritos já não têm capacidade de recuperar, acabando por morrer.

Meios de luta preventivosEvitar feridas nas plantas. Em Espanha, na região da Andaluzia, recomendam que as podas sejam realizadas nos meses mais frios do ano (entre Dezembro e Fevereiro) que

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correspondem ao período de menor actividade do insecto adulto. Sempre que possível, isolar as feridas resultantes da

poda.As palmeiras mortas ou que apresentem sintomas de forte infestação deverão

ser abatidas. Deverão tomar-se os cuidados necessários nesta

operação (recobrir o espique com uma rede de malha fina), de modo a evitar a dispersão de insectos adultos para plantas vizinhas.A título de exemplo, nas prospecções realizadas em Granada, Espanha, numa única palmeira que foi abatida, cujo espique tinha um diâmetro de 80 cm e uma altura de 2 m, foi possível recolher 347 casulos (dos quais 47 vazios), 45 larvas na fase final do seu desenvolvimento e numerosas larvas em estádios intermédios. Estes números permitem-nos perceber a importância de abater as palmeiras fortemente infestadas e as que já estão mortas.

Curativos A realização de tratamentos fitossanitários deverá ter por base a avaliação do grau de infestação da palmeira, feita por um técnico especializado. Só assim se poderá aferir se valerá a pena, ou não, este tipo de intervenção. Poderá consultar o site www.

dgadr.pt onde se indicam os produtos homologados para este efeito.

Prospecção na região NorteFace à situação actual deste organismo em Portugal, nomeadamente no que se refere ao aparecimento do insecto em 2007 na região do Algarve em plantas de Phoenix canariensis e face à sua rápida dispersão noutras regiões, a Divisão de Protecção e Controlo Fitossanitário da Direcção Regional de Agricultura e Pescas do Norte (DRAPN), sob coordenação da Direcção Geral de Agricultura e Desenvolvimento (DGADR) em 2008, 2009 e 2010, intensificou a prospecção do Rhynchophorus ferrugineus (Olivier) bem como a sua vigilância, concretamente em potenciais hospedeiros instalados em jardins públicos, jardins particulares e em viveiros de materiais de propagação vegetativa.Assim, em resultado dos trabalhos de prospecção desenvolvidos em toda a região Norte, em Outubro de 2010, foi observada a presença do Rhynchophorus ferrugineus (Olivier) em palmeiras instaladas na região de Entre Douro e Minho, mais precisamente em exemplares Phoenix canariensis instalados em jardins particulares, distribuídos por três freguesias pertencentes ao concelho de Vila Nova de Gaia; freguesias de Valadares, Gulpilhares e Arcozelo. Até ao momento, a

área infestada encontra-se circunscrita a estas três freguesias, não se observando sintomas da presença do insecto em exemplares localizados em áreas vizinhas.

Comentários finaisDada a elevada capacidade de dispersão e estabelecimento do Rhynchophorus ferrugineus (Olivier), bem como as dificuldades inerentes ao seu combate, mais uma vez, alertamos para a colaboração de todos os intervenientes na implementação de uma estratégia integrada de controlo no sentido de serem aplicadas medidas rápidas e eficazes, de modo a protegermos os nossos ecossistemas da introdução, dispersão e estabelecimento de novos organismos nocivos.

Texto: Gisela Chicau e Miguel Folhadela Rebelo, Técnicos Superiores da Divisão de

Protecção e Controlo Fitosanitário, DRAP-Norte

Bibliografiahttp://www.juntadeandalucia.es/agriculturaypesca/portal/areas-

tematicas/agricultura/sanidad-vegetal/picudo_rojo_palmeras/

index.html Curculiónido Ferruginoso, Picudo Rojo de las

Palmeras Rhynchophorus ferrugineus (Olivier) Consejeria de

Agricultura y Pesca, Junta de Andalucia. (28-02-2011; 15:30h).

DGADR. 2008. Rhynchophorus ferrugineus (Olivier) uma nova

praga da palmeira em Portugal.

OEPP/EPPO. 2007. Bulletin OEPP/EPPO, 37 (571-579)

Vicente, Carlos De Liñan. 1998. Entomologia Agroforestal.

Ediciones Agrotécnicas, S. L., Madrid, Espanha, 1168-1171pp.

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54 MIGRAÇÕES

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Entre 17 e 19 de Fevereiro decorreu no Parque Biológico de Gaia a reunião anual da Associação Ibérica de Zoos e Aquários (AIZA), juntando cerca de 70 participantes de vários países.Dadas as boas-vindas, os inscritos distribuíram-se por quatro grupos de trabalho: direcção, conservação, educação e marketing. Em cada tema foram apresentados

os novos membros da AIZA, referiram-se as novas instalações, assim como os trabalhos recentemente desenvolvidos. No intervalo das reuniões não podia faltar uma visita ao trilho de descoberta do Parque. No último dia realizou-se o debate das conclusões, que foram apresentadas na sessão de encerramento. Texto: Ana Mafalda

Associação Ibérica de Zoos e Aquários

A AIZA contou no certame com cerca de 70 participantes

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54 BREVES

Com vista a «fazer face ao número crescente de visitantes», o Parque Biológico de Vinhais está a instalar uma piscina biológica. Dispensados os aditivos químicos, explica a directora, Carla Alves, «todo este trabalho é feito com recurso a plantas naturais que se encarregam de oxigenar a água, deixando-a límpida». Um outro equipamento projectado é o Centro Interpretativo das Raças Autóctones, que tem por objectivo dar a conhecer a variedade de que a região é exemplo. Será dada informação aos visitantes sobre «as raças de animais que contribuem para a riqueza da região graças à qualidade da carne». Mais: www.parquebiologicodevinhais.com

Parque Biológico de Vinhais

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 55

BIBLIOTECA 55

Link escreve que “o mais notável animal [no Gerês] é a Cabra selvagem... Vimos várias peles e finalmente foi trazido para as

Caldas [do Gerês] um bode abatido, com três anos, que o senhor conde Hoffmannsegg comprou e em cuja colecção se encontra empalhado. [posteriormente transitou para o Museu de Berlim] (...) Não se encontra noutra parte de Portugal, excepto nestas montanhas. Duvido que exista em Espanha. (...) Encontrámo-la muito daqui [Caldas do Gerês] até Montalegre; os habitantes caçam-na muito, e a carne é tão apreciada, que o caçador que nos vendeu com prazer a pele, não quis ceder a carne. Das peles fazem frequentemente coberturas para as mulas e, quanto aos cornos, ornamentam as casas.”Da pele de Cabra-brava que Hoffmannsegg levou para Berlim, conserva ainda hoje o Museu de História Natural da Universidade de Berlim restos do crânio, registados sob a referência ZMB 2201.Este exemplar, ainda que muito incompleto, é um dos três únicos existentes no mundo, da extinta subespécie Capra pyrenaica lusitanica, cujos machos adultos eram localmente conhecidos por “reichêlos”.No Museu Bocage, em Lisboa, existiam embalsamados, um macho e três fêmeas, capturados em 1852 e oferecidos por D. Pedro V, mas perderam-se no incêndio que devastou aquele museu em Março 1978. Teria havido um crânio que entretanto desapareceu mas de que existe uma foto na “Gazeta

Mobil”, n.º 187, de 1975, revista publicada até final dos anos 70 pela Mobil Oil Portuguesa. No Museu de Zoologia de Coimbra ainda existem dois exemplares embalsamados, um macho e uma fêmea, provenientes do Gerês,

mas sem data; talvez sejam os mesmos que o Senhor Fructuoso, banheiro de Gerês, enviou àquele museu, segundo escreveu José Tomaz de Sousa Pereira na “Ilustração Portugueza”, n.º 132, de 31/08/1908: “Estivemos no Geres desde Maio de 1890 a Junho de 1895 e ainda ali encontrámos no pleno gozo das suas faculdades o velho banheiro Fructuoso, que foi o melhor caçador da cabra brava, e raro era ele falar das suas caçadas ao bravio animal, que lhe não viessem as lágrimas aos

olhos, lágrimas de saudade pelos tempos idos e que a idade e a fraqueza das pernas não deixaram renovar. Foi ele quem forneceu os exemplares que ainda há anos existiam no Museu de Coimbra e nunca se pode

convencer da extinção da cabra.” No Museu da Escola Superior de Medicina Veterinária de Lisboa terá existido um exemplar capturado em 1890, mas que se perdeu; seria o último indivíduo capturado vivo, em 20/09/1890 e levado para o Jardim Zoológico de Lisboa, em 23/09/1890, onde morreu.Conta Augusto da Silva Carvalho, nas “Memórias das Caldas do Gerez” (1941), que em Maio de 1852 a Rainha D. Maria II, acompanhada do marido D. Fernando, fez uma viagem ao Norte de Portugal, contando-se o Gerês entre os locais a visitar, o que acabou por não acontecer por a terem avisado que as estradas eram muito más.Quando o casal real estava em Barcelos, Francisco Manuel Costa manda a D. Fernando uma cabra-brava capturada no Gerês que, segundo o príncipe consorte, era “uma dorca [cabra-brava] muito rara e de muito valor.” (Periódico

dos Pobres do Porto, 25/05/1852). Depois, em Guimarães, os habitantes do Gerês “...foram levar [à Família Real] três cargas de caça morta e sete cabrinhas bravas vivas [cabras-bravas, ou mansas?], que levaram para Lisboa”.Porque não nos parece que a Família Real fosse levar para Lisboa cabras-mansas, estes podem ter sido alguns dos cinco exemplares estudados pelo Prof. Barbosa du Bocage, e descritos na sua “Memória

Sobre a extinção da Cabra-brava do Gerês Quando o Conde Hoffmannsegg e o Professor Link (personagens de que já

falámos no último número desta revista) estiveram no Gerês, no Verão de 1798,

referenciaram nos seus livros “Flore Portugaise” e “Viagem a Portugal”

a Cabra-brava (Capra pyrenaica) que, já na altura, consideraram rara

Um aspecto da “excursão venatória” ao Gerês, transportando um Corço (“Illustração Portugueza”, n.º 137, 05/10/1908)

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56 • Parques e Vida Selvagem Primavera 2011

56 BIBLIOTECA

sobre a cabra-montez na Serra do Gerez”, apresentada à Academia Real das Ciências em 16/10/1856, onde escreveu: “Para a nossa descrição consultamos atentamente cinco exemplares, um macho e quatro femêas, que pertencem ao Museu de Lisboa e á acanhada colecção zoológica da Escola Politécnica. Estes exemplares capturados na serra do Gerês em 1852 por fins da primavera [época em que a Família Real visitou a região], segundo cremos, foram oferecidos aqueles estabelecimentos por um Jovem Monarca [refere-se a D. Fernando que tinha, então, 33 anos], que pela cultura das ciências naturais ilustraria o país, em que nasceu, se a Providência lhe não reservasse, dando-lhe um trono, uma missão mais sublime e gloriosa.”A raridade da Cabra-brava era já patente em 1871, quando o visconde Montefaro Barreiro participa numa caçada aos poucos exemplares existentes: “Eram sete; andavam contadas e a sua cabeça, por assim dizer, a preço.”. A caçada fora promovida pelo “...Mota, director da alfândega”, pelo “José Maria, antigo contrabandista... antigo no sentido de ex, digamo-lo para decoro da presente autoridade fiscal...” e pelo padre Gaio, de Brufe (Terras do Bouro), “...o verdadeiro caçador dos sítios...”.Regista Montefaro Barreiro que o padre Gaio “Mandara uma [cabra-brava] por ele morta a D. Pedro V; e a do museu de Coimbra parece-me dele também”.A subespécie de Cabra-brava que existiu no Gerês e na Galiza (Capra pyrenaica lusitanica) extinguiu-se no Gerês por volta de 1890, podendo-se registar as seguintes datas fundamentais: 1871 - “Eram sete; andavam contadas e a sua cabeça, por assim dizer, a preço.”; não foi caçada nenhuma (Barreiro, 1953); 1882 – “...já, segundo nos informaram, muito raro naquelas paragens, mas não extinto, como também se afirmou, pois alguns caçadores que tivemos por companheiros nos asseveraram havê-las visto meses antes.” (Vieira, 1886); 1890, 20 de Setembro – Cabra-brava fêmea capturada em Albergaria, estudada pelo Prof. Ricardo Jorge, e que viria a morrer no Jardim Zoológico de Lisboa (in “A Serra do Geres” de Tude Martins de Sousa, pag. 144 – Fotografada por Emílio Biel, a pedido de Alfredo Tait (Barão de Soutelinho); 1890 – Exemplar encontrado morto no leito do rio Gerês, Vidoeiro (Mendes, 1975); 1891 – Outro exemplar apareceu morto a 2 km da ponte de S. Miguel (Illustração Portugueza, de 03/08/1908); 1892 – Cabras-

bravas vistas pelo Silvicultor José Thomaz de Sousa Pereira, na Lomba do Pau (Mendes, 1975); 1893 – Vestígios junto do curral da Amoreira (Pereira, 1908); Final do séc. XIX: “E os dois pelotões de morte fuzilaram assim o belo animal.” (Costa, 1963) – Carece de confirmação (ver adiante); 1908 – Caçada promovida pela “Illustração Portugueza”; não terá sido capturada nem vista nenhuma cabra-brava (Mendes, 1975); 1921 – ”... o último exemplar da cabra do Gerês – um macho – foi abatido, em 1921” (Bravo, 1982) – Carece de confirmação, ver adiante. Assim, 1892 tem sido aceite como data “oficial” de extinção da Cabra-brava no Gerês. No entanto, sabe-se que a revista “Illustração Portugueza”, uma edição semanal de “O Século” (um jornal diário matutino de Lisboa, publicada entre 1903 e 1924), promoveu de 15 a 17/9/1908 uma grande expedição venatória ao Gerês, com o patrocínio do próprio Rei D. Miguel, para apurar se ali ainda havia cabras-bravas. Diversos artigos sobre a caçada foram publicados na “Illustração Portugueza”, de Março a Novembro de 1908.Embora o resultado desta expedição tenha sido negativo (os 78 caçadores e cerca de 100 batedores apenas abateram 6 corços e cerca de 80 perdizes, segundo notícia da “Illustração Portugueza” de 02/11/1908), não deixa de ser de assinalar ainda haver suspeitas da existência da Cabra-brava, 16 anos depois da data “oficial” de extinção.No livro “A propósito da caça”, do Dr. José Maria Bravo, surge a seguinte intrigante referência: ”... o último exemplar da cabra do Gerês – um macho – foi abatido, em 1921, numa excursão venatória (?!) organizada, para o efeito, pelo jornal “O Século”.Não vemos esta referência comentada ou desmentida por nenhum autor que abordou o assunto; poderá haver um erro de data, poderá não ser “O Século”, mas sim a “Illustração Portugueza”, que era publicada por aquele jornal, mas não deixa de ser curiosa a categórica afirmação de ter sido abatida uma Cabra-brava, mais rigorosamente um macho. O Dr. José Maria Bravo era um conhecido caçador, director da revista de caça, pesca e hipismo “Diana”, que se publicou de 1948 a 1975, e não nos parece muito credível que se tivesse enganado.Já no livro “A Caça em Portugal” (1963) Eurico Costa conta detalhadamente uma história ainda mais bizarra: “Mas aquela última cabra-brava teimava em viver! Mobilizaram-se vinte

espingardas [Não é, pois, a caçada promovida em 1908 pela “Illustração Portugueza”, pois esta mobilizou 78 caçadores)] que perseguiram sem descanso, por fragas e quebradas, o animal proscrito e condenado que, subindo, subindo sempre, atingiu o último píncaro. A hoste dividiu-se então em duas fracções, Estreitou-se o cerco. E os dois pelotões de morte fuzilaram assim o belo animal, que se manteve ainda alguns segundos, projectado contra o céu, no seu pedestal fragoso, caindo depois no abismo. Assim se “caçou” (!) em Portugal no fim do século passado.”Esta referência ao abate de uma Cabra-brava pode coincidir com a anterior, embora a primeira se localize pretensamente em 1921 e esta última, segundo o autor, no final do séc. XIX, mais próxima, portanto, da caçada promovida, efectivamente, pela “Illustração Portugueza” em 1908. A descrição remete, de facto, para uma “expedição venatória”; será que, na expedição de 1908 foi abatida uma Cabra-brava? Será que, por vergonha, ou por envolvimento de alguma figura pública de então, se fez silêncio sobre este acontecimento? Ou será que depois de 1908 ainda houve outra caçada? Por agora fica a dúvida, sendo certo que é bem provável a subsistência da espécie até data bem posterior à oficialmente aceite para a extinção.

Bibliografia: BARREIRO, Montefaro (1953). Caçada às

Cabras no Gerês. Revista Diana, nº 58, Lisboa.

VIEIRA, José Augusto (1886). O Minho Pittoresco. Livraria António Maria Pereira, Editor, Lisboa.

SOUSA, Tude M. (1906). Regímen pastoril dos povos da Será do Gerez. Revista Portugália, Tomo II, Fac. 1 a 4, 1905-1908, Lisboa.

MENDES, Lagrifa. (1975). O Parque Nacional de Peneda-Gerês. A Cabra do Gerês. Gazeta Móbil nº 187, Lisboa.

COSTA, C. Eurico (Planificação e direcção literária), (1963). A Caça em Portugal. Editorial Estampa, Lisboa.

BRAVO, José Maria (1982). A Propósito de Caça, Edição do Autor, Lisboa.

Este texto insere-se no projecto da biblioteca Parque Biológico “Raízes da História Natural de Portugal”.

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 57

Nelson Cardoso (Porto, 23/10/1954Salamanca, em viagem, 19/01/2011)

A 19 de Janeiro faleceu Nelson Cardoso que, no início dos anos 80, na qualidade de Delegado no Porto do FAOJ (Fundo de Apoio aos Organismos Juvenis, actual Instituto Português da Juventude), concedeu os primeiros apoios técnicos e financeiros para instalação do Parque Biológico, de que viria a ser administrador não executivo de 15/11/2002 a 24/11/2009 (com um interno de seis meses em 2005). O Nelson Cardoso foi dos primeiros responsáveis da Administração Pública Portuguesa a acreditar no projecto “Parque Biológico” que continuou a apoiar, mais tarde, quando foi administrador do Instituto Português da Juventude.Ao Nelson devo a possibilidade de ter editado, em 1979, o meu primeiro livro (“Introdução ao estudo e observação da aves”), graças ao patrocínio do FAOJ, numa época em que pouca gente ligava a esta temática.Nelson Cardoso tinha uma qualidade que o distinguia: enquanto a maioria pessoas coloca pedras no caminho das outras, o Nelson, discretamente, tirava as pedras do caminho.Mais preocupado com a causa pública do que consigo e com a sua saúde, o Nelson Cardoso sofreu uma doença súbita quando jantava em Salamanca, deixando-nos “estupidamente” cedo, aos 56 anos, e deixando um grande vazio.

O Centro de Documentação do Parque Biológico de Gaia procura para a sua Biblioteca os números 47, 51, 54, 55, 56, 69, 70, 71, 72, e 73 da antiga revista “Fórum Ambiente”, publicação portuguesa que, de 1994 a 2002, abordou a temática ambiental e a conservação da natureza. Se guarda ou sabe como obter estes números por favor contacte-nos via [email protected] ou telefone, 227878120.

“Fórum Ambiente”

Da direita para esquerda: Nelson Cardoso, Luís Filipe Menezes e Nuno Gomes Oliveira

João Evangelista numa das muitas acções de educação ambiental que dirigiu: neste caso, uma visita à Citânia de Sanfins, em Janeiro de 1991

João Evangelista (Óbidos, 27/12/1920Caldas da Rainha, 17/02/2011)

A idade derrotou o João “Bafo d´Onça”, um grande amigo e mestre que conheci há quase 40 anos, na Comissão Nacional do Ambiente. Ainda em meados de 2010 a ele recorri, telefonicamente, para tirar uma dúvida sobre o Prof. Orlando Ribeiro, a propósito dos campos de maceira de Esposende; não só me esclareceu prontamente, como logo me convidou para ir almoçar com ele às Caldas da Rainha (prometendo que seria, como habitualmente, um excelente almoço); infelizmente não fui a tempo desse almoço e desperdicei o prazer de uma última lição do João.Foi, sem dúvida, o grande Mestre da Educação Ambiental em Portugal, que sensibilizou gerações, em longas visitas de estudo por montes e vales, ensinando-nos a ler nas pedras, quer nas que a natureza criou, quer nas que o homem transformou. Se, hoje, não consigo interpretar uma paisagem sem convocar à reflexão a história, a geografia, ou a antropologia, isso devo-o ao João Evangelista que me ensinou a “ver”.Pressentindo o fim, em Dezembro passado fez um último gesto de serviço público, doando a sua notável biblioteca de mais de 5000 títulos à Biblioteca Municipal das Caldas da Rainha. Aos 90 anos, deixou-nos com projectos por acabar e uma grande saudade.

Por Nuno Gomes Oliveira

Um tirava pedras do caminho outro fazia-nos compreender as pedrasNo primeiro trimestre deste ano deixaram-nos duas pessoas há muito ligadas ao Parque Biológico de Gaia e que muito diziam a muitos dos que aqui trabalham

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58 • Parques e Vida Selvagem Primavera 2011

O regulamento encontra-se disponível em www.parquebiologico.pt/sequestrodocarbono

Para aderir a este projecto recorte o seguinte rectângulo e remeta para:

Junto se envia cheque para pagamento

Nome do MecenasRecibo emitido à ordem de

1 m2 = e 50 = menos 4 kg/ano de CO2

Telefone

Email

Endereço

N.º de Identificação Fiscal

O Parque Biológico pode divulgar o nosso contributo Sim Não

58 SEQUESTRO DE CARBONO

Agrupamento de Escolas Ovar Sul - Curso EFA B3Alice Branco e Manuel SilvaAmigos do Zé d’AdéliaAna Filipa Afonso MiraAna Luis Alves SousaAna Luis e Pedro Miguel Teixeira MoraisAna Miguel Padilha de Oliveira MartinsAna Rita Alves SousaAna Rita Campos, Fátima Bateiro, Daniel Dias, João Tavares e Cláudia Neves - 11.º A (2009/10) Escola Secundária de Oliveira do DouroAna Sofia Magalhães RochaAna Teresa, José Pedro e Hugo Manuel SousaAntónio Miguel da Silva SantosArnaldo José Reis Pinto NunesArtur Mário Pereira LemosBárbara Sofia e Duarte Manuel Carvalho PereiraBernadete SilveiraCarolina de Oliveira Figueiredo MartinsCarolina Sarobe MachadoCaroline BirchCatarina ParenteColaboradores da Costa & GarciaCónego Dr. Francisco C. ZangerConvidados do Casamento de Joana Pinto e Pedro RamosCursos EFA Básicos (2009/10) da Escola Secundária Dr. Joaquim Gomes Ferreira AlvesDeolinda da Silva Fernandes RodriguesDepartamento Administrativo Financeiro da Optimus Comunicações, SA - DAF DAY 2010Departamento de Ciências Sociais e Humanas da Escola Secundária de ErmesindeDepartamento de Matemática e Ciências Experimentais (2009/10) da Escola Secundária de Oliveira do DouroDinah FerreiraDinis NicolaDulcineia AlaminosEduarda e Delfim BritoEduarda Silva GirotoEscola Básica da Formigosa

Escola Dominical da Igreja Metodista do MiranteEscola EB 2,3 de ValadaresEscola EB 2,3 Dr. Manuel Pinto Vasconcelos - Pegada Rodoviária Segura - Ambiente e InovaçãoEscola Secundária Almeida Garrett - Projecto Europeu - Aprender a Viver de Forma SustentávelFamília Carvalho AraújoFamília LourençoFernando RibeiroFrancisco Gonçalves FernandesFrancisco SaraivaFrancisco Soares MagalhãesGraça Cardoso e Pedro CardosoGrupo ARES - Turma 12.º B (2009/10) da Escola Secundária dos CarvalhosGrupo Ciência e Saúde no Sec. XXI - Turma 12.º B (2009/10) da Escola Secundária Dr. Joaquim Gomes Ferreira AlvesHélder, Ângela e João Manuel CardosoInês, Ricardo e Galileu PadilhaJoana Fernandes da SilvaJoana GarciaJoão Guilherme StüveJoaquim Pombal e Marisa AlvesJorge e Dina FelícioJosé Afonso e Luís António Pinto PereiraJosé António da Silva CardosoJosé António Teixeira GomesJosé Carlos Correia PresasJosé Carlos LoureiroJosé da Rocha AlvesJosé, Fátima e Helena MartinsLina Sousa, Lucília Sousa e Fernanda GonçalvesLuana e Solange CruzManuel MesquitaMaria Adriana Macedo PinhalMaria Carlos de Moura Oliveira, Carlos Jaime Quinta Lopes e Alexandre Oliveira LopesMaria de Araújo Correia de Morais SaraivaMaria Guilhermina G. Maia da Costa, Rosa Dionísio Guedes da Costa e Manuel da Costa Dionísio

Maria Helena Santos Silva e Eduardo SilvaMaria Joaquina Moura de OliveiraMaria Manuela Esteves Martins AlvesMaria Violante Paulinos Rosmaninho PomboMariana Diales da RochaMário GarciaMário Leal e Tiago LealMarisa Soares e Pedro RochaMiguel ParenteMiguel, Cláudia e André BarbosaNuno TopaPaula FalcãoPedro Manuel Lima RamosPedro Miguel Santos e Paula SousaProfessores e Funcionários (2009/10) da Escola Secundária de Oliveira do DouroRegina Oliveira e Abel OliveiraRicardo ParenteRita NicolaSara PereiraSara Regueiras, Diana Dias, Ana Filipa S. Ramos - 11.º A (2009/10) Escola Secundária de Oliveira do DouroSerafim Armando Rodrigues de OliveiraSérgio Fernando FangueiroTiago José Magalhães RochaTurma A do 8.º ano (2008/09) da Escola EB 2, 3 de ArgoncilheTurma A do 9.º ano (2009/10) da Escola Secundária de Oliveira do DouroTurma A e C do 10.º ano (2009/10) da Escola Secundária de Oliveira do DouroTurma B e C do 12.º ano - Psicologia B (2009/10) da Escola Secundária de Oliveira do DouroTurma B e D do 11.º ano (2009/10) da Escola Secundária de Oliveira do Douro Turma E do 10.º ano (2008/09) da Escola Secundária de ErmesindeTurma IMSI do Curso EFA (2008/09) ISLA GaiaVânia Rocha

Cada dia que passa há mais empresas e cidadãos a confiarem ao Parque Biológico de Gaia o sequestro de carbono

Parque Biológico de Gaia • Projecto Sequestro do Carbono • 4430 681 Avintes • V. N. Gaia

apoiando a aquisição de

Procedeu-se à transferência para NIB 0033 0000 4536 7338 05305

euros.

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 59

Para mais informações pode contactar pelo n.º (+351) 227 878 120 ou em [email protected]

Parque Biológico de GaiaProjecto Sequestro do Carbono

4430-681 Avintes • Vila Nova de Gaia

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Ajude a neutralizar os efeitos das emissões de CO2, adquirindo área de floresta em Vila Nova de Gaia com a garantia dada pelo Município de a manter e conservar e de haver em cada parcela

a referência ao seu gesto em favor do Planeta.

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60 • Parques e Vida Selvagem Primavera 2011

60 OPINIÃO

Desde a década de 60 que o movimento conservacionista tem apostado no uso de espécies-bandeira (aquelas

usadas como símbolos de campanhas de educação ambiental ou de angariação de fundos), como tigres, baleias ou pandas gigantes, para comunicar com o público. A lógica deste processo assenta em criar uma associação entre o sentimento positivo que estas espécies despertam no público e a conservação do meio ambiente, de forma a motivar uma mudança comportamental ou um donativo. Esta abordagem tem sido usada com muito sucesso principalmente pelas ONG, sendo o caso mais emblemático o panda-gigante usado no logótipo da organização WWF (World Wide Fund for Nature, ou em Português: Fundo Mundial para a Natureza). É comum encontrar a ideia de que o uso de espécies-bandeira beneficia apenas as espécies em questão. Isto é um erro. A literatura científica neste tópico é bem explícita ao definir uma espécie-bandeira como uma representante de um grupo mais vasto de entidades. Ou seja, se uma espécie está apenas e só a ser usada para angariar fundos ou promover a sua própria conservação, então não é uma espécie-bandeira. Estas entidades representadas não têm no entanto de estar limitadas a outras espécies. Podem ser problemáticas ambientais mais amplas (como é o caso dos ursos-polares e as mudanças climáticas),

instituições (como o já referido panda-gigante e a WWF), áreas ecológicas ou geográficas (como o camelo e o deserto ou o lobo-ibérico e o Parque Nacional Peneda-Gêres) ou mesmo grupos biológicos (como é o caso do roaz-corvineiro e dos golfinhos).

A magia “negra” chamada marketingA utilização de espécies-bandeira como ferramenta promocional não é no essencial diferente do uso dado a algumas espécies pelo sector comercial. Basta pensar por exemplo, nos logótipos das marcas Puma ou da Lacoste. Este paralelismo como o mundo do marketing comercial incomoda muitos conservacionistas, que vêem o marketing como parte da “magia negra” usada pela indústria para “obrigar” os consumidores a comprar os seus produtos. Segundo os mais puristas, se algo é moralmente bom então deve “vender-se a si próprio”; tornando o marketing redundante. A realidade é no entanto bem distinta. Muitos de nós estamos regularmente envolvidos em comportamentos que sabemos ser prejudicais para a nossa saúde ou para as gerações vindouras. Exemplos disto são o tabagismo, o consumo de álcool em excesso, o uso insustentável de água ou a falta de hábitos de reciclagem. Fica assim claro que o facto de um comportamento ser moralmente classificado como negativo não significa que tenha “os dias contados”.

Vendendo um planeta melhorO sucesso dos esforços para conservar

a biodiversidade está cada vez mais dependente

não de espécies em florestas tropicais remotas

mas do comportamento de cada um de nós:

por isso, mais do que nunca, comunicar

(efectivamente) é preciso

Conservação e marketing

Para tentar lidar com estes e outros comportamentos de uma forma mais activa foi criado o marketing social, que usa o conhecimento desenvolvido nesta área para promover causas tão importantes como o uso do cinto de segurança ou do preservativo. As ONG ligadas à conservação da biodiversidade reconheceram rapidamente o potencial deste sector, tendo hoje em dia muitas delas, especialmente a nível internacional, departamentos inteiros dedicados ao marketing institucional.

Como escolher?Apesar do seu papel preponderante nas campanhas pela conservação da

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 61

sistematicamente recaído sobre um grupo restrito de mamíferos de grande porte, já familiares para o grande público, tais como os grandes felinos, as baleias ou gorilas. Estas escolhas, aparentemente mais seguras, têm como objectivo salvaguardar o investimento feito no desenvolvimento das acções de sensibilização e angariação de fundos, garantindo um nível mínimo de receptividade e retorno. No entanto este facilitismo faz com que na prática exista uma grande sobreposição entre as espécies-bandeira usadas nas diversas campanhas dirigidas por diferentes organizações. Mais uma vez recorrendo a um paralelo com o sector comercial, isto seria o mesmo que todas as diferentes marcas de automóveis escolherem o mesmo logótipo.É obvio que existem custos associados à escolha de uma espécie-bandeira desconhecida do público-alvo, já que o trabalho de promoção e sensibilização terá de “começar do zero”. No entanto é importante perceber que através deste processo a organização consegue diferenciar-se da competição e isso pode resultar numa optimização da captação de recursos e atenção do público. Por exemplo, apesar de o tigre ser uma espécie mais mediática do que o golfinho-de-rio-asiático, o facto de existirem muitas organizações trabalhar com o felino faz com que cada uma delas tenha de repartir a atenção do grande público. Pelo contrário uma organização que trabalhe com o golfinho-de-rio-asiático, terá menos competição e poderá, dado a diferença abismal no número de organizações envolvidas, receber mais atenção não só proporcionalmente como em termos absolutos.Existe assim uma necessidade de uma integração mais profunda do marketing nas acções para a conservação da biodiversidade. Esta é a única forma de mobilizar verdadeiramente a sociedade em que vivemos para a preservação do nosso património natural.

Por Diogo Veríssimo

Este artigo foi escrito com base em: Verissimo, D.,

D. C. MacMillan, and R. J. Smith. 2011. Toward a

systematic approach for identifying conservation

flagships. Conservation Letters 4:1-8. As opiniões

expressas são apenas do autor.

biodiversidade, as espécies-bandeira são na grande maioria das vezes seleccionadas com base em percepções pessoais e subjectivas de um grupo restrito de pessoas, normalmente conservacionistas ou designers. Tendo em conta que nenhum destes grupos faz parte do público-alvo das campanhas, este processo pode ter resultados muitíssimo enviesados. Isto seria o equivalente, no sector comercial, a uma empresa como a Coca-cola escolher o sabor das suas bebidas e design das suas

embalagens com base nos

gostos dos seus directores e sem auscultar o público-alvo a quem quer vender a bebida. Assim, a premissa aparentemente óbvia de que as características das espécies-bandeira devem ser em grande parte baseadas nas atitudes e valores do público-alvo e na sua relação com os aspectos da biodiversidade a ser promovidos, tem sido esquecida.Esta falta de interacção com o público-alvo tem resultado, especialmente nas organizações sedeadas na Europa e América do Norte, numa enorme falta de originalidade. Assim, as escolhas têm

Conservation and Marketing Despite its leading role in campaigns for the conservation of biodiversity, the initial selection of flagship species is often based on the personal perceptions of a restricted group of people; usually Conservationists or Designers. Given that none of these groups are part of the target for campaigns, the results of this process may be biased.

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Praticamente toda a gente ainda não se apercebeu que vivemos

numa enorme “gaiola”, que é o Globo Terrestre, e que temos vindo a sujá-la

há milénios, sem nos preocuparmos em produzir a menor quantidade possível

de lixo e a tratar todo o que tenha possibilidade de reciclagem

A Terra: uma gaiola lixada

62 • Parques e Vida Selvagem Primavera 2011

Por Jorge PaivaBiólogo, Centro de Ecologia Funcionalda Universidade de [email protected]

62 CRÓNICA

Toda a gente que tem animais enjaulados ou engaiolados tem a preocupação não só de dar de comer e beber a esses animais,

como também de ir limpando a jaula ou a gaiola onde os têm. Se nunca forem limpas, sabemos que o animal acabará por morrer atulhado no lixo ou com uma enfermidade causada por algum agente patogénico que, no entanto, se reproduziu no lixo acumulado, ou intoxicado por gases produzidos por reacções químicas que ocorreram na referida lixeira.Era o que estava (e continua) a acontecer com a “gaiola” onde vivemos. O primeiro grande impacto poluidor aconteceu com a designada “Revolução Industrial”, durante os séculos XVIII e XIX. Houve alterações drásticas na produção industrial de uma enorme gama de produtos, não efectuando a indústria qualquer tratamento dos efluentes líquidos ou gasosos emanados das respectivas fábricas. Iniciou-se também, nessa altura, a indústria dos transportes públicos mecanizados (primeiro, ferroviários e marítimos, a seguir, rodoviários e, finalmente, aéreos). Todos estes transportes emanavam produtos químicos, sem qualquer preocupação, que se depositavam na superfície terrestre sob a forma de poeiras, neve e chuvas, com gases dissolvidos [particularmente gás sulfídrico (H2S), gás sulfuroso (SO2), anidrido carbónico (CO2), monóxido de carbono (CO), e óxidos de azoto (NOx)] sob a forma acídica. Com a referida industrialização e os

excessos da designada “Revolução Verde” [mecanização da agricultura e utilização de agroquímicos (adubos e pesticidas)], a Biosfera está, actualmente, abarrotada com cerca de 72 mil produtos químicos que não faziam parte da composição química da atmosfera terrestre e saturada de produtos tóxicos e outros produtos que, além de se manterem inalterados na Natureza, se vão acumulando nas cadeias alimentares, degradando os organismos ou matando-os, como tem acontecido com o DDT, as dioxinas e os furanos. Nalgumas regiões do Globo, a atmosfera tornou-se praticamente irrespirável, como aconteceu em Inglaterra com o célebre “smog” (mistura de nevoeiro e gases tóxicos), particularmente no Inverno, pois à poluição industrial juntava-se a poluição dos fumos emanados das chaminés dos aquecimentos a carvão das casas de habitação. Ora, a atmosfera terrestre é apenas uma e, portanto, esses produtos poluíram a atmosfera terrestre globalmente. Por isso, surgiram muitas doenças resultantes da poluição atmosférica industrial (ex.: silicoses e pneumoconioses) e agravaram-se outras, com um enorme aumento de doenças e doentes do foro pneumológico e imuno-alergológico (ex.: alergias, alveolites, asmas, bronquites crónicas, enfisemas, rino-sinusites, polinoses e fibroses pulmonares), assim como doenças dermatológicas (ex.: eczemas) e oncológicas. Além do drástico aumento da poluição atmosférica, aconteceu também a poluição

das águas fluviais, como rios praticamente sem peixes; lacustres, como lagos e pântanos pestilentos e sem vida; e marinhas, como o Mar Mediterrâneo, que perdeu um elevado número de espécies. Finalmente, deu-se também a contaminação de solos, como, por exemplo, os resultantes da deposição de escórias de explorações mineiras, de que a Urgeiriça é, infelizmente, um testemunho de consequências oncológicas.Quando começaram a acontecer desastres ambientais que levaram à morte de muitos seres vivos, inclusivamente humanos, alguns responsáveis políticos e uma reduzida faixa da população tomaram alguma consciência que os alertas dos ambientalistas eram uma realidade.Citamos alguns desses exemplos que “alertaram” a consciência de alguns incrédulos. Quando, na Alemanha, no início do último quarto do século passado, a Floresta Negra foi duramente afectada pelas designadas “chuvas ácidas”, pensava muita gente que esse tipo de poluição não chegaria a Portugal, quando, como já referimos, a atmosfera terrestre não está “compartimentada”; é global e contínua. Em 1988 anunciamos e demonstramos que, em Portugal, não só ocorriam “chuvas tóxicas” (vulgo “chuvas ácidas”), como também com consequências nalguma vegetação e edifícios do nosso país.Durante o último quarto do século passado (XX), aconteceram outros terríveis

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 63

CRÓNICA 63

desastres ambientais, com gravíssimas consequências para a Humanidade, resultantes de uma industrialização sem escrúpulos, não cumpridora de mínimas normas de segurança. Um exemplo disso, foi o acidente, em 10 de Julho de 1976, que aconteceu numa fábrica de pesticidas em Seveso (Itália), quando tanques de armazenagem na indústria química ICMESA romperam, derramando para a atmosfera enorme quantidade de 2,3,7,8-tetraclorodibenzo-p-dioxina (TCDD), que se volatilizou e espalhou por grnde área da Lombardia (Itália). Morreram 3 mil animais e cerca de 70 mil animais foram abatidos para evitar a entrada da dioxina na cadeia trófica. Admite-se que não tenha havido mortes humanas directamente vinculadas ao acidente, mas, nessa área, cerca de 200 pessoas sofreram de cloracne e outras afecções.Outro exemplo foi a tragédia industrial de Bhopal (Índia), quando, na noite de 2 para 3 de Dezembro de 1984, uma fábrica de pesticidas da Union Carbide India Ltd. (UCIL) derramou para a atmosfera um gás

(isocianato de metilo), que, segundo dados oficiais indianos, provocou a morte imediata de 2259 pessoas e posteriormente um total de 3787 mortes relacionadas com a libertação de gás. No entanto, houve estimativas para um total de 8 a 15 mil mortes. Além desta mortalidade, o governo indiano, em 2006, estimou que cerca de 558 125 pessoas foram afectadas, 38 478 temporariamente e cerca de 3900 apresentavam lesões incapacitantes, graves e permanentes. Porém, o desastre industrial que marcou o século passado foi o acidente nuclear de Tchernobil (Ucrânia), quando, em 26 de Abril de 1986, explodiu o reactor 4 da central nuclear, situada a cerca de 20 km da cidade, libertando uma imensa nuvem radioactiva, que contaminou pessoas, animais e o meio ambiente de uma vasta extensão da Europa, matando muita gente e afectando a saúde de milhões de pessoas, muitas delas com lesões físicas permanentes.No entanto, a 29 de Março de 1979, já tinha havido um acidente nuclear grave (o segundo pior) na Pensilvânia (Estados Unidos

da América), quando o reactor 2 da central nuclear de Three Mile Island começou a derreter. Segundo as informações “oficiais” os detritos radioactivos contaminaram “apenas” a parte interior dos contentores, não tendo afectado o ambiente e, portanto, as pessoas. Apesar disso, cerca de 150 mil pessoas foram retiradas da região.Todas estas catástrofes foram provocadas pela nossa espécie, por falta de cultura, civismo, incúria e incompetência política. Mas pior do que estas catástrofes, foi a última guerra mundial, que, apesar de ter ocorrido durante a minha infância, não me saem da memória os horrores do holocausto e das duas deflagrações atómicas no Japão, que mataram, nessa altura (1945), 90 mil -166 mil pessoas em Hiroshima e 60 mil – 80 mil em Nagasaki.Apesar de todos estes exemplos, a nossa espécie continua a ser responsável por acidentes nucleares, como o que aconteceu recentemente no Japão, após o forte abalo sísmico de 11 de Março de 2011. Esta catástrofe atómica, resultante da explosão dos reactores nucleares, não foi devida única

Corrente fria

Pacífico Norte

Pacífico Sul

AtlânticoSul

AtlânticoNorte

Índico

Corrente quente

Corrente circumpolar antárctica

Localização das cinco áreas de correntes marinhas giratórias onde se acumula o lixo sólido flutuante

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64 CRÓNICA

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e exclusivamente ao tremor de terra e ao forte maremoto (tsunami) que o acompanhou, que arrastou os depósitos de gasóleo dos geradores de emergência. Sabe-se já que a central japonesa de Fukushima 1 estava preparada apenas para maremotos com ondas até 5 metros de altura. Porém, as ondas atingiram, praticamente, o dobro dessa altura e, por isso, não só destruíram a rede de alimentação eléctrica de 3 reactores que estavam em funcionamento na altura do sismo, como arrastaram os depósitos de gasóleo, que ficaram submersos, assim como os reactores. Com a falta de electricidade, deixou de ser possível introduzir água nos reactores para o respectivo arrefecimento e, como consequência, houve explosões e respectiva poluição atómica que obrigou a desalojar mais de 400 mil pessoas. Apesar disso, já foram detectadas pessoas contaminadas, assim como produtos alimentares. Além da central nuclear de Fukushima 1 não estar devidamente preparada para maremotos com ondas (tsunami) tão altas, sabe-se também que esta central tinha problemas há cerca de uma dezena de anos, que os técnicos ocultaram às entidades oficiais. Agora, tarde demais, tomaram a decisão de a desactivar.Neste tipo de poluição gasosa e líquida, é fundamental referir os diversos desastres ecológicos provocados por muitos derrames de crude nas costas oceânicas, o último dos quais (Golfo do México, em Maio-Junho de 2010, pela plataforma petrolífera da BP) foi

o mais devastador. Um derrame destes em mares quase fechados, como o Mediterrâneo e o Cáspio, provocaria uma catástrofe incumensurável.Além destas formas de poluição, há muitas outras, como a poluição sólida, que é a mais visível e comummente perceptível. A falta de educação ambiental e de escrúpulos de uma grande maioria da população mundial faz com que as pessoas não depositem o lixo sólido nos respectivos contentores. Isso acontece particularmente quando andam na rua ou em viagem com veículos motorizados ou não (bicicletas, por exemplo). É frequentíssimo verem-se recipientes (particularmente garrafas de plástico e latas de refrigerantes) e outro lixo sólido (fraldas descartáveis, por exemplo) “voarem” pelas janelas de automóveis em movimento. Os ciclistas também fazem o mesmo com as garrafas de água que acabam de beber (os das provas desportivas são “exímios” nisso). Mesmo aos que praticam corrida de manutenção (“jogging”) tenho visto fazer isso. Aliás basta o exemplo do que se passou na última maratona de Lisboa (Domingo, 20 de Março de 2011), em que o trajecto ficou pejado de lixo sólido, particularmente de garrafas de plástico. A ponte 25 de Abril não pôde ser aberta ao trânsito logo que os “desportistas poluidores” passaram, pois teve de ser primeiramente despojada da porcaria sólida que lá deixaram. Este hábito das pessoas se desfazerem do lixo sólido, particularmente o mais incómodo

[ex.: cadeiras, frigoríficos e restos de obras (nisto, certos empreiteiros são autênticos criminosos)], levou ao aparecimento do Projecto “Limpar Portugal” (este tipo de acções teve início nos países do Leste Europeu), que só em 2010 recolheu cerca de 50 mil toneladas de lixo sólido, apesar de não colher todo o que está espalhado pelo país fora, particularmente nas florestas (nativas e de produção) e nas bermas das estradas e caminhos. Além de muito desse lixo ser tóxico, o plástico é terrível, pois demora dezenas de anos a ser reciclado naturalmente. Como é leve, é arrastado pelo vento e pelas águas fluviais, indo parar aos oceanos, onde, levados pelas correntes, formaram 5 ilhas enormes de lixo (80% de plástico), com de mais de 3,5 milhões de toneladas e centenas de quilómetros cada uma (2 no Atlântico, uma a Norte e outra a Sul; 2 no Pacífico, uma a Norte e outra a Sul; 1 no Índico). Para não falar do Mediterrâneo, o mar mais poluído, no qual se estima existirem mais de 250 mil milhões de fragmentos de plástico flutuantes.A nossa espécie tem que se convencer que não chega Reduzir, Recolher e Reciclar o lixo. Temos mesmo de produzir individualmente a menor quantidade possível de lixo, não nos desfazermos dele em qualquer lado e procurar reciclar todo o que seja possível, se queremos deixar uma “Gaiola” habitável às futuras gerações. Se não fizermos isso, a nossa espécie caminhará inexoravelmente para a extinção prematura.

Coimbra: mercado abastecedor em 27-9-1994 Efeito das chuvas ácidas: Igreja de Santa Cruz, Coimbra, 21-6-1998

Poluição: pó e escória, cimenteira do Cabo Mondego, 17-12-1988

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2011 • 65

A vida das associações em geral não está fácil e a das associações de defesa do ambiente, em particular, está

muito mais difícil que no passado; de qualquer modo queremos que o NPEPVS (Núcleo Português de Estudo e Protecção da Vida Selvagem) continue a sua carreira de 37 anos de actividade. A actual Direcção irá propor à próxima Assembleia Geral um plano de actividades inovador que permitirá o ressurgimento da associação, com um novo modelo de funcionamento, mais versátil e mais actual. Por isso apelamos aos sócios que participem na próxima Assembleia Geral que será a assembleia do relançamento desta associação que é a segunda criada em Portugal para promover a conservação da natureza.

Assembleia Geral:ConvocatóriaNos termos do Estatutos do Núcleo Português de Estudo e Protecção da Vida Selvagem convoco uma reunião ordinária da Assembleia Geral, com a seguinte:

Ordem de Trabalhos1. Apreciação e deliberação sobre

Relatório e Contas de 2010;2. Apreciação e deliberação sobre Plano e

Orçamento para 2011;3. Apreciação e deliberação sobre uma

alteração estatutária para integração da Associação dos Amigos do Parque Biológico na AAPB, conforme resolução da última Assembleia Geral;

4. Eleição dos Corpos Gerentes para o

biénio 2011/2012;5. Discussão de qualquer assunto de

interesse para a associação.A Assembleia Geral reunirá no dia 14 de Maio de 2011, às 14h30, no Parque Biológico de Gaia.Se à hora marcada não houver quórum, a Assembleia Geral reunirá em segunda convocatória, no mesmo dia e local, pelas 15h00.Vila Nova de Gaia, 15 de Abril de 2011

O Presidente da Assembleia Geral, Serafim Riem

Núcleo Português de Estudo

e Protecção da Vida Selvagem

Parque Biológico de Gaia

4430 - 757 Avintes

Tel. + Fax: 227 878 120

[email protected]

www.vidaselvagem.pt

Núcleo Português de Estudo e Protecção da Vida Selvagem

Parques e Vida SelvagemParque Biológico de Gaia | 4430 - 757 AvintesTelemóvel: 916 319 197 | e-mail: [email protected]

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COLECTIVISMO 65

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66 COLECTIVISMO

A Cagarra Calonectris diomedea, também conhecida por Cagarro, foi a ave escolhida pelos sócios da SPEA para ser a Ave do Ano 2011. A campanha decorre todos os anos e visa chamar a atenção para uma ave emblemática que enfrente desafios à sua sobrevivência. Em 2011, a Cagarra vem alertar-nos não só para todos os perigos que a ameaçam, mas também para a dramática situação dos nossos oceanos. Por ser uma espécie muito sensível a alterações do seu ambiente, é considerada um excelente indicador da qualidade do nosso oceano. Com estatuto de conservação «Vulnerável» em Portugal continental e «Pouco Preocupante» nos arquipélagos dos Açores e da Madeira, é uma espécie bastante atingida pela poluição marinha, captura acidental, destruição de habitat e introdução de predadores exóticos.A Cagarra passa a vida no mar e só quando atinge cinco a oito anos de idade vem a terra para nidificar pela primeira vez. Os casais juntam-se para toda a vida, e apenas põem um ovo por ano, mantendo-se fiéis ao mesmo

Tagis – Centro de Conservação das Borboletas de PortugalMuseu Nacional de História NaturalRua da Escola Politécnica, 58 • 1250-102 LisboaTel. + Fax: 213 965 [email protected] • www.tagis.org

SPEA – Sociedade Portuguesa para o Estudo das AvesAvenida da Liberdade, n.º 105 - 2.º - esq.1250 - 140 LisboaTel.: 21 322 0430 / Fax: 21 322 04 [email protected] • www.spea.pt

SPEA escolhe a Cagarra para Ave do Ano 2011

ninho, pelo que, a espécie possui uma baixa taxa de reprodução.Luís Costa, Director Executivo da SPEA, explica que «ter a Cagarra como protagonista da campanha salienta o enorme progresso do conhecimento que temos sobre esta espécie e sobre as aves marinhas em geral, bem como a necessidade de designar áreas protegidas nos nossos mares. A sua protecção é fundamental para a boa gestão das áreas mais importantes para as aves mais ameaçadas do mundo - as aves marinhas. E em relação à Cagarra, em particular, Portugal possui uma responsabilidade acrescida, pois é no nosso país que se concentra mais de 80% desta espécie ao nível mundial!»

Mas proteger esta ave vai mais para além do que a SPEA está a fazer. Cada cidadão das ilhas da Madeira e Açores tem um papel crucial na protecção desta espécie. Uma vez que as cagarras são aves que caiem muito nas cidades, foi criado o Kit Salve uma Ave Marinha, que pode ser adquirido gratuitamente na sede da SPEA por qualquer pessoa e é constituído por uma caixa própria para o transporte de aves marinhas e um folheto informativo que fala um pouco de cada ave marinha. As pessoas devem apanhar cuidadosamente a ave e podem entregá-la na SPEA ou soltá-la. Nos Açores podem recorrer à linha SOS Cagarro. Para saber mais acerca da espécie ou como pode ajudar a protegê-la vá a www.spea.pt

Por Joana Domingues (SPEA)

A Estação da Biodiversidade de Dornes é um percurso pedestre com cerca de 2 km em que se podem consultar 8 painéis sobre a biodiversidade a observar pelos visitantes. Os painéis funcionam como um guia de campo, com imagens e comentários, especialmente de insectos e plantas comuns. O painel que sinaliza o início da estação está colocado num caminho de terra junto à ponte na entrada da vila de Dornes.A inauguração oficial decorreu no dia 19 de Março e contou com a presença do Dr. Jacinto Lopes, presidente da Câmara de Ferreira do Zêzere. Houve uma visita guiada informal, apenas com a preocupação de esclarecer dúvidas aos participantes e chamar a atenção para as espécies mais emblemáticas. Na primeira parte passamos por uma área de bosque, com eucaliptos misturados com diversas espécies da nossa flora, como a oliveira, sabugueiro, folhado, medronheiro, tojo ou as várias espécies de Cistus. Grande parte do percurso acompanha um

Estação da Biodiversidade de Dornesde lagartas da borboleta aurinia (Euphydryas aurinia). A aurinia é uma borboleta ameaçada na Europa e pertence ao Anexo II da Directiva Habitats. Nesta manhã observámos 16 espécies de borboletas, aumentando para mais de 30 a lista de espécies de Dornes. Todas as nossas observações e fotografias da Estação da Biodiversidade de Dornes estão disponíveis para consulta no website www.biodiversity4all.org.Depois do almoço, visitámos a vila de Dornes, com a sua antiga igreja (séc. XII, única na Península Ibérica) e tivemos ensejo de fazer um pequeno passeio de barco na barragem. Um dia muito completo a desfrutar do rico património que Portugal tem para oferecer.

Por Patrícia Garcia-Pereira

pequeno curso de água, em que podemos apreciar a vegetação típica das zonas ribeirinhas, com choupos, amieiros, salgueiros, aveleiras, freixos e diversas espécies de fetos. A estação termina no Lagar de São Guilherme, antigo lagar de azeite, reconstruído recentemente pelo município. Estava um bonito dia de Sol de vésperas de Primavera e tivemos oportunidade de observar muitos insectos. O destaque vai para as borboletas. A borboleta Carnaval (Zerynthia rumina) era a espécie mais abundante. A descoberta mais interessante foi um ninho nas madressilvas

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