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1 Agosto/2012 - edição 65 sesctv.org.br DANÇA A PROXIMIDADE NAS RELAÇÕES GLOBALIZADAS DOCUMENTÁRIO POSITIVAS: MULHERES CONTAMINADAS POR SEUS PARCEIROS CURTADOC A PRESERVAÇÃO DA MEMÓRIA DO CINEMA FOTO: LU BARCELOS

Revista SescTV - Agosto de 2012

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Na entrevista, Paola Ribeiro, coordenadora e curadora da mostra Cinema Mostra AIDS. Em artigo, Renata Pallottini, poetisa e ensaísta, escreve sobre a adaptação de textos literários para a televisão.

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Agosto/2012 - edição 65sesctv.org.br

DANÇA A PROXIMIDADE NAS RELAÇÕES GLOBALIZADAS

DOCUMENTÁRIOPOSITIVAS: MULHERES CONTAMINADAS POR

SEUS PARCEIROS

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CINEMA

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26/9quarta-feira, 22h

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DESTAqUES DA PROGRAMAÇÃO 4

ENTREVISTA - Paola Ribeiro 8

ARTIGO - Renata Pallottini 10

No último quarto de século, as relações interpessoais passaram a obedecer a critérios que ainda não assimilamos completamente. Isso se deve, em parte, à velocidade na renovação de paradigmas.

Ainda que novas mídias aproximem as pessoas independentemente de sua localização geográfica, cabe questionar quão relativa é essa aproximação e quais seus reais benefícios afetivos.

A arte é um dos meios que fomentam essa reflexão. O espetáculo Tão Próximo, destaque da série Dança Contemporânea deste mês, coreografa os limites da intimidade no mundo globalizado e propõe um olhar sobre o papel das múltiplas formas de comunicação – visuais, táteis, sonoras – no estabelecimento dessas fronteiras.

Como resultado paradoxal da sobrecarga de informações a que estamos universalmente submetidos, algumas preocupações relevantes parecem perder-se no caminho. Nas décadas de 1980 e 1990, a Aids foi protagonista do espetáculo midiático, por ser novidade e por atingir ícones sociais que expunham as mazelas da doença.

Nos últimos anos, porém, os debates sobre a síndrome foram abafados pelo ibope de outros temas – guerra, violência, terrorismo, corrupção. Novas gerações que não sofreram o impacto da descoberta do vírus arriscam-se ao baixar a guarda para a prevenção ao contágio, iludidas pelo surgimento de remédios que, longe de representar a cura, causam efeitos colaterais pesados.

O documentário Positivas, que o SESCTV exibe neste mês, oferece boa chance para repensarmos o espaço reservado à discussão do sexo seguro na sociedade. O filme apresenta mulheres que não fazem parte dos equivocadamente chamados grupos de risco e que se contaminaram pelo parceiro único.

Na entrevista da Revista do SESCTV deste mês, a organizadora e curadora do festival Cinema Mostra Aids, Paola Ribeiro, também aborda o assunto. O artigo da dramaturga e ensaísta Renata Pallottini, por sua vez, trata de adaptações, para a televisão, de obras da literatura brasileira.

Boa leitura!

Danilo Santos de MirandaDiretor Regional do SeSc São Paulo

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cAPA: Quasar Cia. de Dança. Coreografia: Tão Próximo, de

Henrique RodovalhoFoto: Lu Barcelos

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Acordes sintetizados

EDGARD SCANDURRA MOSTRA A CONFLUÊNCIA DO ROCK E DA MÚSICA ELETRÔNICA EM SEU PROJETO BENZINA

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Canhoto como Jimi Hendrix, Edgard Scandurra, a exemplo de seu ídolo, fez da guitarra o instrumento que o projetou como um nome importante da cena roqueira.

Scandurra despontou nos anos 1980 como condutor da linha melódica do Ira!, grupo representativo de uma geração também protagonizada, entre outros, por Legião Urbana, Capital Inicial, Paralamas do Sucesso, Ultraje a Rigor, Titãs e Barão Vermelho.

Com 5 ou 6 anos de idade, ele acompanhava os ensaios do conjunto do irmão dez anos mais velho, Marco, realizados no espaço do restaurante do pai, na Rua Tutoia, em São Paulo. Dos primeiros acordes que dedilhava na guitarra e no violão de Marco, afirmou-se na habilidade que já lhe permitia tirar, com 8 ou 9 anos, um ‘Stairway to Heaven’ [sucesso do Led Zeppelin] e alguma coisa dos Beatles. Aos 15, montou sua primeira banda, a Subúrbio, que durou até os 19, quando entrou para o Exército – época em que surgiu o Ira!.

Uma vez que seu aprendizado começou com o instrumento do irmão, que é destro, Scandurra desenvolveu um jeito peculiar de tocar: o corpo da guitarra invertido – mas não as cordas. “[Ela] acaba timbrando de uma forma diferente”, diz. “Um acorde que é feito de cima para baixo, acabo fazendo de baixo para cima, então as cordas graves, que [normalmente] são tocadas primeiro, ficam por último. Como guitarrista, é muito difícil eu usar

palheta, e isso também dá uma outra sonoridade.”Nos anos 90, o músico incluiu em seu repertório

bases da experimentação eletrônica. Essa vertente criativa é parte integrante de seu projeto Benzina, que o Instrumental SESC Brasil mostra no dia 20 deste mês, em espetáculo inédito. Além de Edgard Scandurra na guitarra e nos samplers, compõem o trio: no contrabaixo, Sandra Coutinho – que participou do grupo As Mercenárias; e na bateria e percussão, Michelle Abu. O show foi gravado no SESC Consolação, em São Paulo.

Edgard conta que Sandra Coutinho tem tudo a ver com a concepção de “aspereza” que busca no baixo e na guitarra. “Ela usa vários pedais que tiram sons impossíveis de identificar como de um baixo”, comenta. “E a Michelle Abu é uma excelente percussionista, tocou com o Ira! no projeto do Acústico [da MTV].”

O programa traz ainda o depoimento do cantor e DJ Kid Vinil, que ficou conhecido na década de 80 com o hit “Sou Boy”. Amigo de longa data de Scandurra, Vinil presenciou os primeiros ensaios do Ira!. “O Edgard não é um virtuoso, mas é um guitarrista que tem muito estilo, é um grande músico e não precisa tocar um milhão de notas”, afirma. “Ele sabe trabalhar a sonoridade.”

Em agosto, o Instrumental SESC Brasil, que tem direção artística para televisão de Max Alvim e é produzido pela produtora Canal Independente, exibe também apresentações de Azymuth, Lis de Carvalho e Sandro Albert.

Saiba mais sobre os músicos e participe de chats no site www.instrumentalsescbrasil.org.br.

instrumental sesc brasil

INSTRUMeNTAL SeSc BRASILSegundas, às 22h

Sandro AlbertDia 6/08

Lis de CarvalhoDia 13/08

Edgard ScandurraDia 20/08

AzymuthDia 27/08

DOcUMeNTÁRIODireção: Susanna Lira

PositivasDia 26/08, às 21h

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A DIRETORA SUSANNA LIRA APRESENTA MULHERES BRASILEIRAS qUE LUTAM CONTRA O PRECONCEITO E A FALTA DE CONHECIMENTO EM RELAÇÃO À AIDS

Positivas na atitude

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Heli, 65 anos. Medianeira, 56. Cida, 54. Rosária, 53. Silvia, 45. Ana Paula, 40. Michelle, 24. São Paulo, Rio, Brasília, Porto Alegre. Nomes, idades, lugares, trajetórias culturais e sociais distintas com um diagnóstico comum. Esse é o roteiro de Positivas, documentário dirigido por Susanna Lira sobre o perfil de mulheres brasileiras que expõem as circunstâncias em que foram infectadas pelo vírus da Aids.

A doença não é o único elo entre elas. A coincidência passa pelo modo como foram contaminadas: por intermédio de seus parceiros. E, nesse contexto, a surpresa ao tomarem ciência do fato de estarem doentes é determinante para a avaliação de seus depoimentos.

“Como se ele [o médico] estivesse dizendo ‘é gripe`, [disse] ‘é Aids’”, lembra a viúva Heli, que se descobriu soropositiva a partir da enfermidade do marido. “Trinta e um anos de casamento sem usar camisinha não podia dar outro resultado que não esse”, lamenta.

“A gente pensa que o amor imuniza. Achei que nunca fizesse parte do grupo de risco”, testemunha Cida. “Nós, mulheres, fomos educadas para não discutir a relação. Se a mulher tem algum tempo de casada, muito menos. Prova de amor maior é usar o preservativo.”

Declarações como essa sustentam um dos temas centrais do filme, a resistência à prevenção em um meio em que a desinformação e o machismo muitas vezes ainda ditam as regras. “Trabalho em uma comunidade

tremendamente pobre em que as mulheres apanham quando querem negociar o preservativo”, relata Rosária. Com o advento de remédios como o Viagra, o problema afeta também as idosas, diz.

É uma forma de contágio que rompe barreiras econômicas e educacionais, como se constata nos casos de Silvia, de classe social mais privilegiada, e Ana Paula, funcionária do governo em Brasília, que teve um relacionamento de cinco anos com um usuário de droga injetável. “A mulher ainda é muito vulnerável, em alguns casos ainda é bastante submissa”, afirma Silvia. “Abre mão da proteção para ter um companheiro. Vemos a Aids muito relacionada à violência doméstica e sexual. É uma questão de cultura que ainda vamos levar muitos anos para mudar.”

Susanna Lira lança ainda um olhar sobre as reações dos familiares das pacientes à síndrome. Rosária recorda-se do “medo de que os outros soubessem”, do “desespero de me cobrir, me isolar”. “Tiraram os meninos [filhos e netos] de perto de mim.”

A diretora também aborda o preconceito que as positivas enfrentam no mercado de trabalho. “Cansei de ouvir histórias de quem ia para o banheiro tomar remédio escondido, como se fosse um criminoso”, conta Silvia.

Para se tornarem pontos de referência no combate à discriminação e à falta de conhecimento sobre a doença, essas brasileiras mostraram a cara em iniciativas como o Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas. “Foi criado quando víamos mulheres não tomando remédio, não se cuidando, não indo aos postos de saúde por medo – do vizinho, do parceiro, de serem reconhecidas”, confabula Silvia. “Isso precisava mudar. Não é porque você tem um vírus, uma doença, que tem que se entregar e morrer assim, escondida. Queríamos construir cidadãs.”

DOcumentÁriO

Tão longe, tão pertoDança

A complexidade dos relacionamentos de tempos em que o “tão longe” e o “tão perto” mais que nunca se confundem é o mote de Tão Próximo, da Quasar Cia. de Dança, de Goiânia, grupo fundado em 1988 e que atua com frequência na Europa e nos Estados Unidos.

Se a distância e a intimidade ganham novos contornos no mundo globalizado, o espetáculo “mostra novas possibilidades no sentido dessa relação de proximidade dos corpos e o que isso pode acarretar, desenvolver”, afirma Henrique Rodovalho, responsável pela direção artística e pela coreografia.

A proposta se traduz em linguagem quando um movimento que começa em um bailarino termina em outro, especifica. Nessa constituição cênica, os limites da particularização tornam-se indistintos. Em outras apresentações a Quasar coreografava o bailarino “mais como indivíduo” – “mesmo quando havia relações essa individualidade era mantida”, discorre Rodovalho. A montagem de Tão Próximo “abre mão” do caráter de unicidade para focar o “conjunto de pessoas”.

Tal recurso é utilizado para discutir a “questão das relações humanas, até que ponto um está ajudando o outro, está fazendo o bem, está fazendo o mal, se está certo, se está errado”. Mas não se pretende fechar o cerco para qualquer tipo de julgamento. “Deixo muito

TÃO PRÓXIMO, MONTAGEM DA qUASAR CIA. DE DANÇA, EXPLORA AS POSSIBILIDADES DOS RELACIONAMENTOS GLOBALIZADOS

DANÇA CONTEMPORÂNEA

para as pessoas fazerem suas próprias avaliações sobre isso”, ressalta o diretor.

A ambientação do palco é fundamental para sustentar as evoluções entre os artistas. Ao desenharem um campo sinestésico para as interações, os jogos de luzes e as intervenções sonoras potencializam a angústia dos amantes que experimentam a amplitude de conceitos como fidelidade e sedução. A dança, dessa maneira, também estende suas fronteiras e se aproxima de uma obra de arte em que imperam múltiplos sentidos, conteúdos e significados.

Estimular o espectador é um objetivo comum a todos os trabalhos da Quasar. “É uma dança contemporânea muito irreverente para o contexto da nossa região [Goiânia]”, diz Vera Bicalho, diretora-geral da companhia. “É um desafio que a gente adora, estar provocando, estar crescendo junto com a cidade. Tão Próximo é ver a resposta das pessoas, seu feedback ao assistir ao espetáculo.”

O SESCTV exibe a versão editada para a TV da encenação no dia 29, à meia-noite. A série Dança Contemporânea, que tem direção para televisão de Antonio Carlos Rebesco e é produzida pela Pipoca Cine Vídeo, também apresenta em agosto De Peixes e Pássaros, da Cia. Suspensa, no dia 1; Lúdico, da Cia. Druw, no dia 8; Paraíso Perdido, do Balé da Cidade de São Paulo, no dia 15; e Torso + Oco, de Wellington Duarte, no dia 22.

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Quartas, às 24h

De Peixes e Pássaros – Cia. SuspensaDia 1/08

Lúdico – Cia. DruwDia 8/08

Paraíso PerdidoBalé da Cidade de São PauloDia 15/08

Torso + Oco - Wellington Duarte Dia 22/08

Tão Próximo – quasar Cia. de DançaDia 29/08

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Cenário de lembranças

Registrar momentos da História é um dos papéis da linguagem cinematográfica. Esses arquivos podem referir-se tanto a figuras conhecidas como às quase anônimas – embora relevantes no contexto em que são imortalizadas pela câmera.

Em Cine Memória, capítulo inédito da série CurtaDoc que o SESCTV exibe no dia 21, as próprias personagens assumem a responsabilidade de preservar o cinema como meio de documentação histórica.

No primeiro dos quatro curtas do episódio – comentados pelo cineasta João Batista de Andrade –, a diretora Dácia Ibiapina retrata a vida de José Ribeiro de Medeiros, homem simples que tomou para si a missão de exibir filmes em pequenas salas do sertão nordestino. Cinema de Engenho destaca o trabalho de Medeiros na recuperação de velhos projetores, que, aposentados nos circuitos contemporâneos, constituem parte da memorabilia tecnológica da sétima arte. A presença de seu neto nas cenas estabelece, nas palavras de Andrade, a “relação vertical do passado com o presente”.

Com direção de Marcelo Abreu Góis, Encontro com o Mestre fala de Luiz Paulino dos Santos, diretor que participou do movimento Cinema Novo. A permanência, no caso, não se materializa no instrumento de propagação; sua força revela-se na imagem humana captada, o “depositário de um momento importante do cinema brasileiro”, como define Andrade.

Cine-Mauro, de Eduardo Yep, conduz o telespectador

pela máquina do tempo fílmica até os caminhos que firmaram Humberto Mauro como um dos pioneiros da cinematografia nacional. Os depoimentos e a geografia de Cataguases, cidade mineira em que Humberto cresceu, estendem o pano de fundo para a reconstituição do patrimônio cultural e humano – um “filme de memória pura”.

Uma visita ao memorial de Glauber Rocha compõe o argumento de Memória Urbana, dirigido por George Neri. O curta vale-se da metalinguagem ao adotar um estilo visual e sonoro semelhante ao trabalhado pelo próprio Glauber em suas produções, além de sincronizar a arte e sua conservação.

O programa Arquivo de Cinema, que vai ao ar no dia 7, chama a atenção para as condições precárias em que muitas das cinematecas brasileiras operam. O cineasta Guilherme Castro, convidado do episódio, menciona “latas e latas espalhadas em repartições públicas e em acervos pessoais” – e “mal se sabe o que tem dentro”. E alerta para as dificuldades na guarda de arquivos digitais, cujo volume de produção tende a ser bem maior que o de analógicos.

Os filmes silenciosos do início do século passado e o resgate dessas películas em nitrato são o fio condutor de Janela Molhada, com direção de Marcos Enrique Lopes. Em Cinema é Maresia, de Diogo Cavour, discute-se a importância dos cineclubes nacionais na formação dos cineastas brasileiros, o que reforça a necessidade da manutenção dessas instituições.

A série CurtaDoc apresenta ainda neste mês os programas Linguagens e Bitolas, no dia 14, e Registro Musical, no dia 28.

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CINE MEMÓRIA E ARqUIVO DE CINEMA DISCUTEM A PRESERVAÇÃO DO ACERVO CINEMATOGRÁFICO BRASILEIRO

cURTADOcTerças, às 21h

Arquivo de CinemaDia 7/08

Linguagens e BitolasDia 14/08

Cine MemóriaDia 21/08

Registro MusicalDia 28/08

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entrevista

Mídia e educação para a saúde

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entrevista

“NÃO VEJO A AIDS FAZENDO PARTE DOS ASSUNTOS TRATADOS PELA

MÍDIA. ESSE TEMA SÓ É MAIS LEMBRADO NA ÉPOCA DO CARNAVAL”

Você acredita que a mídia brasileira em geral tenha relevado o tema de prevenção à Aids a um segundo plano? Como isso poderia mudar? Considerando que a mídia reflete e influencia a sociedade e que a epidemia de HIV/Aids foi esquecida e só é lembrada de uma forma geral quando você encontra um portador no seu círculo social, não vejo a Aids fazendo parte dos assuntos tratados pela mídia. Esse tema só é mais lembrado na época do Carnaval. Acredito que a mudança venha através do resgate da memória, com campanhas ou com a inserção do assunto em novelas, por exemplo. Não digo que deva ser aquela coisa excessiva a ponto de se tornar chata, mas algo que se faça presente. A escassez desse debate na mídia não reflete o que acontece na própria sociedade? Sim. A mídia é um reflexo disso. Estamos num momento em que a sociedade prioriza algumas outras questões. Dependendo do contexto histórico vivido, um debate maior é levantado. O Viagra, por exemplo, esteve em evidência ao habilitar para a vida sexual um novo público, que não se considera grupo de risco, mas que está exposto da mesma forma. Uma

Paola Ribeiro, 26, é a atual coordenadora e curadora do

Cinema Mostra Aids, festival temático que desde 2007

é realizado pelo Grupo Pela Vidda, ONG de apoio a

portadores de HIV.

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discussão que vire prioridade em determinado momento faz com que outras sejam negligenciadas. Séries e novelas televisivas deveriam abordar a Aids? Como disse anteriormente, acredito que sim. A personagem nem precisa adquirir o vírus HIV, mas poderia ser lembrado que a camisinha não serve só pra prevenir a gravidez, mas também para evitar doenças venéreas e o vírus. Acho que o próprio nome – preservativo – é bem explicativo: ele serve para preservar o seu corpo e o do parceiro também. A novela é um veículo de massa, que atinge várias parcelas da população. É um meio importante de difusão e que ultimamente já tem levantado outros assuntos, como alcoolismo e crianças com deficiência. A publicidade poderia ter uma participação mais efetiva no esclarecimento sobre as formas de contágio? A publicidade é sempre um meio efetivo; temos um exemplo de sucesso na divulgação dos males que o fumo traz. No caso do HIV/Aids, é importante porque ela atua de forma dupla, ou seja, além de ser uma política de prevenção, é também uma tentativa de reduzir o olhar preconceituoso para com os portadores.Esse olhar às vezes não parte dos próprios meios de comunicação, que, na maioria das vezes, retratam o doente como homossexual masculino? Existe esse olhar de sempre retratar como homossexual masculino, o que gera um tipo de preconceito ligado à homofobia. Cria-se um único alvo, um único grupo de risco, e dessa forma a mídia ilude as pessoas, o que é um problema. Mas há outro lado, o desconhecimento real de como a doença se desenvolve no organismo e de como se pode lidar com ela. São coisas diferentes, e uma independe da outra. O preconceito tem várias formas de difusão, seja pela ignorância de não atentar para os meios de contágio, seja pelas questões de gênero. Qual o objetivo do festival Cinema Mostra Aids? Qual é o público predominante do evento? A Cinema Mostra Aids funciona como uma política de prevenção, porque traz para a discussão pública filmes com essa temática. Devido à especificidade do tema, o público predominante do evento é o de pessoas que de alguma forma lidam com o HIV/Aids. O festival exibe filmes estrangeiros e nacionais, desde “blockbusters” e longas bem cotados na mídia, como Filadélfia (EUA, 1993) e Dzi Croquettes (Brasil, 2009), até pequenos documentários. Positivas foi exibido em 2010. Os filmes mais conhecidos ajudam na divulgação da mostra, porque o público já tem

algum tipo de referência sobre eles. A ONG Pela Vidda planeja novas ações ligadas ao audiovisual? Temos um projeto em fase de implantação, o Prevenção na Tela, que consiste em realizar exibições de filmes do nosso acervo seguidas – dependendo da idade do grupo – de uma conversa ou de uma atividade, como forma de divulgação dos meios de prevenção do HIV/Aids. Como uma pesquisa apontou que no Grande ABC [São Paulo] existe uma vasta incidência da doença, a ONG fez uma parceria com subprefeituras da região, numa ação educativa, para levar os filmes e promover os debates. O cinema em geral tem se preocupado em discutir a doença? Há muitos documentários sendo produzidos? O cinema de forma geral tem reduzido sua produção com temas relacionados a HIV/Aids. A produção cinematográfica mais expressiva na atualidade, ligada a esse assunto, é o documentário, mas mesmo assim em pouca quantidade e a intervalos muito grandes. Percebemos o surgimento de um número maior desses filmes na África, uma região em que a incidência da doença é mais frequente. Tivemos problemas para encontrar filmes para o festival deste ano. Encontramos seis, mas é pouco para uma mostra de uma semana. Ela seria realizada em setembro e teve de ser transferida para novembro. Uma produção cinematográfica que tratasse da prevenção poderia ser incentivada pelo governo? Existem leis de incentivo à cultura e muitas produções se baseiam nelas. De uma forma indireta o governo acaba contribuindo. Talvez pudesse ser ampliada a participação do próprio Ministério da Saúde em parcerias com os programas de financiamento. Alguém que tenha interesse em fazer um filme que dialogue com os interesses da saúde pública poderia ter acesso a algum tipo de subsídio específico para isso.

“CINEMA MOSTRA AIDS FUNCIONA COMO UMA POLÍTICA

DE PREVENÇÃO, PORqUE TRAZ FILMES COM ESSA TEMÁTICA

PARA A DISCUSSÃO PÚBLICA”

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artigO

a adaptação de textos literários para a tvEstava eu na cidade de Coimbra, Portugal, no Natal de 1982, um Natal muito frio, com neve nas montanhas vizinhas. Longe da família, entre pessoas carinhosas, mas estranhas e estrangeiras. Já tarde da noite, quase antes da meia-noite, vejo anunciada na TV a transmissão de Morte e Vida Severina, original de João Cabral de Mello Neto, direção de Walter Avancini. Ali fiquei, siderada, contendo mesmo algumas lágrimas, revendo a jornada de Severino, os versos exatos de Cabral, a direção sempre inventiva de Avancini, ao lado dos amigos que tinham a oportunidade de ouvir e ver aquela obra-prima...A adaptação de textos literários para a televisão é uma via larga de mão dupla: ao mesmo tempo em que se dão a conhecer a milhões de espectadores obras que, em condições normais, talvez eles não tivessem oportunidade de ver, na própria obra se fazem as inserções, as modificações, os acréscimos e cortes que o gênero televisivo pede ou exige. Um trabalho do gênero literatura, passado para a TV, não é mais o que era quando foi escrito. Pode vir a ser melhor ou pior, mas é sempre uma transcrição, uma recriação.Feitas algumas vezes em versões curtas, de uma hora de duração e encerradas numa unidade, essas recriações podem ser, também, produzidas para programas longos, minisséries ou telenovelas, valendo-se das qualidades do gênero advindo dos melodramas e dos folhetins.Temos de haver-nos, aí, com as diferenças que existem entre o gênero épico-narrativo, aquele de que nos utilizamos para criar o chamado romance, e o gênero épico-dramático, no qual a narração propriamente dita é, mais frequentemente, feita pela câmera.Explicando: quando um romancista quer dizer-nos que Júlio, numa balada, ao voltar do bar, onde foi buscar bebidas para si próprio e para sua garota, a encontra dançando com um velho conhecido e fica furioso e ciumento, ele tem todas as palavras do seu idioma para narrar-nos os sentimentos de que o rapaz está possuído.Numa adaptação para TV é diferente: além das palavras, jamais dispensadas, o autor conta com a câmera, que mostra, em close, as expressões faciais da personagem, seus gestos, sua atitude. É claro que ele continua dispondo da palavra, mas o bom criador de TV sabe que a imagem a substitui com vantagens.Igualmente se nota como a descrição de espaços, lugares e cenários é substituída pela simples exibição dessas locações, de roupas, adereços, detalhes que marcam a época, o país, a região onde os acontecimentos se desenvolvem.O bom adaptador, portanto, é aquele que, além de conservar o espírito do criador original, sabe aproveitar os recursos que a imagem lhe proporciona,

sem distorcer a verdade e a beleza da trama inicial. Na já mencionada adaptação de Morte e Vida, a descrição dos estados de alma do protagonista, do seu desalento, da sua secura, o novo programa criado mostra a seca, a terra morta, as mortes, a busca de um novo caminho e de uma vida possível, que acaba por triunfar. Devido, provavelmente, ao caráter exótico, atraente, de sua localização, de sua gente e de seus costumes, as regiões Norte e Nordeste têm sido ponto de partida de algumas das melhores criações do gênero. O Memorial de Maria Moura, original da escritora cearense Rachel de Queiroz, foi em 1994 recriado com muito sucesso para minissérie de 24 capítulos, adaptação de Jorge Furtado, direção-geral de Carlos Manga, e exibido pela TV Globo. A realização ensejou uma excelente interpretação de Glória Pires, que criou uma personagem apaixonante, marco da sua carreira.Dona Flor e seus Dois Maridos, romance de Jorge Amado ambientado na Bahia, como costumam ser suas criações, e publicado em 1966, teve em 1976 uma brilhante adaptação para cinema, com direção de Bruno Barreto e papel principal de Sônia Braga. Em 1998 voltaria a ser trabalhado, desta vez como telenovela, pela Rede Globo.Outra obra literária de Jorge Amado, sempre na linha de ficção ambientada na Bahia, conta a história de Tieta do Agreste, que volta ao seu lugar de nascimento para vingar-se dos que a humilharam na juventude, em clara recriação da peça teatral A Visita da Velha Senhora, de Dürrenmatt. Tieta, o romance, data de 1977 e sua adaptação para telenovela foi feita pela Globo em 1989.Mas o maior sucesso de público, de crítica e de projeção internacional dentre as obras adaptáveis de Jorge Amado é Gabriela, Cravo e Canela, romance de êxito datado de 1958, feito, em cinema, com participação de Sônia Braga e Marcello Mastroianni; e na TV, em 1975, ainda com Sônia Braga e mais Armando Bógus nos papéis principais. Consta que a TV Tupi, de resto pioneira em termos de telenovela no Brasil, tenha feito uma versão de Gabriela em 1961, com Paulo Autran num dos papéis principais. Mas dessa criação pouco restou, além da notícia.Gabriela está voltando à cena, neste ano de 2012, com Juliana Paes e Humberto Martins nos papéis principais e um grupo de atores consagrados completando o elenco. Sua remontagem, como legítima telenovela, embora prevista para um horário mais tardio, é uma prova a mais do que a ficção literária pode fazer pelo enriquecimento do gênero televisivo.

Renata Pallottini é dramaturga, poetisa, ensaísta e tradutora e fez vários trabalhos para a televisão brasileira.

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Rua Cantagalo, 74, 13.º andar. Tel.: (11) 2227-6527

Coordenação Geral: Ivan Giannini Editoração: Ana Paula Fraay Revisão: Maria Lúcia Leão

Supervisão Gráfica e Editorial: Hélcio Magalhães

Direção Executiva: Valter Vicente Sales Filho Direção de Programação: Regina Gambini

Coordenação de Programação: Juliano de SouzaCoordenação de Comunicação: Marimar Chimenes Gil

Redação: Edson ValenteDivulgação: Jô Santina e Jucimara Serra

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Este boletim foi impresso em papel fabricado com madeira de reflorestamento certificado com o selo do FSC® (Forest Stewardship Council ®) e de outras fontes controladas.A certificação segue padrões internacionais de controles ambientais e sociais.

Os episódios de Sala de Cinema deste mês abordam diferentes perspectivas na realização de obras cinematográficas, desde filmes produzidos na década de 1950 até produções atuais. Um dos pensadores do cinema brasileiro, Carlos Augusto Calil, fala, no dia 2 (16 anos), de sua trajetória profissional. O programa recebe, no dia 9 (16 anos), Sergio Penna, um dos mais reconhecidos preparadores de atores do País. Ele participou, entre outras, das produções de Carandiru, Bicho de Sete Cabeças e Bruna Surfistinha. A cineasta paulista Lina Chamie, diretora de longas como Tônica Dominante e A Via Láctea, é a convidada no dia 16 (12 anos). A atriz e diretora paraibana Marcélia Cartaxo, cuja atuação em A Hora da Estrela lhe valeu um Urso de Prata no Festival de Berlim, em 1986, comenta sua participação em quase 30 filmes no dia 23 (14 anos), e, no dia 30 (14 anos), o entrevistado é o montador pernambucano Severino Dadá, que editou perto de 80 filmes e dirigiu dois documentários. Quintas, às 22h.

A série Tertúlia passa a limpo as obras de nomes relevantes da literatura sob o olhar analítico de outros escritores. A criação poética de Hilda Hilst é investigada pelo também poeta Cláudio Willer no episódio do dia 7 (12 anos). O escritor, tradutor e jornalista Bernardo Ajzenberg revisa o trabalho do norte-americano Philip Roth no programa do dia 14 (livre). No dia 21 (12 anos), é a vez do escritor e jornalista Julián Fuks discorrer sobre James Joyce, um dos autores mais significativos do século XX. Terças, às 20h.

O SeScTV é credenciado pelo Ministério da cultura como canal de programação composto exclusivamente por obras cinematográficas e audiovisuais brasileiras de produção independente em atenção ao artigo 74º do Decreto nº 2.206, de 14 de abril de 1997 que regulamenta o serviço de TV a cabo.

Na data em que se comemora o centenário de nascimento de Nelson Rodrigues – 23 de agosto –, o SESCTV exibe uma programação especial em sua homenagem. A atriz Lucélia Santos é a entrevistada de Sala de Cinema, à 1h, e fala sobre o universo rodriguiano (16 anos). A série Dança Contemporânea destaca, às 18h, o espetáculo O Beijo, da Cia Nova Dança 4 (14 anos), coreografia inspirada na obra do dramaturgo. Em episódio de Tertúlia, às 21h, o escritor André Sant’Anna examina a trajetória de Nelson Rodrigues (12 anos).

O ESCRITOR POR ESCRITORES

Neste mês, a série Artes Visuais mostra a amplitude do uso de fotos no trabalho de quatro artistas plásticos brasileiros. No dia 1, o paulistano Albano Afonso revela seu interesse por experimentações com luz e imagens fotográficas (10 anos). O programa com Márcia Xavier traz, no dia 8, colagens, textos e a utilização de espelhos e de aparelhos oculares (10 anos). O episódio do dia 15 aborda a exposição Relicário, de Vik Muniz, que reuniu no Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo, 30 obras produzidas ao longo da carreira do artista (livre). No dia 22, Marcelo Moscheta fala sobre sua reconstituição dos espaços da memória a partir de cartões postais e fotos de paisagens (livre). A série apresenta ainda, no dia 29, os ensaios em que os fotógrafos Pio Figueiroa e Rafael Jacinto, da Cia. de Foto, misturam fotografia, som e vídeo (livre). Quartas, às 21h30.

ARTE FOTOGRÁFICA

CINEMA EM PERSPECTIVAS

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NELSON CENTENÁRIO

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Teatro e Circunstância

Nova temporadaestreia 11/9, às 22h

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