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1 abril/2012 - edição 61 sesctv.org.br TEMPORAL A DIVERSIDADE CULTURAL E AS RELAÇÕES INTERGERACIONAIS ARTES VISUAIS O PROCESSO DE CRIAÇÃO COLETIVA DO ATELIÊ FIDALGA Sincronize seu celular no QR Code e assista ao vídeo com os destaques da programação. DOCUMENTÁRIO FILME RETRATA A CARREIRA DO ATOR JOSÉ LEWGOY FOTO: DIVULGAÇÃO

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abril/2012 - edição 61sesctv.org.br

Temporala diversidade

culTural e as relações inTergeracionais

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desTaques da programação 4

enTrevisTa - Daniela Capelato 8

arTigo - Kiko Goifman e Olívia Brenga 10

Promover o encontro entre as pessoas e, por meio delas, de histórias, culturas, projetos e olhares é uma das propostas do SESC para cumprir sua missão, manifestada em suas ações de caráter educativo e cultural. Essa escolha também está presente na programação do SESCTV, seja na abordagem de temas, seja no uso das mais diferentes linguagens e narrativas, resultado de um trabalho que prioriza a produção audiovisual independente e que abre espaço para projetos autorais.

Neste mês, o canal estreia uma nova série, Temporal, que foca a diversidade das relações interpessoais, com protagonistas de todas as idades, que lançam olhares diferentes sobre o cotidiano. Com direção dos documentaristas Kiko Goifman e Olívia Brenga, e mediada pela linguagem audiovisual, a série apresenta depoimentos reveladores, que promovem o encontro com o outro e com a diferença.

A diversidade também é foco da série Caminhos, que mostra brasileiros de diferentes regiões em seu trajeto para a escola, revelando paisagens e desejos. Cinco episódios inéditos da série estão na programação deste mês. A vontade de compartilhar foi o ponto de partida para a criação do Ateliê Fidalga, em São Paulo, um espaço que reúne artistas plásticos para discutir ideias e projetos em comum, como apresentam dois episódios da série Artes Visuais. A faixa de Documentários exibe, neste mês, o filme Eu eu eu Lewgoy, de Cláudio Kahns, sobre a longa e fascinante carreira desse ator brasileiro.

A Revista do SESCTV deste mês traz entrevista com a produtora Daniela Capelato, que avalia a repercussão das obras audiovisuais brasileiras no exterior. O artigo de Kiko Goifman e Olívia Brenga aborda os desafios na realização da série Temporal.

Boa leitura!

Danilo Santos de MirandaDiretor Regional do SESC São Paulo

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Temporal

Retratos da humanidade

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A diversidade humana, o modo de entender e interpretar o mundo e as diferentes formas de relacionamento interpessoal são temas que interessam ao documentarista Kiko Goifman. Seus trabalhos – quer para cinema, quer para televisão – buscam mergulhar nas particularidades do outro, em entrevistas reveladoras de comportamentos, personalidades e olhares. Os depoimentos dessas pessoas são reunidos e trabalhados dentro de uma linha temática, tendo-se tornado uma assinatura do autor. A partir deste mês, o SESCTV exibe uma nova série dirigida por Kiko Goifman e Olívia Brenga: Temporal. São 26 episódios de 52 minutos, em linguagem documental, que focam a diversidade humana e as relações entre diferentes gerações.

Dentre os temas abordados, estão: comunidade grega, música e literatura, fisiculturismo, amor, rock, homossexualismo e colecionadores. Cada programa traz depoimentos de pessoas das mais diversas origens, que abordam o tema proposto com suas histórias e pontos de vista. O episódio de estreia, Política do Amor, trata do relacionamento amoroso entre pessoas de diferentes faixas etárias. Dentre as personagens entrevistadas está o diretor teatral José Celso Martinez Corrêa (foto), que relata sua experiência amorosa com o químico Roderick Himeros, cinquenta anos mais novo do que ele. “Eu acho que o amor faz parte de nós desde as primeiras células da vida, que produziram toda a evolução, passando pela fase da água, da terra, das plantas, dos bichos, até a espécie humana. É o que produz, é o desejo de viver, de crescer, de procriar”, afirma ele.

No mesmo episódio, o preconceito e a dificuldade de aceitação por parte da família também são abordados, como explica Raquel Marinho, que aos 22 anos de idade iniciou um namoro com o psiquiatra José Angelo Gaiarsa, na época com 88 anos. “Minha mãe ficou chocada, não entendeu. Meu pai só soube no dia em que meu namorado morreu”, lembra. Para ela, porém, a diferença de idade foi fator fundamental para a qualidade da relação. “Se não existisse essa diferença de idade, a gente não teria tanta atenção, tanto cuidado com a relação. Coisa que, num relacionamento com idades parecidas, a gente não tem. Entra um pouco no automático”, acredita Raquel.

A série Temporal é uma realização do SESCTV, com produção da Paleo TV. É exibida a partir do dia 27/04, sempre às sextas-feiras, 22h.

Sextas-feiras, às 22h

política do amorDireção: Kiko Goifman e Olívia BrengaDia 27/04

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DocumenTário

Filme de cláudio Kahns reTraTa a carreira do aTor José lewgoy nos Tempos da chanchada, no cinema novo e nas Telenovelas

Um ator versátil

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“Se quiser saber quem eu sou, é só ler Alice no País das Maravilhas e O Estrangeiro, de Albert Camus. Sou uma mistura dos dois livros”. Talentoso, mal humorado, versátil, rabugento, culto. É extensa a lista de predicados atribuídos a José Lewgoy, condizente com a longa e intensa carreira que esse ator brasileiro construiu. Em cinco décadas, ele somou mais de cem filmes (sendo 26 internacionais), sem contar as novelas e as peças teatrais, de que participou “menos do que devia”, em sua própria opinião.

José Lewgoy, caçula de uma família de quatro irmãos que imigrou dos Estados Unidos, nasceu e cresceu na cidade de Veranópolis (RS) e ainda criança manifestou interesse pelas artes cênicas. “Saí muito cedo do ninho familiar”, lembra o ator. Em 1935, aos 15 anos, começou a atuar no Teatro dos Estudantes. Também ocupava-se de traduzir textos teatrais, talento que lhe rendeu um convite para estudar na Escola de Artes Dramáticas da Universidade de Yale, nos Estados Unidos.

Após retornar ao Brasil, participou das chanchadas dos estúdios da Atlântida – os papéis de vilão eram sua especialidade – ao lado de ícones como Oscarito e Grande Otelo. “Não houve, não há e nunca haverá um ator como Oscarito”, disse. Depois de uma temporada de dez anos em Paris, Lewgoy retoma sua carreira no Brasil, que vivia a efervescência do Cinema Novo. Com Glauber Rocha, filma Terra em Transe (1967). Já um ator consagrado, inicia uma nova fase de sua carreira, na década de 1970, participando de telenovelas, dentre as quais O Rebu (1974), Anjo Mau (1976), Dancin’ Days (1979) e Água Viva (1980). “José

Lewgoy era uma pessoa que sabia que a câmera o amaria e o tocaria, sentiria sua pele, seu suor e sua raiva”, afirma o cineasta Werner Herzog, com quem o ator trabalhou no filme Fitzcarraldo (1982). Lewgoy morreu em 2003.

O SESCTV exibe, neste mês, o documentário Eu eu eu Lewgoy, dirigido por Cláudio Kahns, com depoimentos de amigos, colegas e familiares do ator, como os atores Tônia Carrero, Walmor Chagas, Anselmo Duarte, Glória Pires; o escritor Luís Fernando Veríssimo; o jornalista Sérgio Augusto; e os cineastas Werner Herzog e Guilherme de Almeida Prado. “O assunto principal do Lewgoy sempre foi o Lewgoy, o que não quer dizer que fosse entediante, de maneira alguma. Lewgoy gostava muito de falar de si, de contar suas histórias, o que tinha feito”, conta Prado. Segundo Lewgoy, “não é uma biografia... nem saberia como escrevê-la; são lembranças dessa vida maluca que levei nestes últimos oitenta anos e que pretendo levar nos próximos oitenta”.

DoCuMEnTáRio

eu eu eu lewgoyDireção: Cláudio KahnsDia 29/04, às 22h

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Criação coletivaarTes Visuais

A criação de um espaço democrático de trocas em que cada artista apresenta suas ideias, propostas e dúvidas em encontros de partilha e amadurecimento criativo foi o ponto de partida do Ateliê Fidalga, criado em São Paulo há uma década por um grupo de artistas, sob coordenação dos artistas plásticos Albano Afonso e Sandra Cinto. “Além de ser nosso espaço de trabalho, é também um local de discussão e de produção artística; a princípio, era algo técnico, mas foi-se desenvolvendo para o lado mais teórico. O nosso papel aqui é de mediação e orientação. Nós indicamos alguns caminhos, numa interferência de grupo”, explica Afonso.

O Ateliê conta com a participação efetiva de 60 artistas que se reúnem em encontros semanais, em grupos de 15 profissionais. Em 2010, ano em que o Ateliê celebrou uma década de existência, seus artistas foram convidados a montar uma exposição no Paço das Artes, que, por sua vez, comemorava 40 anos. “Durante quatro meses, nós ficamos discutindo projeto a projeto. Cada artista apresentava suas ideias, era sabatinado, questionado sobre como poderia melhorar, dar um voo com sua obra. Toda a montagem da exposição foi pensada em grupo”, conta Sandra Cinto.

As propostas giraram em torno da ocupação e diálogo com o espaço da exposição, que ficou em cartaz entre 13 de julho e 29 de agosto de 2010, e abordou temas como a relação do homem com a natureza, o corpo e o efêmero. “Como a gente focou a questão do processo, algumas obras se modificaram ao longo da exposição. Foi o caso, por exemplo, do trabalho da fotógrafa Christina Meirelles, que veio ao Paço no

aTeliê Fidalga, em sua sede em são paulo, reúne 60 arTisTas para discuTir e pensar seu processo criaTivo

arTes visuais

início do projeto, registrou as árvores que ficam em frente ao local, trouxe essas fotografias para dentro do espaço, e durante a exposição foi complementando com outras fotos”, explica Sandra Cinto.

O SESCTV exibe, neste mês, dois episódios inéditos sobre o Ateliê Fidalga, na série Artes Visuais. Os programas foram gravados durante a exposição no Paço das Artes e trazem entrevistas com Albano Afonso, Sandra Cinto e com diversos outros artistas, como Ding Musa, Fernando Velázquez, Felipe Gama, Mariana Palma, Julia Kater e Adélia Klinke. Eles falam sobre suas inspirações na elaboração das obras. Ainda este mês, o canal exibe episódios com Erika Verzutti, dia 18, e com Thiago Honório, dia 25. Artes Visuais tem direção de Cacá Vicalvi.

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Quartas, às 21h30

ateliê Fidalga – parte 1Dia 04/04

ateliê Fidalga – parte 2Dia 11/04

erika verzuttiDia 18/04

Thiago honórioDia 25/04

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Domingos, 19h

só, eu vou e volto (am)Direção: Heloisa Passos. Dia 01/04

além da Fronteira (ms)Direção: Heloisa Passos. Dia 08/04

o espelho de Téo (rJ)Direção: Heloisa Passos. Dia 15/04

entre as maras e o mar (ce)Direção: Marília Rocha. Dia 22/04

o contador de histórias (Ba)Direção: Heloisa Passos. Dia 29/04

caminhos

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caminhos

Para romper fronteiras

série mosTra o TraJeTo da casa para a escola, percorrido por Brasileiros de diFerenTes regiões e condições sociais

Todos os dias, brasileiros de diferentes regiões, origens e condições sociais saem de casa para estudar. Percorrem trajetos distintos, utilizando os mais diversos meios de transporte – como ônibus, carro, moto, barco, bicicleta, cavalo – ou mesmo a pé. Caminhos que, percorridos ora solitariamente ora em família ou em pequenos grupos, representam um passo em busca de conhecimento, de emancipação e de apropriação do mundo. Histórias que inspiram e emocionam, reunidas numa série de treze episódios chamada Caminhos, em exibição no SESCTV. Com direção geral de Heloisa Passos, a série apresenta esses personagens utilizando o gênero de documentário, numa linguagem poética e contemplativa. Caminhos é uma coprodução do SESCTV com a Maquina Filmes e foi realizada com recursos da Lei de Incentivo da Ancine. A direção dos episódios é de Heloisa Passos, Marília Rocha e Katia Lund.

Neste mês, cinco episódios inéditos serão exibidos. A série viaja até o Amazonas para acompanhar a rotina de Jovane, no episódio Só, Eu Vou e Volto. Índio marajaí, ele diariamente deixa sua aldeia, mulher e filhos para cursar História em Teffé. Empenhado em realizar seu sonho, logo cedo ele sai de casa e atravessa rios, estradas e igarapés, de barco e de ônibus.

Além da Fronteira mostra a vida de Fabrício Alaro Huayta, um boliviano de 10 anos de idade

e morador do município Porto Quijaro, que para estudar violino viaja a Corumbá, no Mato Grosso do Sul. Além do difícil trajeto entre os dois países, que ele percorre de ônibus, há também a barreira da língua, dos costumes e da cultura. Desafios que ele enfrenta, perseguindo o desejo de tornar-se músico.

No Rio de Janeiro, a série apresenta, no episódio O Espelho de Téo, o cotidiano de um garoto de classe média que enfrenta as dificuldades de adaptação após a separação de seus pais, que agora se revezam para buscá-lo na escola.

As praias e as dunas cearenses são a paisagem no caminho percorrido por cinco irmãos, em Vila Preá, apresentado no episódio Entre as Maras e o Mar. O trajeto é feito com todos na garupa de uma moto, pilotada pelo mototaxista Bigode, que tem a missão de levar, em segurança, essas crianças para a escola.

A capoeira é a paixão do jovem baiano Delvan, personagem do episódio O Contador de Histórias. Nascido no Quilombo de Remanso, na Chapada Diamantina, três vezes por semana ele retorna à sua comunidade natal para ensinar capoeira às crianças. Em troca, colhe e coleciona histórias, preservando os laços com seu passado.

A série Caminhos é exibida todos os domingos, às 19h.

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enTreVisTa

‘Há pouco espaço para se arriscar’

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“o produTor é um cara com olhar, com Formação, e Tem de

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Qual sua formação e como foi sua trajetória no audiovisual? Fiz Comunicação na FAAP. No meio do curso, fui passar um ano na França, acompanhando os trabalhos do Instituto Nacional do Audiovisual, que tem um importante acervo. A França vivia a transição das TVs públicas para as TVs privadas, processo em que surgiram canais como a ARTE, por exemplo. Eu acompanhava as séries que eram feitas em coprodução com vários países da Europa. Eram produções interessantes, dirigidas por grandes nomes, como Polanski e Godard. Projetos muito ousados, com produções bem trabalhadas e a preocupação de formar um acervo. Voltei para o Brasil muito animada em trabalhar com TV, mas nessa linha de programas de acervo, de arte, mais autorais. Só que veio a era Collor e tudo parou. Naquela época, a produção independente estava só começando, era embrionária. Como eu tinha a ideia de trabalhar o vídeo incorporado a outras artes, eu me identifiquei com o documentário. Fiz uma série chamada Encontro com Artistas e fui convidada a trabalhar na direção de cinema e vídeo do Itaú Cultural, onde permaneci por sete anos. Depois, abri minha própria produtora, cujo primeiro trabalho foi a produção do documentário Do Outro Lado do Rio [em exibição em maio no SESCTV], dirigido por Lucas Bambozzi, e feito na fronteira do Brasil com a Guiana Francesa. Qual o papel do produtor no processo de realização de uma obra audiovisual? Essa é a grande questão do momento. Acho que o produtor é um cara com olhar, com formação, e tem de ser um pouco artista também para trabalhar em parceria com uma equipe de criação de uma obra audiovisual. É fundamental que o produtor se constitua como tal nesse processo. O que é muito difícil de acontecer com um sistema de financiamento como é o do Brasil, no qual não é o produtor que define os projetos, mas um patrocinador ou uma comissão montada para um edital. Esses processos valorizam mais o projeto do que o produtor. Uma das consequências disso é que o produtor acaba tendo de investir em várias frentes, mais lidando com a diversidade do que criando uma linha editorial mesmo: literalmente atirando para todos os lados. O produtor no Brasil configura-se

Daniela Capelato é produtora e roteirista de audiovisual

para cinema e televisão, com enfoque no gênero de

documentário. Há três anos, vem divulgando as obras

brasileiras no exterior como correspondente no Brasil do

FIPA, Festival International des Programmes Audiovisuels,

realizado anualmente em Biarritz, na França.

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mais como um administrador, um advogado, um contador e um prestador de serviços. É muito raro encontrar espaço para um trabalho mais autoral, para desenvolver uma assinatura. Claro que há exceções, mas na média o que vejo é que, no Brasil, é difícil a possibilidade de um produtor ser ele mesmo, de se arriscar num projeto mais ousado ou num diretor desconhecido. No audiovisual, acho que o espaço para arriscar mais ainda está no documentário, pela natureza do gênero mesmo. Não por acaso, é ele quem tem possibilitado uma inovação de linguagem maior. Como você avalia o cenário da atual produção audiovisual brasileira? É mais fácil negociar e distribuir documentários do que filmes de ficção, embora o valor pago seja bem menor. Outra realidade atual é que a produção independente tem caído muito no mundo. Li textos sobre o assunto, que avaliavam esse cenário ainda antes dessa crise na Europa. E o Brasil também sofre com isso. Os modelos possíveis de distribuição de uma obra audiovisual são três: coprodução, licenciamento, e prestação de serviços para empresas de produção. Desses, acredito que o Brasil tem mais chance de se destacar na coprodução, porque nosso país conta com uma verba e vem investindo nos últimos cinco anos, fechando acordos com vários países do mundo, como Canadá, França, Argentina e Uruguai. A vantagem desse processo é que ele amplia a distribuição, porque o filme passa a ter duas ou mais nacionalidades. Mas também há as dificuldades em se produzir um filme assim, porque as regras e leis são diferentes em cada país, sem contar os diferentes modelos de fazer e de idealizar a obra. A coprodução é a possibilidade de troca de conhecimento. Qual a repercussão da produção audiovisual brasileira no exterior? Sinceramente, acho que não é muito grande; os números não enganam. A gente ainda não é uma indústria, tem coisa que a gente não sabe fazer, como, por exemplo, documentários investigativos, que é o gênero que melhor vende no mundo e o que as pessoas mais querem ver. Não há nem lei que permita fazer um filme sem a autorização do uso de imagem de uma personagem. Os canais de TV também não estão preparados, com um departamento jurídico, como acontece nos Estados Unidos e na França. Nesses países, eles fazem documentários que derrubam um governo. Outro destaque são os filmes de natureza, que exigem muito de equipamento e de equipe. Documentários de criação, como os feitos por Eduardo Coutinho e João Moreira Salles, são mais fáceis de

fazer e, embora eles cheguem às mostras oficiais de audiovisual, não saem bem na distribuição. Viajo porque Preciso, Volto porque te Amo, filme que eu produzi, foi muito bem nos festivais e ainda assim só conseguimos vender para os Estados Unidos, México e Espanha. Há filmes que fazem boa bilheteria no Brasil, mas que tocam especificamente o público brasileiro, seja pela presença de atores conhecidos por aqui, seja pela linguagem. Que tipo de produções realizadas no Brasil interessa ao público estrangeiro? O mercado internacional ainda é muito estereotipado em termos de imagem de Brasil. O que a gente vende muito são produções de música. Menos do que antes, mas ainda bastante, o público também gosta da temática da miséria. Há filmes com bom público no Brasil que chegam aos festivais, mas acabam sendo criticados pela imprensa internacional, como aconteceu com Tropa de Elite, por exemplo. Sem contar que é preciso contextualizar de que festivais estamos falando: há o festival de Cannes e há o Oscar. São linhas bem diferentes. A palavra de ordem é buscar uma segmentação e procurar os nichos, para imprimir uma identidade. Qual sua atuação no FIPA (Festival International des Programmes Audiovisuels)? Há três anos, sou correspondente do FIPA no Brasil, ou seja, faço uma ponte entre o festival e os produtores. Ajudo a divulgar o festival aqui e a levar as obras brasileiras para lá. Esse trabalho começa na metade do ano, às vésperas da abertura das inscrições. O interessante é que tem crescido bastante a participação de obras brasileiras no FIPA, o que é muito bom tanto para o festival quanto para os autores. A participação dos produtos brasileiros dá visibilidade ao festival e, ao mesmo tempo, os canais se percebem, identificam suas afinidades, embora estejam em diferentes países do mundo. Já tivemos um telefilme brasileiro que foi selecionado, mas o que mais se destaca ainda são as produções musicais e os espetáculos.

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arTigo

chuVa forTe Vem aíCem quilos erguidos por uma senhora de 67 anos. Pai e filho – cartunistas – tocam jazz juntos. Zé Celso de mãos dadas com seu jovem namorado revela paixão. Jean-Claude Bernardet e o seu desejo de entrar em órbita. Uma prostituta de 65 anos no Parque da Luz. Uma jovem que herdou da mãe o gosto pela morte. Um transformista de 73 anos que se chama Biá. O desafio que nos foi proposto era o desenvolvimento de uma série que tratasse das relações entre pessoas de diferentes gerações, sempre enfocando de alguma forma a terceira idade. Assim como na nossa sociedade em geral, na televisão os idosos são muitas vezes vistos a partir de estereótipos. De um lado, desprezados, de outro, tratados como super-heróis infantilizados. A intenção era tentar ir além, tratar de relações sociais entre pessoas de fato, com sua poesia e suas agruras. Desafio proposto, desafio topado. Assim nasce a série Temporal, palavra essa que possui a ideia de tempo em seu interior. Anteriormente fizemos com o SESCTV a série HiperReal, que se dedica a grupos de jovens em ambientes urbanos. Skatistas, amantes da transformação radical do corpo, ciclistas, palestinos ou jovens gays evangélicos. Em Temporal, a aglutinação de pessoas em grupos é menos importante. Interessam os processos humanos, os rituais cotidianos nos quais pessoas de diferentes idades dividem um mesmo espaço, simbólico ou concreto. Jovens e velhos que se contaminam culturalmente. São vários os temas dos programas. Alguns relacionados à arte e cultura, outros sobre atividades físicas, lazer, etnias e, essencialmente, comportamento. Para chegar aos assuntos tratados e, depois, às personagens, foram meses de pesquisa. Como encontrar essas relações na cidade? Que tipo de relações são estabelecidas entre pessoas de diferentes idades? Temos, de fato, encontros? Temos confrontos? Perguntas básicas orientavam uma pesquisa que se adensava. Se em uma das mãos tivemos a solidez da pesquisa, na outra a opção foi realizar uma série na rua, nos deslocamentos pela cidade. A busca da diversidade. Um exercício de abertura de olhar para poder ser surpreendido. Assim como um temporal que pode desabar a qualquer instante e depois sumir, abrindo o espaço para o sol. Nada de formulações anteriores, nada de certezas de gabinete. Sabíamos sobre as pessoas que iríamos encontrar, mas deixávamos um espaço para que o novo surgisse. O contato com o outro e a descoberta de relações singulares a partir de uma câmera. Quando se trabalha com a ideia de abertura ao acaso,

surpresas emergem. Marcamos um encontro com Zé da Ilha, de 81 anos, frequentador assíduo de um parque. A entrevista ia bem, nos emocionamos muito e ele deixou cair uma lágrima. Subitamente, Zé da Ilha interrompe a conversa, se levanta, começa a andar e cantar mostrando o parque para nossa câmera e falando com pessoas que passavam. De objeto de entrevista, Zé da Ilha converteu-se em sujeito e fez nossa equipe ter que “correr atrás” para ajustar o foco, lidar com o sol forte e a sombra. Naquele momento, a pauta com perguntas, o melhor enquadramento, já nada interessava. Zé estava mais à vontade naquele lugar do que qualquer um de nós. Um outro bom exemplo foi quando saímos de São Paulo até a Granja Vianna para filmar o grupo Mutantes. Atualmente, com a mudança de vários integrantes, eles são um belo exemplo de contato entre pessoas de várias gerações. Chegamos ao estúdio/casa às 14h. Sérgio Dias, o líder, dormia. Foi ali que ficamos esperando, em meio aos viajados estojos de equipamentos repletos de adesivos, guitarras lendárias e amplificadores históricos. Que prazer a espera! Quando Sérgio Dias acordou, um imenso problema. A energia elétrica da casa/estúdio acabou. Tínhamos tudo para cancelar as filmagens. Pois foi aí que um dos momentos mais emocionantes da realização de Temporal aconteceu. Saímos do estúdio e fomos para a sala da casa, onde a luz do sol cruzava a parede de vidro. Juntos, Vitor Trida, Bia Mendes e Sérgio Dias – de gerações bem diferentes – fizeram uma jam session acústica de tirar o fôlego. Tocaram músicas antigas e novas, coisas de que gostavam. Acertavam os arranjos ali, diante de nossos olhos. Entre risadas e brincadeiras, fizemos depois um bate-papo, muito melhor do que seria qualquer entrevista formal. Cada um dos membros de nossa equipe guardará pra sempre essa experiência. Bendita falta de luz. Temporal começa agora a ser veiculado pelo SESCTV. Topamos o desafio e agora teremos o prazer de saber se fomos bem sucedidos. Pratos serão quebrados no episódio dos gregos, corpos com e sem rugas bailarão, pernas finas com mais de 80 anos subirão em pranchas de surfe, fogões serão acesos por pais e filhos, videogames divididos por netos e avôs. Um programa que tem pessoas de todas as faixas etárias em seu conteúdo e que, também, acreditamos possa ser visto por todas as idades

Kiko Goifman e Olívia Brenga são documentaristas e diretores da série Temporal, em exibição no SESCTV.

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Este boletim foi impresso em papel fabricado com madeira de reflorestamento certificado com o selo do FSC® (Forest Stewardship Council ®) e de outras fontes controladas.A certificação segue padrões internacionais de controles ambientais e sociais.

Considerado um dos precursores da Tropicália, José Agrippino de Paula é destaque na programação deste mês do SESCTV. O canal exibe filmes dirigidos pelo “Bruxo de Embu”, com curadoria da videoartista Lucila Meirelles. A programação inclui: Hitler Terceiro Mundo, dia 12/04, às 23h; Céu sobre Água e Candomblé no Togo, dia 13/04, às 23h; Movimento de Abertura da Sinfonia Panamérica e Maria Esther e as Danças na África, dia 14/04, às 23h.

Temas como o convívio entre diferentes grupos, a guerra e o processo de criação, apresentados por realizadores de outros países, estão no episódio Olhar Estrangeiro da série CurtaDoc. O programa exibe quatro curtas-metragens de documentário: All Nations Café (direção de Alice Riff/2010); Pedra Bruta (direção de Júlia Zackia/2009); What are you looking for? (direção de Camila Gonzatto/2008); e Ilha (direção de Marcos Pimentel/2004). O cineasta norte-americano Alan Langdon comenta as produções. Dia 24/04, às 21h.

o SESCTV é credenciado pelo Ministério da Cultura como canal de programação composto exclusivamente por obras cinematográficas e audiovisuais brasileiras de produção independente em atenção ao artigo 74º do Decreto nº 2.206, de 14 de abril de 1997 que regulamenta o serviço de TV a cabo.

O SESCTV transmitiu ao vivo, no dia 22 de março, das 15h às 17h, o debate Rio + 20: Mudanças Climáticas. Uma iniciativa do Sesc Nacional em parceria com o Senac Nacional, o evento discutiu as consequências da atuação do homem para o meio ambiente, antecipando um dos temas que serão abordados por lideranças mundiais, em junho, na Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável. Mediado pela jornalista Bárbara Pereira, o debate teve a participação de Ildeu de Castro Moreira, diretor do Departamento de Difusão e Popularização da Ciência e da Tecnologia do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação; José Antonio Marengo Orsini, chefe do Centro de Ciências do Sistema Terrestre do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe); e Sérgio Besserman Vianna, presidente do Grupo de Trabalho da Prefeitura do Rio de Janeiro para a Conferência Rio +20.

olhares esTrangeiros

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O cenário atual da produção audiovisual no Brasil e as mudanças provocadas pela lei 12.485/11, que atualiza a legislação da TV por assinatura no País, pautaram as principais mesas de debate durante o RioContent Market 2012, realizado entre 29 de fevereiro e 2 de março, com a participação do SESCTV. Nos três dias do evento contou-se com a presença de produtoras, cineastas, canais, operadoras de TV e representantes de órgãos públicos, como o diretor-presidente da Ancine, Manoel Rangel.

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Uma viagem aos limites do Brasil Direção: Lucas Bambozzi

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Do outro lado do rio

27/5, às 20h