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PUBLICAÇÃO OFICIAL Revista SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

RSTJ 239 TOMO1RSTJ 239, Tomo 1 - Direito Ambiental Juristas Colaboradores Álvaro Luiz Valery Mirra Ana Maria de Oliveira Nusdeo Ana Maria Moreira Marchesan Ana Paula Rengel Gonçalves

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    Revista SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

  • VOLUME 239, TOMO 1ANO 27

    JULHO/AGOSTO/SETEMBRO 2015

    Revista SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

  • SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇAGabinete do Ministro Diretor da Revista

    DiretorMinistro Herman BenjaminChefe de GabineteAndrea Dias de Castro CostaServidoresEloame AugustiGerson Prado da SilvaMaria Angélica Neves Sant’AnaTécnica em SecretariadoMaria Luíza Pimentel MeloMensageiroCristiano Augusto Rodrigues Santos

    Superior Tribunal de Justiçawww.stj.jus.br, [email protected] do Ministro Diretor da RevistaSetor de Administração Federal Sul, Quadra 6, Lote 1, Bloco C, 2º Andar, Sala C-240, Brasília-DF, 70095-900Telefone (61) 3319-8055/3319-8003, Fax (61) 3319-8992

    Revista do Superior Tribunal de Justiça. N. 1 (set. 1989). -- Brasília : STJ, 1989 - .

    Periodicidade varia: Mensal, do n. 1 (set. 1989) ao n. 202 (jun. 2006), Trimestral a partir do n. 203 (jul/ago/set. 2006).

    Volumes temáticos na sequência dos fascículos: n. 237 ao n. 239 organizados por Antonio Herman Benjamin, José Rubens Morato Leite e Sílvia Capelli.

    Repositório Ofi cial da Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Nome do editor varia: Superior Tribunal de Justiça/Editora Brasília Jurídica, set. 1989 a dez. 1998; Superior Tribunal de Justiça/Editora Consulex Ltda, jan. 1999 a dez. 2003; Superior Tribunal de Justiça/ Editora Brasília Jurídica, jan. 2004 a jun. 2006; Superior Tribunal de Justiça, jul/ago/set 2006-.

    Disponível também em versão eletrônica a partir de 2009: https://ww2.stj.jus.br/web/revista/eletronica/publicacao/?aplicacao=revista.eletronica.

    ISSN 0103-4286

    1. Direito, Brasil. 2. Jurisprudência, periódico, Brasil. I. Brasil. Superior Tribunal de Justiça (STJ). II. Título.

    CDU 340.142(81)(05)

  • MINISTRO HERMAN BENJAMIN Diretor

    Revista SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

  • Organizadores do Volume TemáticoAntonio Herman BenjaminJosé Rubens Morato Leite

    Sílvia Cappelli

    RSTJ 239, Tomo 1 - Direito Ambiental

    Juristas ColaboradoresÁlvaro Luiz Valery Mirra

    Ana Maria de Oliveira NusdeoAna Maria Moreira Marchesan

    Ana Paula Rengel GonçalvesAndréa Silva

    Andréia Mendonça AgostiniAnnelise Monteiro Steigleder

    Arícia Fernandes CorreiaBraulio Cavalcanti Ferreira

    Cândido Alfredo Silva Leal JúniorCarlos E. Peralta

    Carlos Eduardo Ferreira PintoCarlos Magno de Souza Paiva

    Carlos Teodoro José Hugueney IrigarayClarides Rahmeier

    Cristiane DeraniDaniel Gaio

    Danielle de Andrade MoreiraDélton Winter de Carvalho

    Eduardo Coral ViegasEla Wiecko Volkmer de Castilho

    Eliane Cristina Pinto MoreiraEliziana da Silveira Perez

    Elton M. C. LemeEveline de Magalhães Werner Rodrigues

    Fernanda Dalla Libera DamacenaFernanda Luiza Fontoura de MedeirosFernanda Menna Pinto PeresFernando Reverendo Vidal AkaouiFrancisco Humberto Cunha FilhoGabriel WedyGabriela Cristina Braga NavarroGabriela SilveiraGermana Parente Neiva BelchiorGilberto Passos de FreitasGiorgia Sena MartinsGirolamo Domenico TreccaniGuilherme José Purvin FigueiredoHeline Sivini FerreiraHugo Nigro MazzilliIbraim RochaInês Virgínia Prado SoaresIngo Wolfgang SarletJarbas Soares JúniorJoão Luis Nogueira MatiasJosé Heder BenattiJosé Rubens Morato LeiteKamila Guimarães de MoraesKleber Isaac Silva de SouzaLeonardo Castro Maia

  • Letícia AlbuquerqueLeticia Rodrigues da Silva

    Lidia Helena Ferreira da Costa PassosLucas Lixinski

    Luciano Furtado LoubetLuís Fernando Cabral Barreto Junior

    Luiz Fernando RochaLuiz Guilherme Marinoni

    Luiza Landerdahl ChristmannLuly Rodrigues da Cunha Fischer

    Marcelo Abelha RodriguesMarcelo Krás Borges

    Márcia Dieguez LeuzingerMaria Leonor Paes C. Ferreira Codonho

    Marina Demaria VenâncioMario Jose Gisi

    Melissa Ely MeloNatália Jodas

    Ney de Barros Bello FilhoNicolao Dino

    Oscar Graça CoutoPatricia Antunes Laydner

    Patrícia Faga Iglecias LemosPatrícia Nunes Lima Bianchi

    Patryck de Araujo AyalaPaula Galbiatti Silveira

    Paulo Aff onso Brum VazPery Saraiva Neto

    Rafael Martins Costa MoreiraRaimundo Moraes

    Raquel Thais HunscheRaul Silva Telles do Valle

    Rodolfo de Camargo MancusoRodrigo Antonio de Agostinho Mendonça

    Sandra Veronica CureauSílvia Cappelli

    Solange Teles da SilvaTalden FariasThaís Dalla CorteThaís Emília de Sousa ViegasTiago FensterseiferUbiratan CazettaVanêsca Buzelato PrestesVictor Manoel PelaezVladimir Passos de FreitasXimena Cardozo FerreiraZenildo Bodnar

  • Resolução n. 19/1995-STJ, art. 3º.

    RISTJ, arts. 21, III e VI; 22, § 1º, e 23.

    SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇAPlenário

    Ministro Francisco Cândido de Melo Falcão Neto (Presidente)Ministra Laurita Hilário Vaz (Vice-Presidente)Ministro Felix FischerMinistra Fátima Nancy Andrighi (Corregedora Nacional de Justiça)Ministro João Otávio de Noronha (Diretor-Geral da ENFAM)Ministro Humberto Eustáquio Soares MartinsMinistra Maria Th ereza Rocha de Assis MouraMinistro Antonio Herman de Vasconcellos e Benjamin (Diretor da Revista)Ministro Napoleão Nunes Maia Filho Ministro Jorge MussiMinistro Geraldo Og Nicéas Marques Fernandes (Corregedor-Geral da Justiça Federal)Ministro Luis Felipe SalomãoMinistro Mauro Luiz Campbell MarquesMinistro Benedito GonçalvesMinistro Raul Araújo FilhoMinistro Paulo de Tarso Vieira SanseverinoMinistra Maria Isabel Diniz Gallotti RodriguesMinistro Antonio Carlos Ferreira (Ouvidor)Ministro Ricardo Villas Bôas CuevaMinistro Sebastião Alves dos Reis JúniorMinistro Marco Aurélio Gastaldi BuzziMinistro Marco Aurélio Bellizze OliveiraMinistra Assusete Dumont Reis MagalhãesMinistro Sérgio Luíz KukinaMinistro Paulo Dias de Moura RibeiroMinistra Regina Helena CostaMinistro Rogerio Schietti Machado CruzMinistro Nefi CordeiroMinistro Luiz Alberto Gurgel de FariaMinistro Reynaldo Soares da FonsecaMinistro Marcelo Navarro Ribeiro Dantas

  • CORTE ESPECIAL (Sessões às 1ª e 3ª quartas-feiras do mês)

    Ministro Francisco Falcão (Presidente)Ministra Laurita Vaz (Vice-Presidente)Ministro Felix FischerMinistra Nancy AndrighiMinistro João Otávio de NoronhaMinistro Humberto MartinsMinistra Maria Th ereza de Assis MouraMinistro Herman BenjaminMinistro Napoleão Nunes Maia FilhoMinistro Jorge MussiMinistro Og FernandesMinistro Luis Felipe SalomãoMinistro Mauro Campbell MarquesMinistro Benedito GonçalvesMinistro Raul Araújo

    PRIMEIRA SEÇÃO (Sessões às 2ª e 4ª quartas-feiras do mês)

    Ministro Herman Benjamin (Presidente)

    PRIMEIRA TURMA (Sessões às terças-feiras e 1ª e 3ª quintas-feiras do mês)

    Ministro Sérgio Kukina (Presidente)Ministro Napoleão Nunes Maia FilhoMinistro Benedito Gonçalves Ministra Regina Helena CostaMinistro Olindo Herculano de Menezes *

    * Desembargador convocado (TRF1)

  • SEGUNDA TURMA (Sessões às terças-feiras e 1ª e 3ª quintas-feiras do mês)

    Ministra Assusete Magalhães (Presidente)Ministro Humberto MartinsMinistro Herman BenjaminMinistro Mauro Campbell MarquesMinistra Diva Prestes Marcondes Malerbi **

    SEGUNDA SEÇÃO (Sessões às 2ª e 4ª quartas-feiras do mês)

    Ministro Raul Araújo (Presidente)

    TERCEIRA TURMA (Sessões às terças-feiras e 1ª e 3ª quintas-feiras do mês)

    Ministro Villas Bôas Cueva (Presidente)Ministro João Otávio de NoronhaMinistro Paulo de Tarso SanseverinoMinistro Marco Aurélio BellizzeMinistro Moura Ribeiro

    QUARTA TURMA (Sessões às terças-feiras e 1ª e 3ª quintas-feiras do mês)

    Ministra Isabel Gallotti (Presidente)Ministro Luis Felipe SalomãoMinistro Raul AraújoMinistro Antonio Carlos Ferreira Ministro Marco Buzzi

    ** Desembargadora convocada (TRF3)

  • TERCEIRA SEÇÃO (Sessões às 2ª e 4ª quartas-feiras do mês) Ministro Sebastião Reis Júnior (Presidente)

    QUINTA TURMA (Sessões às terças-feiras e 1ª e 3ª quintas-feiras do mês)

    Ministro Felix Fischer (Presidente)Ministro Jorge MussiMinistro Gurgel de Faria Ministro Reynaldo Soares da FonsecaMinistro Ribeiro Dantas

    SEXTA TURMA (Sessões às terças-feiras e 1ª e 3ª quintas-feiras do mês)

    Ministro Rogerio Schietti Cruz (Presidente)Ministra Maria Th ereza de Assis Moura Ministro Sebastião Reis JúniorMinistro Nefi CordeiroMinistro Ericson Maranho ***

    *** Desembargador convocado (TJ-SP)

  • COMISSÕES PERMANENTES

    COMISSÃO DE COORDENAÇÃO

    Ministro Marco Buzzi (Presidente)Ministra Regina Helena Costa Ministro Gurgel de Faria Ministro Nefi Cordeiro (Suplente)

    COMISSÃO DE DOCUMENTAÇÃO

    Ministro Jorge Mussi (Presidente)Ministro Raul AraújoMinistro Villas Bôas CuevaMinistro Moura Ribeiro (Suplente)

    COMISSÃO DE REGIMENTO INTERNO

    Ministro Luis Felipe Salomão (Presidente)Ministro Benedito GonçalvesMinistro Marco Aurélio BellizzeMinistro Jorge Mussi (Suplente)

    COMISSÃO DE JURISPRUDÊNCIA

    Ministra Maria Th ereza de Assis Moura (Presidente)Ministro Mauro Campbell MarquesMinistra Isabel GallottiMinistro Antonio Carlos FerreiraMinistro Sebastião Reis JúniorMinistro Sérgio Kukina

  • MEMBROS DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL

    Ministra Maria Th ereza de Assis Moura (Corregedora-Geral)Ministro Herman Benjamin (Efetivo)Ministro Napoleão Nunes Maia Filho (1º Substituto)Ministro Jorge Mussi (2º Substituto)

    CONSELHO DA JUSTIÇA FEDERAL (Sessão à 1ª sexta-feira do mês)

    Ministro Francisco Falcão (Presidente)Ministra Laurita Vaz (Vice-Presidente)Ministro Og Fernandes (Corregedor-Geral da Justiça Federal)

    Membros EfetivosMinistro Mauro Campbell MarquesMinistro Benedito GonçalvesDesembargador Federal Cândido Artur M. Ribeiro Filho (TRF 1ª Região)Desembargador Federal Poul Erik Dyrlund (TRF 2ª Região)Desembargador Federal Fábio Prieto de Souza (TRF 3ª Região)Desembargador Federal Luiz Fernando Wowk Penteado (TRF 4ª Região)Desembargador Federal Rogério de Meneses Fialho Moreira (TRF 5ª Região)

    Membros SuplentesMinistro Raul AraújoMinistro Paulo de Tarso SanseverinoMinistra Isabel GallottiDesembargadora Federal Neuza Maria A. da Silva (TRF 1ª Região)Desembargador Federal Reis Friede (TRF 2ª Região)Desembargadora Federal Cecília Maria Piedra Marcondes (TRF 3ª Região)Desembargador Federal Carlos Eduardo Th ompson Flores Lenz (TRF 4ª Região)Desembargador Federal Francisco Roberto Machado (TRF 5ª Região)

  • SUMÁRIO

    RSTJ N. 239 - TOMO 1

    APRESENTAÇÃO ..................................................................................................................................................21

    JURISPRUDÊNCIA E COMENTÁRIOS

    1. Responsabilidade Civil Ambiental, Princípio do Poluidor-Pagador, Princípio daReparação Integral, Princípio da Melhoria da Qualidade Ambiental e Princípio inDubio pro Natura .........................................................................................................23

    1.1. Cumulação de Obrigação de Fazer, Não Fazer e de Indenizar ..................25REsp 1.198.727-MG (Rel. Min. Herman Benjamin) ...........................25Comentário de Patryck de Araujo Ayala, Eveline de MagalhãesWerner Rodrigues e Paula Galbiatti Silveira.............................................41REsp 1.307.938-GO (Rel. Min. Benedito Gonçalves) .........................51Comentário de José Rubens Morato Leite e Marina Demaria Venâncio ....69

    1.2. Dano Ambiental Moral Coletivo ...............................................................74REsp 1.269.494-MG (Rel. Min. Eliana Calmon) .................................74Comentário de José Rubens Morato Leite e Marina Demaria Venâncio ....87REsp 1.367.923-RJ (Rel. Min. Humberto Martins) .............................95Comentário de José Rubens Morato Leite e Marina Demaria Venâncio ..108REsp 1.410.698-MG (Rel. Min. Humberto Martins) ........................118Comentário de Vanêsca Buzelato Prestes ...............................................125

    1.3. Confl ito entre o Interesse Público e o Particular .....................................131AgRg na SLS 1.071-SC (Rel. Min. Cesar Asfor Rocha,Presidente do STJ) ..............................................................................131Comentário de Ingo Wolfgang Sarlet e Tiago Fensterseifer .....................149AgRg na SLS 1.419-DF (Rel. Min. João Otávio de Noronha) ...........155Comentário de Álvaro Luiz Valery Mirra .............................................165

  • 1.4. Sentença Incerta e Ausência de Detalhamento das Medidas naObrigação de Fazer ...............................................................................179

    AgRg no REsp 1.121.233-SP (Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima) ......179Comentário de Kamila Guimarães de Moraes ........................................184

    1.5. Prescrição .................................................................................................192AgRg no REsp 1.204.607-SC (Rel. Min. Cesar Asfor Rocha) ...........192Comentário de Fernanda Menna Pinto Peres ........................................204REsp 1.120.117-AC (Rel. Min. Eliana Calmon) ................................215Comentário de Eliane Cristina Pinto Moreira ......................................236REsp 1.223.092-SC (Rel. Min. Castro Meira) ...................................246Comentário de Lidia Helena Ferreira da Costa Passos ...........................265

    1.6. Solidariedade ...........................................................................................271AgRg no REsp 1.001.780-PR (Rel. Min. Teori Albino Zavascki) ........271Comentário de Fernando Reverendo Vidal Akaoui ................................279REsp 604.725-PR (Rel. Min. Castro Meira) ......................................285Comentário de Th aís Emília de Sousa Viegas ........................................300REsp 647.493-SC (Rel. Min. João Otávio de Noronha) .....................306Comentário de Patrícia Faga Iglecias Lemos .........................................332REsp 771.619-RR (Rel. Min. Denise Arruda) ....................................339Comentário de Délton Winter de Carvalho ...........................................346REsp 880.160-RJ (Rel. Min. Mauro Campbell Marques) ..................353Comentário de Raul Silva Telles do Valle ..............................................358

    1.7. Obrigações Propter Rem ............................................................................362REsp 1.090.968-SP (Rel. Min. Luiz Fux) ...........................................362Comentário de Oscar Graça Couto ........................................................395

    1.8. Indenização por Dano Ambiental, Compensação Ambiental e Bis in Idem ................................................................................................. 403

    REsp 896.863-DF (Rel. Min. Castro Meira) ......................................403Comentário de Jarbas Soares Júnior e Carlos Eduardo Ferreira Pinto .......416

    2. Mínimo Existencial e Meio Ambiente ..................................................................425REsp 1.366.331-RS (Rel. Min. Humberto Martins) ..........................427Comentário de Leonardo Castro Maia ..................................................446

  • 3. Poluição Sonora .....................................................................................................453REsp 791.653-RS (Rel. Min. José Delgado) .......................................455Comentário de José Rubens Morato Leite e Paula Galbiatti Silveira ......462REsp 1.051.306-MG (Rel. Min. Herman Benjamin) .........................470Comentário de Sílvia Cappelli .............................................................487

    4. Unidade de Conservação .......................................................................................4954.1. Plano de Manejo e Gestão .......................................................................497

    REsp 1.163.524-SC (Rel. Min. Humberto Martins) ..........................497Comentário de Ana Maria Moreira Marchesan ....................................505

    4.2. Deveres do Estado ...................................................................................512REsp 1.071.741-SP (Rel. Min. Herman Benjamin) ...........................512Comentário de Germana Parente Neiva Belchior e João LuisNogueira Matias ...................................................................................548

    4.3. Área de Proteção Integral ........................................................................556RMS 20.281-MT (Rel. Min. José Delgado) .......................................556Comentário de Elton M. C. Leme .........................................................580

    RSTJ N. 239 - TOMO 2

    JURISPRUDÊNCIA E COMENTÁRIOS

    5. Patrimônio Histórico, Cultural e Artístico.............................................................587

    5.1. Comunidade Remanescente de Quilombos .............................................589REsp 931.060-RJ (Rel. Min. Benedito Gonçalves) .............................589Comentário de Zenildo Bodnar ............................................................651

    5.2. Tombamento ............................................................................................657REsp 808.708-RJ (Rel. Min. Herman Benjamin) ...............................657Comentário de Carlos Magno de Souza Paiva ......................................676REsp 840.918-DF (Rel. Min. Herman Benjamin) .............................683Comentário de Carlos Magno de Souza Paiva ......................................714REsp 1.098.640-MG (Rel. Min. Humberto Martins) ........................721Comentário de Francisco Humberto Cunha Filho eInês Virgínia Prado Soares ....................................................................730

  • REsp 1.293.608-PE (Rel. Min. Herman Benjamin) ...........................737Comentário de Carlos Magno de Souza Paiva .......................................747

    6. Processo Civil Ambiental .......................................................................................7536.1. Ação Civil Pública ...................................................................................755

    REsp 497.447-MT (Rel. Min. José Delgado) .....................................755Comentário de Álvaro Luiz Valery Mirra .............................................764REsp 570.194-RS (Rel. Min. Denise Arruda) ....................................772Comentário de Fernanda Dalla Libera Damacena ................................788REsp 605.323-MG (Rel. Min. Teori Albino Zavascki) .......................800Comentário de Annelise Monteiro Steigleder ........................................816REsp 726.543-SP (Rel. Min. Francisco Falcão) ..................................831Comentário de Melissa Ely Melo .........................................................836REsp 801.005-SP (Rel. Min. Teori Albino Zavascki) ........................... 842Comentário de Hugo Nigro Mazzilli ....................................................846REsp 826.409-PB (Rel. Min. Francisco Falcão) .................................852Comentário de Mario Jose Gisi ............................................................855REsp 884.150-MT (Rel. Min. Luiz Fux)............................................861Comentário de Rodolfo de Camargo Mancuso .......................................867REsp 1.188.001-SP (Rel. Min. Cesar Asfor Rocha) ...........................873Comentário de Ingo Wolfgang Sarlet e Tiago Fensterseifer .....................885

    6.2. Ação Popular ...........................................................................................890AgRg no REsp 1.151.540-SP (Rel. Min. Benedito Gonçalves) ..........890Comentário de Melissa Ely Melo e Paula Galbiatti Silveira ..................896

    6.3. Legitimação para Agir .............................................................................902REsp 265.300-MG (Rel. Min. Humberto Martins) ...........................902Comentário de Marcelo Abelha Rodrigues.............................................908REsp 440.002-SE (Rel. Min. Teori Albino Zavascki) ..........................921Comentário de Eliziana da Silveira Perez ............................................928REsp 876.931-RJ (Rel. Min. Mauro Campbell Marques) ..................937Comentário de Inês Virgínia Prado Soares e Francisco Humberto Cunha Filho ..........................................................940REsp 876.936-RJ (Rel. Min. Luiz Fux) ..............................................948Comentário de Tiago Fensterseifer ........................................................959

  • 6.4. Competência ............................................................................................965AR 756-PR (Rel. Min. Teori Albino Zavascki) ...................................965Comentário de Heline Sivini Ferreira e Andréia Mendonça Agostini .....989CC 39.111-RJ (Rel. Min. Luiz Fux) ...................................................997Comentário de Marcelo Abelha Rodrigues...........................................1008CC 90.722-BA (Rel. Min. Teori Albino Zavascki) ............................1023Comentário de Cândido Alfredo Silva Leal Júnior ..............................1037CC 102.158-RS (Rel. Min. Teori Albino Zavascki) ...........................1046Comentário de Patricia Antunes Laydner ...........................................1051REsp 1.100.698-PR (Rel. Min. Francisco Falcão) ............................1057Comentário de Zenildo Bodnar ...........................................................1068

    6.5. Denunciação da Lide .............................................................................1072REsp 67.285-SP (Rel. Min. Castro Meira) .......................................1072Comentário de Ney de Barros Bello Filho ...........................................1080

    6.6. Litisconsórcio Necessário ......................................................................1087REsp 1.383.707-SC (Rel. Min. Sérgio Kukina) ................................1087Comentário de Ana Maria de Oliveira Nusdeo ....................................1102

    6.7. Interesse de Agir ....................................................................................1107AgRg no AREsp 477.346-PR (Rel. Min. Og Fernandes) ................1107Comentário de Natália Jodas ..............................................................1114AgRg no REsp 1.312.668-PB (Rel. Min. Benedito Gonçalves) .......1120Comentário de Márcia Dieguez Leuzinger .........................................1125AgRg no REsp 1.396.306-PE (Rel. Min. Mauro Campbell Marques) 1132Comentário de Ximena Cardozo Ferreira ...........................................1137

    6.8. Inversão do Ônus da Prova ....................................................................1141REsp 883.656-RS (Rel. Min. Herman Benjamin) ............................1141Comentário de Luiz Guilherme Marinoni ..........................................1158REsp 972.902-RS (Rel. Min. Eliana Calmon) ..................................1162Comentário de Annelise Monteiro Steigleder, Ana Maria Moreira Marchesan e Silvia Cappelli .................................................................1169REsp 1.049.822-RS (Rel. Min. Francisco Falcão) ............................1177Comentário de Danielle de Andrade Moreira ......................................1202

  • REsp 1.060.753-SP (Rel. Min. Eliana Calmon) ...............................1225Comentário de Cristiane Derani ........................................................1234

    6.9. Provimentos Cautelares ........................................................................1241MC 2.136-SC (Rel. Min. José Delgado) ...........................................1241Comentário de Kleber Isaac Silva de Souza .........................................1251

    MC 15.918-SP (Rel. Min. Humberto Martins) ...............................1261Comentário de Hugo Nigro Mazzilli ..................................................1273

    6.10. Julgamento Ultra ou Extra Petita .........................................................1277

    REsp 1.107.219-SP (Rel. Min. Luiz Fux) .........................................1277Comentário de Pery Saraiva Neto .......................................................1288

    ÍNDICE ANALÍTICO .........................................................................................................................................1297

    ÍNDICE SISTEMÁTICO ....................................................................................................................................1317

    SIGLAS E ABREVIATURAS ...........................................................................................................................1323

    REPOSITÓRIOS AUTORIZADOS E CREDENCIADOS PELO

    SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA ..........................................................................................................1329

  • APRESENTAÇÃO

    Pela primeira vez, a Revista do Superior Tribunal de Justiça publica coletâneas temáticas e comentadas de sua jurisprudência. São vários volumes e tomos dedicados ao Direito Ambiental, representando o labor da Primeira Seção (Direito Público) da Corte, e ao Direito do Consumidor, matéria própria da Segunda Seção (Direito Privado).

    Tal inovação busca atender demanda crescente de especialização, de sistematização e de aprofundada análise doutrinária dos julgados do STJ em ramos do Direito que, embora jovens, têm presença marcante na prática judicial cotidiana da litigiosidade brasileira.

    Os Volumes 237, 238 e 239, Tomos 1 e 2, trazem as principais decisões ambientais da Primeira Seção, desde 2000, cada uma comentada por renomado jurista da área. Não foi fácil selecioná-las, sobretudo diante do número impressionante de julgados do STJ nos diversos domínios da proteção do meio ambiente, urbanismo, patrimônio histórico-cultural e saúde das pessoas. Flora, fauna, água, poluição industrial e sonora, áreas protegidas, mineração, desapropriação direta e indireta, licenciamento, responsabilidade civil, direito adquirido, sanções administrativas, confl ito intertemporal de normas, entre tantos outros temas, praticamente nada fi ca de fora do crivo do STJ. Além, claro, dos aspectos principiológicos (mínimo existencial, princípios da prevenção, da precaução, da função ecológica da propriedade, da reparação in integrum, poluidor-pagador, in dubio pro Natura, obrigação propter rem etc.) e processuais da matéria, notadamente naquilo que diz respeito à ação civil pública e à popular.

    Não foi à toa que os volumes iniciais desta série histórica especializada começaram pelo Direito Ambiental, uma das disciplinas jurídicas que, entre nós, mais se desenvolveram nas últimas décadas, seja pelo surgimento de entidades acadêmicas, como o Instituto “O Direito por um Planeta Verde” e a Aprodab – Associação dos Professores de Direito Ambiental do Brasil, seja por formar centenas de especialistas, mestres e doutores, seja ainda pela produção doutrinária de altíssimo quilate, espelhada em manuais e tratados, bem como em consagrados periódicos, como a Revista de Direito Ambiental (a primeira da América Latina).

    Doutrina e docência, entretanto, pouco signifi cam sem prática judicial robusta e constante. Essa talvez a grande diferença entre o Direito Ambiental brasileiro e o de tantos outros países, onde não passa de aspiração teórica, com pouca ou nenhuma repercussão no dia a dia dos tribunais e das pessoas.

    Nisso reside a expressividade e a riqueza da jurisprudência do STJ, nessa coletânea retratada pela obra dos Ministros que compõem sua Primeira Seção, embora a Segunda e Terceira Seções também possuam magnífi cos precedentes ambientais no âmbito de sua competência (Direito Privado e Direito Penal, respectivamente). Quem compulsar qualquer dos tomos da obra se deparará com julgados dotados de articulação teórica original e sofi sticada, o que põe o STJ na linha de frente da jurisprudência ambiental mais progressista, técnica e numerosa do mundo. Não apenas mera constatação numérica, contudo, tal resultado refl ete a grande sensibilidade social e o amplo saber jurídico dos Ministros de hoje e de ontem. Por conta dessa elaboração jurisprudencial massiva e de qualidade, podem ser eles considerados os mais infl uentes “obreiros” do Direito Ambiental brasileiro.

  • Por isso mesmo, além da fi nalidade informativa e de divulgação, a coletânea, nem poderia ser diferente, denota merecida homenagem que a Revista presta aos Ministros de ontem e de hoje da Primeira Seção do STJ, reconhecimento do seu compromisso coletivo com o admirável projeto político-jurídico, mas igualmente ético-ecológico, de Nação, estampado na Constituição de 1988.

    Não se deve esquecer, no entanto, que os julgados do STJ espelham a própria maturidade, preparo e excelência dos juízes de primeiro grau, assim como dos Desembargadores dos Tribunais de Justiça e dos Tribunais Regionais Federais. Muito do mérito dos acórdãos que ora se publicam deve-se a esses artífi ces devotados do Direito Ambiental, os quais, com sucesso, souberam tirar a disciplina dos livros de leis e doutrina, ou mesmo do mundo das hipóteses (law in the books), e dar-lhe visibilidade e efetividade, no mundo dos fatos (law in action).

    Muito além disso, ou seja, julgar bem, observa-se, nas Justiças federal e estadual, processo de especialização judicial, com criação de Varas Ambientais e até mesmo com o estabelecimento, no Tribunal de Justiça de São Paulo, de duas Câmaras com competência exclusiva para essa modalidade de litígio, fato esse notável em si mesmo. À especialização do Ministério Público brasileiro, a quem se imputa muito dos avanços e sucesso do nosso Direito Ambiental, segue-se, pois, a especialização da própria jurisdição, o que certamente terá impactos em outras instituições, como a Advocacia-Geral da União, as Procuradorias federais, estaduais e municipais e a Defensoria Pública, na linha do que prega o IBAP – Instituto Brasileiro de Advocacia Pública.

    O cuidado aqui é louvar o progresso inequívoco, como refl etido na jurisprudência que agora se leva a lume, sem olvidar que muito ainda há por fazer. Evidente que não basta contar com juízes independentes e atentos à dimensão épica da crise ambiental que assola o mundo e, de maneira particular, o Brasil. Não iremos muito longe no enfrentamento da acelerada degradação da biota, convulsão no sistema climático da Terra, contaminação das pessoas e erosão da biodiversidade sem órgãos ambientais fortes, íntegros e competentes, sem sociedade civil organizada apta a se manifestar, protestar e exigir, sem empresários conscientes de suas responsabilidades para com as gerações futuras e o Planeta.

    Em síntese, ao reconhecer que a presente coletânea é realmente eloquente exemplo de que nossos juízes estão atentos à crise planetária, inserida de maneira central em todos os debates jurídicos da atualidade, devemos, por igual, referir à existência de incontáveis boas práticas ambientais por este País afora. A esperança maior reside aí, na transformação ética e cultural, por meio da educação, de um povo que avança na direção de uma genuína ecocivilização.

    Finalmente, agradeço, em nome da Revista, aos Professores José Rubens Morato Leite e Sílvia Cappelli, aclamados juristas da matéria e co-organizadores da obra, assim como aos 97 especialistas-colaboradores que emprestaram seu vasto conhecimento ao comentário dos acórdãos selecionados. Destaco, ainda, o trabalho incansável e esmerado zelo da pequeníssima equipe do Gabinete da Revista, tão bem chefi ado pela Drª Andrea Costa.

    Ministro Diretor da Revista Antonio Herman Benjamin

  • 1. Responsabilidade Civil Ambiental, Princípio do Poluidor-Pagador, Princípio da

    Reparação Integral, Princípio da Melhoria da Qualidade Ambiental e

    Princípio in Dubio pro Natura

  • 1.1. Cumulação de Obrigação de Fazer, Não Fazer e de Indenizar

    RECURSO ESPECIAL N. 1.198.727-MG (2010/0111349-9)

    Relator: Ministro Herman BenjaminRecorrente: Ministério Público do Estado de Minas GeraisRecorrido: Pedro Paulo PereiraAdvogado: Sem representação nos autos

    EMENTA

    Administrativo. Ambiental. Ação civil pública. Desmatamento de vegetação nativa (Cerrado) sem autorização da autoridade ambiental. Danos causados à Biota. Interpretação dos arts. 4º, VII, e 14, § 1º, da Lei n. 6.938/1981, e do art. 3º da Lei n. 7.347/1985. Princípios da reparação integral, do poluidor-pagador e do usuário-pagador. Possibilidade de cumulação de obrigação de fazer (reparação da área degradada) e de pagar quantia certa (indenização). Reduction ad pristinum statum. Dano ambiental intermediário, residual e moral coletivo. Art. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil. Interpretação in dubio pro natura da norma ambiental.

    1. Cuidam os autos de ação civil pública proposta com o fi to de obter responsabilização por danos ambientais causados pelo desmatamento de vegetação nativa (Cerrado). O juiz de primeiro grau e o Tribunal de Justiça de Minas Gerais consideraram provado o dano ambiental e condenaram o réu a repará-lo; porém, julgaram improcedente o pedido indenizatório pelo dano ecológico pretérito e residual.

    2. A legislação de amparo dos sujeitos vulneráveis e dos interesses difusos e coletivos deve ser interpretada da maneira que lhes seja mais favorável e melhor possa viabilizar, no plano da efi cácia, a prestação

  • REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

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    jurisdicional e a ratio essendi da norma. A hermenêutica jurídico-ambiental rege-se pelo princípio in dubio pro natura.

    3. Ao responsabilizar-se civilmente o infrator ambiental, não se deve confundir prioridade da recuperação in natura do bem degradado com impossibilidade de cumulação simultânea dos deveres de repristinação natural (obrigação de fazer), compensação ambiental e indenização em dinheiro (obrigação de dar), e abstenção de uso e de nova lesão (obrigação de não fazer).

    4. De acordo com a tradição do Direito brasileiro, imputar responsabilidade civil ao agente causador de degradação ambiental difere de fazê-lo administrativa ou penalmente. Logo, eventual absolvição no processo criminal ou perante a Administração Pública não infl ui, como regra, na responsabilização civil, tirantes as exceções em numerus clausus do sistema legal, como a inequívoca negativa do fato ilícito (não ocorrência de degradação ambiental, p. ex.) ou da autoria (direta ou indireta), nos termos do art. 935 do Código Civil.

    5. Nas demandas ambientais, por força dos princípios do poluidor-pagador e da reparação in integrum, admite-se a condenação do réu, simultânea e agregadamente, em obrigação de fazer, não fazer e indenizar. Aí se encontra típica obrigação cumulativa ou conjuntiva. Assim, na interpretação dos arts. 4º, VII, e 14, § 1º, da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei n. 6.938/1981), e do art. 3º da Lei n. 7.347/1985, a conjunção “ou” opera com valor aditivo, não introduz alternativa excludente. Essa posição jurisprudencial leva em conta que o dano ambiental é multifacetário (ética, temporal, ecológica e patrimonialmente falando, sensível ainda à diversidade do vasto universo de vítimas, que vão do indivíduo isolado à coletividade, às gerações futuras e aos próprios processos ecológicos em si mesmos considerados).

    6. Se o bem ambiental lesado for imediata e completamente restaurado ao status quo ante (reductio ad pristinum statum, isto é, restabelecimento à condição original), não há falar, ordinariamente, em indenização. Contudo, a possibilidade técnica, no futuro (= prestação jurisdicional prospectiva), de restauração in natura nem sempre se mostra sufi ciente para reverter ou recompor integralmente, no terreno da responsabilidade civil, as várias dimensões do dano ambiental

  • Responsabilidade Civil Ambiental, Princípio do Poluidor-Pagador, Princípio da Reparação Integral,

    Princípio da Melhoria da Qualidade Ambiental e Princípio in Dubio pro Natura

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    causado; por isso não exaure os deveres associados aos princípios do poluidor-pagador e da reparação in integrum.

    7. A recusa de aplicação ou aplicação parcial dos princípios do poluidor-pagador e da reparação in integrum arrisca projetar, moral e socialmente, a nociva impressão de que o ilícito ambiental compensa. Daí a resposta administrativa e judicial não passar de aceitável e gerenciável “risco ou custo do negócio”, acarretando o enfraquecimento do caráter dissuasório da proteção legal, verdadeiro estímulo para que outros, inspirados no exemplo de impunidade de fato, mesmo que não de direito, do infrator premiado, imitem ou repitam seu comportamento deletério.

    8. A responsabilidade civil ambiental deve ser compreendida o mais amplamente possível, de modo que a condenação a recuperar a área prejudicada não exclua o dever de indenizar – juízos retrospectivo e prospectivo.

    9. A cumulação de obrigação de fazer, não fazer e pagar não confi gura bis in idem, porquanto a indenização, em vez de considerar lesão específi ca já ecologicamente restaurada ou a ser restaurada, põe o foco em parcela do dano que, embora causada pelo mesmo comportamento pretérito do agente, apresenta efeitos deletérios de cunho futuro, irreparável ou intangível.

    10. Essa degradação transitória, remanescente ou refl exa do meio ambiente inclui: a) o prejuízo ecológico que medeia, temporalmente, o instante da ação ou omissão danosa e o pleno restabelecimento ou recomposição da biota, vale dizer, o hiato passadiço de deterioração, total ou parcial, na fruição do bem de uso comum do povo (= dano interino ou intermediário), algo frequente na hipótese, p. ex., em que o comando judicial, restritivamente, se satisfaz com a exclusiva regeneração natural e a perder de vista da fl ora ilegalmente suprimida, b) a ruína ambiental que subsista ou perdure, não obstante todos os esforços de restauração (= dano residual ou permanente), e c) o dano moral coletivo. Também deve ser reembolsado ao patrimônio público e à coletividade o proveito econômico do agente com a atividade ou empreendimento degradador, a mais-valia ecológica ilícita que auferiu (p. ex., madeira ou minério retirados irregularmente da área degradada ou benefício com seu uso espúrio para fi m agrossilvopastoril, turístico, comercial).

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    11. No âmbito específi co da responsabilidade civil do agente por desmatamento ilegal, irrelevante se a vegetação nativa lesada integra, ou não, Área de Preservação Permanente, Reserva Legal ou Unidade de Conservação, porquanto, com o dever de reparar o dano causado, o que se salvaguarda não é a localização ou topografi a do bem ambiental, mas a fl ora brasileira em si mesma, decorrência dos excepcionais e insubstituíveis serviços ecológicos que presta à vida planetária, em todos os seus matizes.

    12. De acordo com o Código Florestal brasileiro (tanto o de 1965, como o atual, a Lei n. 12.651, de 25.5.2012) e a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei n. 6.938/1981), a fl ora nativa, no caso de supressão, encontra-se uniformemente protegida pela exigência de prévia e válida autorização do órgão ambiental competente, qualquer que seja o seu bioma, localização, tipologia ou estado de conservação (primária ou secundária).

    13. A jurisprudência do STJ está firmada no sentido da viabilidade, no âmbito da Lei n. 7.347/1985 e da Lei n. 6.938/1981, de cumulação de obrigações de fazer, de não fazer e de indenizar (REsp n. 1.145.083-MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 4.9.2012; REsp n. 1.178.294-MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 10.9.2010; AgRg nos EDcl no Ag n. 1.156.486-PR, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 27.4.2011; REsp n. 1.120.117-AC, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 19.11.2009; REsp n. 1.090.968-SP, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 3.8.2010; REsp n. 605.323-MG, Rel. Ministro José Delgado, Rel. p/ Acórdão Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJ 17.10.2005; REsp n. 625.249-PR, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJ 31.8.2006, entre outros).

    14. Recurso especial parcialmente provido para reconhecer a possibilidade, em tese, de cumulação de indenização pecuniária com as obrigações de fazer e não fazer voltadas à recomposição in natura do bem lesado, devolvendo-se os autos ao Tribunal de origem para que verifi que se, na hipótese, há dano indenizável e fi xe eventual quantum debeatur.

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    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça: “A Turma, por unanimidade, deu parcial provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator, sem destaque e em bloco.” Os Srs. Ministros Mauro Campbell Marques, Cesar Asfor Rocha, Castro Meira e Humberto Martins votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Brasília (DF), 14 de agosto de 2012 (data do julgamento).Ministro Herman Benjamin, Relator

    RELATÓRIO

    O Sr. Ministro Herman Benjamin: Trata-se na origem de Ação Civil Pública movida contra particular em razão de desmatamento não autorizado de vegetação nativa (cerrado). A sentença de procedência parcial foi mantida pelo Tribunal a quo nos termos de acórdão assim ementado:

    Apelação cível. Ação civil pública. Desmatamento em área de preservação ambiental permanente. Processo de reflorestamento natural. Obrigação indenizatória. A indenização é cabível quando os danos verificados forem insuscetíveis de recomposição in natura. Se o escopo da lei é a reparação do dano ambiental, e no caso dos autos a sua restauração se mostrou possível, é esta a providência ideal a ser determinada, pois por meio dela será atingido o interesse indispensável e indisponível da sociedade em ter um meio ambiente ecologicamente equilibrado, o que, indiscutivelmente, não se pode substituir por pecúnia. O aspecto repressivo deve fi car a cargo da autoridade administrativa, na forma da lei. Recurso conhecido e desprovido (e-STJ fl . 75).

    Os Embargos de Declaração opostos pelo ora recorrente foram rejeitados (fl . 96).

    O Ministério Público do Estado de Minas Gerais afirma ter havido ofensa ao art. 535 do Código de Processo Civil; aos arts. 2º, 3º, 4º e 14 da Lei n. 6.938/1981. Sustenta, em suma, que: a) o Tribunal de Justiça deveria ter-se manifestado sobre “o fato de que não é apenas a agressão à natureza que deve ser objeto de reparação, mas a privação, imposta à coletividade, o equilíbrio ecológico, do bem estar e da qualidade de vida que o recurso ambiental proporciona”; e b) “o acórdão não levou em conta o ato de que a obrigação de

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    fazer determinada na sentença – de abster-se de efetuar qualquer intervenção na área degradada, salvo aquelas referentes à sua manutenção e cuidados, além de proceder à averbação da reserva legal – pode ter efeito na situação atual e futura da área, mas não no que se refere ao dano pretérito, que pode ser inclusive arbitrado pelo julgador ou apurado em fase de liquidação” (fl . 110-STJ).

    O recurso subiu ao STJ por força do provimento do Agravo de Instrumento da decisão que o inadmitira.

    Instado a se manifestar, o Ministério Público Federal, na função de custos legis, opinou pelo conhecimento do recurso e, no mérito, pelo seu provimento em parecer que recebeu a seguinte ementa:

    Recurso especial. Ação civil pública. Tutela do meio ambiente. Cumulação de pedidos na ação civil pública. Recomposição do patrimônio ambiental lesado e condenação pecuniária. Possibilidade.

    I - Comprovada a degradação ambiental, impõe-se sua integral reconstituição, promovendo-se a completa recomposição do ecossistema lesado, ou seja, o princípio que rege as condenações por lesões ao meio ambiente é o da máxima reparação do dano, traduzindo-se na ausência de limites para a recomposição do bem degradado, de modo a assegurar o restabelecimento ao status quo ante.

    II - A interpretação sistemática das normas que integram o elenco constitucional de proteção ao meio ambiente permite a cumulação de pedidos em ação civil pública ambiental, visando o cumprimento da máxima reparação do dano. Precedentes do STJ.

    III - Parecer pelo conhecimento e provimento do recurso (e-STJ, fl . 174, grifo no original).

    É o relatório.

    VOTO

    O Sr. Ministro Herman Benjamin (Relator): Cinge-se a controvérsia à discussão em torno da possibilidade de cumulação de condenação à reparação pecuniária com obrigação de fazer consistente na recomposição in natura do meio ambiente degradado.

    O Tribunal de Justiça de Minas Gerais, mantendo o julgado de primeiro grau, entendeu que “a indenização é cabível (somente) quanto aos danos insuscetíveis de recomposição in natura, sendo que o aspecto repressor fi cará a cargo da aplicação da penalidade cabível pela administração” (fl . 80-STJ).

    O decisum merece reforma.

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    Princípio da Melhoria da Qualidade Ambiental e Princípio in Dubio pro Natura

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    1. Evolução da jurisprudência restritiva do Tribunal de Justiça de Minas Gerais

    Não são poucos os processos que têm chegado ao STJ em Recurso Especial em que o Tribunal de Justiça de Minas Gerais confere interpretação restritiva aos arts. 4º e 14, § 1º, da Lei n. 6.938/1981, e à própria Lei da Ação Civil Pública.

    Na origem dessa corrente jurisprudencial mineira, rejeitada pelo STJ, está precedente da lavra do eminente Desembargador Jarbas Ladeira, julgado em 2006, nos seguintes termos:

    (...) a pena aplicada ao causador de dano ao meio ambiente será de reparação ou de indenização do dano ocasionado. Nessa mesma esteira se posiciona Edis Milaré, coordenador da obra Ação Civil Pública, 2ª edição, Revista dos Tribunais, a saber: “Apenas quando a reconstituição não seja viável - fática ou tecnicamente - é que se admite a indenização em dinheiro. Essa - a reparação econômica - é, portanto, forma indireta de sanar a lesão” (Apelação Cível n. 1.0400.02.006262-8/001, j. em 3.10.2006, publicada em 20.10.2006).

    2. Princípios do poluidor-pagador, do usuário-pagador e da reparação in integrum: possibilidade de condenação, cumulativa e simultânea, em obrigações de fazer, não fazer e indenizar

    Vigora em nosso sistema jurídico o princípio da reparação integral ou in integrum do dano ambiental, irmão siamês do princípio do poluidor-pagador, a determinar a responsabilização por todos os efeitos decorrentes da conduta lesiva, incluindo, entre outros aspectos, o prejuízo suportado pela sociedade, até que haja completa e absoluta recuperação in natura do bem lesado.

    Na linha do estatuído nos arts. 225, 170, inciso VI, e 186, II, da Constituição Federal, o art. 4º da Lei n. 6.938/1981 (grifei) dispõe que a Política Nacional do Meio Ambiente se norteará pelos princípios do poluidor-pagador, do usuário-pagador e da reparação in integrum, concretizados por meio da obrigação de recuperar o dano ambiental; indenizar os prejuízos sofridos pelas vítimas e pela biota afetada; e pagar pelos serviços ambientais retirados da Natureza:

    VII - à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fi ns econômicos.

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    Por sua vez, o art. 14, § 1º, da referida lei estabelece a responsabilidade objetiva do poluidor da seguinte forma (grifei):

    Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.

    Convém, inicialmente, frisar que, ao contrário do que insinua o acórdão recorrido, os deveres de indenização e recuperação ambientais não são “pena”, mas providências ressarcitórias de natureza civil que buscam, simultânea e complementarmente, a restauração do status quo ante da biota afetada e a reversão à coletividade dos benefícios econômicos auferidos com a utilização ilegal e individual de bem supraindividual salvaguardado, que, nos termos do art. 225 da Constituição, é “de uso comum do povo”.

    Nessa esteira, acrescente-se que, de acordo com a tradição do Direito brasileiro, imputar responsabilidade civil ao agente causador de degradação ambiental difere de fazê-lo administrativa ou penalmente. Logo, eventual absolvição no processo criminal ou perante a Administração Pública não infl ui, como regra, na responsabilização civil, tirantes as exceções em numerus clausus do sistema legal, como a inequívoca negativa do fato ilícito (não ocorrência de degradação ambiental, p. ex.) ou da autoria (direta ou indireta), conforme previsão do art. 935 do Código Civil.

    A interpretação sistemática das normas e princípios ambientais não agasalha a restrição imposta no acórdão recorrido. Se o bem ambiental lesado for imediata e completamente restaurado ao status quo ante (reductio ad pristinum statum, isto é, restabelecimento à condição original)), não há falar, como regra, em indenização. Contudo, a possibilidade técnica, no futuro (= prestação jurisdicional prospectiva), de restauração in natura nem sempre se mostra sufi ciente para reverter ou recompor integralmente, no terreno da responsabilidade civil, as várias dimensões do dano ambiental causado; por isso não exaure os deveres associados aos princípios do poluidor-pagador e da reparação in integrum.

    Não custa lembrar que o dano ambiental é multifacetário (ética, temporal, ecológica e patrimonialmente falando, sensível ainda à diversidade do vasto universo de vítimas, que vão do indivíduo isolado à coletividade, às gerações futuras e aos próprios processos ecológicos em si mesmos considerados).

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    Em suma, equivoca-se, jurídica e metodologicamente, quem confunde prioridade da recuperação in natura do bem degradado com impossibilidade de cumulação simultânea dos deveres de repristinação natural (obrigação de fazer), compensação ambiental e indenização em dinheiro (obrigação de dar), e abstenção de uso e nova lesão (obrigação de não fazer).

    A recusa de aplicação ou aplicação parcial dos princípios do poluidor-pagador e da reparação in integrum arrisca projetar, moral e socialmente, a nociva impressão de que o ilícito ambiental compensa, daí a resposta administrativa e judicial não passar de aceitável e gerenciável “risco ou custo do negócio”, acarretando o enfraquecimento do caráter dissuasório da proteção legal, um verdadeiro estímulo para que outros, inspirados no exemplo de impunidade de fato, mesmo que não de direito, do infrator premiado, imitem ou repitam seu comportamento deletério.

    A responsabilidade civil ambiental deve ser compreendida da forma mais ampla possível, de modo que a condenação a recuperar a área prejudicada não exclua o dever de indenizar – juízos retrospectivo e prospectivo.

    A cumulação de obrigação de fazer, não fazer e pagar não confi gura bis in idem, porquanto a indenização, em vez de considerar lesão específi ca já ecologicamente restaurada ou a ser restaurada, põe o foco em parcela do dano que, embora causada pelo mesmo comportamento pretérito do agente, apresenta efeitos deletérios de cunho futuro, irreparável ou intangível.

    Essa degradação transitória, remanescente ou reflexa do meio ambiente inclui: a) o prejuízo ecológico que medeia, temporalmente, o instante da ação ou omissão danosa e o pleno restabelecimento ou recomposição da biota, vale dizer, o hiato passadiço de deterioração, total ou parcial, na fruição do bem de uso comum do povo (= dano interino ou intermediário), algo frequente na hipótese, p. ex., em que o comando judicial, restritivamente, se satisfaz com a exclusiva regeneração natural e a perder de vista da fl ora ilegalmente suprimida, b) a ruína ambiental que subsista ou perdure, não obstante todos os esforços de restauração (= dano residual ou permanente), e c) o dano moral coletivo.

    Também deve ser reembolsado ao patrimônio público e à coletividade o proveito econômico do agente com a atividade ou empreendimento degradador, a mais-valia ecológica ilícita que auferiu (p. ex., madeira ou minério retirados irregularmente da área degradada ou benefício com seu uso espúrio para fi m agrossilvopastoril, turístico, comercial).

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    Álvaro Luiz Valery Mirra, magistrado em São Paulo, leciona que o princípio da reparação integral “deve conduzir o meio ambiente e a sociedade a uma situação na medida do possível equivalente à de que seriam benefi ciários se o dano não tivesse sido causado” (Ação Civil Pública e a Reparação do Dano Ambiental, 2ª ed., São Paulo, Editora Juarez de Oliveira, 2004, fl . 314). Prossegue o autor (p. 315, grifos no original):

    Nesse sentido, a reparação integral do dano ao meio ambiente deve compreender não apenas o prejuízo causado ao bem ou recurso ambiental atingido, como também, na lição de Helita Barreira Custódio, toda a extensão dos danos produzidos em conseqüência do fato danoso, o que inclui os efeitos ecológicos e ambientais da agressão inicial a um bem ambiental corpóreo que estiverem no mesmo encadeamento causal, como, por exemplo, a destruição de espécimes, habitats, e ecossistemas inter-relacionados com o meio afetado; os denominados danos interinos, vale dizer, as perdas de qualidade ambiental havidas no interregno entre a ocorrência do prejuízo e a efetiva recomposição do meio degradado; os danos futuros que se apresentarem como certos, os danos irreversíveis à qualidade ambiental e os danos morais coletivos resultantes da agressão a determinado bem ambiental.

    Em tal panorama, a indenização vai além da sua função subsidiária (último recurso quando a reparação in natura não for total ou parcialmente possível). Nessa linha de raciocínio, cito doutrina de Annelise Monteiro Steigleder (Responsabilidade Civil Ambiental: as Dimensões do Dano Ambiental no Direito Brasileiro, Porto Alegre, Livraria do Advogado Editora, 2004, p. 236, grifei):

    A partir da compreensão de que o dano ambiental tem uma dimensão material a que se encontram associados danos extrapatrimoniais, que abarcam os danos morais coletivos, a perda pública decorrente da não fruição do bem ambiental, e a lesão ao valor de existência da natureza degradada, importa defi nir diferentes formas de reparação para cada classe de danos.

    Esclareça-se que os pedidos de condenação em obrigações de fazer e de indenização serão cumulados, inexistindo bis in idem, pois o fundamento para cada um deles é diverso. O pedido de obrigação de fazer cuida da reparação in natura do dano ecológico puro e a indenização visa a ressarcir os danos extrapatrimoniais, pelo que o reconhecimento de tais pedidos compreende as diversas facetas do dano ambiental.

    Embora o art. 3º da Lei n. 7.347/1985 disponha que “a ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer” (grifei), é certo que a conjunção “ou” contida na citada norma

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    RSTJ, a. 27, (239): 23-424, julho/setembro 2015 35

    (assim como nos arts. 4º, VII, e 14, § 1º, da Lei n. 6.938/1981) opera com valor aditivo, não introduz alternativa excludente. Vedar a cumulação desses remédios limitaria, de forma indesejada, a Ação Civil Pública, instrumento de persecução da responsabilidade civil de danos causados ao meio ambiente, por exemplo inviabilizando a condenação em dano moral coletivo.

    Hugo Nigro Mazzilli (A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo, 21ª ed., São Paulo, Saraiva, 2008, p. 140, grifei), claro e objetivo como sempre, vai diretamente ao ponto:

    (...) nada impede, entretanto, que se condene o réu a pagar indenização pelos danos já causados e, ao mesmo tempo, a cumprir uma obrigação de fazer, como pôr um fi ltro numa chaminé de fábrica, para prevenir danos futuros; ou ainda, nada impede que se condene o réu a cumprir uma obrigação de fazer e a pagar a multa fi xada na forma do art. 11 da LACP.

    Somente à primeira vista é que poderia parecer, de forma simplista, que a alternativa do art. 3º da LACP é ou a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer, jamais as duas coisas ao mesmo tempo. Não é exatamente isso o que pretende a lei.

    (...) nada impede que se condene o réu a pagar uma indenização pelo dano causado e ainda a suportar uma obrigação de fazer para serem evitados danos futuros; também pode ser condenado a refl orestar uma área ambiental danifi cada, sem prejuízo de ter de arcar com uma indenização pelo dano à coletividade, correspondente ao período de tempo em que esta terá de aguardar até que se obtenha o resultado prático do cumprimento da obrigação de fazer”.

    Acrescente-se, por oportuna, também a observação de Délton Winter de Carvalho, entendendo, em casos tais, que a causa de pedir estaria fundada também no dever de preventividade objetiva, que se associa à exigência de reparação, no seu sentido tradicional e estreito (Dano Ambiental Futuro: A Responsabilização Civil pelo Risco Ambiental, Rio de Janeiro, Forense Universitária, 2008, p. 151, grifos no original):

    A ação civil pública, tida como instrumento processual para imposição de responsabilização civil em casos de danos ambientais coletivos, prevê a possibilidade de imposição de obrigações de fazer ou não fazer (medidas preventivas) a um determinado agente. Assim, o dano ambiental futuro consiste em todos aqueles riscos ambientais que, por sua intolerabilidade, são considerados como ilícito, justifi cando a imposição de medidas preventivas.

    Não bastassem todos esses argumentos, ao juiz, diante das normas de Direito Ambiental, recheadas que são de conteúdo ético intergeracional atrelado

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    às presentes e futuras gerações, incumbe levar em conta o comando do art. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil, que dispõe que, ao aplicar a lei, deve-se atender “aos fi ns sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum”. Corolário dessa regra é a constatação de que, em caso de dúvida ou outra anomalia técnico-redacional, a norma ambiental demanda interpretação e integração de acordo com o princípio hermenêutico in dubio pro natura.

    Assim é precisamente porque, convém lembrar, toda a legislação de amparo dos sujeitos vulneráveis e dos interesses difusos e coletivos há sempre de ser compreendida da maneira que lhes seja mais proveitosa e melhor possa viabilizar, na perspectiva dos resultados práticos, a prestação jurisdicional e a ratio essendi da norma. Aqui, ensina Ricardo Lorenzetti, lastreado em precedentes da Corte Suprema argentina, o juiz, como de resto em todo o campo dos direitos fundamentais, é um garimpeiro da exegese em favor da efetividade das garantias constitucionais e legais, fugindo de interpretações que aceitem como legítimas, ou referendem, as condutas coibidas pelo legislador ou que cumpram o comando legal de modo aparente, perfunctório ou parcial, pois, a ser diferente, estará legitimando, pela via transversa, precisamente o comportamento ou dano que a norma pretendeu evitar ou reprimir (Teoria del Derecho Ambiental, Buenos Aires, La Ley, 2009, pp. 55-56).

    Advirta-se, por último, que, no âmbito específi co da responsabilidade civil do agente por desmatamento ilegal, é irrelevante se a vegetação nativa lesada integra, ou não, Área de Preservação Permanente, Reserva Legal ou Unidade de Conservação, porquanto, com o dever de reparar o dano botânico causado, o que se salvaguarda não é a localização ou topografi a do bem ambiental (= o espaço), mas a fl ora brasileira em si mesma, decorrência dos excepcionais e insubstituíveis serviços ecológicos que presta à vida planetária, em todos os seus matizes.

    Exatamente por essa razão, de acordo com o Código Florestal brasileiro (tanto o de 1965, como o atual, a Lei n. 12.651, de 25.5.2012) e a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, a fl ora nativa, na hipótese de supressão, encontra-se uniformemente protegida pela exigência de prévia e válida autorização do órgão ambiental competente, qualquer que seja o seu bioma, localização, tipologia ou estado de conservação (primária ou secundária).

    3. Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça

    A jurisprudência do STJ está fi rmada no sentido de que a necessidade de reparação integral da lesão causada ao meio ambiente permite a cumulação de

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    obrigações de fazer, não fazer e indenizar. Cito precedentes da Primeira e da Segunda Turmas:

    Ambiental. Desmatamento de mata nativa sem autorização. Queimadas. Dano reconhecido pela instância ordinária. Cumulação de obrigação de fazer (reparação da área degradada) e de pagar quantia certa (indenização). Possibilidade. Natureza propter rem. Interpretação da norma ambiental. Precedentes do STJ.

    (...)

    3. A jurisprudência do STJ está fi rmada no sentido de que a necessidade de reparação integral da lesão causada ao meio ambiente permite a cumulação de obrigações de fazer, de não fazer e de indenizar, que têm natureza propter rem. Precedentes: REsp n. 1.178.294-MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, j. 10.8.2010; REsp n. 1.115.555-MG, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, j. 15.2.2011; AgRg no REsp n. 1.170.532-MG, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, j. 24.8.2010; REsp n. 605.323-MG, Rel. p/ Acórdão Ministro Teori Albino Zavascki, j. 18.8.2005, entre outros.

    4. Recurso Especial parcialmente provido para reconhecer a possibilidade, em tese, de cumulação da indenização pecuniária com as obrigações de fazer voltadas à recomposição in natura do bem lesado, com a devolução dos autos ao Tribunal de origem para que verifi que se, na hipótese, há dano indenizável e fi xe eventual quantum debeatur (REsp n. 1.248.214-MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 13.4.2012).

    Processo Civil. Direito Ambiental. Ação civil pública para tutela do meio ambiente. Obrigações de fazer, de não fazer e de pagar quantia. Possibilidade de cumulação de pedidos art. 3º da Lei n. 7.347/1985. Interpretação sistemática. Art. 225, § 3º, da CF/1988, arts. 2º e 4º da Lei n. 6.938/1981, art. 25, IV, da Lei n. 8.625/1993 e art. 83 do CDC. Princípios da prevenção, do poluidor-pagador e da reparação integral.

    1. O sistema jurídico de proteção ao meio ambiente, disciplinado em normas constitucionais (CF, art. 225, § 3º) e infraconstitucionais (Lei n. 6.938/1981, arts. 2º e 4º), está fundado, entre outros, nos princípios da prevenção, do poluidor-pagador e da reparação integral. Deles decorrem, para os destinatários (Estado e comunidade), deveres e obrigações de variada natureza, comportando prestações pessoais, positivas e negativas (fazer e não fazer), bem como de pagar quantia (indenização dos danos insuscetíveis de recomposição in natura), prestações essas que não se excluem, mas, pelo contrário, se cumulam, se for o caso.

    2. A ação civil pública é o instrumento processual destinado a propiciar a tutela ao meio ambiente (CF, art. 129, III). Como todo instrumento, submete-se ao princípio da adequação, a signifi car que deve ter aptidão sufi ciente para operacionalizar, no plano jurisdicional, a devida e integral proteção do direito material. Somente assim será instrumento adequado e útil.

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    3. É por isso que, na interpretação do art. 3º da Lei n. 7.347/1985 (“A ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer”), a conjunção “ou” deve ser considerada com o sentido de adição (permitindo, com a cumulação dos pedidos, a tutela integral do meio ambiente) e não o de alternativa excludente (o que tornaria a ação civil pública instrumento inadequado a seus fins). É conclusão imposta, outrossim, por interpretação sistemática do art. 21 da mesma lei, combinado com o art. 83 do Código de Defesa do Consumidor (“Art. 83. Para a defesa dos direitos e interesses protegidos por este código são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela.”) e, ainda, pelo art. 25 da Lei n. 8.625/1993, segundo o qual incumbe ao Ministério Público “IV - promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei: a) para a proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio ambiente (...)”.

    4. Exigir, para cada espécie de prestação, uma ação civil pública autônoma, além de atentar contra os princípios da instrumentalidade e da economia processual, ensejaria a possibilidade de sentenças contraditórias para demandas semelhantes, entre as mesmas partes, com a mesma causa de pedir e com fi nalidade comum (medidas de tutela ambiental), cuja única variante seriam os pedidos mediatos, consistentes em prestações de natureza diversa. A proibição de cumular pedidos dessa natureza não existe no procedimento comum, e não teria sentido negar à ação civil pública, criada especialmente como alternativa para melhor viabilizar a tutela dos direitos difusos, o que se permite, pela via ordinária, para a tutela de todo e qualquer outro direito.

    5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido (REsp n. 605.323-MG, Rel. Ministro José Delgado, Rel. p/ Acórdão Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJ 17.10.2005, p. 179).

    Processo Civil. Direito Ambiental. Ação civil pública para tutela do meio ambiente. Obrigações de fazer, de não fazer e de pagar quantia. Possibilidade de cumulação de pedidos art. 3º da Lei n. 7.347/1985. Interpretação sistemática. Art. 225, § 3º, da CF/1988, arts. 2º e 4º da Lei n. 6.938/1981, art. 25, IV, da Lei n. 8.625/1993 e art. 83 do CDC. Princípios da prevenção, do poluidor-pagador e da reparação integral.

    1. A Lei n. 7.347/1985, em seu art. 5º, autoriza a propositura de ações civis públicas por associações que incluam entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao consumidor, ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, ou a qualquer outro interesse difuso ou coletivo.

    2. O sistema jurídico de proteção ao meio ambiente, disciplinado em normas constitucionais (CF, art. 225, § 3º) e infraconstitucionais (Lei n. 6.938/1981, arts. 2º e 4º), está fundado, entre outros, nos princípios da prevenção, do poluidor-pagador e da reparação integral.

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    3. Deveras, decorrem para os destinatários (Estado e comunidade), deveres e obrigações de variada natureza, comportando prestações pessoais, positivas e negativas (fazer e não fazer), bem como de pagar quantia (indenização dos danos insuscetíveis de recomposição in natura), prestações essas que não se excluem, mas, pelo contrário, se cumulam, se for o caso.

    4. A ação civil pública é o instrumento processual destinado a propiciar a tutela ao meio ambiente (CF, art. 129, III) e submete-se ao princípio da adequação, a signifi car que deve ter aptidão sufi ciente para operacionalizar, no plano jurisdicional, a devida e integral proteção do direito material, a fi m de ser instrumento adequado e útil.

    5. A exegese do art. 3º da Lei n. 7.347/1985 (“A ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer”), a conjunção “ou” deve ser considerada com o sentido de adição (permitindo, com a cumulação dos pedidos, a tutela integral do meio ambiente) e não o de alternativa excludente (o que tornaria a ação civil pública instrumento inadequado a seus fi ns).

    6. Interpretação sistemática do art. 21 da mesma lei, combinado com o art. 83 do Código de Defesa do Consumidor (“Art. 83. Para a defesa dos direitos e interesses protegidos por este código são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela.”) bem como o art. 25 da Lei n. 8.625/1993, segundo o qual incumbe ao Ministério Público “IV - promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei: a) para a proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio ambiente (...)”.

    7. A exigência para cada espécie de prestação, da propositura de uma ação civil pública autônoma, além de atentar contra os princípios da instrumentalidade e da economia processual, ensejaria a possibilidade de sentenças contraditórias para demandas semelhantes, entre as mesmas partes, com a mesma causa de pedir e com fi nalidade comum (medidas de tutela ambiental), cuja única variante seriam os pedidos mediatos, consistentes em prestações de natureza diversa.

    8. Ademais, a proibição de cumular pedidos dessa natureza não encontra sustentáculo nas regras do procedimento comum, restando ilógico negar à ação civil pública, criada especialmente como alternativa para melhor viabilizar a tutela dos direitos difusos, o que se permite, pela via ordinária, para a tutela de todo e qualquer outro direito.

    9. Recurso especial desprovido (REsp n. 625.249-PR, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJ 31.8.2006, p. 203, grifei).

    Processo Civil e Ambiental. Ofensa ao art. 535 do CPC. Inocorrência. Ação civil pública. Tutela do meio ambiente. Obrigações de fazer, de não fazer e de pagar. Cumulação. Possibilidade. Interpretação sistemática da CR/1988, das Leis n. 6.938/1981 e 8.625/1993 e do CDC. Efetividade dos princípios da prevenção, do poluidor-pagador e da reparação integral.

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    1. Os órgãos julgadores não estão obrigados a examinar todas as teses levantadas pelo jurisdicionado durante um processo judicial, bastando que as decisões proferidas estejam devida e coerentemente fundamentadas, em obediência ao que determina o art. 93, inc. IX, da Lei Maior. Isso não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC. Precedente.

    2. O art. 3º da Lei n. 7.347/1985 deve ser lido de maneira abrangente e sistemática com a Constituição da República, com as Leis n. 6.938/1981 e 8.625/1993 e com o Código de Defesa do Consumidor - CDC, a fi m de permitir a tutela integral do meio ambiente, com possibilidade de cumulação de obrigações de fazer, não fazer e pagar. Precedentes.

    3. Recurso parcialmente conhecido e, nesta parte, provido (REsp n. 1.178.294-MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 10.9.2010, grifei).

    Processual Civil. Agravo regimental nos embargos de declaração em agravo de instrumento. Possibilidade de cumulação de pedidos em sede de ação civil pública. Súmula n. 83-STJ. Dano ambiental. Litisconsórcio passivo necessário. Ausência de violação ao art. 47 do CPC. Revisão do conjunto fático-probatório. Súmula n. 7-STJ. Agravo não provido.

    1. Incensurável o acórdão recorrido ao concluir pela possibilidade da cumulação das obrigações de fazer, não fazer e pagar em sede de ação civil pública, afastando a insurgência recursal, no ponto, tendo em vista a incidência da Súmula n. 83-STJ, também aplicável aos recursos interpostos pela alínea a.

    (...)

    3. Agravo regimental não provido (AgRg nos EDcl no Ag n. 1.156.486-PR, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 27.4.2011).

    4. Conclusão

    In casu, a violação dos dispositivos legais sobressai evidente porque o acórdão recorrido negou a possibilidade de cumular a reparação específi ca já determinada com a indenização pecuniária pretendida pelo Ministério Público. Nesse ponto, evidente o antagonismo entre a posição do Tribunal de Justiça de Minas Gerais e a do STJ, para quem, nas demandas ambientais, admite-se, sim, a condenação, simultânea e agregadamente, em obrigação de fazer, não fazer e indenizar: uma típica obrigação cumulativa ou conjuntiva.

    Sem embargo do êxito recursal nesse ponto, o apelo somente pode ser provido em parte, tendo em vista não caber ao STJ, como regra, perquirir a existência de dano no caso concreto – análise que esbarra, ressalvadas situações

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    excepcionais, na Súmula n. 7-STJ. Tal juízo fático é de competência das instâncias de origem, diante da prova carreada aos autos.

    Pelas razões expostas, dou parcial provimento ao Recurso Especial para reconhecer a possibilidade, em tese, de cumulação de indenização pecuniária com as obrigações de fazer e não fazer voltadas à recomposição in natura do bem lesado, com a devolução dos autos ao Tribunal a quo para que verifi que se, na hipótese, há dano indenizável e fi xe o eventual quantum debeatur.

    É como voto.

    COMENTÁRIO DOUTRINÁRIO

    Patryck de Araujo Ayala1 Eveline de Magalhães Werner Rodrigues2

    Paula Galbiatti Silveira3

    1. BREVES APONTAMENTOS ACERCA DOS FATOS E DAS QUESTÕES JURÍDICAS ABORDADAS NOS ACÓRDÃOS

    Ambos os acórdãos, referentes ao Recurso Especial nº 1.145.083-MG e Recurso Especial nº 1.198-727-MG, foram proferidos em recursos especiais interpostos pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais contra decisão do tribunal de justiça local que reconheceu a decisão recorrida julgou procedente o pedido de reparação do dano ambiental, não provendo, contudo, o pedido indenizatório, ao entender que o mesmo só seria cabível caso inviável a recuperação da área degradada.

    Quanto ao Recurso Especial nº 1.145.083-MG, o parquet estadual insurgiu-se sob a afi rmação de violação do texto do artigo 535 do Código de Processo Civil e dos artigos 3º, 4º e 14 da Lei nº 6.938⁄1981, bem como ao artigo 3º da Lei nº 7.347/1985, sustentando que são cabíveis a obrigação de reparar o dano causado e a condenação do réu ao pagamento de indenização, a fi m de assegurar a defesa ampla e efetiva do meio ambiente. Já quanto ao Recurso

    1 Universidade Federal de Mato Grosso e Procuradoria-Geral do Estado de Mato Grosso.2 Universidade Federal de Mato Grosso.3 Universidade Federal de Santa Catarina.

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    Especial nº 1.145.083-MG, requereu que fosse reconhecida a possibilidade de reparação do dano extrapatrimonial consistente na subtração do usufruto do bem pela coletividade, além da reparação da perda de biodiversidade, que não se encontraria amparada pela decisão impugnada.

    As razões do acórdão referente ao Recurso Especial nº 1.145.083-MG se deram a partir da consideração de que a interpretação adotada pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais referente aos artigos 3º da Lei nº 7.347/1985 e 4º, inciso VII, e 14 da Lei nº 6.938/1981 foi restritiva e dissonante com a jurisprudência daquele Superior Tribunal e com a melhor doutrina. O recurso especial foi parcialmente provido, reconhecendo a possibilidade, em tese, de cumulação da indenização pecuniária com obrigação de fazer – recomposição in natura do bem lesado – e determinando a devolução dos autos ao Tribunal de origem para verifi car se há dano indenizável e fi xar, em consequência, o quantum debeatur.

    O Relator do acórdão, Ministro Herman Benjamin, entendeu que o disposto nos artigos 3º da Lei nº 7.347/1985 e 4º inciso VII e 14 da Lei nº 6.938/1981 não traz uma pena, mas sim deveres de indenização e recuperação ambientais como ressarcimento de natureza civil, buscando a restauração do status quo ante da área afetada, bem como a reversão à coletividade dos benefícios econômicos que o degradador auferiu de um bem que é coletivo e de uso comum do povo.

    O acórdão fundamentou-se ainda nos princípios do poluidor-pagador que, ao contrário da visão economicista dada por outros países e por sua origem, assume no direito brasileiro fundamento efi caz para técnicas de enfrentamento das externalidades negativas da degradação ambiental, facilitando o acesso à justiça e técnicas de restauração do dano; e no princípio da reparação integral, que visa ao pleno restabelecimento da biota, aí incluindo a privação temporária da fruição do bem; o dano residual, ou seja, a deterioração ambiental irreversível; os danos futuros certos; o dano moral coletivo; e o proveito econômico do agente com a atividade ou empreendimento degradador. Assim, a aplicação equivocada de tais princípios dá a impressão de que degradar o meio ambiente compensa, debilitando o caráter dissuasório, a força pedagógica e o objetivo profi lático da responsabilidade civil ambiental, estimulando a conduta lesiva.

    Considerou o acórdão que a cumulação de obrigação de fazer, não fazer e indenizar não confi gura bis in idem, ante o caráter distinto de seus fundamentos e de que a indenização corresponde à degradação remanescente

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    ou refl exa. Entendeu o acórdão que, embora o artigo 3º da Lei nº 7.347/1985 disponha que “a ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer”, a conjunção “ou” tem cunho aditivo e não alternativo, assim como o disposto no artigo 14, § 1º, da Lei nº 6.938/1981. Assim, interpretação diversa inviabilizaria a reparação integral do dano ambiental.

    Convém ressaltar que o acórdão traz ainda a importância da renovação da hermenêutica da norma ambiental, visto seu conteúdo ético-intergeracional e ecocêntrico, exigindo do intérprete a aplicação da norma para atender aos seus fi ns sociais e às exigências do bem comum, conforme o artigo 5º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, devendo as disposições ambientais receber interpretação e integração conforme o princípio hermenêutico in dubio pro natura.

    Em relação ao acórdão ao Recurso Especial nº 1.198-727-MG, conduzido por voto proferido pelo ministro Herman Benjamin, o tribunal superior enfatizou, em primeiro lugar, a iterativa jurisprudência da corte no sentido de se reconhecer possível a cumulação dos deveres de reparação e de restauração natural no âmbito das obrigações de fazer e de não fazer fi xadas pelo artigo 3º da Lei nº 7.347/1985, citando, inclusive, a decisão proferida pelo REsp 1.145.083/MG, também ora em análise, bem como a diversos outros (REsp 1.178.294/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 10.9.2010; AgRg nos EDcl no Ag 1.156.486/PR, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 27.4.2011; REsp 1.120.117/AC, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 19.11.2009; REsp 1.090.968/SP, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 3.8.2010; REsp 605.323/MG, Rel. Ministro José Delgado, Rel. p/ Acórdão Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJ 17.10.2005; REsp 625.249/PR, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJ 31.8.2006).

    Como segundo aspecto de relevância afi rmado pela decisão, deve ser destacada a defi nição que deve ser atribuída ao princípio de reparação integral consagrado pelo artigo 225, § 3º da CRFB de 1988, por meio do qual todas as manifestações do dano ambiental devem ser objeto de reparação, não sendo possível que remanesça dano indene. Por meio do princípio, as manifestações penal, civil e administrativa do dano devem ser alcançadas pela ação estatal, e todas as manifestações (patrimoniais e extrapatrimoniais) também o devem ser.

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    Outro aspecto que merece ser enfatizado concentra-se no reconhecimento de que o princípio de autorização prévia não foi subtraído pela Lei nº 12.651/2012, devendo ser observado pelas autoridades ambientais e pelos aplicadores da norma ambiental.

    A afi rmação dos princípios do poluidor-pagador e da reparação integral, da cumulação entre as obrigações de fazer, de não fazer e de indenizar, além da consideração de um princípio in dubio pro natura, permitiriam que fosse exigido do aplicador da norma ambiental comportamento que favorecesse o melhor nível de proteção. Em semelhante realidade não seria possível que, diante da capacidade de proteção oferecida pela norma, um nível menor fosse proporcionado por seu aplicador. Desse modo, de forma distinta do que foi reconhecido pelo tribunal de origem, o STJ reformou o acórdão para o fi m de confi rmar a possibilidade de que danos residuais, intercorrentes, intermediários (e extrapatrimoniais) pudessem ser reparados. Esta decisão reitera posição já fi rmada por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 1.145.083 e comentada anteriormente.

    2. ANÁLISE TEÓRICA E DOGMÁTICA DOS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO

    A degradação ao meio ambiente atinge não somente o indivíduo, mas toda uma coletividade, causando danos materiais e morais, de caráter transtemporal, transfronteiriço, cumulativo, de ampla causalidade, muitas vezes invisível, o que difi culta sua percepção, diferindo muito da danosidade civil tradicional.

    A complexidade do bem ambiental e dos danos a ele causados levam à difi culdade de sua reparação, haja vista ser impossível a volta ao status quo ante. Ante as características do dano ao meio ambiente, a responsabilidade civil ambiental tem passado por mudanças, incluindo a responsabilidade objetiva ao agente degradador, teorias do nexo de causalidade e do ônus da prova, bem como novos mecanismos processuais para servir aos interesses metaindividuais, como a ação civil pública, regulamentada pela Lei nº 7.347/1985.

    No Brasil, o sistema da responsabilidade ambiental é aberto, sendo objetiva e trazendo um conceito amplo de poluidor e poluição. A reparabilidade integral do dano é imposição ao degradador, possuindo funções preventiva, precaucional, pedagógica e dissuasória. O agente é obrigado a reparar o dano em sua integralidade impondo-se a ele um dever-agir preventivo4.

    4 LEITE, José Rubens Morato; AYALA, Patryck de Araújo. Dano ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial: teoria e prática. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 229.

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    A interpretação gramatical do disposto no artigo 3º da Lei nº 7.347/1985, ao entender pela impossibilidade de cumulação de pedidos de condenação em direito e obrigação de fazer e não fazer, limita o alcance e a efetividade da ação civil pública e não se coaduna com a visão necessária do processo constitucional como meio simplifi cador de demandas, correspondendo a um ônus injustifi cado ao efetivo acesso à justiça5. Nesse sentido, Melo afi rma que o sistema de indenização dos danos ambientais é orientado pelo princípio da conservação, o qual exige que as sanções ambientais busquem não somente a reconstituição do bem, mas a restauração e substituição, devendo ser o mais abrangente possível6.

    Assim, para Melo, é necessária a reparação do dano ambiental com a maior integralidade possível, devendo haver a duplicidade da reparação, ou seja, pela restauração ou compensação do dano e, ainda, pela indenização pecuniária relativa aos danos sofridos7.

    A influência de um princípio de prevenção ou de precaução na responsabilidade civil situaria uma dimensão alargada para a reparação de danos potenciais, por meio da antecipação da reparação de danos futuros, permitindo reconhecer um dever de reparação de danos não confi rmados no presente, mas sobre os quais existe elevada probabilidade de concretização.

    Sua importância é ressaltada particularmente nos casos em que o conhecimento científi co disponível não permite estabelecer uma conclusão sobre a periculosidade da atividade, processo ou produto, os quais, no futuro, poderão se revelar nocivos, como em casos de saúde e meio ambiente. Nestes casos, a consideração de um princípio de precaução permite a mitigação de um dos fi ltros da responsabilidade civil8, qual seja, o da prova do nexo de causalidade, colaborando para sua fl exibilização sobre os danos potenciais e futuros submetidos à incerteza científi ca. Nos casos em que não fosse possível confirmar cientificamente a causalidade entre o dano e o risco criado, a

    5 FAZOLLI, Sílvio Alexandre. Por uma tutela coletiva diferenciada do bem jurídico ambiental. In: LEITE, José Rubens Morato. (coord.). Dano ambiental na sociedade de risco. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 379.6 MELO, Melissa Ely. Restauração ambiental: do dever jurídico às técnicas reparatórias. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p. 110.7 IBID., p.