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Superior Tribunal de Justiça RECURSO ESPECIAL Nº 489.732 - DF (2002/0156851-2) RELATOR : MINISTRO BARROS MONTEIRO RECORRENTE : COMPANHIA IMOBILIÁRIA DE BRASÍLIA - TERRACAP ADVOGADO : CARLOS FREDERICO DE FARIA PEREIRA E OUTROS RECORRIDO : VALDEMIRO LOPES DE SOUZA ADVOGADO : JOÃO PAULO PINTO E OUTROS EMENTA MANUTENÇÃO DE POSSE. OCUPAÇÃO DE ÁREA PÚBLICA, ADMINISTRADA PELA “TERRACAP – COMPANHIA IMOBILIÁRIA DE BRASÍLIA”. INADMISSIBILIDADE DA PROTEÇÃO POSSESSÓRIA. – A ocupação de bem público não passa de simples detenção, caso em que se afigura inadmissível o pleito de proteção possessória contra o órgão público. – Não induzem posse os atos de mera tolerância (art. 497 do Código Civil/1916). Precedentes do STJ. Recurso especial conhecido e provido. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas: Decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas precedentes que integram o presente julgado. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Fernando Gonçalves, Aldir Passarinho Junior e Jorge Scartezzini. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha. Sustentou oralmente, pelo recorrido, o Dr. Fenando Brasil. Brasília, 5 de maio de 2005 (data do julgamento). MINISTRO BARROS MONTEIRO Relator Documento: 547314 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 13/06/2005 Página 1 de 7

STJ, Resp 489732 - Manutenção de Posse - Área Pública

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Page 1: STJ, Resp 489732 - Manutenção de Posse - Área Pública

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RECURSO ESPECIAL Nº 489.732 - DF (2002/0156851-2) RELATOR : MINISTRO BARROS MONTEIRORECORRENTE : COMPANHIA IMOBILIÁRIA DE BRASÍLIA - TERRACAP ADVOGADO : CARLOS FREDERICO DE FARIA PEREIRA E OUTROSRECORRIDO : VALDEMIRO LOPES DE SOUZA ADVOGADO : JOÃO PAULO PINTO E OUTROS

EMENTAMANUTENÇÃO DE POSSE. OCUPAÇÃO DE ÁREA PÚBLICA,

ADMINISTRADA PELA “TERRACAP – COMPANHIA IMOBILIÁRIA DE BRASÍLIA”. INADMISSIBILIDADE DA PROTEÇÃO POSSESSÓRIA.

– A ocupação de bem público não passa de simples detenção, caso em que se afigura inadmissível o pleito de proteção possessória contra o órgão público.

– Não induzem posse os atos de mera tolerância (art. 497 do Código Civil/1916). Precedentes do STJ.

Recurso especial conhecido e provido.ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas:Decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

conhecer do recurso e dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas precedentes que integram o presente julgado. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Fernando Gonçalves, Aldir Passarinho Junior e Jorge Scartezzini. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha. Sustentou oralmente, pelo recorrido, o Dr. Fenando Brasil.

Brasília, 5 de maio de 2005 (data do julgamento).

MINISTRO BARROS MONTEIRO Relator

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RECURSO ESPECIAL Nº 489.732 - DF (2002/0156851-2)

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO:

Valdomiro Lopes de Souza ajuizou ação de manutenção de posse contra

a “Terracap – Companhia Imobiliária de Brasília”, alegando ser possuidor, há mais de

vinte anos, de uma área de terras, denominada “Chácara Bela Vista”, com 35,00

hectares, sita à margem direita do córrego do “Torto”, onde reside com seus nove

filhos e cultiva hortigranjeiros. Esclareceu que, em ação de reintegração de posse

movida pela ré, restou comprovado não ter ela a posse do referido imóvel, tampouco a

propriedade. Informou que, no ano de 1996, ajuizou ação de usucapião especial, em

trâmite na a 6ª Vara da Fazenda Pública. Acrescentou que no início do mês de agosto

de 2000, funcionários da Administração do Lago Norte deixaram em sua residência

uma notificação, estabelecendo o prazo de doze horas para desocupação do imóvel, ato

que reputa ilegal, pois a questão se encontra sub judice.

O MM. Juiz de Direito, invocando o poder geral de cautela, determinou,

à fl. 42, se abstivesse a ré de promover a demolição de acessões erigidas pelo autor.

A sentença de fls. 189/195, entendendo ser o demandante possuidor da

gleba por transferência havida no ano de 1980 sem nenhum vício, julgou procedente,

em parte, o pedido para conceder a manutenção na posse das terras descritas na

inaugural.

Apelou a ré, sustentando tratar-se de bem público, descabendo a ação

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possessória, independentemente do fato de ter o autor ocupado o terreno por longo

período.

A Quinta Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e

Territórios, à unanimidade de votos, negou provimento ao recurso, em acórdão cujos

fundamentos se resumem na seguinte ementa:

“MANUTENÇÃO DE POSSE – BEM PÚBLICO – DISCUSSÃO SOBRE DOMÍNIO.

01. Admite-se a possibilidade de se reconhecer a posse em determinado tipo de imóvel, ainda que pertencente ao poder público, como é o caso de terras que antes pertenciam a particular e que teriam voltado ao domínio público, sendo denominadas terras devolutas.

02. Recurso desprovido.Unânime” (fl. 232).

Inconformada, a ré aviou este recurso especial com arrimo na alínea “a”

do autorizativo constitucional, apontando contrariedade aos arts. 200 do Decreto-Lei

n. 9.760, de 5 de setembro de 1946, e 497 do Código Civil/1916. Aduziu que todos os

bens imóveis públicos, pela sua natureza específica, não podem ser objeto de

apossamento por particular. Sustentou ocorrer no caso mera detenção decorrente de

atos de permissão ou tolerância do poder público. Disse, em seguida, não se cuidar no

caso de terras devolutas, pois os imóveis integrantes do seu patrimônio imobiliário são

oriundos de ação expropriatória.

Oferecidas as contra-razões, o apelo extremo foi admitido na origem.

É o relatório.

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VOTO

O SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO (Relator):

1. Acha-se satisfeito in casu o requisito do prequestionamento,

porquanto, embora não mencionados às expressas pelo decisório recorrido os artigos

de lei federal tidos por afrontados, examinou ele as questões jurídicas federais

enfocadas no recurso especial.

2. O autor ocupa o imóvel objeto da ação desde o ano de 1980, conforme

a “transferência de posse” que lhe fizeram Maria do Socorro Costa Leão, Eliane

Ferreira da Silva e José dos Santos (recibo de fls. 10), fato esse mencionado pela

decisão de 1º grau (fl. 193).

De outro lado, o acórdão recorrido admite que o terreno litigioso é

pertencente ao poder público (fl. 236), classificando-o, ainda que sem muita

segurança, como “terras devolutas” (fls. 236/237).

Ora, ainda que se trate de “terras devolutas”, elas não perdem a natureza

de bem público. Hely Lopes Meirelles leciona que “terras devolutas são todas aquelas

que, embora pertencentes ao domínio público de uma das entidades estatais (União,

Estado ou Município), não são aplicadas em seus serviços, nem têm destinação

específica” (Direito Municipal Brasileiro, pág. 287, 13ª ed.). Consoante o escólio de

Benedito Silvério Ribeiro, magistrado paulista, “as terras devolutas constituem

espécie de terras públicas, detendo estas compreensão abrangente daquelas, que são

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do patrimônio público, mas não se encontram cadastradas ou individualizadas nem

cultivadas ou destinadas a qualquer uso público” (Tratado de Usucapião, vol. I,

pág.542, 3ª ed.).

Se assim é, ou seja, cuidando-se no caso de bem público integrado ao

patrimônio imobiliário do Distrito Federal e administrado pela ré, o imóvel em tela não

é passível de apossamento por particular, tampouco de usucapião (Súmula n.

340-STF).

Em verdade, o autor não tem a posse do terreno, mas a mera detenção

decorrente da tolerância ou permissão do Poder Público.

Jansen Fialho de Almeida, magistrado no Distrito Federal, observa que

“a jurisprudência, contudo, tem entendimento pela impossibilidade jurídica de pedido

possessório em área pública, quando deduzido por particular sobre bem público

contra o órgão detentor da propriedade, pois, não podendo ser objeto de usucapião, a

ocupação é mera detenção tolerada ou permitida, portanto, à precariedade.” (O

Cabimento da Oposição pela Administração como Proprietária, com base no Domínio,

em Ação Possesória disputada por Terceiros sobre Bens Públicos, Revista do Tribunal

Regional Federal da 1ª Região, vol. 3, pág.19).

É exatamente esse o caso dos autos. Cuida-se de uma ocupação precária,

ainda que exercida por vários anos. Por isso mesmo, é passível de reclamo pela

Administração a qualquer tempo.

Ao apreciar o REsp n. 341.395-DF, sob a relatoria do Ministro Carlos

Alberto Menezes Direito, a Terceira Turma deste Tribunal decidiu sob a ementa

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seguinte:

"Ação de reintegração de posse. Ocupação indevida de áreas públicas. TERRACAP.

1. Tratando-se de ocupação de áreas públicas sem a devida autorização, afastada pelo exame da prova dos autos as alegações do réu, não há direito à permanência, configurado o esbulho pela não devolução das áreas ocupadas após a devida notificação.

2. Recurso especial não conhecido."

Mais recentemente esta Quarta Turma teve ocasião de apreciar espécie

similar, quando assentou:

“INTERDITO PROIBITÓRIO. OCUPAÇÃO DE ÁREA PÚBLICA, PERTENCENTE À “COMPANHIA IMOBILIÁRIA DE BRASÍLIA – TERRACAP”. INADMISSIBILIDADE DA PROTEÇÃO POSSESSÓRIA NO CASO.

– A ocupação de bem público, ainda que dominical, não passa de mera detenção, caso em que se afigura inadmissível o pleito de proteção possessória contra o órgão público. Não induzem posse os atos de mera tolerância (art. 497 do CC/1916).

Recurso especial não conhecido. ” (REsp n. 146.367-DF, de minha relatoria.)

Nessas condições, a decisão combatida, ao reconhecer a posse sobre bem

público em favor do demandante e conferir-lhe proteção jurídica, malferiu as normas

dos arts. 200 do Decreto-Lei n. 9.760, de 5 de setembro de 1945, e 497 do Código

Civil de 1916.

3. Isso posto, conheço do recurso e dou-lhe provimento, a fim de julgar

improcedente a ação. Beneficiário o autor da justiça gratuita, somente pagará ele as

custas processuais e os honorários de advogado, arbitrados em R$ 200,00 (duzentos

reais), caso se verifiquem as hipóteses previstas no art. 12 da Lei n. 1.060, de 1950.

É como voto.

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CERTIDÃO DE JULGAMENTOQUARTA TURMA

Número Registro: 2002/0156851-2 RESP 489732 / DF

Número Origem: 20000110599277

PAUTA: 05/05/2005 JULGADO: 05/05/2005

RelatorExmo. Sr. Ministro BARROS MONTEIRO

Presidente da SessãoExmo. Sr. Ministro FERNANDO GONÇALVES

Subprocurador-Geral da RepúblicaExmo. Sr. Dr. DURVAL TADEU GUIMARÃES

SecretáriaBela. CLAUDIA AUSTREGÉSILO DE ATHAYDE BECK

AUTUAÇÃO

RECORRENTE : COMPANHIA IMOBILIÁRIA DE BRASÍLIA - TERRACAPADVOGADO : CARLOS FREDERICO DE FARIA PEREIRA E OUTROSRECORRIDO : VALDEMIRO LOPES DE SOUZAADVOGADO : JOÃO PAULO PINTO E OUTROS

ASSUNTO: Civil - Direito das Coisas - Posse - Manutenção

SUSTENTAÇÃO ORAL

Sustentou oralmente, DR. FERNANDO BRASIL, pelo Recorrido.

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, por unanimidade, conheceu do recurso e deu-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Fernando Gonçalves, Aldir Passarinho Junior e Jorge Scartezzini votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha.

Brasília, 05 de maio de 2005

CLAUDIA AUSTREGÉSILO DE ATHAYDE BECKSecretária

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