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25 Junho 2009 | O MIRANTE 42 | SUPLEMENTO FESTAS ALVERCA foto O MIRANTE foto O MIRANTE A paixão pela etnografia de Alverca do Ribatejo une os três ranchos existentes na cidade. Cada um à sua maneira tentam preservar as tradições e as raízes de uma terra que afinal já foi uma “aldeia agrícola” e agora “não é tão urbana assim”. “As raízes do folclore são o povo. Seja ele da cidade ou do campo. O folclore não pode ser entendido como sendo só das zonas rurais. E Alverca não é tão urbana assim. Há 22 anos quando vim para aqui ainda se vivia muito da agricultura. E hoje, há zonas em Alverca, como a parte dos casais, que ainda vive da apanha da azeitona e da pastorícia”, conta Jaime Coelho, responsável pelo Rancho Folcló- rico da Casa do Povo de Arcena, um dos três ranchos que existem actualmente em Alverca do Ribatejo. Tem 69 anos, é apaixonado pela arte e aceitou o desafio para começar a fazer o desenvolvimento no campo da etnogra- fia de um grupo que até então dançava apenas de uma forma lúdica. “O grupo é etnográfico desde que represente a zona onde está inserido em função daquilo que se fazia numa determinada altura. E o rancho não tinha trabalho de pesquisa, análise, recolha, reconstituição e depois de divulgação. As roupas antes eram inventadas e agora são estudadas”, revela Jaime Coelho. O rancho representa a época que vai desde 1880 até 1935, numa altura em que a vida era mais ligada à pesca e à agricultura. O folclore faz parte da história cultural de Alverca. “No rancho temos pessoas com 80 anos. Ouvimos as vivências dos seus pais e as suas próprias experiências. Tentamos saber o que as pessoas usavam naquele tempo e depois reproduzimos através de descrições verbais, pesquisas e fotografias”, refere. O rancho possui um núcleo museológi- co que tem para cima de 1600 peças, todas elas resultado de muita recolha. “Vamos buscar as coisas ao caixote do lixo se for preciso. Perguntamos a toda a gente que têm sótãos ou quando há alguma casa para desmanchar. Passamos num lado, encontramos um canivete velho, um garfo ou uma colher de estanho, serve perfeita- mente”, confessa Jaime Coelho. Em termos de representação de “danças e cantorias” o rancho de Arcena alargou as pesquisas ao concelho de Vila Franca de Xira. Costumam dançar os “viras que são dançados em toda a parte”. “Os verde gaios, que se dançam em muito lado” e as “modas e as “rodas” são dançadas em todo o país. Mais ligadas ao Ribatejo também faz parte do seu reportório, os fados, fadinhos, verde gaios e o fandango. “Mas nem o vira nasceu no Norte nem o fandango é do Ribatejo. Os Ribatejanos é que souberam aproveitá-lo da melhor maneira”, garante João Pereira, um dos membros mais antigos do grupo. Dos cerca de 60 elementos que compõe o rancho, a maior parte veio de fora. “Há desde o doutor ao cavador. Eu por exemplo, estou aposentado e trabalho no campo”, revela João Pereira. Folclore faz parte da história cultural de Alverca do Ribatejo São três os ranchos que tentam manter vivas as raízes e as tradições Jorge Afonso da Silva

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25 Junho 2009 | O MIRANTE42 | SUPLEMENTO FESTAS ALVERCA

foto O MIRANTE

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A paixão pela etnografia de Alverca do Ribatejo une os três ranchos existentes na cidade. Cada um à sua maneira tentam preservar as tradições e as raízes de uma terra que afinal já foi uma “aldeia agrícola” e agora “não é tão urbana assim”.

“As raízes do folclore são o povo. Seja ele da cidade ou do campo. O folclore não pode ser entendido como sendo só das zonas rurais. E Alverca não é tão urbana assim. Há 22 anos quando vim para aqui ainda se vivia muito da agricultura. E hoje, há zonas em Alverca, como a parte dos casais, que ainda vive da apanha da azeitona e da pastorícia”, conta Jaime Coelho, responsável pelo Rancho Folcló-rico da Casa do Povo de Arcena, um dos três ranchos que existem actualmente em Alverca do Ribatejo.

Tem 69 anos, é apaixonado pela arte e aceitou o desafio para começar a fazer o desenvolvimento no campo da etnogra-fia de um grupo que até então dançava apenas de uma forma lúdica. “O grupo é etnográfico desde que represente a zona onde está inserido em função daquilo que se fazia numa determinada altura. E o rancho não tinha trabalho de pesquisa, análise, recolha, reconstituição e depois de divulgação. As roupas antes eram inventadas e agora são estudadas”, revela Jaime Coelho.

O rancho representa a época que vai desde 1880 até 1935, numa altura em que a vida era mais ligada à pesca e à agricultura. O folclore faz parte da história cultural de Alverca. “No rancho temos pessoas com 80 anos. Ouvimos as vivências dos seus pais e as suas próprias experiências. Tentamos saber o que as pessoas usavam naquele tempo e depois reproduzimos através de descrições verbais, pesquisas e fotografias”, refere.

O rancho possui um núcleo museológi-co que tem para cima de 1600 peças, todas elas resultado de muita recolha. “Vamos buscar as coisas ao caixote do lixo se for preciso. Perguntamos a toda a gente que têm sótãos ou quando há alguma casa para desmanchar. Passamos num lado, encontramos um canivete velho, um garfo ou uma colher de estanho, serve perfeita-mente”, confessa Jaime Coelho.

Em termos de representação de “danças e cantorias” o rancho de Arcena alargou as pesquisas ao concelho de Vila Franca de Xira. Costumam dançar os “viras que são dançados em toda a parte”. “Os verde gaios, que se dançam em muito lado” e as “modas e as “rodas” são dançadas em todo o país. Mais ligadas ao Ribatejo também faz parte do seu reportório, os fados, fadinhos, verde gaios e o fandango. “Mas nem o vira nasceu no Norte nem o fandango é do Ribatejo. Os Ribatejanos é que souberam aproveitá-lo da melhor maneira”, garante João Pereira, um dos membros mais antigos do grupo. Dos cerca de 60 elementos que compõe o rancho, a maior parte veio de fora. “Há desde o doutor ao cavador. Eu por exemplo, estou aposentado e trabalho no campo”, revela João Pereira.

Folclore faz parte da história cultural de Alverca do RibatejoSão três os ranchos que tentam manter vivas as raízes e as tradições

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O MIRANTE | 25 Junho 2009 SUPLEMENTO FESTAS ALVERCA | 43

Está tudo pronto para mais uma edição das festas da cidade e de São Pedro em Alverca do Ribatejo. Sardinha, concertos, garraiadas, marchas populares e fogo de artifício marcam as festividades deste ano.

Em Alverca do Ribatejo está tudo pronto para receber mais uma edição das festas da cidade e de São Pedro. De 24 a 29 de Junho a cidade ribatejana espera receber milhares de visitantes no campo da feira. Serão cinco dias com muita animação e divertimento e com a vantagem de este ano as festividades terem mais um dia, a segunda-feira.

Além dos stands, tasquinhas, petis-cos, folclore, bailes, garraiadas, mar-chas populares, artistas de renome, a procissão em honra do padroeiro e a noite da sardinha assada, destaque para a realização de um espectáculo de fogo de artifício, que encerrará as festas 2009.

A organização espera que São Pe-dro ajude e que o tempo não pregue uma partida. As festas, que tiveram início na quarta-feira com a actuação das bandas Black Bonbaim e dos Karpe Diem, prosseguem quinta-feira, 25 de Junho. Pelas 21h30 pode assistir a um espectáculo de fado. Uma hora mais tarde começa a noite da sardinha assada, oferta da junta de freguesia local. Às 23h30 terá início uma garraiada nocturna.

Sexta-feira, às 21h00, tem início o desfile das marchas populares e de-pois a população poderá dançar no baile popular ao ritmo do grupo “Pão com Manteiga”, que antecede a actuação de Ruth Marlene pelas 23h00.

No sábado, a garraia-da começa às 17h00 e pelas 21h30 terá início o festival de folclore com

Alverca pronta para receber milhares de visitantes em cinco dias

Não muito longe de Arcena, está sedeado o Rancho Folclórico do Centro social e Cultural do Bom Sucesso. Fun-dado em 1980 só a partir de 1996 é que começou a trabalhar para se tornar num verdadeiro rancho folclórico. José Miguel é o responsável e faz uma retrospectiva. “Alverca era uma zona rural. Só teve o seu desenvolvimento aquando da chegada em 1917 da OGMA, que deu uma alma mais industrial, e nos anos 60 com as Estradas de Portugal e a MAGUE”, recorda.

Nessa altura, quando ainda haviam quintas com searas e olivais em Alverca do Ribatejo, depois de um dia de trabalho “de sol a sol”, os trabalhadores ainda arranja-vam energias para fazerem uns bailaricos. “Sou de Sobral de Monte Agraço e o meu sogro deslocava-se para aqui para a apanha da azeitona. O folclore é uma espontanei-dade das danças do povo”, revela.

“As enciclopédias provam que o folclore vai desde o Norte até ao Algarve. Fomos influenciados na nossa zona por outras pessoas de fora que vieram para Alverca”, assegura João Pinto Pereira, secretário da direcção do rancho.

Quanto às recolhas são cada vez mais difíceis. São feitos os estudos e pesquisas dos trajes que se usavam nos finais do século XIX e início do século XX. “Acho que as pessoas nessa altura não viviam tão abas-tadamente que pudessem ter trajes para todas as ocasiões. Há o traje do campino e do salineiro, fruto da existência de salinas em Alverca”, afirma José Miguel.

Costumam dançar os verde gaios, as valsas e os fandangos. Parece que o futuro do rancho está garantido para o responsá-vel. “Temos bastante jovens e tentamos transmitir-lhes que somos agentes culturais e que o folclore não é só subir para cima de um palco.”

E terminamos esta nossa viagem pelas tradições folclóricas de Alverca do Ribatejo com o Grupo Etnográfico de Danças e Cantares de Alverca do Ribatejo (GED-CAR). Dos três grupos é o mais recente e foi fundado em 1996 por Manuela e Joaquim Dias.

“Folclore são os usos e costumes das pes-soas”, diz a esposa Manuela Dias, sentada ao seu lado, na sala onde guardam grande parte das recolhas que foram fazendo aos longo dos anos. São provenientes de Ponte de Sôr, Alto Alentejo, e como não conheciam bem Alverca começaram a falar com pessoas mais antigas para tentar saber um pouco mais sobre a história do folclore na cidade.

A nível das danças, Joaquim Dias foi quem pesquisou e ainda hoje sempre que vê um livro sobre folclore compra-o. A esposa dedicou-se mais ao estudo dos trajes da época. “Os trajes de trabalho são difíceis de encontrar em fotografias. Quem tem fotografias de pessoal a trabalhar no início do século? Grande parte deles são feitos em função da descrição oral. Temos algumas recolhas mesmo do lado de lá do Tejo, sempre tombando para a parte da Lezíria e Vila franca de Xira”, refere Manuela Dias. Os três ranchos de Alverca do Ribatejo vão continuar a desenvolver o trabalho em prol das raízes tradicionais. A próxima actuação em conjunto será duran-te as festas da cidade na noite de sábado, 27 de Junho, pelas 21h00.

Animação começou quarta-feira e prolonga-se até à próxima segunda

a presença dos três ranchos que existem na cidade. O Rancho Folclórico da Casa do Povo de Arcena, o Rancho Folclórico do Centro Social do Bom Sucesso e do Grupo Etnográfico de Danças e Canta-res de Alverca. A noite termina com a actuação de Quinzinho de Portugal que a partir das 23h30 porá toda a gente a dançar.

Domingo haverá missa às 16h00 e uma hora mais tarde começará a procissão em honra de São Pedro. Pelas 20h30, baile com o grupo “Musicar-te” e a partir das 22h00 é a vez do cantor português Toy subir ao palco.

Para o último dia de festa estão agendadas as marchas populares a par-tir das 21h00 e às 22h30, Mónica Sintra dará música a todos os presentes. Pelas 00h00 terá início o espectáculo de fogo de artifício, que encerrará as festas da cidade e de São Pedro 2009 em Alverca do Ribatejo.

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25 Junho 2009 | O MIRANTE44 | SUPLEMENTO FESTAS ALVERCA

Passar as noites de animação atrás do balcãoJosé Tomás , comerciante

Nascido em Alverca há meio século, José Tomás já teve vários estabeleci-mentos na cidade. Sempre fez a sua vida profissional na segunda maior freguesia do concelho de Vila Franca de Xira. Ac-tualmente a explorar o bar do estádio do Alverca queixa-se da crise. “Estou aqui há 8 anos e isto não está fácil. Já tive aqui fases más, boas e ultimamente têm sido só fases más”, lamenta, confessando que já não acredita na melhoria da situação. “Só vai dando para a bucha”, refere. Este ano vai estar nas festas de Alverca, como nos anos anteriores, mas a trabalhar. “Nem vou ter tempo de ver os artistas, vou estar a trabalhar no duro”, afiança.

Festas de Alverca ajudam a dar cor à cidade nos dias de VerãoTrabalhar em Alverca no Verão é um desafio para muitos dos comerciantes da cidade. Muitos clientes partem para férias e

também por isso as festas são um boa ajuda para dar vida e trazer movimento à freguesia

Uma festa que dinamiza a cidadePaula Braga, comerciante

Desde Setembro de 2006 que Paula Braga está instalada em Alverca. Abriu uma loja que diz ser “diferente”. Serve chás e produtos “gourmet” a clientes desejosos por uma experiência diferente. “Eu vivia em Alverca e na altura pensei que podia ser uma boa oportunidade para captar um nicho de mercado”, conta a interlocutora. Trabalhar em Alverca é “agradável e desafiante” e o negócio está a crescer. Este ano, porém, as receitas têm diminuído. “Tem sido um ano di-fícil e no meu negócio em particular os meses de verão são complicados porque as pessoas vão de férias”. A poucos dias do arranque das festas da cidade Paula

Quando o Verão é sinónimo de melhor negócio Adriana Pires, comerciante

Entre os catálogos de tratamentos estéticos está Adriana Pires, empresária com negócio montado na cidade de Alverca. Verão é sinónimo de fortaleci-mento de vendas. “Com a chegada do verão nota-se um aumento de procura, porque as pessoas querem estar em boa forma para a praia”, garante. “Nós so-mos um franchising e como temos muita publicidade a nível nacional acabamos por estar sempre atentos a tudo o que o mercado necessita e fazemos várias promoções”, refere a nossa interlocu-tora. Adriana diz que está implantada em Alverca há 4 anos e está satisfeita. “Por acaso nunca fui às festas de Alverca mas estou com curiosidade em ir este ano”, garante.

Uma cidade com a marca da aeronáuticaArtur Ferreira, aposentado

Para Artur Ferreira, “viver em Alver-ca é ter qualidade de vida, estar com a família e com os amigos”. O aposentado, natural da cidade, refere que profissional-mente já foi uma grande escola. “Alverca sempre foi um grande centro industrial e as OGMA eram a escola da industria na-cional”, afiança o homem que trabalhou nas OGMA, SEPNAV e Timex. “Para mim foi um privilégio”, assegura. Para Artur Ferreira, as festas são boas “mas talvez não fosse muito aconselhável meter tudo no mesmo sítio só com a intenção de ganhar dinheiro”.

Quando o trabalho se sobrepõe às festasDiogo Aguiar, comerciante

Com negócio montado há quase 30 anos, Diogo Aguiar já viveu de tudo um pouco. Momentos bons e maus. O ganha-pão em Alverca tem “corrido bem”, mas o fantasma da crise anda por aí e bateu-lhe à porta este ano. “O negócio neste momento não está bom, tal como em qualquer parte do pais, não é só em Alverca. Vai dando para viver mas com muito trabalho”, diz o homem da beira alta que se con-verteu em alverquense. O trabalho é tanto que, diz, não tem tempo para ir às festas.

A paixão das marchas populares Luísa Ferreira, comerciante

Há 10 anos que Luísa Ferreira montou uma loja. Reside há 26 anos em Alverca e a cidade foi a sua primeira escolha para montar o negócio. “Tenho a mi-nha vida feita aqui e é mais cómodo”, explica, enquanto garante que o negócio anda doente. Especialmente de verão. “Chegando a Julho e Agosto não se vê ninguém, desaparece tudo. As pessoas de Alverca vão mais aos centros comerciais, não se habituam a comprar aqui no comércio tradicional, não sei porquê”, lamenta. Diz que a cidade é uma terra de boa gente e Luísa Ferreira assegura que vai às festas. “Gosto muito de ver o ambiente e adoro marchas, onde até já entrei, aqui por Alverca”, diz.

Braga garante que é espectadora fre-quente. “Costumo ir porque é sempre um momento de animação”. A partir das 22h00 a cidade fica moribunda e as festas ajudam a dinamizar Alverca”, diz com um sorriso.