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GRUPO I - CLASSE III - Plenário TC 016.756/2003-0 (com 1 anexo) Natureza: Consulta. Órgão: Câmara dos Deputados. Interessado: Presidente da Comissão Especial da Reforma Trabalhista - Deputado Federal Vicentinho. Sumário: Consulta formulada por Comissão Parlamentar quanto à aplicabilidade aos conselhos de Fiscalização de Profissões Regulamentadas: de limitações impostas pela Lei Complementar 101/2000 - Lei de Responsabilidade Fiscal; da sujeição de seus funcionários admitidos até a vigência da Lei 9.649/98 ao regime jurídico da Lei 8.112/90; da fixação de data inicial de obrigatoriedade de prévia realização de concurso público para admissão de pessoal; dos limites de livre nomeação de servidores para cargos em comissão e da existência de limites quantitativos para a terceirização de atividades. Cumulação à consulta de solicitação de auditoria ou inspeção nas entidades, a fim de verificar o cumprimento das orientações normativas fixadas pelo Tribunal. Admissibilidade da consulta. Não-conhecimento da solicitação de auditoria ou inspeção. Impossibilidade jurídica da incidência das restrições estabelecidas pela Lei de Responsabilidade Fiscal aos conselhos, devendo tais entidades observar, apenas, os princípios e normas gerais do referido diploma legal. Não-cabimento da sujeição ao regime da Lei 8.112/90 dos servidores dos conselhos admitidos antes da edição da Medida Provisória 1.549/97, posteriormente convertida na Lei 9.649/98. Impossibilidade jurídica da transformação de emprego em cargo público, a teor do art. 243, § 1º, da Lei 8.112/90. Obrigatoriedade de prévia realização de concurso público, para admissão de pessoal, a contar do dia 18.5.2001, data da publicação no Diário da Justiça do julgamento proferido pelo E. STF no MS 21.797-9. Necessidade de os conselhos de fiscalização profissional adequarem suas instruções normativas internas ao art. 37, inciso V, da Constituição Federal, estabelecendo, ainda, o percentual mínimo de 50% dos cargos em comissão a serem preenchidos por empregados de carreira, a exemplo da

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GRUPO I - CLASSE III - PlenárioTC 016.756/2003-0 (com 1 anexo)Natureza: Consulta.Órgão: Câmara dos Deputados.Interessado: Presidente da Comissão Especial da Reforma Trabalhista - Deputado

Federal Vicentinho.

Sumário: Consulta formulada por Comissão Parlamentar quanto à aplicabilidade aos conselhos de Fiscalização de Profissões Regulamentadas: de limitações impostas pela Lei Complementar 101/2000 - Lei de Responsabilidade Fiscal; da sujeição de seus funcionários admitidos até a vigência da Lei 9.649/98 ao regime jurídico da Lei 8.112/90; da fixação de data inicial de obrigatoriedade de prévia realização de concurso público para admissão de pessoal; dos limites de livre nomeação de servidores para cargos em comissão e da existência de limites quantitativos para a terceirização de atividades. Cumulação à consulta de solicitação de auditoria ou inspeção nas entidades, a fim de verificar o cumprimento das orientações normativas fixadas pelo Tribunal. Admissibilidade da consulta. Não-conhecimento da solicitação de auditoria ou inspeção. Impossibilidade jurídica da incidência das restrições estabelecidas pela Lei de Responsabilidade Fiscal aos conselhos, devendo tais entidades observar, apenas, os princípios e normas gerais do referido diploma legal. Não-cabimento da sujeição ao regime da Lei 8.112/90 dos servidores dos conselhos admitidos antes da edição da Medida Provisória 1.549/97, posteriormente convertida na Lei 9.649/98. Impossibilidade jurídica da transformação de emprego em cargo público, a teor do art. 243, § 1º, da Lei 8.112/90. Obrigatoriedade de prévia realização de concurso público, para admissão de pessoal, a contar do dia 18.5.2001, data da publicação no Diário da Justiça do julgamento proferido pelo E. STF no MS 21.797-9. Necessidade de os conselhos de fiscalização profissional adequarem suas instruções normativas internas ao art. 37, inciso V, da Constituição Federal, estabelecendo, ainda, o percentual mínimo de 50% dos cargos em comissão a serem preenchidos por empregados de carreira, a exemplo da orientação fixada pelo art. 14 da Lei 8.460/92. Vedação à execução indireta de atividades fins abrangidas pelo Plano de Cargos e Salários dos conselhos, conforme firme jurisprudência do TCU e regulamentação dada pelo Decreto Federal 2.271/97. Resposta ao consulente. Arquivamento dos autos.

RELATÓRIO

Trata-se de Consulta formulada pelo Presidente da Comissão Especial da Reforma Trabalhista da Câmara dos Deputados, Deputado Vicentinho, mediante o Ofício 115-03 (fl. 2), acerca da aplicabilidade aos conselhos de Fiscalização de Profissões Regulamentadas das disposições contidas na Lei Complementar 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal); da sujeição dos empregados dessas entidades, admitidos antes da vigência da Lei 9.649/98, ao regime instituído pela Lei 8.112/90; da definição do marco temporal para exigibilidade de prévio concurso público para admissão de pessoal, bem como dos limites quantitativos aceitáveis de livre nomeação de funcionários para cargos em comissão e de terceirização de seus serviços.

No mencionado expediente, Sua Excelência esclarece que a solicitação decorre de questionamentos feitos pela Federação Nacional dos Servidores das Autarquias de

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Fiscalização do Exercício Profissional - Fenasera em representação encaminhada àquela Comissão Parlamentar (fl. 3).

A consulta, propriamente dita, encontra-se vazada nos seguintes termos:

“- se os Conselhos de Fiscalização Profissional estão subordinados às limitações contidas na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF);

- se os seus servidores admitidos até a vigência da Lei 9.649/98 estão subordinados ao regime da Lei 8.112/90 ou da CLT;

- se aos admitidos até 01/01/1990 aplica-se a transformação de emprego em cargo (art. 243, da Lei 8.112/90);

- se pode ser admitido como marco da rigorosa exigência de concurso público as contratações de pessoal o dia 28/03/2003 (publicação do Acórdão do STF na ADIN nº 1.717/6);

- se é correta a exigência de observar-se o disposto no art. 37/V da Constituição Federal a partir dessa data (28/03/2003), limitada em 50% as nomeações comissionadas de livre escolha e;

- se as terceirizações com inclusão de estagiários teria (sic) limite quantitativo (...). ”

Por fim, o consulente apresenta solicitação de realização de auditoria ou inspeção por este Tribunal, nas entidades referidas, a fim de verificar o cumprimento da orientação normativa que for emanada da presente consulta. A consulta é instruída com parecer jurídico acerca da matéria (fls. 4/11).

A matéria foi examinada pela unidade técnica nas instrução fls. 18/42, cujo teor reproduzo a seguir:

“4. Inicialmente, cabe destacar que o Of. 115-03, de 15/09/2003, que deu origem ao presente processo, apesar de ter sido autuado como SCN, preenche os requisitos estabelecidos pelo art. 264 do Regimento Interno do TCU para os casos de consulta, uma vez que se trata de dúvidas formuladas por autoridade prevista no inciso IV do mencionado dispositivo regimental sobre a aplicação de dispositivos legais a entidades jurisdicionadas a esta Corte de Contas.

I - Parecer Técnico-JurídicoA) Lei de Responsabilidade Fiscal5. Sobre a questão da subordinação dos conselhos de fiscalização profissional às

restrições impostas pela Lei Complementar nº 101/2000, o parecerista concluiu pela sua não aplicabilidade por considerar que, estando essas entidades incumbidas, essencialmente, do exercício do poder de polícia no que se refere à fiscalização do exercício das profissões regulamentadas, os gastos devem se ater, necessariamente a essa atividade, mesmo considerando os serviços administrativos postos à sua disposição para o desempenho de tal atribuição.

6. Isso porque ‘... se as contribuições estão limitadas aos custos do poder de polícia exercido pelos Conselhos, por meio de seus recursos humanos, não há como limitar-se o gasto com pessoal a 50% das receitas correntes, pois em tais circunstâncias não haveria destinação específica, para aplicar a outra metade remanescente’.

7. Ainda segundo o parecerista, considerando que o produto da arrecadação das contribuições dos conselhos deve ater-se ao necessário para custeio de sua atividade de fiscalização, pode-se admitir que a Lei de Responsabilidade Fiscal seja observada por

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essas entidades no que se refere às normas gerais de direito financeiro nela contidas, excluídas as limitações impostas pelos artigos 18 e seguintes.

B) Regime Jurídico dos Servidores8. No entender do parecerista, há que se fazer distinção entre os admitidos antes e

depois da edição da Lei nº 9.649, de 27.5.1998.9. A Constituição Federal de 1988, em sua redação original, estabeleceu que a

União deveria instituir regime jurídico único para os seus servidores, inclusive das autarquias, o que foi implementado por meio da Lei 8.112/90, que, nos termos do art. 243, § 1º, ‘transformou em cargos os empregos efetivos então providos, com seus ocupantes, que passaram da condição de celetistas para a de servidores públicos’.

10. Contudo, com a Emenda Constitucional 19, de 4.6.1998, foi dada nova redação ao art. 39 da Constituição Federal, ocasião em que foi abolida a obrigatoriedade do regime jurídico único para os servidores da União, suas autarquias e fundações públicas. Ainda segundo o parecerista, por ocasião do julgamento da ADIN 1.717, o Supremo Tribunal Federal considerou prejudicado o exame da constitucionalidade do art. 58, § 3º, da Lei 9.649/98, em virtude de não mais persistir a obrigação de regime jurídico único, diante da nova redação dada pela Emenda Constitucional 19/98 ao dispositivo em questão (art. 39 da C.F.).

11. Por essas razões, conclui o parecerista que os servidores dos conselhos admitidos até 27.5.1998 devem ser regidos pela Lei 8.112/90, ficando submetidos à legislação trabalhista os contratados na vigência da Lei 9.649/98.

C) Concurso Público12. De acordo com o parecer anexo aos presentes autos, a exigência de concurso

público passou a ser obrigatória a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988, inclusive para os conselhos de fiscalização profissional que, até então, eram considerados indiscutivelmente autarquias federais. Afirma o parecerista, contudo, que essa exigência não invalida as admissões e contratações até então realizadas (cf. Decisão do STF no julgamento do Agravo nº 248.696 e no RE nº 111.345-6).

13. Entende o parecerista que essa exigência, em tese, deveria permanecer mesmo após a edição da Lei 9.649/98. Contudo, afirma que com a controvérsia surgida com a norma da referida lei acerca da natureza jurídica dos conselhos, que passaram a ser considerados de caráter privado, ‘gerou o entendimento um tanto quanto de conveniência, no sentido de estar abolida aquela obrigatoriedade’.

14. Nessa linha, afirma o parecerista, o Tribunal de Contas da União tem, reiteradamente, exigido o concurso público. Contudo, citando o Acórdão 628/2003 - Plenário, afirma que o TCU tem tolerado a sua preterição para as admissões realizadas até 18.5.2001, data da publicação do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal no MS 21.797-9.

15. Com essas considerações, o parecerista entende que a data a partir da qual deve-se exigir o concurso público para novas contratações pelos conselhos deve ser o dia 28.3.2003, data de publicação do acórdão proferido pelo STF na ADIN 1.717, considerando ser esta decisão de efeito erga omnes, e não a do MS 21.797-9, de efeito restrito inter partes.

D) Comissionamentos e Terceirizações16. Argumenta o parecerista que, nos termos das disposições constantes do art. 37,

inciso V, da Constituição Federal, ‘as funções de confiança devem ser exercidas, exclusivamente, por servidores ocupantes de cargos ou empregos efetivos, enquanto que os

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comissionamentos, jungidos ao aspecto de confiança, devem ser preenchidos, preferencialmente, por servidores efetivos do quadro de carreira da entidade, em percentuais pré-fixados, destinando-se estes, apenas, às atribuições próprias de direção, chefia e assessoramento’ (grifo nosso). Conclui que, inexistindo lei que estabeleça para os conselhos os percentuais mínimos, seria plausível fixar o percentual de 50% dos comissionamentos para o pessoal com vínculo efetivo com as entidades, ficando a outra metade para livre escolha dos administradores.

17. De igual forma, entende o parecerista que, para que seja evitada a ocorrência de fraude à exigência de concurso público, os casos de terceirizações devem limitar-se às modalidades de mão-de-obra que não constituem ‘invasão ou substituição das atribuições próprias e inerentes ao pessoal do quadro de carreira’.

18. Assim, conclui o parecerista que, embora não aplicável aos conselhos as limitações impostas pela Lei Complementar 101/2000 quanto aos gastos com pessoal (50% da receita líquida), pelas razões expostas anteriormente, torna-se conveniente a observância aos ditames estabelecidos pelos arts. 18, § 1º, e 72 da referida Lei Complementar, até que a matéria seja devidamente disciplinada.

E) Possibilidade de normatização19. O parecerista alega que resultou evidenciado que os conselhos de fiscalização

profissional estão sujeitos à jurisdição do TCU (cf. ADIN 1.717-6 e MS 22.643-9/SC), cabendo ao Tribunal responder a consulta sobre matéria de sua competência, sendo-lhe, ainda, atribuído o encargo de acompanhar as despesas com pessoal, zelando pelo cumprimento dos limites estabelecidos pela Lei Complementar 101/2000, que lhe confere o poder de solucionar dúvidas eventualmente existentes acerca de sua aplicação.

20. Argumenta o parecerista que em alguns conselhos tem havido resistência no tocante à aplicação da Lei 8.112/90 (regime jurídico único) a seus antigos servidores, o que tem ocasionado dispensas imotivadas com vistas a meras substituições de ‘uns por outros’ ou sob a alegação de cumprimento da LRF quanto à contenção de despesa, reclamando, por essa razão, providências imediatas por parte do poder público.

21. Com isso, por entender viável, o parecerista entendeu que a providência adequada consistia exatamente em que a ‘Comissão de Trabalho’ da Câmara dos Deputados solicitasse ao Tribunal ‘a realização de diligências, inspeções ou auditorias’ nos conselhos para verificação da correção dos procedimentos objeto do parecer, o que poderia, no seu entender, ser precedida de consulta formal, na forma dos arts. 1º, inciso XXV, 264 e 265 do Regimento Interno do TCU.

22. Com essas ponderações e sugerindo a formulação de consulta ao Tribunal, o parecerista conclui que:

- os Conselhos de Fiscalização Profissional, embora sejam de reconhecida natureza autárquica, não estariam subordinados, em razão das suas particularidades, às limitações contidas na chamada Lei de Responsabilidade Fiscal sobre pessoal, consistente no percentual de 50% da sua receita corrente líquida, embora passíveis de observar as normas gerais de direito financeiro, no que couber;

- os servidores dessas entidades, admitidos até 27.5.1998, estão sujeitos ao regime jurídico único estabelecido pela Lei 8.112/90, devendo, por essa razão, ser transformados em cargos os empregos existentes e ocupados em 1º.1.1991, por força do disposto no art. 243 da referida Lei;

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- somente as contratações feitas a partir de 28.3.2003 (data de publicação do Acórdão proferido pelo STF na ADIN 1.717-6) estariam sujeitas ao rigor da exigência de concurso público;

- a partir de 28.3.2003 as funções de confiança e os comissionamentos estariam sujeitos ao comando do art. 37, inciso V, da Constituição Federal, limitando-se em 50% as nomeações de livre escolha por pessoas sem vínculo efetivo com as entidades;

- as terceirizações, até a edição de normativo específico, devem ater-se aos limites estabelecidos nos arts. 18, § 1º, e 72 da Lei Complementar 101/2000.

II - Análise23. Conforme se verifica do expediente que deu origem ao presente processo (cf. item

1 retro), todos os pontos objeto da consulta gravitam em torno da natureza jurídica dos conselhos de fiscalização profissional e dos recursos por eles arrecadados, sendo que alguns deles já foram amplamente discutidos por este Tribunal em diversos processos. Dessa forma, antes de adentrarmos na análise de cada item, convém que sejam feitas algumas considerações sobre essas questões.

24. De uma maneira geral, as leis que instituiram os conselhos de fiscalização estabeleceram expressamente a personalidade jurídica de direito público para essas entidades, embora nem todas tenham sido denominadas autarquias. Apesar das peculiaridades de cada um, os conselhos foram criados com a finalidade de zelar pela integridade e disciplina das diversas profissões.

25. Contudo, esses entes não constituem as autarquias administrativas que compõem o aparelho do Estado como entidades da administração indireta, uma vez que não são sustentadas pela União e, por essa razão, não são contempladas com dotações à conta da lei orçamentária anual. Os conselhos, considerando as características estabelecidas nas leis de criação, constituem as chamadas autarquias corporativas, criadas com atribuições de fiscalização do exercício de profissões regulamentadas, detendo, para tanto, poder de polícia, consistente na faculdade de aplicar multas pecuniárias e sanções disciplinares aos seus membros, suspender o exercício profissional ou até cancelar o registro de seus associados.

26. Os recursos arrecadados pelos conselhos de fiscalização são constituídos em sua maioria das anuidades pagas pelos profissionais que deles fazem parte e destinam-se ao custeio das atividades administrativas das respectivas entidades utilizadas no cumprimento de sua finalidade. Originários da Constituição Federal, por força das disposições do art. 149, a esses recursos são aplicados os princípios constitucionais e legais inerentes aos tributos e, enquadrando-se como contribuições parafiscais, estão sujeitos ao controle externo, a cargo do Congresso Nacional, com o auxílio do Tribunal de Contas da União.

26. Convém registrar que até o advento da Medida Provisória 1.549-35, de 9.10.1997, era pacífico o entendimento acerca da natureza pública dos conselhos e de suas receitas. Após a referida legislação, transformada na Lei 9.649, de 27.5.1998, esses entes, por força das disposições do art. 58 e seus parágrafos, passaram a ser ‘dotados de personalidade jurídica de direito privado’. A partir de então surgiram algumas controvérsias acerca dessas entidades, em especial sobre a natureza jurídica dos conselhos e das contribuições por eles arrecadadas e até mesmo em relação ao controle exercido pelo TCU sobre esses entes.

27. Essas dúvidas foram definitivamente esclarecidas após o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal da ADIN 1.717-6 (DF), mediante a qual aquela Corte Suprema julgou procedente o pedido para declarar a inconstitucionalidade do caput do art. 58 e §§

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1º, 2º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º do mesmo artigo da Lei 9.649/98, sob o fundamento de que a ‘interpretação conjugada dos artigos 5º, XIII, 22, XVI, 21, XXIV, 70, parágrafo único, 149 e 175 da Constituição Federal, leva à conclusão, no sentido da indelegabilidade, a uma entidade privada, de atividade típica de Estado, que abrange até poder de polícia, de tributar e de punir, no que concerne ao exercício de atividades profissionais regulamentadas, como ocorre com os dispositivos impugnados.’

28. Tratando-se, pois, de recursos públicos, o Tribunal de Contas da União tem a competência de fiscalizar sua aplicação, consoante as disposições do art. 70, parágrafo único, da Constituição Federal: ‘Prestará contas qualquer pessoa física ou entidade pública que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiro, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária’. Já o art. 5º, inciso V, da Lei 8.443/92 estabelece que a jurisdição do TCU abrange os responsáveis por entidades dotadas de personalidade jurídica de direito privado, desde que recebam contribuições parafiscais e prestem serviço de interesse público ou social. Portanto, no caso dos conselhos de fiscalização, a competência do TCU para fiscalizar a aplicação dos recursos por eles administrados decorre não só da natureza jurídica dessas entidades mas fundamentalmente da natureza pública das contribuições arrecadadas, não obstante, após o julgamento pelo STF da ADIN 1.717, encontrar-se pacificado o entendimento pela natureza pública dessas entidades.

29. Conclui-se, portanto, que, sendo públicas, essas contribuições devem ser utilizadas em consonância com os princípios básicos da Administração Pública, tais como o da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade, da supremacia do interesse público sobre o privado, da motivação, da razoabilidade e da economicidade.

30. Feitas essas considerações preliminares, passaremos a seguir ao exame das questões objeto da consulta.

31. Acerca da aplicação da Lei Complementar 101/2000 aos conselhos de fiscalização profissional, há que se registrar que o assunto foi objeto de menção pelo Exmo. Sr. Ministro Lincoln Magalhães da Rocha no Voto que fundamentou o Acórdão 3/2003 - Plenário, relativo a Recurso de Reconsideração interposto pelo Conselho Federal de Contabilidade contra deliberação relativa às contas do Conselho Regional de Contabilidade do Estado do Rio de Janeiro - CRC/RJ, exercício de 1996, em que se analisava a questão das aplicações financeiras por essas entidades, nos seguintes termos: ‘45. A Lei de responsabilidade fiscal - Lei Complementar 101, de 4.5.2000 -, apesar de abranger a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, inclusive as respectivas administrações diretas, fundos, autarquias, fundações e empresas estatais dependentes, não excluiu expressamente os conselhos de fiscalização das profissões regulamentadas de seu controle, mas, na prática, não lhes são extensivos, apesar destes se sujeitarem às disposições da Lei 4.320/64;’

32. Consta da referida deliberação ‘considerando’ no sentido de que ‘o Conselho Regional de Contabilidade, a exemplo dos conselhos congêneres, embora sejam autarquias federais, não participam da conta única do Tesouro Nacional, não se utilizam do SIAFI para movimentação de seus recursos próprios e não estão sujeitas às normas de finanças públicas voltadas para o controle da gestão fiscal a que se refere a Lei Complementar 101, de 4.5.2000;’.

33. Vale mencionar, ainda, o entendimento constante do Voto do Exmo. Sr. Ministro Humberto Guimarães Souto que fundamentou o Acórdão 811/2003 - Primeira Câmara no sentido de que ‘Os conselhos, embora sejam considerados autarquias federais, não

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participam da conta única do Tesouro Nacional, não se utilizam do SIAFI para movimentação de seus recursos próprios e não estão sujeitos às normas de finanças públicas voltadas para o controle da gestão fiscal a que se refere a Lei Complementar 101, de 4.5.2000.’

34. Não obstante isso, considerando que a aplicação da mencionada Lei de Responsabilidade Fiscal aos conselhos de fiscalização profissional não foi, ainda, objeto de discussão no âmbito desta Corte de Contas, entendemos oportuno fazer algumas considerações acerca da questão.

35. A Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF (Lei Complementar 101, de 4.5.2000) estabelece no Capítulo II normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal. O objetivo da LRF é estabelecer as normas de finanças públicas abrangendo os seguintes aspectos:

- ação planejada e transparente;- prevenção de riscos e correção de desvios que afetem o equilíbrio das contas

públicas;- garantia de equilíbrio nas contas, via cumprimento de metas de resultado entre

receitas e despesas, com limites e condições para a renúncia da receita e a geração de despesas com pessoal, seguridade, dívida, operações de crédito, concessão de garantia e inscrição em restos a pagar.

36. Vê-se, pois, que a LRF não revoga nem substitui a Lei 4.320/64, que se refere a normas gerais para elaboração e controle dos orçamentos e balanços. Contudo, elas encontram-se intimamente ligadas, de modo que, na existência de algum dispositivo conflitante, prevalece o contido na LRF que, além de tratar-se de Lei Complementar é mais recente.

37. A LRF estabelece no seu art. 1°, §§ 2° e 3° quais órgãos se subordinam ao seu regime, da seguinte forma:

‘Art. 1º Esta Lei Complementar estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal, com amparo no Capítulo II do Título VI da Constituição.

(...)§ 2º As disposições desta Lei Complementar obrigam a União, os Estados, o Distrito

Federal e os Municípios.

§ 3º Nas referências:I - à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municipios, estão compreendidos:a) o Poder Executivo, o Poder Legislativo, neste abrangidos os Tribunais de Contas,

o Poder Judiciário e o Ministério Público;b) as respectivas administrações diretas, fundos, autarquias, fundações e empresas

estatais dependentes;II - a Estados entende-se considerado o Distrito Federal;III - a Tribunais de Contas estão incluídos: Tribunal de Contas da União, Tribunal

de Contas do Estado e, quando houver, tribunal de Contas dos Municípios e Tribunal de Contas do Município.

Art. 2º Para os efeitos desta Lei Complementar, entende-se como:I - ente da Federação: a União, cada Estado, o Distrito Federal e cada Município;

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II - empresa controlada: sociedade cuja maioria do capital social com direito a voto pertença, direta ou indiretamente, a ente da Federação;

III - empresa estatal dependente: empresa controlada que receba do ente controlador recursos financeiros para pagamento de despesas com o pessoal ou de custeio em geral ou de capital, excluídos, no último caso, aqueles provenientes de aumento de participação acionária;

(...)’38. Conforme se verifica, a LRF não alcança todo e qualquer órgão ou entidade da

administração pública. Foram excluídos aqueles que não guardam relação de dependência financeira total ou parcial com o Tesouro Nacional. Ao fazer referência no art. 1°, § 3°, inciso I, letra ‘b’, a empresa estatal dependente, definida como sendo aquela que recebe do controlador recursos para pagamento de despesas de pessoal, de custeio geral ou de capital, a Lei determinou, expressamente, que apenas essas empresas dependentes devem submeter-se a todas as determinações nela contidas (cf. art. 2°, inciso III).

39. No caso dos conselhos, conforme amplamente discorrido na presente instrução, apesar de terem sido criados, em sua maioria, como autarquias, esses entes não constituem as autarquias administrativas que compõem o aparelho do Estado como entidades da administração indireta, uma vez que não são sustentados pela União, não sendo, por conseguinte, alcançados pelas limitações impostas pela LRF, posto que contêm procedimentos diretamente relacionados com a chamada ação planejada, da qual não fazem parte, consistente em planos previamente traçados, previstos na Constituição Federal e revigorados pela nova Lei, traduzidos nos seguintes instrumentos: Plano Plurianual - PPA, Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO e Lei Orçamentária Anual - LOA.

40. Não obstante isso, sendo públicos os recursos por eles administrados, a execução de seus orçamentos deve obedecer aos princípios e normas de direito público aplicados à Administração Pública Federal, inclusive os constantes da LRF, a exemplo daqueles previstos nos arts. 15 e 21, parágrafo único, da referida Lei, que estabelecem, respectivamente, regras acerca de geração de despesa ou assunção de obrigação e sobre aumento de despesa com pessoal, neles estando implícitos os princípios do planejamento, transparência e moralidade.

41. A segunda questão objeto da consulta diz respeito à aplicação da Lei 8.112/90 aos servidores dos conselhos de fiscalização admitidos até vigência da Lei 9.649/98. Convém registrar que esse assunto, no âmbito deste Tribunal, somente foi abordado concretamente no TC 016.937/91-0 (Sigiloso), referente a Denúncia contra atos do então Presidente do Conselho Federal de Odontologia, Sr. João Hildo de Carvalho Furtado, ocasião em que o Tribunal, ao apreciar o referido processo, decidiu, dentre outras questões, recomendar àquela entidade a aplicação a seus servidores do Regime Jurídico Único instituído pela mencionada Lei, consoante o item 2 da Decisão 111/93 - Plenário.

42. Ocorre que, inconformado com os termos da citada deliberação, o Conselho Federal de Odontologia impetrou junto ao Supremo Tribunal Federal o Mandado de Segurança 21.797-9. Indeferida a Liminar e ouvida a Procuradoria-Geral da República, o Relator Exmo. Sr. Ministro Carlos Velloso opinou em seu Voto pelo indeferimento do mandamus.

43. Contudo, o Ministro Maurício Corrêa pediu vistas dos autos por discordar exatamente sobre a sujeição dos servidores das entidades de fiscalização profissional aos ditames da Lei 8.112/90, uma vez que, no seu entender, o regime jurídico único somente se

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aplica quando se trata de autarquias típicas ou especiais, nos termos referidas pelo art. 243 da Lei 8.112/90, disposição que, a seu ver, ‘em face do caráter geral de que se reveste, não teve o efeito de revogar o art. 1º do Decreto-lei 968/69, que excluiu os conselhos de fiscalização da atividade profissional da incidência das normas relativas a pessoal, cuja despesa é coberta por receita proveniente das contribuições dos profissionais a ela vinculados.’

44. Posteriormente, em face da controvérsia instaurada, pediu vista o Ministro Ilmar Galvão, adiando, assim, o julgamento do MS. Os fundamentos utilizados pelo Ministro foram no sentido de que a questão objeto do mandamus relativa à aplicação da Lei 8.112/90 aos empregados do CFO dizia respeito a ‘simples recomendação, ainda assim sobrestada em caso análogo, para audiência do órgão governamental responsável pela política de pessoal do Governo Federal’. Sendo assim, entendeu o Ministro por aplicar ao caso a diretriz já adotada pelo STF de suscitar preliminar de não conhecimento do mandado de segurança no que tange à recomendação, uma vez desprovida de caráter cogente (cf. MS 21.462, 21.534 e 21.683).

45. De fato essa questão encontrava-se sobrestada no âmbito deste Tribunal, após apreciação de denúncia formulada contra os Conselhos de Fiscalização, nos autos do TC 015.595/1992-7, em que foi suscitada omissão continuada dessas entidades quanto à aplicação do Regime Jurídico Único a seus empregados. Nesses termos, por meio da Decisão 235/92 - Plenário, o Tribunal, ao conhecer da denúncia, decidiu sobrestar o julgamento do processo e solicitar, preliminarmente, a manifestação da então Secretaria de Administração Federal sobre a matéria.

46. Em resposta a essa solicitação, a então SAF informou ao Tribunal que a matéria encontrava-se pendente de julgamento no âmbito da Justiça Federal, em razão do Mandado de Segurança coletivo 92.00.05.5931. Promovida diligência junto à 9ª Vara da Justiça Federal do Distrito Federal, obteve-se a informação de que o mandado de segurança foi sentenciado em 19.9.1997, sendo denegada a segurança pretendida, sob o entendimento da ausência de direito líquido e certo para amparar a pretensão dos impetrantes.

47. Verifica-se, pois, que na esfera judicial a questão foi analisada, chegando-se à conclusão pela não aplicação da Lei 8.112/90 aos empregados dos conselhos de fiscalização. Nesse sentido, embora o MS 21.797-9 não tenha sido conhecido nesse ponto em particular, merece destaque as razões expostas pelo Ministro Maurício Corrêa no seu Voto Vista, em que foi analisado o mérito da questão nos seguintes termos, in verbis:

‘14. Quanto à submissão dos empregados do impetrante ao Regime Jurídico da União, a teor do que expressa o artigo 243 da Lei 8.112/90, quando diz que a ele se submetem os servidores das autarquias, inclusive daqueles servidores das denominadas autarquias especiais corporativas, quer me parecer merecer o deferimento da segurança.

Começo por retomar o Decreto-lei 968/69, que em seu artigo 1° determinou que as autarquias criadas por lei para fiscalização do exercício profissional, que são mantidas com recursos próprios e não recebem subvenções ou quaisquer transferências por conta do Orçamento da União, regular-se-ão pela respectiva legislação específica, a elas não se aplicando as normas legais sobre pessoal.

A Lei 4.324/64, instituidora do impetrante, em seu artigo 24 assegura que ‘o pessoal a serviço do Conselho Federal e dos Conselhos Regionais será regido pela legislação trabalhista e inscrito, para efeito da previdência social, no Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Comerciários‘

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15. Importa saber se a Lei 8.112/90 teria revogado o artigo 1° do Decreto-lei 968/69, tanto mais que a Lei do Regime Jurídico da União é Lei Geral, enquanto que o Decreto-lei que regulamenta as exceções é Lei Especial. Não me parece que tal Decreto-lei estaria revogado, tão-somente porque no contexto do artigo 243 da Lei 8.112/90, fêz-se referência a autarquia especial. Veja o caso do Banco Central do Brasil, por exemplo, cuja inconstitucionalidade do artigo 251 da Lei do Regime Jurídico da União, recentemente fora declarada. Ora, é ele autarquia da União Federal e por ela mantido. Este sim, apenas para citar uma amostragem, poderia ser autarquia especial a que se refere o citado artigo. Mas aí há um ingrediente que o distancia das denominadas autarquias corporativas, na verdade entes paraestatais, sui generis, atípicos, anômalos, ou como querem outros, paradministrativos (D’ Andréa Ferreira ‘Comentários à Constituição’, Freitas Bastos’, v. 3°, p. 50) entretanto essa excentricidade do tipo jurídico do impetrante não pode ser analisado como autarquia especial, tais como são aquelas que integram o complexo administrativo da União Federal, porque por esta são disciplinadas, organizadas, como entes descentralizados do Poder Público para o desempenho de determinadas atividades públicas estatais delegadas. Os Conselhos Fiscalizadores das Profissões tanto não chegam: são meros órgãos delegados, quase que abstratos na geografia axiológica do Estado, para exercerem, dentre profissionais liberais, integrantes do núcleo privado, tarefas que pela sua destinação de prestadores de serviços públicos especializados, de altíssimo conteúdo social, comportam e integram, subliminarmente, ação estatal, de forma indireta.

Por isso mesmo, para compreender os contornos jurídicos dos Conselhos Profissionais, ter afirmado o Min. Rafael Mayer, por realizarem parcelas de função administrativa, incumbe-lhes o Estado a fiscalização do exercício profissional das profissões liberais, para melhor e mais consentâneo desempenho dessa missão estatal sendo chamados a participar de sua constituição, em caráter corporativo, os próprios integrantes da classe, interessados e capacitados, em razão do seu nível, a velar pela integridade e disciplina profissional, em favor do interesse geral da sociedade. (AC 93.02.044017, TRF-2º Turma, un., DJ 27.12.94).

Ora, pretender dar aplicação literal ao artigo 39 da Carta da República, para dizer que os Conselhos Profissionais são típicas autarquias, é querer, permissa venia, passar a carreta na frente dos bois e dar exegese que extrapola o razoável, o lógico, e ir além, muito além da raiz que atavicamente lhes deu origem.

Não são, por isso mesmo, os empregados desses organismos os destinatários da norma que impõe a sujeição, como verdadeiros servidores públicos, ao Regime Jurídico Único da União, que se transmudou em único para equa1izar em meio à variegada composição de regimes legais que regulavam as relações de trabalho dos antigos funcionários públicos, hoje redefinidos como servidores públicos, fato esse preexistente ao atual ordenamento constitucional.

16. Com efeito, os empregados dos Conselhos Profissionais nunca foram tidos como integrantes de quadros de carreira do serviço público. Seria o cúmulo do absurdo que pretendesse o Constituinte, ao votar o artigo 39 da Carta Política, o que não fez, ter querido dizer que tal regime e planos de carreira para ‘os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas’ - porque assim é o que diz literalmente a norma - tivesse instituído também incluir os empregados de Conselhos Profissionais, sob a alcunha de servidores públicos, como beneficiários da infortunada classificação de autarquia especial, que na lei ordinária fez-se dimensionar. E mais

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absurdo ainda seria querer interpretar que o legislador ordinário, submisso ao Texto Maior, ao fazer menção a autarquia especial no citado artigo 243, igualmente quisesse significar que nessa autarquia especial se englobassem pessoas totalmente distantes e situadas fora da abrangência do conceito, já pulverizado pela Constituição Federal, leis, doutrina e jurisprudência, do que seja servidor público, cuja estruturação jurídica faz implicar um mundo de premissas.

17. Se a Constituição nada disse sobre tal extravagância, para especificar o seu conceito, fazendo referência apenas, a meu ver, a típica autarquia que integra os seus serviços, muito menos poderia fazê-lo o legislador ordinário, donde não se pode extrair de um mero vocábulo, que deve ter interpretação contida, a teratológica, data venia, afirmação de que tais empregados são servidores públicos.

Tais são as razões, neste particular, porque não posso entender que a Lei 8.112/90 tenha revogado a norma especial do Decreto-lei 968/69, atento inclusive ao artigo 2° e seus parágrafos da Lei de Introdução ao Código Civil, notadamente pela redação de seu parágrafo segundo, sob a égide do qual ‘a lei nova que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.’

Dessa forma não posso deixar de entender que o Decreto-lei 968/69, não tenha sido recepcionado pela vigente Constituição Federal.

Para tanto, basta-me tudo o que foi exaustivamente dito, para chegar à conclusão de que já havendo lei específica que regrou o regime dos empregados do impetrado como o da CLT, que possam agora ser convertidos em servidores públicos.

Celetistas também o são os servidores da Ordem do Advogados do Brasil, segundo a definição, ora introduzida, na espécie, pelo artigo 79 da Lei 8.906/94, que disciplinou inclusive a situação híbrida que outrora vigia para o seu quadro de pessoal.

18. Caso ainda assim não se satisfaça que se tenha como revogada a norma específica que antes transcrevi, não posso ter como aplicável a esse gênero de entidade paraestatal, a regra insculpida no artigo 243, da Lei 8.112/90, em face da imperatividade do preceito contido no art. 39, da Constituição Federal, como já assinalado. Mesmo que esses Conselhos sejam autarquias, segundo a definição de uns, porém nunca deixarão de ser autarquias corporativas peculiares, em seu sentido particularíssimo contudo, jamais aquelas especiais integrantes indiretas do Serviço Público, como tal organizado em carreira à imagem do estampado dogmaticamente na Constituição.

19. Para os efeitos da Lei 8.112/90, servidor público é pessoa legalmente investida em cargo público. Cargo público é cargo criado por lei, com vencimento pago pelos cofres públicos. Sendo assim, é certo não preencherem os empregados dos Conselhos os requisitos básicos, fundamentais e indispensáveis para que sejam denominados servidores públicos. É de se perguntar: suportaria a União, e em cascata os Estados-membros, sobretudo esses que se acham com suas finanças caoticamente comprometidas e combalidas, serem compelidos a admitir como servidores públicos, conforme estaria a determinar o artigo 243, da Lei 8.112/90, todos os empregados das centenas de Conselhos existentes no país?

Acredito que seria mais um ingrediente a acrescentar-se ao estágio pre-falimentar da própria Administração Pública. Concluo, portanto, entendendo que os empregados dos Conselhos não são servidores públicos

20. E mais.No caso das autarquias corporativas é claramente inaplicável o regime da Lei

8.112/90. Não podem os empregados das entidades de profissionais liberais ser

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considerados servidores públicos, precipuamente porque não são remunerados pelos cofres públicos. Ora, o próprio artigo 2° do Regime Jurídico, estabelece que ‘para os efeitos desta lei, servidor é a pessoa legalmente investida em cargo público’, acrescentando em seguida o artigo 3º que

‘Cargo público é o conjunto de atribuições e responsabilidades previstas na estrutura organizacional que devem ser cometidas a um servidor.

Parágrafo único. Os cargos públicos, acessíveis a todos os brasileiros, são criados por lei, com denominação própria e vencimento pago pelos cofres públicos, para provimento em caráter efetivo ou em comissão.’

21. Esses entes sui generis, como é o caso do impetrante, têm renda própria, com a qual são cobertas as despesas com o pessoal, sua receita provém das contribuições dos profissionais jurisdicionados à sua área, e de outros rendimentos definidos por eles, não sendo por isso mesmo os seus empregados servidores públicos.

Os artigos 37, 11, e 39 da CF, apresentam regras básicas e mecanismos próprios para o ingresso de qualquer pessoa no serviço público, e segundo a exegese dos mencionados preceitos o primeiro desses requisitos é o da submissão a concurso de provas ou de provas e títulos, obedecidos a ordem e o prazo de sua validade. Fora disso se verifica inversão absoluta do princípio basilar definido no caput do artigo 37, relativamente à legalidade, impessoalidade moralidade e publicidade. As admissões nos Conselhos Profissionais de seus empregados, são feitas e seguramente foram feitas segundo critérios eleitos por essas entidades, como se sabe, ao sabor de conveniências, muitas vezes estritamente pessoais, segundo critério de um modo geral subjetivos de seus administradores. Não possui qualquer suporte lógico conceber que se possa, como num passo de mágica, transformar empregos privados regidos sob a ótica do ordenamento trabalhista, em cargos públicos. Essas investiduras dependem, em primeiro lugar, da existência de cargos públicos criados por lei, o que caracterizaria, caso o Estado os instituísse para o impetrante, a indébita intromissão estatal em área de competência gerencial daquelas pessoas, que investidas na condição de administradores, por delegação da coletividade dos integrantes da respectiva categoria, comandam a administração de seu órgão de controle profissional, de natureza conceptual peculiar e corporativa.

22. Seria um contra-senso que a ação estatal se fizesse em setor de exclusiva atuação da iniciativa privada, para impor o cumprimento de certo regime para os seus empregados, de que defluiriam prerrogativas, privilégios, ônus e encargos, que ao Estado não é dado constranger ao ente paraestatal a que o façam. Nenhuma lei criou cargos públicos em Conselhos Profissionais, seria absolutamente inadmissível, inconcebível e ininteligível mesmo, que por uma interpretação analógica e ampliativa, viesse o Estado a exigir que essa categoria de empregados se convertesse a servidores públicos, circunstância que por si só já acarretaria ele mesmo, pesados ônus, decorrentes das conseqüências dessa absurda metamorfose.

Que dizer da seguridade social, como ficariam os encargos da União, dos servidores e dos Conselhos?

23. Pela mesma forma, não vejo como se possa buscar supedâneo no artigo 19 do ADCT/88, a toda evidência inaplicável aos empregados dos Conselhos Federais de Fiscalização do Exercício Profissional, pois esse benefício alcança apenas e tão-somente os servidores da administração autárquica, não os empregados das autarquias corporativas peculiares (Rectius: paraestatais e paradministrativas), que admitidos sob a proteção da legislação trabalhista, não integram nenhuma carreira do Serviço Público.

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Não há que se cogitar, portanto, de estabilidade para o efeito de cumprimento do mencionado artigo 19, do ADCT.

24. Por último, valho-me do que acaba de escrever o prof. J. E. Carreira Alvim, em monografia, que dele recebi e a ser publicada, sobre ‘Autarquia Corporativa. Natureza Jurídica. Regime de Pessoal’, em que S.Exa, salienta:

‘Penso que o engessamento das entidades corporativas na moldura da autarquia tradicional ou mesmo da especial stricto sensu, presas à disciplina da Lei 8.112/90, não se limita ao universo salarial dos servidores; vai além importando no reconhecimento de que se lhes aplicam as normas sobre acumulação de cargos (art. 37, XVII); os limites globais e condições para operações de crédito externo e interno (art. 52,VII); será de iniciativa do Presidente da República as leis de criação de cargos e funções ou empregos ou aumento de remuneração (art. 61, § 1°, lI, a); dívida pública externa e interna sujeita a lei complementar (art. 163, 11); participação no orçamento anual da União, com a sua inclusão no orçamento fiscal (art. 165, § 5°, I); estabilidade no serviço (art. 19 do ADCT); revisão dos direitos dos inativos e pensionistas (art. 20 do ADCT)’.

25. Situação surrealista essa dos autos. De um lado, está o Governo Federal empenhadíssimo no enxugamento da máquina administrativa, no que diz respeito ao pessoal do serviço público, sob a alegação de falta de recursos para mantê-lo, tentando inclusive, extinguir a estabilidade; de outro o próprio Estado a criar condições para que esse número seja aumentado...

26. Diante dessas circunstâncias, Sr. Presidente, meu voto, nesta parte, concede a segurança para que o impetrado se abstenha de exigir do impetrante a compulsória obrigatoriedade de fazer sujeitar os seus empregados ao Regime Jurídico da União, de que trata a Lei 8.112/90, por inaplicável na espécie, rendendo as minhas homenagens ao e. Relator, porque neste ponto dele divirjo.’

48. Conforme defendido pelo Ministro Maurício Corrêa no transcrito Voto Vista, consoante as disposições do art. 1º do Decreto-lei 968/69, os conselhos de fiscalização encontram-se submetidos às suas legislações específicas, não se lhes aplicando as normas de caráter geral relativas às autarquias federais como no caso da Lei 8.112/90. Ocorre que, em se tratando de norma especial, o referido art. 1º do Decreto-lei 968/69 não pode ter sido revogado pela Lei 8.112/90. Ademais, os empregados dos conselhos não preenchem os requisitos básicos dos chamados ‘servidores públicos’ na forma estabelecida pelo Regime Jurídico Único, ou seja, esses empregados não são detentores de cargos públicos (criados por lei, com vencimento pago pelos cofres públicos). Os recursos arrecadados por essas entidades se constituem das contribuições pagas por seus associados e não fazem parte do Orçamento Geral da União. Assim, exatamente em função do caráter especial dessas entidades que seus empregados são subordinados à legislação trabalhista, regime esse expresso em algumas leis de criação dos conselhos, a exemplo da Lei 4.324/64 (Conselhos de Odontologia) e da Lei 5.766/71 (Conselhos de Psicologia).

49. De qualquer forma, se alguma dúvida existia acerca da legislação aplicável ao pessoal dos conselhos, essa questão foi devidamente esclarecida com a edição da Medida Provisória 1.549/97, em 6.11.1997, convertida na Lei 9.649, de 27.5.1998, que após o julgamento da ADIN 1.717, em 7.11.2002, teve o seu art. 58 considerado inconstitucional, mantendo-se apenas o § 3º, que estabelece o regime da CLT para os empregos dos conselhos. Sendo assim, diferentemente do entendimento defendido pelo parecerista, não há que se falar em aplicação do Regime Jurídico Único aos empregados dos conselhos de

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fiscalização profissional mesmo antes do advento da Medida Provisória 1.549, de 6.11.1997, convertida na Lei 9.649, de 27.5.1998, restando prejudicada, por essa razão, a transformação de emprego em cargo prevista nas disposições do art. 243 da Lei 8.112/90.

50. Acerca da exigência de concurso público para contratação dos empregados dos conselhos de fiscalização há que se esclarecer que essa questão encontra-se pacificada no âmbito desta Corte de Contas, tendo o Tribunal, mediante a Decisão 830/96 - Plenário, firmado o seu entendimento:

‘Aos Conselhos de Fiscalização do Exercício Profissional aplica-se o disposto nos incisos II e XVII do art. 37 da Constituição Federal, estando os mesmos obrigados à realização de concurso público para preenchimento de seus cargos/empregos, ficando conseqüentemente vedados a ascensão funcional e o acúmulo de cargos’.

51. E nesse sentido existem diversas deliberações proferidas por este Tribunal onde há determinações de regularização de situações de contratação de pessoal sem a observância da realização de concurso público. Contudo, a obrigatoriedade de realização de concurso público somente se tornou efetiva a partir de 6.6.1990, data da publicação no Diário Oficial da União da Decisão proferida pelo Plenário na Sessão de 16.6.1990, por ocasião da apreciação do TC 006.658/89-0 (Ata 21, Anexo II), ocasião em que foi analisada a questão por esta Corte de Contas.

52. Há que se esclarecer que, por algum tempo, apesar de reconhecer a sujeição das contratações efetivadas pelos conselhos de fiscalização aos ditames do art. 37, inciso II, da Constituição Federal, o Tribunal apenas determinava àqueles entes a observância de concurso público para contratação de pessoal, sem que se tornassem nulas as admissões efetivadas em descumprimento a essa regra. Entendia o Tribunal que, estando sub judice no Supremo Tribunal Federal questões relativas a legislação aplicável ao pessoal dos conselhos (cf. MS nº 21.797-9), ‘não haveria justiça em negar a boa-fé, tanto dos dirigentes da Entidade quanto das pessoas que efetivamente foram contratadas, em relação à aplicabilidade, ou não, do concurso público’, privilegiando, assim, o princípio da segurança jurídica (cf. Voto do Ministro Benjamin Zymler proferido no TC 700.105/96-4).

53. Esse entendimento encontra-se firmado em diversas deliberações, tais como Acórdão 50/2001 - Primeira Câmara; Decisão 31/2001 - Plenário; Acórdão 179/2000 - Plenário; Decisão 133/2000 - Plenário; Acórdão 213/99 - Plenário; Decisão 123/99 - Segunda Câmara; Decisão 69/99 - Plenário; Acórdão 212/98 - Segunda Câmara; Acórdão 209/98 - Segunda Câmara. No entanto, a opinião é de que ‘a admissão não é para o ingresso nos quadros do funcionalismo público mas sim uma relação trabalhista normal ex-labore e não sob a égide da Lei 8.112/90’, consoante expresso no Voto do Exmo. Sr. Ministro Lincoln Magalhães da Rocha, proferido no TC 725.038/1997-7. Ademais, esta Corte de Contas entende que os conselhos podem realizar processo seletivo - ‘não com o rigor exigido para os órgãos da Administração Pública Federal -, como forma de resguardar os princípios balisadores da administração pública definidos no mesmo artigo a Constituição: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.’ (cf. Voto do Exmo. Sr. Ministro Iram Saraiva proferido no TC 021.750/1994-7).

54. Nesse sentido, e de forma esclarecedora, são as considerações feitas pelo Ministro Augusto Sherman Cavalcanti acerca da realização de concurso para o preenchimento de cargos nos diversos conselhos de fiscalização, constantes da proposta de decisão que fundamentou o Acórdão 42/2002 - Primeira Câmara, nos seguintes termos:

‘4.Conforme apontado acima, a posição reiterada desta Corte tem sido no sentido de que os Conselhos Profissionais encontram-se obrigados a promover concurso público

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previamente à contratação de pessoal. No sentido dessas decisões, concurso público é, dentre outras características, aquele amplamente divulgado ao conhecimento público, no qual restem pública e previamente estabelecidos os requisitos para candidatura e a sistemática de avaliação dos candidatos, e garantam objetividade na avaliação. Não há como considerar que meros processos seletivos, de publicidade e isonomia limitados, atendem aos ditames constitucionais incidentes sobre entidades regidas pelo direito público (art. 37, inciso II, da CF). Ressalto, aqui, não se estar afirmando que os conselhos devem promover concurso público nos moldes da Lei 8.112/90, mas sim conforme determinação e princípios constitucionais, nos moldes, por exemplo, daqueles já promovidos por diversas empresas estatais.

5.Importante ressaltar, ainda, que o fato de o regime jurídico trabalhista adotado pelos conselhos ser aquele estabelecido na Consolidação das Leis do Trabalho em nada altera a incidência da determinação constitucional, vez que expressamente incidente sobre cargos e empregos públicos (art. 37, inciso II, da CF-88).

6.Quanto à serem regidas pelo direito privado, o art. 58 da Lei 9.649/98, citada pela Recorrente, efetivamente confere caráter privatístico aos conselhos de regulamentação e fiscalização profissionais. Não obstante, tal dispositivo legal ainda se encontra com execução e aplicabilidade suspensas por medida cautelar, deferida pelo Supremo Tribunal Federal, em 22.9.1999, na ADIn 1717-6. Tendo aquela Corte considerado, ainda que preliminarmente, que existem indícios de inconstitucionalidade no dispositivo legal que confere aos conselhos natureza jurídica de direito privado, razão não há para que o TCU modifique, agora, seu entendimento. Pelo contrário, tal decisão, ainda que em sede liminar, reforça a posição de que os conselhos detém natureza jurídica de direito público.

7.Destaco, ainda, que a reiterada posição desta Corte tem sido bastante amena e pragmática, pois tem conferido apenas efeito ex nunc às determinações para que os conselhos não contratem pessoal sem a prévia promoção de concurso público.’

55. No entanto, a partir de 9.3.2000, com o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal do MS 21.797-9, esta Corte de Contas estabeleceu essa data como marco para que fosse exigido dos conselhos não só a observância de realização de concurso público para as admissões por eles efetuadas, como também que as contratações realizadas em desconformidade com essa orientação fossem tornadas nulas. Isso porque entendeu o Tribunal que a partir dessa data não mais subsistia dúvida sobre a natureza pública dos conselhos de fiscalização profissional, condição necessária para a exigência de cumprimento das disposições do art. 37, inciso II, da Constituição Federal e da Súmula 231 da Jurisprudência do TCU. E assim seguiram diversos julgados deste Tribunal, a exemplo dos Acórdãos 136/2003, 137/2003 e 138/2003, todos da 2ª Câmara.

56. Posteriormente, ao examinar as contas do Conselho Regional de Fonoaudiologia da 3ª Região, relativas ao exercício de 2000 (TC 010.272/2001-2), o Tribunal, ao acatar as razões expostas pelo Relator, Exmo. Sr. Ministro Guilherme Palmeira, decidiu rever o seu posicionamento acerca da data a partir da qual deveria ser exigido o cumprimento, pelos conselhos de fiscalização, da obrigatoriedade de realização de concurso público para admissão de pessoal. Essa decisão teve como fundamento o fato de que, tratando o MS 21.797-9 de contenda impetrada pelo Conselho Federal de Odontologia contra deliberação deste Tribunal, não seria razoável exigir-se dos demais conselhos a observância da decisão ali adotada a contar da data em foi prolatada, mas sim a partir da data de sua publicação no Diário da Justiça (18.5.2001).

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57. Sendo assim, a partir da mencionada deliberação, o Tribunal passou a exigir de todos os conselhos o cumprimento das disposições do art. 37, inciso II, da Constituição Federal e da Súmula 231 da Jurisprudência do TCU, bem como a nulidade das admissões efetuadas com inobservância da realização de concurso público, estabelecendo, contudo, como marco a data de 18.5.2001, conforme se verifica dos Acórdãos 814/2003, 1.281/2003 e 1.367/2003 - Plenário e Acórdãos 1.219/2003 e 1.221/2003 - Segunda Câmara, além de outros.

58. O consulente, com base no parecer anexo aos presentes autos, entende que esta Corte deveria fixar como marco para que essa exigência seja cumprida pelos conselhos a data de publicação do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal por ocasião do exame de mérito da ADIN 1.717 (28.3.2003), posto que este tem efeito ‘erga omnes’, enquanto a deliberação do MS 21.797-9, considerada pelo Tribunal, é de efeito restrito ‘inter partes’.

59. Pelo que se depreende da síntese feita acerca de como foi conduzida a questão no âmbito deste Tribunal, pode-se concluir que não assiste razão ao consulente. Acontece que a obrigatoriedade de realização de concurso público decorre da natureza pública dos órgãos e entidades, porquanto trata-se de uma exigência constitucional, o que se estende a todos os entes públicos, inclusive às entidades controladas direta ou indiretamente pela União, mesmo que visem a objetivos estritamente econômicos, em regime de competitividade com a iniciativa privada, consoante os termos da Súmula 231.

60. No caso dos conselhos de fiscalização, conforme se observa, a partir da edição da Medida Provisória 1.549/97, em 6.11.1997, convertida na Lei 9.649, de 27.5.1998, é que surgiram algumas dúvidas acerca da natureza dessas entidades e dos recursos por elas arrecadados, dentre outras. Por essa razão, e considerando que tais questões encontravam-se inseridas nos objetos do MS 21.797-9 e da ADIN 1.717-6, o Tribunal entendeu que não seria razoável decidir em caráter definitivo sobre as admissões sem concurso público e sobre o reflexo desses atos no mérito das contas dos conselhos, haja vista a possibilidade de sobrevir, por parte do STF, entendimento diverso do defendido pelo TCU.

61. Não obstante os efeitos ‘inter partes’ do MS 21.797-9, como alegado pelo consulente, o STF, por ocasião de seu exame de mérito, manifestou-se, indubitavelmente, pela natureza autárquica dos conselhos e pela condição pública dos recursos por eles arrecadados, situações essas que levam tais entidades à obrigatoriedade de realização de concurso público, não cabendo, aos demais conselhos, a partir da publicação no Diário da Justiça da deliberação nele proferida (18.5.2001), agirem em desconformidade com os posicionamentos adotados. Ademais, a partir da publicação do acórdão, o Tribunal, no âmbito de sua competência constitucional e legal, tem a obrigação de exigir o cumprimento dos posicionamentos firmados pela Suprema Corte, sob pena de omissão e/ou responsabilidade solidária.

62. Já com relação à ADIN 1.717, há que se ressaltar que a declaração de inconstitucionalidade do ‘caput’ e dos parágrafos 1º, 2º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º do art. 58 da Lei 9.649/98 feita pelo STF apenas ratificou, no que se refere à natureza dos conselhos, a posição anteriormente firmada por meio do Acórdão proferido no MS 21.797-9. Assim, apesar do efeito ‘erga omnes’ alegado pelo consulente, a referida declaração de inconstitucionalidade não se sobrepôs a qualquer entendimento anteriormente firmado pela Suprema Corte sobre essa questão, não justificando, portanto, a submissão dos

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conselhos ao entendimento firmado sobre a sua natureza pública apenas a partir da data de publicação do Acórdão proferido na referida ADIN.

63. No que se refere ao questionamento feito pelo consulente a respeito dos comissionamentos e terceirizações, há que se fazer as considerações a seguir aduzidas.

64. O consulente entende que, nos termos das disposições do art. 37, inciso V, da Constituição Federal, as funções de confiança são de preenchimento exclusivo de servidores ocupantes de cargos e empregos efetivos, sendo que os cargos comissionados devem ser ocupados, preferencialmente por servidores efetivos do quadro de carreira da entidade, mediante a fixação por lei dos respectivos percentuais.

65. Para melhor análise da questão ora suscitada, convém registrar que o mencionado dispositivo constitucional estabelece: ‘as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento’.

66. Há que se ressaltar que essa redação do art. 37, inciso V, da Constituição Federal foi dada pela Emenda Constitucional 19/98, que veio recepcionar as regras estabelecidas pela Lei 8.460/92 para a ocupação de referidos cargos no âmbito do Poder Executivo Federal, nos seguintes termos:

‘Art. 14. Os dirigentes dos órgãos do Poder Executivo deverão destinar, no mínimo, 50% (cinqüenta por cento) dos cargos de Direção e Assessoramento Superior de níveis DAS-1, DAS-2 e DAS-3 a ocupantes de cargo efetivo lotados e em exercício nos respectivos órgãos.

Art. 15. A designação para o exercício de Função Gratificada (FG) recairá em servidor ocupante de cargo efetivo do quadro próprio do órgão ou entidade e, quando for o caso, em servidores das carreiras de Orçamento e de Finanças e Controle.

Parágrafo único. Nas unidades setoriais do Sistema de Controle Interno do Poder Executivo Federal, poderá, excepcionalmente, ser designado para o exercício de FG servidor efetivo dos quadros de órgãos em que a unidade tiver atuação.’ (NR) (Parágrafo incluído pela Lei 10.180, de 6.2.2001)‘

67. É certo que, apesar da natureza pública dos conselhos e dos recursos por eles arrecadados, esses entes não integram a Administração Pública e tampouco os seus gastos estão incluídos no Orçamento Geral da União, dadas as prerrogativas especiais que detêm.

68. Contudo, criados por lei para o exercício de função pública (art. 5º, inciso XIII; art. 21, inciso XXIV, e art. 22, inciso XVI, da Constituição Federal), regem-se pelas regras de direito público, sendo os conselhos de fiscalização profissional submetidos às normas e princípios da Administração Pública.

70. Dessa forma, e considerando a competência originária dos conselhos federais para expedir as instruções necessárias ao bom funcionamento das entidades a eles ligadas, consoante previsto em suas leis de criação, a exemplo da Lei 4.320/64 (art. 4º) e da Lei 2.800/56 (art. 8º), e objetivando evitar a ocorrência de favorecimento a pessoas que porventura venham a exercer cargos em comissão e funções de confiança, em observância aos princípios da moralidade e da impessoalidade, entendemos que essas entidades podem

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utilizar como parâmetro as mesmas regras atualmente estabelecidas para a Administração Pública, nos termos das retrotranscritas disposições da Constituição Federal e da Lei 8.460/92. Conforme se observa, o exercício de funções de confiança é exclusivo de servidores ocupantes de cargo efetivo no âmbito da Administração Pública, em qualquer dos poderes e em qualquer dos três entes federados, União, Estados-Membros e Municípios. Já o preenchimento dos cargos em comissão, que se destinam às funções dos superiores hierárquicos (direção, chefia e assessoramento), 50% devem ser reservados a servidores ocupantes de cargo efetivo do próprio órgão ou entidade.

71. Relativamente à terceirização de serviços, assiste razão ao parecerista quando aduz que a utilização do referido instituto deve se limitar às modalidades de mão-de-obra que não façam parte do quadro de carreira da entidade, senão vejamos.

72. No âmbito da Administração Pública, a matéria encontra-se regulamentada pelo Decreto 2.271/97, que estabelece regras para a execução indireta de certas atividades, nos seguintes termos:

‘Art . 1º No âmbito da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional poderão ser objeto de execução indireta as atividades materiais acessórias, instrumentais ou complementares aos assuntos que constituem área de competência legal do órgão ou entidade.

§ 1º As atividades de conservação, limpeza, segurança, vigilância, transportes, informática, copeiragem, recepção, reprografia, telecomunicações e manutenção de prédios, equipamentos e instalações serão, de preferência, objeto de execução indireta.

§ 2º Não poderão ser objeto de execução indireta as atividades inerentes às categorias funcionais abrangidas pelo plano de cargos do órgão ou entidade, salvo expressa disposição legal em contrário ou quando se tratar de cargo extinto, total ou parcialmente, no âmbito do quadro geral de pessoal.’

73. Com efeito, pelas disposições retrotranscritas constata-se que somente as atividades-meio da entidade podem ser objeto de terceirização e desde que não se refiram a categorias funcionais abrangidas pelo plano de cargos e, mesmo assim, observadas as exigências legais para contratação, ou seja, realização de prévio processo licitatório.

74. A propósito, deve-se ressaltar que este Tribunal já se posicionou sobre essa questão em relação aos conselhos de fiscalização, merecendo destaque a análise feita quando do Recurso de Reconsideração interposto pelo Conselho Regional dos Representantes Comerciais/PR contra deliberações proferidas por esta Corte ao julgar as contas da entidade relativas ao exercício de 1992 (TC 012.895/1994-6), consistente no Parecer emitido pelo Ministério Público junto ao TCU, integrante do Relatório do Exmo. Ministro Valmir Campelo que fundamentou o Acórdão 143/1999 - Segunda Câmara, nos seguintes termos, in verbis:

‘Com efeito, afigura-se insuperável a irregularidade consistente na terceirização de todas as atividades do CORE/PR, incluídas suas atividades-fim, mediante a contratação privilegiada do sindicato da categoria. A competência para a fiscalização do exercício profissional é atribuída por lei ao órgão por ela instituído com esta única e exclusiva finalidade. Nenhuma outra entidade, pública ou privada, pode praticar validamente os atos

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de fiscalização do exercício profissional que não a que foi instituída expressamente para esse fim. Qualquer forma de transferência desse mister importa a negação da própria razão de ser da entidade e a nulidade de todos os atos fiscalizatórios praticados pelos agentes incompetentes.

Atividades-meio da entidade podem ser objeto de terceirização, desde que observadas as exigências legais para contratação, nomeadamente o prévio processo licitatório, instrumento de garantia de impessoalidade, igualdade e obtenção das melhores propostas para a Administração. A só condição de o sindicato contratado ser da mesma categoria fiscalizada pelo CORE/PR, ou o fato de 2/3 dos membros do CORE/PR procederem do sindicato não o pré-qualifica como o único contratante apto a prestar os serviços requeridos. Ao contrário, tais circunstâncias revelam a promiscuidade existente no relacionamento entre o conselho e o sindicato, promiscuidade essa que permitiu a cessão gratuita de todos os bens móveis e imóveis do CORE/PR, com este arcando, ainda, com as despesas de manutenção desses bens

(...)As graves irregularidades que motivaram a rejeição das contas permanecem, pois,

inalteradas, sem que tenham os recorrentes apresentado razões fáticas ou jurídicas que justificassem alguma delas.’

75. Com base nas disposições que regulamentam a terceirização de atividades no âmbito da Administração Pública e na jurisprudência deste Tribunal, observa-se que este instituto não se encontra vinculado ao quantitativo de terceirizações que os órgãos ou entidades podem efetuar, como quer entender o consulente. Nos termos das disposições do mencionado Decreto 2.271/97, a terceirização é permitida, tão-somente, em relação às diversas atividades-meio exercidas pelos órgãos e entidades com vistas à consecução de suas competências legais, observadas as exigências para tanto estabelecidas, independentemente de quantidade. No que refere aos limites estabelecidos pela Lei Complementar 101/2000 para gastos com pessoal, neles se incluindo as terceirizações, pelas razões expostas nos itens 31 a 41 retro, não se aplicam aos conselhos de fiscalização, uma vez que não fazem parte do planejamento de gastos públicos previsto no Plano Plurianual - PPA, na Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO e na Lei Orçamentária Anual - LOA de que trata a referida Lei.

76. Por fim, quanto à solicitação feita pelo Presidente da Comissão Especial da Reforma Trabalhista da Câmara dos Deputados no sentido da realização por este Tribunal de auditoria ou inspeção nos conselhos de fiscalização profissional, com vistas à verificação da observância por essas entidades do normativo que vier a ser adotado em consonância com o exame feito acerca das questões objeto da consulta, é necessário que sejam feitas as considerações a seguir aduzidas.

77. Preliminarmente, convém registrar que o pedido de realização de auditoria feito no bojo da consulta formulada nos termos do item 1 supra não preenche os requisitos previstos no art. 232, inciso III, do Regimento Interno do TCU, por não estar acompanhado de elementos que comprovem a sua aprovação pela referida Comissão Especial da Reforma Trabalhista da Câmara dos Deputados.

78. Contudo, mesmo que superada essa formalidade, há que se ressaltar que o pedido esbarra também em entraves operacionais, uma vez tratar-se de solicitação genérica e abrangente, em que não foram mencionadas pelo requerente as entidades a serem fiscalizadas e tampouco as irregularidades que porventura estejam cometendo.

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79. Deve-se ressaltar, ainda, que o Tribunal respaldado nos princípios da eficiência, utilidade e economicidade e na busca da racionalização e simplificação do exame e julgamento de processo de contas editou a IN/TCU 42/2002, dispensando os conselhos de fiscalização profissional da apresentação das contas anuais, sem perda, entretanto, da eficácia das ações de controle, uma vez que permanecem as demais formas de fiscalização empreendidas, seja por meio de auditorias e inspeções, realizadas por iniciativa própria ou por solicitação do Congresso Nacional, seja por representações e denúncias, formuladas nos termos da Constituição Federal e da legislação ordinária, a exemplo do art. 74, § 2°, da Carta Magna e do art. 113, § 1°, da Lei 8.666/93, ou até mesmo por intermédio de tomadas de contas especiais instauradas nos casos de ocorrência de prejuízos aos cofres das referidas entidades.

80. Levando-se em conta o caráter genérico da solicitação ora em exame e considerando a existência de cerca de 500 entidades de fiscalização profissional, o atendimento do pleito na forma em que foi feito poderia levar este Tribunal a uma concentração de todo o seu efetivo de pessoal tão-somente para o cumprimento dessa missão, o que desvirtua totalmente da finalidade da medida adotada pelo Tribunal antes referida no item 79 retro, qual seja, a de concentrar esforços em ações que assegurem maior efetividade ao controle externo, permitindo, assim, uma resposta mais concreta aos anseios da sociedade sobre a aplicação dos recursos públicos.

81. Dessa forma, para que a solicitação de fiscalização pudesse ser atendida por este Tribunal, seria necessário que, além de ser aprovada pela Comissão Especial da Reforma Trabalhista da Câmara dos Deputados, nos termos previstos no art. 232, inciso III, do Regimento Interno do TCU, fosse delimitada a abrangência da auditoria em relação às entidades a serem fiscalizadas, mediante a indicação dos indícios de irregularidades porventura perpetradas por tais conselhos.

82. Há que se ressaltar, contudo, que, não obstante as medidas de racionalização implementadas por meio da IN/TCU 42/2002, no decorrer dos exercícios de 2002 e 2003, este Tribunal realizou 39 trabalhos de auditoria nos conselhos de fiscalização profissional, abrangendo, inclusive, a verificação das questões objeto da presente consulta, conforme se verifica da planilha anexa ao presente processo, elaborada pela Secretaria Adjunta de Fiscalização - ADFIS, Unidade Técnica desta Corte responsável pela coordenação e orientação do planejamento geral das fiscalizações. Além disso, de acordo com a referida planilha, já estão programadas para o primeiro semestre do exercício de 2004 outras 29 fiscalizações, das quais, 27 serão realizadas no sistema dos Conselhos Federal e Regionais de Medicina Veterinária para verificação das contratações de pessoal efetivadas por essas entidades.

Diante do exposto submetemos os autos à apreciação superior, propondo:a) conhecer como consulta o Of. 115-03 da Comissão Especial da Reforma

Trabalhista da Câmara dos Deputados, com fundamento no art. 264, inciso IV, do Regimento Interno do TCU;

b) responder ao consulente que:c) não obstante a execução dos orçamentos dos conselhos de fiscalização

profissional deva obedecer aos princípios e normas de direito público, inclusive aqueles previstos na Lei Complementar 101/2000, essas entidades não estão subordinadas às limitações previstas na referida Lei, em especial quanto aos gastos com pessoal, inclusive terceirizações, posto que estas contêm procedimentos diretamente relacionados com a ação planejada da gestão fiscal, consistentes em planos previamente definidos no Plano

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Plurianual - PPA, na Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO e na Lei Orçamentária Anual - LOA, dos quais não fazem parte os conselhos;

d) por força das disposições contidas nas próprias leis de criação, a exemplo do art. 24 da Lei 4.324/64 (Conselhos de Odontologia) e do art. 35 da Lei 5.766/71 (Conselhos de Psicologia), no art. 1° do Decreto-lei 968/69 e no § 3º do art. 58 da Lei 9.649/98, e em razão de não serem detentores de cargos públicos criados por lei, com vencimentos pagos pelos cofres da União, na forma definida pela Lei 8.112/90, os empregados dos Conselhos de fiscalização profissional nunca estiveram subordinados ao Regime Jurídico Único instituído pela mencionada Lei, restando prejudicada, por esse motivo, a pretendida transformação de emprego em cargo prevista no art. 243 da Lei;

e) decorrendo a obrigatoriedade de realização de concurso público da natureza pública dos órgãos e entidades e dos recursos por eles administrados, e considerando o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal do Mandado de Segurança 21.797-9, em que foi firmado o entendimento acerca da natureza autárquica dos conselhos e sobre a condição pública de seus recursos, o marco para que essa exigência seja cumprida é a data de publicação da mencionada deliberação (18.5.2001) e não da ADIN 1.717 que, ao declarar a inconstitucionalidade do ‘caput’ e dos parágrafos 1°, 2°, 4°, 5°, 6°, 7° e 8° do art. 58 da Lei 9.649/98, apenas ratificou o posicionamento antes defendido no mencionado mandamus;

f) estando os conselhos de fiscalização profissional submetidos às normas e princípios da Administração Pública e visando a observância aos princípios da moralidade e da impessoalidade, bem como objetivando evitar a ocorrência de favorecimento de pessoas que porventura venham a exercer cargos em comissão ou funções de confiança, essas entidades podem utilizar como parâmetro as mesmas regras atualmente estabelecidas para a Administração Pública Federal, nos termos do art. 37, inciso V, da Constituição Federal e do art. 14 da Lei 8.460/92, no sentido de que o exercício de funções de confiança é exclusivo de servidores ocupantes de cargo efetivo no âmbito da Administração Pública, em qualquer dos poderes e em qualquer dos três entes federados, União, Estados-Membros e Municípios, enquanto que o preenchimento dos cargos em comissão, que se destinam às funções dos superiores hierárquicos (direção, chefia e assessoramento), 50% devem ser reservados a servidores ocupantes de cargo efetivo do próprio órgão ou entidade;

g) de acordo com o Decreto 2.271/97, que regulamenta a terceirização de atividades no âmbito da Administração Pública, bem como em consonância com a jurisprudência deste Tribunal (cf. Acórdão 143/1999 - Segunda Câmara), esse instituto está adstrito às diversas atividades-meio exercidas pelos órgãos e entidades com vistas à consecução de suas competências legais, observadas as exigências para tanto estabelecidas, independentemente de quantidade;

h) os limites estabelecidos pela Lei Complementar 101/2000 para gastos com pessoal, neles se incluindo as terceirizações, não se aplicam aos conselhos de fiscalização, uma que não fazem parte do planejamento de gastos públicos previsto no Plano Plurianual - PPA, na Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO e na Lei Orçamentária Anual - LOA de que trata a referida Lei (cf. letra ‘a’ supra);

i) informar ao consulente que:j) para que a solicitação de fiscalização possa ser implementada, necessário se faz

que, além de ser aprovada pela Comissão Especial da Reforma Trabalhista da Câmara dos Deputados, nos termos previstos no art. 232, inciso III, do Regimento Interno do TCU, seja

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delimitada a abrangência da auditoria em relação aos conselhos a serem fiscalizados, mediante a indicação dos indícios de irregularidades porventura por eles perpetradas, assegurando, assim, maior efetividade ao controle externo em relação a essas entidades, que hoje somam mais de 500 entidades;

k) não obstante as medidas de racionalização implementadas por este Tribunal por meio da IN/TCU 42/2002, mediante a qual os conselhos de fiscalização profissional foram dispensados da apresentação de suas contas anuais, no decorrer dos exercícios de 2002 e 2003, foram realizados por esta Corte de Contas 39 trabalhos de auditoria nos conselhos, envolvendo inclusive a verificação das questões objeto da presente consulta, estando programadas para o primeiro semestre do exercício de 2004 mais 29 fiscalizações, dentre as quais, 27 serão realizadas no sistema dos Conselhos Federal e Regionais de Medicina Veterinária com o objetivo de examinar as contratações de pessoal efetivadas por essas entidades;

l) enviar ao consulente cópia da deliberação que vier a ser proferida nestes autos, do relatório e do voto que a fundamentarem, bem como da planilha anexa ao presente processo.”

Estando os autos em meu Gabinete, o Sindicato dos Empregados em conselhos e Ordens de Fiscalização Profissional e Entidades Coligadas e Afins do Distrito Federal - Sindecof/DF também formulou consulta a este Tribunal (fl. 1 do anexo 1), em que questiona as áreas dessas unidades autárquicas passíveis de terceirização. De plano, o pedido foi indeferido, ante a ausência de legitimidade do autor, nos termos dos arts. 264 e 265 do Regimento Interno do TCU. Contudo, dada a conexão da matéria com o requerimento produzido pela Comissão Especial de Reforma Trabalhista da Câmara dos Deputados, determinei à 5ª Secex que, oportunamente, cientifique a entidade sindical da deliberação que vier a ser adotada neste processo.

VOTO

Conheço da consulta, por atender aos requisitos do art. 264, inciso IV, do Regimento Interno do TCU. Todavia, no tocante à solicitação de auditoria ou inspeção, falece ao referido pedido o requisito de prévia aprovação pela Comissão Parlamentar, conforme estabelece o art. 232, inciso III, in fine, do citado Regimento Interno.

Ademais, a ausência de indicação precisa do objeto, com a definição do escopo, tipificação das irregularidades, identificação da entidade e do período da ocorrência, milita contra a viabilidade operacional do atendimento à solicitação, já que o universo de entidades a ser auditadas perfaz o montante de mais de 500 unidades. É oportuno, entretanto, seja o requerente informado da nova sistemática de fiscalização dos conselhos, disciplinada pela IN TCU 42/2002, bem como das ações fiscalizadoras aprovadas por este Tribunal, a serem empreendidas no primeiro semestre de 2004.

Quanto ao mérito da consulta, convém tecer algumas considerações. Entende esta Corte de Contas que os conselhos de Fiscalização de Profissões Regulamentadas têm natureza autárquica, ainda que diferenciada, visto que detêm capacidade tributária ativa, imunidade tributária, munus público decorrente do exercício do poder de polícia delegado pelo Estado. Esses atributos são suficientes para fazer incidir sobre eles as normas gerais e princípios de direito público.

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Nesse sentido, alinham-se, dentre outros, os seguintes arestos: Decisão 31/2001 - Plenário; Acórdão 179/2000 - Plenário; Decisão 133/2000 - Plenário; Acórdão 213/99 - Plenário; Decisão 123/99 - Segunda Câmara; Decisão 69/99 - Plenário; Acórdão 212/98 - Segunda Câmara; Acórdão 209/98 - Segunda Câmara; Decisão 364/98 - Plenário; Acórdão 181/98 - Plenário; Acórdão 424/98 - Segunda Câmara; Acórdão 364/98 - Plenário; Decisão 119/98 - Segunda Câmara; Acórdão 329/98 - Segunda Câmara; Acórdão 390/98 - Segunda Câmara; Acórdão 151/98 - Segunda Câmara; Acórdão 209/98 - Segunda Câmara.

Corroborando o entendimento há muito assentado por esta Corte de Contas, o Egrégio Supremo Tribunal Federal, ao julgar o mérito da Adin 1.717/DF, declarou inconstitucionais os dispositivos do art. 58, caput, e §§ 1º, 2º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º, todos da Lei 9.469/98, que pretendiam subtrair os conselhos de fiscalização de profissões da órbita do regime de direito público (Acórdão prolatado em 7.11.2002, publicado no Diário de Justiça de 18.11.2002). Frise-se que o Pretório Excelsojá havia, anteriormente, afirmado a natureza jurídica publicística dos conselhos (Mandados de Segurança 21.797-9, em 9.3.2000, e 22.643-9, em 6.8.1998).

Feita essa introdução, cumpre definir os contornos dos preceitos legais de caráter público incidentes na situação em análise.

A Lei Complementar 101/2000, denominada Lei de Responsabilidade Fiscal, veio estabelecer normas de finanças públicas em todas as esferas governamentais, voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal, incluindo a dívida pública externa e interna, a concessão de garantias pelas entidades públicas, a emissão e o resgate de títulos da dívida pública, bem como a elaboração dos orçamentos.

O referido diploma tem, portanto, escopo específico: o manejo das contas públicas, visando a objetivos macroeconômicos (nível geral de preços, dos juros, emprego, dentre outros) e a superação de entraves financeiros que possam comprometer a continuidade e a eficiência de serviços públicos. Seus pilares são a valorização do processo de planejamento orçamentário, a transparência da aplicação do dinheiro público, a formulação de uma política tributária previsível e controlada, a diminuição do estoque da dívida em nível equivalente à capacidade de geração de receita do ente público federado, a prevenção de déficits imoderados e injustificados e, por fim, a preservação do patrimônio público.

A LRF estabeleceu sérios condicionamentos aos gastos de governo, para que já não houvesse descontrole das finanças públicas e crescimento desordenado da dívida pública consolidada, o que certamente resultaria em novas necessidades de financiamento do setor público, via Tesouro Nacional, por meio da renegociação das dívidas com estados e municípios, e da realização de novas operações de crédito.

Daí a razão de se impor aos destinatários da lei limites de endividamento em seus mais variados aspectos, tais como: restrição aos gastos de pessoal com base em receita corrente líquida; limitação às renúncias de receitas; circunscrição das antecipações de receitas orçamentárias; proibição de financiamento recíproco entre entes federados, à exceção das instituições financeiras públicas.

Observa-se, portanto, que todas essas medidas têm em mira estabelecer contornos precisos das ações de gestores públicos que possam repercutir nos agregados econômicos das contas nacionais.

Não é o caso dos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas, cujos atos ordinários de arrecadação de receitas e de realização de despesas não têm o condão de repercutir nos resultados consolidados de gestão fiscal a que alude a Lei Complementar 101/2000.

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Conquanto a jurisprudência e a doutrina atribuam a esses entes natureza autárquica, são-lhes inteiramente inadequadas as restrições de receita e de despesa contidas na referida lei, a exemplo dos limites de gastos com pessoal, incluindo terceirizados, em relação à receita corrente líquida, conforme prevêem os arts. 18 e 19. Se considerarmos que as contribuições arrecadadas pelos conselhos destinam-se, primordialmente, a custear gastos com recursos humanos, em sua maior parte, envolvidos no desempenho de sua finalidade institucional - fiscalização das profissões regulamentadas - tornar-se-ia inócua e contraproducente limitar os dispêndios nos moldes pretendidos por aquele normativo federal, pois, além de não concorrer para o equilíbrio fiscal do Estado brasileiro, implicaria forte restrição ao exercício do poder de polícia que lhes incumbe realizar.

Também não se justifica a submissão dos conselhos às restrições impostas pela Lei Complementar 101/2000, pelo simples fato de esta norma federal também contemplar as autarquias entre as entidades por ela alcançadas. Tal presunção ignora a peculiaridade daqueles entes, pois, embora desempenhem atividades públicas delegadas, não chegam a integrar o complexo administrativo da União.

A especificidade dessas unidades está em sua natureza corporativa, pelo que são credenciadas a exercer, no interesse público, tarefas de alta especialização dentre profissionais do núcleo privado. Dada a complexidade do ofício e a relevância da missão de zelar pela integridade e disciplina profissional, são chamados a desempenhar o referido mister os integrantes de classe interessados e capacitados.

Para tanto, essas entidades dispõem, tão somente, de recursos arrecadados da própria categoria, sem receber subvenções ou transferências oriundas do Orçamento Geral da União. Deve-se salientar, ainda, que a Lei de Diretrizes Orçamentárias, para o exercício de 2004, expressamente excluiu os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas, constituídas como autarquias, da participação nos Orçamentos Fiscal e de Seguridade Social (art. 5º, parágrafo único, inciso II, da Lei 10.707/2004).

Apesar de as entidades fiscalizadoras de profissões regulamentadas não estarem adstritas, pelas razões expostas, aos limites específicos definidos na Lei de Responsabilidade Fiscal, não estão isentas da incidência de normas gerais e de princípios que a regem. Vale dizer, dado o interesse público prevalente no desempenho de suas atribuições, os gestores dos conselhos devem observar as diretrizes fixadas no art. 1º, § 1º, da Lei Complementar 101/2000 de forma a contemplar a ação planejada e transparente, que possam prevenir riscos e corrigir desvios capazes de afetar o equilíbrio de suas contas. A necessidade de equilíbrio econômico e financeiro desses entes valem mais como regra de boa conduta na gestão da res publica do que propriamente uma política que efetivamente contribua para a política de estabilização fiscal do Estado brasileiro.

Sobre a subordinação ao regime estatutário, instituído pela Lei 8.112/90, dos servidores dos conselhos de Fiscalização Profissional, admitidos antes da edição da Medida Provisória 1.549/97, sucessivamente reeditada e convertida na Lei 9.649/98, valho-me das judiciosas ponderações externadas pelo Exmo. Ministro Maurício Corrêa, em seu Voto Vista, nos autos do MS 21.797-9, trazido à baila pela instrução. Conforme salientou S. Exª, a teor do disposto no art. 1º do Decreto-Lei 968/99, recepcionado pela Constituição Federal, a disciplina da relação jurídica dessas entidades com seus funcionários acha-se definida nas leis específicas que as instituíram, a maioria das quais referem-se explicitamente ao regime celetista (vide exemplo das Leis 4.324/64 - Conselho de Odontologia; 5.766/71 - Conselho de Psicologia). Por não disporem em seus quadros de

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cargos públicos criados por lei e com vencimentos pagos pelo Erário, ao contrário do que prevê o art. 3º, parágrafo único, da Lei 8.112/90, não se lhes aplica a Lei 8.112/90.

Conforme frisei no voto condutor da Decisão 91/2001 - Primeira Câmara (TC 625.243/1996-0), não vislumbro óbice à subordinação dos funcionários dos conselhos à legislação trabalhista. O vínculo com a CLT sempre foi utilizado por todas as autarquias corporativas, sobretudo em face da impossibilidade fática de as entidades de pequeno porte e abrangência limitada poderem custear aposentadorias integrais de seus empregados.

Outrossim, a Emenda Constitucional 19/98 alterou a redação do caput do art. 39 da Lei Maior, elidindo a obrigatoriedade de instituição, pela União, estados, Distrito Federal e municípios, de regime jurídico único para os servidores da administração direta, das autarquias e das fundações públicas. Ademais, em nenhum momento, a contratação de empregados pelos conselhos foi interrompida, jamais se cogitando que tais contratados fossem servidores estatutários, regidos pela Lei 8.112/90. Aliás, a alteração constitucional superveniente foi a razão pela qual o E. STF, ao apreciar a concessão de liminar na citada Adin 1.717-6, julgou prejudicada a ação direta, no que concerne ao § 3º do art. 58 da Lei 9.649, de 27/5/1998, consistente na dicção de que os empregados dos conselhos fiscalizadores das profissões regulamentadas são regidos pelo regime trabalhista.

Admitindo-se, à guisa de argumentação, a hipótese de incidência da Lei 8.112/90 aos servidores na situação retratada, a mera transposição ao regime estatutário dos empregados dos conselhos, conforme art. 243, § 1º, daquele diploma legal, teria ainda graves conseqüências. Além dessas hipotéticas investiduras não virem precedidas da existência de cargos públicos criados por lei, a referida transformação importaria pesado ônus aos cofres públicos, visto que implicaria reconhecimento de direitos e encargos a serem pagos retroativamente aos servidores por ela alcançados, verdadeiro contra-senso à linha de austeridade defendida pelo governo federal nos gastos com recursos humanos.

As implicações dessa mudança não param por aí. Resultariam, ainda, conforme frisou em seu voto o Ministro Maurício Corrêa, na possibilidade de aplicação de diversos permissivos constitucionais aplicáveis à espécie: acumulação de cargos (art. 37, inciso XVII); aptidão para realizar operações de crédito interno e externo (art. 52, inciso VII); sujeição à lei de responsabilidade fiscal; necessidade de lei de iniciativa do Poder Executivo para a criação de cargos públicos e aumento de remuneração (art. 61, § 1º, II, “a”); participação no Orçamento Geral da União, com a sua inclusão no orçamento fiscal (art. 165, § 5º, inciso I); estabilidade no serviço público (art. 19 do ADCT); revisão dos direitos dos ativos e pensionistas (art. 20 do ADCT).

Haja vista a peculiar natureza jurídica corporativa dos conselhos, aliada à sua histórica independência financeira dos recursos da União, não se afigura jurídica e economicamente adequada a conversão de regime suscitada na consulta, muito menos a transformação de emprego em cargo, a que alude o art. 243, § 1º, da Lei 8.112/90.

Quanto ao marco temporal de exigibilidade de prévio concurso público para a admissão de funcionários nas citadas entidades, a jurisprudência desta Corte de Contas já sedimentou entendimento de que 18.5.2001 é a data a partir da qual não mais se tolera a contratação de funcionários pelos conselhos sem a observância do mandamento insculpido no art. 37, inciso II, da Constituição Federal, sob pena de anulação dos atos de admissão e responsabilização dos gestores que a autorizaram. Nesse diapasão, perfilham, dentre outros, os seguintes Acórdãos: 814/2003, 1.281/2003 e 1.367/2003, todos do Plenário; 1.219/2003 e 1.221/2003, da 2ª Câmara. Referido termo refere-se à data de publicação no Diário de Justiça da deliberação proferida pelo Supremo Tribunal Federal, nos autos do MS 21.797-9,

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que ratificou o posicionamento há muito defendido pelo TCU no sentido da exigência de os conselhos proverem seu quadro de pessoal por meio de prévio certame público.

Não seria acertada, portanto, que a fixação de termo a quo para a referida exigência constitucional recaísse na data de publicação no Diário Oficial do julgamento da Adin 1717, como levanta o consulente, pois a manifestação do STF veio a corroborar jurisprudência reiterada desta Corte de Contas quanto à natureza jurídica de direito público dessas entidades e a obrigatoriedade de sua submissão ao comando constitucional inscrito no art. 37, inciso II. A rigor, a declaração do Excelso Pretório em sede de controle abstrato tem eficácia retrooperante, impondo a desconstituição de todos os atos desconformes com a Lei Maior, desde a sua vigência em 5.10.1988. O TCU, ao estabelecer o marco inicial em 18.5.2001, adotou solução mais benéfica, protegendo as relações jurídicas estabelecidas ao abrigo de interpretação de lei dada pelos conselhos, preservando a boa fé dos administrados.

Conquanto não se vinculem propriamente ao aparelho estatal, a natureza jurídica peculiar dos conselhos e a relevância de suas atribuições sujeitam-nos a determinados preceitos constitucionais ordenadores da Administração Pública. Um deles refere-se às limitações estabelecidas para o provimento de funções de confiança e cargos em comissão, previstas no art. 37, inciso V, da Constituição Federal, com a nova redação dada pela Emenda Constitucional 19/98, verbis: “as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos e condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento”.

A referida restrição tem por objetivo resguardar os princípios da legalidade, da impessoalidade e da moralidade no trato da coisa pública, evitando, assim, o loteamento indevido de funções de confiança e de cargos comissionados, destinados ao desempenho de atribuições de direção, chefia e assessoramento no âmbito de órgãos e entidades públicos. Não há dúvidas de que as entidades fiscalizadoras de profissões regulamentadas devem pautar o preenchimento desses cargos e funções segundo o diapasão constitucional.

O mandamento da Lei Maior que determina o provimento das funções de confiança por servidores ocupantes de cargo efetivo é autoaplicável. O mesmo não ocorre em relação à segunda parte do referido dispositivo constitucional, já que, em princípio, requer a edição de norma legal que discipline as condições e percentuais mínimos pelos quais os cargos em comissão deverão ser preenchidos por servidores de carreira.

Ao enfrentar a necessidade da elaboração de leis específicas para a criação de cargos e empregos no âmbito dos conselhos, esta Corte de Contas, por intermédio do Acórdão 147/2003 - Plenário (Ata 5/2003; Sessão do dia 19.2.2003), perfilhou o entendimento de que não se afigura razoável exigir de tais entidades que lei de iniciativa do Poder Executivo Federal, a teor do art. 61, § 1º, inciso II, alínea “a”, da CF/88, venha dispor especificamente sobre a organização de seus respectivos quadros de pessoal.

Segundo a dicção do Plenário, tal exigência não se amolda à natureza de autarquia sui generis desses entes de fiscalização profissional, uma vez que a independência em relação aos recursos orçamentários da União e a organização em bases corporativas confere-lhes poder de autogestão, o que não afasta, porém, a obrigação de observarem os institutos de Direito Público.

Tendo em vista que as leis de criação dessas entidades conferem aos conselhos federais o poder de expedir instruções necessárias ao pleno funcionamento das unidades a eles vinculadas, a exemplo das Leis 4.324/64 (art. 4º) e 2.800/56 (art. 8º), o correto é que

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tais entes, utilizando de seus mecanismos de autogestão, definam suas necessidades peculiares de cargos em comissão, as condições e limites mínimos de provimento por funcionário efetivo, devendo adequar seus normativos ao fim moralizador pretendido pelo art. 35, inciso V, da Carta Magna.

Na ausência de critério normativo próprio que defina os percentuais mínimos de cargos em comissão a serem providos por funcionários efetivos dos conselhos, ou melhor, enquanto não editada norma interna a respeito, nada impede que os conselhos adotem como parâmetro a regra fixada pelo Poder Executivo Federal, de destinar, no mínimo, metade dos cargos em comissão a ocupantes de cargo efetivo, conforme apregoa o art. 14 da Lei 8.460/92. Com isso, dá-se imediata concretude à diretriz constitucional.

Conclui-se, então, que os conselhos deverão adaptar seus normativos internos para disciplinar o provimento dos cargos em comissão e os percentuais mínimos a serem preenchidos por servidores de carreira, podendo ser adotados como referencial os parâmetros fixados no art. 14 da Lei 8.460/92.

Com relação aos serviços contratados, é assente o entendimento deste Tribunal de que somente são passíveis de terceirização as atividades que não integrem o plexo de atividades finalísticas abrangidas pelo plano de cargos dos respectivos órgãos e entidades públicos, salvo expressa disposição legal em contrário ou quando se tratar de cargo extinto, total ou parcialmente, no âmbito do quadro geral de pessoal. Nesse sentido, alinham-se as seguintes deliberações: Decisões 128/93, 334/95, 885/97, todas do Plenário; Acórdãos 71/2003, 76/2003, do Plenário; Acórdãos 168/2002, 143/1999, da 2ª Câmara).

Na mesma linha do referido posicionamento do TCU, a regulamentação adotada pelo Poder Executivo Federal, mediante Decreto 2.271/97 (art. 1º, §§ 1º e 2º), que definiu as áreas da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional que poderão ser objeto de execução indireta, a saber: as atividades materiais acessórias, instrumentais ou complementares aos assuntos que constituem área de competência legal do órgão ou entidade.

Não há, em princípio, limitação ao quantitativo de terceirizações admissíveis, desde que a execução indireta não alcance as atividades fim dos conselhos de fiscalização profissional.

Pelas mesmas razões anteriormente expostas, quanto à inaplicabilidade às autarquias corporativas da limitação de gastos com pessoal, imposta pela Lei Complementar 101/2000, as despesas de terceirização dos conselhos também não estão sujeitas às restrições da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Não há confundir, porém, a participação de estagiários nos conselhos com a terceirização de serviços, como leva a crer a consulta, pois se trata de institutos distintos com propósitos bem definidos. O primeiro destina-se a propiciar que alunos de estabelecimentos de ensino superior e de ensino profissionalizante do 2º grau ou Supletivo venham complementar a aprendizagem educacional por meio de desenvolvimento de atividades conexas ao seu currículo escolar, em jornada de trabalho compatível com a vida acadêmica ou estudantil.

O art. 4º da Lei 6.494/77 é claro ao estabelecer que o estágio não cria vínculo empregatício de qualquer natureza, embora o estagiário perceba bolsa ou outra forma de contraprestação que venha a ser acordada. Por essa razão, o estágio não integra o conceito de prestação de serviços profissionais terceirizados, os quais são cometidos a empresa idônea, mediante licitação, e destinados à execução indireta de tarefas instrumentais, complementares e acessórios dos conselhos.

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Essa distinção é fundamental na medida em que evita a utilização dos estágios como forma indiscriminada de terceirização de serviços. Portanto, devem as relações jurídicas estabelecidas entre estagiários e os conselhos, com interveniência das instituições de ensino, ser disciplinadas pela Lei 6.494/77, com alteração dada pela Lei 8.859/94.

Dessa forma, acolho o parecer e Voto por que o Tribunal de Contas da União aprove o acórdão que ora submeto à apreciação deste Plenário.

Sala das Sessões, em 31 de março de 2004.

Walton Alencar RodriguesMinistro-Relator

ACÓRDÃO 341/2004 - Plenário - TCU

1. Processo TC 016.756/2003-0 (com 1 anexo)2. Grupo I - Classe III - Consulta.3. Interessado: Presidente da Comissão Especial da Reforma Trabalhista - Deputado

Federal Vicentinho.4. Órgão: Câmara dos Deputados.5. Relator: Ministro Walton Alencar Rodrigues.6. Representante do Ministério Público: não atuou.7. Unidade técnica: 5ª Secex.8. Advogado constituído nos autos: não atuou.

9. Acórdão:VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Consulta formulada pelo Deputado

Federal Vicentinho, Presidente da Comissão Especial da Reforma Trabalhista da Câmara dos Deputados,

ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em sessão do Plenário, ante as razões expostas pelo Relator e com fundamento no art. 1º, inciso XVII, da Lei 8.443/92, em:

9.1. conhecer da consulta formulada pelo Presidente da Comissão Especial de Reforma Trabalhista da Câmara dos Deputados, com fulcro no art. 264, inciso IV, do Regimento Interno do TCU;

9.2. responder ao consulente que:9.2.1. os conselhos de fiscalização profissional não estão subordinados às limitações

contidas na Lei Complementar 101/2000, em especial as relativas aos limites de gastos com pessoal, incluindo terceirizações, visto que tais entidades não participam do Orçamento Geral da União e não gerem receitas e despesas de que resultem impactos nos resultados de gestão fiscal a que alude o referido diploma legal;

9.2.2. os conselhos de fiscalização profissional, apesar de não estarem sujeitos às limitações de despesa impostas pela Lei Complementar 101/2000, devem observar as normas gerais e princípios que norteiam a gestão pública responsável, com destaque para a ação planejada e transparente, que possam prevenir riscos e corrigir desvios capazes de afetar o equilíbrio de suas contas (art. 1º, § 1º);

9.2.3. os servidores dos conselhos de fiscalização profissional nunca foram regidos pela Lei 8.112/90, mesmo no período anterior à vigência da Medida Provisória 1.549/97,

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sucessivamente reeditada e convertida na Lei 9.649/98, uma vez que jamais foram detentores de cargos públicos criados por lei com vencimentos pagos pela União, sendo-lhes, portanto, incabível a transposição do regime celetista para o estatutário, conforme o art. 243 do referido diploma legal;

9.2.4. o marco inicial para a obrigatoriedade da realização de prévio concurso público para as admissões de servidores pelos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas, sob pena de nulidade dos referidos atos e responsabilização dos gestores, é o dia 18.5.2001, data de publicação no Diário de Justiça do Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Mandado de Segurança 21.797-9;

9.2.5. as disposições normativas internas dos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas que cuidam da organização de seu quadro de pessoal, conforme lhes autorizam as respectivas leis instituidoras, devem adequar-se ao disposto no art. 37, inciso V, da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional 19/98, de forma que as funções de confiança sejam exclusivamente ocupadas por empregados do quadro efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por empregados do quadro efetivo nas condições e limites mínimos a serem fixados por instruções dos conselhos federais, sejam destinados apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento, podendo ser adotados como referencial os parâmetros fixados no art. 14 da Lei 8.460/92;

9.2.6. os conselhos de fiscalização profissional não poderão terceirizar as atividades que integram o plexo de suas atribuições finalísticas, abrangidas pelos seus Planos de Cargos e Salários, podendo, todavia, ser objeto de execução indireta apenas as atividades materiais acessórias, instrumentais e complementares aos assuntos que constituem a área de competência legal dessas entidades, conforme firme orientação jurisprudencial desta Corte de Contas, a exemplo do Acórdão 143/1999 - Segunda Câmara - TCU, e regulamentação estabelecida pelo Decreto federal 2.271/97;

9.2.7. a participação de estagiários em atividades nos conselhos não se confunde com a prestação de serviços terceirizados, muito menos a substitui, devendo as relações jurídicas estabelecidas entre aqueles estudantes e as entidades corporativas, com interveniência das instituições de ensino, observar a disciplina da Lei 6.494/77, com as alterações dadas pela Lei 8.859/94;

9.3. não conhecer da solicitação de auditoria ou inspeção nos Conselhos de Fiscalização de Profissões Regulamentadas formulada pelo interessado, porquanto carece ao referido pedido o requisito de prévia aprovação da Comissão Especial de Reforma Trabalhista, conforme estabelece o art. 232, inciso III, in fine, do Regimento Interno do TCU;

9.4. informar ao consulente que no decorrer dos exercícios de 2002 e 2003 foram realizados por esta Corte de Contas 39 trabalhos de auditoria nos conselhos, envolvendo, inclusive, a verificação das questões objeto da presente consulta, estando programadas para o primeiro semestre do exercício de 2004 mais 29 fiscalizações, dentre as quais, 27 serão realizadas com o objetivo de examinar as contratações de pessoal efetivadas por essas entidades;

9.5.encaminhar cópia deste acórdão, acompanhado do relatório e voto que o fundamentam, à autoridade consulente e ao Sindicato dos Empregados em conselhos e Ordens de Fiscalização Profissional e Entidades Coligadas e Afins do Distrito Federal - Sindecof; e

9.6. arquivar o presente processo.

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10. Ata nº 10/2004 - Plenário11. Data da Sessão: 31/3/2004 - Ordinária12. Especificação do quórum:12.1. Ministros presentes: Valmir Campelo (Presidente), Marcos Vinicios Vilaça,

Adylson Motta, Walton Alencar Rodrigues (Relator), Guilherme Palmeira, Ubiratan Aguiar, Benjamin Zymler e os Ministros-Substitutos Lincoln Magalhães da Rocha e Marcos Bemquerer Costa.

VALMIR CAMPELOPresidente

WALTON ALENCAR RODRIGUESMinistro-Relator

Fui Presente:

LUCAS ROCHA FURTADOProcurador-Geral