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Laudo de avaliação de dano corporal de natureza penal (Lesão corporal, para medicina legal, é qualquer alteração ou desordem da normalidade, de origem externa e violenta, capaz de provocar um dano à saúde em decorrência de culpa, dolo, acidente ou autolesão   ex.: delegado que corta cabelo de preso); (O laudo procura determinar qualidades, quantidades, causa e consequências das lesões)  1. Preâmbulo Em atendimento ao Ofício n.º 462/98, da 12. ª Delegacia de Polícia, referente à ocorrência n.º 1,146/98, solicitando exame de corpo de delito em GHAR, o Dr. Eduardo da Silva Reis, Diretor deste Instituto de Medicina Legal, designou o Dr. José Ribamar Souza Machado Filho, Médico especialista em Medicina Legal, e o Dr. Malthus Fonseca Galvão, Médico especialista em Medicina Legal e Cirurgião Dentista Chefe da Odontologia Legal deste Instituto para realizarem os exames periciais pertinentes. 2. Histórico Paciente refere agressão física no dia 02/02/98. Refere ter sofrido três socos (agente contundente, que agem por pressão perpendicularmente, sobre uma superfície corporal, esmagando tecidos) (A mão pode ser considerada instrumento contundente, pois, em forma de tapa ou bofetada, produz contusões, equimoses, bossas sanguíneas, hematomas, escoriações  Revista dos Tribunais, 444/358) , um na região atrás da orelha esquerda (região mastoidiana), outro na própria orelha esquerda (região auricular) e um último o lado esquerdo do queixo (região mentoniana), causando uma fratura dentária. O dente quebrado, segundo o relato, está dolorido ao contato, atrapalhando a mastigação, porém sem dor espontânea. 3. Descrição Às dezoito horas do dia 03/02/98, nas dependências deste Instituto, Gustavo Henrique Alves Rodrigues apresentava pequeninas equimoses avermelhadas, algumas coalescentes, correspondendo no conjunto a uma faixa cutânea de aproximadamente 5 x 20 mm, disposta axialmente ao pescoço em sua região cervical posterior superior esquerda (fotos nº). O segundo molar inferior esquerdo apresentava em sua região distovestibular uma solução de continuidade do esmalte dentário, estendendo-se da ponta da cúspide distovestibular até a região subgengival correspondente com limites agudos e cortantes (fotos n.º). A dentina subjacente a esta falha também apresentava perda da substância. As superfícies adamantinas e dentinárias não naturalmente expostas apresentavam-se lisas, com colorações características e sem tecidos cariados ou pigmentações. A gengiva relacionada à falha dentária apresentava uma discreta hiperemia (aumento da quantidade de sangue circulante num determinado local, ocasionado pelo aumento do número de vasos sanguíneos funcionais), e não se apresentava colabada sobre o contorno não natural do dente. A oclusão do periciando era do tipo II de Angle, ou neuro-oclusão (foto n.º), e durante o movimento de lateralidade direita a cúspide mésio-lingual do segundo molar superior esquerdo atingia o que seria o contorno natural da cúspide do segundo molar inferior esquerdo. O estado dentário, excetuando-se a fratura dentária, era excelente. O exame das articulações têmporo- mandibulares não revelou anormalidades.

Trabalho de Medicina Legal

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Laudo de avaliao de dano corporal de natureza penal (Leso corporal, para medicina legal, qualquer alterao ou desordem da normalidade, de origem externa e violenta, capaz de provocar um dano sade em decorrncia de culpa, dolo, acidente ou autoleso ex.: delegado que corta cabelo de preso); (O laudo procura determinar qualidades, quantidades, causa e consequncias das leses)1. Prembulo Em atendimento ao Ofcio n. 462/98, da 12. Delegacia de Polcia, referente ocorrncia n. 1,146/98, solicitando exame de corpo de delito em GHAR, o Dr. Eduardo da Silva Reis, Diretor deste Instituto de Medicina Legal, designou o Dr. Jos Ribamar Souza Machado Filho, Mdico especialista em Medicina Legal, e o Dr. Malthus Fonseca Galvo, Mdico especialista em Medicina Legal e Cirurgio Dentista Chefe da Odontologia Legal deste Instituto para realizarem os exames periciais pertinentes. 2. Histrico Paciente refere agresso fsica no dia 02/02/98. Refere ter sofrido trs socos (agente contundente, que agem por presso perpendicularmente, sobre uma superfcie corporal, esmagando tecidos) (A mo pode ser considerada instrumento contundente, pois, em forma de tapa ou bofetada, produz contuses, equimoses, bossas sanguneas, hematomas, escoriaes Revista dos Tribunais, 444/358), um na regio atrs da orelha esquerda (regio mastoidiana), outro na prpria orelha esquerda (regio auricular) e um ltimo o lado esquerdo do queixo (regio mentoniana), causando uma fratura dentria. O dente quebrado, segundo o relato, est dolorido ao contato, atrapalhando a mastigao, porm sem dor espontnea.3. Descrio s dezoito horas do dia 03/02/98, nas dependncias deste Instituto, Gustavo Henrique Alves Rodrigues apresentava pequeninas equimoses avermelhadas, algumas coalescentes, correspondendo no conjunto a uma faixa cutnea de aproximadamente 5 x 20 mm, disposta axialmente ao pescoo em sua regio cervical posterior superior esquerda (fotos n). O segundo molar inferior esquerdo apresentava em sua regio distovestibular uma soluo de continuidade do esmalte dentrio, estendendo-se da ponta da cspide distovestibular at a regio subgengival correspondente com limites agudos e cortantes (fotos n.). A dentina subjacente a esta falha tambm apresentava perda da substncia. As superfcies adamantinas e dentinrias no naturalmente expostas apresentavam-se lisas, com coloraes caractersticas e sem tecidos cariados ou pigmentaes. A gengiva relacionada falha dentria apresentava uma discreta hiperemia (aumento da quantidade de sangue circulante num determinado local, ocasionado pelo aumento do nmero de vasos sanguneos funcionais), e no se apresentava colabada sobre o contorno no natural do dente. A ocluso do periciando era do tipo II de Angle, ou neuro-ocluso (foto n.), e durante o movimento de lateralidade direita a cspide msio-lingual do segundo molar superior esquerdo atingia o que seria o contorno natural da cspide do segundo molar inferior esquerdo. O estado dentrio, excetuando-se a fratura dentria, era excelente. O exame das articulaes tmporo-mandibulares no revelou anormalidades.4. Discusso (Nexo de causalidade, na avaliao do dano corporal, necesessrio que: a) a leso seja produzida por determinado traumatismo, portanto, que seja real e apropriada s circunstncias; b) a leso tenha efetivamente uma etiologia traumtica; c) o local do traumatismo tenha relao com a sede da leso; d) haja relao de temporalidade (um prazo legal e um prazo clnico), ou seja, exista uma coerncia entre a idade da leso e a ocorrncia dos fatos; e) exista uma lgica anatomoclinica de sinais e sintomas tpicos; f) haja excluso da preexistncia de danos relativamente ao traumatismo; g) inexista uma causa estranha ao traumtica)As equimoses (existem vrios vestgios de leses contuso, desde de fugazes (rubor), temporrios (equimoses, hematomas ) e permanentes (cicatrizes, calo sseo), a equimose corresponde a sufuso hemorrgica, deixando, entre as malhas dos tecidos, as hemcias e os leuccitos sem formar uma continuidade lacustre, prpria do hematoma. Poder representar a forma do instrumento utilizado)encontradas no pescoo, por suas localizaes, morfologias e coloraes (devido a transformao qumica por que passa a hemoglobina fora do vaso, a colorao da equimose varia com a sua evoluo, seguindo o espectro equimtico de Legrand du Saulle) so condizentes com o histrico de um soco h menos de vinte e quatro horas naquela regio. Esta colorao encontrada apresentaria, provavelmente, uma tonalidade mais escura se decorressem quarenta e oito horas. A falha dentria apresentada pelo segundo molar inferior esquerdo (quanto aos dentes, h necessidade da pericia distinguir com sutileza o valor de cada pea, levando em conta suas funes mastigatria, esttica e fontica, sendo que o segundo molar tem maior valor quando se fala em funo mastigatria), por suas caractersticas, corresponde a uma fratura dentria muito recente. A lisura e ausncia de pigmentaes da superfcie fraturada e as bordas cortantes do esmalte indicam que a fratura muito recente, enquanto o estado da gengiva, que no colabou sobre o espao deixado pela fratura, no se manteria por mais de quarenta e oito horas aps a fratura. O histrico do soco no queixo pelo lado esquerdo no poderia ter causado a fratura diretamente, pois o fragmento se desgarrou da direita para a esquerda, na mesma direo do golpe. O mecanismo que explicaria a dinmica seria o trauma indireto no qual, no golpe, a mandbula seria deslocada bruscamente para a direita, e a ponta da cspide disto-vestibular do segundo molar inferior esquerdo se chocaria com a cspide msio-lingual do segundo molar superior homo- lateral. A dentia fraturada apresenta seus canalculos dentinrios expostos, o que leva a uma sensibilidade dentria naquela regio, condizente com o histrico. A evoluo natural da equimose leva a cura. A evoluo natural da fratura dentria , pela exposio da dentina, provavelmente levar a uma leso de crie que poder ao longo do tempo inutilizar o dente. A exposio da dentina pode, diretamente ou por intermdio de uma leso de crie subseqente, causar leso irreversvel da poupa dentria, levando a necessidade de tratamento endodntico, popularmente conhecido como tratamento de canal. A funo mastigatria est diminuda atualmente pela sensibilidade e, num futuro, depender da evoluo do caso, podendo ser nula caso a reparao dentria seja realizada com xito. A perda de um dente apenas compromete de imediato a funo numa proporo muito maior que a simples porcentagem que aquele elemento perdido representava na ocluso, pois quebra-se a integridade do arco. A perda de um dente leva, com o tempo, a alteraes oclusais que incluem a extruso do antagonista e a migrao mesial com a inclinao do dente posterior falha. Traumas mandibulares podem eventualmente ocasionar, a longo prazo, disfuno da articulao tmporo-mandibular.5. Concluso Houve leses corporais representadas pelas equimoses cervicais e fratura dentria do segundo molar inferior esquerdo. A funo mastigatria est atualmente diminuda em funo da fratura dentria. A evoluo natural da fratura dentria provavelmente incrementar esta debilidade funcional. Existe tratamento restaurador eficaz. (O fato de ter a vtima implantado uma ponte no lugar dos dentes perdidos na agresso que sofreu irrelevante para fins de tipificao penal da infrao. Ningum est obrigado a usar postios ou disfarces para favorecer a sorte de seu ofensor TJSP.)6. Resposta aos quesitos (estes quisitos foram formulados por uma comisso de juristas e legistas quando da elaborao do Cdigo de Processo Penal, e no obsta que a autoridade responsvels pelo inqurito formule novas questes); (as respostas a tais quesitos devem ser sempre incisivas, sem expresses dbias); (poder o perito responder que no tem elementos de convico); (Pode ser necessrio exame complementar para caracterizar, por exemplo, debilidade permanente);Primeiro: H ofensa integridade corporal ou sade? (caso o golpe desferido na cabea da vtima tivesse resultado na quebra de prtese e no de dente, o dano seria patrimonial, no pessoal)SimSegundo: Qual o instrumento ou meio que produziu?Contundente. Terceiro: Foi produzido por meio de veneno, fogo, explosivo ou tortura, ou por meio insidioso ou cruel? (resposta especfica). No. Quarto: Houve perigo de vida? No.Quinto: Resultou em incapacidade para as ocupaes habituais por mais de trinta dias? No. Sexto: Resultou em incapacidade permanente para o trabalho, enfermidade incurvel, debilidade permanente de membro, sentido ou funo, aborto ou acelerao de parto ou deformidade permanente?(resposta especificada) Sim (Por debilidade, deve-se entender enfraquecimento ou reduo ou debilitao da capacidade funcional ou de uso. Dve ser de carter permanente, incidindo sobre um membro, sentido ou funo. A debilidade transitria no caracteriza tal situao); (a debilidade permanente aquela que ultrapassa um ano com ou sem tratamento, de acordo com as determinaes legais) , debilidade permanente da funo mastigatria (a funo mastigatria acessria, se distingue das principais como a respiratria) em grau mnimo (vide discusso)