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388 1. INTRODUÇÃO A lesão da medula espinhal (LME) ocorre em cerca de 15 a 20% das fraturas da coluna vertebral e a incidência desse tipo de lesão apresenta variações nos diferentes países. Estima-se que, na Alemanha, ocorram anualmente dezessete (17) casos novos por milhão de habitantes, nos EUA, essa cifra varia de trinta e dois (32) a cinqüenta e dois (52) casos novos anuais por milhão de habitantes e, no Brasil, cerca de quarenta (40) casos novos anuais por milhão de habi- tantes, perfazendo um total de seis (06) a oito (08) mil casos por ano, cujo custo aproximado é de U$ 300,000,000,00 por ano (1,2) . A lesão ocorre, preferencialmente, no sexo mas- culino, na proporção de 4:1, na faixa etária entre 15 a 40 anos. Acidentes automobilísticos, queda de altura, acidente por mergulho em água rasa e ferimentos por arma de fogo têm sido as principais causas de trauma- tismo raquimedular (TRM). A freqüência dos TRM em decorrência de ferimentos por projéteis de arma de fogo tem aumentado de modo considerável, refle- tindo o alto nível de violência nos grandes centros, e a relação entre a velocidade dos veículos no momento da colisão e a ocorrência de fraturas da coluna toraco- lombar foram demonstradas em estudos de perícia téc- nica, realizados após os acidentes automobilísticos ( 3 ) . Em nossa cidade e região, o mergulho em águas rasas representa uma importante causa de TRM, ten- do sido observados sessenta e nove (69) casos entre 1989 a 1996, com o predomínio desse tipo de lesão em pessoas jovens do sexo masculino, principalmente du- rante o verão. A análise das principais causas de TRM em nossa cidade (acidente automobilístico, queda de altu- ra e mergulho em água rasa) demonstrou que esse tipo de lesão é passível de prevenção e poderia apresentar redução de sua incidência por meio de campanhas pre- TRAUMA RAQUIMEDULAR SPINAL CORD INJURIES Helton L. A. Defino Docente da Disciplina de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo Correspondência: Disciplina de Ortopedia e Traumatologia – Av. Bandeirantes, 3900 – 11º andar – Ribeirão Preto – SP – CEP: 14048-900 – Fone: (0xx16) 602-3224/ 633-7559 – Fax (0xx16) 633-0336 – email: [email protected] DEFINO HLA. Trauma raquimedular. Medicina, Ribeirão Preto, 32: 388-400, out./dez. 1999. RESUMO: O trauma raquimedular é uma lesão que predomina em adultos jovens do sexo masculino e, pelas características da sua etiologia, sua prevenção pode ser muito efetiva, por meio de campanhas de esclarecimentos junto à população e adoção de medidas de segurança individuais ou coletivas. A abordagem terapêutica do TRM deve ser multidisciplinar, desde o momento do resgate e remoção dos pacientes até a sua fase final de reabilitação. Até o momento, não existe nenhum tratamento efetivo capaz de restaurar as funções da medula espinhal lesada. O tratamento é realizado para a reabilitação dos pacientes, de modo que todos os esforços devem ser realizados na prevenção desse tipo irreversível de lesão. UNITERMOS: Traumatismos da Medula Espinhal. Traumatismo da Coluna Vertebral. Medicina, Ribeirªo Preto, Simpsio: TRAUMA II 32: 388-400, out./dez. 1999 Captulo II

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1. INTRODUÇÃO

A lesão da medula espinhal (LME) ocorre emcerca de 15 a 20% das fraturas da coluna vertebral ea incidência desse tipo de lesão apresenta variaçõesnos diferentes países. Estima-se que, na Alemanha,ocorram anualmente dezessete (17) casos novos pormilhão de habitantes, nos EUA, essa cifra varia detrinta e dois (32) a cinqüenta e dois (52) casos novosanuais por milhão de habitantes e, no Brasil, cerca dequarenta (40) casos novos anuais por milhão de habi-tantes, perfazendo um total de seis (06) a oito (08) milcasos por ano, cujo custo aproximado é de U$300,000,000,00 por ano(1,2).

A lesão ocorre, preferencialmente, no sexo mas-culino, na proporção de 4:1, na faixa etária entre 15 a40 anos. Acidentes automobilísticos, queda de altura,acidente por mergulho em água rasa e ferimentos porarma de fogo têm sido as principais causas de trauma-

tismo raquimedular (TRM). A freqüência dos TRMem decorrência de ferimentos por projéteis de armade fogo tem aumentado de modo considerável, refle-tindo o alto nível de violência nos grandes centros, e arelação entre a velocidade dos veículos no momentoda colisão e a ocorrência de fraturas da coluna toraco-lombar foram demonstradas em estudos de perícia téc-nica, realizados após os acidentes automobilísticos( 3 ).

Em nossa cidade e região, o mergulho em águasrasas representa uma importante causa de TRM, ten-do sido observados sessenta e nove (69) casos entre1989 a 1996, com o predomínio desse tipo de lesão empessoas jovens do sexo masculino, principalmente du-rante o verão.

A análise das principais causas de TRM emnossa cidade (acidente automobilístico, queda de altu-ra e mergulho em água rasa) demonstrou que esse tipode lesão é passível de prevenção e poderia apresentarredução de sua incidência por meio de campanhas pre-

TRAUMA RAQUIMEDULAR

SPINAL CORD INJURIES

Helton L. A. Defino

Docente da Disciplina de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São PauloCorrespondência: Disciplina de Ortopedia e Traumatologia – Av. Bandeirantes, 3900 – 11º andar – Ribeirão Preto – SP – CEP:14048-900 – Fone: (0xx16) 602-3224/ 633-7559 – Fax (0xx16) 633-0336 – email: [email protected]

DEFINO HLA. Trauma raquimedular. Medicina, Ribeirão Preto, 32: 388-400, out./dez. 1999.

RESUMO: O trauma raquimedular é uma lesão que predomina em adultos jovens do sexomasculino e, pelas características da sua etiologia, sua prevenção pode ser muito efetiva, pormeio de campanhas de esclarecimentos junto à população e adoção de medidas de segurançaindividuais ou coletivas.

A abordagem terapêutica do TRM deve ser multidisciplinar, desde o momento do resgate eremoção dos pacientes até a sua fase final de reabilitação.

Até o momento, não existe nenhum tratamento efetivo capaz de restaurar as funções damedula espinhal lesada. O tratamento é realizado para a reabilitação dos pacientes, de modoque todos os esforços devem ser realizados na prevenção desse tipo irreversível de lesão.

UNITERMOS: Traumatismos da Medula Espinhal. Traumatismo da Coluna Vertebral.

Medicina, Ribeirão Preto, Simpósio: TRAUMA II32: 388-400, out./dez. 1999 Capítulo II

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Trauma raquimedular

ventivas e de esclarecimento junto à população, demodo que a iniciativa da Liga do Trauma no tocante àprevenção desses traumatismos deve ser estimuladapara que seja um trabalho contínuo e que procure, demodo crescente, atingir de maneira eficiente o maiornúmero possível de pessoas em nossa cidade. Comoexemplo da importância do esclarecimento junto à po-pulação, podemos citar que a entrevista com doze (12)pacientes vítimas de TRM por mergulho em água rasarevelou que todos desconheciam a possibilidade daocorrência desse tipo de acidente, bem como de suasconseqüências, pois a preocupação em relação ao lazeraquático estava voltada para o afogamento e não paraoutro tipo de trauma da coluna cervical(4).

A localização anatômica da lesão está direta-mente relacionada ao mecanismo detrauma e cerca de 2/3 das lesões medu-lares estão localizadas no segmento cer-vical. Lesões da medula na região torá-cica ocorrem em 10% das fraturas des-se segmento e em 4% das fraturas dacoluna toracolombar(5).

2. CONSIDERAÇÕES ANATÔMICAS

A coluna vertebral é formada portrinta e três (33) a trinta e quatro (34)vértebras (07 cervicais, 12 torácicas, 05lombares, 05 sacrais e 04 ou 05 coccí-geas). O forame ou conduto vertebral éformado pela parede posterior do corpovertebral e parede anterior do arco ver-tebral, e a superposição dos vários fora-mes vertebrais forma o canal raquídeo,que aloja e protege a medula espinhal.

A medula espinhal, nos adultos,possui cerca de 45 cm e estende-se des-de a altura do atlas (C1) até a primeiraou segunda vértebra lombar.

A medula espinhal afila-se paraformar o cone medular, do qual se es-tende um filamento delicado, denomina-do de “filum terminale”, que se inserepróximo ao primeiro segmento coccígeo.Na parte baixa do canal vertebral, des-cendem as raízes dos nervos espinhaiscaudais, que, juntamente com o “filumterminale”, formam a cauda eqüina, quetem o seu início no nível de T11 e termi-na, caudalmente, no nível do terceiro seg-

mento sacral, ocupando sozinha o canal vertebral abai-xo de L2. (Figura 1)

A medula espinhal está dividida em segmentose as raízes nervosas que emergem da medula no nívelde cada segmento são designadas por algarismos quese referem ao nível de sua saída. Trinta e um pares denervos espinhais originam-se da medula espinhal (08cervicais, 12 torácicos, 05 lombares, 05 sacrais e 01coccígeo). O primeiro par de nervo espinhal emergeentre o occipital e o atlas (C1), de modo que, na colu-na cervical, o nervo emerge, cranialmente, junto a suavértebra correspondente. Somente a partir do primei-ro segmento torácico, o nervo espinhal emerge caudalà sua vértebra correspondente.

Cada raiz nervosa recebe informações sensiti-vas de áreas da pele denominadas dedermátomos e, similarmente, cadaraiz nervosa inerva um grupo de mús-culos denominados de miótomos.

A localização do segmento damedula espinhal não está na mesmaaltura do segmento ósseo vertebralcorrespondente; como exemplo, ob-servamos que o segmento medularC8 está localizado no nível entre C6-C7 e o segmento medular T12 no ní-vel de T10. (Figura 1)

A medula espinhal é um gran-de condutor de impulsos nervosos sen-sitivos e motores entre o cérebro eas demais regiões do corpo. A medu-la espinhal possui tratos orientados lon-gitudinalmente (substância branca) cir-cundando áreas centrais (substânciacinzenta) onde a maioria dos corposcelulares dos neurônios espinhais es-tão localizados. Ao corte transversal,a substância cinzenta apresenta a for-ma de H e pode ser subdividida emcorno anterior, lateral e posterior. Nocorno anterior, estão localizados oscorpos celulares dos neurônios moto-res e visceromotores (aferentes), nocorno posterior os neurônios sensiti-vos (eferentes) e no corno lateral osneurônios do sistema simpático. As fi-bras motoras, oriundas do corno an-terior, juntam-se às fibras sensitivas docorno posterior para formar o nervoespinhal.

Figura 1- Desenho, ilustran-do a relação entre as vérte-bras, a medula espinhal e asraízes nervosas.

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Os tratos da substân-cia branca constituem viasnervosas ascendentes e des-cendentes, que conduzemimpulsos nervosos em direçãoao cérebro e de várias partesdo cérebro para o resto docorpo (Figura 2). Os tratosmais importantes do ponto devista clínico são os relatadosa seguir.

T r a t oespinotalâmico ventral –transmite impulsos relaciona-dos ao tato. Possui origem nacoluna posterior, cruza para olado oposto na comissura an-terior e ascende pelo funículoanterior até o tálamo.

T r a t oespinotalâmico lateral-media os impulsos da sensibi-lidade dolorosa e da tempe-ratura do lado contralateral. Possui, também, origemna coluna posterior, cruza para o lado oposto nacomissura anterior e ascende pelo funículo lateral aotálamo. Clinicamente, pode ser avaliado, beliscando-se a pele ou por meio de estímulo com objetos pontia-gudos, como agulha ou alfinete.

Trato espinocerebelar ventral e dorsal- re-lacionados à propriocepção, conduzem impulsos ao ce-rebelo por meio da medula espinhal.

Fascículos grácil e cuneiforme – localizadosna porção posterior da medula espinhal entre o sulcomediano posterior e sulco póstero-lateral, conduzemimpulsos proprioceptivos, provenientes de músculos,tendões e articulações, impulsos táteis localização ediscriminação, e sensações vibratórias, como as pro-duzidas pelo cabo do diapasão colocado sobre um ossorecoberto de pele.

Trato corticoespinhal lateral e trato cor-ticoespinhal ventral – as vias piramidais transmi-tem o impulso motor para os motoneurônios do cor-no anterior, por meio do trato corticoespinhal lateral,que cruza para o lado oposto no bulbo, e do trato cor-ticoespinhal ventral, que desce sem cruzar para o ladooposto, na parte anterior da medula espinhal. Contro-lam a força motora e são testados por meio da contra-ção voluntária ou contração involuntária mediante es-tímulo doloroso.

Dorsal

Ventral

3. FISIOPATOLOGIA

A transferência de energia cinética para a me-dula espinhal, o rompimento dos axônios, a lesão dascélulas nervosas e a rotura dos vasos sangüíneos cau-sam a lesão primária da medula espinhal, e, no estágioagudo da lesão (até 08 horas após o trauma), ocorrehemorragia e necrose da substância cinzenta, seguidade edema e hemorragia. Formam-se petéquias hemor-rágicas na substância cinzenta, logo no primeiro minu-to da LME, que se aglutinam dentro da primeira hora,resultando na necrose central hemorrágica, que podeestender-se para a substância branca nas 04 a 08horas seguintes, como conseqüência de uma reduçãogeral do fluxo sangüíneo no local da lesão. A seguir,células inflamatórias migram para o local da lesão,acompanhadas de proliferação de células da glia, e,no período de 01 a 04 semanas, ocorre a formação detecido cicatricial e cistos no interior da medula espi-nhal.

A redução do fluxo sangüíneo para o segmentolesado da medula espinhal pode ainda ser ocasionadopor alteração do canal vertebral, hemorragia, edemaou redução da pressão sistêmica, que conduzem àlesão adicional, denominada de lesão secundária. Essaredução do fluxo sangüíneo pode provocar a mortedas células e axônios que não foram inicialmentelesados.

Figura 2 - Desenho, ilustrando os principais tratos da medula espinhal.1. Fascículo grácil e cuneiforme; 2. Trato corticoespinhal lateral; 3. Trato espinocerebelar dorsal;4. Trato espinotalâmico lateral; 5. Trato espinocerebelar ventral

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A separação física dos tratos da medula espi-nhal, geralmente, não ocorre nos traumatismos nãopenetrantes da medula espinhal, tendo sido observadaseparação física dos axônios somente em alguns ca-sos de ferimento por arma de fogo(6). A separação dosaxônios é um processo gradual, que ocorre no localda lesão, após alguns dias do traumatismo, sendo oresultado de uma série de eventos patológicos, relaci-onados à lesão da membrana celular e suas proteí-nas, e não da separação física imediata do axônio. Ainterrupção da condução do estímulo nervoso ime-diatamente após o trauma, provocado pela energiacinética da lesão, pode ser devida a uma despolarizaçãoimediata da membrana do axônio, associada à falhade sua repolarização, que ocasiona perda de potássiopelo axônio(7).

A isquemia do sistema nervoso central é carac-terizada por um grande influxo de cálcio para as célu-las(8), e reações metabólicas, como falha das mitocôn-drias e ativação das fosfolipases, proteases e adenosi-na trifosfatase ocorrem, e o resultado é a perda deenergia e colapso da membrana celular, que tambémé mediado pela produção de radicais livres e ativaçãodas fosfolipases e lipases. A impossibilidade da célulaem converter completamente o oxigênio para dióxidode carbono e água, promove a formação de radicaislivres, que resulta em peroxidação lipídica e subse-qüente falha da membrana celular. Esses eventos jus-tificam a utilização da metilprednisolona nas primeiras08 horas após o TRM, que é administrada com o obje-tivo de inibir a peroxidação lipídica(9).

4. AVALIAÇÃO CLÍNICA

O atendimento do paciente no local do acidenteé de grande importância para a sua avaliação inicial,reconhecimento de suas lesões e prevenção de lesõesadicionais durante o seu resgate e transporte para olocal onde deverá receber o atendimento definitivo.Devem ser sempre consideradas a presença de umalesão da coluna vertebral e a manutenção da imobili-zação do paciente até que esse tipo de lesão possa seravaliado com segurança por meio de radiografias eoutros exames complementares, quando necessários.As lesões instáveis da coluna vertebral sem lesãoneurológica, principalmente em pacientes politrau-matizados, vítimas de colisões em alta velocidade, in-conscientes ou alcoolizados, possuem grande potenci-al de lesão adicional das estruturas nervosas duranteo resgate e transporte dos pacientes, existindo inú-

meros exemplos clínicos de pacientes com quadroneurológico normal após o acidente, e que sofreramlesão das estruturas nervosas durante o resgate etransporte. Em pacientes inconscientes e vítimas decolisão de automóveis ou quedas, a possibilidade dacoluna cervical estar lesada é de 5 a 10% e observou-se, no estudo de trezentos (300) pacientes portadoresde fratura da coluna cervical, que cerca de 1/3 dasfraturas não foram diagnosticadas no momento do aten-dimento inicial(10).

A avaliação do paciente compreende a história,exame físico, exame neurológico e exame radiológico.

A história do trauma e informações acerca doestado geral do paciente previamente ao trauma sãode grande utilidade para auxiliar no esclarecimento domecanismo de trauma e suas possíveis lesões associ-adas. A presença de traumatismo cranioencefálico, in-toxicação alcoólica, lesões múltiplas, traumas da facee acima da clavícula aumentam a probabilidade daocorrência de fratura da coluna vertebral.

O exame físico geral do paciente inicia-se pelaavaliação de suas vias aéreas “com o controle da co-luna cervical”, da sua respiração e ventilação, e dacirculação (ABC), pois a prioridade, no atendimentoinicial, deve ser para a avaliação, preservação e trata-mento das funções vitais básicas.

Os pacientes com fratura da coluna vertebralsem lesão neurológica apresentam dor local, que podeirradiar-se para os membros, e incapacidade funcio-nal, acompanhada de espasmo da musculatura adja-cente. Nos pacientes com lesão medular, podem serobservadas respiração diafragmática, perda da res-posta ao estímulo doloroso, incapacidade de realizarmovimentos voluntários nos membros, alterações docontrole dos esfíncteres, priapismo e presença de re-flexos patológicos (Babinski, Oppenheim), indicandolesão do neurônio motor superior. Os pacientes comlesão medular podem apresentar, também, queda dapressão arterial, acompanhada de bradicardia, que ca-racteriza o denominado choque neurogênico. Nessespacientes, a lesão das vias eferentes do sistema ner-voso simpático medular e conseqüente vasodilataçãodos vasos viscerais e das extremidades, associadas àperda do tônus simpático cardíaco, não permitem queo paciente consiga elevar a freqüência cardíaca. Essasituação deve ser reconhecida e diferenciada do cho-que hipovolêmico, no qual a pressão arterial está dimi-nuída e acompanhada de taquicardia. A reposição delíquidos deve ser evitada no choque neurogênico, paranão sobrecarregar a volemia.

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O exame neurológico consiste na avaliação dasensibilidade, da função motora e dos reflexos. A áreade sensibilidade do paciente é examinada no sentidocraniocaudal, desde a região cervical, pela avaliaçãoda sensibilidade à variação de temperatura, sensi-bilidade dolorosa e sensibilidade tátil, que são funçõesmediadas pelo trato espinotalâmico lateral, cujas fi-bras estão na porção anterolateral da medula espinhal.A avaliação da vibração por meio de diapasão ou daposição espacial dos membros avalia as condições do

trato posterior da medula espinhal (funículo grácil ecuneiforme).

A distribuição dos dermátomos está ilustrada naFigura 3 e algumas regiões anatômicas possuem rela-ção com esses dermátomos e importância semiológica,como os mamilos (T4), processo xifóide (T7), umbigo(T10), região inguinal (T12-L1) e região perineal (S2-S3-S4). (Figura 4)

A avaliação da função motora tem como objeti-vo a determinação do grau de movimento que o paci-

ente possui, avalia afunção dos tratos cor-ticoespinhais, sendo in-suficiente a constata-ção apenas da presen-ça ou ausência do mo-vimento nas extremi-dades, que deve serquantificado com rela-ção ao grau de forçamuscular, que é deter-minada por meio deuma escala que variade 0 a 5. A paralisia to-tal é considerada 0; apresença de contraçãomuscular palpável ouvisível, 1; a presença demovimento ativo, masque não vence a forçada gravidade, 2; movi-mento ativo que vencea força da gravidade, 3;movimento ativo quevence alguma resistên-cia, 4 e movimento ati-vo normal, 5.

Deve ser lem-brado que as raízesinervam mais de ummúsculo e que os mús-culos, geralmente, re-cebem fibras nervosasde mais de uma raiznervosa.

Os reflexos ten-dinosos profundos sãomediados pelas célulasdo corno anterior damedula espinhal, e o

Figura 3 - Distribuição dos dermátomos do membro superior, membro inferior e região perineal.

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córtex cerebral exerce uma ação inibidora paraevitar a sua resposta exacerbada aos estímulosrecebidos. A ausência desse reflexo pode indi-car uma lesão do nervo periférico, interrom-pendo o arco reflexo, ou a presença de choquemedular. Os reflexos tendinosos profundos, demaior importância clínica são os reflexos: bici-pital (C5), estiloradial (C6), tricipital (C7), patelar(L4) e aquileo (S1).

Os reflexos abdominais e cremastéricossão testes do neurônio motor superior, e a au-sência desses reflexos indica lesão do neurôniomotor superior, enquanto a perda assimétricasugere lesão no neurônio motor inferior. As le-sões do neurônio motor superior podem tam-bém ser diagnosticadas pela presença de refle-xos patológicos, evidenciados pelo teste deBabinski ou Oppenheim.

O reflexo bulbocavernoso é de grandeimportância na avaliação dos pacientes comTRM, que apresentam choque medular. O cho-que medular pode ocorrer imediatamente apóso traumatismo da medula espinhal, mesmo que

a lesão medular não seja completa e permanente, e,nessa situação, o paciente apresenta ausência total dasensibilidade, dos seus movimentos e do reflexo bul-bocarvenoso, que, normalmente, está presente. O re-torno desse reflexo, que pode ser obtido por meio daestimulação do pênis ou clitóris, provocando contra-ção do esfíncter anal, indica o término do choque me-dular, permitindo, então, a determinação do déficit neu-rológico após a lesão. (Figura 5)

A avaliação clínica dos pacientes determina onível de lesão neurológica, que é considerada comosendo o segmento mais caudal da medula espinhal queapresenta as funções sensitivas e motoras normais deambos os lados. Quando o termo nível sensitivo éutilizado, refere-se ao nível mais caudal da medula es-pinhal, que apresenta sensibilidade normal, podendo,do mesmo modo, ser definido o nível motor. O nívelesquelético da lesão é determinado por meio de ra-diografias e corresponde à vértebra lesionada.

A lesão medular é denominada completa, quan-do existe ausência de sensibilidade e função motoranos segmentos sacrais baixos da medula espinhal, eincompleta nas situações em que é observada pre-servação parcial das funções motoras abaixo do nívelneurológico e inclui os segmentos sacrais baixos damedula espinhal.

Figura 5 - Desenho, ilustrando o reflexo bulbocavernoso e sua avaliaçãono sexo masculino.

Figura 4 - Desenho, ilustrando a relação entre áreasanatômicas de importância semiológica e seus respectivosdermátomos.

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Algumas síndromes medulares têm sido des-critas e elas apresentam quadro neurológico caracte-rístico, dependendo da localização da lesão no interiorda medula espinhal. A síndrome da medula centralocorre, principalmente, na região cervical e apresentacomprometimento mais acentuado dos membros su-periores que dos membros inferiores. Na síndromeda medula anterior, existe preservação da proprio-cepção e perda variável da função motora e da sensi-bilidade à dor. Na síndrome de Brown-Séquard, ahemisecção da medula ocasiona perda da função mo-tora e proprioceptiva do lado da lesão e perda da sensibi-lidade à dor e temperatura do lado oposto. Na síndromeda medula posterior, a função motora, a sensibilida-de à dor e tato estão preservados, enquanto que a pro-priocepção está alterada. A lesão da medula espinhalno nível sacral, geralmente no nível ósseo de T12-L1(síndrome do cone medular), resulta em incontinên-cia fecal, vesical e alteração da função sexual. A sensibi-lidade está alterada nos 03 a 04 segmentos sacrais distaise segmentos coccígeos (anestesia em cela) e o reflexobulbo cavernoso encontra-se ausente. A lesão isoladados nervos espinhais da cauda eqüina (lesão da cau-da eqüina) no interior do canal vertebral, geralmente,ocorre nas fraturas distais a L1-L2, e, na verdade, nãosão lesões da medula espinhal. O quadro clínico de-pende da raiz atingida e podem ser observados paresiado membro inferior, arreflexia, distúrbios da sensibili-dade e, também, incontinência fecal e vesical.

O termo tetraplegia refere-se à perda da fun-ção motora e ou sensitiva nos segmentos cervicais damedula espinhal devido à lesão dos elementos neuronaisno interior do canal vertebral. A tetraplegia, resulta emalteração das funções dos membros superiores, tron-co, membros inferiores e órgãos pélvicos, não sendoincluídas nessa categoria de lesão as lesões do plexobraquial e nervos periféricos fora do canal vertebral.

A paraplegia refere-se à perda da funçãomotora e ou sensitiva nos segmentos torácicos, lom-bares e sacrais da medula espinhal, secundária à le-são dos elementos neurais no interior do canal verte-bral. Esse termo pode ser utilizado para definir as le-sões da cauda eqüina e cone medular, mas não paraas lesões do plexo lombossacro e lesões dos nervosperiféricos, localizadas fora do canal vertebral.

5. AVALIAÇÃO DA ASIA (AMERICAN SPINEINJURY ASSOCIATION)

A Associação Americana do Trauma Raquime-dular (ASIA- American Spine Injury Association) de-senvolveu, em 1992, padrões para a avaliação e clas-

sificação neurológica do TRM, avaliação que apresenta,no momento, grande aceitação em nível mundial. (Fi-gura 6).

A avaliação neurológica é baseada na sensibili-dade e na função motora, e possui uma etapa compul-sória, baseada na qual é determinado o nível da lesãoneurológica, o nível motor e o nível sensitivo, e obtêm-se números que, em conjunto, fornecem um escore. Aoutra etapa é opcional (avaliação da sensibilidade pro-funda, propriocepção, dor profunda) e não participana formação do escore, mas acrescenta importantesinformações na avaliação clínica dos pacientes.

O exame da sensibilidade do paciente é realiza-do por meio da avaliação da sensibilidade tátil e dolo-rosa do paciente, pesquisada nos 28 dermátomos deambos os lados (Figura 6), atribuindo-se uma avalia-ção numérica de acordo com o achado clínico: 0- au-sente, 1- alterada, 2- normal e NT (não testada), quan-do, por qualquer motivo, a avaliação do dermátomonão puder ser realizada. O esfíncter anal externo deveser também examinado por meio da introdução do dedodo examinador no orifício anal, com a finalidade dedeterminar-se se a lesão é completa ou incompleta(sensibilidade presente-sim, ou ausente-não).

A avaliação da função motora é realizada pormeio da avaliação de ambos os lados, de músculosdenominados “músculos chaves” em 10 pares de mió-tomos, e a força muscular graduada de acordo com aseguinte escala: 0- paralisia toral, 1- contração palpá-vel ou visível, 2- movimento ativo eliminado pela forçada gravidade, 3- movimento ativo que vence a forçada gravidade, 4- movimento ativo contra alguma re-sistência, 5- normal e NT (não testada).Os músculosselecionados para a avaliação e os níveis neurológicoscorrespondentes são:

C5- flexores do cotoveloC6- flexores do punhoC7- extensores do cotoveloC8- flexores do dedo (falanges média e distal)T1- abdutores (dedo mínimo)L2- flexores do quadrilL3- flexores do joelhoL4- dorsiflexores do tornozeloL5- extensor longo dos dedosS1- flexores plantares do tornozeloAdicionalmente ao exame dos 10 pares de mió-

tomos mencionados, o esfíncter anal externo deve sertambém examinado para se avaliar a sua capacidadede contração voluntária (sim ou não), que auxilia nadiferenciação da lesão incompleta ou completa.

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Opcionalmente,o diafragma, o deltói-de e os ísquio tibiaissão também avaliadose sua força anotadacomo ausente, dimi-nuída ou normal.

A somatóriados diferentes valoresnuméricos referentesà força motora, sen-sibilidade tátil e sensi-bilidade dolorosa dãoorigem a escores, cujovalor máximo é 100para o referente àavaliação motora e 112 para o da avaliação sensitiva.

A avaliação da deficiência é baseada na modifi-cação da escala de Frankel et al.(11), que foi modifica-da pela ASIA e consiste em 05 graus de incapacidade:a) lesão completa - não existe função motora ou sen-

sitiva nos segmentos sacrais S4-S5.c) lesão incompleta - preservação da sensibilidade e

perda da força motora abaixo do nível neurológico,estendendo-se até os segmentos sacrais S4-S5.

c) lesão incompleta - função motora é preservada abai-xo do nível neurológico, e a maioria dos músculoschaves abaixo do nível neurológico possui graumenor ou igual a 3.

d) lesão incompleta - função motora é preservada abai-xo do nível neurológico e a maioria dos músculoschaves abaixo do nível neurológico possui graumaior ou igual a 3.

e) normal – sensibilidade e força motora normais.

6. AVALIAÇÃO RADIOLÓGICA

A coluna vertebral deve ser avaliada por meiode radiografias realizadas nos planos anteroposterior(AP) e lateral, procurando avaliar a assimetria, o ali-nhamento das vértebras e roturas das partes moles. Émuito importante a visualização de todas as vértebrasda coluna cervical e a transição cervicotorácica, e, naimpossibilidade da visualização desse segmento da co-luna vertebral por meio das radiografias convencio-nais, a realização das radiografias sob tração dos mem-bros superiores (Figura7) ou a utilização da posição donadador podem, também, auxiliar (Figura 8), e utiliza-sea tomografia computadorizada nas situações extremas.

Figura 8 - “Posição do nadador” utilizada para auxiliar avisualização das vértebras cervicais distais na avaliaçãoradiográfica.

Figura 7- Aplicação de tração nos membros superiores para auxiliar a visualização da parte baixa dacoluna cervical para radiografias convencionais.

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As radiografias dinâmicas (hiperflexão e hipe-rextensão) são contra-indicadas em pacientes com défi-cit neurológico ou inconscientes. Esse tipo de avalia-ção radiológica deve somente ser utilizada em paci-entes que apresentem radiografias normais, sem alte-ração neurológica e em perfeito estado de alerta, demodo que possam realizar a flexão e extensão ativada coluna cervical de modo voluntário e com o totalcontrole da situação.

A realização das radiografias em AP, perfil etransoral para a observação do processo odontóidepermite o diagnóstico de 84% das fraturas da colunacervical. A utilização da tomografia computadorizadapermite o diagnóstico de fraturas ocultas da regiãocervical(12) e ela é também muito útil na avaliação damorfologia da fratura, da estabilidade do segmento le-sado e da compressão do canal vertebral pelos frag-mentos da vértebra fraturada.(Figura 9).

A ressonância magnética tem auxiliado sobre-maneira o diagnóstico dos TRM e sempre que possí-vel deve ser utilizada na fase primária do diagnóstico,pois ela permite uma análise detalhada das partesmoles, com melhor visualização de contusões medu-lares, hematomas, lesões ligamentares, hérnias discaise coleções líquidas.

Figura 9 - Radiografias em AP (a) e perfil (b) e tomografiacomputadorizada (c) de fratura de L1. Radiografia pós-operatória em AP (d) e perfil (e) após fixação anterior eposterior.

Figura 10 - Desenho, ilustrando os cuidados iniciais naremoção e transporte dos pacientes.

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7. TRATAMENTO

O tratamento dos TRM deve terinício no momento do atendimento ini-cial, ainda fora do ambiente hospitalar,durante o resgate e transporte dos pa-cientes, com o objetivo de evitar lesõesadicionais ou ampliação das lesões jáexistentes. A imobilização da coluna cer-vical deve ser realizada em todos os pa-cientes politraumatizados e retirada so-mente após a confirmação da ausênciade lesão. Cuidados especiais devem sertomados durante o transporte dos paci-entes e durante a retirada de capace-tes de ciclistas ou motociclistas vítimasde acidente. (Figuras 10 e 11)

O tratamento na emergência temcomo principal objetivo a manutençãoe o restabelecimento das funções vi-tais do paciente (ABC – vias aéreas, respiração e cir-culação), de modo que o tratamento específico da le-são do segmento vertebral com lesão medular é reali-zada somente após a resolução dessa fase. É impor-tante lembrar a ocorrência do choque neurogênico(hipotensão associada à bradicardia) nos pacientes comlesão acima de T6 para evitar-se a administração delíquidos e conseqüente sobrecarga hídrica.

A metil prednisolona tem sido administrada até08 horas após a lesão da medula espinhal, com basenos resultados observados no NASCIS I e II (NationalSpinal Cord Injury Study), realizados em 1990 e 1992,nos quais foi observada uma melhora neurológica sig-nificativa no grupo de pacientes em que essa droga foiadministrada. A metil prednisolona tem a capacidadede reduzir a peroxidação lipídica e preservar a integri-dade das estruturas neuronais, atuando no nível da le-são secundária devido à isquemia e ação dos radicaislivres. A metil- prednisolona possui maior efeito que adexametasona na inibição da peroxidação lipídica, eoutras drogas, como o mesilato de tiralazade, que é daclasse dos compostos conhecidos como 21-aminoes-teróides ou lazaróides, têm sido também utilizadas, pois,também, são potentes inibidores da peroxidação lipídicae não apresentam os efeitos colaterais dos corticóides.

A dose recomendada de metil-prednisolona éde 30 mg/Kg de peso, administrada em bolo durante15 minutos, e 45 minutos após essa dose em bolo, ad-ministram-se 5,4 mg/Kg em infusão constante por 23horas. A dose total de metil-prednisolona é de 154,2mg/Kg de peso em 24 horas, e deve ser administrada

Figura 11 - Desenho, ilustrando a seqüência e os cuidados necessários naremoção do capacete.

nas primeiras 08 horas após o trauma. Após esse pe-ríodo, a administração dessa droga não alcança o ob-jetivo desejado e pode acarretar ainda certos efeitosnocivos. A utilização dessas drogas, disseminada prin-cipalmente nos EUA, tem sido objeto de críticas emoutros países e não há consenso definitivo sobre o papelprotetor delas, nos traumatismos raquimedulares.

O tratamento definitivo da lesão, no segmentovertebral fraturado, tem, como principais objetivos, apreservação da anatomia e função da medula espi-nhal, restauração do alinhamento da coluna vertebral,estabilização do segmento vertebral lesado, preven-ção de complicações gerais e locais, e o restabeleci-mento precoce das atividades dos pacientes, devendoser realizado o mais precocemente possível, desde queas condições gerais do paciente permitam. Na impos-sibilidade de o tratamento definitivo ser realizado, aredução da fratura e realinhamento do canal verte-bral deve ser realizado por meio de tração.

Não existe até o momento nenhum tratamentocirúrgico capaz de restaurar as funções da medula es-pinhal lesada e o objetivo do tratamento cirúrgico éapenas a redução e o realinhamento do segmento ver-tebral lesado, restauração da estabilidade do segmen-to lesado, de modo a evitar lesões adicionais da medu-la espinhal e favorecer a sua recuperação. Outra van-tagem adicional dos modernos métodos de fixação ver-tebral é a possibilidade da mobilização precoce dospacientes, sem a utilização de imobilização externa, oque facilita a reabilitação no período pós-operatório(Figuras 9, 12 e 13).

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Trauma raquimedular

DEFINO HLA. Spinal cord injuries. Medicina, Ribeirão Preto, 32: 388-400, oct./dec. 1999.

ABSTRACT: Rachimedullary trauma (RMT) is a lesion that predominates among young adultmales. Because of the characteristics of its etiology, it can be effectively prevented by means ofeducational campaigns directed at the population and by the adoption of individual or collectivesafety measures.

The therapeutic approach to RMT should be multidisciplinary from the time of patient’s rescueand removal to the final rehabilitation phase.

Thus far there is no effective treatment capable of restoring the functions of the injured spinalcord. Treatment consists of patient rehabilitation and therefore all efforts should be directed atpreventing this irreversible type of injury.

UNITERMS: Spinal Cord Injuries. Spinal Injuries.

As indicações do tratamento cirúrgico têm sidobaseadas na presença de instabilidade do segmentovertebral e lesão neurológica, existindo controvérsiacom relação a esse tópico. A presença de paralisiaapós intervalo de quadro neurológico normal, presen-ça de paralisia rápida e progressiva ou paralisia in-completa, que evolui para paralisia completa, têm sidoconsideradas como indicações absolutas e urgentes

de tratamento cirúrgico.Nossa conduta atual tem sido no sentido de rea-

lizar a estabilização precoce das lesões, para facili-tar a mobilização precoce dos pacientes e promoverde modo mais rápido sua reabilitação e reintegraçãosocial e não no sentido de realizar sua recuperaçãoneurológica, uma vez que o papel da descompressão émuito discutível.

Figura 13 - Radiografia em perfil da colunacervical após corporectomia de C4, colocaçãode enxerto corticoesponjoso e fixação vertebralanterior com placa em H de C3 a C5.

Figura 12 - Radiografia em perfil da colunacervical após a fixação posterior com implantes.

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Recebido para publicação em 08/12/1999

Aprovado para publicação em 19/01/2000