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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP PAULO ROBERTO BARBOSA Um Estudo sobre os Gêneros Textuais no Apostilado de Língua Portuguesa da Rede Pública Paulista Mestrado em Língua Portuguesa SÃO PAULO 2018

Um Estudo sobre os Gêneros Textuais no Apostilado de

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

PAULO ROBERTO BARBOSA

Um Estudo sobre os Gêneros Textuais no Apostilado de

Língua Portuguesa da Rede Pública Paulista

Mestrado em Língua Portuguesa

SÃO PAULO

2018

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

PAULO ROBERTO BARBOSA

Um Estudo sobre os Gêneros Textuais no Apostilado de

Língua Portuguesa da Rede Pública Paulista

Mestrado em Língua Portuguesa

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como

exigência parcial para a obtenção do título de Mestre

em Língua Portuguesa, sob orientação da Professora

Doutora Leonor Lopes Fávero.

SÃO PAULO

2018

Banca Examinadora

____________________________________________________

____________________________________________________

____________________________________________________

“As fronteiras da minha linguagem são as fronteiras

do meu universo” (Ludwig Wittgenstein, 2005).

Agradeço à CAPES, cujo apoio

financeiro possibilitou minha

dedicação a este estudo.

AGRADECIMENTOS

A Deus, pela minha vida.

À minha querida mãe, que, com sua força, amor e dedicação me fez ser o que sou hoje,

sempre iluminando os meus passos com sábios conselhos e com um cuidado incondicional.

Ao meu pai, em memória, cuja presença, ainda que não mais física, serve sempre de apoio e

de exemplo, em que eu me inspiro e me espelho para ser sempre uma pessoa melhor.

À minha noiva, Neiva Ferreira, parceira de todas as horas, que caminha ao meu lado em todas

as situações. A sua cumplicidade e o seu amor tornam a minha vida mais leve e bonita.

À minha orientadora, Leonor Lopes Fávero, que, com seus ensinamentos, instruções e

conselhos, proporciona um acréscimo imenso às minhas empreitadas acadêmicas. Sem

dúvida, um dos meus maiores exemplos de professora e de pesquisadora, alguém em quem

sempre irei me inspirar no decorrer da minha vida profissional e acadêmica.

Ao meu irmão, Luciano Barbosa, uma pessoa essencial em minha vida e um amigo com quem

sempre posso contar.

Aos meus cunhados, Célia Ferreira e Robson Cruzoe, e a meus sogros, Maria Rosa e José

Ferreira, pelo incentivo e apoio.

Às professoras Lílian Maria Ghiuro Passarelli e Zilda Gaspar Oliveira de Aquino, por terem

aceitado ler meu trabalho e participar da minha banca e cujos apontamentos possibilitaram-me

avançar nas discussões.

Às colegas Maria Izabel Rodrigues Tognato e Adriana Manolio, pela leitura atenta e

apontamentos valiosos.

Aos professores Joaquim Dolz, Sueli Cristina Marquesi, Ana Rosa Ferreira Dias e Dieli

Vesaro Palma, por suas preciosas instruções.

Aos meus colegas de trabalho, João Manoel de Oliveira e Roberta Moraes dos Santos

Bezerra, obrigado pela compreensão.

À secretária do programa, Lourdes Scaglione, e aos demais professores que contribuíram

direta ou indiretamente para o desenvolvimento desta pesquisa.

E, por fim, a todos os meus colegas que, de uma forma ou de outra, por meio de conselhos,

ideias ou experiências, ajudaram a tornar este estudo possível, torcendo por mim. Todos

foram peças fundamentais para o alicerce deste trabalho.

RESUMO

Este estudo trata da análise das questões referentes ao ensino dos gêneros textuais presentes

no Caderno do Aluno de Língua Portuguesa do 9º ano do Ensino Fundamental, apostilado

distribuído na rede pública de ensino do estado de São Paulo. Sua abrangência e consequente

relevância no panorama educacional do estado motivaram nossa escolha por analisá-lo, visto

que as apostilas são utilizadas por todos os alunos. O objetivo que norteia esta pesquisa é

investigar a forma como os gêneros textuais são abordados no Caderno do Aluno de Língua

Portuguesa. Esse objetivo geral se associa aos seguintes objetivos específicos: levantamento

dos gêneros textuais presentes na apostila; relacionando-os a seus respectivos domínios

discursivos; identificação das tipologias mobilizadas nos gêneros textuais; e análise de como e

em que medida as tipologias argumentativas e expositivas podem ser internalizadas pelos

alunos por meio das atividades propostas no apostilado. O aporte teórico que orienta a

pesquisa se relaciona aos postulados da Linguística Textual, sobretudo os conceitos de

intertextualidade, coesão e coerência apresentados pelos estudos de Fávero (2014, 2009

[1991]), Fávero e Koch (2012 [1983]) e Koch (2014 [1989], 2004), além do Interacionismo

Sociodiscursivo de Bronckart (2012 [1997], 2006a), com grande influência da obra de

Vygotsky (1989, 1984). Este estudo considera o ensino com base em gêneros textuais

propostos por Bakhtin (2011 [1979]) e reinterpretados pelo viés teórico-metodológico de

Bronckart (2012 [1997]), Marcuschi (2008) e Dolz e Schneuwly (2004), segundo os quais a

linguagem é uma forma de ação que se realiza no discurso socialmente situado e partilhado

por meio dos gêneros textuais. À vista disso, tem-se como base as resoluções dos Parâmetros

Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998) – no que concerne às sugestões para o ensino da

Língua Portuguesa, a partir das quais foi elaborado o Currículo do Estado de São Paulo (SÃO

PAULO, 2012). Esses documentos sugerem que, no 9º ano do Ensino Fundamental, sejam

estudados com maior ênfase os textos argumentativos e expositivos. Além disso, este trabalho

também apresenta o percurso histórico do apostilado no Brasil até a aplicação desse material

nos dias atuais na rede pública paulista. Como resultado das análises do apostilado, constatou-

se um distanciamento entre o que está prescrito no Currículo Estado de São Paulo e as

atividades propostas aos alunos para a aprendizagem dos gêneros da ordem do argumentar e

do expor, já que se verificou a inserção majoritária dos gêneros que competem ao narrar, ao

passo que os gêneros argumentativos e expositivos, embora tenham aparecido, foram pouco

explorados. Houve, portanto, a compreensão de que, para promover a formação de cidadãos

ativos socialmente, é preciso dar ênfase ao estudo interativo da linguagem, que acontece

essencialmente por meio dos gêneros textuais.

Palavras-Chave: Gêneros textuais. Caderno do Aluno de Língua Portuguesa. Interacionismo

Sociodiscursivo. Linguística Textual. Tipologia Textual.

ABSTRACT

This study deals with the analysis of issues related to the teaching of the textual genres

present in the 9th

Elementary School year Portuguese Language Student Notebook, a handout

distributed in the public teaching system in the state of São Paulo. Its analysis was motivated

by its scope and consequent relevance in the educational panorama of the state, since these

handouts are used by all students. The objective that guides this research is to investigate the

way in which textual genres are approached in the aforementioned in the Portuguese

Language Student Notebook. This general objective is associated to the following specific

objectives: to carry out a survey of the textual genres present in the handbook, relating them

to their respective discursive domains; identify the typologies mobilized in the textual genres;

and carry out an analysis of how and to what extent the argumentative and expository

typologies can be internalized by students through proposed notebook activities. The

theoretical contribution that guides the research is related to Textual Linguistics postulates,

especially the intertextuality, cohesion and coherence concepts presented by the studies

carried out by Fávero (2014, 2009 [1991]), Fávero and Koch (2012 [1983]) and Koch (2014

[1989], 2004, in addition to Bronckart's Sociodiscursive Interactionism (2012 [1997], 2006a),

with a significant influence by Vygotsky’s (1989 1984) work. The study considers teaching

based on the textual genres proposed by Bakhtin (2011 [1979]) and reinterpreted by the

theoretical-methodological bias carried out by Bronckart (2012 [1997]), Marcuschi (2008)

and Dolz and Schneuwly (2004), according to whom language is a form of action that takes

place in the socially situated and shared discourse by means of textual genres. In this context,

the present study is based on the resolutions stipulated by the National Curricular Parameters

(BRASIL, 1998) regarding suggestions for the teaching of the Portuguese Language, from

which the Curriculum of the State of São Paulo was developed (SÃO PAULO, 2012). These

documents suggest that, in the 9th

elementary school year, argumentative and expository texts

should be studied with greater emphasis. In addition, this study also presents the historical

course of the notebook in Brazil until its current application in the São Paulo public network.

As a result of the notebook analysis, a distance was observed between what is prescribed in

the State of São Paulo Curriculum and the proposed student activities concerning the learning

of argumentative and exposure genres, since genres that compete in narrating were mostly

inserted, while argumentative and expository genres, although appearing, were underexplored.

There is, therefore, the understanding that, in order to promote the formation of socially active

citizens, it is necessary to emphasize the interactive study of language, which occurs,

essentially, through textual genres.

Keywords: Textual genres. Portuguese Language Student Notebook. Sociodiscursive

Interactionism. Textual Linguistics. Textual typology.

LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 – Tirinha do Cartunista Laerte - CALP 9º ano - Vol. 1 - p. 17 .............................. 95

FIGURA 2 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 1- p. 14 ....................................... 104

FIGURA 3 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 1- p. 08 ....................................... 111

FIGURA 4 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 1- p. 09 e 10 ............................... 112

FIGURA 5 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 1- p. 20 ....................................... 113

FIGURA 6 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 1- p. 29 e 30 ............................... 115

FIGURA 7 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 1- p. 37 ....................................... 116

FIGURA 8 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 1- p. 49 ....................................... 117

FIGURA 9 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 1- p. 55 ....................................... 118

FIGURA 10 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 1- p. 65 ..................................... 119

FIGURA 11 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 1- p. 80 ..................................... 121

FIGURA 12 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 1- p. 85 ..................................... 122

FIGURA 13 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 1- p. 89 ..................................... 123

FIGURA 14 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 2 - p. 22 .................................... 124

FIGURA 15 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 2 - p. 25 .................................... 125

FIGURA 16 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 2 - p. 45 .................................... 126

FIGURA 17 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 2 - p. 51 .................................... 128

LISTA DE GRÁFICOS

GRÁFICO 1 – Incidência dos Domínios Discursivos em Porcentagem - CALP 9º ano – Vol. 1

.......................................................................................................................................... 96

GRÁFICO 2 – Incidência dos Domínios Discursivos em Porcentagem - CALP 9º ano – Vol. 2

.......................................................................................................................................... 98

GRÁFICO 3 – Incidência Total dos Domínios Discursivos em Porcentagem - CALP 9º ano -

Vol. 1 e Vol. 2 ................................................................................................................ 101

GRÁFICO 4 – Abordagem das Tipologias Textuais - CALP 9º ano – Vol. 1 ....................... 104

GRÁFICO 5 – Abordagem das Tipologias Textuais - CALP 9º ano – Vol. 2 ....................... 105

GRÁFICO 6 – Abordagem Total das Tipologias Textuais - CALP 9º ano ........................... 106

LISTA DE QUADROS

QUADRO 1 – Domínios Discursivos e Gêneros Textuais....................................................... 46

QUADRO 2– Tipologias Textuais ........................................................................................... 50

QUADRO 3 – Gêneros sugeridos nos PCN para a prática de escuta e leitura de textos ......... 67

QUADRO 4 – Gêneros sugeridos nos PCN para a prática de produção de textos................... 68

QUADRO 5 – Conteúdos e habilidades previstas para o 9º ano do Ensino Fundamental pelo

CESP ................................................................................................................................. 72

QUADRO 6 – Campos de Atuação, Objetos de Conhecimento e Habilidades na BNCC ....... 81

QUADRO 7 – Domínios Discursivos - CALP 9º ano – Vol. 1 ................................................ 93

QUADRO 8 – Domínios Discursivos - CALP 9º ano – Vol. 2 ................................................ 97

QUADRO 9 – Tipologias Textuais - CALP 9º ano ................................................................ 102

LISTA DE TABELAS

TABELA 1 – Gêneros Textuais - CALP 9º ano – Vol. 1 ......................................................... 86

TABELA 2 – Gêneros Textuais não Elencados no Quadro Geral Proposto por Marcuschi

(2008) - CALP 9º ano – Vol. 1 ......................................................................................... 88

TABELA 3 – Gêneros Textuais - CALP 9º ano – Vol. 2 ......................................................... 89

TABELA 4 – Recorrência Total dos Gêneros Textuais - CALP 9º ano .................................. 91

TABELA 5 – Recorrência Total dos Domínios Discursivos - CALP 9º ano ........................... 99

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

BCNN Base Nacional Comum Curricular

CALP Caderno do Aluno de Língua Portuguesa

CESP Currículo do Estado de São Paulo

CPLP Caderno do Professor de Língua Portuguesa

DD Domínio Discursivo

ISD Interacionismo Sociodiscursivo

PCN Parâmetros Curriculares Nacionais

SA Situação de Aprendizagem

SARESP Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo

TT Tipologia Textual

ZDP Zona de desenvolvimento proximal

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 13

1 CAPÍTULO 1: A LINGUÍSTICA TEXTUAL E O INTERACIONISMO

SOCIODISCURSIVO ............................................................................................................ 19 1.1 A Linguística Textual ....................................................................................................... 20

1.1.1 Intertextualidade ......................................................................................................... 25 1.1.2 Coesão e Coerência .................................................................................................... 28

1.2 O Interacionismo Social ................................................................................................... 32 1.2.1 A Mediação e a Zona de Desenvolvimento Proximal ................................................. 34

1.3 Artefato e Instrumento ..................................................................................................... 35 1.4 O Interacionismo Sociodiscursivo ................................................................................... 38 1.5 Gênero Textual ................................................................................................................. 41

1.5.1 Ensino com Base em Gênero Textual ......................................................................... 42 1.6 Domínios Discursivos ....................................................................................................... 45 1.7 Tipologias Textuais ........................................................................................................... 48

1.7.1 Tipologia Argumentativa ............................................................................................ 52 1.7.2 Tipologia Expositiva ................................................................................................... 56

2 CAPÍTULO 2: O SISTEMA APOSTILADO NO AMBIENTE ESCOLAR ............... 59 2.1 Percurso Histórico do Sistema de Apostilado no Brasil ................................................ 60 2.2 A Aplicação do Apostilado na Rede Pública Paulista ................................................... 63 2.3 Parâmetros Curriculares Nacionais................................................................................ 66 2.4 Currículo do Estado de São Paulo .................................................................................. 70 2.5 Caderno do Aluno e do Professor de Língua Portuguesa ............................................. 76

2.5.1 Caderno do Aluno de Língua Portuguesa (CALP) da 8ª série/9º ano ........................ 77 2.5.2 Novas Mudanças Curriculares – Base Nacional Comum Curricular ...................... 79

3 CAPÍTULO 3: ANÁLISE DO CORPUS ......................................................................... 85 3.1 Levantamentos dos Gêneros Textuais ............................................................................ 85 3.2 Articulações entre os Gêneros Textuais e seus Domínios Discursivos ......................... 93 3.3 Tipologias Textuais Mobilizadas nos Gêneros Textuais ............................................. 102 3.4 Análises das Atividades Desenvolvidas no CALP ........................................................ 108

CONCLUSÃO .................................................................................................................... 130

REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 135

ANEXOS ............................................................................................................................. 142

13

INTRODUÇÃO

As pesquisas acerca dos gêneros textuais estão recebendo cada vez mais atenção do

meio acadêmico, e os resultados desses trabalhos já estão influenciando, de certa forma, as

configurações das aulas de Língua Portuguesa no Brasil. De acordo com os Parâmetros

Curriculares Nacionais (PCN) (BRASIL, 1998), o estudo dos gêneros textuais deve ter como

objetivo potencializar o ensino da linguagem de forma ampla, sem se limitar apenas a

aspectos gramaticais ou prescritivos, proporcionando ao aluno o desenvolvimento e o

refinamento das habilidades linguísticas para se tornar um agente capaz de selecionar e de

produzir enunciados nos mais variados contextos comunicativos.

Com a finalidade de tentar alcançar esses objetivos, o Governo do Estado de São

Paulo adotou o sistema de apostilado na rede pública de ensino, o qual respeita, sobretudo, as

orientações do Currículo do Estado de São Paulo (CESP) (SÃO PAULO, 2012) – acerca dos

conteúdos a serem vistos em cada ciclo.

Nessa configuração, o papel do professor torna-se o de mediador, ponte entre o aluno e

o conhecimento, cabendo ao aluno participar de modo ativo de todo o processo, tendo como

elemento de apoio o conteúdo da apostila, que apresenta os temas a serem tratados e as

atividades a serem desenvolvidas. Da mesma forma, para que essa relação se estabeleça de

maneira efetiva, há o Caderno do Professor, com orientações acerca de como esses temas

devem ser explorados.

O corpus de estudo para este trabalho é o Caderno do Aluno de Língua Portuguesa

(CALP) do 9º ano do Ensino Fundamental, volumes 1 e 2, apostila desenvolvida pela

Secretaria da Educação do Estado de São Paulo e distribuída em toda rede pública de ensino.

Segundo o informativo do site1 da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, os

estudantes do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, matriculados nas mais de cinco mil

escolas da rede estadual paulista, contam com um material exclusivo, desenvolvido por

especialistas da área da educação. A abrangência e a consequente relevância do apostilado no

panorama educacional do estado motivaram nossa escolha por analisá-lo.

O material fornecido pelo governo aos estudantes da rede estadual tem o propósito de,

em primeira ordem, unificar o ensino por meio de um apostilado de currículo comum a todos

os alunos. Devemos salientar que optamos por analisá-lo, em sua funcionalidade como objeto

norteador das aulas ao longo de todo o ano letivo, devido ao seu importante papel no

1Disponível em:< http://www.educacao.sp.gov.br/caderno-aluno >. Acesso em: 28 fev. 2018.

14

desenvolvimento do currículo previsto para a rede estadual de ensino e por consideramos o

ensino de Língua Portuguesa com base em gêneros textuais primordial ao exercício da

cidadania e, por conseguinte, objeto de atenção no ambiente escolar.

Na literatura, localizamos alguns estudos que parecem dialogar com questões

parecidas com essas, tais como aqueles de Rojo (2003), Santos, Mendonça e Cavalcante

(2006), os quais serão explorados a seguir.

Rojo (2003) observou que muitos materiais didáticos têm atendido bem ao papel da

multiplicidade de gêneros, porém ficam aquém em outros pontos, como o da exploração da

língua oral e da variedade linguística. Ademais, a autora relata que a maior parte das

propostas de atividades se fundamenta apenas na gramática normativa.

Já Santos, Mendonça e Cavalcante (2006) investigaram as conexões estabelecidas nas

atividades textuais entre os trabalhos de exploração de texto e os de gênero. As pesquisadoras

revelaram que os materiais didáticos, em alguns momentos, optam pelo trabalho exclusivo do

texto e, em outras circunstâncias, apenas exploram o gênero. Contudo, para elas, essas

abordagens são indissociáveis.

Por essas razões, acentuamos a necessidade de uma investigação analítica do nosso

corpus de estudo – o CALP do 9º ano do Ensino Fundamental, enquanto material didático dos

alunos da rede pública de ensino. Faz-se necessário levar em conta a escolha dos textos

presentes no CALP e sua adequação às propostas do CESP (SÃO PAULO, 2012).

O objetivo que norteia nossa pesquisa diz respeito ao estudo dos gêneros textuais e à

forma como eles são abordados no CALP do 9º ano do Ensino Fundamental, de modo a

investigar em que aspectos o ensino de Língua Portuguesa com base em gêneros coopera com

os programas escolares.

Esse objetivo geral se associa aos seguintes objetivos específicos de análise: i) levantar

os gêneros textuais presentes no CALP e sua predominância; ii) relacionar esses gêneros

encontrados aos seus respectivos domínios discursivos; iii) identificar as tipologias textuais

mobilizadas nos gêneros textuais localizados no apostilado e; iv), analisar em que medida as

tipologias argumentativas e expositivas podem ser internalizadas por meio das atividades

propostas e de que forma acontece o ensino de Língua Portuguesa com base em gêneros

textuais no decorrer do CALP a partir do estudo de uma amostra das atividades presentes no

corpus, além de sugestões de algumas alternativas para essas atividades.

Em nossa análise, refletimos acerca da linguagem como principal elemento do

desenvolvimento humano, além da caracterização dos gêneros textuais como indispensáveis

para a apropriação do conhecimento. Partilhamos da ideia de Marcuschi (2008), ao citar

15

Bakhtin (1997 [1979]), de que a língua é um fenômeno cultural, histórico, social e cognitivo

que se transforma ao longo do tempo e, de acordo com os falantes, “[...] se manifesta no seu

funcionamento e é sensível ao contexto. Não é um sistema monolítico e transparente, para

‘fotografar’ a realidade, mas é heterogênea e sempre funciona situadamente na relação

dialógica” (MARCUSCHI, 2008, p. 240).

Ainda no que se refere ao gênero, consideramo-lo como um tipo relativamente estável

de enunciado (BAKHTIN, 2011 [1979]), indissociável do contexto social. Sua mestria pode

permitir ao sujeito agir em diferentes situações de comunicação com as quais se depara, já que

o tomamos como “[...] um instrumento semiótico complexo, isto é, uma forma de linguagem

prescritiva, que permite, a um só tempo, a produção e a compreensão de textos” (DOLZ;

SCHNEUWLY, 2004, p. 27).

No que concerne à organização dos capítulos de nossa pesquisa, será apresentada a

seguinte sistematização:

No Capítulo 1, Linguística Textual e Interacionismo Sociodiscursivo: um estudo dos

Gêneros Textuais, exporemos as bases teóricas que fundamentam este trabalho nos postulados

da Linguística Textual (LT), sobretudo os conceitos de intertextualidade, coesão e coerência

orientados pelos estudos de Fávero (2014, 2009 [1991]), Fávero e Koch (2012 [1983]) e Koch

(2014 [1989], 2004), do Interacionismo Social e seus princípios, baseados na obra de

Vygotsky (1989, 1984), explanando sobre os conceitos essenciais dessa perspectiva teórico-

metodológica, como as definições de mediação, de Zona de Desenvolvimento Proximal

(ZDP), de artefato e de instrumento. Em seguida, mostraremos como, a partir dos

pressupostos do Interacionismo Social, fundou-se o Interacionismo Sociodiscursivo (ISD)

(BRONCKART, 2012 [1997], 2006a), a respeito do qual fizemos uma introdução abordando

sua origem e suas principais ideias. Posteriormente, discutiremos o conceito de gênero textual,

bem como a questão do ensino com base em gêneros. Na sequência, abordaremos sobre os

domínios discursivos (DD) e o quadro geral de distribuição dos gêneros textuais, tomando por

base os estudos de Marcuschi (2008). Vale evidenciar que utilizamos o quadro geral proposto

por Marcuschi (2008, p. 194-196) para enquadrar os gêneros textuais encontrados no CALP.

Por fim, fundamentamo-nos em Dolz, Noverraz, Schneuwly (2004) e Marcuschi (2007) para

apontar os elementos constitutivos das tipologias textuais, com ênfase nas tipologias

argumentativa e expositiva, pois essas são as indicadas no CESP para o estudo no decorrer do

9º ano do Ensino Fundamental e, portanto, são as que mais interessam aos objetivos desta

pesquisa.

16

No Capítulo 2, trataremos do Sistema Apostilado no Ambiente Escolar, com o intento

de trazer a lume o percurso histórico do apostilado no Brasil e como ocorreu sua evolução,

desde as origens, na década de 302, com o Instituto Radiotécnico Monitor e Instituto Nacional

Brasileiro, até os dias de hoje, após as propostas de reforma no sistema educacional que vêm

configurando o cenário nacional há cerca de três décadas. Além disso, dedicaremos uma seção

aos PCN e outra ao CESP, apresentando uma contextualização das publicações e discorrendo

sobre as principais recomendações dos dois documentos para o ensino da língua portuguesa

com base em gêneros textuais. Na sequência, descreveremos a estrutura e os objetivos do

CALP do 9º ano do Ensino Fundamental. Apresentaremos, ainda, brevemente, a nova Base

Nacional Comum Curricular, que trará mudanças significativas aos Currículos brasileiros, que

deverão ser (re)escritos; por conseguinte, o CALP deverá ser reelaborado para se adequar a

essas orientações curriculares.

No terceiro e último capítulo, discutiremos os resultados da Análise do Corpus, com a

apresentação e a discussão das análises dos dados retirados do CALP, considerando as etapas

de investigação relacionadas a seguir.

Em relação ao desenvolvimento da nossa investigação, sistematizamos nosso estudo a

partir da análise documental e do levantamento qualitativo e quantitativo. Segundo Gil

(2002), nas pesquisas quantitativas, as categorias são frequentemente estabelecidas a priori, o

que simplifica sobremaneira o trabalho analítico. No que tange às pesquisas qualitativas, o

conjunto inicial de categorias, em geral, é reexaminado e modificado sucessivamente com a

intenção de obter ideais mais abrangentes e significativos. Assim, nas pesquisas quantitativas,

os dados costumam ser organizados em tabelas, ao passo que, nas pesquisas qualitativas, é

necessário valer-se de textos narrativos, matrizes, esquemas etc.

As análises dos documentos Caderno do Aluno, Caderno do Professor, Currículo do

Estado de São Paulo e Parâmetros Curriculares Nacionais foram feitas com a intenção de

investigar se as atividades propostas no CALP ampliam nos discentes o desenvolvimento das

capacidades linguísticas de ler e escrever, falar e ouvir, podendo obter sucesso nas mais

variadas situações comunicativas das quais participa. No que concerne à análise documental,

concordamos com Gil (2002, p. 47), quando adverte que pesquisas produzidas com esse

propósito “[...] são importantes não porque respondem definitivamente a um problema, mas

porque proporcionam melhor visão desse problema”. Tal posicionamento nos parece oportuno

em face do fato de o conhecimento acontecer por um encadeamento sempre aproximativo,

2 As décadas mencionadas no trabalho referem-se ao século XX. Ou seja, iniciou em 1° de janeiro de 1901 e

terminou em 31 de dezembro de 2000.

17

nunca irrefutável e acabado.

A fim de alcançar tais resultados, fizemos um levantamento quantitativo/numérico

acerca dos gêneros, domínios discursivos e tipologias textuais presentes no CALP. Nessa

perspectiva, objetivando o melhor andamento do estudo, dividimos nossa pesquisa em três

grandes etapas, que serão descritas a seguir.

Identificamos, em um primeiro momento, os gêneros textuais que aparecem no

material e o número de ocorrências, tendo como objetivo a verificação da incidência de cada

gênero apresentado. O quadro que utilizamos para enquadramento dos gêneros encontrados

no CALP é proposto por Marcuschi (2008, p.194-196) e está presente na seção “Domínios

discursivos” desta dissertação. O quadro, segundo Marcuschi (2008, p. 194), é uma “tentativa

de distribuição dos gêneros”, ou seja, da palavra “tentativa” depreendemos que haja

flexibilidade no enquadramento/distribuição dos gêneros localizados no CALP. Nessa etapa,

produzimos um quadro no sentido de apresentar todos os gêneros explorados no CALP,

considerando os dois volumes da publicação.

Para realizar a tabulação dos dados, foram levados em conta os textos que aparecem

na seção “Leitura e análise de texto”, nos enunciados das atividades e também nas instruções

para produção escrita por parte dos alunos, enunciados que foram classificados como gêneros

textuais de acordo com suas características mais explícitas e nomeados conforme a

classificação sugerida por Marcuschi (2008, p. 194-196).

Posteriormente, foi feita a classificação dos gêneros textuais dentro dos domínios

discursivos, definidos por Marcuschi (2008, p. 194) como “[...] uma esfera da vida social ou

institucional [...] no qual se dão práticas que organizam formas de comunicação”, isto é,

grandes grupos que abrangem os gêneros textuais normalmente utilizados em contextos

sociodiscursivos semelhantes.

Para tanto, organizamos os gêneros encontrados dentro dos domínios instrucional,

jornalístico, religioso, da saúde, comercial, industrial, jurídico, publicitário, de lazer,

interpessoal, militar e ficcional, sendo que alguns desses DD não foram contemplados no

CALP.

Nessa etapa da pesquisa, foi possível visualizar com maior lucidez a diversidade

textual, já constatada na etapa anterior. A partir disso, teve-se abertura para discutir quais

tipologias textuais foram mais exploradas no CALP e quais apareceram com menor

frequência. Salientamos que também fizemos os devidos apontamentos a respeito dos

domínios que não foram abordados em nenhum momento ao longo do material.

18

É importante ressaltar que, embora tenhamos feito essa organização dos gêneros

dentro dos grandes grupos discursivos, temos a consciência de que esses grupos não são

definitivos e que a classificação marcuschiana é apenas uma tentativa de enquadramento

didático, tendo em vista o caráter flexível das diversas modalidades textuais, que podem ora

ser idealmente classificadas dentro de um domínio, ora em outro. Nesse sentido, fizemos tal

organização levando em conta como o texto é apresentado no CALP, e sua melhor

classificação a partir desses casos específicos.

Nas análises, ainda, identificamos quais tipologias textuais definidas por Dolz,

Noverraz, Schneuwly (2004) e Marcuschi (2007) foram mobilizadas ao longo do material,

percurso necessário para que se tornasse possível a análise de quais tipologias foram mais

trabalhadas em sala de aula no decorrer do 9º ano do Ensino Fundamental da rede estadual de

ensino.

Para o 9º ano do Ensino Fundamental, o CESP (SÃO PAULO, 2012) sugere que sejam

priorizadas as tipologias argumentativa e expositiva. A partir disso, fizemos a análise de como

ocorre a distribuição dos gêneros textuais, abordados ao longo do CALP, como modalidades

de discurso, buscando compreender quais foram as tipologias mais trabalhadas e se houve

concordância com o que é proposto pela Secretaria da Educação. As Tipologias Textuais (TT)

que consideramos, devido à maior recorrência no CALP, como recorte para este trabalho são

cinco, a saber: narrar, relatar, argumentar, expor e descrever.

Na última etapa das análises, efetuamos o recorte de 14 atividades e analisamos se as

propostas são significativas no que diz respeito àquilo a que se propõem, além de examinar

como a proposta para o trabalho com gêneros textuais é sistematizada/organizada. Por fim, na

Conclusão, procuramos fazer uma síntese dos resultados obtidos com a análise do corpus e

sugerir um trabalho mais sistemático com os gêneros, especialmente os argumentativos e

expositivos, e sua adequação às propostas do CESP.

19

CAPÍTULO 1

1 A LINGUÍSTICA TEXTUAL E O INTERACIONISMO SOCIODISCURSIVO

Neste capítulo, discorreremos sobre os principais conceitos-chave que norteiam nosso

estudo. No primeiro tópico, descreveremos a trajetória da Linguística Textual (LT) e sua

evolução, além de explicar suas principais motivações e mecanismos. Abordaremos,

sobretudo, os conceitos de intertextualidade, coesão e coerência, tendo por base fundamental

os estudos de Fávero (2014, 2009 [1991]), Fávero e Koch (2012 [1983]) e de Koch (2014

[1989], 2004).

Em seguida, propomo-nos a apresentar os pontos fundamentais do Interacionismo

Social elencados por Vygotsky (1989, 1984), incluindo as definições de mediação e de Zona

de Desenvolvimento Proximal (ZDP), além das questões também discutidas pelo autor sobre

o artefato e o instrumento semiótico, conceitos importantes para o nosso estudo devido à

confluência entre o que é proposto por Vygotsky e aquilo que consideramos relevante em

nosso corpus, já que estamos tratando de gêneros textuais.

A partir da revisão teórica, na qual nos baseamos para a investigação do CALP como

material de apoio para o ensino da língua portuguesa no 9º ano do Ensino Fundamental

(Ciclo II), faremos uma correlação entre instrumentos semióticos e gêneros textuais,

agregando a estes últimos o caráter de mediadores no processo de aprendizagem da língua

pelos alunos e o consequente desenvolvimento das tipologias textuais.

Logo após, discutiremos como a perspectiva do Interacionismo Social inspirou

Bronckart (2012 [1997], 2006a), para o qual o desenvolvimento humano ocorre por meio da

linguagem – princípio do Interacionismo Sociodiscursivo (ISD). Na sequência, trataremos das

possíveis relações entre o ISD e os gêneros textuais, produções textuais que colaboram para a

compreensão dos diversos elementos linguísticos. Para tanto, introduziremos o conceito de

gênero, além de tratar a questão do ensino com base em gêneros textuais.

Abordaremos, ainda, o conceito de domínio discursivo, sobre o qual nos

fundamentamos, sobretudo, nos estudos de Marcuschi (2008), que define os domínios como

grandes esferas discursivas de caráter flexível, nas quais se localizam os variados gêneros

textuais de acordo com suas semelhanças de contexto e de intenção comunicativa. Além

disso, discorreremos sobre as tipologias textuais propostas por Dolz, Noverraz e Schneuwly

(2004) e Marcuschi (2007), que devem ser dominadas pelo sujeito ao lidar com diferentes

gêneros textuais.

20

Por fim, faremos explanações acerca das tipologias argumentativas e expositivas, uma

vez que são as prioridades estabelecidas pelos PCN e pelo CESP para o 9º ano do Ensino

Fundamental, série selecionada para esta pesquisa.

1.1 A Linguística Textual

A Linguística Textual começou a se desenvolver a partir dos anos 1960 na Europa,

especialmente na Alemanha (FÁVERO; KOCH, 2012 [1983]). Segundo as autoras, o termo

que dá nome a essa ciência, cuja função é o estudo dos textos, havia sido originalmente

empregado por Cosériu (1955), muito embora seu significado atual tenha sido concebido

somente em 1966, na publicação Linguistik der Lüge, de Weinrich (1966).

Esse campo de estudo começou a ser aprofundado principalmente devido às grandes

limitações encontradas pela gramática tradicional no tratamento de eventos linguísticos

somente passíveis de compreensão com base em alguma referência situacional. A perspectiva

anteriormente conhecida como Linguística do Discurso não detalhava, por exemplo, as

anáforas associativas e indiretas (KOCH, 2004).

Em meados de 1970, a Pragmática, ramo da linguística que estuda a linguagem no

contexto de seu uso na comunicação, com forte influência dos interacionistas e dos

sociocognitivistas, surgiu rompendo os limites das teorias que consideravam a fala e o

discurso como simples atividades verbais para elevá-los ao patamar de mecanismo social

comunicativo.

Nesse sentido, foi-se, aos poucos, ampliando a investigação de textos que careciam,

necessariamente, do contexto para sua significação. De acordo com Fávero e Koch (2012

[1983]), a LT ganhou forma em um percurso com raízes históricas diferentes e

complementares, tais como a Retórica Clássica, a Estilística e a linha teórica do Círculo

Linguístico de Moscou, conhecidos como Formalistas Russos. Ainda segundo as autoras, a

ciência em questão teve representação de estudiosos como Harris, Pike, Hjelmslev,

Benveniste, Jakobson, Pêcheux, entre outros precursores.

Conforme esses autores, a Retórica Clássica define microestrutura textual e

macroestrutura textual, que conferem ao texto o papel de motor interacional. A Estilística, por

exemplo, é responsável por caracterizar as propriedades das estruturas dos textos em geral. Já

dentre os Formalistas Russos, encontra-se em Propp a pesquisa de contos populares russos,

sobretudo na poesia e no mito, e a apresentação de um novo esquema de comunicação

proposto por Jakobson, buscando estudar a estrutura do texto somente em si mesmo e

21

rejeitando toda e qualquer consideração exterior a ele (FÁVERO, 2014; FÁVERO; KOCH,

2012 [1983]). Essas bases foram importantes para a construção de uma nova concepção de

análise textual.

No Brasil, a Linguística Textual teve como marco inicial a publicação, na revista

Letras de Hoje, número 44, do trabalho intitulado “Por uma gramática textual”, do Dr.

Ignácio Antônio Reis, professor da PUCRS (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande

do Sul) em 1981. Mais tarde, em 1982, Koch é convidada por Fávero para, em parceria,

escreverem sobre a Linguística Textual, trabalho a partir do qual resulta o livro Linguística

Textual: Introdução, lançado no IV Congresso Brasileiro de Língua Portuguesa, na PUC-SP,

em 1983. No mesmo evento, Luiz Antônio Marcuschi apresentou, em uma conferência,

Linguística de texto – o que é e como se faz (FÁVERO, 2014; FÁVERO; KOCH, 2012

[1983]; MARCUSCHI, 2012 [1983]).

Ainda em 1983, passado o evento e após algumas modificações, Marcuschi publicou

seu trabalho pela série Debates – Revista do Mestrado de Letras, da Universidade Federal de

Pernambuco (FÁVERO, 2014; FÁVERO; KOCH, 2012 [1983]; MARCUSCHI, 2012

[1983]). A partir de então, os estudos na área cresceram visivelmente, e, hoje, a Linguística

Textual é considerada uma ciência, que privilegia questões importantes, como a

referenciação, a inferenciação, a participação ativa do receptor do discurso, entre outros

aspectos sociocognitivos.

Em linhas gerais, pode-se dizer que a LT contribui fortemente para a compreensão de

textos e, por isso, deve ser uma aliada no ensino de gêneros textuais no ambiente escolar,

afinal, os diferentes exemplares textuais são indissociáveis dos contextos sociais, quando

vistos pela perspectiva do Interacionismo Sociodiscursivo, ao qual retornaremos

posteriormente. Dessa forma, vãos deixados pela Linguística do Enunciado são preenchidos e

a interpretação textual torna-se muito mais efetiva.

Para entender melhor o percurso histórico da LT, é preciso conhecer os três

momentos3 que lhe deram forma. Retomando Conte (1977), Fávero e Koch (2012 [1983],

grifos das autoras) pontuam esses momentos: a) o da análise transfrástica; b) o da construção

das gramáticas textuais e; c) o da construção das teorias de texto, que são brevemente

explicados a seguir.

a) Primeiro momento: o da análise transfrástica

3 Conte (1977) frisa que não se trata de uma distinção de ordem cronológica (fases), e sim tipológica

(momentos).

22

Segundo as pesquisadoras, circunscreve-se a pesquisa, ainda, a enunciados e

sequências textuais de enunciados, partindo-se destes em direção ao texto, precisamente por

estarem preocupados com as relações que se estabelecem entre as frases e os períodos, de

forma que construa uma unidade de sentido. Nesse primeiro momento, Fávero e Koch (2012,

[1983]), citando Harweg (1968), esclarecem que o texto era definido como uma sucessão de

unidades linguísticas constituídas mediante uma concatenação pronominal ininterrupta.

Conforme as autoras, outro importante conceito de texto é aquele apresentado por Isenberg

(1970), de acordo com o qual um texto é definido como uma “[...] sequência coerente de

enunciados” e o seu principal objetivo é estudar “os tipos de relação que se podem estabelecer

entre os diversos enunciados que compõem uma sequência significativa” (FÁVERO; KOCH,

2012 [1983], p. 18).

b) Segundo momento: o da construção das gramáticas textuais

Essas gramáticas surgem com a finalidade de refletir sobre fenômenos linguísticos

inexplicáveis por meio de uma gramática do enunciado. “O que a legitima é, pois, a

descontinuidade existente entre enunciado e texto, já que há entre ambos uma diferença de

ordem qualitativa (e não meramente quantitativa)” (FÁVERO; KOCH, 2012 [1983], p. 19).

Por isso, as autoras expõem que:

Sendo o texto muito mais que uma simples sequência de enunciados, a sua

compreensão e a sua produção derivam de uma competência específica do

falante – a competência textual – que se distingue da competência frasal ou

linguística em sentido estrito. [...] São estas habilidades do usuário da língua

que justificam a construção de uma gramática textual, cujas tarefas básicas

são: a) verificar o que faz com que um texto seja um texto, isto é, determinar

os seus princípios de constituição, os fatores responsáveis pela sua

coerência, as condições em que se manifesta a textualidade (Texthäftigkeit);

b) levantar critérios para a delimitação de textos, já que a completude é uma

das características essenciais do texto; c) diferenciar as várias espécies de

texto. (FÁVERO; KOCH, [1983] 2012, p. 19, grifos das autoras).

É importante ressaltar que, entre os vários modelos de gramáticas textuais, destaca-se

o de Petöfi, que descreve sua gramática com uma base textual fixada de modo não linear – e

garante que seu modelo permitiria, entre outras coisas, a análise de texto, isto é, “a atribuição

a uma manifestação linear de todas as bases textuais possíveis” (FÁVERO; KOCH, [1983]

2012, p. 20). Cabe ressaltar que é neste modelo que o léxico surge em lugar de destaque, pois

tenta dar conta de suas múltiplas representações semânticas.

Nesse momento, surgiu a necessidade de elaboração de gramáticas textuais, à

semelhança das já existentes gramáticas de frase, a partir do pressuposto de que existe uma

23

competência textual para além da competência linguística, de base chomskiana. A

virtualidade desse novo olhar consistiu em encarar o texto como uma unidade linguística

hierarquicamente superior, ou mais elevada.

Para Charolles (1983), o falante seria capaz de reconhecer os tipos textuais

fundamentando-se em algumas competências básicas, como a formativa, a qualificativa e a

transformativa. A primeira se refere à capacidade do falante de produzir e interpretar textos,

bem como avaliar sua construção. A segunda compreende a identificação de gêneros, tendo

por base o reconhecimento de traços comuns a mais de um exemplar discursivo. Já a terceira

relaciona-se à capacidade de resumir ideias centrais de um modelo textual e reformulá-las,

adaptando-as aos objetivos situacionais.

Apesar de bem-sucedida no sentido de estabelecer raízes do que seria a Linguística

Textual moderna, a Gramática de Texto falhava em sua formulação, já que ainda ignorava a

contextualização do enunciado, tentando explicar o texto como unidade formal e dependente

de um sistema finito de regras. Para Koch (2004), as competências citadas por Charolles

(1983) e atribuídas a todos os falantes cumpriam algumas tarefas básicas que a Gramática

Textual não havia sido capaz de contemplar, como a determinação dos elementos

responsáveis pela coerência de um enunciado, além da textualidade e da identificação da

espécie de texto.

c) Terceiro momento: o da construção das teorias de texto

No que se refere a esse momento, Fávero e Koch ([1983] 2012) mostraram que, na

década 70, passou-se a privilegiar as noções de textualidade, minimizando — mas não

eliminando — o enfoque dado à competência linguística do falante. Tais noções são

relevantes por evidenciarem a existência de um contexto em qualquer formação textual, ou

seja, a existência de condições externas ao texto que influenciam diretamente o seu conteúdo

e o seu sentido.

Verifica-se que tanto a situação social e o momento histórico quanto a configuração da

interação estabelecida entre o produtor e o receptor são decisivos para a correta compreensão

da significação e da formulação efetiva de construções frasais. Isso significa dizer que o

sentido, antes atribuído ao texto, de forma interna, na verdade, depende imensamente da

relação comunicativa que o envolve.

Essa nova concepção nega o momento anterior, que consiste na ideia de que haveria

um sistema pronto e acabado, comum a todos os falantes da língua, cujas regras seriam

necessariamente aplicadas em qualquer produção de texto. De acordo com esse terceiro

24

momento percursor da Linguística Textual, pode-se observar que o sistema, na prática, é real

e constantemente transformado pelos usuários por meio das interações comunicativas.

Assim, para Fávero e Koch ([1983] 2012), elimina-se o foco na depreensão de normas

fixas, possibilitando uma análise textual ampla, levando em conta as condições extratextuais

nas quais o texto se insere. Pode-se notar, portanto, nuances interdisciplinares, dinâmicas,

funcionais e processuais, desmistificando o caráter formal da língua.

O enunciado é, por conseguinte, vivo e subjetivo, e sua produção se refere à “[...]

capacidade de o locutor se propor como sujeito do seu discurso e ela se funda no exercício da

língua” (BENVENISTE, 1974, p. 82). Essa ideia traz à tona a existência inegável de

determinado espaço, de determinado tempo e de determinado tipo de interação, todos

altamente ativos na compreensão textual.

Segundo Bakhtin (apud BRANDÃO, 1995, p. 53),

Um enunciado vivo, significativamente surgido em um momento histórico e

em um meio social determinados, não pode deixar de tocar em milhares de

fios dialógicos vivos, tecidos pela consciência socioideológica em torno do

objeto de tal enunciado e de participar ativamente do diálogo social. Do

resto, é dele que o enunciado saiu: ele é como sua continuação, sua réplica.

Essa posição é defendida, também, por Fávero e Koch (2012 [1983]), que definem o

texto em duas acepções, afirmando que

[...] texto, em sentido lato, designa toda e qualquer manifestação da

capacidade textual do ser humano (quer se trate de um poema, quer de uma

música, uma pintura, um filme, uma escultura etc.), isto é, qualquer tipo de

comunicação realizado por meio de um sistema de signos. Em se tratando

da linguagem verbal temos o discurso, atividade comunicativa de um

falante, numa situação de comunicação dada, englobando o conjunto de

enunciados produzidos pelo locutor [...] e o evento de sua enunciação. O

discurso é manifestado, linguisticamente, por meio de textos (em sentido

estrito). Nesse sentido, o texto consiste em qualquer passagem, falada ou

escrita, que foram um todo significativo, independente de sua extensão.

(FÁVERO; KOCH, 2012 [1983], p. 34, grifos das autoras).

Conforme Koch (2004), na década de 80, uma nova orientação dará as rédeas de como

se configurarão os estudos do texto. Trata-se do fenômeno que os pesquisadores costumam

chamar de “virada cognitivista”, que consiste em se entender que todo texto passa a ser

considerado como resultado de operações mentais. A obra de Beaugrande e Dressler (2005

[1981]), de fundamental importância na sedimentação dessa ideia, postulando essa

multiplicidade de operações cognitivas interligadas que subjazem à elaboração e produção

textuais. A novidade dessa abordagem reside, pois, na percepção de que o processamento

25

textual é estratégico e não é indissociável das características dos usuários da língua e do

conhecimento episódico e enciclopédico que convocam na construção textual. As estratégias

interacionais afirmam-se, nesse sentido, como estratégias socioculturalmente determinadas,

com o objetivo do sucesso da interação verbal, destacando-se as estratégias de preservação

das faces, que envolvem o uso de formas de atenuação e de polidez, entre outras.

De acordo com Koch (2004), na sequência dessa visão, surge a perspectiva

sociocognitivo-interacionista, com base na interiorização de que os processos cognitivos não

são exclusivamente individuais, mas, concomitantemente, sociais. Essa ideia considera as

ações verbais como “engajamento” em contextos sociais, com finalidades sociais e com

papéis distribuídos socialmente, reforçando a dimensão sociointeracionista da linguagem.

Para Beaugrande e Dressler (2005 [1981]), que desenvolveram os princípios de

textualidade, é necessário situar-nos no texto, fonte primária dos estudos da LT atualmente.

Por isso, os estudiosos afirmam que um texto é um acontecimento comunicativo que cumpre

sete princípios de textualidade. Se um texto não satisfaz alguns desses princípios, então não

se pode considerar que ele seja comunicativo (BEAUGRANDE; DRESSLER, 2005 [1981],

grifos nossos). A partir disso, verifica-se que outro elemento passa a compor o novo conceito

de texto, a textualidade. Dessa forma, é a partir dela que o texto passa a ser um todo

significativo.

Os princípios de textualidade desenvolvidos por Beaugrande e Dressler são a

intencionalidade do produtor, que se refere aos objetivos da construção do texto; a

aceitabilidade do receptor, que se volta para a existência de informações relevantes que

podem ser absorvidas ou não; a situacionalidade, que compreende a coerência pragmática do

conteúdo; e a informatividade, que avalia a suficiência de dados disponibilizados no texto.

Além desses fatores, é importante tratar da intertextualidade, da coesão e da coerência, sobre

as quais discorreremos a seguir.

1.1.1 Intertextualidade

Nos PCN de Língua Portuguesa, preconiza-se que a relação entre textos é o que se

denomina intertextualidade (BRASIL, 1998). A ideia geral que fundamenta a

intertextualidade é a de que toda estrutura textual contém em si elementos de outras

variedades de enunciados, de modo que tudo o que é fabricado pelo agente enunciador é

resultado das interações com outros textos, orais ou escritos.

26

Os estudos bakhtinianos foram significativos na concepção de intertextualidade como

um fenômeno fundamental no ensino dos gêneros textuais. As reflexões de Júlia Kristeva

(1967) mostram que um texto não tem um sentido pontual, desacompanhado, fixo, mas é o

cruzamento de superfícies textuais, um diálogo entre múltiplas escrituras, um cruzamento de

citações, ou seja, um texto não apresenta uma forma fixa ou imutável, mas é uma espécie de

mosaico de outros textos, com citações ou possíveis relações de ideias.

O termo “intertextualidade” foi atribuído por Kristeva (1967) a essa dependência

textual mútua com o objetivo de instaurar uma nova reflexão acerca do trânsito de

informações entre diversas estruturas textuais, ou, ainda, sobre a coexistência das vozes de

dois ou mais textos em um mesmo universo.

Portela (1999) corrobora os estudos de Kristeva (1967) e resume a ideia de

intertextualidade da seguinte maneira:

Quando ocorre um diálogo entre os muitos textos de uma (ou várias)

cultura(s) que se instala no interior de cada texto e o define, tem-se o

fenômeno da intertextualidade, um ponto de intersecção de muitos diálogos,

cruzamento de vozes oriundas de práticas de linguagem socialmente

diversificadas, que têm no texto sua realização (PORTELA, 1999, p. 69).

A autora acrescenta, ainda, que “[...] o termo intertextualidade designa essa

transposição de um (ou de vários) sistema(s) de signos [...] num sistema significativo, o qual

exige uma nova articulação [...] da personalidade enunciativa e denotativa” (PORTELA,

1999, p. 69). Nesse viés, é fundamental compreender que a ativação do conhecimento já

internacionalizado do indivíduo se dá continuamente e passa por inúmeras reconstruções na

medida em que entra em contato com novas formas de texto. A base já existente é o que

permite ao agente comunicativo fazer as inferências pertinentes e necessárias para

compreender a coerência linguística do novo discurso que se apresenta.

Sobre isso, Koch (1996, p. 101) afirma, ainda, que “[...] em sentido restrito, todo texto

faz remissão a outro(s) efetivamente já produzido(s) e que faz(em) parte da memória social

dos leitores [...]”, ou seja, quando o leitor ou o receptor de um enunciado qualquer tem acesso

à determinada estrutura textual, automaticamente ativa um repertório preestabelecido por

meio do seu conhecimento pessoal, individual ou coletivo, fazendo ligações entre o material

de análise imediato e conteúdos já vistos anteriormente.

Bakhtin (1997 [1979]) esclarece que, durante uma interação comunicativa, o indivíduo

perde seu papel central na enunciação, dando lugar a várias e diferentes vozes sociais que

refletem suas influências históricas e ideológicas. Dessa forma, há um desdobramento da

27

linguagem em mais de um aspecto, envolvendo não somente a relação entre o enunciado e o

enunciatário, mas também o da pluralidade contida no interior do discurso, isto é, do

intertexto. A esse fenômeno, o teórico dá o nome de “dialogismo”, afirmando que essa é uma

característica essencial de todo e qualquer discurso, bem como das concepções de mundo,

visto que o diálogo ocorre internamente na linguagem sempre que um enunciado discursivo se

insere em outro. Para Bakhtin (2011 [1979]), é a materialização da interação entre sujeitos —

um autor e um leitor –, em uma relação dialógica, representando emoção, sentido, pensamento

e o significado por meio de enunciados (BAKHTIN, 2011 [1979]).

Desse modo, não há nada fixo no que concerne à linguagem e às trocas comunicativas.

O discurso é algo em constante curso ou movimento, e qualquer possibilidade de inércia pode

ser excluída quando se trata de enunciados, tendo em vista que um texto nunca está isolado

das muitas vozes sociais que lhe conferem propriedades culturais. Nesse sentido, Orlandi

(1999) declara que:

Na análise do discurso, procura-se compreender a língua fazendo sentido,

enquanto trabalho simbólico, parte do trabalho social geral, constitutivo do

homem e de sua história. Por esse tipo de estudo se pode conhecer melhor

aquilo que faz do homem um ser especial com sua capacidade de significa e

significar-se. A análise do discurso concebe a linguagem como mediação

necessária entre o homem e a realidade natural e social. Essa mediação, que

é o discurso, torna possível tanto a permanência e a continuidade quanto o

deslocamento e a transformação do homem e da realidade em que vive.

(ORLANDI, 1999, p. 15-16).

Isto posto, verifica-se que um texto é sempre orientado, quando não pelas intenções do

seu produtor, pela perspectiva do leitor ou ouvinte, o que significa que um discurso nunca se

move sozinho, mas carrega consigo outras considerações extradiscursivas que muito têm a ver

com as percepções de mundo e com as inferências de outros textos. Essas nuances, no

entanto, nem sempre são facilmente percebidas. Koch (2011 [1984]), inclusive, explica que a

intertextualidade pode ser explícita ou implícita. No primeiro caso, o autor do discurso cita as

fontes externas utilizadas no conteúdo, direta ou indiretamente. Já no segundo, o que ocorre é

o resgate de outros exemplares do repertório de leitura do interlocutor em sua memória que

funcionam como motores para a construção do sentido.

Em ambos os casos, a responsabilidade de significação é grande e nunca passiva.

Conforme Bakhtin (1997 [1979]):

[...] o ouvinte que recebe e compreende a significação (linguística) de um

discurso adota, simultaneamente, para com este discurso, uma atitude

responsiva ativa: ele concorda ou discorda (total ou parcialmente), completa,

28

adapta, apronta-se para executar etc., e esta atitude do ouvinte está em

elaboração constante durante todo o processo de audição e de compreensão

desde o início do discurso, às vezes já nas primeiras palavras emitidas pelo

locutor [...]; toda compreensão é prenhe de resposta e, de uma forma ou de

outra, forçosamente a produz: o ouvinte torna-se locutor. A compreensão

passiva das significações do discurso ouvido é apenas o elemento abstrato de

um fato real que é o todo constituído pela compreensão responsiva ativa e

que se materializa no ato real da resposta fônica subsequente. Uma resposta

fônica, claro, não sucede infalivelmente ao enunciado fônico que a suscita: a

compreensão responsiva ativa do que foi ouvido (por exemplo, no caso de

uma ordem dada) pode realizar-se diretamente como um ato (a execução da

ordem compreendida e acatada), pode permanecer, por certo lapso de tempo,

compreensão responsiva muda (certos gêneros do discurso fundamentam-se

apenas nesse tipo de compreensão, como, por exemplo, os gêneros líricos),

mas neste caso trata-se, poderíamos dizer, de uma compreensão responsiva

de ação retardada: cedo ou tarde, o que foi ouvido e compreendido de modo

ativo encontrará um eco no discurso ou no comportamento subsequente do

ouvinte. (BAKHTIN, 1997 [1979], p. 291, grifos do autor).

Todas essas considerações podem ser observadas também na relação escrita-leitura e

afirmam teoricamente os fundamentos da intertextualidade no sentido de reforçar que um

discurso não existe por si só nem pode ser interpretado de maneira isolada sem que haja

prejuízos de significação. A concepção de intertextualidade, portanto, tem como foco o

dialogismo como condição sine qua non da interação discursiva, sobre o qual Bakhtin (1997

[1979]), explica que o diálogo é a única forma possível da linguagem. É exatamente a partir

dessa perspectiva complementar que estudaremos os gêneros textuais no CALP.

1.1.2 Coesão e Coerência

Para tratar da Linguística Textual, valemo-nos da obra de Fávero e Koch (2012

[1983]), que enfatizam a necessidade de o texto apresentar coesão e coerência, dois motores

indispensáveis para o estabelecimento de sentido. De acordo com Fávero (2009 [1991], p. 61),

“[...] os elementos de coesão são os que dão conta da estruturação da sequência superficial do

texto; e os de coerência, os que dão conta do processamento cognitivo do texto e permitem

uma análise mais profunda”. Em outras palavras, a coesão abrange os elementos de

textualização a nível microtextual4, sendo a grande responsável pela interligação das palavras

dentro de uma sequência lógica, ao passo que a coerência abarca os elementos a nível

macrotextual, realizando a conexão dos enunciados do texto de forma harmônica e

considerando o âmbito cognitivo do agente receptor.

4 “A coesão se dá em nível microtextual – conexão da superfície do texto –, a coerência caracteriza-se como o

nível de conexão conceitual e estruturação do sentido, manifestado, em grande parte, macrotextualmente”

(FÁVERO, 2009 [1991], p. 61).

29

Segundo Fávero (2009 [1991]), sempre que um texto é desenvolvido, o produtor

seleciona dados e informações do seu banco de conhecimentos prévios para incorporá-los ao

enunciado. Para que isso ocorra de forma clara, ele precisa usar alguns elementos de ligação

para que as ideias sejam estabelecidas e interligadas, a fim de possibilitar um bom

desenvolvimento do texto — esses são, justamente, os elementos coesivos.

Na obra de Halliday e Hasan (1976), faz-se referência à coesão, entretanto, o conceito

de coesão dos autores, em alguns momentos, não parece muito claro. Halliday e Hasan (1976)

têm como base o critério semântico-discursivo ao afirmarem que a coesão se verifica toda vez

que, para se interpretar um elemento no discurso, se recorre à interpretação de outro. Desse

modo, a coesão estabelece relações de sentido, e é por esse motivo que, para eles, ela

representa uma condição necessária para a configuração de textualidade. Acreditamos que é

exatamente pelo fato de ser definida por Halliday e Hasan (1976) como uma complexa rede

de relações de coerência que a coesão se confunde, a nosso ver, com a própria noção de

coerência. Assim, a investigação da coesão passa a ser muito valorizada por esses autores, que

chegam a afirmar que, por esse fator de textualidade, é possível diferenciar um texto de um

não texto.

Tendo em vista essas ponderações, não adotaremos tal conceito de coesão.

Admitiremos, em nosso estudo, a explanação que se fundamenta em Beaugrande e Dressler

(2005, [1981]): o conceito de coesão textual refere-se a todos os processos de sequenciação

que asseguram (ou tornam recuperável) uma ligação linguística significativa entre os

elementos que aparecem na superfície textual (VILELA, KOCH, 2001). A partir dessa

perspectiva, a coesão seria uma espécie de expressão linguística, por meio de conexões

coesivas, explícitas e subentendidas, das relações de coerência.

Em território nacional, há, também, os estudos de coesão efetuados por Marcuschi

(2012 [1983]), que, sob a influência das reflexões de Beaugrande e Dressler (2005 [1981]),

introduziu quatro conceitos responsáveis pela conexão de ideias e pelo estabelecimento de

sequências: a) os repetidores, englobando os processos de paralelismo, recorrência e

definitivização; b) os substituidores, que consistem nos mecanismos de paráfrase, pró-formas

nominais, adverbiais, verbais e pró-sintagmais, além dos fenômenos de anáfora, catáfora,

exófora e elipse; c) os sequenciadores, que representam o tempo, a disjunção, a conjunção e

contrajunção, a subordinação, o aspecto e o tema-rema, e por fim; d) os moduladores,

responsáveis pelo efeito de entonação e pelas modalidades.

30

Fávero (2009 [1991]), em seu livro Coesão e Coerência Textuais, apresenta uma

proposta de reclassificação em relação ao seu trabalho5 anterior, buscando evidenciar a função

que os elementos coesivos exercem na construção do texto, não mais se prendendo às classes

de palavras ou ao léxico. No novo sistema, a coesão pode ser dividida em referencial,

recorrencial ou sequencial stricto sensu.

A coesão referencial engloba “[...] certos itens na língua que têm a função de

estabelecer referência, isto é, não são interpretados semanticamente por seu sentido próprio,

mas fazem referência a alguma coisa necessária a sua interpretação” (FÁVERO, 2009 [1991],

p. 18, grifos da autora). Essa referência pode ser estabelecida por substituição ou por

reiteração. No primeiro caso, há a retomada de um termo por meio de uma anáfora ou a

sucessão de outro componente por intermédio de uma catáfora. Já na reiteração, há a repetição

de uma expressão ou elemento para que seja concretizada a referenciação, o que pode ocorrer

pelo segundo emprego de um mesmo item lexical, pela utilização de sinônimos, hiperônimos,

hipônimos, expressões nominais definidas ou nomes genéricos.

A coesão recorrencial, por sua vez, “[...] se dá quando, apesar de haver retomada de

estruturas, itens ou sentenças, o fluxo informacional caminha, progride; tem, então, por

função levar adiante o discurso” (FÁVERO, 2009 [1991], p. 26), ou seja, os elementos

coesivos articulados à recorrência têm o papel de articular um novo dado ou informação. São

seus mecanismos, o paralelismo, a paráfrase, os recursos fonológicos segmentais e os

suprassegmentais.

Por fim, há a coesão sequencial strictu sensu, que abrange todos os elementos “[...]

que têm por função, da mesma forma que os de recorrência, fazer progredir o texto, fazer

caminhar o fluxo informacional. Diferem dos de recorrência, por não haver neles retomada de

itens, sentenças ou estruturas” (FÁVERO, 2009 [1991], p. 33, grifo da autora). Ela pode

ocorrer por sequenciação temporal; por meio da ordenação linear, expressões que assinalam

ordenação ou continuação; por partículas temporais e correlação dos tempos verbais; ou por

sequenciação por conexão, através de operadores do tipo lógico (proposições, mediações,

complementações, restrições ou delimitações) ou operadores do discurso (conjunções,

disjunções e contrajunções).

Indo mais além, Fávero (2009 [1991]) reformula a noção de coerência e explica que

existem os modelos cognitivos globais, que são blocos de conhecimentos muito utilizados no

processo de comunicação e representam de modo organizado nosso conhecimento prévio

5 FÁVERO, L. L.; KOCH, I. G. V. Revendo os critérios de textualidade. 1985. (Não publicado).

31

armazenado na memória. São modelos cognitivos globais os frames, esquemas, planos,

scripts e cenários. Os frames são modelos globais que contêm o conhecimento comum acerca

de um conceito primário, normalmente situações estereotipadas, como natal, imposto de

renda, carnaval etc.; os esquemas são estados dispostos em sequências ordenadas ligadas por

relações de proximidade temporal e causalidade, dessa forma, são fixos, ordenados,

determinados e previsíveis; os planos são modelos de comportamento exibidos pelas pessoas,

sendo capaz de abranger vários propósitos superpostos, além de terem todos os elementos

ordenados de modo previsível, levam o leitor/ouvinte a notar a intenção do escritor/falante e é

isso que os diferencia dos esquemas; os scripts são empregados regularmente para especificar

os papéis dos participadores e as ações esperadas deles, distintivamente dos planos, são

estereotipados e contêm uma rotina preestabelecida; os cenários, que referenciam o contexto;

as superestruturas, que consistem nas formas globais do discurso, isto é, na sua organização

hierárquica, contento ideias principais e fragmentos; e, por último, o conhecimento prévio,

indispensável para qualquer relação de sentido que possa ser alcançada por meio da coesão ou

da coerência. Esse conhecimento se refere não somente à língua, mas também ao

reconhecimento de tendências narrativas, argumentativas ou descritivas, além da concepção

de mundo — também chamada de conhecimento enciclopédico — que é adquirida de maneira

formal e informal a partir das vivências do falante.

Desse modo, após percorrer esses caminhos, Fávero (2009 [1991], p. 75-76, grifos da

autora), revê a proposta cognitivista e afirma que:

o “frame parece ser a noção mais abrangente, tornando-se mais produtivo

considera-lo o modelo cognitivo mais global e o que possui capacidade de

abarcar os demais. [...] Dentro dessa perspectiva, as estruturas de

conhecimento são produzidos ativamente pelos participantes da interação e

têm um reflexo direto sobre a própria contextualização. Assim, o frame deve

ser visto não só como uma noção que se utiliza de esquemas cognitivos

fixos, mas também como uma noção interativa em que a interpretação

contextual é negociada pelos falantes, refletindo-se direta ou indiretamente

em suas trocas conversacionais, perdendo, assim, seu caráter de fixidez e

adquirindo maior dinamismo.

Para Koch e Travaglia (2013), o conhecimento de mundo é resultado de aspectos

socioculturais estereotipados. O processo de armazenamento na memória não acontece de

modo isolado, mas sua organização e representação na mente se realizam por meio de

unidades completas de conhecimentos estereotipados, chamados de conceitos e modelos

cognitivos globais.

32

Segundo Koch e Travaglia (2013) o que favorece o processo de compreensão é o

conhecimento de mundo que ocorre através da construção do mundo textual, da articulação

dos elementos do texto e da continuidade de sentido. Desse modo, o conhecimento

enciclopédico ou conhecimento de mundo se constitui um dos fatores responsáveis pela

construção do sentido e, consequentemente, por meio da coerência textual.

Consoante com esses autores, tudo o que se relaciona à interpretação do texto, tem

relação com a coerência. Isso pode acontecer em situações que facilitem, dificultem,

impeçam, auxiliem, haja vista que a coerência é posta como interpretabilidade. A coerência

está ligada a elementos linguísticos, à interpretação, em outras palavras, ao que decorre do

contexto linguístico, do conhecimento de mundo, que se relaciona à estrutura informacional

do texto, além de fatores pragmáticos e interacionais, como a função comunicativa do texto e

o contexto situacional.

Por fim, é importante ressaltar as reflexões de Koch e Travaglia (2013) sobre o ensino

da coerência textual nas escolas, alertando para a necessidade de se desenvolver atividades

que motivem os estudantes a relacionar uma mesma ideia de várias formas. Para os autores, o

papel do professor é fundamental para que haja uma conscientização, em sala de aula, das

múltiplas possibilidades na produção de um texto, uma vez que, para tal, são necessárias

intensas mobilizações e escolhas ativas por parte do falante, com o objetivo de expressar suas

intenções efetivamente e, não menos importante, de compreender discursos com clareza.

1.2 O Interacionismo Social

O Interacionismo Social surgiu por volta de 1930, contrapondo-se ao ideal de que as

atividades psíquicas humanas, em suas mais diversas configurações, seria o resultado de

associações decorrentes de impressões imediatas, tal qual defendia o behaviorismo.

Inicialmente, o Interacionismo Social não encontrou grande adesão na comunidade

acadêmica, mas o quadro foi revertido no início dos anos 1970, quando seus teóricos

conseguiram prestígio internacional, principalmente após a publicação da pesquisa do

psicólogo bielorrusso, Lev Vygotsky, pioneira no estudo do funcionamento e do

desenvolvimento das funções psicológicas superiores.

Em seu livro Pensamento e Linguagem, Vygotsky (1989) defende que todo processo

de aprendizagem humana, em quaisquer áreas do conhecimento, perpassa pela cultura e é

resultado de suas interações sociais ao longo da vida. A natureza do homem é social e

somente por meio de trocas de experiências, o indivíduo, que possui, de início, funções

33

psicológicas elementares, consegue refinar suas funções psicológicas superiores – aquelas que

nos diferem de outros animais, como a linguagem e o pensamento.

Para Vygotsky (1989), nossas condutas são fruto de um processo histórico-social,

processo esse que apenas é possível pela mediação do uso da língua, sugerindo que a

linguagem é a fonte de compreensão e de motivação para as atividades humanas. Trata-se de

uma abordagem epistemológica, com confluência em várias áreas das ciências humanas,

como a Filosofia, a Sociologia, a Psicologia e a Linguística, conforme reflexões de Bronckart

sobre o tema. Segundo o autor, “[...] as propriedades específicas das condutas humanas são o

resultado de um processo histórico de socialização” (BRONCKART, 2012 [1997], p. 21,

grifo do autor). Nesse sentido, a linguagem é uma ferramenta indispensável para as

organizações sociais, já que possibilita que as interações humanas aconteçam.

Estruturada na definição da linguagem como instrumento de mediação simbólica

construída por Vygotsky, influenciada pela pesquisa acerca do psiquismo humano realizada

por Hegel (1947) e pela obra sobre a construção da consciência de Marx (1951) e Engels

(1971), estabeleceu-se a teoria do Interacionismo Social como uma tentativa de explicar o

desenvolvimento das relações humanas. Essa nova visão difere do construtivismo de Piaget e

do estruturalismo de Chomsky, ao afirmar que as condutas do ser humano não podem estar

ligadas somente a processos pré-interiorizados ou biológicos, mas também aos processos de

socialização, formalizando uma relação de interdependência de diversos aspectos,

fisiológicos, cognitivos e culturais.

No que tange à visão interacionista, Bronckart (2012 [1997]) afirma que:

[...] é no contexto da atividade em funcionamento nas formações sociais

que se constroem as ações imputáveis a agentes singulares e é no quadro

estrutural das ações que se elaboram as capacidades mentais e a consciência

desses mesmos agentes humanos (BRONCKART, 2012 [1997], p. 13, grifos

do autor).

O pesquisador também defende que o surgimento e o desenvolvimento de

instrumentos semióticos6 estão intimamente relacionados aos processos de socialização que

resultam das condutas humanas.

Tal pensamento é corroborado pelos estudos de Bakhtin (1997 [1979]), que considera

o discurso um elemento que é fruto de estruturas socialmente construídas e reconhecidas,

sendo o texto uma entidade não inédita que marca o encontro de várias impressões, pois “[...]

o objeto, por assim dizer, já foi falado, controvertido, esclarecido e julgado de diversas

6 Os instrumentos semióticos ou instrumentos psicológicos, propostos por Vygotsky (1984), são o que marca o

limite entre a ação do sujeito e o que sofre influência da ação, seja um objeto ou uma situação.

34

maneiras, é o lugar onde se cruzam, se encontram e se separam diferentes pontos de vista,

visões de mundo, tendências” (BAKHTIN, 1997 [1979], p. 319).

Em resumo, a tese primordial defendida pelo Interacionismo Social é a de que todas as

atividades humanas são fruto de um processo social. Portanto, o desenvolvimento das

capacidades humanas acontece por intermédio das interações sociais a partir da internalização

de condutas ou operações. Dessa maneira, o desenvolvimento da linguagem somente pode ser

originado a partir de relações sociais e de trocas comunicativas. Todo e qualquer processo de

ensino e aprendizagem ocorre necessariamente por meio de uma intervenção ou mediação. A

apropriação de conhecimento acontece pelo contato interpessoal. Essa concepção é a base dos

conceitos de Mediação e de Zona de Desenvolvimento Proximal, sobre os quais explanaremos

a seguir.

1.2.1 A Mediação e a Zona de Desenvolvimento Proximal

Em consonância com os estudos de Marx (1951) e Engels (1971) e a fim de

desenvolver sua pesquisa acerca da relação entre o homem e o ambiente a sua volta, bem

como da mediação entre eles, Vygotsky partiu do princípio de que o homem transforma a

natureza de acordo com suas conveniências para dominá-la e, dessa forma, usá-la em seu

favor. Em seus estudos, o pesquisador defende que as relações interacionais entre o social e o

biológico (por ele denominadas sociogênese e filogênese) ocorrem de maneira constante e,

apoiado nos ideais de Engels, afirma que as transformações pessoais humanas acontecem à

medida que o homem transforma o meio a partir do trabalho e do uso de instrumentos.

Vygotsky (1984) defende, ainda, que a psicologia humana é baseada em relações de

mediação entre o indivíduo e o meio, e entre o indivíduo e os objetos de conhecimento, que

são instrumentos que colaboram para o desenvolvimento de determinados comportamentos e,

por conseguinte, servem de guia para a atividade de alteração da natureza. Assim, no exemplo

do inconsciente infantil, para o professor russo, há sempre um instrumento semiótico agindo

como mediador entre o objeto/tarefa a ser memorizado e o efeito de a criança memorizar esse

objeto/tarefa de fato. Esses instrumentos constituem as adaptações artificiais, ou seja, de

criação humana, a partir das quais o homem se apropria de algum saber, sendo definidos

como instrumentos ou artefatos, termos que explicaremos posteriormente.

Dentre algumas dessas adaptações artificiais relacionadas por Vygotsky (1984), estão

os sistemas de contagem, as expressões artísticas, os diagramas e símbolos e, o que mais nos

35

interessa, a linguagem. Incorporados a ela, podemos acrescentar, por nossa própria conta e

com o apoio dos preceitos de Schneuwly e Dolz (2004), os gêneros textuais.

No que concerne à Zona de Desenvolvimento Proximal, Vygotsky (1984) sinaliza a

existência de duas noções de um mesmo conceito: o desenvolvimento “real” e o

desenvolvimento “potencial”, o primeiro sendo descrito como os conhecimentos já

internalizados e, consequentemente, consolidados, e o segundo, como uma gama de

conhecimentos que podem vir a ser adquiridos de acordo com os aspectos particulares do

indivíduo.

A ZDP é definida por Vygotsky (1984) como um espaço ou uma abertura entre aquilo

que o sujeito está apto a alcançar por seus próprios meios e aquilo que para ser alcançado por

ele é necessário o papel de um mediador, referindo-se, sobretudo, ao desenvolvimento

potencial. O mediador faz, nesse sentido, a ponte entre os pré-construtos e a internalização de

novos saberes para os quais os primeiros servirão de base. No decorrer do percurso do

aprendizado, em especial na trajetória escolar, o indivíduo poderá aprender de forma

gradativa a ultrapassar as regulações dadas pelo meio social, para então gerar suas próprias

regulações, dando espaço para o desenvolvimento humano definitivo.

A partir dos preceitos vygotskyanos, torna-se possível compreender os gêneros

textuais como instrumentos ativos na ZDP, agindo como fomentadores da transição das zonas

reais para as potenciais, principalmente quando tratados com caráter desafiador, ou seja,

quando ressaltada sua importância. Ainda de acordo com Vygotsky (1984), para que o

processo de desenvolvimento ocorra de maneira satisfatória, é preciso que o meio incite a

necessidade de superação dos saberes já internalizados, com a geração de um ambiente

conflituoso entre o que já era e o que pode vir a ser, pois, dessa forma, será possível alcançar

os estágios mais elevados de conhecimento e de raciocínio.

1.3 Artefato e Instrumento

Conforme a explanação efetuada nas seções anteriores, o instrumento semiótico é a

chave do princípio sociointeracionista vygotskyano, sendo objeto fundamental nas pesquisas a

respeito do desenvolvimento humano de forma geral. O estudo de Vygotsky envolve a

interação de três áreas da atividade humana propostas por Schneuwly e Dolz (2004) e

denominadas objetos específicos, instrumentos e sujeito.

Os objetos específicos, descritos por Rabardel (1995) como artefatos simbólicos,

existem externamente ao sujeito e são fruto de experiências vividas anteriormente. Os

36

instrumentos semióticos ou instrumentos psicológicos, propostos por Vygotsky (1984),

marcam o limite entre a ação do sujeito e o que sofre influência da ação, seja um objeto ou

uma situação. Já o sujeito, em termos gerais, é o detentor do poder de ação que se apropria do

meio de acordo com o que lhe convém em determinado momento, sempre com o objetivo de

transformar esse meio e registrar sua influência.

Um exemplo, para melhor compreensão dessas três áreas da atividade humana, pode

ser dado quando uma criança, ao ter o primeiro contato com um poema, identifica a forma do

texto, a sonoridade produzida com a leitura do professor e atribui determinados valores a

partir do que é exposto pelo professor e transformado por ele. Desse modo, o objeto

específico é o poema, o instrumento é aquilo que será exposto ao aluno (a leitura do poema, a

explicação do professor sobre a forma do poema, dentre outros) e o sujeito é o próprio aluno,

que irá transformar aquilo que foi vivenciado e registrar sua influência.

Em síntese, os artefatos e instrumentos são definidos por Schneuwly e Dolz (2004)

como o agir que permeia as transformações do meio, enriquecendo-se e subdividindo-se em

diversas possibilidades, tornando possível a evolução da atividade humana de forma contínua

e inédita. Para exemplificar, tomando por base os estudos de Vygotsky (1984), pode-se dizer

que, quando se aprende a usar todos os recursos do computador ou do celular, estes deixam de

ser artefatos e passam a ser instrumentos. O mesmo ocorre com os gêneros textuais em

relação aos alunos, com os materiais didáticos em relação ao professor e, também, com o

conteúdo estudado ou ensinado.

As três áreas de atividade humana descritas por Schneuwly e Dolz (2004) compõem o

que Rabardel (1995, p. 52) chamou de “tríade característica das situações”, um esquema que

explicita o caráter múltiplo das interações humanas, bem como a complexidade das relações

entre cada um dos componentes da tríade. O autor observa a gama de possibilidades de

interação, podendo partir de um polo ao outro ou vice-versa. Assim, constroem-se relações

envolvendo o sujeito e o objeto, o sujeito e o instrumento, e o instrumento e o objeto, todas

com a possibilidade de partirem de uma direção à outra.

Um aspecto de extrema importância a ser ressaltado é que, de acordo com as

observações de Rabardel (1995), o instrumento possui dupla função, podendo também ser

caracterizado como um artefato simbólico. A apropriação desse artefato pelo sujeito em vias

de ocasionar transformações com intenção consciente é o que delimita a função de artefato e

lhe atribui a função de instrumento, isto é, para o pesquisador, o instrumento pode ser

definido como o artefato em uso, num determinado contexto ou situação, por meio do qual o

sujeito age.

37

Ainda sobre a definição de instrumento, Rabardel (1995) observa também que, para a

apropriação do artefato como objeto ainda não esclarecido pelo sujeito, a carga de

conhecimento do indivíduo é determinante e há uma adaptação conveniente, para o bem ou

para o mal, a depender dos objetivos do sujeito.

Os esclarecimentos acerca do instrumento semiótico vygotskyano encontram

confluência nos estudos de Friedrich (2012), que compara a atividade humana àquela

realizada por um instrumento – ambas possuindo caráter mediador. Dessa forma, reforçamos

a importância desse conceito linguístico para nossa investigação acerca do uso do CALP para

o aprendizado dos gêneros textuais no 9º ano do Ensino Fundamental, com prioridade para os

gêneros argumentativos e expositivos, isso porque os objetos de análise adotados neste

trabalho podem ser considerados como instrumentos semióticos, podendo atuar de forma ativa

no aprendizado não somente das estruturas linguísticas, como também dos gêneros e

tipologias textuais presentes.

O instrumento é, portanto, um “[...] meio de influência do sujeito sobre si mesmo, um

meio de autorregulação e de autocontrole” (FRIEDRICH, 2012, p. 57). Nesse sentido,

justifica-se a classificação de gêneros textuais como instrumentos semióticos, uma vez que às

modalidades de texto estudadas por meio do CALP compete o ato de intermediar o

aprendizado das tipologias textuais, propiciando condições para o desenvolvimento de um

raciocínio crítico e de produção textual mais efetivo nas diversas situações comunicativas.

Encontra-se apoio para essa classificação nas definições de Bronckart (2012 [1997]), para

quem os instrumentos semióticos são responsáveis pelos chamados fatos de linguagem, as

condutas humanas em contextos sociais. É, por conseguinte, pela mediação de um

instrumento semiótico (gêneros textuais) ativo e interativo que se desenvolve a capacidade de

uso da linguagem em estruturas discursivas com vistas a se atingir determinados objetivos nas

situações de comunicação em que se inserem os gêneros.

Schneuwly e Dolz (2004) corroboram esse ponto de vista ao declarar que

[...] os gêneros textuais, por seu caráter genérico, são um termo de referência

intermediário para a aprendizagem. [...] o gênero pode, assim, ser

considerado um megainstrumento que fornece suporte para a atividade, nas

situações de comunicação, e uma referência para os aprendizes.

(SCHNEUWLY; DOLZ, 2004, p. 64-65, grifo dos autores).

A partir dessa perspectiva, os gêneros são objetos fundamentais no esquema de

intermediação para a compreensão e a produção da linguagem como estrutura comunicativa e

instrumento de desenvolvimento das atividades humanas.

38

1.4 O Interacionismo Sociodiscursivo

O presente trabalho investigará o ensino da língua portuguesa com base em gêneros

textuais, do modo como é posposto pela Escola de Genebra, isto é, por meio do

Interacionismo Sociodiscursivo (ISD).

Configurado como uma extensão da teoria do Interacionismo Social, mas focado nos

aspectos específicos da linguagem, o Interacionismo Sociodiscursivo foi expandido por

Bronckart (2012 [1997]), que afirma que os processos comunicativos somente são passíveis

de existência em situações sociais, pois representam expressões coletivas, de modo que nunca

podem acontecer sem que haja dois expoentes interagindo. O ISD considera que o

desenvolvimento humano se dá por intermédio das interações sociais, apresentando forte

influência dos princípios vygotskyanos e saussurianos em sua concepção: de Vygotsky

(1984), devido aos seus estudos acerca do refinamento das funções psíquicas superiores por

meio das interações sociais, conforme já discorremos nas seções anteriores; de Saussure

(2002), em virtude de seu pioneirismo ao atribuir o caráter arbitrário e coletivo ao signo

linguístico.

Saussure (2002) classifica a linguagem como um sistema de valores sociais

estabelecidos por meio de acordos coletivos. Sem a existência do coletivo, os signos

perderiam o seu significado. Para exemplificar sua teoria, o linguista se utilizou de uma

comparação com o sistema monetário: uma nota representa um valor abstrato, que não está

necessariamente relacionado ao material, e cuja grandeza é estabelecida por intermédio de um

acordo social. Somente concebemos a grandeza de uma nota de dez reais, por exemplo, em

comparação às notas de dois, cinco, e assim por diante. Definimos o seu valor abstrato ao

observar o que ela representa em meio às demais notas.

De forma semelhante, os signos linguísticos carregam um significado conceitual a

partir de um processo de associação de grandezas e definições postuladas socialmente, de

maneira coletiva e gradual, isto é, ao longo do tempo. O signo é, pois, uma associação entre

significante e significado, que são vinculados de forma arbitrária.

Partindo desses princípios e tendo por base a concepção de que a linguagem é um

elemento de fundamental importância no desenvolvimento das capacidades humanas, tanto

epistêmicas (de conhecimento) quanto praxeológicas (de ação), Bronckart (2012 [1997])

define a interação linguística como algo que permite ao sujeito a abstração do pensamento e o

reconhecimento de si próprio e de seu papel no mundo.

39

De acordo com Bronckart (2012 [1997]), os estudos realizados no campo teórico-

metodológico do ISD foram organizados em três etapas: i) procedimentos de análise de textos

que levam em conta as condições de produção discursiva e a arquitetura geral do texto; ii)

investigações dos esquemas de organização nos programas de ensino de língua e nos sistemas

escolares, com uma consequente produção de sugestões de sequências de aprendizagem,

objetivando refinar o estudo dos gêneros e, por fim; iii) pesquisas cuja finalidade é dar

prosseguimento ao trabalho desenvolvido por Vygotsky, principalmente no que toca à questão

da interiorização dos signos.

As pesquisas desenvolvidas em consonância com os princípios do ISD são,

geralmente, direcionadas para a questão do ensino de línguas e de formação de docentes.

Alguns estudiosos brasileiros vêm se destacando nas investigações a respeito do

desenvolvimento humano a partir da análise estrutural de textos, proporcionando uma

observação do agir humano, em especial, da ação dos profissionais docentes. Os estudos de

Bronckart junto aos pesquisadores da escola de Genebra encontram-se em movimento

ascendente nos meios acadêmicos desde a década de 80, alcançando, inclusive, a atenção de

estudiosos brasileiros que contribuem para o fortalecimento da teoria. Dentre eles, pode-se

destacar o trabalho de Machado (1998), responsável pela publicação da primeira pesquisa

relacionada ao ISD no Brasil. Desde então, e, sobretudo após a publicação dos PCN

(BRASIL, 1998) para o ensino da Língua Portuguesa, os estudos no quadro do ISD

começaram a se multiplicar e a alcançar notoriedade no meio acadêmico.

É na pesquisa de Vygotsky que o ISD encontra maior respaldo, o que se torna evidente

nas palavras de Bronckart:

[...] a emergência das práticas de linguagem ou semióticas inscreve-se na

continuidade da evolução das espécies e constitui, ao mesmo tempo, o

elemento decisivo da “ruptura humana”: a prática dos signos e dos textos

que os organizam constituiriam uma forma de materialização dos processos

dinâmicos que, com o homem, elabora-se uma nova rede de processos

dinâmicos de origem radicalmente social que, de um lado, se sobrepõe à rede

dinâmica herdada ou biológica, e de outro lado, porque é material e,

portanto, acessível, permitindo ao homem pensar e gerar seu próprio futuro.

(BRONCKART, 2006b, p. 11, grifo do autor).

O ISD enfatiza os aspectos específicos da linguagem e das práticas de discurso como

instrumentos semióticos para o desenvolvimento das funções psíquicas superiores. Enquanto

o Interacionismo Social busca entender o papel das relações sociais para o funcionamento e o

refinamento das atividades humanas, o ISD faz o mesmo, mas a partir de uma visão mais

específica, em que a linguagem ocupa o centro desse questionamento. Bronckart (2006a)

40

sustenta que o desenvolvimento das capacidades de cognição humana, fundamentado em

interações sociais, deriva de outro esquema de caráter secundário, afinal, o pensamento

particular somente é possível por meio da construção de um repertório linguístico baseado em

experiências socioculturais e de diálogo coletivo.

Bronckart (2006a) empresta de Vygostsky o conceito de instrumento semiótico para

explicar os efeitos da linguagem sobre o funcionamento das atividades humanas, apontando

que uma criança, assim que nasce, é integrada a determinados esquemas do agir pela

mediação de um adulto. Conforme adquire conhecimentos linguísticos suficientes para

internalizar esses esquemas, ela passa a fazer parte do processo de agir humano. A partir das

interações mediadas pelos indivíduos pertencentes ao seu círculo social, ela é capaz de

interiorizar coordenadas e se torna perceptiva às ações, adquirindo, paulatinamente,

consciência do seu próprio papel como enunciadora. Segundo Bronckart (2006a):

Em um estado de desenvolvimento da espécie humana, os mundos racionais

que regem as ações humanas já “estão lá” e são permanentemente

(re)elaborados pelas práticas linguageiras e reconfigurados pelos gêneros

discursivos historicamente construídos por um grupo. (BRONCKART,

2006a, p. 79).

Em outras palavras, na concepção do Interacionismo Sociodiscursivo, os gêneros

textuais fazem parte de um repertório natural inerente a todos os indivíduos da sociedade e

construído diacronicamente com a somatória de modelos de textos relativamente

padronizados e selecionados de acordo com as situações ou contextos sociais. Ou seja, todos

os gêneros são escolhas que “[...] provém do trabalho que as formações sociais de linguagem

desenvolvem para que os textos sejam [...] eficazes diante de um desafio social”

(BRONCKART, 2006a, p. 143-144).

Nesse sentido, o ISD considera que:

[...] é no contexto da atividade em funcionamento nas formações sociais

que se constroem as ações imputáveis a agentes singulares, e é no quadro

estrutural das ações que se elaboram as capacidades mentais e a consciência

desses mesmos agentes humanos. As condutas verbais são concebidas,

portanto, como formas de ação (daí o termo ação de linguagem), ao mesmo

tempo específicas (dado que são semióticas) e em interdependência com as

ações não verbais. (BRONCKART, 2012 [1997], p. 13, grifos do autor).

Portanto, se consideramos o texto como um instrumento mediador que pode propiciar

o desenvolvimento das capacidades humanas, há uma importância didática ao utilizar o

41

modelo sociodiscursivo para o entendimento da organização e do funcionamento dos gêneros

textuais como mediadores do aprendizado.

1.5 Gênero Textual

Neste trabalho, foram utilizados alguns conceitos-chave na perspectiva de

Interacionismo Sociodiscursivo defendida por Bronckart (2012 [1997]), Dolz e Schneuwly

(2004) acerca do ensino de línguas com base em gêneros. Todavia, antes, é preciso apresentar

a origem do conceito de gêneros textuais. Os estudos a respeito desse assunto são bem

antigos, tendo a tradição poética sua origem em Platão, e a tradição retórica, em Aristóteles.

Enquanto Bakhtin (2011 [1979]) emprega a expressão “gêneros do discurso”,

Bronckart (2012 [1997]) prefere o termo “gêneros de texto”, justificando essa preferência ao

afirmar que as modalidades discursivas são, na realidade, componentes de uma estrutura

textual. Vale lembrar que adotamos a expressão gêneros textuais ancorados na argumentação

de Marcuschi (2008) de não discutir qual é a mais pertinente das escolhas, mas adotar a

posição de que todas elas (gênero discursivo, gênero do discurso, gênero textual e gênero de

texto) podem ser utilizadas intercambiavelmente, salvo naqueles casos em que se pretende

identificar algum evento específico.

A noção de gêneros tal qual conhecemos hoje começou a ser elaborada por Bakhtin

(2011 [1979]). De acordo com o estudioso, todos os enunciados representados por meio da

oralidade ou da escrita são determinados, em princípio, por suas características particulares e

pelos objetivos aos quais obedecem. Em suas palavras, “[...] cada enunciado particular é

individual, mas cada campo de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis

de enunciados, os quais denominamos gêneros do discurso” (BAKHTIN, 2011, p. 262

[1979], grifos do autor).

Segundo Bakhtin (2011 [1979]), as interações sociais são repletas de tipos de discurso

que obedecem a elementos relativamente estáveis em relação ao seu conteúdo temático, estilo

e composição. Esses tipos são selecionados no ato comunicativo a depender das necessidades

e intenções dos indivíduos participantes da troca linguística. O autor também observa que há

mais de um tipo de gênero — existem os padronizados e cotidianos, os elevados, os oficiais e

os livres ou criativos, típicos da comunicação ativamente verbal. Ainda de acordo com os

estudos bakhtinianos, o ser humano tem uma gama extensa de gêneros já internalizados e

passeia com agilidade por entre as várias modalidades de texto. Conforme o autor, fazemos

42

uso de formas precisas de texto, sejam elas padronizadas e prescritivas ou livres, a depender

do contexto social.

Em relação a tais concepções, encontramos consonância com as pesquisas de

Marcuschi (2005), segundo o qual “os gêneros textuais são fenômenos históricos,

profundamente vinculados à vida cultural e social. Fruto de trabalho coletivo, os gêneros

contribuem para ordenar e estabilizar as atividades comunicativas do dia a dia.”

(MARCUSCHI, 2005, p. 19).

Compreende-se, pois, o caráter funcional dos gêneros como elementos comunicativos

e institucionalizados. Por esse mesmo motivo, o texto não se constitui isoladamente, sem que

haja uma interação social, e é exatamente essa característica de dependência das situações

coletivas que garante a ele a versatilidade e maleabilidade de função. Os gêneros são

incontáveis e, mesmo os mais convencionais, carregam consigo a flexibilidade de uma

entidade social, um organismo vivo e mutável que responde aos contextos nos quais se insere.

Em virtude dessa maleabilidade contida em cada gênero textual, há o estabelecimento

de uma relação contínua de interação. O que não se pode perder de vista é o caráter plural e

complexo de cada construção textual, justamente por sua organização de origem social e

cultural.

1.5.1 Ensino com Base em Gênero Textual

Durante muito tempo, o ensino nas escolas priorizou o contato dos alunos com gêneros

textuais postulados como consagrados e marcados por uma tradição que não acompanhou os

estudos acerca das propriedades comunicativas da linguagem. O texto, nesse cenário, é:

[...] marcado pela precariedade dialógica, que pouco contribui para que o

aluno atribua à escrita um sentido social e para que ele compreenda a

necessidade e as possibilidades de selecionar e organizar conteúdos, definir

um gênero, escolher um estilo de linguagem (MARCUSCHI, 2008, p. 9).

Assim, o ensino dos gêneros textuais foi, por muito tempo, centrado em aspectos

puramente gramaticais e prescritivos, limitando o trabalho docente à correção de normas da

língua, sem realmente observar o desenvolvimento de suas capacidades comunicativas e sua

real funcionalidade na compreensão do mundo. Nos últimos anos, em especial após a

publicação dos PCN (BRASIL, 1998), houve uma espécie de rompimento com essa tradição

gramaticalizada, e o estudo dos gêneros passou a refletir um anseio mais global no que

concerne às habilidades linguísticas do aluno.

43

A seleção dos gêneros textuais é, por vezes, complexa e extensa, sendo, portanto, uma

tarefa delicada escolher aqueles que serão trabalhados durante o processo escolar. Para

Marcuschi (2008), não há um ou outro gênero considerado ideal para o ensino; deve-se, por

conseguinte, privilegiar os exemplares que permitam ao aluno progressão na construção de

suas habilidades comunicativas no que se refere à produção e à compreensão textual. Nos

PCN7, há sugestões dos gêneros que podem ser trabalhados em sala de aula, propostos com o

intuito de estimular a fala, a escuta, a escrita e a leitura em amplas esferas, como a literária, a

publicitária, a jornalística etc.

Além da dificuldade na seleção da variedade de gêneros a ser estudada no percurso

escolar, há outro ponto importante levantado por Marcuschi, a oralidade. Para o autor:

Aspecto central nesta questão é a impossibilidade de situar a oralidade e a

escrita em sistemas linguísticos diversos, de modo que ambas façam parte do

mesmo sistema da língua [...]. Portanto, não postulamos uma simetria de

representação entre fala e escrita, mas uma relação sistêmica no aspecto

central das articulações estritamente linguísticas. (MARCUSCHI, 2008,

p. 191).

De acordo com Bakhtin (2011 [1979]), todo e qualquer uso que fazemos da língua

acontece a partir da estruturação de um discurso que pode ser escrito ou oral. Isso ocorre

independentemente de qualquer institucionalização, já que os gêneros discursivos “[...] nos

são dados quase como nos é dada a língua materna, que dominamos com facilidade, antes

mesmo que lhe estudemos a gramática [...]” (BAKHTIN, 2011 [1979], p. 301). Sob essa

perspectiva teórica, não há como ignorar, portanto, o estudo da oralidade no Ensino

Fundamental, refletindo, principalmente, em seu uso como instrumento na produção e na

compreensão comunicativa.

Dessa forma, uma nova postura em relação ao estudo dos gêneros na escola a partir

dos PCN (BRASIL, 1998) converge para a necessidade de uma adequação, também, do plano

de aula pelo profissional docente. É preciso que haja a consciência de que o trabalho com os

diferentes gêneros textuais “[...] se bem conduzido, pode contribuir para a formação de

leitores perspicazes e produtores de textos habilidosos e seguros” (MARCUSCHI, 2008, p. 9).

A pressuposta chave dessa reflexão é considerar o ensino da Língua Portuguesa a partir do

texto, além da reflexão sobre seu uso linguístico.

7 Os quadros dos PCN são reproduzidos no item 2.3 desta dissertação.

44

O texto, antes de ser um objeto escolar, é um objeto social. Sendo assim, é tarefa

primordial da escola levar o aluno a compreender o significado do uso do texto e de modo

integrado ao meio social. De acordo com Passarelli (2012), trata-se de levar em conta e

mostrar aos alunos que a linguagem se realiza em situações práticas de convívio social, por

gêneros orais e escritos.

Kaufman e Rodriguez (1995, p. 45) são favoráveis a essa perspectiva e salientam que

“[...] os leitores não se formam com leituras escolares de materiais escritos expressamente

para a escola com a finalidade de cumprir as exigências de um programa”. De acordo com as

autoras, os leitores são fruto do contato com diferentes obras, com os mais variados gêneros

textuais, a exemplo do que verdadeiramente ocorre no ambiente extraescolar – as situações

comunicativas não respeitam um número limitado de padrões preestabelecidos, mas trazem

consigo a característica de mutabilidade, adequando-se e modificando-se conforme as

condições contextuais em que se inserem.

Ademais, as estudiosas referem-se ao material didático, observando que somente são

favoráveis ao ensino dos gêneros quando usados com conveniência, visando à produção e à

compreensão de conteúdo de forma não mecanizada. Por isso, o papel do professor se faz

importante, principalmente no que se refere à seleção de textos para serem estudados em sala

de aula, com consciência de que suas concepções podem ser decisivas no percurso escolar do

aluno. Kaufman e Rodriguez (1995) ressaltam ainda que a palavra-chave na escolha e no uso

do material didático é “cautela”, reforçando que a postura do docente na observação crítica a

respeito dos gêneros, bem como no que concerne à necessidade de as atividades propostas

contemplarem ou não o que é proposto no plano de aula, é fundamental em todo esse

processo.

O ensino com base em gêneros textuais deve ser pautado na importância de fazer o

aluno identificar e entender as expectativas dos ouvintes e escritores quanto a seu texto, sua

forma, seu conteúdo, dentre outros. Dessa forma, faz-se necessário compreender o que é

gênero. Segundo Dolz e Schneuwly (2004, p. 142), gêneros são “[...] formas relativamente

estáveis de textos que funcionam como intermediárias entre o enunciador e o destinatário”, ou

seja, os gêneros fazem com que a comunicação se efetue, já que seria muito complexo para o

enunciador ter de criar, inventar estruturas linguísticas e contextuais para cada situação de

comunicação.

Assim, o enunciador sempre vai produzir expectativas para com a situação de

comunicação a depender do gênero em que está inserido. Para exemplificar, o gênero “aula”

pressupõe uma configuração de sala (que precisará ter um quadro, cadeiras, mesa para

45

professor, mesas para alunos, giz/pincel para quadro, data-show, a depender de ter outros),

assim como um professor, um mediador, um aluno, o conteúdo de uma determinada

disciplina, entre outros elementos. Dito de outra maneira, quando o enunciador vai para uma

aula, já tem em mente as características peculiares desse gênero e, por isso, levará caderno,

lápis, caneta etc. Cada um de nós reconhece essas características e sabe o que será exposto em

determinado gênero. Sendo assim, segundo Dolz e Schneuwly (2004), o gênero é um

instrumento que funda a possibilidade de comunicação. Algumas vezes, os autores chamam

os gêneros de “megainstrumentos”, quando se referem ao fato de se tratar de um conjunto

articulado de instrumentos comunicativos.

O ensino com base no gênero textual é, portanto, aquele que garante a apropriação das

diferentes construções textuais pelo aluno, sejam elas escritas ou orais, tornando-o apto a

compreender e inserir práticas de discurso em suas atividades comunicativas. Quanto maior

for o alcance da escola a respeito da diversidade de gêneros, mais bem contempladas serão as

habilidades de leitura, escrita, fala e compreensão dos textos, uma vez que se tornará possível

a reflexão acerca das muitas possibilidades de uso da língua.

1.6 Domínios Discursivos

No que tange aos domínios discursivos (DD), Marcuschi (2008) define-os como

instâncias discursivas, isto é, grandes esferas que “[...] constituem práticas discursivas nas

quais podemos identificar um conjunto de gêneros textuais que às vezes lhe são próprios ou

específicos, como rotinas comunicativas institucionalizadas e instauradoras de relações de

poder” (MARCUSCHI, 2008, p. 155). Em outras palavras, os DD não abrangem um ou outro

gênero em particular, mas agrupam gêneros com estruturas e com finalidades discursivas

relativamente semelhantes; por exemplo, os textos podem ser característicos do discurso

jornalístico, do discurso publicitário etc.

Para corroborarmos tal definição, precisamos compreender as propriedades do texto

pelas lentes do ISD, a partir do qual consideramos impossível que haja comunicação e, por

conseguinte, o desenvolvimento das atividades humanas sem que haja o uso interativo da

linguagem, o que ocorre essencialmente por meio do texto. Em toda e qualquer atividade

humana que apresente alguma manifestação verbal, há o uso de algum gênero textual,

acarretando um número ilimitado de estruturas textuais que correspondem às mais variadas

situações e aos contextos sociais.

46

Assim, não cabe entender os gêneros textuais como formas rígidas e imutáveis, visto

que são, conforme já discutido anteriormente, organismos vivos e flexíveis, equivalendo às

formas culturais de interação linguística. Esse caráter torna sua classificação, em grandes

grupos, impossível de ser inflexível. No entanto, seu agrupamento sistemático de acordo com

suas finalidades discursivas é inevitável, até mesmo devido à necessidade de conhecimento

das mais variadas formas de texto, a fim de nos tornarmos falantes capazes de eleger o

discurso em relação às práticas sociais.

Marcuschi (2008, p. 194) observa que “[...] os domínios discursivos operam como

enquadres globais de superordenação comunicativa, subordinando práticas sociodiscursivas”.

Dessa forma, o autor realizou o trabalho de agrupar os gêneros mais recorrentes em DD na

tentativa de distribuí-los conforme os parâmetros justificados. Vale lembrar que utilizamos o

quadro geral a seguir, proposto por Marcuschi (2008, p. 194-196), para enquadrar os gêneros

textuais localizados no CALP. Evidenciamos, ainda, que a escolha do quadro geral se justifica

pela tentativa de didatizar o levantamento dos gêneros textuais encontrados no CALP.

Encontramos, em nossa tabulação de dados, a existência de alguns gêneros que não se

enquadram no quadro geral proposto pelo autor. O agrupamento proposto por Marcuschi é

reproduzido no Quadro 1, a seguir:

QUADRO 1 – Domínios Discursivos e Gêneros Textuais

DOMÍNIOS DISCURSIVOS

MODALIDADES DE USO DA LÍNGUA

Escrita Oralidade

INSTRUCIONAL (científico,

acadêmico e educacional)

artigo científico; verbete de enciclopédia; relatório científico; notas de aula; nota de rodapé; diário de campo; tese; dissertação; monografia; glossário; artigo de divulgação científica; tabela; mapa; gráfico; resumo de artigos de livros; resumo de livro; resumo de conferência; resenha; comentários; biografia; projetos; solicitação de bolsa; cronograma de trabalho; organograma de atividade; monografia de curso; monografia de disciplina; definição; autobiografia; manual de ensino; bibliografia; ficha catalográfica; memorial; curriculum vitae; parecer técnico; verbete; parecer sobre tese; parecer sobre artigo; parecer sobre projeto; carta de apresentação; carta de recomendação; ata de reunião; sumário; índice remissivo; diploma; índice onomástico; dicionário; prova de língua; prova de vestibular; prova de múltipla escolha; diploma; certificado de especialização; certificado de proficiência; atestado de

conferência; debate; discussão; exposição; comunicação; aula participativa; aula expositiva; entrevista de campo; exame oral; exame final; seminário de iniciantes; seminário avançado; seminário temático; colóquio; prova oral; arguição de tese; arguição de dissertação; entrevista de seleção de concurso; aula de concurso; aula em vídeo; aula pelo rádio;

47

participação; epígrafe aconselhamento

JORNALÍSTICO

editorial; notícia; reportagem; nota social; artigo de opinião; comentário; jogos; história em quadrinhos; palavra cruzada; crônica policial; crônica esportiva; entrevista jornalística; anúncios classificados; anúncios fúnebres; carta do leitor; carta ao leitor; resumo de novela; reclamações; capa de revista; expediente; boletim do tempo; sinopse de novela; resumo de filme; cartoon; caricatura; enquete; roteiros; errata; charge; programação semanal; agenda de viagem

entrevista jornalística; entrevista televisiva; entrevista radiofônica; entrevista coletiva; notícia de rádio; notícia de TV; reportagem ao vivo; comentários; discussões; debate; apresentações; programa radiofônico;

RELIGIOSO oração; reza; catecismo; homilia; hagiografia; cântico religioso; missal; bula papal; jaculatória; penitência; encíclica papal

sermão; confissão; reza; cantorias; oração; lamentações; benzeção; cantos medicinais

SAÚDE receita médica; bula de remédio; parecer médico; receitas caseiras; receitas culinárias

consulta; entrevista médica; conselho médico

COMERCIAL

rótulo; nota de venda; fatura; nota de compra; classificados; publicidade; comprovante de pagamento; nota promissória; nota fiscal; boleto; boletim de preços; logomarca; comprovante de renda; carta comercial; parecer de consultoria; formulário de compra; carta-resposta; comercial; memorando; nota de serviço; controle de estoque; controle de venda; copyright; bilhete de avião; bilhete de ônibus; carta de representação; certificado de garantia; atestado de qualidade; lista de espera; balança comercial

publicidade de feira; publicidade de TV; publicidade de rádio; refrão de feira; refrão de carro de venda de rua

INDUSTRIAL instruções de montagem; descrição de obras; código de obras; aviso; controle de estoque; atestado de validade; manual de instrução

ordens

JURÍDICO

contrato; lei; regimento; estatuto; certidão de batismo; certidão de casamento; certidão de óbito; certidão de bons antecedentes; certidão negativa; atestado; certificado; diploma; normas; regras; parecer; boletim de ocorrência; edital de convocação; edital de concurso; aviso de licitação; auto de penhora; auto de avaliação; documentos pessoais; requerimento; autorização de funcionamento; alvará de licença; alvará de soltura; alvará de prisão; sentença de condenação; citação criminal; mandado de busca; decreto-lei; medida provisória; desmentido; edital; regulamento; advertência

tomada de depoimento, arguição; declaração; exortação; depoimento; inquérito judicial; inquérito policial; ordem de prisão

PUBLICITÁRIO propaganda; publicidade, anúncio, cartaz; folheto; logomarca; aviso; necrológio; outdoors; inscrições em muros; inscrições em banheiros;

publicidade na tv; publicidade no rádio

48

placa, endereço postal; endereço eletrônico; endereço de internet

LAZER piada; jogos; adivinha; história em quadrinhos; palavra cruzada; horóscopo

fofoca; piada; adivinha; jogos teatrais

INTERPESSOAL

carta pessoal; carta comercial; carta aberta; carta do leitor; carta oficial; carta-convite; cartão de visita; e-mail; bilhete; ata; telegrama; memorando; boletim; relato; agradecimento; convite; advertência; informe; diário pessoal; aviso fúnebre; volante; lista de compras; endereço postal; endereço eletrônico; autobiografia; formulário; placa; mapa; catálogo; papel timbrado

recado; conversação espontânea; telefonema; bate-papo virtual; convite; agradecimento; advertência; aviso; ameaça; provérbio

MILITAR ordem do dia; roteiro de cerimônia oficial; roteiro de formatura; lista de tarefas

ordem do dia

FICCIONAL

épica-lírica-dramática; poema; conto, mito; peça de teatro; lenda; parlenda; fábula; história em quadrinhos; romance; drama; crônica; roteiro de filme

fábula; conto; lenda; poema; declamação; encenação

Fonte: Adaptado de Marcuschi (2008, p. 194-196).

O autor observa que, na Língua Portuguesa, há uma predominância dos gêneros

textuais representados por meio da escrita em detrimento daqueles típicos da oralidade e

acrescenta que, se fizéssemos o mesmo trabalho de agrupamento dos gêneros em DD

considerando outras culturas, os resultados poderiam ser muito diferentes e surpreendentes,

reforçando a carga cultural indissociável aos gêneros textuais.

Por isso, para Marcuschi (2008), alguns gêneros são altamente flexíveis, podendo

fazer parte de mais de um DD, enquanto outros não possuem a mesma plasticidade. Isso

ocorre porque determinados ambientes, em especial aqueles que fazem parte de contextos

muito específicos – como no caso do domínio jurídico, por exemplo – não permitem a

circulação de gêneros diversos, mas somente de alguns muito particulares a esses contextos.

Constata-se, pois, que os DD são consolidados por meio de um esquema de interação social.

1.7 Tipologias Textuais

Levando-se em consideração a classificação de entidades sociodiscursivas empregada

por Marcuschi (2005, 2008), infere-se que os gêneros constituem a comunicação verbal e são

fatores de estudo fundamentais para o desenvolvimento das situações comunicativas do aluno.

Tendo por base essa premissa, adotamos como um dos conceitos-chave do nosso estudo a

49

noção de tipologias textuais, proposta por Dolz, Noverraz, Schneuwly (2004) e Marcuschi

(2007).

Para os autores, há diferença entre os conceitos de gênero e tipo textuais. O primeiro

tem função comunicativa e é fortemente relacionado aos aspectos sociais e culturais, ao passo

que o segundo é classificado de acordo com suas propriedades linguísticas, incluindo tempos

verbais, vocabulário empregado, construções de frase etc., ou seja, a tipologia textual mais

tem a ver com a forma do texto propriamente dita. Segundo Travaglia (1996) cada tipo de

texto se distingue dos demais por uma correlação entre marcas e propriedades, mas um tipo

não se caracteriza somente por traços formais no texto, o que ocorre em razão de,

dificilmente, um traço linguístico ser exclusivo de determinado discurso.

Na mesma linha de pensamento, estão Koch e Fávero (1987), que comentam sobre três

grandes dimensões de análise das tipologias textuais, sendo elas interdependentes: a) a

dimensão pragmática; b) a dimensão esquemática global ou superestrutura; e c) a dimensão

linguística ou de superfície. A primeira se refere aos chamados “macroatos” da fala, como o

de orientar ou o de instruir, por exemplo. A segunda, aos sistemas cognitivos associados aos

aspectos culturais. E, por último, a terceira dimensão se relaciona aos elementos linguísticos

característicos de cada tipo textual, incluindo as marcas sintático-semânticas, morfológicas e

fonético-fonológicas.

Tendo como fundamento a complexidade dos gêneros e das tipologias textuais, Dolz e

Schneuwly (2004) afirmam que, para que haja compreensão e produção efetiva, tanto de

exemplares escritos como orais, algumas habilidades precisam ser refinadas e expandidas a

fim de que, em um dado momento de interação comunicativa, o enunciador consiga adequar

seu discurso ao contexto compartilhado com o enunciatário — essas habilidades foram

chamadas de Capacidades de Linguagem (CL). Para os autores, as CL são instituídas por

meio de práticas sociais características de determinados modelos de apropriação discursiva e

permitem ao indivíduo “[...] adaptar-se às características do contexto e do referente

(capacidades de ação), mobilizar modelos discursivos (capacidades discursivas) e dominar as

operações psicolinguísticas e as unidades linguísticas (capacidades linguístico-discursivas).”

(DOLZ; SCHNEUWLY, 2004, p. 44).

Detalhamos as propriedades de cada uma dessas capacidades a seguir:

a) Capacidade de Ação: ligada à produção do enunciado e à adequação de seus conteúdos.

Essa capacidade traduz a habilidade do falante de realizar inferências pela observação dos

participantes da situação comunicativa e de suas intenções. Em resumo, a capacidade de

ação mobiliza a observação dos seguintes fatores: a) do ambiente, b) dos destinatários e c)

50

do contexto; além do papel social de quem escreve e o objetivo da situação de

comunicação.

b) Capacidade Discursiva: relacionada à organização estrutural do texto, incluindo os

aspectos temáticos e as tipologias textuais. Uma capacidade discursiva refinada permite ao

falante organizar o seu discurso de forma a atender plenamente seus objetivos naquela

determinada situação interativa. Para tanto, é preciso conhecer a forma de apresentação

textual, inclusive quando não verbal (fotos, gráficos etc.), e identificar o nível de

distanciamento social entre os participantes do contexto comunicativo.

c) Capacidade Linguístico-discursiva: diz respeito ao domínio de estruturas linguísticas e de

operações psicolinguísticas, como o conhecimento de aspectos de coerência, coesão verbal

e nominal, construções semânticas, mecanismos enunciativos, vozes e modalizações,

escolha lexical e referências pronominais. Essa capacidade é necessária para que haja a

plena compreensão dos elementos que mobilizam as construções textuais, tornando

possível a compreensão do funcionamento de parágrafos, orações, elementos de articulação

textual e adequação sintática, morfológica e semântica, dentre outros.

Schneuwly e Dolz (2004) observam que, para que os gêneros textuais sejam

devidamente utilizados como instrumentos capazes de propiciar o desenvolvimento das

tipologias textuais durante o percurso escolar e, portanto, para que sua inserção no currículo e

no plano de aula seja conveniente, é preciso observar alguns critérios de organização que

consideram, entre outros fatores, a) a adequação dos gêneros a determinadas intenções sociais

tradicionalmente delegadas à prática escolar, b) a retomada gradual e flexível de algumas

distinções essenciais realizadas previamente em manuais e currículos, e c) a similaridade

relativa em relação a como determinados gêneros abarcam certas capacidades de linguagem.

A partir desses critérios, os autores construíram um agrupamento de gêneros orais e

escritos de acordo com as tipologias textuais, reproduzido no Quadro 2:

QUADRO 2– Tipologias Textuais

Domínios Sociais de

Comunicação

Aspectos

Tipológicos

Capacidades

de Linguagem dominantes

Exemplos de Gêneros Orais e Escritos

Cultura literária ficcional

Narrar

Mimeses de ação por meio da criação da intriga no domínio do

Conto maravilhoso, Fábula, Lenda, Narrativa de aventura, Narrativa de ficção científica, Narrativa de enigma, Novela fantástica, Conto

51

verossímil

parodiado

Documentação e memorização de ações humanas

Relatar

Representação pelo discurso de experiências vividas situadas no tempo

Relato de experiência vivida, Relato de viagem, Testemunho, Curriculum vitae, Notícia, Reportagem, Crônica esportiva, Ensaio biográfico

Discussão de problemas sociais

controversos

Argumentar

Sustentação, refutação e negociação de tomadas de posição

Texto de opinião, Diálogo argumentativo, Carta do leitor, Carta de reclamação, Deliberação informal, Debate regrado, Discurso de defesa, Discurso de acusação

Transmissão e construção de saberes

Expor

Apresentação textual de diferentes formas dos saberes

Seminário, Conferência, Artigo ou verbete de enciclopédia, Entrevista de especialista, Tomada de notas, Resumo de textos “expositivos” ou explicativos, Relatório científico, Relato de experiência científica

Instruções e prescrições

Descrever

Regulação mútua de comportamentos

Instruções de montagem, Receita, Regulamento, Regras de jogo, Instruções de uso, Instruções

Fonte: Adaptado de Dolz; Noverraz; Schneuwly (2004, p. 102).

Segundo Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004), o agrupamento proposto possui

intenções puramente didáticas, não representando uma classificação de gêneros de acordo

com a sua tipologia textual de forma definitiva ou absoluta. “Trata-se, mais simplesmente, de

dispor de um instrumento suficientemente fundado teoricamente para resolver,

provisoriamente, problemas práticos, como a escolha dos gêneros” (DOLZ; NOVERRAZ;

SCHNEUWLY, 2004, p. 103). O quadro apresentado anteriormente serve, assim, como uma

sugestão para a escolha dos gêneros a serem trabalhados em sala de aula de acordo com as

necessidades que se busca desenvolver.

52

Para Marcuschi (2008), as tipologias textuais são sequências estruturais8 de qualquer

gênero, isto é, para todo gênero textual pode-se ter diversas tipologias inerentes aos gêneros,

estabelecendo, dessa maneira, a ideia de que todo gênero elege uma tipologia textual mais

frequente, mais característica. Sendo assim, os gêneros textuais são constituídos de tipologias

textuais. Levando em conta as reflexões de Marcuschi (2007), há, aproximadamente, seis

categorias de tipologias, cujas definições são expostas a seguir:

(TT1) – Narrar: capacidade de recriar a realidade, imaginando histórias e intrigas;

(TT2) – Relatar: capacidade de representar, por meio do discurso, acontecimentos

reais;

(TT3) – Argumentar: capacidade de defender determinada posição a respeito de um

assunto e de sustentar ou refutar argumentos;

(TT4) – Expor: capacidade de demonstrar conhecimentos adquiridos por meio de

pesquisa;

(TT5) – Descrever: capacidade de instruir ou prescrever conteúdos.

Ademais, tendo esclarecido a definição de tipologias textuais apresentadas por Dolz,

Noverraz, Schneuwly (2004) e Marcuschi (2007), passamos a nos concentrar nas tipologias da

ordem do argumentar e do expor, pois constituem as que interessam de modo especial ao

nosso estudo, tendo em vista as predisposições do CESP (SÃO PAULO, 2012) em relação ao

conteúdo que deve ser explorado no decorrer do 9º ano do Ensino Fundamental. Desse modo,

trataremos, a seguir, das tipologias argumentativa e expositiva.

1.7.1 Tipologia Argumentativa

Os gêneros textuais característicos da ordem do argumentar apresentam, em sua

estrutura, uma sequência argumentativa para a qual Bronckart (2006a) compõe um protótipo

abstrato constituído de quatro fases essenciais, quais sejam: 1ª fase: premissas ou constatações

iniciais; 2ª fase: argumentação; 3ª fase: contra-argumentação e; 4ª fase: conclusão. O autor, no

entanto, considera que esse protótipo é apenas um construto teórico, ou seja, um modelo

relativamente padronizado do discurso argumentativo sobre o qual o contexto e os

participantes da ação comunicativa mobilizam alterações estruturais a partir de decisões e de

intenções específicas.

8 “[...] é bom salientar que, embora os gêneros textuais não se caracterizem nem se definam por aspectos formais,

sejam eles estruturais ou linguísticos, e sim por aspectos sócio-comunicativos e funcionais, isso não quer dizer

que estejamos desprezando a forma. Pois é evidente [...] que em muitos casos são as formas que determinam o

gênero e, em outros tantos, serão as funções” (MARCUSCHI, 2007, p. 21).

53

Para falar de argumentação, optamos, antes, por relembrar os ensinamentos de

Aristóteles sobre a arte da Retórica, o primeiro registro de literatura didática sobre os

principais elementos argumentativos em um discurso. O filósofo explica que a Retórica se

ocupa do que é verossímil e passível de discussão e apresenta, em sua obra, uma

sistematização dos meios de persuasão, do estilo e da composição do discurso retórico, além

de fazer comentários sobre as emoções provocadas nos ouvintes (BRETON; GAUTHIER,

2001; CARVALHO, 2015).

Esses ensinamentos são divididos em três livros na Arte Retórica, definida por Ricoeur

(2005, p. 21) como “[...] a mais brilhante das tentativas de institucionalizar a retórica a partir

da Filosofia”. Aristóteles dividiu sua obra em três da seguinte maneira:

O livro I é o livro do emissor da mensagem, o livro do orador. Aí trata-se

principalmente da concepção dos argumentos, na medida em que eles

dependem do orador, de sua adaptação ao público. Tudo isso, de acordo com

os três gêneros reconhecidos de discurso (judiciário, deliberativo, epidítico).

O livro II é o livro do receptor da mensagem, o livro do público. Aí, são

focalizadas as emoções (paixões) e novamente os argumentos, mas somente

na medida em que são recebidos (e não concebidos, como dantes). O livro

III é o livro, por excelência, da mensagem: nele se enfocam a lexis ou

elocutio, isto é, as “figuras”, e também a taxis ou dispositio, a ordem das

partes do discurso ((BARTHES, in COHEN et alii, 1975, p. 156, grifos do

autor).

No empreendimento retórico aristotélico, de acordo com o pesquisador, essa ciência é

dividida em quatro fases representativas, a saber: a) inventio, que consiste na busca de

argumentos ou técnicas de persuasão por parte do orador; b) dispositio, que é a organização

do discurso a partir de uma ordenação interna dos argumentos, previamente feita pelo orador;

c) elocutio, que diz respeito ao momento da escrita do discurso argumentativo, quando o

orador pode fazer uso de figuras de estilo e, por último; d) actio, a proferição propriamente

dita, em que estão presentes importantes elementos, como a entonação da voz, o ritmo e a

gestualidade.

A partir de Aristóteles, a Retórica consagrou-se como a “arte de persuadir”, mas foi

um tanto depreciada em meados do século XIX devido ao seu rebuscamento excessivo

(BRETON; GAUTHIER, 2001; CARVALHO, 2015). Parte desse declínio também se deve ao

desenvolvimento da corrente descartiana no século XVII, que estimulava o questionamento de

pressupostos e a aferição de eventos, cuja existência só poderia ser respeitada com a

apresentação de provas concretas. Ademais, Reboul (2004) acrescenta que o positivismo e o

romantismo do século XIX também foram responsáveis pela depreciação da retórica, já que

54

essas correntes de pensamento prezavam pela verdade científica e pela sinceridade no

discurso.

No século XX, no entanto, Perelman e Olbrechts-Tyteca (2005 [1958]) renovaram a

concepção de Retórica com a publicação da obra Tratado da argumentação: a nova retórica.

Outro autor que merece ser lembrado é Toulmin (1958), principalmente pela obra Os usos do

argumento. Essas duas publicações foram notórias na construção de uma nova abordagem nos

estudos da argumentação, que, dentre outras características, é marcada pela concepção de um

auditório ativo, capaz de influenciar e avaliar o orador.

Há, ainda, os estudos de Koch (2011 [1984]) sobre a argumentação. As pesquisas da

autora fundamentaram-se, sobretudo, numa investigação acerca do ensino das teorias

argumentativas. Para a autora, a característica fundamental dos gêneros da ordem do

argumentar não é a sequência argumentativa em si, mas, sim, a argumentatividade, a partir da

qual o indivíduo “[...] tenta influir sobre o comportamento do outro ou fazer com que

compartilhe determinadas de suas opiniões” (KOCH, 1996, p. 19), sustentando, dessa forma,

toda a estrutura do discurso.

A todo texto, de certa forma, subjaz um discurso argumentativo que pode ser

ressaltado ou não, dependendo da intenção do locutor. Em alguns gêneros textuais, a

argumentação está explicitada na superfície linguística do texto, com uma estrutura assim

orientada por um jogo persuasivo, ao passo que, em outros gêneros, a argumentatividade pode

ser construída não pelos aspectos formais, mas pela intenção comunicativa do locutor e/ou

enunciador do texto. Essa visão pode ser encontrada em Fávero e Koch (1987):

Num continnum argumentativo, pode-se localizar textos dotados de maior ou

menor argumentatividade, a qual, porém, não é jamais inexistente: na

narrativa é feita a partir de um ponto de vista, na descrição, selecionam-se os

aspectos a serem representados de acordo com os adjetivos que se têm em

mente; a exposição de idéias envolve tomadas de posição (nunca se tem a

coisa em si, mas como ela é vista por alguém) e assim por diante.

(FÁVERO; KOCH, 1987, p. 7).

Segundo as autoras, não há texto que não carregue certo grau de argumentatividade.

Aos textos que atingem o grau máximo de argumentatividade, Fávero e Koch (1987) dá a

denominação de argumentativos stricto sensu.

Conforme Perelman e Olbrechts-Tyteca (2005 [1958]) é de extrema importância, no

discurso argumentativo, a valorização do consentimento do ouvinte. Para alcançar tal adesão,

é importante que o agente enunciador seja conhecedor das particularidades de seu público, a

fim de construir argumentos eficazes frente às características daqueles a quem se pretende

55

influenciar ou persuadir. Assim, a escolha pela melhor estratégia argumentativa apenas pode

ser efetivamente realizada com um prévio conhecimento do público em questão. Nesse ponto,

torna-se necessário destacar que:

É sobejamente conhecido o fato de que argumentação só é possível em razão

de existirem pontos de vista diferentes entre os interlocutores. Então, ao

interagirmos, se quisermos conseguir a adesão de nossos interlocutores,

precisaremos proceder a uma ação eficaz. Trata-se de um momento

significativo no jogo discursivo em que é preciso, antes de tudo, levar em

consideração a(s) reação(ões) do(s) outro(s) (AQUINO, 2015, p. 243).

Por isso, compactuamos com a ideia de Carvalho (2015) ao citar Perelman e

Olbrechts-Tyteca (2005 [1958], p. 50), que observam que “[...] o objetivo de toda

argumentação [...] é provocar ou aumentar a adesão dos espíritos às teses que se apresentam a

seu assentimento”. Dessa forma, destaca-se como principal função da argumentação a de

regular o conflito entre dois ou mais valores, em geral, opostos, às vistas de conquistar o

maior número de adeptos a um dos lados. É vencedor, portanto, em um discurso

argumentativo, aquele que conseguir persuadir a maior quantidade de ouvintes.

Os estudiosos propõem, em sua nova teoria, “[...] uma ruptura com a concepção da

razão e do raciocínio oriunda de Descartes” (PERELMAN-TYTECA, 2005 [1958], p. 1),

afirmando que cabe ao discurso argumentativo não apresentar evidências, mas, sim,

informações verossímeis, isto é, que parecem evidências, independentemente de sua

comprovação ser possível ou não. Cabe ao orador convencer o seu público, utilizando-se, para

isso, de técnicas discursivas específicas que “[...] se encontram em todos os níveis, tanto no da

discussão ao redor da mesa familiar como no debate num meio especializado” (PERELMAN-

TYTECA, 2005 [1958], p. 8).

Para tanto, os autores explicam que é preciso estabelecer um contexto propício à

argumentação, e isso se dá por meio do desenvolvimento de um percurso argumentativo que

parte da escolha de informações e vai até a apresentação delas. No primeiro momento, o

orador vale-se de dois processos para elaborar seus argumentos: a) de ligação, no qual a

estruturação do discurso se dá a partir de relações que aproximam ou valorizam elementos

diferentes e; b) de dissociação, em que são inseridas técnicas que promovem a ruptura ou a

desunião de elementos constituintes de um sistema de pensamento, noções que seriam as

peças mestras da opinião do ouvinte (PERELMAN-TYTECA, 2005 [1958], p. 215).

Para além disso, a Nova Retórica defende que tão importante quanto a escolha ou a

elaboração dos argumentos é a seleção de dados e, principalmente, a interpretação dessas

56

informações diante do auditório, o que se dá com a adequação da linguagem. A ordem dos

argumentos, por exemplo, é fundamental para o sucesso do discurso, já que uma configuração

adequada fortalece a argumentação e promove uma boa recepção por parte do público, sendo

imprescindível no processo persuasivo. Isso porque:

Nosso ponto de vista permite compreender que o matiz entre os termos

convencer e persuadir seja sempre impreciso e que, na prática, deva

permanecer assim. Pois, ao passo que as fronteiras entre a inteligência e a

vontade, entre a razão e o irracional, podem constituir um limite preciso, a

distinção entre os diversos auditórios é muito mais incerta, e isso ainda é

mais porque o modo como o orador imagina os auditórios é o resultado de

um esforço sempre suscetível de ser retomado. (PERELMAN-TYTECA,

2005 [1958], p. 33).

O estudo referente à linguagem e à argumentação se faz necessário em nosso caso,

visto que essa relação permite-nos estabelecer os pontos de ligação no decorrer do estudo dos

gêneros textuais argumentativos, garantindo a compreensão do papel do receptor da

mensagem ou do texto para o sucesso da situação comunicativa. Após o estudo da retórica

argumentativa proposta por Perelman-Tyteca, recorremos novamente ao pensamento

bakhtiniano, lembrando que a participação do ouvinte é ativa e igualmente responsável pelo

estabelecimento do sentido se comparada à função do produtor, haja vista que “[...] toda

compreensão é prenhe de resposta e, nessa ou naquela forma, gera-a obrigatoriamente: o

ouvinte se torna falante” (BAKHTIN, 2011 [1979], p. 271).

1.7.2 Tipologia Expositiva

À tipologia expositiva, também daremos enfoque especial, tendo em vista sua

importância para o nosso estudo. Compreendida como aquela em que há o uso da terceira

pessoa, a predominância de verbos impessoais e na forma do indicativo, além da recorrência

de conectores lógicos, analogias, ilustrações e registro formal, essa tipologia, destaca Meyer

(1985), é reconhecida por sua modalidade de compilação, normalmente a sequência ou

enumeração de informações, a causalidade e a comparação de problemas e soluções.

De acordo com Parejo (2011), a produção de textos expositivos é frequente no

ambiente escolar e importante para o desenvolvimento da competência leitora, mas nem

sempre há, em paralelo, o ensino efetivo ou explícito de suas particularidades.

Conforme Colomer e Camps (2002, p. 53), “[...] os textos expositivos apresentam uma

organização textual muito distinta daquela dos narrativos”, pois, se colocarmos em linhas

57

gerais, a exposição pode ser classificada, genericamente, como função que cumpre informar,

relatar ou descrever algo, mas sem que para isso haja uma estrutura previamente definida ou

estática. Os textos narrativos, ao contrário, contam uma história a partir de um modelo pré-

fixado que raramente apresenta grandes variações.

Observa-se, na obra de Meyer (1985), uma tentativa de classificação dos textos

expositivos em um sistema estrutural que, para além de limitá-lo a um arquétipo, serve para a

sua organização. Segundo o autor, na exposição, há uma ou mais ideias centrais e outras a

nível periférico. Em toda a sua extensão, há uma relação de subordinação de informações, o

que garante a sua distinção de outras tipologias que buscam relatar ou descrever dados, como

é o caso das listas.

Como destacado anteriormente, a produção de um texto expositivo está intimamente

relacionada à capacidade leitora. Para Silva (2010):

[...] o desenvolvimento da competência leitora realiza-se ao longo da

escolaridade para garantir o acesso à literacia plena, visando à integração do

indivíduo nas diferentes comunidades em que se insere socialmente e à

criação de hábitos de leitura que se mantenham ao longo da vida. Para

atingir objetivos tão ambiciosos, é fundamental que as várias

funcionalidades da leitura sejam tidas em consideração na formação de

crianças e jovens leitores. Na escola e fora dela, eles precisam utilizar social

e individualmente a leitura para fazer coisas, para se formar, para se

documentar e informar, para interagir ou, muito simplesmente, como forma

de fruição e de evasão. (SILVA et alii, 2010, p. 5).

Além da importância da capacidade leitora, a produção de um texto expositivo deve-

se, sobretudo, à necessidade de reunião de informações para a ordenação de ideias. A seleção

de dados para a exposição é fundamental, já que o principal objetivo dessa tipologia textual é

o de apresentar conceitos ou relatar fenômenos de forma que sejam perfeitamente

compreendidos pelo leitor. Para tanto, Adam (1992) apresenta uma sequência expositiva

simples a qual denominou grau zero, ou seja, a essência da exposição, compreendendo uma

enumeração hierarquizada que atribui propriedades ao objeto, a começar pela identificação ou

ancoragem e chegando à listagem ou aspectualização.

O autor pontua que essa sequência dificilmente acontece sozinha, isto é, quase nunca é

autônoma. Para conseguir alcançar os objetivos da exposição, geralmente, é preciso recorrer a

uma explicação interligada a uma descrição. Surge, então, a definição da sequência

expositiva-explicativa, composta por três principais elementos: um problema, uma resolução e

uma conclusão (ADAM, 1992). O autor nos alerta que quase nunca há um texto homogêneo,

mas, sim, elementos complexos, heterogêneos e sequenciais, nos quais normalmente se

58

reconhece a sequência expositivo-explicativa e, somente por isso, consegue-se classificá-los

como tais.

Para discorrermos sobre as características da ordem do expor, também nos valemos

das descrições dos tipos de discurso de Bronckart (2012 [1997]). Segundo o estudioso, o

universo expositivo é composto pelo que é implicado e pelo que é autônomo. No primeiro

caso, o que está implicado é relacionado a uma interação verbal, com a presença de turnos,

declarações, referências a objetos, espaços ou tempos, e dêiticos. Já no segundo caso, o que é

autônomo é relacionado a um discurso teórico ou monologado, no qual não há interação

verbal.

Um texto expositivo implicado e, portanto, interativo, faz uso de nomes próprios,

verbos, pronomes, adjetivos (na 1ª ou na 2ª pessoa do singular ou plural), anáforas nominais

etc., o que dá a ele a característica de uma verbalização densa. Um texto expositivo autônomo,

em geral, não apresenta o uso de nomes próprios ou pronomes de 2ª ou 3ª pessoa do singular

ou plural, isto é, não traz consigo características do discurso interativo, mas é carregado de

frases passivas e de anáforas pronominais e nominais, o que o torna sintagmaticamente denso.

Uma característica fundamental de qualquer texto é a linguagem clara e objetiva. Por

isso, um dos recursos mais recorrentes nos gêneros textuais da ordem do expor é a

enumeração de fatos, bem como as comparações e as analogias com efeito de contrastar

informações. Para Dolz e Schneuwly (2004), a estrutura padrão se resume em: a) Introdução,

b) Desenvolvimento e c) Conclusão. Cada parte estrutural carrega uma função específica

dentro do objetivo geral da exposição, a saber:

a) Introdução: contextualização e delimitação do tema a ser exposto;

b) Desenvolvimento: apresentação dos recursos característicos da exposição, a fim de

informar os fatos de forma satisfatória;

c) Conclusão: síntese do tema.

Cabe à tipologia expositiva a função primordial de informar. Para Dolz e Schneuwly

(2004), é dentro da ordem do expor que ocorre a transmissão de conhecimento pela exposição

discursiva. A tipologia expositiva pode ser desenvolvida por meio dos seguintes gêneros da

ordem do expor: seminário, conferência, palestra, artigo enciclopédico, resenha etc.

Com base nos princípios teóricos discutidos até aqui, passamos ao segundo capítulo do

nosso estudo, no qual trataremos, sobretudo, da contextualização do sistema apostilado e dos

caminhos que levaram o Governo do Estado de São Paulo a criar a atual configuração do

Caderno do Aluno.

59

CAPÍTULO 2

2 O SISTEMA APOSTILADO NO AMBIENTE ESCOLAR

Neste capítulo, delinearemos um quadro geral de como se iniciou e se estabeleceu a

adoção das apostilas como material de suporte pedagógico, isto é, como material de apoio nas

salas de aula das escolas brasileiras. Para tanto, antes, consideramos fundamental apresentar o

sistema de apostilado e justificar sua aplicação.

O Governo do Estado de São Paulo não foi pioneiro na adoção do apostilado como

parte do material utilizado no desenvolvimento das aulas. A importância desse material vem

se consolidando no Brasil desde a década de 30, quando as primeiras instituições começaram

a fazer uso dessa tradição textual, a saber, o Instituto Radiotécnico Monitor e o Instituto

Nacional Brasileiro. No estado de São Paulo, sua introdução ocorreu com o plano de melhoria

do sistema educacional público pela Secretaria da Educação, o Programa São Paulo Faz

Escola, do qual o apostilado Caderno do Aluno de Língua Portuguesa (CALP) faz parte.

Reservamos, também, uma seção para uma apresentação geral dos Parâmetros

Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998) –, contextualizando sua elaboração e sua publicação.

Discorreremos a respeito das principais recomendações para o ensino da Língua Portuguesa,

sobre as mudanças na concepção acerca do que pode ser prioritário na abordagem em sala de

aula, o caráter social da língua e a necessidade de contato com os gêneros textuais como

mecanismos de trocas linguísticas e de comunicação ativa.

Em seguida, apresentaremos as orientações encontradas no Currículo do Estado de São

Paulo (CESP), publicado pela primeira vez em 2008 e revisado em 2012. Enfatizaremos o

fato de que, tomando por base o CESP (SÃO PAULO, 2012), as práticas de leitura e escrita

estão relacionadas não apenas ao conteúdo de Língua Portuguesa, mas também aos conteúdos

de todas as outras áreas de conhecimento; por isso, devem ser tratadas como itens prioritários

durante o processo escolar. Reproduziremos, ainda, o quadro com as recomendações

específicas de conteúdos que o CESP apresenta para as aulas no decorrer do 9º ano do Ensino

Fundamental, o foco do nosso trabalho. Para finalizar o capítulo, reservamos uma seção à

análise da configuração geral do CALP, dando atenção especial à infraestrutura do apostilado

concernente às práticas do 9º ano, inclusive descrevendo a organização das situações de

aprendizagem que compõem os dois volumes.

60

Por fim, exporemos brevemente a nova Base Nacional Comum Curricular, que trará

mudanças significativas nos currículos brasileiros, tendo que ser (re)escritos e, por

conseguinte, o CALP deverá ser reorganizado, bem como os gêneros textuais.

2.1 Percurso histórico do sistema de apostilado no Brasil

Em 1939, o Instituto Radiotécnico Monitor inaugurou, no Brasil, a apostila como

material didático. O Instituto foi criado com o objetivo de oferecer cursos profissionalizantes

de ensino a distância, na época chamados cursos por correspondência. Seu fundador, o

húngaro Nicolás Goldberger, iniciou a empresa com um curso de construção de um aparelho

de rádio caseiro, elaborado a partir de um composto de peças e apostilas enviadas pelo

correio. Em seguida, a experiência do ensino por correspondência foi seguida pelo Instituto

Universal Brasileiro, fundado em 1941 por um ex-sócio do Instituto Monitor (SILVA, 2013).

Nesse momento, o Brasil passou por fortes mudanças políticas e sociais, percorrendo o

período que ficou conhecido como Primeira República, entre os anos de 1889 e 1930, com

a “política do café-com-leite” (alternância de paulistas e mineiros na presidência). Por fim, o

gaúcho Getúlio Vargas articulou, com o apoio de militares que pretendiam alterar o panorama

político, a Revolução de 1930.

A década de 30 foi marcada por regimes totalitários não somente no Brasil, mas em

muitos países europeus, como Espanha (franquismo), Portugal (salazarismo), Itália (fascismo)

e Alemanha (nazismo). O Brasil sofria a influência econômica dessas potências e, para se

transformar em um país industrializado, precisou, portanto, adaptar sua educação para formar

a nova classe operária (MINOZZI JR., 2007; SILVA, 2013).

A Era Vargas (1930-1945) promoveu uma série de reformas educacionais em nível

nacional. A primeira delas ocorreu em 1931, sob o comando do Ministro da Educação e

Saúde, Francisco Campos, de quem recebeu o nome. A Reforma Francisco Campos estipulou,

entre outras coisas, a criação do Conselho Nacional de Educação e o reconhecimento oficial

do ensino secundário e comercial, destinado à formação de trabalhadores para todos os

grandes setores da atividade nacional, construindo, no seu espírito, um sistema de hábitos,

atitudes e comportamentos (ZOTTI, 2006).

Segundo Zotti (2006), durante o Estado Novo (1937-1945) de Getúlio Vargas, o

ensino foi normatizado a partir de 1942, com a promulgação da Reforma Capanema, sob o

nome de Leis Orgânicas do Ensino, que estruturou o ensino industrial, reformou o ensino

comercial, criou o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) e trouxe mudanças

61

no ensino secundário. O Ministro da Educação e Saúde Pública, Gustavo Capanema,

extinguiu o curso complementar e organizou o secundário em dois ciclos: o ginasial, com

quatro anos, e o colegial, com três anos. Em 1946, sob a responsabilidade do Ministro da

Educação, Raul Leitão da Cunha, a Lei Orgânica do Ensino Primário sistematizou esse nível

de ensino com procedimentos gerais (BRASIL, 1946), projetou o ensino supletivo primário

(para adolescentes e adultos), com duração de dois anos, e organizou o ensino normal e

agrícola, instituindo o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC).

Em suma, o governo autoritário de Getúlio Vargas e seu projeto político ideológico

fortaleceram não só a economia brasileira, mas também o desequilíbrio entre a educação

preparatória, convencional e elitizada, que possibilitava ingressantes no ensino superior, e o

ensino técnico-profissionalizante, que se destinava às classes sociais menos prestigiadas,

formando a classe operária (ZOTTI, 2006).

O Instituto Monitor e o Instituto Universal Brasileiro destacaram-se na preparação de

mão de obra para os setores de indústria e serviços. Desde o seu surgimento no Brasil, o

apostilado foi reconhecido pela abordagem sintética dos conteúdos, pois, como era

amplamente remetido a todo território nacional, não havia espaço para discussão, reflexão e

troca entre discentes e docentes. A construção do conhecimento, portanto, acontecia de

maneira receptiva por parte dos alunos, que absorviam o que era resumidamente redigido nas

apostilas. Foi a partir da década de 50 que o apostilado passou a ser aplicado nas salas de aula

presenciais, em princípio, como material para cursos pré-vestibulares e, posteriormente, nas

escolas particulares (CÁRIA; ANDRADE, 2011; SILVA, 2013; CARVALHO, 2015).

Após a Reforma Francisco Campos, que estabeleceu o Estatuto das Universidades

Brasileiras e reformou a Universidade do Rio de Janeiro, houve a fundação da Universidade

de São Paulo (1934) e da Universidade do Distrito Federal (1935) (FÁVERO, 2006). No final

da década de 40 e ao longo da década de 50, ocorreram as federalizações, estendendo-se pelas

décadas de 60 e 70 o processo de criação das universidades federais de modo geral nas

capitais dos estados federados (SAVIANI, 2010). Com o alargamento das instituições de

Ensino Superior, sua demanda aumentou exponencialmente e, em 1950, as vagas já não eram

suficientes. De acordo com Whitaker (2010), foi esse fato que impulsionou a criação de

cursos para preparação de candidatos ao Ensino Superior.

Whitaker (2010) afirma que, naquela época, devido à enorme competitividade por

vagas nas universidades públicas, o Curso Anglo-Latino e o Curso Objetivo despontaram

como os principais cursos preparatórios para vestibulares. O Curso Anglo, dirigido por Simão

Faiguenboim, Emílio Gabriades e Abram Bloch, desenvolveu os primeiros fascículos

62

teóricos, os primeiros simulados e o “O Anglo Resolve”, publicação com resoluções e

comentários das questões dos principais exames vestibulares. O Curso Objetivo, por sua vez,

surgiu em 1965, idealizado como preparatório e com material específico para as faculdades de

Medicina de São Paulo elaborado pelos estudantes de Medicina João Carlos Di Genio e

Dráuzio Varella, e pelos médicos Roger Patti e Tadasi Itto.

Na década de 70, foi criado o Colégio Objetivo, com currículo de Ensino Médio e a

ideologia de operar de modo flexível e dinâmico (NUNES, 2012; CARVALHO, 2015).

Assim, o apostilado passou a ser adotado também nas escolas entre essa década e a seguinte.

A partir do momento em que colégios particulares, cursos pré-vestibulares e cursos

universitários passaram a fazer uso de apostilas como material didático, o apostilado se

fortaleceu como sistema de ensino, uma vez que havia sido comprovada sua eficiência nos

exames vestibulares dos alunos que se prepararam por meio dessa metodologia (SILVA,

2013).

Até o advento da Constituição Federal de 1988, prevaleceu, na educação brasileira, o

modelo napoleônico, caracterizado pela forte presença do Estado na organização e na

regulação educacional. A partir da década de 90, num processo em curso até os dias atuais,

emergiu uma mudança caracterizada pela diversificação das formas de organização das

instituições de ensino, com destaque para a globalização e a revolução tecnológica da Internet

(BEZERRA, 2008; SILVA, 2013). Se a sociedade precisou se adaptar às novas dimensões de

espaço-tempo, cada vez mais encurtadas, com as escolas não foi diferente. Os novos

paradigmas possibilitaram novas parcerias público-privadas, revertendo parte da tendência de

se priorizar as instituições particulares, como vinha acontecendo desde a decisão ditatorial

pela Lei 5.540, em grande parte revogada pela Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que

vinculou a educação escolar ao mundo do trabalho e à prática social.

Bezerra (2008) e Silva (2013) mencionam que, em especial no estado de São Paulo,

estabeleceu-se uma relação entre os setores privado e público, propiciando a intervenção de

empresas particulares em determinados assuntos de responsabilidade do governo. O setor

privado, assim, subsidiou a compra de sistemas de ensino estruturados, compostos pelo

fornecimento de apostilas e materiais didáticos para alunos e professores, a capacitação e o

treinamento dos professores, além do acompanhamento pedagógico na utilização do material.

A ampliação dessas práticas à rede pública se deu em razão, sobretudo, do

posicionamento de editoras de capital privado que expandiram sua produção de apostilas à

rede pública de ensino, como as editoras Saraiva e Moderna (VIALLI, 2011; SILVA, 2013).

A seguir, daremos um breve panorama do apostilado na rede educacional pública do estado de

63

São Paulo do início dos anos 2000 até a atualidade.

2.2 A Aplicação do Apostilado na Rede Pública Paulista

A Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, sob a orientação de Maria Helena

Guimarães de Castro, apresentou, em 2008, uma proposta que visava possibilitar à rede

estadual uma base comum de conhecimentos para o processo de ensino-aprendizagem. Esse

documento, intitulado Proposta Curricular do Estado de São Paulo – em 2010, Currículo do

Estado de São Paulo, do qual faz parte o Currículo de Língua Portuguesa –, estabeleceu

diretrizes para desenvolver uma prática educativa que objetivasse o enfrentamento dos

desafios sociais, culturais e profissionais do mundo contemporâneo (SILVA, 2013). A partir

de então, foi criado o Programa São Paulo Faz Escola, responsável pela instituição do sistema

apostilado de ensino nas escolas públicas estaduais, com a recuperação das condições sociais

e históricas da utilização de apostilas como material didático.

Sabe-se que, de modo geral, a fundamentação teórica oferecida ao professor é escassa.

Especificamente na área de Língua Portuguesa, espera-se que as aulas auxiliem a formação de

leitores e escritores, cidadãos conscientes de seu papel social, sobretudo no que se refere ao

poder de interpretação de eventos, à tomada de posição e à criticidade.

Além disso, notava-se uma demanda por qualificar o rendimento de grande parte dos

alunos que vinham apresentando dificuldades em exames externos, como o Sistema de

Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (SARESP), de 1996; o Sistema de

Avaliação da Educação Básica (Saeb), instituído pela Portaria nº 931, de 21 de março de

2005; o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), aplicado desde 1998 para avaliar a

qualidade da educação nacional, e, posteriormente, em 2009, como substituição aos antigos

exames vestibulares; e o Programme for International Student Assessment – Programa

Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa), que, no Brasil, é coordenado pelo Instituto

Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) (SILVA, 2013).

Assim, a rede estadual assumiu a responsabilidade de “[...] cumprir seu dever de

garantir a todos uma base comum de conhecimentos e competências para que nossas escolas

funcionem como uma rede” (SÃO PAULO, 2012, p. 9), desenvolvendo conteúdos mínimos e

prescrevendo a grade de competências e habilidades a serem desenvolvidas no Ensino

Fundamental e no Ensino Médio em todo o estado de São Paulo.

A fim de implementar um currículo unificado, foram instituídos, ainda em 2008, o

Caderno do Gestor, direcionado à equipe gestora (diretor, vice-diretor, coordenador,

64

supervisor), e o Caderno do Professor, com instruções às disciplinas a serem ministradas

durante o período letivo, atividades e orientações sobre como desenvolvê-las com os

discentes.

Para que o Programa São Paulo Faz Escola fosse realizado com eficiência, foi

necessário, num primeiro momento, recuperar os conteúdos já trabalhados nas séries. Por isso,

nos primeiros 42 dias letivos de 2008, o Jornal do Aluno São Paulo Faz Escola, especialmente

preparado para ser distribuído aos alunos, foi utilizado em sala de aula com o objetivo de

resgatar os conteúdos não assimilados. O jornal continha atividades a serem desenvolvidas em

todas as disciplinas. Aos professores, foi distribuída a Revista do Professor, com orientações

sobre as atividades do jornal dos alunos (SILVA, 2013).

Após a recuperação dos conteúdos, aos docentes da rede pública, foram entregues a

Proposta Curricular, para que tomassem ciência da mudança de paradigma, e o Caderno do

Professor, organizado bimestralmente e por disciplina, com o currículo a ser cumprido

durante o período letivo, com sugestões de planos de aula, atividades a serem desenvolvidas,

avaliações e orientações didáticas.

No ano seguinte, 2009, a partir de relatos de professores que não conseguiam conduzir

atividades pela escassez de material, foi distribuído aos alunos da rede pública estadual de

ensino, o Caderno do Aluno, com o mesmo conteúdo, exceto as sugestões didáticas. Somente

em 2010, após a consolidação da Proposta curricular, o Currículo do Estado de São Paulo foi

entregue aos professores.

O sistema apostilado remetido, então, às escolas agiu em duas frentes: o Caderno do

Professor e o Caderno do Aluno. Este último objetivou alcançar todos os alunos dos ensinos

Fundamental e Médio da rede pública – estimados em 3,3 milhões.

O próximo passo foi a incorporação da Proposta Curricular ao SARESP por meio da

implantação do Programa de Qualidade da Escola, visando orientar gestores e professores do

ensino básico no monitoramento das políticas voltadas para a melhoria da qualidade

educacional a partir da avaliação de 2008 dos alunos do 3º, 5º, 7º e 9º anos do Ensino

Fundamental e da 3ª série do Ensino Médio. Para ilustrar essa questão, Silva (2013) afirma

que, a partir do Programa de Qualidade da Escola,

[...] os resultados atingidos no SARESP foram combinados aos índices de

repetência e evasão de cada escola para criar o Índice de Desenvolvimento

da Educação do Estado de São Paulo (IDESP), um indicador de qualidade

das séries iniciais e finais do EF e do EM, que tem como objetivo fornecer

um diagnóstico de cada segmento da escola, mostrando os pontos a serem

melhorados, e propor uma meta anual a ser atingida, calculada com base no

65

desempenho aferido no SARESP e no fluxo escolar. (SILVA, 2013.p. 27).

O Caderno do Aluno foi remetido aos discentes, organizado por disciplina, de acordo

com a série, ano e bimestre de cada um. No apostilado, havia Situações de Aprendizagem

para orientar o ensino e a aprendizagem dos alunos, como mencionado anteriormente. Em

2010, a Proposta Curricular foi reformulada, mantendo uma base comum de conhecimentos,

habilidades e competências dos gestores e professores, sob o novo título de Currículo do

Estado de São Paulo, organizado em quatro volumes, cada um direcionado a uma área do

conhecimento, a saber, Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, Matemática e suas

Tecnologias, Ciências Humanas e suas Tecnologias e Ciências da Natureza e suas

Tecnologias.

Assim, o volume de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias aborda a orientação

técnica no Ensino Fundamental (Ciclo II) e no Médio nas disciplinas de Língua Portuguesa,

Língua Estrangeira Moderna, Educação Física e Arte. O Currículo de Língua Portuguesa tem

por objetivo desenvolver as linguagens por meio do estudo dos conteúdos historicamente

construídos, sendo subdividido em: a) o ensino de Língua Portuguesa: breve histórico; b)

fundamentos para o ensino de Língua Portuguesa – apresentação da concepção da disciplina e

os fundamentos teóricos que sustentam esse ponto de vista; c) Língua Portuguesa para o

Ensino Fundamental (Ciclo II) e o Ensino Médio, que organiza os conteúdos básicos para

esses níveis, estabelece uma metodologia de ensino-aprendizagem dos conteúdos básicos,

fornece subsídios para a implantação do currículo proposto e organiza as grades curriculares

(série/ano por bimestre); d) quadro de conteúdos e habilidades em Língua Portuguesa, que,

como o próprio nome sugere, esquematiza conteúdos e habilidades a serem desenvolvidos por

série (SÃO PAULO, 2012; SILVA, 2013).

Em 2012, a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo publicou atualizações do

CESP. Com a nova edição, a Secretaria expressou a expectativa de que as orientações

didático-pedagógicas nele contidas contribuíssem para que se efetivassem situações de

aprendizagem em cada disciplina integrante do Ensino Fundamental e do Ensino Médio nas

escolas da rede pública estadual. Entretanto, a normatização instituída pelo documento ainda

tem causado grandes polêmicas sobre sua efetivação em sala de aula.

Apesar das visíveis mudanças, o Caderno do Aluno e o Caderno do Professor ainda

apresentam problemas, o que tem acarretado a emissão de erratas e o recolhimento de

exemplares. Um dos entraves é a falta de autonomia do docente, assim como da comunidade,

que congrega diversidades e multiculturalismos. Paralelamente a isso, a sistematização de

66

conteúdos mínimos e a definição de atividades nos apostilados qualificam a educação e a

conectam à avaliação não somente do aluno, mas da própria escola e da equipe de professores

que participam mais ativamente de todos os processos de ensino-aprendizagem.

2.3 Parâmetros Curriculares Nacionais

As décadas de 80 e de 90 foram marcadas, no Brasil, pela busca da redemocratização e

de revisão dos direitos sociais após a queda do regime militar (1964-1985). Na educação,

houve uma série de movimentos estudantis e o surgimento de entidades representativas que

promoveram debates sobre as questões educacionais e sobre as políticas públicas para a

educação. Além disso, houve o estabelecimento de uma nova Constituição, em 1988, a

criação do Programa Nacional de Alfabetização e Cidadania (PNAC), em 1990, buscando a

valorização da carreira docente e o combate ao analfabetismo e a instauração do pacto

federativo que previa a gestão do Ensino Fundamental como prioridade de ordem estadual.

Nesse cenário, foram disseminados os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN),

documento distribuído na rede pública de ensino em 1997, como base para uma reforma

educacional. De acordo com as observações de Falleiros (2005), a elaboração dos PCN foi

orientada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, instituída em 1996, como

recurso para descentralização e autonomia das escolas, exigindo, dessa forma, o

fortalecimento das gestões educacionais. Os PCN foram criados com o objetivo principal de

nortear o trabalho docente em relação aos conteúdos e às práticas educacionais mais efetivas.

A pesquisadora também explica que os PCN foram estabelecidos como sugestões de

caráter não obrigatório e ressalta que:

Situando-se historicamente no contexto de ampliação da participação

política no país, o MEC delimitou, em meados dos anos 1990, os PCN como

um conjunto de orientações e recomendações para apoiar o trabalho dos

professores na implantação da reforma curricular (FALLEIROS, 2005,

p. 218).

Em nossa pesquisa, interessam, sobretudo, os Parâmetros dedicados à área de Língua

Portuguesa do terceiro e do quarto ciclo do Ensino Fundamental, publicados em 1998,

especialmente em relação às orientações quanto ao estudo dos gêneros textuais a serem

estudados durante esse período da vida escolar.

Ao ler o documento, constatamos que, no que tange ao ensino da língua com base em

gêneros textuais, os PCN (BRASIL, 1998) propõem que as práticas de leitura e de escrita

67

devem ser consideradas práticas sociais, de modo que confira ao aluno a capacidade de

planejar suas construções comunicativas, tomando a linguagem como uma ferramenta de

formação cidadã.

Nos Quadros 3 e 4, a seguir, reproduzimos os dados dispostos nos PCN (BRASIL,

1998) a respeito dos gêneros que devem ser idealmente privilegiados durante o percurso

escolar dos alunos da rede pública de ensino, organizados e selecionados de acordo com os

objetivos principais defendidos no documento para a didatização dos gêneros textuais. No

Quadro 3, encontram-se os gêneros privilegiados para a prática de escuta e de leitura de texto;

no Quadro 4, os gêneros selecionados para a prática de produção de textos.

QUADRO 3 – Gêneros sugeridos nos PCN para a prática de escuta e leitura de textos

GÊNEROS PRIVILEGIADOS PARA A PRÁTICA DE ESCUTA E LEITURA DE TEXTOS

LINGUAGEM ORAL LINGUAGEM ESCRITA

LITERÁRIOS

. cordel, causos e similares . texto dramático . canção

LITERÁRIOS

. conto

. novela

. romance

. crônica

. poema

. texto dramático

DE IMPRENSA

. comentário radiofônico . entrevista . debate . depoimento

DE IMPRENSA

. notícia

. editorial

. artigo

. reportagem

. carta do leitor

. entrevista

. charge e tira

DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA

. exposição

. seminário

. debate

. palestra DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA

. verbete enciclopédico (nota/artigo) . relatório de experiência . didático (textos, enunciados de questões) . artigo

PUBLICIDADE . propaganda PUBLICIDADE . propaganda

Fonte: Adaptado dos PCN (BRASIL, 1998, p. 54).

68

QUADRO 4 – Gêneros sugeridos nos PCN para a prática de produção de textos

GÊNEROS PRIVILEGIADOS PARA A PRÁTICA DE TEXTOS ORAIS E ESCRITOS

LINGUAGEM ORAL LINGUAGEM ESCRITA

LITERÁRIOS

. canção

. textos dramáticos

LITERÁRIOS

. crônica

. conto

. poema

DE IMPRENSA

. notícia

. entrevista

. debate

. depoimento

DE IMPRENSA

. notícia

. artigo

. carta do leitor

. entrevista

DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA

. exposição . seminário . debate

DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA

. relatório de experiência . esquema e resumo de artigos ou verbetes de enciclopédia

Fonte: Adaptado dos PCN (BRASIL, 1998, p. 57).

Como pode ser observado nos quadros acima, os PCN não apontam de forma

prescritiva os conteúdos que devem ser trabalhados, como faz o CESP (SÃO PAULO, 2012)

conforme veremos a seguir, no qual os temas são detalhados e classificados bimestre por

bimestre. Nos PCN (BRASIL, 1998), distintamente, as recomendações são estabelecidas de

uma forma mais generalizada, abrangendo todo o conteúdo previsto para o Ensino

Fundamental, ou seja, da 5ª a 8ª série ou do 6º ao 9º ano.

No documento para o ensino da Língua Portuguesa, há uma discussão sobre o lugar

ocupado pela gramática nessa nova visão educacional defendida pelos PCN. No que diz

respeito ao papel da gramática, o documento afirma que os aspectos gramaticais carregam sua

importância e não podem ser deixados de lado, uma vez que:

[...] não se podem desprezar as possibilidades que a reflexão linguística

apresenta para o desenvolvimento dos processos mentais do sujeito [...] de

formular explicações para explicitar as regularidades dos dados que se

observam a partir do conhecimento gramatical implícito (BRASIL, 1998,

p. 78).

No entanto, não deixam de pontuar que “[...] quando se toma o texto como unidade de

ensino, ainda que se considere a dimensão gramatical [...] os textos submetem-se às

regularidades linguísticas dos gêneros em que se organizam e às especificidades de suas

condições de produção” (BRASIL, 1998, p. 78).

A partir disso, os PCN reforçam a importância de se estudar as construções textuais,

tendo-se em vista as dimensões pragmática e semântica da linguagem por serem estas

69

dimensões indissociáveis da prática discursiva e, portanto, dos processos comunicativos

sociais.

Dentre alguns estudiosos do tema, Virmond (2004) se utilizou da influência

interacionista nos PCN para elaborar sua dissertação, na qual busca explicar de que forma o

documento reflete os pensamentos bakthinianos na definição dos gêneros textuais como

objeto de estudo. A autora identifica nos PCN uma tentativa de discutir o funcionamento da

linguagem, mas observa que as pesquisas de Bakhtin abordam os gêneros de forma teórica,

enquanto os PCN buscaram tratá-los de forma metodológica, com aplicações práticas.

Em relação a esse caráter metodológico, os PCN indicam que:

[...] a grande diversidade de gêneros, praticamente ilimitada, impede que a

escola trate todos eles como objeto de ensino; assim, uma seleção é

necessária. Neste documento, foram priorizados aqueles cujo domínio é

fundamental à efetiva participação social. [...] No entanto, não se deve

considerar a relação apresentada como exaustiva. Ao contrário, em função

do projeto da escola, do trabalho em desenvolvimento e das necessidades

específicas do grupo de alunos, outras escolhas poderão ser feitas. (BRASIL,

1998, p. 53).

Os PCN também apresentam quadros com as indicações de gêneros para a prática de

escuta e leitura e com as modalidades privilegiadas na prática de produção de texto. Após

indicar os gêneros textuais que devem ser enfatizados no ensino da Língua Portuguesa durante

o Ensino Fundamental, os PCN destacam que “[...] tal organização exige que a escola tenha

claro o que pode esperar do aluno em cada momento e quais aspectos do conteúdo devem ser

privilegiados em cada etapa” (BRASIL, 1998, p. 66), acrescentando que “[...] a frequentação

a diferentes textos de diferentes gêneros é essencial para que o aluno construa os diversos

conceitos e procedimentos envolvidos na recepção e produção de cada um deles.” (BRASIL,

1998, p. 66).

Dessa forma, fica evidente a orientação de que o conteúdo em relação aos gêneros seja

variado e amplo, de modo a proporcionar um aprendizado que possibilite o desenvolvimento

linguístico dos alunos. Ademais, é necessário, ainda de acordo com os Parâmetros, que os

assuntos sejam divididos entre as várias etapas do percurso escolar, de maneira que os gêneros

sejam estudados com maior cuidado e ênfase conforme o ciclo pedagógico. A partir dessas

recomendações, foi elaborado o CESP (SÃO PAULO, 2012), sobre o qual discorreremos.

70

2.4 Currículo do Estado de São Paulo

O Currículo do Estado de São Paulo (CESP), como uma proposta curricular, foi

produzido em 2008 pela Secretaria Estadual de Educação de São Paulo. Trata-se de um

documento composto de orientações práticas para dar suporte ao trabalho realizado nas salas

de aula da rede pública para o Ensino Fundamental e o Ensino Médio, com o objetivo de

aumentar o rendimento dos alunos e garantir a qualidade em seu processo de aprendizagem.

Após uma edição atualizada, publicada em 2012, o documento enfatiza o fato de que

as práticas de leitura e escrita estão relacionadas não apenas ao conteúdo de Língua

Portuguesa, mas também de todas as outras áreas de conhecimento e, por isso, devem ser

manuseadas como itens prioritários durante o processo escolar. O CESP (SÃO PAULO,

2012) também aponta que o conhecimento adquirido em sala de aula deve se estender à vida

cotidiana, deixando de ser um apanhado de matérias de base puramente acadêmica para ser

ferramenta na mobilização da cultura, conforme se pode observar na citação a seguir:

O conhecimento tomado como instrumento, mobilizado em competências,

reforça o sentido cultural da aprendizagem. Tomado como valor de conteúdo

lúdico, de caráter ético ou de fruição estética, numa escola de prática cultural

ativa, o conhecimento torna-se um prazer que pode ser aprendido ao se

aprender a aprender. [...] Quando, no projeto pedagógico da escola, a

cidadania cultural é uma de suas prioridades, o currículo é a referência para

ampliar, localizar e contextualizar os conhecimentos acumulados pela

humanidade ao longo do tempo. (SÃO PAULO, 2012, p. 13-14).

Assim, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, de 1996, apresenta a finalidade da

educação como, para além do alcance de bons resultados em indicadores ou exames, “[...] o

pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua

qualificação para o trabalho” (BRASIL, 1996, p. 1). A partir dessa noção, consideramos que o

desenvolvimento das aulas proposto pelo CESP se atém ao princípio de que a educação

idealmente concebida pauta-se no crescimento pessoal do aluno como cidadão.

Levando em conta a importância do conhecimento das práticas de leitura e de escrita

para o sucesso no estudo não apenas da Língua Portuguesa, mas de todas as outras disciplinas,

o CESP apresenta recomendações que se referem tanto ao ensino da gramática, quanto ao

desenvolvimento das habilidades linguísticas como um todo. No CESP, encontra-se

novamente apoio à teoria interacionista, visto que, segundo o documento:

71

[...] o desenvolvimento da competência linguística do aluno, nessa

perspectiva, não está pautado na exclusividade do domínio técnico de uso da

língua legitimado pela norma-padrão, mas, principalmente, no domínio da

competência performativa [...] ou seja, a competência comunicativa vista

pelo prisma da referência do valor social e simbólico da atividade linguística

no âmbito dos inúmeros discursos concorrentes. (SÃO PAULO, 2012, p.

17).

A ênfase dada pelo CESP ao fato de que a compreensão da leitura e da escrita de

forma satisfatória é fundamental para a aprendizagem dos diversos conteúdos curriculares,

bem como para a realização efetiva de uma construção cidadã, é evidenciada ao longo do

documento. Para que isso ocorra, destaca-se que é necessário compreender o texto como a

chave do processo de ensino e de aprendizagem. Dessa forma, dominar a linguagem e,

consequentemente, as práticas comunicativas é um objetivo indissociável do conhecimento

dos textos em suas mais diversas expressões, possibilitando interpretação, seleção e

construção de discursos de maneira adequada aos contextos sociais particulares.

Em relação aos conteúdos e habilidades previstos no CESP (SÃO PAULO, 2012) para

o 9º ano do Ensino Fundamental, reproduzimos no Quadro 5 as propostas do Governo do

estado para o programa de aula, incluindo os conteúdos sugeridos e as habilidades que devem

ser idealmente desenvolvidas:

72

QUADRO 5 – Conteúdos e habilidades previstas para o 9º ano do Ensino Fundamental pelo CESP

8ª SÉRIE/9º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL

CONTEÚDOS HABILIDADES

BIM

ES

TR

E

Conteúdos gerais Traços característicos de textos argumentativos Traços característicos de textos expositivos Estudos de gêneros da tipologia argumentativa Estudos de gêneros da tipologia expositiva Argumentar e expor: semelhanças e diferenças Estudos linguísticos: • Marcas dêiticas (pronomes pessoais) • Pontuação • Elementos coesivos (preposição e conectivos) • Concordâncias nominal e verbal • Questões ortográficas • Pronome relativo • Adequação vocabular • Período simples • Crase Variedades linguísticas Conteúdos de leitura, escrita e oralidade Leitura, produção e escuta de textos argumentativos e expositivos em diferentes situações de comunicação Interpretação de textos literário e não literário • Leitura em voz alta • Inferência • Coerência • Paragrafação • Etapas de elaboração e revisão da escrita • Elaboração de fichas Apresentação oral Roda de conversa

Espera-se que, tendo como referência principal as tipologias argumentativa e expositiva, em situações de aprendizagem orientadas por projetos de leitura e escrita e centradas em debate regrado, textos de opinião, artigo de divulgação científica e outros gêneros dessas tipologias, os estudantes desenvolvam as seguintes habilidades: • Ler e interpretar textos argumentativos, inferindo seus traços característicos • Analisar textos argumentativos e construir quadros-síntese • Analisar a norma-padrão em funcionamento no texto • Debater oralmente sobre temas variados, selecionando argumentos coerentes para a defesa de um dado ponto de vista • Identificar tipos de argumentos em textos de opinião • Produzir resenhas utilizando os conhecimentos adquiridos sobre textos argumentativos • Analisar temas diversos, selecionando argumentos que justifiquem pontos de vista divergentes • Fruir esteticamente objetos culturais • Saber revisar textos, reconhecendo a importância das questões linguísticas para a organização coerente de ideias e argumentos

73

BIM

ES

TR

E

Conteúdos gerais Estudo de gêneros textuais da tipologia argumentativa Estudo de gêneros textuais da tipologia expositiva Gênero textual artigo de opinião Gênero textual carta do leitor Estudos linguísticos: • Pontuação • Figuras de linguagem • Colocação pronominal • Regências verbal e nominal • Funções da linguagem • Período composto por coordenação • Articuladores sintáticos argumentativos Variedades linguísticas Conteúdo de leitura, escrita e oralidade Leitura, produção e escuta de artigo de opinião, carta do leitor e outros gêneros em diferentes situações de comunicação • Formulação de hipótese • Inferência • Interpretação de textos literários e não literários • Informatividade • Etapas de elaboração e revisão da escrita Roda de conversa

Espera-se que, tendo como referência principal as tipologias argumentativa e expositiva, em situações de aprendizagem orientadas por projetos de leitura e escrita e centradas em debate regrado, textos de opinião, artigo de divulgação científica e outros gêneros dessas tipologias, os estudantes desenvolvam as seguintes habilidades: • Ler e interpretar textos expositivos e argumentativos, inferindo seus traços característicos • Selecionar informações de acordo com os objetivos ou intencionalidades da situação comunicativa • Identificar, escolher e classificar argumentos que sejam a favor ou contrários à defesa de um ponto de vista • Analisar imagens do ponto de vista de seu caráter político • Analisar a norma-padrão em funcionamento no texto • Compreender, identificar e utilizar os mecanismos de coerência e coesão no texto • Construir parágrafos argumentativos de acordo com o contexto da situação comunicativa • Criar hipótese de sentido a partir de informações encontradas no texto • Fruir esteticamente objetos culturais

74

BIM

ES

TR

E

Conteúdos gerais Discurso político: diferentes formas de representação Estudo de tipologia e gêneros argumentativos articulados por projetos Construção de projeto político Estudos linguísticos: • Regências verbal e nominal • Período composto por subordinação • Conjunção • Preposição • Anafóricos • Pontuação • Período composto Variedades linguísticas Conteúdo de leitura, escrita e oralidade Leitura, escrita e escuta intertextual e interdiscursiva de gêneros argumentativos e expositivos articulados por projeto político • Interpretação de textos literário e não literário • Inferência • Fruição • Situacionalidade • Leitura dramática • Leitura em voz alta • Coerência • Coesão • Informatividade • Leitura oral: ritmo, entonação, respiração, qualidade da voz, elocução e pausa • Etapas de elaboração e revisão da escrita • Paragrafação

Espera-se que, tendo como referência principal as tipologias argumentativa e expositiva, em situações de aprendizagem orientadas por projetos de leitura e escrita e centradas em debate regrado, textos de opinião, artigo de divulgação científica e outros gêneros dessas tipologias, os estudantes desenvolvam as seguintes habilidades: • Identificar, escolher e classificar argumentos que sejam a favor ou contrários à defesa de um ponto de vista • Analisar a norma-padrão em funcionamento no texto • Identificar e reconhecer a produção de um texto como processo em etapas de reelaboração • Produzir versão final de um texto com marcas de intervenção • Construir ponto de vista que represente o interesse do grupo majoritário • Construir conceito de “ato político” a partir de situação de comunicação • Construir opinião crítica a partir de informações e análises apresentadas • Analisar imagens sob o ponto de vista de seu caráter político e social • Realizar apresentação oral adequada à situação de interlocução • Fruir esteticamente objetos culturais

75

BIM

ES

TR

E

Conteúdos gerais Discurso político: diferentes formas de representação Estudo de tipologia e gêneros argumentativos articulados por projetos Construção de projeto político Estudos linguísticos: • Pontuação • Período composto por subordinação • Conjunção • Crase • Regências verbal e nominal • Concordâncias verbal e nominal Variedades linguísticas Conteúdo de leitura, escrita e oralidade Leitura, escrita e escuta intertextual e interdiscursiva de gêneros argumentativos e expositivos articulados por projeto político • Interpretação de textos literário e não literário • Inferência • Fruição • Situacionalidade • Leitura dramática • Leitura em voz alta • Coerência • Coesão • Informatividade • Leitura oral: ritmo, entonação, respiração, qualidade da voz, elocução e pausa • Etapas de elaboração e revisão da escrita • Paragrafação

Tendo como referência principal as tipologias argumentativa e expositiva em situações de aprendizagem orientadas por projetos de leitura e escrita e centradas em debate regrado, textos de opinião, artigo de divulgação científica e outros gêneros dessas tipologias, espera-se que os estudantes desenvolvam as seguintes habilidades: • Reconhecer e analisar texto de estrutura opinativa • Resumir texto opinativo • Posicionar-se como agente de ações que contribuam para sua formação como leitor, escritor e ator em uma dada realidade • Reformular ideias, apresentando novos argumentos e exemplos • Analisar a norma-padrão em funcionamento no texto • Utilizar conhecimento sobre a língua (linguísticos, de gênero etc.) para elaborar projeto coletivo • Produzir uma versão final de um texto com marcas de intervenção • Fruir esteticamente de objetos culturais Competências de produção de textos (SARESP) COMPETÊNCIA I – Tema – Desenvolver o texto de acordo com as determinações temáticas e situacionais da proposta de produção de texto COMPETÊNCIA II – Tipologia – Mobilizar, no texto produzido, os conhecimentos relativos aos elementos organizacionais da tipologia textual em questão COMPETÊNCIA III – Coesão/Coerência – Organizar o texto de forma lógica, demonstrando conhecimento dos mecanismos coesivos linguísticos e textuais necessários para a construção coerente do texto COMPETÊNCIA IV – Registro – Adequar as convenções e normas do sistema da escrita à situação comunicativa COMPETÊNCIA V – Proposição – Elaborar proposta de intervenção para o problema abordado, demonstrando um posicionamento crítico e cidadão a respeito do tema

Fonte: Adaptado pelo autor a partir do Currículo do Estado de São Paulo (2012, p. 70-77).

Com base nesses dados, pode-se inferir que o conteúdo prioritário para o 9º do Ensino

Fundamental são as construções linguísticas relacionadas aos gêneros da ordem do

argumentar e do expor, incluindo as características fundamentais das tipologias argumentativa

e expositiva, sua interpretação e produção discursiva.

76

2.5 Caderno do Aluno e do Professor de Língua Portuguesa

O CALP e o CPLP são resultados do Fundo de Desenvolvimento da Educação da

Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, visando atender às demandas de ensino nos

níveis fundamental e médio. O apostilado tem o objetivo de “[...] orientar o trabalho do

professor no ensino dos conteúdos disciplinares específicos e a aprendizagem dos alunos”

(SÃO PAULO, 2010, p. 8). Dessa forma, o intuito na utilização do material no Ensino

Fundamental e no Ensino Médio é o de fornecer apoio às aulas, norteando o programa do ano

letivo e padronizando o projeto pedagógico das instituições públicas de São Paulo.

O conteúdo do apostilado é dividido em dois volumes, cada qual dedicado a um dos

semestres do ano letivo. O material é organizado por temas que seguem as orientações do

CESP (SÃO PAULO, 2012), com foco em determinadas tipologias textuais em cada ano

letivo e com execução de atividades e projetos envolvendo o conteúdo abordado.

O CALP é disposto por Situações de Aprendizagem, a maioria delas iniciadas com

uma seção de “Leitura e análise de textos”. Posteriormente, são propostas questões de

interpretação dos textos de apoio, abrangendo atividades da ordem de análise de conteúdo,

atividades gramaticais e propostas de discussão. As Situações de Aprendizagem (SA) que não

são iniciadas com a leitura de textos de apoio apresentam, em seu lugar, o campo “Para

começo de conversa”, que consiste, em geral, em alguma atividade prática que promova a

discussão e a compreensão por parte dos alunos acerca de determinado assunto, antes de

começar a estudá-lo propriamente.

Além disso, o material didático é constituído pelos campos “Oralidade”, “Estudo da

língua” e “Produção escrita”, que, geralmente, são colocados em uma mesma Situação de

Aprendizagem após a abordagem dos textos de apoio. Nessas seções, são explorados os

aspectos orais, gramaticais e de produção textual, sempre seguindo o tema introduzido nos

primeiros textos de apoio.

Toda situação de aprendizagem possui uma ou mais indicações de tarefas nas sessões

“Lição de Casa” (exceto a SA 9 do volume 2), com atividades planejadas para serem feitas

fora da escola após o aprendizado do conteúdo, de maneira a garantir maior compreensão do

que foi estudado em sala de aula. Com o intuito de acompanhar esse aprendizado, há o campo

“O que eu aprendi”, no qual os alunos devem escrever, de forma resumida, o que extraíram do

conteúdo que está em vias de ser encerrado.

Algumas Situações do CALP possuem uma seção extra, denominada “Você

aprendeu?”, em que são dispostas atividades desenvolvidas de forma a retomar os principais

77

conceitos e características estudadas na seção que será finalizada. O material também traz as

seções de pesquisa, que podem aparecer em diferentes momentos da SA, sendo estas a

“Pesquisa em Grupo” e a “Pesquisa Individual”. Nelas, os alunos são convidados a ampliar os

conhecimentos adquiridos nas questões de interpretação por meio de pesquisas individuais ou

com os colegas de turma.

Embora não apareça em todas as Situações, há uma seção chamada “Para saber mais”,

em que são sugeridos materiais de apoio sobre o tema abordado, de forma a enriquecer a

experiência do aluno fora da sala de aula. Trata-se de comentários a respeito de livros, filmes,

documentários, músicas e outros tipos de elementos que podem ajudar o aluno a aprofundar

seus conhecimentos.

Toda a construção didática existente nos volumes do CALP também está presente no

CPLP, material utilizado como apoio no desenvolvimento das aulas, com sugestões e

comentários que auxiliam o professor na abordagem do conteúdo. A distinção entre o material

do CPLP e CALP é estabelecida pela série de orientações presentes no início de cada volume

do CPLP, com explicações sobre o conteúdo a ser ensinado e sobre as habilidades gerais que

devem ser desenvolvidas pelos alunos no decorrer das aulas. Ademais, no início de cada

Situação de Aprendizagem, há um quadro com os tópicos Conteúdos e Temas; Competências

e Habilidades; Sugestão de Estratégias; Sugestão de Recursos; Sugestão de Avaliação, com as

devidas explanações a respeito do que é esperado e qual a melhor forma de obter esses

resultados. Além disso, todas as situações de aprendizagem apresentam um roteiro para o

professor, visando à aplicação das atividades e comentários ao longo de todo o conteúdo.

A fim de melhor compreender de que modo a abordagem dos gêneros textuais no 9º

ano do Ensino Fundamental ocorre a partir do apostilado fornecido pela Secretaria da

Educação do Estado de São Paulo, tendo como ponto de partida e referência comparativa as

instruções e os objetivos de aprendizagem descritos no CESP (SÃO PAULO, 2012), por sua

vez produzidos a partir dos PCN (BRASIL, 1998), descreveremos, a seguir, de maneira mais

pormenorizada, as características individuais do CALP do referido ano.

2.5.1 Caderno do Aluno de Língua Portuguesa (CALP) da 8ª série/9º ano

Na apresentação do CESP sobre os fundamentos para o ensino da Língua Portuguesa,

pontua-se que, idealmente, o aluno deve aprender a lidar com as mais variadas tipologias e

gêneros para poder utilizar-se delas em contextos sociais. Segundo o CESP, “é essa habilidade

78

de interagir linguisticamente por meio de textos [...] que permite a construção de sentidos.

Desse modo, desenvolve-se a competência discursiva” (SÃO PAULO, 2012, p. 32).

O CESP (SÃO PAULO, 2012) também confere a devida importância ao estudo dos

gêneros textuais como eventos linguísticos para as ações sociais. Na publicação, os gêneros

são definidos como entidades construídas ao longo do tempo e com influências culturais,

sendo utilizados para atingir objetivos comunicativos específicos em cada situação social.

A partir disso, são indicados alguns gêneros textuais específicos para cada série do

ciclo fundamental, de forma que as tipologias consideradas mais importantes no processo de

aprendizagem sejam enfatizadas ao longo do percurso escolar. Para o 9º ano, os gêneros a

serem conhecidos pelos alunos são os das ordens expositiva e argumentativa e, para que isso

seja realizado de modo mais eficaz, o CESP indica que devem ser estudados os traços

característicos dos textos dessas tipologias, buscando-se o desenvolvimento da habilidade de

reconhecer e analisar as estruturas expositivas ou argumentativas, bem como de produzir

textos opinativos ou explanativos.

Com vistas a seguir o que é proposto pelo CESP (SÃO PAULO, 2012), o CALP do 9º

ano do Ensino Fundamental é dividido em dois volumes, o primeiro contendo dez Situações

de Aprendizagem e o segundo, nove, cujos títulos são reproduzidos a seguir:

SA 1 – Traços característicos da tipologia “expor”;

SA 2 – Traços característicos do agrupamento tipológico “argumentar”;

SA 3 – O diálogo entre as tipologias textuais na composição do gênero;

SA 4 – Debater é mais do que trocar ideias;

SA 5 – Recapitulando os conteúdos;

SA 6 – Da discussão coletiva à carta: construindo a argumentação;

SA 7 – Escrita de parágrafos argumentativos;

SA 8 – Textos de opinião e seu contexto comunicacional;

SA 9 – Produzindo um artigo de opinião;

SA 10 – Recapitulando os conteúdos.

Já os do segundo volume são:

SA 1 – Discutindo para fazer escolhas;

SA 2 – Será que estamos fazendo política?;

SA 3 – Mudanças de rumos: a escola está querendo proibir... E agora?;

SA 4 – Adequando o texto de opinião à situação comunicativa;

SA 5 – Seleção do texto e apresentação à direção da escola;

79

SA 6 – Pesquisando profissões;

SA 7 – Qual o melhor roteiro para nossa Semana de Profissões?;

SA 8 – Tomando uma decisão coletiva;

SA 9 – Apresentações finais: avaliando resultados.

O primeiro volume é dedicado ao estudo das características estruturais dos textos

expositivos e argumentativos, em especial da resenha, do debate regrado e do artigo de

opinião. O segundo é voltado à construção de opinião crítica.

2.5.2 Novas Mudanças Curriculares – Base Nacional Comum Curricular

No início de março do ano corrente (2018), a Secretaria da Educação do Estado de São

Paulo levantou e aprofundou discussões sobre a implantação de um novo currículo oficial,

conforme orientações da nova Base Nacional Comum Curricular (BNCC), homologada em 20

de dezembro de 2017. A proposta é de que, até novembro de 2018, haja participação efetiva

de professores e gestores de escolas públicas do estado em um processo colaborativo que

envolve o estudo dos materiais disponibilizados pelo MEC e a pesquisa referente aos

currículos anteriores e o interesse na reformulação da matriz curricular.

Além disso, os profissionais da educação são convidados a participar de seminários e

grupos de trabalho para o desenvolvimento do texto inicial do novo currículo, que será

construído a partir de documentos enviados pelas escolas com propostas e recomendações da

BNCC.

Em nossa pesquisa, permanecemos atentos às mudanças trazidas na substituição do

antigo currículo, que vigora desde 2008 e dá base para a formação básica e fundamental no

estado de São Paulo. O primeiro grande ato de mobilização para as discussões acerca do novo

modelo se deu em seis de março de 2018, durante o chamado “Dia D” — o Dia Nacional de

Discussão sobre a BNCC.

Em seu site9 oficial, o MEC disponibilizou uma série de materiais de apoio para a

realização do evento, sugerindo que todas as escolas de rede pública participassem. No roteiro

para o Dia D, a Secretaria da Educação buscou fornecer suporte às falas dos gestores e às

apresentações, por meio de informativos impressos e vídeos explicativos. Dentre os objetivos

pretendidos para o evento, estão a promoção de uma discussão nacional sobre a estrutura e as

9 Disponível em:< http://basenacionalcomum.mec.gov.br/>. Acesso em: 28 abr. 2018.

80

competências da BNCC em todas as localidades do Brasil, envolvendo secretarias, escolas e

comunidade escolar.

Na nova BNCC, a organização das práticas de linguagem (leitura de textos, produção

de textos, oralidade e análise linguística/semiótica) por campos de atuação aponta para a

importância da contextualização do conhecimento escolar, para a ideia de que essas práticas

derivam de situações da vida social e, exatamente por isso, precisam ser situadas em

contextos significativos para os estudantes. São quatro os campos de atuação considerados

para o Ensino Fundamental – anos finais, a saber: campo artístico-literário, campo das

práticas de estudo e pesquisa, campo jornalístico/midiático e campo de atuação na vida

pública.

Segundo esse documento, a escolha desses campos deu-se pela comprensão de que

eles contemplam dimensões formativas importantes do uso da linguagem na escola e fora

dela, além de criar condições para uma participação efetiva nas atividades do dia a dia, no

espaço familiar e escolar, uma formação que contempla a produção do conhecimento e a

pesquisa, o exercício da cidadania e uma formação estética. De acordo com a nova BNCC:

[...] os campos de atuação orientam a seleção de gêneros, práticas, atividades

e procedimentos em cada um deles. Diferentes recortes são possíveis quando

se pensa em campos. As fronteiras entre eles são tênues, ou seja, reconhece-

se que alguns gêneros incluídos em um determinado campo estão também

referenciados a outros, existindo trânsito entre esses campos. Práticas de

leitura e produção escrita ou oral do campo jornalístico/midiático se

conectam com as de atuação na vida pública. Uma reportagem científica

transita tanto pelo campo jornalístico/midiático quanto pelo campo de

divulgação científica; uma resenha crítica pode pertencer tanto ao campo

jornalístico quanto ao literário ou de investigação. Enfim, os exemplos são

muitos. É preciso considerar, então, que os campos se interseccionam de

diferentes maneiras. Mas o mais importante a se ter em conta e que justifica

sua presença como organizador do componente é que os campos de atuação

permitem considerar as práticas de linguagem – leitura e produção de textos

orais e escritos – que neles têm lugar em uma perspectiva situada, o que

significa, nesse contexto, que o conhecimento metalinguístico e semiótico

em jogo – conhecimento sobre os gêneros, as configurações textuais e os

demais níveis de análise linguística e semiótica – deve poder ser revertido

para situações significativas de uso e de análise para o uso (BRASIL, 2017,

p. 83).

É importante salientar que aquilo que a nova BNCC trata como campos de atuação,

Marcuschi (2008) chama de domínios discursivos, isto é, “[...] uma esfera da vida social ou

institucional [...] na qual se dão práticas que organizam formas de comunicação e respectivas

estratégias de compreensão” (MARCUSCHI, 2008, p. 194). Assim, os domínios discursivos

81

são grandes grupos que acarretam ações e trocas linguísticas semelhantes, como modelos que

estabilizam os gêneros de acordo com seus principais objetivos contextuais comunicativos.

No tocante ao ensino dos gêneros textuais no 9º ano do Ensino Fundamental, assunto

central deste estudo, a BNCC preconiza alguns objetos de conhecimento fundamentais, cada

qual correspondente a um campo de atuação e com o desenvolvimento de habilidades

específicas nas diferentes práticas de linguagem. Selecionamos e reproduzimos, no quadro a

seguir, alguns dos elementos da tabela disponibilizada pelo MEC:

QUADRO 6 – Campos de Atuação, Objetos de Conhecimento e Habilidades na BNCC

CAMPOS DE

ATUAÇÃO

OBJETOS DE

CONHECIMENTO HABILIDADES

Jornalístico/Midiático Apreciação e réplica/ Relação

entre gêneros textuais e mídias

Analisar e comparar peças publicitárias variadas (cartazes, folhetos, outdoor, anúncios e propagandas em diferentes mídias, spots, jingle, vídeos etc.), de forma a perceber a articulação entre elas em campanhas, as especificidades das várias semioses e mídias, a adequação dessas peças ao público-alvo, aos objetivos do anunciante e/ou da campanha e à construção composicional e estilo dos gêneros em questão, como forma de ampliar suas possibilidades de compreensão (e produção) de textos pertencentes a esses gêneros.

Jornalístico/Midiático Textualização

Produzir textos em diferentes gêneros, considerando sua adequação ao contexto produção e circulação – os enunciadores envolvidos, os objetivos, o gênero, o suporte, a circulação -, ao modo (escrito ou oral; imagem estática ou em movimento etc.), à variedade linguística e/ou semiótica apropriada a esse contexto, à construção da textualidade relacionada às propriedades textuais e do gênero) [...]

Jornalístico/Midiático Revisão/ edição de texto informativo e opinativo

Revisar/editar o texto produzido – notícia, reportagem, resenha, artigo de opinião, dentre outros –, tendo em vista sua adequação ao contexto de produção, a mídia em questão, características do gênero, aspectos relativos à textualidade, a relação entre as diferentes semioses, a formatação e uso adequado das ferramentas de edição (de texto,

82

foto, áudio e vídeo, dependendo do caso) e adequação à norma culta.

Jornalístico/Midiático

Participação em discussões orais de temas controversos de

interesse da turma e/ou de relevância social

Apresentar argumentos e contra-argumentos coerentes, respeitando os turnos de fala, na participação em discussões sobre temas controversos e/ou polêmicos.

Jornalístico/Midiático Construção composicional

Analisar e utilizar as formas de composição dos gêneros jornalísticos da ordem do relatar, tais como notícias (pirâmide invertida no impresso X blocos noticiosos hipertextuais e hipermidiáticos no digital, que também pode contar com imagens de vários tipos, vídeos, gravações de áudio etc.), da ordem do argumentar, tais como artigos de opinião e editorial (contextualização, defesa de tese/opinião e uso de argumentos) e das entrevistas: apresentação e contextualização do entrevistado e do tema, estrutura pergunta e resposta etc.

Jornalístico/Midiático Estilo

Utilizar, na escrita/reescrita de textos argumentativos, recursos linguísticos que marquem as relações de sentido entre parágrafos e enunciados do texto e operadores de conexão adequados aos tipos de argumento e à forma de composição de textos argumentativos, de maneira a garantir a coesão, a coerência e a progressão temática nesses textos [...]

Jornalístico/Midiático Efeito de sentido

Analisar, em gêneros orais que envolvam argumentação, os efeitos de sentido de elementos típicos da modalidade falada, como a pausa, a entonação, o ritmo, a gestualidade e expressão facial, as hesitações etc.

Práticas de estudo e pesquisa

Estratégias e procedimentos de leitura/ Relação do verbal com

outras semioses/ Procedimentos e gêneros de

apoio à compreensão

Selecionar informações e dados relevantes de fontes diversas (impressas, digitais, orais etc.), avaliando a qualidade e a utilidade dessas fontes, e organizar, esquematicamente, com ajuda do professor, as informações necessárias (sem excedê-las) com ou sem apoio de ferramentas digitais, em quadros, tabelas ou gráficos.

Práticas de estudo e pesquisa

Construção composicional e estilo Gêneros de divulgação

científica

Analisar a construção composicional dos textos pertencentes a gêneros relacionados à [...] exposição, contendo definições, descrições, comparações, enumerações, exemplificações e remissões a conceitos e relações por meio de notas de rodapé, boxes ou links; ou título, contextualização do campo,

83

ordenação temporal ou temática por tema ou subtema, intercalação de trechos verbais com fotos, ilustrações, áudios, vídeos etc. e reconhecer traços da linguagem dos textos de divulgação científica, fazendo uso consciente das estratégias de impessoalização da linguagem (ou de pessoalização, se o tipo de publicação e objetivos assim o demandarem, como em alguns podcasts e vídeos de divulgação científica), 3ª pessoa, presente atemporal, recurso à citação, uso de vocabulário técnico/especializado etc., como forma de ampliar suas capacidades de compreensão e produção de textos nesses gêneros.

Jornalístico/Midiático Estratégia de leitura: apreender

os sentidos globais do texto Apreciação e réplica

Analisar textos de opinião (artigos de opinião, editoriais, cartas de leitores, comentários, posts de blog e de redes sociais, charges, memes, gifs etc.) e posicionar-se de forma crítica e fundamentada, ética e respeitosa frente a fatos e opiniões relacionados a esses textos.

Jornalístico/Midiático Efeito de sentido

Analisar o uso de recursos persuasivos em textos argumentativos diversos (como a elaboração do título, escolhas lexicais, construções metafóricas, a explicitação ou a ocultação de fontes de informação) e seus efeitos de sentido.

Jornalístico/Midiático

Argumentação: movimentos argumentativos, tipos de

argumento e força argumentativa

Analisar, em textos argumentativos e propositivos, os movimentos argumentativos de sustentação, refutação e negociação e os tipos de argumentos, avaliando a força/tipo dos argumentos utilizados.

Fonte: Adaptado da Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2017, p. 35-38).

Esses são apenas alguns exemplos do que é proposto pela BNCC. Ao analisar os

elementos previstos como objetos de conhecimento, notamos uma incidência significativa de

conteúdos voltados para as capacidades argumentativas e expositivas. Tal revelação leva-nos

a pensar que:

Ao mesmo tempo que se fundamenta em concepções e conceitos já

disseminados em outros documentos e orientações curriculares e em

contextos variados de formação de professores, já relativamente conhecidos

no ambiente escolar – tais como práticas de linguagem, discurso e gêneros

discursivos/gêneros textuais, esferas/campos de circulação dos discursos –,

considera as práticas contemporâneas de linguagem, sem o que a

participação nas esferas da vida pública, do trabalho e pessoal pode se dar de

84

forma desigual. Na esteira do que foi proposto nos Parâmetros Curriculares

Nacionais, o texto ganha centralidade na definição dos conteúdos,

habilidades e objetivos, considerado a partir de seu pertencimento a um

gênero discursivo que circula em diferentes esferas/campos sociais de

atividade/comunicação/ uso da linguagem. Os conhecimentos sobre os

gêneros, sobre os textos, sobre a língua, sobre a norma-padrão, sobre as

diferentes linguagens (semioses) devem ser mobilizados em favor do

desenvolvimento das capacidades de leitura, produção e tratamento das

linguagens, que, por sua vez, devem estar a serviço da ampliação das

possibilidades de participação em práticas de diferentes esferas/ campos de

atividades humanas. Ao componente Língua Portuguesa cabe, então,

proporcionar aos estudantes experiências que contribuam para a ampliação

dos letramentos, de forma a possibilitar a participação significativa e crítica

nas diversas práticas sociais permeadas/constituídas pela oralidade, pela

escrita e por outras linguagens (BRASIL, 2017, p. 65-66).

Considerando tais proposições, pensamos que o professor e sua capacidade de ensinar,

quando colocados em termos de ruptura, tensão e conflito com o que seria o sistema anterior,

passam por uma reorganização do funcionamento. A BNCC, bem como o currículo do estado,

se presta, sobretudo, ao dimensionamento da função docente, do mesmo modo que o CALP é

um instrumento de apoio para o seu desenvolvimento. Assim, novos horizontes curriculares

são delineados.

85

CAPÍTULO 3

3 ANÁLISE DO CORPUS

Para dar início às análises do corpus deste estudo, partimos das concepções

bakhtinianas, retomadas por Marcuschi (2008), de que o texto está muito além de uma

estrutura meramente formal e deve ser compreendido como um instrumento vivo de

comunicação, refletindo uma organização sociocultural e histórica. Na esteira desse

pensamento, defendemos que, a fim de cumprir seus objetivos prioritários, um programa

escolar deve garantir, basicamente, que o estudante desenvolva a capacidade linguística de

reconhecer as diferentes estruturas de gêneros textuais, bem como tenha o conhecimento

necessário para a escolha do gênero adequado aos diversos contextos e situações

comunicativas.

No que toca às etapas da investigação, inicialmente, efetuamos o levantamento dos

gêneros textuais existentes no material e também dos números de ocorrências de cada um

deles. Em seguida, relacionamos os diversos gêneros a seus respectivos domínios discursivos,

identificamos as tipologias textuais mobilizadas e, por fim, analisamos as atividades e o modo

como abordam os gêneros argumentativos e expositivos.

3.1 Levantamentos dos Gêneros Textuais

A fim de identificar os gêneros textuais propostos pelo material didático e sua

predominância, realizamos a identificação do número de ocorrências de cada gênero a partir

do quadro geral proposto por Marcuschi (2008), conforme apresentado neste estudo no

Quadro 1.

Na Tabela 1, elencamos os gêneros textuais e a quantidade de ocorrências de cada um

deles encontrada no CALP – volume 1, material para o estudo da Língua Portuguesa durante

os dois primeiros bimestres do 9º ano.

86

TABELA 1 – Gêneros Textuais - CALP 9º ano – Vol. 1

Gênero Textual Ocorrência

VOLUME 1

Artigo de divulgação científica 02

Verbete de enciclopédia 02

Resenha 01

Relatório 01

Notícia 01

Reportagem 02

Artigo de opinião 01

Anúncio classificado 01

Tira de cartoon 01

Entrevista 01

Propaganda 01

Carta 02

Poema 01

Conto 02

Romance (trecho) 01

Crônica 02

TOTAL DE GÊNEROS: 16

TOTAL DE

OCORRÊNCIAS:

22

Fonte: Elaboração própria.

Em um primeiro momento, constatamos que são trabalhados 16 gêneros textuais, que

aparecem num total de 22 vezes no decorrer da publicação. Quase todos os gêneros são

abordados uma única vez; os gêneros trabalhados em mais de uma ocasião, como o artigo de

divulgação científica, o verbete de enciclopédia, a reportagem, a carta, o conto e a crônica,

são abordados apenas uma vez mais. Dessa forma, observamos que o número de gêneros

efetivamente trabalhados com os alunos é menor do que o número de ocorrências, não

havendo, em alguns momentos, uma sistematização acerca do aprendizado do gênero.

Partindo desses dados, embora tenhamos percebido alguns avanços nos padrões de

ensino da Língua Portuguesa, que, até alguns anos, priorizava somente o estudo de grandes

obras de gêneros consagrados, como o romance e o poema, ainda é necessário avançar mais,

principalmente se levarmos em conta a dinamicidade do mundo contemporâneo e a

necessidade de um trabalho sistematizado do gênero.

87

A variedade dos gêneros textuais é relevante para o aprendizado mais efetivo e para o

refinamento das habilidades discursivas dos alunos, pois, como discutido anteriormente, um

texto não existe por si só, tal como afirma Koch (1996), visto que toda forma de produção

textual faz referência a outras, seja de forma consciente ou inconsciente por parte do agente

enunciador. A exemplo do que ocorre nas interações sociais, em que há uma gama de

possibilidades de discurso, com adaptações específicas para cada contexto, com alterações

originadas do produtor e também do receptor, de acordo com os seus objetivos específicos em

dada situação comunicacional, no que concerne aos gêneros textuais não é diferente e nem há

como sê-lo, uma vez que eles refletem diretamente as relações sociais reais e se inserem em

diferentes situações de comunicação.

Outro tópico a ser considerado é a apresentação única do gênero, ou, no máximo,

repetida apenas uma vez, condição esta que pode comprometer a compreensão do gênero

textual estudado. Para que se obtenha o máximo de aproveitamento do material e a devida

aprendizagem por parte dos alunos, o ideal é que um mesmo gênero seja trabalhado a partir de

diversos textos, a fim de que o aluno tenha as condições necessárias para compreender o

conteúdo e estabelecer as relações linguísticas esperadas e não estudar o gênero como um

único modelo possível. O gênero, antes mesmo de constituir um conceito, é uma prática social

e deve orientar a ação pedagógica, privilegiando o contato real do estudante com a

multiplicidade de textos produzidos e que circulam socialmente (PARANÁ, 2006).

Tendo justificado a necessidade de maior sistematização dos gêneros no material

utilizado no ensino da Língua Portuguesa, voltamos nossa atenção para outro ponto que, a

nosso ver, merece destaque neste estudo. Identificamos, em nossa tabulação de dados, a

existência de alguns gêneros que não se enquadram no quadro geral10

proposto Marcuschi

(2008) e que também foram trabalhados no material, conforme demonstrado na Tabela 2.

10

O quadro geral de Marcuschi (2008, p. 194-196) é uma proposta, logo, flexível e “[...] resta dizer que muitos

gêneros são comuns a vários domínios” (MARCUSCHI, 2008, p. 194).

88

TABELA 2 – Gêneros Textuais não Elencados no Quadro Geral Proposto por Marcuschi (2008)

- CALP 9º ano – Vol. 1

Gênero Textual Ocorrência

VOLUME 1

Exposição oral11 02

Debate regrado12 01

Letra de música13 02

TOTAL DE GÊNEROS: 05

TOTAL DE

OCORRÊNCIAS:

05

Fonte: Elaboração própria.

11

Costa (2014), no livro Dicionário de Gêneros Textuais, afirma que há muita confusão entre os gêneros

exposição oral e seminário, uma vez que, comumente, o gênero exposição oral é considerado como sinônimo de

seminário. Dolz e Schneuwly (2004) definem a exposição oral como um gênero textual público, relativamente

formal e específico, no qual um expositor especialista dirige-se a um auditório, de modo (explicitamente)

estruturado, para lhe transmitir informações, descrever-lhe ou lhe explicar alguma coisa sobre um determinado

assunto. Ou seja, o gênero exposição oral não é uma discussão coletiva, o discurso se caracteriza como

monologal. Realizado também em sala de aula, o expositor dirige-se ao público para lhe transmitir informações,

descrever-lhe ou explicar-lhe algum assunto. Já o seminário, segundo Bezerra (2003), é um gênero de discussão

oral, coletiva, realizada em sala de aula, como a intenção de explorar de forma aprofundada um determinado

assunto. Para isso, os participantes devem ter lido, com antecedência, o material escrito sobre esse assunto,

devendo seguir um roteiro com os tópicos a serem discutidos, ouvir e anotar informações, se posicionar a

respeito, para encerrar com uma avaliação (que pode ser por escrito ou oralmente). Diante do exposto, nota-se

que o seminário e a exposição oral sejam dois gêneros assemelhados e que, portanto, cabe aos professores

delimitar as características de cada um deles para melhor trabalhá-los. 12

Segundo Costa (2014), o debate (colóquio, conversa/conversação, diálogo, discussão, fórum ou fórum virtual)

no cotidiano, trata-se de uma discussão acirrada, altercação, contenda por meio de palavras ou argumentos ou

exposição de razões em defesa de uma opinião ou contra um argumento, ordem, decisão etc. Pertencendo mais

comumente à comunicação oral, em todos seus tipos, predomina a linguagem argumentativa e/ou expositiva. O

autor afirma que esse gênero coloca em jogo capacidades humanas fundamentais sob o ponto de vista i)

linguístico, como as técnicas de retomada do discurso do outro, marcas de refutação etc.; ii) cognitivo, como as

capacidades crítica e social (escuta e respeito pelo outro); e iii) individual, como as habilidades de se situar, de

tomar posição, de construção de identidade. Entre outros, podem-se destacar alguns tipos de debate: a) debate de

opinião de fundo controverso: visa à compreensão de um assunto controverso (por exemplo, "A favor ou contra a

clonagem de seres vivos"), já que possui várias facetas ou permite várias posições e pode também influenciar a

posição do outro, como também precisar/forjar ou transformar/modificar a própria opinião; b) debate

deliberativo: propõe-se, após a discussão de um tema (por exemplo, "Realizar uma festa de formatura" ou

"Escolher um lugar para passear") que permite a explicitação e exposição de motivos de cada participante, à

tomada de uma decisão que pode estabelecer soluções originais para algo que era anteriormente polêmico; c)

debate para resolução de problemas: valendo-se de um conhecimento comum dos debatedores (por exemplo,

"Eclipse lunar", "Reprodução humana"), cuja solução existe, mas não é totalmente conhecida, de modo que o

grupo deve construir uma proposta de solução com base nas contribuições de cada debatedor; d) debate público

regrado: os debates podem ter uma forma livre, e cada debatedor expressa o que pensa e o que acha sobre o

tema, ou podem também ter regras (debate regrado), com a presença de um moderador que assegura o papel de

síntese, de reenfoque, de reproposição, não permitindo uma dispersão desnecessária. Esse é um modelo de

debate muito comum, usado pelos meios de comunicação em época de eleições. 13

De acordo com Costa (2014), a composição é qualquer produção literária, musical, artística e, por extensão de

sentido, passou a ser um gênero usado na escola como exercício escrito, literário ou não, que consiste no

desenvolvimento, pelos alunos, de um tema proposto pelo professor. Desse modo, entendemos que letra de

música (canção) seja composição musical, por isso, a enquadramos como gênero textual.

89

Foram explorados 03 gêneros característicos da expressão oral: a exposição oral

propriamente dita, indicada em 2 atividades, nas quais os alunos deveriam transcrever um

áudio gravado e discuti-lo, bem como 01 ocorrência do debate regrado; 02 ocorrências de

letra de música.

Marcuschi (2008) já havia sinalizado isso, demonstrando que, aos poucos, a tradição

no ensino da língua, no campo estritamente escrito, vem abrindo espaço para novas

perspectivas no que concerne à modalidade oral. No entanto, o teórico afirma que “[...] os

gêneros orais em geral ainda não são tratados de modo sistematizado. Apenas alguns, de

modo particular os mais formais, são lembrados em suas características mais básicas”

(MARCUSCHI, 2008, p. 207). Essa tendência está diretamente relacionada ao contexto

cultural de ensino e o próprio autor acentua que, se fôssemos fazer um levantamento de

gêneros considerando outras culturas, “[...] teríamos grandes surpresas. Pois, há culturas em

que a situação se inverteria totalmente em relação ao que se tem nesses quadros”

(MARCUSCHI, 2008, p. 196). No Brasil, há um histórico de priorização de gêneros mais

tradicionais nas salas de aula e é precisamente por isso que a abertura para novos gêneros

orais vêm acontecendo de forma gradual.

Na sequência, analisamos os dados obtidos no volume 2 da publicação e organizamos

os gêneros textuais presentes no segundo volume do CALP, material de estudo dedicado aos

dois últimos bimestres do 9º ano, conforme Tabela 3.

TABELA 3 – Gêneros Textuais - CALP 9º ano – Vol. 2

Gênero Textual Escrito Ocorrência

VOLUME 2

Artigo de divulgação científica 01

Resumo 01

Manual/Roteiro instructional 02

Reportagem 03

Artigo de opinião 02

Conto 01

Romance (trecho) 02

TOTAL DE GÊNEROS: 07

TOTAL DE

OCORRÊNCIAS:

12

Fonte: Elaboração própria.

90

Em comparação com o volume 1, a segunda publicação apresenta um número inferior

de ocorrências de gêneros textuais, pois somente 7 foram trabalhados num total de 12

ocorrências, sendo que o gênero reportagem foi estudado 3 vezes.

No segundo volume do CALP, a modalidade de artigo de opinião é estudada. Embora

o gênero em si tenha sido explorado somente 2 vezes no decorrer da publicação, sua premissa

principal – a tipologia argumentativa – é trabalhada de forma escrita e oral em debates entre

os alunos sobre temas polêmicos da atualidade, conforme discorreremos mais adiante quando

nos dedicarmos à análise das atividades propostas no material. Importa lembrar que não

identificamos, na segunda publicação, a existência de gêneros textuais não encontrados no

quadro de Marcuschi (2008).

De modo geral, o segundo volume do CALP apresenta menor número de gêneros

textuais que o primeiro. Constatamos que o material dedicado ao segundo semestre prioriza

atividades acerca de um mesmo gênero proposto em cada situação de aprendizagem,

principalmente de construção de um roteiro de viagem, de debates e produção de escrita, de

problemáticas de uma formatura do Ensino Fundamental e da realização de uma semana de

profissões na escola.

Em seguida, fizemos um levantamento comparativo entre os dados obtidos nos dois

volumes do CALP, conforme Tabela 4, na qual estão tabulados os números referentes aos

volumes 1 e 2 e o total de recorrências de cada gênero textual abordado no corpus estudado.

91

TABELA 4 – Recorrência Total dos Gêneros Textuais - CALP 9º ano

Gênero Textual Recorrência

VOLUME 1

Recorrência

VOLUME 2

Total de

Recorrências

Artigo de divulgação científica 02 01 03

Verbete de enciclopédia 02 - 02

Resumo - 01 01

Resenha 01 - 01

Manual/Roteiro instrucional - 02 02

Relatório 01 - 01

Notícia 01 - 01

Reportagem 02 03 05

Anúncio classificado 01 - 01

Artigo de opinião 01 02 03

Tira de cartoon 01 - 01

Entrevista 01 - 01

Propaganda 01 - 01

Carta 02 - 02

Poema 01 - 01

Conto 02 01 03

Romance (trecho) 01 02 03

Crônica 02 - 02

Exposição oral 02 - 02

Debate regrado 01 - 01

Letra de música 02 - 02

TOTAL DE GÊNEROS: 21 27 12 39

Fonte: Elaboração própria.

Somando-se os dados obtidos no levantamento dos gêneros textuais abordados nos

dois volumes do CALP, tem-se 21 gêneros explorados em meio a um total de 39 recorrências.

Com isso, constatamos que os gêneros com maior recorrência de tratamento são em ordem

decrescente por número de abordagens: reportagem, com 05 ocorrências; e conto, romance

(trecho), artigo de divulgação científica e artigo de opinião, com 03 ocorrências cada.

O gênero mais estudado é o da reportagem. Esse gênero aponta para uma preocupação

com o fato de que os alunos formados no Ensino Fundamental carreguem consigo um

conhecimento de gênero atual e recorrente em nosso cotidiano. A leitura atenta de reportagens

92

jornalísticas pode auxiliar na conscientização cidadã no que concerne ao papel do estudante

como agente transformador da sociedade.

O artigo de divulgação científica é apresentado em três momentos distintos no

decorrer do material, e sua abordagem se apoia na necessidade de que os alunos ingressem na

próxima etapa da vida escolar – o ensino médio, com uma base do que seriam os gêneros

acadêmicos. Além disso, os gêneros conto e romance aparecem em três momentos, já sendo

consagrados no ensino da Língua Portuguesa e cumprindo seu papel de gênero tradicional.

A partir do levantamento realizado, podemos afirmar que, embora tenha havido certo

avanço na formatação do material, servindo como instrumento de suporte das aulas durante

todo o último ano do ciclo fundamental de estudos, há ainda muito a ser feito, sobretudo no

que tange ao avanço das tecnologias virtuais.

É importante ressaltar, ainda, que, apesar de estarmos absolutamente imersos e

dependentes das mídias virtuais, e mesmo os alunos fazendo uso das novas tecnologias, não

foram encontrados, em nenhum dos dois volumes do CALP, uma abordagem textual do que

Marcuschi (2010) define como “gêneros emergentes” – em outras palavras, gêneros digitais.

Os gêneros textuais identificados nas mídias virtuais são, muitas vezes, adaptados a

partir de gêneros já consagrados, que sofrem uma espécie de evolução para se enquadrarem

no uso digital. A respeito disso, Pimentel (2010, p. 2) explica que “[...] os gêneros textuais já

convencionados pela sociedade são transportados para o novo meio de comunicação – a

Internet – sofrendo algumas adaptações relativas ao espaço virtual”.

Como observa Thomas Erickson14

(1997, p. 4 apud MARCUSCHI, 2008, p. 198, grifo

do autor), “[...] a interação on-line tem o potencial de acelerar enormemente a evolução dos

gêneros”. Ora, se tais gêneros são tão presentes em nosso cotidiano e possuem tamanho

potencial transformador na evolução da estrutura linguística, podemos nos questionar por que

ainda não foram inseridos num plano de estudo tão fundamental. A resposta para essa

pergunta talvez consista na forte resistência à aceitação de que e-mails, chats, blogs etc. se

enquadrem como modelos oficiais de gêneros textuais.

Partindo de tais fatos, pensamos ser necessária uma comutação nos modelos de ensino,

a fim de que haja espaço para discussão e análise das estruturas textuais de mídias digitais15

.

14

ERICKSON, T. Social Interaction on the Net: Virtual Community as participatory Genre.Publicado no

Proceedings of the Thirtieth Hawaii International Conference on System Science. Maui, Hawaii. January,

Vol. VI, p. 13-21, 1997. Disponível em:<http://www.pliant.org/personal/Tom_Erickson/VC_as_Genre.html>.

Acesso em: 30 de jun. 2018. 15

Em 1998 os PCN já chamavam atenção para os usos das tecnologias da informação ao afirmar que a presença

crescente dos meios tecnológicos na vida cotidiana coloca, para a sociedade em geral e para a escola em

93

Levando em conta tais aspectos, há que se questionar por que tais gêneros não foram

incorporados ao material em estudo.

3.2 Articulações entre os Gêneros Textuais e seus Domínios Discursivos

Na segunda etapa de nosso estudo, sistematizamos os gêneros textuais encontrados nos

dois volumes do CALP – 9º ano de acordo com as categorias de contextos sociodiscursivos

denominados domínios discursivos.

Seguindo a classificação marcuschiana, os grandes domínios discursivos são o

instrucional (científico, acadêmico e educacional), o jornalístico, o religioso, o da saúde, o

comercial, o industrial, o jurídico, o publicitário, o de lazer, o interpessoal, o militar e o

ficcional.

Assim, os gêneros textuais explorados no CALP – volume 1 estão dentro de seus

respectivos domínios, conforme mostra o Quadro 7.

QUADRO 7 – Domínios Discursivos - CALP 9º ano – Vol. 1

Domínio Discursivo

Gêneros Trabalhados no Vol. 1

INSTRUCIONAL Artigo de divulgação científica

Verbete de enciclopédia

Resenha

Relatório

Debate regrado

JORNALÍSTICO Notícia

Reportagem

Artigo de opinião

Anúncio classificado

Tira de Cartoon

Entrevista

PUBLICITÁRIO Propaganda16

particular, a tarefa de educar crianças e jovens para a recepção desses meios, ou seja, “conhecer a linguagem

videotecnológica própria desse meio” (BRASIL, 1998, p.89). 16

Esse gênero (anexo 09) se trata de uma propaganda, uma vez que é uma campanha de lançamento das novas

lixeiras de coleta seletiva do Metrô de São Paulo. Existe uma equivocada interpretação em considerar

publicidade e propaganda como sinônimos (GOMES, 1998). Contudo, esses dois termos possuem origens e

significados diferentes. A propaganda é compreendida como a propagação de ideias e teorias que tem como

94

INTERPESSOAL Carta

Exposição oral

FICCIONAL Poema

Conto

Romance (trecho)

Crônica

Letra de música

Fonte: Elaboração própria.

Como é possível observar, a partir dos dados, no CALP – vol. 1, são apresentados os

gêneros textuais que se enquadram nos cinco domínios discursivos classificados por

Marcuschi (2008): o instrucional, o jornalístico, o publicitário, o interpessoal e o ficcional.

No que diz respeito à flexibilidade, isto é, ao pertencimento a diferentes domínios

discursivos, de acordo com Marcuschi (2008), os gêneros textuais podem ora se enquadrar em

um, ora em outro, não havendo, portanto, uma classificação definitiva ou não maleável. Isso

ocorre porque um determinado gênero pode ser usado em diversos contextos sociais e com

intenções comunicativas diferentes.

No que diz respeito a essa questão, Dias (2012) constatou que, em determinados

ambientes, circulam certos gêneros e, em outras situações, são utilizadas modalidades

discursivas completamente distintas, o que acontece em razão de os domínios discursivos

consolidarem-se por meio de um contexto histórico-social e organizarem as práticas sociais

comunicativas. Koerner (2006) complementa afirmando que há uma enorme dificuldade no

enquadramento de domínio discursivo ao qual pertencem certos gêneros.

Essa problemática foi percebida em nossas análises quando, no apostilado, decidimos

enquadrar o gênero tira de cartoon no DD jornalístico. Pudemos verificar que a mesma

modalidade está presente em outros domínios discursivos, muitas vezes como uma estrutura

típica dos contextos de lazer, principalmente quando o seu conteúdo tem intenção de causar

riso.

No caso desta pesquisa, a tira de cartoon aparece na p. 17 do CALP – vol. 1 e na seção

“Leitura e análise de texto”, conforme mostra a Figura 1. Se realizarmos uma breve análise da

objetivo implantá-las na mente do consumidor (GOMES, 1998). Já o termo publicidade “[...] designa a qualidade

do que é público. Significa o ato de vulgarizar, de tornar público um fato, uma ideia” (SANT’ANNA, 1998, p.

75). Há duas características nucleares, de acordo com Gomes (1998), que identificam os termos: tanto

publicidade quanto propaganda visam informar e persuadir. No entanto, o que difere um termo do outro é que a

publicidade possui interesse comercial e financeiro; já a propaganda possui caráter ideológico.

95

finalidade do Cartoon de Laerte17

, veremos que a tirinha possui um caráter informativo e

crítico.

FIGURA 1 – Tirinha do Cartunista Laerte - CALP 9º ano - Vol. 1 - p. 17

Fonte: SÃO PAULO. Caderno do Aluno de Língua Portuguesa. São Paulo: SE, 2014-2017a.

O cartunista faz uma crítica muito refinada, contrapondo as premissas do quadro de

Delacroix à realidade contemporânea, exposta no primeiro quadrinho, no qual as personagens

que representam uma família estão enclausuradas e buscando meios para sua proteção

individual. No segundo quadrinho, percebemos a posição de Laerte, evidenciando a

necessidade de ações comuns e lutas coletivas.

A partir dessa análise, acreditamos ser mais adequado enquadrar a tira no domínio

jornalístico, porque a este cabem os gêneros mais informativos e com intenções críticas, ao

passo que a outra possibilidade para essa modalidade textual, o DD de lazer, não seria tão

conveniente.

Ademais, é necessário esclarecer que inserimos o gênero exposição oral no DD

interpessoal porque, apesar da abrangência possível de conteúdo dentro desse gênero, em

nosso caso particular, essa modalidade aparece no material em uma atividade que consiste na

sugestão de gravação de um discurso de tema de interesse comum da classe para que os

alunos possam realizar a transcrição do conteúdo e, a partir disso, desenvolver um debate

regrado18

. Ocorre, a partir disso, a interação entre aluno e professor, de forma que

17

Laerte Coutinho faz referência à “Liberdade guiando o povo”, pintura de Engène Delacroix em comemoração à

Revolução Francesa de 1830. Disponível em: <https://www.louvre.fr/en/expositions/delacroix-1798-1863>.

Acesso em: 28 fev. 2018. 18

O CALP orienta que, nessa atividade de debate, os grupos envolvidos precisam ter pontos de vista opostos

sobre as polêmicas que serão discutidas. Será necessário que os alunos se distribuam em torno de duas (ou mais)

ideias divergentes, preparando-se para defendê-las. Nesse momento, os grupos devem dividir-se em subgrupos

para realizar o debate e escolher quais integrantes farão a defesa de cada um dos pontos de vista. A partir da

definição da data do debate, será preciso preparar com antecedência o espaço: devem organizar os lugares que

96

consideramos pertinente o enquadramento desse gênero no domínio interpessoal. Assim, a

análise da exposição oral e sua transcrição servem como ferramenta para o desenvolvimento

de outra modalidade.

Além disso, não há, dentro da classificação de Marcuschi (2008), um domínio

discursivo no qual se enquadre o gênero letra de música. Por essas razões, decidimos colocá-

lo dentro do tipo ficcional, devido à proximidade das letras de música com o gênero poema,

uma vez que é comum que as letras de canções tratem de conteúdos ficcionais/artísticos tal

como acontece nos poemas.

Vale destacar uma atitude progressista por parte do Governo do Estado de São Paulo

ao explorar esse gênero no material utilizado para estudo no 9º ano do Ensino Fundamental,

configurando, a nosso ver, um ponto positivo do nosso corpus. A letra de música tem

importância nas aulas de Língua Portuguesa, pois, além de desenvolver a compreensão e

produção de texto, conhecer e apreciar o gênero permite o despertar de emoções, por

pertencer ao domínio ficcional, bem como tornar o aluno mais sensível às questões e

problemáticas do cotidiano.

Para maior entendimento da incidência de cada domínio discursivo abordado no

CALP – vol. 1, comparamos, no Gráfico 1 a seguir, os dados encontrados:

GRÁFICO 1 – Incidência dos Domínios Discursivos em Porcentagem - CALP 9º ano – Vol. 1

Fonte: Elaboração própria.

serão ocupados por debatedores e moderadores, a fim de que todos os alunos da classe possam vê-los e observar

seus gestos durante a explanação (SÃO PAULO, 2014-2017a).

PUBLICITÁRIO (4%)

INTERPESSOAL (15%)

INSTRUCIONAL (26%)

JORNALÍSTICO (26%)

FICCIONAL (29%)

0 5 10 15 20 25 30 35

97

De acordo com os dados anteriores, pode-se observar que o domínio discursivo

predominante foi o ficcional, com 29% de incidência, seguidos pelos DD jornalístico e

instrucional, ambos explorados em 26% do material.

Os domínios jornalístico e instrucional são de caráter mais prático e sua abordagem

demonstra uma preocupação existente no CALP de preparar o aluno para ser capaz de

explorar e construir discursos cotidianos, visto que esses domínios estão mais presentes nos

nossos contextos de trocas linguísticas rotineiras. O domínio jornalístico é portador “[...] de

ampla circulação social” (BRASILEIRO, 2016, p.8) e o domínio instrucional é construído

“[...] como uma sequência de informações e procedimentos que visam esclarecer como

realizar determinada atividade para obter um resultado prático" (BRASILEIRO, 2016, p. 9).

O domínio ficcional, que foi muito trabalhado, é composto, na maioria das vezes, por

gêneros textuais mais tradicionalmente abordados durante a trajetória escolar na educação

brasileira. O referido dado não aponta para uma tendência negativa nem positiva dentro do

corpus estudado. Embora seja muito importante para a formação do aluno ter as habilidades

de interpretar e explorar os gêneros ficcionais, bem como de estar apto para a produção de

conteúdos nesse segmento, é necessário que essa abordagem não restrinja as possibilidades de

estudo dos demais gêneros, de modo que o aluno tenha uma experiência variada e abrangente

em muitos gêneros textuais.

Na sequência, organizamos os gêneros abordados no CALP – vol. 2 nos grupos

discursivos dispostos no Quadro 8.

QUADRO 8 – Domínios Discursivos - CALP 9º ano – Vol. 2

Domínio Discursivo

Gêneros Trabalhados no Vol. 2

INSTRUCIONAL Artigo de divulgação científica

Resumo

Manual/Roteiro instrucional

JORNALÍSTICO Reportagem

Artigo de opinião

FICCIONAL Conto

Romance (trecho)

Fonte: Elaboração própria.

98

Em um primeiro momento, constatamos que, no volume 2 da publicação, aparecem

somente 3 domínios discursivos marcuschianos: o instrucional, o jornalístico e o ficcional. Há

pouca variedade de domínios contemplados no CALP- vol. 2. Conforme já discorremos, é

necessário que os alunos carreguem consigo experiências concretas do aprendizado de tantas

estruturas linguísticas e construções comunicativas quanto possíveis. O estudo da Língua

Portuguesa deve cumprir o seu papel de formar comunicadores que, segundo o CESP, atinjam

“objetivos específicos em situações sociais particulares” (SÃO PAULO, 2012, p. 33).

No Gráfico 2 que segue, demonstramos a incidência de cada DD no vol. 2 do material

analisado.

GRÁFICO 2 – Incidência dos Domínios Discursivos em Porcentagem - CALP 9º ano – Vol. 2

Fonte: Elaboração própria.

Os domínios jornalístico e instrucional foram os mais amplamente explorados,

correspondendo a 75% das ocorrências. Como já mencionado, o volume 2 do CALP possui

caráter bastante prático, e a principal proposta contida no material é a de preparar o aluno para

a produção de relatórios e roteiros que poderão servir para sua futura vida acadêmica e

comunitária. Assim, o aluno estará apto a produzir, por exemplo, um roteiro para a viagem de

formatura do Ensino Fundamental.

Em terceiro lugar, está o domínio ficcional, revelando que não houve grandes

disparidades entre as propostas dos materiais didáticos dedicados tanto ao primeiro quanto ao

segundo semestre.

FICCIONAL (25%)

INSTRUCIONAL (33%)

JORNALÍSTICO (42%)

0 5 10 15 20 25 30 35 40 45

99

Por fim, analisamos as possíveis articulações entre os dados referentes aos gêneros

explorados nos dois volumes do CALP e sua posição nos domínios discursivos, como pode

ser observado na Tabela 5.

TABELA 5 – Recorrência Total dos Domínios Discursivos - CALP 9º ano

DOMÍNIO DISCURSIVO Gêneros Trabalhados no CALP

Vol. 1 e Vol. 2

RECORRÊNCIA

TOTAL DE

ABORDAGENS

INSTRUCIONAL Artigo de divulgação científica

Verbete de enciclopédia

Resumo

Resenha

Manual/Roteiro instrucional

Relatório

Debate regrado

03

02

01

01

02

01

01

TOTAL: 11

JORNALÍSTICO Notícia

Reportagem

Artigo de opinião

Anúncio classificado

Tira de Cartoon

Entrevista19

01

05

03

01

01

01

TOTAL: 12

PUBLICITÁRIO Propaganda 01

TOTAL: 01

INTERPESSOAL Carta

Exposição oral

02

02

TOTAL: 04

FICCIONAL Poema

Conto

Romance (trecho)

Crônica

Letra de música

01

03

03

02

02

TOTAL: 11

Fonte: Elaboração própria.

19

O recorte da atividade gênero entrevista está presente no anexo 1 e na figura 3 desta dissertação.

100

Tendo como referência a classificação de domínios feita por Marcuschi (2008),

observamos que não há a presença de alguns dos grupos textuais no nosso corpus; mais

especificamente, não houve nenhuma abordagem dos gêneros textuais classificados nos

domínios militar, de lazer, religioso, da saúde, comercial, industrial e jurídico. A esse

respeito, podemos afirmar que o material produzido para o estudo dos alunos em seu último

ano do Ensino Fundamental não mostra a preocupação de apresentar as modalidades de texto

dos domínios supracitados.

Considerando-se que o conteúdo linguístico que, idealmente, deveria ser apresentado

aos alunos no decorrer de sua vida escolar é bastante abrangente, essa posição é passível de

compreensão, dando-se preferência ao estudo de gêneros textuais pertencentes aos grandes

grupos discursivos com os quais o aluno poderá ter mais contato ao longo do tempo. No

entanto, por mais que, de um ponto de vista pedagógico, essa falta de simetria na abordagem

dos gêneros seja compreensível, tendo-se em vista o objetivo de estudo defendido nessa

análise, que é o de aprimorar as habilidades comunicacionais dos estudantes, julgamos que

todos os domínios discursivos deveriam ser ao menos apresentados no material, de forma que

os alunos com eles tivessem algum contato.

Já os DD da saúde, comercial e, sobretudo, de lazer, que abrangem gêneros como

piadas, histórias em quadrinhos, palavras cruzadas etc., são muito presentes no cotidiano da

maioria das pessoas e, por isso, pressupomos que poderiam também ter sido estudados no

decorrer do material, principalmente se levarmos em conta que, em situações de lazer, as

interações sociais são muito frequentes. As situações coletivas são carro-chefe no que tange à

produção de discursos e consequentes trocas linguísticas, portanto, há que se esperar que, na

esfera dos textos pertencentes ao grupo do lazer, exista uma grande riqueza de material para o

estudo dos gêneros textuais e de sua função enquanto instrumentos de mediação para a

internalização de conhecimentos.

Assim, a fim de melhor analisarmos em porcentagem a incidência dos domínios

discursivos abordados no decorrer do CALP, além de articular cada um dos gêneros textuais

abordados no material com seus respectivos DD, também tabulamos o total de ocorrências de

DD dos dois volumes, conforme Gráfico 3.

101

GRÁFICO 3 – Incidência Total dos Domínios Discursivos em Porcentagem - CALP 9º ano - Vol.

1 e Vol. 2

Fonte: Elaboração própria.

O domínio mais explorado no decorrer do CALP vol. 1 e vol. 2 foi o jornalístico,

seguido do ficcional e do instrucional, fato já mencionado nos parágrafos anteriores. Em

penúltimo lugar, tem-se o domínio interpessoal, com 10% das ocorrências e, por fim, o

publicitário, com 2%. Entendemos que esses dois últimos domínios, o interpessoal e o

publicitário, deveriam ter tido uma maior abordagem. Ora, se o nosso objetivo é preparar o

aluno para as situações cotidianas, nada mais adequado do que apresentá-lo aos grandes

grupos que abrangem os contextos comunicacionais interpessoais e os de publicidade.

Os gêneros interpessoais se caracterizam, sobretudo, pela interação com outras pessoas

e pelas trocas linguísticas. Por serem muito presentes no nosso cotidiano, poderiam ter sido

estudados, por exemplo, os bilhetes, os convites, os e-mails e os agradecimentos. Igualmente,

o domínio publicitário poderia ter maiores proporções de ocorrência, pois, nos dias de hoje, o

que temos, comemos, fazemos e queremos sofre influência da publicidade. Sendo assim, nada

mais adequado do que estudar esses gêneros na escola, a fim de fazer o aluno transitar entre as

diferentes estruturas e funções dos textos, que ser capaz de perceber que, ao ver a publicidade

de uma água de coco gelada em um dia de sol de 40 graus e sentirmos vontade de tomá-la, a

vontade pode ter superado a necessidade. Desse modo, a atitude foi motivada pela campanha

PUBLICITÁRIO (2%)

INTERPESSOAL (10%)

INSTRUCIONAL (28%)

FICCIONAL (29%)

JORNALÍSTICO (31%)

0 5 10 15 20 25 30 35

102

publicitária, visto que a marca do produto está diretamente ligada aos seus desejos e às suas

emoções.

3.3 Tipologias Textuais Mobilizadas nos Gêneros Textuais

Nesta etapa, buscamos entender como são mobilizadas, no corpus desta pesquisa, as

diferentes tipologias textuais. O estudo dos gêneros textuais, tomando por base as tipologias

textuais abarcadas, justifica-se pelo fato de que as modalidades textuais, enquanto quadros de

atividade social, somente podem ser trabalhados na perspectiva das interações que serão

realizadas, interações estas denominadas por Machado (2005) de “ações de linguagem”. As

tipologias textuais são classificações utilizadas com vistas a otimizar o estudo da Língua

Portuguesa e das habilidades comunicativas dos estudantes, por isso, é necessário que haja

uma simetria na abordagem de cada tipologia (descrever, narrar, argumentar, expor e relatar),

de forma que o aluno se torne apto a produzir o seu discurso.

As tipologias textuais que consideramos para este estudo, definidas por Dolz,

Noverraz, Schneuwly (2004) e Marcuschi (2007), são cinco, conforme expusemos

anteriormente. A fim de identificarmos quais tipologias textuais são mobilizadas no CALP,

organizamos o Quadro 9, com o enquadramento de cada um dos gêneros estudados no

decorrer dos dois CALP.

QUADRO 9 – Tipologias Textuais - CALP 9º ano

Gênero Textual Tipologia Textual

Resumo

Carta

Conto

Romance (trecho) TT1 - Narrar

Crônica

Tira de cartoon

Exposição oral

Poema

Letra de música

Notícia

Reportagem TT2 - Relatar

103

Artigo de opinião

Debate regrado TT3 - Argumentar

Propaganda

Artigo de divulgação

científica

Verbete de enciclopédia

Resenha TT4 - Expor

Entrevista20

Anúncio classificado

Relatório

Manual/Roteiro instrucional TT5 - Descrever

Fonte: Elaboração própria.

Nosso levantamento foi feito considerando a tipologia textual explorada no estudo de

cada gênero textual presente no CALP, mas é preciso salientar que os gêneros textuais podem

ser flexíveis às diversas tipologias. Um exemplo dessa flexibilidade pode ser observado no

uso do gênero crônica, que pode se enquadrar como espécime da ordem do narrar, recriando a

realidade por meio do texto, mas também pode refletir características da tipologia textual

relatar, no caso de algumas crônicas policiais e jornalísticas, nas quais o texto tem a finalidade

de transmitir acontecimentos reais, aproximando-se do gênero notícia, contudo lançando mão

de recursos literários para tal.

Nessa perspectiva, torna-se necessário esclarecer que alguns gêneros com

característica plural em sua concepção podem ser classificados como adequados a uma

determinada tipologia textual, ainda que, de acordo com as propostas de interpretação e de

análise de texto presentes no apostilado, caminhem para a abordagem de outra tipologia

textual. A letra de música é um exemplo de gênero textual que carrega consigo propriedades

inerentes à ordem do narrar, pois é capaz de recriar a realidade pela força imaginativa, mas

que, no CALP, foi trabalhado de forma a contribuir para um exercício argumentativo. Com o

intuito de esclarecer nossa defesa, reproduzimos abaixo o recorte do apostilado em que o

gênero aparece:

20

Há ainda o que Adam (2008) chama de sequência dialogal, que se entende por atos de linguagem, produzido

por dois ou mais interlocutores por meio de intercâmbios, que, ao se combinarem no evento da interação,

constituem as sequências. Contudo, não iremos nos ater à sequência dialogal, uma vez que as tipologias

apresentadas na fundamentação teórica dão conta das discussões dessa pesquisa.

104

FIGURA 2 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 1- p. 14

Fonte: SÃO PAULO. Caderno do Aluno de Língua Portuguesa. São Paulo: SE, 2014-2017a.

Como pode ser observado, o gênero pertencente à ordem do narrar foi utilizado no

CALP como um meio para a realização de um exercício argumentativo – a roda de conversa

com os colegas. Partindo de casos como esse, salientamos que a nossa classificação dos

gêneros textuais de acordo com as tipologias textuais levou em conta as propriedades da

estrutura textual em si, de maneira global e independente às formas de abordagem desse

material dentro do contexto geral da Situação de Aprendizagem.

Após classificar os gêneros textuais estudados no decorrer do CALP, produzimos um

gráfico com o número de ocorrências de cada tipologia abordada no volume 1 da publicação,

conforme Gráfico 4.

GRÁFICO 4 – Abordagem das Tipologias Textuais - CALP 9º ano – Vol. 1

Fonte: Elaboração própria.

É possível observar que a tipologia textual com mais ocorrências no vol. 1 da

publicação é a narrar, aparecendo 13 vezes nos gêneros abordados. Em segundo lugar, tem-se

a TT4 – expor, com 8 ocorrências. Em seguida, identificamos as TT relatar e argumentar, com

0

2

4

6

8

10

12

14

TT1 - Narrar TT2 - Relatar TT3 - Argumentar TT4 - Expor TT5 - Descrever

105

3 aparições cada no decorrer do material, respectivamente. A TT5 – Descrever não foi

explorada em nenhum dos gêneros textuais abordados no volume 1 do CALP.

O estudo mais acentuado da tipologia de narração demonstra uma preferência do

material elaborado para o ensino da língua no 9º ano pelos conteúdos discursivos já bastante

consagrados no decorrer da vida escolar. Isso mostra que ainda há muito que se desenvolver

no que concerne à abertura de conteúdos e aprofundamento nas outras variedades de discurso.

Já as TT expor, relatar e argumentar, embora tenham aparecido no material, foram

pouco exploradas, deixando defasado o aprimoramento dessas tipologias textuais. Notamos,

no que se refere às tipologias de relatar e argumentar, que foram trabalhadas somente em três

situações no decorrer do volume e, portanto, ao longo do primeiro semestre do ano letivo, mas

que deveriam ter sido estudadas com maior profundidade, uma vez que, no 9º ano do Ensino

Fundamental, os alunos possuem uma média de idade que confere certa maturidade

ideológica, e já têm a capacidade de formação de opiniões próprias, até mesmo no que se

refere a questões políticas e sociais.

Por fim, a tipologia textual do descrever não foi abordada em nenhum momento,

podendo deixar uma lacuna no conteúdo, vindo, possivelmente, a se tornar fundamental no

decorrer da vida escolar do aluno.

A exemplo do que foi feito no volume 1, também dispusemos em gráfico a incidência

de abordagem de cada TT nos gêneros textuais estudados no segundo volume do CALP.

GRÁFICO 5 – Abordagem das Tipologias Textuais - CALP 9º ano – Vol. 2

Fonte: Elaboração própria.

0

0,5

1

1,5

2

2,5

3

3,5

4

4,5

TT1 - Narrar TT2 - Relatar TT3 - Argumentar TT4 - Expor TT5 - Descrever

106

Assim como ocorreu no volume 1, do CALP, no volume 2, a TT mais explorada

também é a do narrar, com 4 ocorrências, seguida da TT2 – relatar, com 3 aparições no

decorrer da obra. Em seguida, temos as TT 3 e TT5, argumentar e descrever, respectivamente,

ambas aparecem 2 vezes no material. Em quinto lugar, está a TT4 – expor, que foi explorada

somente em 1 situação.

É digno de nota que, apesar de ter ocorrido somente em 4 momentos no decorrer do

material, a abordagem majoritária da TT1 – narrar, também neste volume, aponta-nos a

consolidação da tendência de predominância da tipologia narrativa, já observada no estudo.

Tais dados revelam que não há grandes disparidades entre as propostas de aprimoramento

discursivo existentes nos dois volumes. A principal diferença de abordagem entre as duas

publicações está no estudo da tipologia de descrever, ausente no primeiro volume do CALP e

trabalhada duas vezes no segundo volume.

Ainda assim, a TT5 foi muito pouco utilizada. Conforme dito anteriormente, essa

habilidade discursiva é de grande importância no decorrer da vida dos alunos, e exatamente

por isso, poderia ter sido abordada com maior frequência, de forma a internalizar o conteúdo e

promover um domínio maior da tipologia.

Para que fosse possível chegar a conclusões a respeito do estudo das tipologias

textuais de forma global no CALP, elaboramos um gráfico comparativo entre elas, dessa vez

levando em conta a porcentagem de ocorrências na totalidade do material, como mostra o

Gráfico 6.

GRÁFICO 6 – Abordagem Total das Tipologias Textuais - CALP 9º ano

Fonte: Elaboração própria.

TT1 - Narrar 44%

TT2 - Relatar 15%

TT3 - Argumentar 13%

TT4 - Expor 23%

TT5 - Descrever 5%

107

Especificamente, em se tratando do 9º ano do Ensino Fundamental, o CESP (SÃO

PAULO, 2012, p. 70-77) sugere que sejam tratados com maior ênfase os gêneros textuais da

ordem do argumentar e do expor. Além disso, tendo em vista que o CALP é desenvolvido

pelo Governo do estado e, em teoria, segue os preceitos estipulados no CESP, existe falha no

material no que se refere à abordagem dessas TT, já que, como podemos constatar, há

somente 13% de textos com a tipologia textual argumentar e 23% de textos com a tipologia

textual expor.

Observamos que a abordagem da TT1 – narrar foi priorizada no decorrer do CALP. É

evidente que, conforme explicado anteriormente, essa predileção encontrada no CALP pelos

gêneros textuais narrativos se restringe somente ao objeto textual de análise, não levando em

conta, nesse primeiro momento, os caminhos seguidos na sequência para a possível

abordagem de outras TT.

Ainda assim, por mais que, eventualmente, o CALP consiga explorar as tipologias

textuais do argumentar e do expor a partir de gêneros textuais de outra ordem, é preciso

relembrar que, conforme as instruções do CESP (SÃO PAULO, 2012), no decorrer do 9º ano

do Ensino Fundamental, são itens fundamentais dos conteúdos gerais do programa que sejam

estudados os traços característicos dos textos argumentativos e expositivos, o que somente

pode ser possível por meio da análise de textos notadamente pertencentes aos gêneros em

questão. Dessa forma, há lacunas no que toca aos modelos essencialmente argumentativos e

expositivos devido à substituição por gêneros textuais de outra ordem tipológica.

Com isso, reconhecemos que um aluno poderá se tornar um leitor e comunicador hábil

se tiver contato com diferentes tipologias textuais, adquirindo, assim, variados recursos

linguísticos e, consequentemente, um maior desenvolvimento de suas funções psicológicas,

que serão utilizadas para a interpretação e produção dos diferentes gêneros textuais. Tal ideia

se baseia na teoria de vygotskyana da ontogênese21

, a partir da qual o autor (1989) afirma que

as principais funções psicológicas superiores são desenvolvidas na medida em que o

indivíduo se apropria de instrumentos sociais e culturais, sobretudo daqueles que se dão no

meio familiar e no planejamento escolar. Dessa forma, de acordo com os estudos de Vygotsky

(1989), quanto mais contato com diferentes recursos, mais elaborada será a internalização de

conceitos e o desenvolvimento das capacidades humanas, pois, ao desenvolver novas

habilidades, as anteriores não deixam de existir.

21

Ontogenia: estudo das origens e da evolução de um organismo (VYGOTSKY, 1989). Vygotsky (1989) utiliza

o termo ontogeneticamente para se referir ao desenvolvimento das funções psicológicas superiores – aquelas que

nos diferem de outros animais, como a linguagem e o pensamento.

108

As tipologias de relatar, argumentar e expor foram trabalhadas de forma mais

equilibrada ao longo do material; mesmo assim, consideramos que elas poderiam ter sido

abordadas com uma maior frequência, de modo a promover o real aprendizado de suas

características por parte dos alunos. A nosso ver, reduzir a prioridade no estudo das estruturas

narrativas, compensando o contato com as demais habilidades linguísticas de discurso, seria

benéfico ao programa organizacional do CALP.

Em se tratando da TT5 – descrever, notamos uma insuficiência de conteúdo e a

tipologia responsável pelo desenvolvimento da capacidade de instruir ou prescrever

informações foi abordada em somente 5% das expressões de gêneros textuais encontradas no

apostilado. Esse dado revela uma falha da TT em questão ocasionada por parte dos

organizadores do material.

A tipologia de narrar foi trabalhada em quase metade dos casos, ao passo que as

tipologias argumentativas e expositivas ficaram defasadas. Somando-se a recorrência das duas

TT que mais deveriam ter sido contempladas no CALP, tem-se o total de 36%, um número

bastante inferior ao esperado.

Diante disso, depreendemos que o CALP apresenta uma proposta reparável no que

concerne ao estudo e à abordagem das tipologias textuais, sobretudo na adequação de suas

propostas, para que haja um equilíbrio maior no estudo das diferentes tipologias, tendo-se

como prioridade os textos argumentativos e expositivos. A respeito desse aspecto,

constatamos que, para um melhor aproveitamento do material de apoio escolar e, por

conseguinte, melhor formação educacional do aluno, pelo menos no que toca ao 9º ano do

Ensino Fundamental, as estruturas narrativas poderiam funcionar como argumentos, pois todo

texto carrega certo grau de argumentatividade (FÁVERO; KOCH, 1987).

3.4 Análises das Atividades Desenvolvidas no CALP

Nesta etapa do nosso estudo, buscamos analisar as propostas de uma amostra das

atividades apresentadas no CALP, de forma a identificar se estas são eficientes no tratamento

dos gêneros textuais abordados, tendo em vista os objetivos declarados como ideais no ensino

da Língua Portuguesa, no 9º ano do Ensino Fundamental, assim como preconizado nos PCN

(BRASIL, 1998).

Para tanto, devemos relembrar que nosso estudo se baseia na tese central da LT

(Linguística Textual) e do ISD (Interacionismo Sociodiscursivo), segundo a qual a linguagem

é o elemento principal no desenvolvimento das capacidades humanas superiores – aquelas que

109

nos diferenciam dos animais, como o pensamento; ao passo que a LT considera o texto como

manifestação da linguagem, ou seja, é responsável pelo padrão da textualidade, além do

processo de produção do texto.

Somente pelo uso da língua, o ser humano é capaz de abstrair seu pensamento,

tomando consciência não somente de quem ele é, como também do seu lugar no mundo,

tornando-se apto, então, a fazer mudanças no seu meio cultural. No entanto, para que o

indivíduo possa dominar os gêneros e as tipologias textuais, ele precisa, antes, internalizar

algumas coordenadas pela apropriação de um instrumento semiótico. Em nosso caso

específico, interessa-nos, em primeiro lugar, o papel dos gêneros textuais como instrumentos

semióticos.

Ora, se os resultados da apropriação desses instrumentos parecem significativos, isto é,

se o aprendizado a respeito das formas de produção e de interpretação dos gêneros textuais

ocorre de forma profunda, a ponto de transformar os alunos em indivíduos com pleno

domínio dos textos, nada mais adequado do que caracterizar os gêneros como instrumentos do

saber. É relevante mencionar o que assevera Libâneo (1998) quando afirma que o professor

atua como mediador na relação entre o aluno e o conhecimento, considerando a experiência e

o significado que o aluno traz à sala de aula, seu potencial cognitivo, sua capacidade e seu

interesse, seu modo de pensar e trabalhar. Nesse sentido, o conhecimento de mundo ou o

conhecimento prévio do aluno deve ser respeitado e ampliado.

O domínio dos mais variados gêneros textuais é de extrema importância para que o

indivíduo possa realizar ações no mundo, visto que é por meio das trocas linguísticas em

contextos de interações sociais que as atividades humanas se consolidam e se tornam produto

para o estabelecimento de novos modelos histórico-sociais que, de forma sucessiva, também

farão parte do repertório natural de capacidades do indivíduo. Essa perspectiva condiz com os

preceitos do ISD, e é a partir dela que reconhecemos a importância do ensino dos gêneros

textuais com responsabilidade.

Dessa forma, justificamos nossa análise das propostas de atividades do CALP: é por

meio, também, da atividade que o conhecimento é internalizado. Portanto, propostas de

atividades confluentes com o que está sendo sugerido ao longo deste trabalho são meios de se

obter resultados favoráveis.

Teremos como base as resoluções dos PCN (BRASIL, 1998) em relação às sugestões

de estruturação pedagógica para o ensino da Língua Portuguesa, e não podemos nos esquecer

da comparação entre o que está presente em nosso corpus e o que é sugerido no CESP (SÃO

PAULO, 2012) a respeito da exploração dos gêneros concernentes às TT argumentar e expor

110

durante o 9º ano do Ensino Fundamental. Justamente por isso, optamos por selecionar alguns

recortes de atividades que correspondessem a essas TT, não necessariamente pelos textos aos

quais essas propostas de atividades se referem, mas pelo caminho delineado pelo CALP no

que toca às tipologias argumentativas e expositivas.

É pertinente observar que, nas propostas de atividade, os enunciados não funcionam

isoladamente, mas são construídos em relação ao contexto geral da situação de aprendizagem.

Por isso, em alguns momentos uma mesma proposta de atividade pode abordar um, dois ou

mais textos argumentativos ou expositivos dentre os dispostos no decorrer da situação de

aprendizagem, e em outros, pode, na realidade, se referir a um texto de outra ordem – como a

narrativa, por exemplo –, mas ainda assim, caminhar para um exercício de argumentação ou

de exposição.

Isto posto, selecionamos uma amostra de propostas de atividades apresentadas nos

dois volumes do CALP, para exemplificar as categorias que trazem, como material de estudo,

as tipologias argumentativas e expositivas. Para tanto, analisamos se houve o

desenvolvimento de alguns aspectos estruturais, as formas de circulação dos textos em

questão, as principais características do gênero, e também alguns aspectos comunicacionais,

como os contextos sociais contemplados, as tipologias discursivas, a coesão, a coerência e a

intertextualidade.

Como primeiro exemplo, analisamos a atividade proposta na seção “Leitura e análise

de texto” da Situação de Aprendizagem 1 do primeiro volume do CALP, em que são

apresentados três textos (Anexo 1): um verbete da enciclopédia dos povos indígenas no

Brasil, com a definição do grupo indígena Deni; um trecho de uma entrevista jornalística com

Roger Chartier; e um artigo de divulgação científica a respeito do processo feito pelo beija-

flor para ganho de energia. Após a leitura dos textos, os alunos devem responder algumas

questões e preencher o quadro reproduzido na Figura 3 a seguir:

111

FIGURA 3 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 1- p. 08

Fonte: SÃO PAULO. Caderno do Aluno de Língua Portuguesa. São Paulo: SE, 2014-2017a.

O objetivo dessa atividade é fazer com que o aluno identifique algumas das principais

características dos gêneros verbete de enciclopédia, entrevista e artigo de divulgação

científica, sendo todos da ordem do expor. Para isso, ele deve observar qual é o interlocutor e

o leitor, o veículo de circulação e a possível presença de termos técnicos na escrita. De acordo

com as informações contidas no Caderno do Professor referentes a esse mesmo volume, que é

o material de suporte às aulas e que possui sugestões para o desenvolvimento das Situações de

Aprendizagem, o objetivo dessa atividade é contribuir para a aprendizagem e o

desenvolvimento dos alunos ao “[...] fazê-los ampliar seu repertório, identificando nos textos

expositivos uma fonte rica de consulta por pertencerem à área de documentação e

informação” (SÃO PAULO, 2014-2017c, p. 13). Ou seja, nessa primeira atividade da

publicação, busca-se fazer a introdução dos gêneros textuais expositivos aos alunos, propondo

que a classe procure, nos próprios textos, os principais fatores estruturais que os caracterizam

como tais.

Esse tipo de atividade possibilita ao aluno desenvolver a capacidade de identificar

elementos-chave a partir da leitura dos três gêneros (verbete de enciclopédia, entrevista e

artigo de divulgação científica), exercitando, dessa forma, a consciência linguística.

112

A partir da leitura dos três gêneros supracitados (anexo 1), segundo o CALP, cabe ao

professor, no desenvolvimento da atividade, pedir a cada grupo que se aprofunde na leitura de

um dos textos, fazendo um levantamento das informações nele contidas. Para isso, o professor

deve auxiliá-los com uma ficha organizativa, como a apresentada a seguir na Figura 4, para

que possam sistematizar o conhecimento adquirido sobre textos expositivos.

FIGURA 4 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 1- p. 09 e 10

113

Fonte: SÃO PAULO. Caderno do Aluno de Língua Portuguesa. São Paulo: SE, 2014-2017a.

Consideramos que a atividade é satisfatória no que refere aos princípios teóricos

defendidos neste trabalho. É necessário que os alunos despertem a consciência linguística a

fim de reconhecer os principais elementos de um gênero textual específico, nesse caso, todos

pertencentes à ordem expositiva. Tendo essa base estrutural, eles estarão aptos a produzir ou

extrair sentido por meio dos textos e, consequentemente, em situações comunicativas.

Na segunda atividade analisada, reproduzida na Figura 5, os alunos devem responder a

algumas perguntas acerca dos textos discutidos na coletânea da Situação de Aprendizagem 2,

sendo eles uma letra de música escolhida pelo professor, uma crônica e uma tirinha de

cartoon (Anexo 2).

FIGURA 5 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 1- p. 20

Fonte: SÃO PAULO. Caderno do Aluno de Língua Portuguesa. São Paulo: SE, 2014-2017a.

114

Essa proposta de atividade acerca da coletânea22

é relevante por trazer a

intertextualidade para a sala de aula, haja vista que a letra de música, a crônica e a tirinha são

modalidades textuais concernentes à ordem do narrar, mas, a partir desses textos, é solicitado

que o aluno analise criticamente o conteúdo apresentado e aponte se concorda ou não,

favorecendo, assim, o desenvolvimento da tipologia argumentativa, ao menos no que se refere

à formação de uma opinião.

Segundo as observações do CPLP, nessa atividade, é esperado que os alunos “[...]

tenham conseguido construir uma opinião clara sobre o tema, discutindo a questão da

violência e pensando em possíveis soluções para que esse problema possa ser amenizado em

nossa sociedade” (SÃO PAULO, 2014-2017c, p. 24). Dessa maneira, os alunos devem

realmente discutir o assunto para conseguirem argumentar a respeito, e não apenas declararem

a sua opinião sem algum tipo de fundamentação. No campo “Tome nota!”, inclusive, o CALP

sugere que, para responder às perguntas, o aluno já se utilize de alguns recursos

argumentativos, o que não deixa de ser uma forma de introduzir os estudantes no tema,

induzindo-os ao exercício da argumentação.

Essa proposta condiz com os preceitos dos PCN, que enfatizam a importância da

linguagem como instrumento de interação na sociedade, possibilitando, por conseguinte, a

construção de um bom desempenho dos alunos levando-se em conta o conceito de cidadania,

visto que “[...] utilizar-se da linguagem é saber colocar-se como agente do processo de

produção/recepção” (SÃO PAULO, 2012, p. 27). De acordo com a perspectiva teórico-

metodológica do ISD, é pelo intermédio da linguagem materializada nos textos que o

indivíduo se apropria dos gêneros e das tipologias para tornar-se apto a modificar o meio no

qual está inserido socialmente, um meio “[...] construído e organizado [...] através de

processos de mediação, sobretudo os linguageiros” (MACHADO, 2009, p. 47). Entendemos,

portanto, que o ensino de línguas com base em gêneros, inserido em uma perspectiva teórico-

metodológica mais ampla como a do ISD, pode ter como um dos seus focos propiciar o

desenvolvimento das capacidades comunicativas dos alunos.

Ao mesmo tempo em que a atividade parece contribuir para o desenvolvimento da

tipologia argumentativa e, por mais que o fato de terem sido utilizados textos de outros

gêneros textuais seja uma proposta válida, o CALP não trabalhou, nessa Situação de

22

A coletânea está presente no anexo 2. Importa lembrar que o Caderno do Professor sugere que o educador

busque uma letra de música, centrada no tema de violência urbana, fazendo-os escutar e solicitando que, em

seguida, em uma roda informal de conversa, falem de suas impressões. A crônica é “Segurança” de Luis

Fernando Veríssimo. Como informado anteriormente, acerca do Cartoon, Laerte Coutinho faz referência à

“Liberdade guiando o povo”, pintura de Engène Delacroix em comemoração à Revolução Francesa de 1830.

Disponível em: <https://www.louvre.fr/en/expositions/delacroix-1798-1863>. Acesso em: 28 fev. 2018.

115

Aprendizagem, gêneros textuais argumentativos ou expositivos, deixando de lado, portanto, a

abordagem de textos dessas tipologias.

Na Figura 6, ilustramos uma proposta de atividade também do vol. 1 do CALP a

respeito do gênero resenha23

de filme ou livro, cujo conteúdo busca identificar, sobretudo, as

características clássicas deste gênero textual.

FIGURA 6 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 1- p. 29 e 30

Fonte: SÃO PAULO. Caderno do Aluno de Língua Portuguesa. São Paulo: SE, 2014-2017a.

De acordo com a proposta da atividade, os alunos devem fazer a leitura dos tópicos

presentes no quadro a respeito do gênero resenha e observar se as descrições pontuadas estão

realmente presentes nas resenhas trabalhadas em aula. Antes, porém, de estudarem esse

gênero textual, o CPLP (SÃO PAULO, 2014-2017c, p. 32) sugere que a classe assista a “A

23

A proposta de atividade convida o aluno a escrever uma resenha sobre um livro ou filme de seu interesse.

116

lista de Schindler”, filme de 1993, com direção de Steven Spielberg (Anexo 3), para que seja

possível ler alguns exemplos desse gênero textual, tendo como base o filme assistido,

possibilitando a leitura crítica dos textos, haja vista que, por conhecerem o objeto de

discussão, possam confrontar suas opiniões com a dos autores.

Seria oportuno se houvesse alguma menção, no CPLP (SÃO PAULO, 2014-2017c), à

flexibilidade deste gênero textual, dentro das tipologias textuais expor e argumentar, visto que

as resenhas de filme ou livro podem ser definidas como gênero da ordem do expor

(capacidade de demonstrar conhecimentos adquiridos por meio de pesquisa) ou da ordem do

argumentar (capacidade de defender determinada posição a respeito de um assunto), porém,

não encontramos nenhuma sugestão de abordagem sobre isso.

No próprio quadro descritivo apresentado, afirma-se que “[...] as resenhas misturam

informação e opinião sobre determinada obra” (SÃO PAULO, 2014-2017a, p. 30). Desse

modo, tanto são expostas informações adquiridas por intermédio da pesquisa, realizada em tal

caso no ato de assistir ao filme em questão, quanto são defendidos certos posicionamentos, já

que o autor de uma resenha importa necessariamente suas opiniões pessoais ao texto.

A seguir, ilustramos, na Figura 7, uma proposta de atividade que explora as multifaces

do gênero “debate regrado”, com sua interação entre escrita e oralidade.

FIGURA 7 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 1- p. 37

Fonte: SÃO PAULO. Caderno do Aluno de Língua Portuguesa. São Paulo: SE, 2014-2017a.

A partir de uma lista, elaborada pelos alunos, a respeito de alguns temas atuais sobre

os quais gostariam de conversar e de algumas atividades de pesquisa e preparação (Anexo 4),

a classe é dividida a fim de praticar um debate regrado. Nessa atividade, propõe-se que os

alunos identifiquem as principais características estruturais do gênero, bem como utilizem sua

tipologia textual. Com isso, constatamos que pode haver maior apropriação da aprendizagem

a partir de experiências práticas do gênero debate.

Dentre os principais objetivos da proposta desta atividade, segundo o CPLP (SÃO

PAULO, 2014-2017c, p. 41), destacamos os seguintes:

117

fazer com que os alunos construam um saber sobre o gênero, reconhecendo nele sua

estrutura predominantemente argumentativa;

identificar o debate como um procedimento comunicativo que exige do aluno

repertório consistente e capacidade para resolver problemas.

Considerando os objetivos descritos, a atividade foi bem elaborada e sua estrutura

possui caráter bastante didático, promovendo uma maior compressão do conteúdo por parte

dos alunos. Com isso, um aspecto levantado a partir desta atividade são os saberes da

oralidade como uma realização concomitante à escrita, e não estranha a ela.

A seguir, na Figura 8, é solicitada a produção escrita de um comentário de opinião

acerca de uma das três imagens apresentadas na seção “Leitura e análise de texto” da Situação

de Aprendizagem 5. As imagens consistem em uma pintura (O violeiro, de Almeida Júnior,

1899), uma fotografia do bairro de Ipanema/ RJ, que apresenta o contraste entre a favela e os

prédios nobres, e uma fotografia da Lagoa Rodrigo de Freitas, que expõe uma catástrofe com

centenas de peixes mortos na superfície (Anexo 5).

FIGURA 8 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 1- p. 49

Fonte: SÃO PAULO. Caderno do Aluno de Língua Portuguesa. São Paulo: SE, 2014-2017a.

Da mesma maneira que as tipologias textuais foram trabalhadas na segunda atividade

que analisamos (Figura 4), nesta também são disponibilizados para análise dos textos as

tipologias do narrar, pois as imagens têm a capacidade de recriar a realidade, deixando por

conta do leitor a construção de diferentes interpretações. A partir dos textos narrativos, pede-

se que o aluno exercite sua capacidade argumentativa por meio da construção escrita de um

comentário de opinião.

Bronckart (2012 [1997]) afirma que a análise dos pré-construídos sociais e históricos,

tais como os gêneros textuais, é fruto de um processo de mediação que deve garantir a

transmissão de conceitos, o que ocorre, sobretudo, por intermédio da atividade. É necessário,

então, que haja uma sistematização nas salas de aula do trabalho com os textos a fim de

contemplá-los de forma efetiva, sistematização esta que não pode ser monótona, ou seja, que

118

garanta realmente a apropriação dos gêneros, despertando o interesse do aluno de diferentes

formas para manter o processo de aprendizagem ativo.

Logo, a apropriação dos textos como instrumentos semióticos, materializados em

gêneros textuais, é indissociável da ação e da prática da atividade de interpretação, leitura e

produção linguística. Concluímos, portanto, que, apesar de esta ser uma proposta pertinente,

repetir o mesmo padrão de atividade apenas retoma o conhecimento trabalhado, e não

contribui para que o aluno desenvolva a TT argumentar, não conferindo profundidade à

atividade. Até mesmo no CPLP (SÃO PAULO, 2014-2017c, p.55), notamos que a atividade

não apresenta aprofundamento do tema, tendo em vista a observação feita ao educador de que

“[...] as orientações para a ‘Produção escrita’ são as mesmas já feitas em atividades

anteriores”.

Na Figura 9, apresentamos uma proposta de interpretação de um artigo de opinião, no

qual o autor Gerardo Castillo discorre sobre a educação sexual na adolescência e o papel da

família em relação a esse aspecto (Anexo 6). Após a leitura do texto, os alunos são

convidados a identificar a opinião do autor em duas situações: quando o relacionamento

homossexual é favorável e quando o relacionamento heterossexual pode ser prejudicial.

FIGURA 9 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 1- p. 55

Fonte: SÃO PAULO. Caderno do Aluno de Língua Portuguesa. São Paulo: SE, 2014-2017a.

O texto parece pertinente para a análise em sala de aula, tendo em vista a idade média

dos alunos do 9º ano do Ensino Fundamental e a atualidade da discussão presente no conteúdo

do artigo. No entanto, mesmo tendo tanto potencial de análise e debate, não somente no

âmbito linguístico, como também no social, o CALP solicita apenas que os alunos

identifiquem determinados tópicos no decorrer do texto, abrindo mão de um aprofundamento

analítico.

119

A atividade não apresenta a complexidade necessária, não apenas por deixar de lado a

discussão social, mas também por exigir pouco dos alunos. Por já ser a 6ª Situação de

Aprendizagem do primeiro volume e o semestre já estar adiantado, deveria haver uma

concentração maior de exigências no que se refere às tipologias argumentativas ou

expositivas.

Não encontramos sugestão ao professor sobre aspectos que deveriam ser mais

evidenciados ou de discussões ou conteúdos, além do texto exposto, para maior aprendizado

sobre o tema. No CPLP (SÃO PAULO, 2014-2017c), constam apenas as respostas das

atividades, sendo estas apenas de localização no texto e não de interpretação de aspectos

relevantes do assunto ou do gênero textual em questão.

Na Figura 10, apresentamos o recorte de uma atividade na qual os alunos devem

construir parágrafos argumentativos a partir do tema pesquisado na seção “Pesquisa em

grupo” (Anexo 7).

FIGURA 10 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 1- p. 65

Fonte: SÃO PAULO. Caderno do Aluno de Língua Portuguesa. São Paulo: SE, 2014-2017a.

São trabalhadas, nessa perspectiva, as partes que compõem a estrutura básica de um

texto de opinião. No CPLP (SÃO PAULO, 2014-2017c, p. 79 e 80), estão dispostos os

tópicos que compõem essa estruturação, sendo eles os parágrafos introdutórios, os parágrafos

de desenvolvimento do tema e o parágrafo conclusivo. Seria relevante, nessa parte, apresentar

120

os critérios ou elementos constitutivos de um texto de opinião aos alunos para que fique

explícito o que e como se espera que eles escrevam esse texto.

A atividade anterior busca introduzir aos alunos a estrutura característica do gênero

textual artigo de opinião, o que é relevante frente à proposta do CALP e tendo em vista que,

no 9º ano do Ensino Fundamental, os alunos se aproximam de uma idade em que o voto já é

permitido – conquista alcançada por meio de movimentos estudantis, cabe ressaltar.

Não basta, no entanto, que o indivíduo saiba reconhecer um gênero textual ou

classificá-lo de acordo com suas características. É necessário que os alunos tenham

conhecimento da função de um texto na perspectiva social em que ele se insere. O domínio da

língua tem muita relação com a possibilidade de participação social, visto que é por

intermédio dela que o homem se comunica, tem acesso à informação e defende seu ponto de

vista, partilha ou constrói visões de mundo, produz conhecimento. Desse modo, um projeto

educativo engajado com a democratização social e cultural confere à escola o ofício de

garantir aos alunos o acesso aos saberes linguísticos necessários para o exercício da cidadania,

direito inalienável a todos.

Os aspectos linguísticos também são deixados à margem. Ressaltamos a importância

do aspecto coesão e coerência de um texto argumentativo. Percebemos que não é devidamente

explorada a coesão que está no nível microtextual, sendo responsável por costurar as palavras,

referindo-se à definição de operações linguísticas subjacentes ao texto (FÁVERO, 2009

[1991]), bem como a coerência que acontece no nível macrotextual, e compromete-se com o

nível local do texto, em que as relações de coerência se constituem, ou não, entre as frases da

sequência textual. A coerência refere-se ao nível global, em que as relações se estabelecem

entre as sequências construtivas (FÁVERO, 2009 [1991]).

A aprendizagem é sempre mediada pelos gêneros e, por essa mediação, as pessoas

adquirem não somente habilidades, como também valores sociais. Por isso, a proposta de

atividade não oportuniza levantar uma discussão pertinente à realidade dos alunos, focando

nos aspectos estruturais do gênero textual artigo de opinião, e secundarizando a carga social

do conteúdo do texto.

Em seguida, ilustramos uma atividade cuja proposta é estudar com os alunos o

conceito de intertextualidade, a partir da letra de música “O tempo não para” e do texto que

apresenta opiniões da autora Mary Lucy Priore a respeito da não existência do chamado

racismo nos dias de hoje. Após algumas breves questões de interpretação do texto, os alunos

são convidados a ouvir e acompanhar a letra de música, do cantor e compositor Cazuza

(Anexo 8), conforme Figura 11.

121

FIGURA 11 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 1- p. 80

Fonte: SÃO PAULO. Caderno do Aluno de Língua Portuguesa. São Paulo: SE, 2014-2017a.

A partir dessa proposta, os alunos devem buscar identificar a relação entre os dois

textos e refletir sobre como acontece a interação entre eles. A questão é relevante, no que diz

respeito ao necessário para o aluno produzir e compreender a linguagem, que o diálogo entre

os textos acontece não apenas enquanto gêneros textuais, mas também enquanto espécies

representantes das tipologias textuais como as do argumentar e do narrar, respectivamente.

Essas interpretações, entre as variadas formas de discurso, podem preparar o aluno para

situações reais de trocas linguísticas no cotidiano social e acadêmico.

É importante evocar o fenômeno da intertextualidade no ambiente de ensino, isso

porque essa preocupação pode contribuir não somente para o entendimento do conteúdo do

texto, como também para a apropriação de conhecimentos que poderão ser úteis na produção

textual, uma vez que a intertextualidade trata da compreensão e da consciência da forma como

dois ou mais textos são interligados, bem como do modo como esses elementos dialogam.

Trabalhando esse componente por meio dos gêneros textuais de diversos domínios, os alunos

observam de que forma se constrói a intertextualidade e são preparados para o próprio uso

desta em futuras situações discursivas.

O Caderno do Professor sugere que, antes de iniciar a atividade com a letra da música

do Cazuza, os alunos façam uma pesquisa, na internet e/ou no livro didático, sobre o conceito

de intertextualidade e anotem pelo menos duas definições com suas respectivas fontes. O

documento ainda propõe que o professor chame a atenção dos alunos para o conceito de

intertextualidade, já que o texto da autora Mary Lucy Priore estabelece um diálogo explícito

com a composição de Cazuza. O CPLP sugere as seguintes perguntas: “Eles conhecem essa

122

composição? Sabem quem foi Cazuza? Por que acham que a autora faz essa relação entre dois

textos tão diferentes?”, propondo, ainda, que o professor “[...] coloque a música para eles

ouvirem e avaliarem com atenção a letra. Depois, sugere que o educador procure conduzi-los

a um entendimento dos dois textos que, de algum modo, contribuam para justificar o diálogo”

(SÃO PAULO, 2014-2017c, p.102).

Referindo-se a materialidade linguística, Costa (2003) defende que no gênero letra de

música há uma predominância de palavras de uso cotidiano, existência de uma maior

liberdade em relação às regras normativas da sintaxe, permissão de repetições e quebra de

frases, palavras, sílabas e sons sem intencionalidade a não ser as sujeições impostas pela

melodia e ritmo. Também pode ser observada pouca coerência, suprida, no entanto, pela

melodia.

Diante dessa exposição, é possível perceber o construto e a relação desse gênero com

o mundo externo, permitindo que seja ferramenta de construção do conhecimento, não como

forma de descrição e representação do mundo, mas de ação e intervenção sobre ele.

Na proposta recortada na Figura 12, os alunos devem responder à questão de

interpretação com base em uma propaganda apresentada na seção “Leitura e análise de texto”

(Anexo 9). A propaganda se refere a uma campanha de lançamento de novas lixeiras de coleta

seletiva no Metrô de São Paulo e apresenta a mensagem de autoridade, buscando orientar os

usuários desse sistema de transporte a utilizar a coleta seletiva.

FIGURA 12 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 1- p. 85

Fonte: SÃO PAULO. Caderno do Aluno de Língua Portuguesa. São Paulo: SE, 2014-2017a.

Apesar de a proposta ter como objetivo que os alunos saibam identificar as

características argumentativas na propaganda, consideramos que a atividade explora pouco as

123

várias nuances de um texto de caráter expositivo-argumentativo, pois sugere somente uma

prática de interpretação ou de coleta de dados. Uma alternativa que poderia incitar mais as

tipologias expositivas e argumentativas seria solicitar aos alunos que, além de indicar os

elementos persuasivos na propaganda, redigissem uma breve explicação sobre o motivo pelo

qual esses elementos conseguem sugerir uma ideia convincente aos leitores e, talvez,

estimular a produção de uma propaganda semelhante com outros elementos de persuasão,

permitindo, dessa forma, o desenvolvimento da tipologia argumentativa na produção de um

enunciado.

Segundo o CPLP (SÃO PAULO, 2014-2017c, p. 108), não há uma resposta

definitivamente correta para a questão levantada nessa atividade. É necessário que o educador

faça um direcionamento tal que os alunos saibam identificar as marcas que reforçam a

intenção da propaganda, tais como o uso das palavras sua, você, faça sua parte, seu e

colabore. A partir disso, há, então, a junção entre o estudo do gênero textual propaganda,

como tipologia argumentativa, e o estudo dos usos linguísticos discursivos.

Na atividade seguinte, ilustrada na Figura 13, os alunos devem produzir uma carta

expositivo-argumentativa, mas, antes disso, devem refletir se esse é realmente o melhor

gênero textual para se comunicar diante da situação apresentada.

FIGURA 13 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 1- p. 89

Fonte: SÃO PAULO. Caderno do Aluno de Língua Portuguesa. São Paulo: SE, 2014-2017a.

Consideramos esta uma das propostas mais bem elaboradas no material, pois, além de

sugerir ao aluno a produção escrita de determinado gênero textual, que condiz com os

124

preceitos do CESP (SÃO PAULO, 2012), há a orientação de uma reflexão sobre essa escolha

discursiva. Essa atividade reflete o que ocorre no cotidiano real dos alunos e pretende

desenvolver as habilidades de comunicação de forma a tornar o aluno apto, não somente a

reconhecer e interpretar um texto, mas também a usar a Língua Portuguesa a seu favor,

tornando-o preparado para a escolha do gênero mais adequado à situação comunicacional.

Como exposto anteriormente, o uso eficiente da linguagem aumenta as possibilidades

de participação social. No ISD, a linguagem se materializa por intermédio de práticas sociais

– a produção dos gêneros – e permite o acesso do indivíduo ao meio (BRONCKART, 2006a).

O autor (BRONCKART, 2012 [1997]) também se apoia nos trabalhos de Habermas ao

ressaltar que, ao agir (socialmente), os indivíduos levam em conta representações coletivas e é

por meio das trocas linguísticas que um grupo social constrói coordenadas formais do mundo.

Em outras palavras, pode-se dizer que o estudo de um gênero textual, como o anúncio

publicitário, corresponde a um agir comunicativo no qual o mundo é representado e

materializado no texto.

Na proposta apresentada na Figura 14, presente no CALP volume 2, busca-se uma

recapitulação das principais características do gênero artigo de opinião, que foram estudadas

em algumas das Situações de Aprendizagem do volume 1. Para tanto, os alunos devem

identificar textos de cunho opinativo em jornais e, após levantar alguns trechos do conteúdo,

utilizar-se de habilidades argumentativas para justificar para o restante da classe o motivo de

estes textos poderem ser classificados como artigos de opinião.

FIGURA 14 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 2 - p. 22

Fonte: SÃO PAULO. Caderno do Aluno de Língua Portuguesa. São Paulo: SE, 2014-2017b.

125

No CPLP (SÃO PAULO, 2014-2017d, p. 35), há a recomendação de que os alunos

respondam à questão sem fazer o uso de nenhum material de apoio, pois a atividade tem como

objetivo propiciar a observação de como os alunos se recordam do que já foi estudado a

respeito do gênero artigo de opinião. Ademais, não há nenhuma outra recomendação de maior

pertinência, sendo, portanto, uma atividade de fácil execução e coordenação por parte do

educador.

Na Figura 15, reproduzimos uma atividade proposta no vol. 2 do CALP, na qual é

apresentada, novamente, a estrutura dos artigos de opinião. Para a realização da atividade, o

professor deve selecionar um texto argumentativo, produzido pelos próprios alunos na

Situação de Aprendizagem anterior, e propor que o seguinte quadro seja preenchido:

FIGURA 15 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 2 - p. 25

Fonte: SÃO PAULO. Caderno do Aluno de Língua Portuguesa. São Paulo: SE, 2014-2017b.

126

O texto analisado se refere à produção escrita dos alunos, em defesa de uma excursão

hipotética, organizada pelos próprios alunos e que está ameaçada devido a um incidente com

um deles (Anexo 10). A partir desta problemática, a classe deve redigir um texto opinativo,

recapitulando, dessa forma, a tipologia argumentativa. Com o preenchimento das informações

requeridas, espera-se que a classe saiba analisar se o texto estudado está de acordo com os

preceitos estruturais característicos do gênero em questão e da tipologia argumentativa.

A atividade é simples e, em nossa opinião, não apresenta a complexidade necessária

para o trabalho com o gênero textual, garantindo apenas que os alunos se prontifiquem a

procurar algumas poucas informações e tópicos clássicos na construção do gênero estudado.

Em um segundo momento, o professor deve intervir para que os alunos reescrevam o artigo

tendo em vista alguns aspectos gramaticais apontados no CPLP (SÃO PAULO, 2014-2017d,

p. 36), tais quais a organização de períodos, o uso de conjunções e o uso da crase. Dessa

forma, essa ação implica o fornecimento de mais informações dadas pelo professor ao aluno a

respeito do gênero textual estudado, visando somente aos elementos linguísticos e não aos

elementos comunicacionais.

Em seguida, ilustramos, na Figura 16, outra atividade a respeito dos artigos de opinião,

que apresenta uma proposta bastante semelhante à anterior:

FIGURA 16 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 2 - p. 45

Fonte: SÃO PAULO. Caderno do Aluno de Língua Portuguesa. São Paulo: SE, 2014-2017b.

127

Nesta questão, os alunos devem ler o texto intitulado “Reforma universitária –

importância social”, do autor Charles Mady (Anexo 11), e, conforme o que já foi feito em

outros momentos, responder a algumas perguntas de interpretação de conteúdo e preencher o

quadro. O aluno é convidado a identificar os elementos de desenvolvimento do artigo de

opinião, a saber, introdução com apresentação de uma tese, argumentos principais,

argumentos complementares e conclusão.

De acordo com as observações presentes no CPLP (SÃO PAULO, 2014-2017d, p. 68),

sugere-se que o professor solicite aos alunos a elaboração de um resumo do texto abordado,

com uma síntese de suas principais ideias, objetivando destacar outra forma de entendimento

de um gênero textual. Outro aspecto que se espera investigar é o caráter de selecionar e

organizar tópicos, concernente à elaboração de um resumo, mas sempre seguindo a estrutura

clássica de um artigo de opinião, com a busca de um raciocínio linear que siga os passos tema

– tese – argumentos – conclusão.

Desse modo, são estudados dois gêneros em uma única situação de aprendizagem: o

artigo de opinião e o resumo. A nosso ver, essa proposta de atividade novamente não

corresponde às expectativas do desenvolvimento das habilidades comunicativas, pois se

prendem aos aspectos puramente estruturais, isto é, aqueles concernentes às formas

linguísticas, e não abrange com eficiência os aspectos comunicacionais. Não há nenhuma

menção, na atividade, aos contextos sociais em que se encontram os textos argumentativos,

nem ao seu enquadramento dentro das tipologias discursivas.

A partir disso, é impossível deixar de lado a existência de postulados da LT, como os

fatores de textualidade, tais quais a coesão e a coerência, que se entrelaçam, possibilitando a

composição do texto. Neste ponto, devemos relembrar também as inferências da teoria do

ISD, baseadas nos estudos de Vygotsky, de que a linguagem é a chave para o

desenvolvimento das capacidades humanas. Forçar os alunos a analisar repetidamente

aspectos estruturais dos gêneros é limitar o desenvolvimento linguístico, pouco diferindo do

que era feito nas salas de aula quando a discussão acerca do caráter social dos textos ainda

não estava aflorada no meio acadêmico e a preferência pela gramática era bastante visível.

Agora, temos, a partir dos PCN (BRASIL, 1998) e do CESP (SÃO PAULO, 2012), a

premissa de que deve ser priorizada em sala de aula a abordagem dos gêneros textuais como

agentes de mobilização social. No entanto, vemos, ao analisar essas propostas de atividades,

que ainda há o que se discutir e que se revisar no apostilado utilizado na rede pública de

ensino em São Paulo.

128

Por fim, analisamos a proposta da seção “Produção Escrita” da Situação de

Aprendizagem 8, do volume 2 do CALP. Nessa atividade, os alunos devem, novamente,

produzir um artigo de opinião referente às propostas apresentadas na “Semana de Profissões”,

elaborada, no capítulo anterior, após pesquisas sobre diversas áreas profissionais e o

planejamento de um roteiro com atividades vocacionais feitas pelos próprios alunos

(Anexo 12).

FIGURA 17 – Recorte de Atividade – CALP 9º ano – Vol. 2 - p. 51

Fonte: SÃO PAULO. Caderno do Aluno de Língua Portuguesa. São Paulo: SE, 2014-2017b.

O tema dessa atividade é apropriado à finalidade a que se destina, pois contempla um

assunto da realidade dos alunos do 9º ano do Ensino Fundamental e também pertinente no

sentido de preparação profissional. Contudo, a proposta é repetitiva, visto que outras

atividades já sugeriram a mesma redação. Ao mesmo tempo, isso pode ser benéfico, devido à

maior apropriação da estrutura de um texto opinativo, tendo em vista que o tempo de estudo

com ênfase nas tipologias textuais argumentativas e expositivas é limitado dentro da trajetória

escolar e que, pelo andamento do ano letivo, os alunos já deveriam, a essa altura, ter se

familiarizado com as características estruturais desse gênero textual, e assim outras tipologias

poderiam ser, agora, exploradas.

Tendo analisado as atividades apresentadas nos volumes do CALP que contemplam as

tipologias do argumentar e do expor, podemos compreender de que forma os gêneros textuais,

preconizados nos PCN para o 9º ano do Ensino Fundamental, são explorados no decorrer do

material. Em primeiro lugar, por mais que algumas propostas sejam instigantes para o

aprendizado dos aspectos estruturais, linguísticos e comunicacionais dos gêneros em questão,

outras são superficiais e pouco didáticas.

Mesmo levando em consideração a relevância da proposta, deparamo-nos com uma

disparidade entre o que é proposto no CESP (SÃO PAULO, 2012) e o que realmente é feito

no apostilado. De acordo com os PCN (BRASIL, 1998) e com o CESP (SÃO PAULO, 2012),

são objetos de estudo, no 9º ano do Ensino Fundamental, as tipologias argumentar e expor,

129

mas, conforme os dados encontrados no nosso estudo, a tipologia textual mais abordada no

decorrer do material foi a narrativa, correspondendo a quase metade das ocorrências textuais.

Constatamos, então, que as propostas de atividades presentes no CALP têm caráter

reparável em alguns casos, sendo desejado que se explore de forma mais profunda e frequente

as características dos gêneros textuais argumentativos e expositivos, não somente no que

concerne aos aspectos estruturais, mas também no aperfeiçoamento das habilidades esperadas

para um bom desenvolvimento e interpretação de discursos dessas tipologias por parte dos

alunos.

130

CONCLUSÃO

Ao idealizar esta pesquisa, partimos das discussões acerca dos gêneros textuais, após a

publicação dos PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais – em 1998, nos quais está explícita

a preocupação com o ensino da Língua Portuguesa com base em gêneros textuais. Essa

preocupação começou a se tornar maior a partir da leitura da teoria bakhtiniana e, no cenário

nacional, com os pressupostos marcuschianos de que os gêneros textuais são entidades

sociocomunicativas e com vivo poder de mudança nas esferas culturais, de forma a promover

uma real interação linguística.

Considerando tais proposições, optamos por tomar como corpus de estudo os

Cadernos do Aluno de Língua Portuguesa do 9º ano do Ensino Fundamental, apostilas com

situações de aprendizagem. Esse material nos permitiu analisar pontos importantes acerca da

questão dos gêneros textuais, bem como refletir sobre uma lacuna existente no apostilado ao

não considerar o nosso próprio mundo, o mundo virtual. Sendo uma modalidade em franco

desenvolvimento, poder interacional e potencial transformador das estruturas linguísticas,

observamos que os gêneros digitais ainda não foram incorporados pelo CALP utilizado como

apoio para as aulas no decorrer do ano letivo.

É preciso considerar a importância dos elementos virtuais na cultura contemporânea e

a necessidade de adequação da escola ao mundo virtual, que transformou a forma como nos

relacionamos. É necessário, portanto, que o apostilado não fique alheio a esse processo, pois é

de fundamental importância que o aluno saiba identificar, relacionar e compreender os

diversos gêneros, a fim de que seja plenamente letrado.

Muito embora os PCN não façam qualquer referência específica ao uso dos gêneros

digitais – o que até certo ponto é justificável, visto que os PCN do Ensino Fundamental II

completam 20 anos e, na época, os estudos sobre gêneros digitais, quando existentes, ainda

eram incipientes –, o simples fato de demonstrarem preocupação com a importância do uso

das novas tecnologias no ensino já seria mais do que suficiente para a inclusão do estudo dos

gêneros digitais no apostilado.

Além disso, com o surgimento das novas diretrizes da Base Nacional Comum

Curricular, surgiu a necessidade de verificar, de forma breve, esse novo documento, com a

finalidade de avaliar algumas mudanças ocorridas e, por conseguinte, avançar nas pesquisas

sobre os gêneros textuais. Importa lembrar que, com o advendo do novo documento, os

currículos dos estados e municípios terão de ser (re)elaborados de acordo com as novas

131

diretrizes e, consequentemente, um novo material didático. Espera-se que haja correções nos

aspectos lacunares que foram constatados neste estudo.

Com a finalidade de analisar se o CALP consegue oportunizar a internalização dos

conhecimentos por meio de gêneros, optamos por dividir nosso estudo em quatro etapas,

sendo estas: o levantamento da diversidade de gêneros que o material compreende; a relação

que ocorre na articulação entre os gêneros propostos e os domínios discursivos

marcuschianos; a identificação de como se inserem os gêneros em questão dentro das

tipologias textuais e, por fim; a análise das tipologias argumentativas e expositivas nos

gêneros textuais presentes no apostilado.

A partir dos resultados obtidos na análise do CALP, pudemos constatar que o Caderno

do Aluno apresenta pequena variedade de gêneros textuais em seus dois volumes, além de, em

sua grande maioria, os textos de cada gênero aparecerem uma única vez em todo o material,

com exceção de alguns poucos que se repetem duas ou, no máximo, três vezes em cada

volume, como é o caso do gênero reportagem.

Essa abordagem limitada em ocorrências pode comprometer a assimilação dos

conteúdos propostos, uma vez que, para internalizar conhecimentos de forma crítica, é

necessário haver sistematização do objeto de aprendizado. Além disso, é preciso levar em

conta que, com a atual dinamicidade social e cultural em que vivemos, existe a necessidade de

proporcionar um ensino variado e abrangente, de forma a contemplar de maneira significativa

as muitas entidades comunicativas interacionais, principalmente porque estamos vivendo uma

época de mudança generalizada nas relações humanas devido ao advento da era digital.

Observamos que o volume 2 do CALP apresenta uma variedade de textos ainda

inferior ao volume 1. No total de ocorrências, são estudados 12 gêneros em todo o material

idealizado para o segundo semestre do 9º ano do Ensino Fundamental. Apesar da quantidade

baixa de abordagens textuais no material, o segundo volume possui um aspecto positivo: o

trabalho prioritário com textos de expressão oral, em detrimento dos escritos. Na apostila,

aparecem os gêneros exposição oral, debate regrado e letra de música, todos relacionados à

oralidade.

Esse fato demonstra certa otimização dos padrões de Ensino da Língua Portuguesa,

que parecem apresentar alguma flexibilidade em relação aos preceitos tradicionais de ensino,

que priorizam, dentro das salas de aula, as modalidades escritas já consagradas.

No que toca à segunda etapa desta pesquisa, observamos que são contemplados nos

apostilados somente cinco dos domínios discursivos marcuschianos, sendo esses, o ficcional,

o instrucional, o interpessoal, o jornalístico e o publicitário, com uma concentração

132

majoritária do DD jornalístico, especialmente no volume 2, que corresponde a 42% das

ocorrências textuais.

O grande número de ocorrências de textos do domínio jornalístico se deve, sobretudo,

às sugestões previstas nos PCN de que o 9º ano do Ensino Fundamental deve priorizar a

abordagem de gêneros argumentativos e expositivos. Embora possam apresentar uma

flexibilidade de adequação entre os domínios, em geral, correspondem a textos de teor

jornalístico.

O domínio ficcional ficou em segundo lugar junto ao domínio instrucional.

Depreendemos desse fato que, apesar da sugerida prioridade à abordagem dos textos da

ordem do argumentar e do expor, o CALP mantém o estudo dos gêneros ficcionais, de modo

que espelha a tendência existente no meio escolar de priorizar o estudo de modalidades

textuais tradicionais e já estabelecidas.

Em relação ao estudo de textos pertencentes ao domínio instrucional, bastante

presente, sobretudo, no volume 2 da publicação, que corresponde a 33% das ocorrências,

mostra-nos que os responsáveis pela elaboração do CALP possivelmente tiveram a intenção

de preparar o aluno para gêneros explorados com maior frequência, principalmente no

restante da trajetória acadêmica, como os artigos científicos, resumos, manuais e relatórios,

entre outros.

Os domínios publicitário e interpessoal apareceram poucas vezes. Assim, acreditamos

que há necessidade de reparação no conteúdo do Caderno, visto que as estruturas textuais

concernentes a esses dois grupos são cotidianas, frequentes na vida sociocultural dos alunos.

Consideramos, portanto, ser necessário estudá-las em maior profundidade, a fim de que haja

uma real assimilação do conteúdo e, com isso, o refinamento das capacidades comunicativas

dos alunos.

Dentre os domínios não contemplados no material, notamos, sobretudo, os domínios

da saúde, do comercial e do lazer, também muito presentes no nosso dia a dia. Pressupomos,

pois, que sua aprendizagem seja relevante ao longo da vida escolar do aluno.

Sobre a terceira etapa da nossa pesquisa, notamos a inserção majoritária de gêneros

narrativos, tendência que acompanha os materiais utilizados no ensino da Língua Portuguesa

de forma geral, haja vista que são tradicionalmente explorados com maior frequência no

decorrer da vida escolar. Acreditamos que essas estruturas narrativas poderiam ser utilizadas

como estímulo para a introdução das tipologias argumentativas.

A tipologia textual da ordem do descrever foi a que teve menor número de incidências

ao longo do apostilado; no primeiro volume, sequer foi introduzida. Já as tipologias da ordem

133

do relatar, argumentar e expor, embora tenham aparecido, foram pouco exploradas. Esse é um

aspecto que aponta para a necessidade de reparar o conteúdo do CALP, especialmente se

levarmos em consideração que, segundo o CESP, no 9º do Ensino Fundamental, deveria ser

aprofundado o estudo de textos argumentativos e expositivos.

Já em relação às propostas de atividades no CALP, buscamos analisar sua eficiência

no sentido de promover um aprendizado satisfatório por parte dos alunos no que concerne aos

aspectos estruturais dos vários gêneros textuais, como a exploração dos conteúdos, as

principais características comunicacionais, os contextos sociais contemplados e as tipologias

textuais.

Para tanto, fizemos uma composição de análise, em que discorremos sobre a proposta

de atividade em si, bem como as respectivas sugestões para aplicação e objetivos pedagógicos

dispostos nos Cadernos do Professor. É importante salientar que, embora haja informações

elogiáveis no material utilizado como apoio ao educador, consideramos que esse recurso

poderia ser mais bem elaborado, de forma a contemplar a “[...] intermediação do professor,

pela dimensão lúdica que instaura um espaço interativo, pelos pressupostos de aprendizagem

por descoberta [...]” (PASSARELLI, 2012, p. 286).

Dentre as propostas analisadas, constatamos particularmente a situação de

aprendizagem que trabalha o gênero debate regrado, sendo uma das poucas atividades que

propõem um estudo mais acentuado e de caráter didático, pois os alunos são estimulados a

compreender as principais características do gênero, sua estrutura e os conteúdos consagrados

por meio da própria prática do debate. Ainda assim, acreditamos que esse tipo de atividade

deveria ter maior espaço dentro da disciplina de Língua Portuguesa, uma vez que “[...] o

debate corresponde a um espaço [...] de posicionamento frente a questões que se apresentam

na vida em sociedade. Esta concepção vai ao encontro dos pontos de interesse da escola [...]

que concerne ao desenvolvimento da cidadania” (AQUINO, 2015, p. 231).

Por outro lado, outras atividades solicitam pouco esforço de interpretação e

compreensão por parte do aluno, sendo quase previsíveis no que se refere às informações

exploradas. Algumas atividades requerem, basicamente, que o aluno procure um ou outro

dado no material textual oferecido. Pensamos que esse tipo de atividade não promove um

aprendizado significativo, considerando o reduzido tempo da Língua Portuguesa no ensino

básico, já insuficiente para tratar de conteúdos necessários. Acreditamos que os objetos de

análise adotados poderiam, se tivessem sido bem aplicados, ser considerados como

instrumentos semióticos, podendo atuar de forma ativa no aprendizado não somente das

estruturas linguísticas, mas também dos gêneros textuais.

134

Além das considerações a respeito da necessidade de uma reformulação de algumas

propostas de atividades, cabe lembrar também que, conforme mencionado anteriormente, o 9º

ano deveria priorizar o estudo de gêneros argumentativos e expositivos, mas, em sua maioria,

os textos são de ordem narrativa, mesmo que, em um segundo momento, sejam desenvolvidas

propostas de atividades que caminham para a abordagem dessas tipologias.

Sabemos que o CALP, desenvolvido a partir do CESP, ainda está em fase de transição

nos seus preceitos do ensino da Língua Portuguesa, afastando-se aos poucos dos tópicos

tradicionais para se aproximar de novas tendências. Dessa forma, é compreensível que o

material ainda não proponha, em sua plenitude, o ensino da Língua Portuguesa com base em

gêneros textuais, considerando o dinamismo sociocultural dos dias de hoje. Contudo,

esperamos que, por meio e a partir deste estudo, esclareçam-se alguns dos aspectos que

precisam ser rediscutidos e reformulados.

De maneira geral, consideramos positiva a existência de um recurso como o CALP

para o apoio em sala de aula, em especial como instrumento de unificação do ensino, pois

todos os alunos da rede pública têm contato com a mesma estrutura curricular de

aprendizagem, o que reduz disparidades nos indicadores de desempenho devido às diferenças

geográficas, étnico-raciais e sociais dentro do estado de São Paulo. O CALP também é

positivo no sentido de atuar como um material didático no qual se inserem os gêneros textuais

– grandes instrumentos na mediação do aprendizado –, atuando de forma ativa no

desenvolvimento das capacidades linguísticas dos alunos.

Apesar disso, os resultados de nossa pesquisa apontam lacunas no apostilado no que se

refere ao estudo dos gêneros textuais, área que deve ser mais bem explorada para que o

fundamento principal do estudo da Língua Portuguesa se dê satisfatoriamente no sentido de

contribuir para a formação de cidadãos aptos à interpretação e à elaboração dos gêneros como

instrumentos de discurso, de modo a conhecerem suas condições de uso, sua adequação ao

contexto social e as possibilidades de materialização que requerem operações de

contextualização e de textualização, levando o aluno a tomar decisões em relação à seleção

textual.

Nossas sugestões para o CALP vão ao encontro do pensamento de Wittgenstein (2005)

em ampliar as fronteiras da linguagem visando-se expandir o universo do aluno, já que o

mundo é da dimensão do nosso conhecimento. Sendo assim, estimamos conseguir atrair

novos olhares sobre o apostilado e que outras investigações e sugestões sobrevenham a este

estudo.

135

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142

ANEXOS

ANEXO 1 – Governo do Estado de São Paulo, CALP 9º ano - Vol. 1 (2014-2017a, p. 5 a 7)

143

144

145

ANEXO 2 – Governo do Estado de São Paulo, CALP 9º ano - Vol. 1 (2014-2017a, p. 14 a 17)

146

147

148

ANEXO 3 – Governo do Estado de São Paulo, CPLP 9º ano - Vol. 1 (2014-2017a, p. 32)

149

ANEXO 4 – Governo do Estado de São Paulo, CALP 9º ano - Vol. 1 (2014-2017a, p. 35 e 36)

150

151

ANEXO 5 – Governo do Estado de São Paulo, CALP 9º ano - Vol. 1 (2014-2017a, p. 47 e 48)

152

ANEXO 6 – Governo do Estado de São Paulo, CALP 9º ano - Vol. 1 (2014-2017a, p. 53 a 55)

153

154

155

ANEXO 7 – Governo do Estado de São Paulo, CALP 9º ano - Vol. 1 (2014-2017a, p. 64)

156

ANEXO 8 - Governo do Estado de São Paulo, CALP 9º ano - Vol. 1 (2014-2017a, p. 76, 77, 78 e 80)

157

158

159

ANEXO 9 - Governo do Estado de São Paulo, CALP 9º ano - Vol. 1 (2014-2017a, p. 84)

160

ANEXO 10 – Governo do Estado de São Paulo, CALP 9º ano - Vol. 2 (2014-2017b, p. 20 a 22)

161

ANEXO 11 - Governo do Estado de São Paulo, CALP 9º ano - Vol. 2 (2014-2017b, p. 42 a 44)

162

163

164

ANEXO 12 - Governo do Estado de São Paulo, CALP 9º ano - Vol. 2 (2014-2017b, p. 47 e 48)

165