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1 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” FACULDADE INTEGRADA AVM Os Aspectos Comportamentais nas Decisões de Investimento Por: Luiz Eduardo de Medeiros Rodrigues Orientador Prof. Ana Claudia Morrissy Rio de Janeiro, 2011

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO … · heurística da disponibilidade, heurística da representatividade, ancoragem, excesso de confiança, dependência do contexto,

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

FACULDADE INTEGRADA AVM

Os Aspectos Comportamentais nas Decisões de Investimento

Por: Luiz Eduardo de Medeiros Rodrigues

Orientador

Prof. Ana Claudia Morrissy

Rio de Janeiro,

2011

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

FACULDADE INTEGRADA AVM

Os Aspectos Comportamentais nas Decisões de Investimento

Apresentação de monografia à Universidade

Candido Mendes como requisito parcial para

obtenção do grau de especialista em Gestão em

Instituições Financeiras.

Por: Luiz Eduardo de Medeiros Rodrigues

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AGRADECIMENTOS

A orientadora Professora Ana Claudia

Morrissy pela paciência, conselhos e

atenção dispensada; aos meus pais,

primeiro aprendi com eles; à Fabiana

companheira incansável das horas difíceis e

felizes também; à Manuela, minha alegria,

nada estaria completo sem você; à Deus,

que nada se daria sem a presença dele.

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho aos meu pais Urias e

Lúcia, minha amada esposa Fabiana e

minha filha Manuela amor sem fim.

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RESUMO

Os principais objetivos deste trabalho residem na discussão das motivações que

levaram à constituição do programa de pesquisa em Finanças Comportamentais e

no exame do arcabouço conceitual até agora desenvolvido. Argumenta-se que esse

novo campo de pesquisa é essencialmente uma reação ao fracasso da “hipótese dos

mercados eficientes” de explicar uma ampla gama de fenômenos financeiros

recorrentemente observados, tais como a (parcial) previsibilidade dos retornos dos

ativos financeiros, volumes excessivos de negociação, e a diversificação ingênua.

Enfatiza-se, ainda, que as Finanças Comportamentais, movida pelo intento de

explicar essas “anomalias”, rejeita o pressuposto da racionalidade ilimitada e

adota uma perspectiva que incorpora na análise econômica contribuições da

Psicologia e da Sociologia. Por isso, são analisados alguns componentes de seu

arcabouço conceituais relacionados a vieses gerados por heurísticas (como

heurística da disponibilidade, heurística da representatividade, ancoragem,

excesso de confiança, dependência do contexto, contabilidade mental, e aversão à

perda), e mostra-se como têm sido empregados para solucionar algumas das

anomalias não explicadas pela teoria convencional de finanças.

Palavras-Chaves: “Anomalias” no Mercado Financeiro, Finanças

Comportamentais, Hipótese dos Mercados Eficientes, Limites à Arbitragem.

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METODOLOGIA

Os métodos de pesquisas utilizados são baseados em consultas bibliográficas em livros, revistas científicas, artigos e sites de boa reputação acadêmica sobre os assuntos tratados neste trabalho. A exploração do tema será feito pela apresentação da teoria da Hipótese dos Mercados Eficientes, principais anomalias nos mercados financeiros, a teoria das Finanças Comportamentais.

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SUMÁRIO INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 08 CAPÍTULO 1 – A Hipótese dos Mercados Eficiêntes ......................................... 10 1.1 Fundamentos Teóricos da HME .................................................................................... 12 1.2 Mercado Eficiente.......................................................................................................... 15 1.3 A Eficiência do Mercado Acionário .............................................................................. 15 1.4 Principais Testes de Eficiência de Mercado ................................................................. 16 CAPÍTULO 2 – Anomalias no Mercado Financeiro .......................................... 20 2.1 Bolhas Financeiras ......................................................................................................... 20 2.2 Previsibilidade dos Retornos dos Ativos ....................................................................... 21 2.3 Violação da Lei do Preço Único .................................................................................... 22 2.4 Volatilidade Excessiva nos Preços nos Ativos .............................................................. 23 2.5 Posse Prolongada de Ativos Perdedores ........................................................................ 24 2.6 Excessiva Negociação ................................................................................................... 24 2.7 Diversificação Ingênua .................................................................................................. 25 2.8 Aquisições de Empresas e a Maldição do Vencedor ..................................................... 26 2.9 Limites a Arbitragem ..................................................................................................... 26 CAPÍTULO 3 – Fundamentos Teóricos das Finanças Comportamentais ........ 31 3.1 Aversão Ás Perdas ......................................................................................................... 31 3.2 Psicologia e Decisões Econômicas ................................................................................ 34 3.3 Excesso de Confiança .................................................................................................... 34 3.4 Otimismo ....................................................................................................................... 35 3.5 Representatividade......................................................................................................... 35 3.6 Perseverança .................................................................................................................. 36 3.7 Ancoragem .................................................................................................................... 36 3.8 Disponibilidade .............................................................................................................. 36 3.9 Teoria da Perspectiva (Propect Theory) ........................................................................ 37 3.10 Aversão á Ambigüidade .............................................................................................. 38 CAPÍTULO 4 –O Contexto das Finanças Comportamentais na Atualidade ... 39 4.1 A Inserção de um novo Modelo .................................................................................... 39 4.2 Modelos de Finanças Comportamentais ........................................................................ 42 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 47 REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 49 ANEXO I ................................................................................................................ 51 ANEXO I ................................................................................................................ 56 ANEXO III ............................................................................................................. 57

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INTRODUÇÃO

Um dos principais conceitos em que se baseiam as Finanças Comportamentais

(behavioral finance), está intimamente ligado, à idéia de que as pessoas possuem um

sentimento muito maior quando se deparam com as perdas resultantes de seus

investimentos, do que com os retornos positivos esperados, mesmo que estes sejam

proporcionais. Ou seja, estamos falando do sentimento de aversão às perdas, natural ao

comportamento humano.

Esta corrente de pensamento tem o objetivo de encontrar explicações nos

desvios cognitivos (gerados pela limitação de tempo, memória e atenção) e desvios

emocionais (julgamento baseado nas emoções), que atuam freqüentemente sobre as

atitudes de investimentos dos agentes, que de uma forma geral, são considerados

racionais.

As Finanças Comportamentais se apresentam sob a forma de questionamento a

cerca dos tradicionais modelos quantitativos, ligados principalmente ao conceito da

Hipótese dos Mercados Eficientes, uma vez que estes modelos quantitativos em

diversas situações na história das finanças não conseguiram explicar totalmente as

variações nos retornos dos investimentos e, em alguns casos não conseguiram explicar

de forma nenhuma tais variações.

A grande transformação no contexto das finanças começou na década de 50,

com o nascimento das Finanças Modernas.

Estas surgiram no contexto acadêmico com os princípios de portifólio de

Markowitz(1952) e conceitos que ainda hoje são utilizados para a diversificação de

carteiras de investimentos, provando matematicamente que “não se deve colocar todos

os ovos no mesmo cesto”.

Continuou ainda com Modigliani e Miller(1958), que questionaram todo o

conhecimento existente sobre estrutura de capital, defendendo o conceito de que os

administradores são capazes de alterar o valor de uma empresa mudando a composição

dos títulos emitidos para financiá-las.

Na década seguinte, nasceria o modelo predominante até hoje para determinar o

custo do capital das empresas, o CAPM de Sharpe (1964), Lintner (1965) e Mossin

(1966).

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Em seguida, Fama (1970), introduziu um dos pilares das Finanças modernas, a

teoria dos mercados eficientes. Nos anos 70, tem-se a Teoria de Precificação de Opções

de Black (1973), Scholes (1973) e Merton (1973), utilizada ainda hoje para avaliação de

opções, bem como o nascimento da Teoria Comportamental de Finanças - a Behavioral

Finance.

A discussão no mundo das finanças atualmente está baseada entre dois fortes

pilares, o dos Mercados Eficientes e o das Finanças Comportamentais, os quais

discutiremos no decorrer deste trabalho, apresentando seus principais conceitos e

avanços no entendimento do comportamento do mercado e no comportamento dos

agentes investidores.

O estudo consiste num primeiro instante na apresentação dos princípios da

Hipótese dos Mercados Eficientes, seguido pela identificação das anomalias de mercado

não explicadas por esta teoria.

Na segunda parte do estudo serão apresentados os princípios das Finanças

Comportamentais como alternativa aos conceitos descritos na teoria da Hipótese dos

Mercados Eficientes.

Em seguida o estudo analisa a evolução das Finanças Comportamentais, que é o

objeto deste trabalho, para embasar a discussão se de fato a nova teoria das Finanças

Comportamentais substituirá a Hipótese dos Mercados Eficientes? Até que ponto?

Quais as perspectivas da nova teoria? E, com o surgimento das Finanças

Comportamentais é possível esquecer os princípios da HME, a idéia da teoria é a

substituição ou o apenas complemento?

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1) A HIPÓTESE DOS MERCADOS EFICIENTES

Esta teoria consiste basicamente no princípio de que os indivíduos são

necessariamente racionais e sendo assim, conforme a teoria econômica neoclássica,

estes indivíduos maximizam suas utilidades.

Nesse sentido, as tomadas de decisões de investimento e a formação de preços

dos ativos incorporam e processam de maneira eficiente todas as informações

disponíveis no mercado.

A Hipótese dos Mercados Eficientes, doravante (HME), tem um papel

significativo no campo das finanças, sendo base para diversos modelos de precificação

de ativos, desde os utilizados em Finanças Corporativas até avançadas teorias na

identificação de “preço justo” de ativos financeiros.

De acordo com a (HME), o preço de um ativo financeiro reflete todas as

informações disponíveis sobre o mesmo, sendo a melhor estimativa de seu “valor

fundamental”. Se o preço do ativo financeiro afasta-se desse valor, operações de

arbitragem promovem a convergência.

Uma das bases da (HME), é exatamente a possibilidade de arbitragem como

artifício de ajuste dos possíveis desvios que o mercado possa sofrer em sua forma

eficiente. Ou seja, mesmo com a presença de alguns investidores não racionais, a

possibilidade de arbitragem anularia o efeito das variações nos preços dos ativos,

trazendo-lhes de volta ao seu preço fundamental, isso será analisado m um próximo

momento.

Tendo como foco de investigação o processo real de decisão em questões

financeiras, a Finança Comportamental (Behavioral Finance), doravante (FC), em

relação principalmente a (HME), questiona essas suposições, revelando e tentando

explicar discrepâncias com as previsões da teoria tradicional de finanças.

Partindo do pressuposto de que os indivíduos tomam decisões que não seguem

estritamente os cânones de uma racionalidade ilimitada, a Economia Comportamental

(Behavioral Economics), doravante (EC) explica essas discrepâncias com base em um

arcabouço teórico que combina princípios econômicos, psicológicos e sociológicos.

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Fortalecendo-se, conquistando reputação e controlando grande parte da agenda

teórica e empírica em finanças, a (EC) contrasta assim com a teoria neoclássica

convencional por assumir que as preferências dos indivíduos não são estáveis, sendo

influenciadas por um determinado contexto, e que as decisões são feitas com base em

regras de bolso simples (heuristics), que podem levar a erros sistemáticos (os chamados

“vieses de heurística”).

Em relação às decisões financeiras, o recurso à heurística, combinado aos limites

à arbitragem, pode resultar em desvios sistemáticos, significativos e persistentes entre

preços dos ativos e valores que refletiriam as informações disponíveis sobre seus

fundamentos econômicos.

Assim, em alguns casos, seria possível prever o comportamento dos preços dos

ativos, não ficando assegurada à eficiência dos mercados financeiros.

Dado o pressuposto deste trabalho de que a (FC) constitui uma tentativa de

superar as limitações da (HME), torna-se necessário iniciar a análise da (FC) pelo

exame das suposições e implicações da (HME). Suas suposições são as seguintes:

(a) Concorrência perfeita: há participantes em número suficiente nos mercados

de ativos financeiros para impedir que a decisão isolada de um deles afete os preços;

(b) Os investidores têm preferências estáveis, formam expectativas racionais

(ER) e maximizam suas utilidades esperadas;

(c) As expectativas dos investidores são homogêneas, pois se supõem que os

investidores são racionais e têm igual acesso às informações e aos mercados;

(d) Novas informações sobre os ativos financeiros surgem aleatoriamente,

ensejando ajustes instantâneos nos portfólios dos investidores;

(e) não há fricções: os ativos são homogêneos, divisíveis e não envolvem custos

de transação.

(f) os agentes são capazes de processar de maneira ótima todas as informações

disponíveis.

Sob esses pressupostos prevalecem ainda os resultados do modelo do passeio

aleatório (random walk model)1: mudanças de preços nos ativos financeiros são

imprevisíveis e independem totalmente dos preços passados.

1 Para uma maior estudo sobre o modelo (random walk model) ver CUNNIGHAM, Lawrence. 1994. “From Random Walk to Chaotic Crashes: The Linear Genealogy of the Efficient Capital Market Hypothesis”. Washington Lee Law Review, 62, 1133.

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Quando se assume que o comportamento dos preços de um ativo segue a

hipótese de Random Walk, diz se que ele obedece ao Processo de Markov, sendo este,

um processo estocástico em que o comportamento de uma variável durante um curto

período de tempo depende somente do valor da variável no início do período, e não de

seu histórico.

Existe uma imensa literatura sobre a hipótese de Random Walk e inúmeros

testes, muitas vezes conflitantes, visando suas comprovações no mercado financeiro.

Isso tem tornado o tema ainda mais controverso, principalmente quando levado para

fora do mundo acadêmico.

Dado que o preço corrente do ativo em um mercado eficiente condensa todas as

informações disponíveis sobre o seu valor de fundamento, sendo por isso, a melhor

estimativa desse valor, mudanças nesse preço ocorre apenas quando surgem novas

informações relevantes que afetam as expectativas sobre o retorno futuro e a percepção

do risco e a liquidez do ativo.

1.1) Fundamentos Teóricos da HME

Os argumentos da base teórica da (HME) são basicamente três, como segue a

seguir:

- Investidores são assumidos como racionais e, conseqüentemente, avaliam e

precificam os ativos financeiros de forma racional:

- À medida que alguns investidores não são racionais, suas participações no

mercado são assumidas como aleatórias, cancelando-as e não produzindo nenhum efeito

nos preços praticados no mercado:

- À medida que esses investidores irracionais o são de maneira similar entre si, à

presença de uma maioria de arbitradores racionais, no mesmo mercado, elimina suas

influências nos preços.

O argumento da racionalidade indica que os investidores precificam seus ativos

pelo valor fundamental, ou seja, o valor presente de seus fluxos de caixa futuros

descontados pelos seus respectivos riscos.

Ademais, qualquer informação que revele uma variação positiva ou negativa no

valor fundamental de um ativo, os investidores a absorvem rapidamente refletindo,

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portanto, em um novo preço. Sendo assim o preço dos ativos incorporam as

informações quase que instantaneamente, entretanto, a teoria ainda divide o que chama

de informação em três grupos, conforme a velocidade com que esta afeta o preço do

ativo, conforme veremos a seguir:

Forma Fraca: Quando o mercado incorpora, integralmente, as informações

contidas em preços passados. Pode-se representar a forma fraca de eficiência

matematicamente, como:

Pt = Pt-1 + Retorno Esperado + Tt

Onde o preço de hoje é função do último preço observado, acrescido ao retorno

esperado do título e de um componente aleatório ao longo do período. O retorno

esperado do título pode ser mensurado através de seu risco aplicado a modelos

tradicionalmente utilizados, como CAPM. O componente aleatório é resultado de novas

informações a respeito do ativo precificado, podendo assumir valores positivos ou

negativos, sendo, porém, seu valor esperado igual a zero.

Esta forma de eficiência, no entanto, é considerada como a de resultados pouco

consideráveis, porque é composta de informações dos preços passados, não sendo

possível obter lucros extraordinários desta forma, já que estas informações são de fácil

obtenção e, todos o fariam de forma igual fazendo com que a competição entre eles

anulasse o efeito da variação do preço.

Uma conseqüência imediata da aceitação da Forma Fraca para os mercados é a

rejeição da Análise Técnica como ferramenta de obtenção de lucros e de projeção de

preços. A Análise Técnica, parte do princípio de comportamentos futuros de preços

podem ser previstos através do comportamento dos preços passados.

Como salienta ROSS (2002), um bom motivo para esperar que o mercado seja

eficiente na forma fraca é o fato de que é muito barato e fácil encontrar padrões de

comportamento em preços de ações. Uma vez encontrados esses padrões, os

participantes do mercado tentariam utilizá-los para obtenção de lucros extraordinários.

Ao tentar fazer isto, o próprio mercado faria com que essas oportunidades de lucros

extraordinários desaparecessem.

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Forma Semiforte: Quando os preços dos títulos refletem todas as informações

publicamente disponíveis, incluindo as informações obtidas através de demonstrações

contábeis e informações históricas.

Neste sentido, o que difere a forma de eficiência semiforte da forma fraca é que

no primeiro caso não exige apenas que o mercado seja eficiente em relação aos preços

passados, mas que toda informação publicamente divulgada incorpore a formação dos

preços dos ativos. Sendo assim, na forma de eficiência semiforte, exige-se dos

investidores, além do levantamento do comportamento passado do preço dos ativos, um

maior aprofundamento teórico que lhes permita analisar de uma maneira mais

consistente as empresas e os setores da economia, o que demanda mais tempo, mais

recursos financeiros e intelectuais.

Mesmo nesta situação de eficiência semiforte, os investidores não conseguiriam

auferir lucros extraordinários, pois nos dias atuais as inovações tecnológicas permitem

com maior facilidade o acesso às informações e a manipulação dos dados contábeis para

analise de resultados das empresas e setores, com custos muito menores do que no

passado.

Forma forte: Quando a formação dos preços dos ativos engloba, além das

informações dos preços passados e, as informações publicamente disponíveis as

informações não disponíveis sobre um determinado ativo. Engloba, portanto todo o tipo

de informação sobre um ativo.

Está é a forma mais restritiva de eficiência, o que a torna praticamente

improvável, uma vez que se apenas um investidor a possuísse, este incorporaria a

informação no preço do ativo e, em breve o mercado perceberia este novo preço, não

refletindo, portanto em lucros extraordinários.

1.2) Mercado Eficiente

Um tema recorrente na área de finanças refere-se à hipótese de eficiência do

mercado acionário. Esta concepção parte da premissa de que um investidor não poderia

obter um retorno extraordinário no mercado de ações, ajustado simplesmente ao risco

atribuído. No entanto, muitos estudos empíricos têm comprovado o contrário, ou seja, a

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partir de algumas estratégias de investimentos é possível obter retorno maior com um

menor nível de risco.

Os resultados dos testes empíricos que não comprovam a eficiência do mercado

são genericamente denominados de “anomalias” do mercado acionário.

Durante um longo tempo os testes de eficiência de mercado aplicados não

comprovavam a existência de anomalias ou eram considerados irrelevantes, de tal modo

que a eficiência de mercado continuava a ser mantida. Entretanto, aos poucos esta

posição foi sendo revertida.

Conforme observa DAMODARAN (1997), a questão da eficiência do mercado

continua gerando muita polêmica entre os diversos estudos realizados.

“A eficiência do mercado foi testada em centenas de estudos ao longo das últimas três décadas. As evidências destes estudos têm sido às vezes contraditórias, pois os pesquisadores examinaram as mesmas questões de várias formas diferentes, utilizando diferentes técnicas estatísticas e períodos de tempo para seus testes. O pêndulo da opinião de consenso tem se movimentado entre a visão de que os mercados são, em sua grande maioria, eficiente e a visão de que há ineficiências significantes nos mercado financeiros”. (p.201)

As conseqüências de um mercado ineficiente são várias. Como exemplo,

podemos citar: a análise fundamentalista poderia ser lucrativa, uma vez que existiriam

diversas ações que estariam sendo negociadas abaixo de seu valor intrínseco, que

poderiam ser adquiridas, e outras, que estariam acima de seu valor potencial, que

deveriam ser vendidas, proporcionando dessa forma lucros nas transações; também

poderiam ser obtidas vantagens na análise gráfica, pois as informações sendo absorvidas

de forma defasada iriam levar a um ajuste mais demorado das ações, fato que

possibilitaria a visualização em gráficos desse tipo de tendência e a obtenção de

operações lucrativas; e uma outra implicação, seria a invalidação da Teoria do Mercado

de Capitais, pois esta parte da premissa de que os mercados são eficientes.

1.3) A Eficiência do Mercado Acionário

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De acordo com FAMA(1970) um mercado é chamado de eficiente quando os

preços de seus títulos refletem integralmente todas as informações disponíveis naquele

momento. Sendo assim, para que o mercado de capitais seja eficiente, há necessidade de

que os preços das ações sejam justos, isto é, temos que ter um conhecimento dos

prováveis retornos futuros, além de determinarmos a taxa de retorno.

A determinação do preço justo está intimamente relacionada ao processo de

eficiência no processamento das informações, ou seja, qualquer informação disponível

estaria incorporada aos preços das ações. Desse modo, não haveria espaço para qualquer

ganho anormal no mercado acionário, caso o mercado de capitais fosse eficiente.

Segundo FAMA(1970), as condições para termos um mercado eficiente seriam:

“a) Inexistência de custos de transação em negociação de títulos. b)Todas as informações disponíveis estão isentas de custos para os participantes do mercado. c) Há expectativa homogênea em relação aos retornos futuros de cada título.” (p. 387)

Assim, para termos um mercado com eficiência informacional haveria a

necessidade de equilíbrio de mercado, o que conforme vários testes realizados não há

comprovação empírica.

Os preços, portanto, teriam que necessariamente refletir todas as informações

disponíveis de forma que nenhum investidor poderia obter ganho com a compra ou a

venda de títulos.

Na visão de DAMODARAM (1997)

“Um mercado eficiente é aquele em que o preço de mercado é uma estimativa não-tendenciosa do valor real do investimento”. (p.184)

Na sua conceituação, os preços de mercado não exigem necessariamente

espelhar o preço justo das ações a todo momento, ou seja, podem existir ações

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subavaliadas ou superavaliadas. No entanto, a probabilidade de encontrar tais ativos é a

mesma, não compensando, dessa forma, o custo de encontrá-los.

Um outro ponto levantado é de que existem diferenças de eficiência de mercado

em relação aos investidores. Isto ocorre, porque os custos, principalmente de transação,

são diferentes de investidor para investidor.

1.4) Principais Testes de Eficiência de Mercado

Atualmente os testes de eficiência de mercado são classificados de acordo com a

nova proposta de FAMA (1991), em três grupos: os testes de previsibilidade de retorno,

estudos de eventos e testes de informação privada, os quais respectivamente procuram

verificar as três formas de eficiência, fraca, semiforte e forte, citadas acima.

Os testes de eficiência do mercado podem ser ajustados ao risco ou não

ajustados ao risco. Os testes que são ajustados ao risco normalmente baseiam-se em

uma ferramenta conhecida o modelo Capital Asset Pricing Model (CAPM), no qual

partindo da premissa que o modelo de precificação está correto, não deveria existir

lucro extraordinário ajustados aos riscos do ativo. No entanto, caso ocorra estes lucros,

teríamos uma comprovação contra a eficiência de mercado.

- Testes de Previsibilidade de Retornos (Evidência da Forma Fraca): estes teste

baseiam-se na análise da aleatoriedade temporal de taxas de retorno dos ativos.

Sendo a metodologia do teste a aleatoriedade dos dados, podem ocorrer coletas

de dados bons e ruins, que por fim influenciarão o resultado da análise. Porém, sendo

aceita a aleatoriedade, diz que se aceita o teste de mercado eficiente na forma fraca. Os

primeiros testes empíricos para avaliação da forma fraca foram: de autocorrelação

serial, resultado de estratégias de filtro e testes de corrida de sinais.2

Os testes de autocorrelação serial avaliam o grau de dependência entre as taxas

de rentabilidade de um dia com as taxas de rentabilidade de dias anteriores. Uma

correlação serial de zero significaria que as mudanças de preços em períodos de tempos

2 Para uma maior discussão dos testes de eficiência fraca dos mercados de capitais ver por exemplo: BRITO, Ney Roberto Ottoni de. Eficiência informacional fraca de mercados de capitais sob condições de Inflação. Revista Brasileira de Mercado de Capitais, v.4, n.10, p. 63-85, jan/abr, 1978.

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consecutivos não seriam correlacionáveis entre si, rejeitando dessa forma que os

investidores poderiam obter retornos extraordinários a partir de informações passadas.

Este teste é valido no mercado de capitais mais desenvolvidos na forma eficiente

fraca, apenas em períodos curtos de tempo.

Os testes de filtro consistem na avaliação de dependência do tipo senoidal. Ou

seja, a estratégia utilizada é a compra de ativos caso o preço suba em X% e a

manutenção até que o preço caia de pelo menos X%. Estes testes podem adotar as mais

variadas estratégias e magnitude de mudanças de X% nas regras de filtragem.

Os testes de corrida de sinais analisam as taxas de variação de preço dos ativos

com o mesmo sinal em diversos dias consecutivos. Desse modo, para que o mercado

fosse eficiente não deveriam existir longos períodos de um mesmo sinal.

- Estudos de Eventos (Evidência da Forma Semiforte): Este teste baseia-se no

impacto sobre os preços das novas informações, tais como: lucros, anúncio de

dividendos, fusões, incorporações, desdobramentos, etc. Quando são publicadas estas

informações, esperasse que os investidores do mercado absorvessem estas informações

e ajustem os preços dos ativos.

A preocupação deste teste está ligada à velocidade com que estes ajustes

ocorrem. Para que o mercado seja eficiente, existe a necessidade de que os ajuste

ocorram de forma instantânea e não tendenciosa. Isto pode ser observado nos gráficos

abaixo de reações de mercado a novas informações. Sendo que neste caso estamos

considerando informações positivas quanto à variação nos preços dos ativos.

Conforme os gráficos apresentados, apenas o A, representa de fato um mercado

eficiente, onde o preço reflete instantaneamente uma nova informação, enquanto o B

representa um “mercado de aprendizado”, onde a divulgação de algum fato relevante

implica em uma variação gradual no preço. Por fim, o gráfico C, representa um

“mercado com reação exagerada”, onde o preço e ajustado instantaneamente a nova

informação, porém em seguida é corrigido em conseqüência do exagero no ajuste de tal

preço.

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Figura 1: Reações Contrastantes de Mercado a Comunicação de Fatos

Relevantes.

Gráfico (A) Gráfico (B) Gráfico (C)

Fonte: DAMODARAM (1997: 211)

De acordo com a (HME), ganhos excepcionais nos mercados acionários

restringem-se a realocações de portfólios motivadas por mudanças na demanda por

liquidez ou na propensão ao risco, ou até mesmo nos padrões de oferta.

Sendo aleatórias essas trocas de posições, apenas mudanças nos retornos

associadas a motivações tributárias seriam previsíveis, podendo explicar, por exemplo,

o efeito janeiro.

Portanto, não se justificaria despender tempo e recursos para obter informações

públicas com o propósito de conseguir retornos acima do retorno médio do mercado,

uma vez que essas informações já estariam incorporadas nos preços (Fama, 1970).

A suposição da (HME) de que as informações são as mesmas para todos os

investidores elimina as oportunidades de ganhos extraordinários. Somente se um

investidor tivesse acesso privilegiado a novas informações relevantes sobre o ativo é

que poderia “vencer o mercado”. Portanto, exceto no caso de informação privilegiada,

seria mais adequado que mantivesse por um longo período de tempo um portifólio

diversificado de ações.

Em uma versão mais refinada, a (HME) prescinde das suposições de que todos

os investidores estejam igualmente informados sobre os fundamentos de um ativo

financeiro ou de que tenham expectativas racionais sobre seu preço futuro.

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Poderiam, ainda, existir noise traders3 (investidores desinformados) cuja atuação

levasse a desvios entre preços de mercado e valor de fundamento. Duraria pouco,

porém, essas discrepâncias, ainda que existentes e envolvendo custos de transação

baixos, as oportunidades de arbitragem seriam rapidamente exploradas.

Assim, a diferença entre valor de fundamento do ativo (estimado de acordo

com as ER) e seu preço de mercado (distorcido pela ação dos noise traders)

forneceria o incentivo para que os investidores informados revelassem as

informações de que dispõem, transmitindo-as aos preços.

2) “ANOMALIAS” NOS MERCADOS FINANCEIROS

Análises empíricas e testes experimentais têm fornecido evidências copiosas de

que, em muitas situações, as decisões financeiras desviam-se bastante daquelas

implicadas pelo tipo de racionalidade sobre a qual se sustenta a (HME), colocando sua

validade sob suspeição.

Uma vez que essas “anomalias” constituem a razão de ser da investigação

empírica e teórica da (FC), representando o principal argumento na retórica

empreendida por seus pesquisadores para demonstrar a superioridade dessa abordagem

em relação à (HME), algumas delas são abaixo discutidas, ainda que sucintamente por

limitações de espaço.

2.1) Bolhas Financeiras

Muitos economistas identificam uma dinâmica típica em episódios de bolhas

especulativas — situação em que os preços de mercado dos ativos excedem

significativa e prolongadamente os valores de seus fundamentos econômicos. As bolhas

seriam deflagradas por algum deslocamento (displacement) nos fundamentos

econômicos, gerando uma reação exageradamente otimista dos investidores. A

3 O termo noise trader refere-se a investidores que, sob a ótica da hipótese das expectativas racionais, tomam decisões não racionais (Black, 1986)

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expansão acelerada subseqüente no volume de transações disseminaria as expectativas

otimistas, contribuindo para criar e realimentar a euforia característica de qualquer

bolha.

Não raro os investidores passam a crer na emergência de uma “nova era” de

opulência e segurança ininterruptas, crença sancionada e difundida por analistas e pela

mídia para racionalizar o próprio aumento espetacular de preços. Mesmo os investidores

racionais, que reconhecem o exagero dos preços nos mercado dos ativos vis-à-vis seus

respectivos valores de fundamento, atuariam de modo desestabilizador, adquirindo os

ativos sob a expectativa de revendê-los com lucro logo depois.

A euforia é geralmente acompanhada por uma forte expansão do crédito e do

grau de alavancagem, facilitando e aprofundando a especulação e a desestabilização. O

sistema bancário incha e surgem novas instituições e instrumentos financeiros, formais

e informais, para explorar a demanda crescente por ativos especulativos estimulada

pelos preços em escalada. As próprias inovações financeiras que viabilizam a

alavancagem são percebidas como uma confirmação da “nova era”.

O desfecho da bolha ocorreria com difusão do pessimismo: alguns especuladores

que haviam conduzido a tendência de alta liquidariam seus ativos, desencadeando o

pânico e a deflação dos ativos. Racionalizações a posteriori sobre as causas que

precipitaram o colapso dos ativos tendem a fazer tabula rasa dos exageros e das

fragilidades dos “fundamentos” que haviam impulsionado os preços até o momento do

pânico.

A ineficiência dos mercados de capital manifesta-se também na freqüente

correlação entre o volume de títulos emitidos pelas empresas e o ciclo econômico: em

geral, a emissão de novas ações concentra-se nos períodos de prosperidade econômica e

de alta nos mercados acionários, enquanto a emissão de títulos de dívida ocorre,

sobretudo em momentos em que as taxas de juros estão baixas. Se os mercados fossem

eficientes, o momento das emissões desses títulos não deveria coincidir com a etapa de

expansão da economia.

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2.2) Previsibilidade dos Retornos dos Ativos

Como visto antes, a (HME) implica que os preços dos ativos seguem uma

trajetória aleatória: mudanças nos preços decorrem de novas informações, razão pela

qual os investidores não são capazes de prevê-las. Evidências da previsibilidade dos

preços das ações com base em informações disponíveis, ações com retorno

relativamente alto durante certo período tendem a experimentar um retorno

relativamente baixo no período seguinte.

O teste que se realiza consiste em primeiro lugar em identificar ações que

apresentaram os melhores e os piores desempenhos nos três anos anteriores a uma data

de referência e, depois, analisar as variações nos valores dos portfólios dos grupos de

ações vencedoras e perdedoras nos três anos subseqüentes.

Constatam que no longo prazo prevalece a tendência de reversão à média (mean

reversion) dos retornos das ações: o retorno do primeiro grupo é bem inferior ao do

segundo.

Na mesma linha de “erros de expectativas”, ações menos valorizadas no período

anterior e que apresentam preços baixos em relação aos ganhos, dividendos, preços

históricos, ou outros fundamentos (as chamadas value stocks) geram retornos bem

superiores aos das ações de empresas que apresentaram crescimento elevado dos

retornos ou das receitas (denominadas growth stocks).

O retorno maior seria explicado essencialmente pela “reação exagerada”, e não

pelo maior risco ou pela baixa liquidez, nem pelo custo relativamente alto de se ter

acesso a informações para avaliar as value stocks.

Fama (1998) argumenta que tais resultados são aleatórios, e que as reações

exageradas aparentam ser tão freqüente quanto à “sub-reações” (underreactions).

Sustenta que se fossem válidos os resultados acima mencionados, deveriam existir

oportunidades sistemáticas de retornos anormais, cuja ocorrência é por ele descartada.

Duas outras anomalias recorrentes no mercado acionário são os retornos

sistematicamente superiores das ações de pequenas empresas, mesmo se ajustados pelo

risco, e os retornos maiores das ações em janeiro. Ambas caracterizam oportunidades

não exploradas de lucros acima da média, em conflito com a (HME) de que essas

oportunidades não existem ou são efêmeras.

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Motivações tributárias poderiam ser uma explicação do efeito janeiro baseado na

suposição da racionalidade dos indivíduos. Por exemplo, investidores tentam

deliberadamente reduzir o imposto de renda vendendo em dezembro as ações que deram

prejuízo no ano para compensar os ganhos de capital proporcionados por outras ações.

Entretanto, investidores institucionais, isentos de impostos sobre ganhos de capital,

deveriam neutralizar essa tendência, comprando em dezembro e vendendo em janeiro.

Quanto ao maior retorno relativo das ações de pequenas empresas, haveria duas

possíveis explicações fundamentadas no comportamento racional dos investidores: a

menor liquidez dessas ações e o custo maior de obter informações para avaliá-las.

2.3) Violação da Lei do Preço Único

Mesmo considerando os custos de transação, o valor negociado no mercado das

quotas dos fundos de investimento do tipo “closed-end” diverge significativamente do

valor do quociente entre o valor de mercado dos títulos que compõem sua carteira

(líquido de seus passivos) e o número de quotas. Ademais, a magnitude dessa

discrepância varia bastante no tempo (podendo ser negativa ou positiva) e entre os

diversos fundos.

Uma explicação plausível para essa divergência seria a capacidade dos gestores

do fundo de gerar lucros no futuro. Todavia, estudos empíricos não confirmam uma

correlação significante entre ágios/descontos passados nesse tipo de fundos e

desempenho subseqüente (De Long et al., 1990).

Descontos poderiam resultar ainda do fato de que alguns fundos mantivessem

em carteira ações de baixa liquidez, dificultando um eventual desmanche dessas

posições. Entretanto, a grande maioria dos fundos cujas quotas são negociadas com

desconto não mantém posições relevantes em ações com liquidez baixa.

Custos de agência e taxas elevadas de administração constituiriam uma terceira

tentativa de explicação. Outro exemplo de violação da lei do preço único é a aliança

constituída em 1907 entre a Royal Dutch Petroleum e a Shell Transport and Trading,

cujas participações na Royal Dutch/Shell eram de, respectivamente, 60% e 40%. Uma

vez que as ações das duas empresas originais ainda são negociadas separadamente em

diversas bolsas — as da Royal Dutch Petroleum principalmente em Nova Iorque e

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Amsterdã e as da Shell, sobretudo em Londres —, seria de se esperar que o valor de

mercado das ações da Royal Dutch fosse 50% maior do que o das ações da Shell.

Entretanto, entre 1980 e 1995 os desvios da paridade oscilaram entre uma

subvalorização de 35% e uma sobrevalorização de 10% .

2.4) Volatilidade Excessiva nos Preços dos Ativos

Como observa Shiller (1981), a amplitude das flutuações nos índices ou nos

preços das ações é muito alta para ser explicada apenas pelo surgimento de novas

informações aos investidores. Evidências diversas apontam que não há correlação entre

alterações nos preços dos ativos e a chegada de novas informações relevantes.

Outra anomalia relativa à excessiva volatilidade dos preços ocorre nos mercados

de opções de compra e venda de ações, onde existem grandes referenciais de

volatilidade implícita entre opções de mesmas características com preços de exercício

diferentes. Por serem estimadas para o mesmo ativo no mesmo período, tais

volatilidades, que são o único fator não observável na precificação de uma opção de

compra ou de venda, deveriam ser iguais.

Todavia, as opções de compra com preços de exercício abaixo do preço corrente

de mercado (in-the-money) apresentam, em geral, volatilidade implícita maior que as

opções de compra com preços de exercício acima do preço corrente de mercado (out-of-

money). Em suma, flutuações nos preços de mercado dos ativos parecem ser muito mais

intensas do que as flutuações nos seus respectivos valores de fundamento, havendo

reação excessiva dos mercados a novas informações e sendo lenta a correção dos

“erros” nos preços.

2.5) Posse Prolongada de Ativos Perdedores

Alguns estudos comprovam que investidores tendem a liquidar rapidamente

ativos que geraram ganhos de capital ao mesmo tempo em que relutam a se desfazer de

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posições que dariam prejuízo. Essa aversão à perda (loss aversion) é expressa nos

mercados acionários, no mercado de imóveis e em fundos mútuos de investimento.

Nesse sentido, a tendência dos investidores de manter posições perdedoras por

muito mais tempo que as posições vencedoras está também relacionada aos maiores

custos de transação em relação ao valor do investimento poderiam tornar os investidores

menos propensos a negociar ações de menor valor.

2.6) Excessiva Negociação

De acordo com a (HME), as negociações de ações são motivadas essencialmente

por alterações na demanda por liquidez ou por diversificação de risco. Entretanto, os

volumes negociados nos mercados financeiros são muito elevados para serem

explicados por necessidades de liquidez ou de balanceamento de portfólios.

Observa-se no mercado também que os investidores tendem a negociar

relativamente mais ações de empresas de pequeno porte que tiveram bons retornos em

passado recente. Essa estratégia resulta, porém, em retornos médios bem abaixo do que

se tivessem investido em um fundo indexado a ações de empresas de pequeno porte.

2.7) Diversificação Ingênua

As decisões de investimento dos indivíduos nos seus planos de poupança de

contribuição definida obedecem a um critério de diversificação ingênua (naive

diversification). Na sua forma extrema, as pessoas tendem a dividir igualmente sua

contribuição entre as n opções de fundos oferecidas pelo plano de poupança de

aposentadoria, independentemente das características particulares dessas opções.

Ignoram assim se os retornos e riscos esperados associados a essa “estratégia”

estão de acordo com suas preferências de longo prazo.

A conseqüência é que as decisões de alocação de portifólio do indivíduo

dependem da oferta relativa de fundos de renda variável e de fundos de renda fixa do

seu plano de aposentadoria. Por exemplo, se determinado plano oferece dois fundos de

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ações e um de renda fixa, a maioria dos indivíduos aloca um terço dos seus recursos em

cada fundo, resultando em uma carteira com 2/3 dos ativos concentrados em ações.

2.8) Aquisições de Empresas e a Maldição do Vencedor

Muitas empresas pagam prêmios sobre o preço de mercado para adquirir outras

empresas, a despeito de evidências de que as empresas compradoras lucram pouco ou

nada, enquanto os acionistas da empresa adquirida obtêm retornos consideráveis. Por

exemplo, em fusões amigáveis e leilões o retorno posterior para os acionistas das

empresas compradoras é substancialmente inferior ao retorno dos acionistas das

empresas vendidas.

A maldição do vencedor pode se manifestar de duas formas: o vencedor pode ter

prejuízo por pagar pelo ativo um preço maior do que realmente vale, ou, mesmo se o

ativo gerar lucro, o retorno é menor do que o estimado quando ele fez a oferta.

Discutidos os diversos tipos de evidência sobre discrepâncias sistemáticas entre

as decisões reais dos indivíduos e as implicações da (HME), a seção seguinte apresenta

as bases do arcabouço teórico que a (FC) desenvolveu para explicar essas anomalias.

2.9) Limites à Arbitragem

Os defensores da (HME) sustentam que “anomalias” nos mercados financeiros

seriam eliminadas pelo aprendizado com os erros ou por arbitragem. Diferentemente, a

FC mostra que essas anomalias, provocadas por vieses comportamentais, são

persistentes, atribuindo essa persistência a limites à arbitragem.

De Long et al. (1990) e Shleifer (2000) argumentam que os sentimentos dos

noise traders são em grande medidas imprevisíveis, criando o risco para as operações de

arbitragem de que os “preços errados” resultantes das percepções equivocadas, em vez

de serem corrigidos, afastem-se ainda mais dos “fundamentos”. Para que esse risco, que

torna a arbitragem menos atraente, fosse eliminada, a seguinte condição deveriam ser

satisfeitas:

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(a) Venda a descoberto (short selling) sem risco e sem custo: essa operação ou é

legalmente coibida ou proibida, ou, quando permitida, envolve diversas dificuldades.

Mesmo em mercados mais desenvolvidos em que os arbitradores podem “alugar” títulos

e vendê-los a descoberto, “tais empréstimos funcionam apenas se a corretora (broker)

retém uma posição de propriedade (long) no título ou na conta de um cliente” (Shleifer,

2000). Em mercados pouco líquidos ou em que os títulos mobiliários negociados estão

sob o controle de poucos investidores dispostos a especular contra arbitradores, estes

poderiam ter de pagar um prêmio elevado para adquirir os títulos que venderam a

descoberto, tornando arriscada a arbitragem. Isso dificulta a venda a descoberto de

títulos sobrevalorizados e, indiretamente, a compra de títulos subvalorizados.

(b) O conhecimento pelos arbitradores de como os noise traders tomam decisões

(como formam suas opiniões, quais seus sentimentos etc.).

(c) Perfeição dos mercados de capital e ausência de custos nas transações de

títulos mobiliários: em mercados menos líquidos, são significativos os custos de

corretagem, os custos associados a depósito de altas margens de garantia e à

eventualidade de se ter de cobrir uma venda short. Ademais, imperfeições nos mercados

financeiros ou liquidez limitada no sistema bancário podem restringir as operações de

arbitragem. Se os market makers sofrem restrições financeiras, os mercados das ações

nas quais se especializam terão baixa liquidez e funcionarão, portanto, de maneira

ineficiente, impedindo que os preços das ações cumpram seu papel informacional.

(d) Atuação de muitos investidores com horizonte longo de decisão: em

mercados nos quais os investidores não informados representam uma fração importante

dos investidores, o preço pode demorar a retornar a seu valor de fundamento.

Um investidor informado pode lucrar apostando na persistência da tendência

“errada” do mercado. Durante uma bolha especulativa, um investidor racional pode

adquirir ações de uma empresa, mesmo sabendo que seu preço está exageradamente

inflado, motivado pela perspectiva de revendê-las por preços ainda maiores.

Por sua vez, o argumento de que os preços “corretos” acabam por prevalecer em

algum momento é omisso quanto à duração do processo de convergência.

Ademais, os arbitradores muitas vezes não podem esperar o tempo necessário

para o alinhamento entre preços de mercado e “valores de fundamento”, sendo levados

a liquidar precocemente ativos adquiridos a preços subvalorizados. Isso limita as

operações de arbitragem, possibilitando que os noise traders se beneficiem da distorção

que criaram nos preços e do risco a ela associado.

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Nem sempre, portanto, investidores mais bem informados atuando

racionalmente podem lucrar à custa dos noise traders. Até mesmo no caso de ações de

empresas fundamentalmente idênticas, um arbitrador que aposte contra a discrepância

nos seus preços corre o risco de que ela aumente, obrigando-o a liquidar com perdas sua

posição, o que inibe arbitradores avessos ao risco a apostar contra preços distintos de

títulos desse tipo.

Assim, decisões erradas dos noise traders não necessariamente criam

oportunidades de arbitragem sem risco a outros agentes, explicando a persistência dos

desvios.

Um exemplo eloqüente dessa situação é o caso da discrepância entre o preço

relativo de mercado das ações da Royal Dutch e da Shell e o “valor correto”. Essas

limitações à arbitragem são ampliadas pelo fato de que os arbitradores são

predominantemente “agentes” — fundos de investimento, de pensão ou de hedge que

administram recursos de terceiros (Shleifer 2000).

Diferentemente de arbitradores que operam com recursos próprios, mais

propensos a considerar retornos esperados, os proprietários dos recursos desses fundos

tomam decisões de portifólio com base, sobretudo na rentabilidade recente. Se esta for

inferior à dos demais, os poupadores tenderão a transferir suas aplicações para os

fundos com maior rentabilidade passada, forçando todos a terem como foco o

desempenho de curto prazo.

Além de contrair os recursos fornecidos por quotistas, a baixa rentabilidade de

um fundo “arbitrador” pode dificultar a renovação do crédito, pois credores tendem a

exigir o resgate de seus empréstimos quando o valor dos títulos usados como garantia

cai, mesmo havendo oportunidades de ganhos com arbitragem.

Desse modo, o próprio aumento no desalinhamento entre preço de mercado e

valor de fundamento, embora amplie os ganhos potenciais de arbitragem, restringe

financeiramente os arbitradores.

Em suma, por serem avaliados periodicamente, os gestores de fundos não

comportamentais e a hipótese... podem insistir em operações em que a convergência

para os “preços corretos” seja demorada, tornando-os sensíveis aos retornos de curto

prazo, e mais relutantes a apostar contra preços incorretos, resultando no que Shleifer

(p. 89) denomina “arbitragem baseada em performance” (performance based arbitrage),

cuja capacidade de eliminar ineficiências de mercado é limitada.

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Quanto ao argumento de que os indivíduos aprendem com os erros, a FC o

rebate apontando que há situações em que os agentes não têm oportunidade de

aprendizado, como no caso da formação de poupança ao longo da vida visando à

aposentadoria.

Apontadas na seção anterior evidências empíricas de decisões financeiras não

explicadas pela (HME), buscou-se nesta seção apresentar os conceitos e arcabouço

teórico que a (FC) vem desenvolvendo para subsumir essas anomalias.

Mostrou-se que, embora ainda careçam de maior elaboração para serem

integrados em um arcabouço teórico mais geral, os conceitos teóricos de “vieses no

processo cognitivo” (efeitos certeza, reflexão, isolamento, dependência do contexto e

aversão à perda), de “limites ao aprendizado” (autoconfiança e otimismo excessivo) e

de “limites à arbitragem” têm sido capazes de explicar em boa parte os fenômenos

financeiros que, sob a ótica da HME, permaneciam como anomalias.

As (FC) surge e se desenvolve como um programa de pesquisa teórico e

empírico norteado pela crítica a (HME) e pela busca de explicações para decisões e

comportamentos financeiros que essa hipótese não explica. Para isso, foram

apresentadas a (HME), suas implicações e as anomalias que ela não explica, e discutiu-

se o arcabouço teórico que as (FC) vem desenvolvendo para superar essas deficiências.

Abaixo, são condensados os principais argumentos explorados ao longo do

texto. Se válida, a (HME) implicaria, entre outros resultados, que mudanças nos preços

refletiriam apenas novas informações, que os volumes de transação nos mercados

financeiros seriam modestos, que os preços dos ativos financeiros apresentariam uma

trajetória aleatória, e que os indivíduos diversificariam seus portfólios.

Acumulam-se, entretanto, evidências sobre o irrealismo dessa hipótese e de suas

previsões: os portifólios são pouco diversificados, os fundos de ações são ativamente

administrados, há discrepâncias persistentes entre preços de mercado e valores baseados

em fundamentos, ocorre reversão à média, etc.

De acordo com essa linha de investigação, dados a racionalidade limitada e os

custos para alcançar as soluções “ótimas” (deliberation costs), os indivíduos baseiam-se

em um número limitado de princípios heurísticos que tornam suas operações mais

simples de julgamentos as tarefas complexas de avaliar as probabilidades e de prever

seus respectivos valores.

Defensores da (HME) alegam que as (FC) carece de generalidade e que as

supostas “anomalias” resultam de problemas de especificação nos testes ou ocorrem de

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maneira randômica e isolada, não gerando implicações, no agregado, distintas das

previstas.

Para eles, essas anomalias não podem persistir, pois proporcionam

oportunidades de arbitragem que, dado o postulado da racionalidade, são exploradas.

As (FC) contra-argumenta, porém, que operações de arbitragem fracassam em

suprimir os vieses de comportamento que levam às anomalias porque a atuação dos

noise traders cria o risco de que as distorções que geram possam se ampliar com o

tempo.

Sendo os arbitradores predominantemente administradores de fundos de

investimentos, avaliados, sobretudo pelo seu desempenho no curto prazo, não podem

manter operações de arbitragem cujos ganhos demoram a aparecer.

Como enfatizam Barberis e Thaler (2001), se os preços estão “corretos”, então

não existe oportunidade de lucros extraordinários, mas a ausência de oportunidades de

lucros extraordinários não implica que os preços estejam alinhados com os

fundamentos, porque existem limites à atuação de arbitradores.

As notórias limitações da teoria convencional de finanças para explicar a

formação dos preços dos ativos financeiros são em grande parte responsáveis pelo

amplo e crescente prestígio acadêmico que as (FC) vem conquistando.

O abandono da crença “monoteísta” na racionalidade ilimitada e a consideração

de fatores de ordem psicológica na análise de decisões e comportamentos financeiros

conferem-lhe maior realismo e atendem aos reiterados alertas sobre a estreiteza da

noção de homo economicus e a importância desses fatores.

Por isso vem sendo aplicada a um leque extenso de questões financeiras, como

financiamento e governança das empresas e regulamentação dos mercados financeiros.

Apostando na racionalidade dos economistas, Thaler (1999, p. 16) prevê que “em um

futuro não tão distante, o termo ‘finança comportamental’ será corretamente visto como

um termo redundante”. Entretanto, para que de fato se torne uma teoria mais geral e

subsuma a (HME), as (FC) tem de superar dois desafios interligados: desenvolver

estudos empíricos mais sistemáticos que gerem evidências suficientes para

generalizações e construir teorias mais integradas que vão além da reunião de conceitos

que expliquem ad hoc anomalias não explicadas pela (HME).

São tarefas complexas cujo sucesso, embora provável, ainda exige bastante

esforço. Portanto, é cedo para avaliar se a previsão de Thaler reflete fundamentos ou se

é mais uma manifestação de confiança excessiva.

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3) FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA FINANÇA COMPORTAMENTAL

O comportamento pode ser definido como qualquer coisa que um organismo

vivo faça ou qualquer ação de um indivíduo que possa ser observada. A palavra pode

ser usada com o significado de resposta a um estímulo.

A definição é relativamente muito inclusiva, mas dificilmente poderia ser mais

restrita. Comportamento nos animais envolve essencialmente instintos e hábitos

aprendidos; os primeiros sendo de natureza genética e biológica, os segundos de

natureza social e cultural.

Elegendo como foco de investigação as anomalias não explicadas pela (HME),

as (FC) tem desenvolvido conceitos e teorias baseadas, sobretudo em limitações

intrínsecas dos indivíduos que os impedem de decidir estritamente segundo os

princípios do homo economicus, como a maximização de utilidade, preferências

estáveis, processamento ótimo de informações etc.

Essas limitações estariam associadas também à força de vontade limitada,

engendrando decisões do indivíduo em desacordo com seus interesses de longo prazo,

ao auto-interesse limitado, ao altruísmo recíproco que faz os indivíduos agirem de

maneira justa se julgarem que os demais assim se comportam, ou em outras situações de

maneira oportunista caso entendam que os outros agem dessa forma.

Embora mesmo para a economia neoclássica o altruísmo seja compatível com o

auto-interesse, testes experimentais revelam comportamentos econômicos conflitantes

com o tipo de racionalidade subjacente a essa teoria. Por exemplo, em jogos envolvendo

o “dilema dos prisioneiros”, é freqüente a cooperação, a despeito de uma eventual ação

oportunista de um dos participantes prejudicar fortemente o outro.

3.1) A aversão à perda

A aversão à perda - principal conceito trabalhado pelas Finanças

Comportamentais - baseia-se na constatação de que as pessoas sentem muito mais dor

pelo que perdem do que prazer com um ganho equivalente. O fato de as pessoas não

encontrarem explicações sobre suas atitudes financeiras revela a atuação de desvios

cognitivos, gerados pela limitação de tempo, memória e atenção e, de desvios

emocionais (julgamento baseado nas emoções).

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Os estudos relacionados às (FC) foram incorporados ao contexto das finanças

nas últimas décadas, em decorrência das anomalias irracionais produzidas pelas crises

financeiras que não conseguiram ser explicada pelo Modelo Moderno de Finanças.

As Finanças Comportamentais contestam a idéia de que os agentes e os

mercados atuam sempre com racionalidade e passam a considerar o ser humano como

suscetível a cometer erros, agindo freqüentemente sob impulsos “irracionais” e

passionais.

Tais postulados sobre a natureza humana encontram sustentação na teoria

psicanalítica, uma vez que Freud operou uma cisão no pensamento racionalista

predominante desde Descartes, mostrando que o indivíduo é dividido entre os sistemas

consciente e inconsciente, onde a razão passa a ser apenas um efeito de superfície.

Nas últimas décadas, tanto os fundamentos teóricos como as provas empíricas

propostas como base da (HME) vêm sendo contestados.

Os alicerces que supostamente sustentam os mercados como eficientes, como a

arbitragem, têm-se revelado mais fracos do que poderiam supor os teóricos da eficiência

de mercado. Ao mesmo tempo, uma série de recentes estudos tem revertido algumas das

evidências iniciais que deram sustentação à hipótese.

É nesse cenário de questionamento que surgem as Finanças Comportamentais,

propondo uma visão alternativa dos mercados financeiros. Conforme Shleifer (2000),

nessa visão, a teoria econômica não leva a esperar um mercado financeiro eficiente,

pelo contrário: desvios significativos e sistemáticos da eficiência são esperados e

passíveis de continuidade por longos períodos de tempo.

Para o mesmo autor, as Finanças Comportamentais podem ser definidas

resumidamente como o estudo da falibilidade humana nos mercados competitivos.

Primeiramente é de difícil sustentação que pessoas em geral, particularmente

investidoras, são inteiramente racionais. Em um primeiro nível, investidores reagem a

informações irrelevantes, formando demanda por títulos – negociam boatos ao invés de

informações. Em segundo lugar, muitos dos mecanismos de arbitragem propostos pela

HME não são passíveis de plena implementação nos mercados reais. De forma

simplificada, pode-se dizer que as Finanças Comportamentais focam seu campo de

atuação exatamente nos supostos pilares da (HME): racionalidade do investidor e

arbitragem como ferramenta eficaz de correção de possíveis desvios.

As teorias tradicionais de Finanças, em sua quase totalidade, foram construídas a

partir de uma abordagem microeconômica neoclássica cujo paradigma central é a

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racionalidade dos agentes econômicos. Mais especificamente, assume-se que os

indivíduos que atuam nos mercados financeiros são capazes de atualizar corretamente

suas crenças após receberem novas informações e que suas decisões são consistentes

com o conceito de Utilidade.

O paradigma tradicional possui a significativa vantagem da simplicidade e

facilidade de modelagem do ponto de vista do pesquisador. Não obstante, a validade

deste arcabouço para descrever o comportamento dos mercados é uma questão de

natureza empírica. Se as teorias baseadas no agente racional fossem capazes de explicar

satisfatoriamente os mais importantes fenômenos investigados pela literatura de

Finanças, não haveria razão ou, pelo menos, não haveria forte motivação para se

questionar seus fundamentos e propor abordagens alternativas. No entanto, um vasto

conjunto de evidências empíricas produzidas nas últimas décadas revela que as teorias

disponíveis baseadas na suposição de racionalidade dos indivíduos não são capazes de

explicar a contento diversos fenômenos regularmente observados nos mercados

financeiros.

As dificuldades da teoria tradicional no que se refere à sua validade empírica

sugerem duas abordagens possíveis. A primeira é a reformulação das mesmas sem, no

entanto, abandonar o pressuposto de racionalidade dos agentes. A segunda consiste na

mudança de paradigma, a partir do reconhecimento de que as pessoas nem sempre se

comportam racionalmente. Este último orienta todo o campo das Finanças

Comportamentais, uma área de estudos de desenvolvimento recente e crescimento

acelerado.

Os limites à arbitragem estão relacionados com a dificuldade que os investidores

racionais podem enfrentar para desfazerem distorções provocadas por investidores

menos racionais. A psicologia, por sua vez, descreve com mais detalhe os possíveis

desvios da racionalidade pura que podem responder por estas distorções.

Os desvios em relação ao comportamento racional dos indivíduos são ligados à

natureza humana e devem ser incorporados à análise econômica como uma extensão

natural dos modelos tradicionais, uma vez que as evidências sugerem tanto que os

agentes são capazes de cometer certa variedade de erros sistemáticos, como também que

as distorções deles advindas têm importantes implicações econômicas.

Alguns dos estudos mais importantes na área de Finanças Comportamentais

mostram que em uma economia na qual agentes racionais e irracionais interagem entre

si, a irracionalidade pode influenciar significativamente os preços dos ativos. Não

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obstante, para que possam produzir predições mais detalhadas, os modelos

comportamentais precisam especificar a forma da irracionalidade dos agentes, ou seja,

de que maneira seu comportamento diverge da teoria normativa tradicional.

A psicologia desempenha aí um papel fundamental, ao fornecer o embasamento

teórico que explica os vieses cognitivos que influenciam as preferências, o

comportamento e as decisões das pessoas. Os fundamentos de Finanças

Comportamentais são discutidos mais detalhadamente a seguir.

3.2) Psicologia e Decisões Econômicas

A Economia Experimental acumula evidências de que os indivíduos violam o

axioma da transitividade, ignoram a lei dos grandes números, dão pouca importância a

informações relevantes, superestimam informações irrelevantes e confiam

exageradamente nas próprias previsões sobre eventos incertos. Para a (EC), esses

“desvios” decorrem de vieses no processo de decisão e de limites ao aprendizado.

As teorias fundamentadas nos "limites à arbitragem" mostram que investidores

irracionais provocam desvios dos preços observados em relação ao valor fundamental

dos ativos e que os agentes racionais têm restrições para aproveitar as oportunidades de

ganho decorrentes destas distorções.

Quando se deseja explicar em maior detalhe a estrutura das distorções

provocadas por agentes não racionais, pode-se recorrer ao vasto repertório de evidências

experimentais estudadas por psicólogos ou outros investigadores do comportamento

humano.

Com relação aos vieses relacionados às crenças dos indivíduos, destacam-se os

excessos de confiança, otimismo, os vieses da representatividade, conservadorismo,

perseverança, o viés da ancoragem e da disponibilidade, conforme analisaremos a

seguir.

3.3) Excesso de Confiança

Diversas pesquisas sobre o comportamento humano revelam que muitos

indivíduos apresentam excesso de confiança nas próprias habilidades de estimação, não

levando em consideração a verdadeira incerteza que existe no processo. Pessoas

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acreditam que suas estimativas em situações que envolvem incerteza são mais precisas

do que realmente são.

Este fenômeno de excesso de confiança decorrente do fato das pessoas

utilizarem suas estimativas iniciais provoca um viés em suas estimativas de intervalos

de confiança.

3.4) Otimismo

As pessoas normalmente fantasiam demais as suas habilidades e possibilidades,

acreditando que podiam fazer melhor do que realmente faziam e, ainda se consideram

melhores do que a média dos outros indivíduos.

3.5) Representatividade

Para os indivíduos que utilizam esta heurística, a probabilidade de ocorrência de

um evento específico está relacionada à probabilidade de ocorrência de um grupo de

eventos representados pelo evento específico.

Em outras palavras, as pessoas tendem a pensar sobre eventos ou objetos e a

fazer julgamentos sobre eles baseando-se em estereótipos previamente formados. E,

ainda, tendem a ignorar informações objetivamente relevantes ao estimar a

probabilidade de um evento quando há outras informações descritivas que são

fornecidas, mesmo quando estas não são relevantes para o problema.

Além disso, as pessoas freqüentemente apresentam o viés de não considerar o

papel do tamanho da amostra ao considerar a validade da informação obtida com base

na amostra como representativa para toda a população.

Os pesquisadores comportamentais utilizam o termo heurísticas para designar as

estratégias simplificadoras, utilizadas pelos indivíduos em seu processo cotidiano de

tomada de decisões.

Muitos indivíduos apresentam uma tendência à não considerar eventos

independentes como tal. Pessoas acreditam que eventos aleatórios e não-aleatórios se

equilibram.

Observa-se que muitas pessoas tendem a ignorar o fato de que eventos extremos

tendem a regredir à média em um número grande de tentativas.

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3.6) Perseverança

Há uma série de estudos que comprovam que as pessoas freqüentemente têm

opinião formada, o que provoca dois efeitos: elas relutam em procurar evidências que

contrariem suas crenças e ao encontrá-las, consideram-nas com excesso de ceticismo.

Isto acaba gerando um forte viés no processo decisório, pois não é possível

saber se algo é verdadeiro sem haver uma checagem de sua possível não-confirmação.

3.7) Ancoragem

Pesquisas demonstram que as pessoas constroem suas estimativas a partir de um

valor inicial, ou âncora, baseado em qualquer informação que lhes é fornecida,

ajustando-o para obter uma resposta final.

Entretanto, decisões tomadas em contextos idênticos podem ser bastante

diferentes em razão da presença de valores de referência distintos disponíveis para os

agentes, ainda que estes valores não devessem exercer grande impacto sobre a decisão

final.

3.8) Disponibilidade

Os vieses de disponibilidade estão relacionados com o fato de que os eventos

mais freqüentes são mais facilmente relembrados que os demais, e que os eventos mais

prováveis são mais lembrados que os improváveis.

A abordagem comportamental também se preocupa com as formas através das

quais os indivíduos definem suas preferências e as utilizam para tomarem decisões.

Duas das principais contribuições nesta área são a Teoria da Perspectiva,

introduzida por Amos Tversky e Daniel Kahneman (1974) e as pesquisas sobre a

aversão à ambigüidade.

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Os trabalhos destes dois psicólogos compreendendo os anos 1974 e 1979,

representam a base teórica para a análise do comportamento dos investidores,

desenvolvendo papel fundamental para o início do desenvolvimento das Finanças

Comportamentais.

3.9) Teoria da Perspectiva (Prospect Theory)

Uma etapa fundamental quando se procura modelar fenômenos financeiros como

o comportamento dos preços dos ativos é a suposição de premissas sobre as preferências

dos investidores, sobre como estes avaliam os riscos envolvidos em uma decisão.

A grande maioria de modelos assume que os investidores avaliam as alternativas

considerando a sua utilidade esperada.

Podemos considerar que as preferências dos indivíduos preenchem os requisitos

de completude, transitividade, continuidade e independência e, como decorrência,

podem ser representadas pela esperança de uma função de utilidade. No entanto,

pesquisas empíricas demonstraram que as pessoas não seguem tais abordagens

normativas quando tomam muitas de suas decisões.

Dentre todas as abordagens alternativas à teoria da utilidade esperada, a mais

utilizada pelos pesquisadores de Finanças Comportamentais é a Teoria da Perspectiva,

proposta por Tversky e Kahneman (1974). Os autores argumentam que cada decisão

tende a ser avaliada de forma independente, opondo-se à teoria da utilidade esperada.

A Teoria da Perspectiva argumenta que:

(a) Ganhos e perdas são avaliados relativamente a um ponto neutro de

referência;

(b) Resultados potenciais são expressos em termos de ganhos ou perdas relativos

ao ponto neutro fixado;

(c) As escolhas são regidas por uma função de valor em forma de “S” similar à

desenhada na figura abaixo;

(d) A maneira como o problema é apresentado (perspectiva) pode alterar o ponto

neutro de referência;

(e) A dor associada à perda de $X é maior que o prazer associado ao ganho dos

mesmos $X;

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(f) Há uma tendência a superavaliar eventos de pequena probabilidade e

subavaliar eventos de média e grande probabilidade.

Figura 2: Função de valor (hipotética) da Teoria da Perspectiva

Fonte: Adaptado de Kahneman e Tversky (1979)

3.10) Aversão à Ambigüidade

De acordo com Tversky e Kahneman (1974), avaliamos erroneamente as

probabilidades de ocorrências dos eventos incertos. A percepção da certeza de um

evento pode ser facilmente manipulada, gerando o que os autores denominaram de

pseudocerteza (quando o indivíduo acredita que determinado evento tem 100% ou 0%

de chances de ocorrer).

Os efeitos de certeza e de pseudocerteza levam a inconsistências de julgamento.

No entanto, de acordo com a teoria da perspectiva, os indivíduos atribuem maior valor

às certezas percebidas, ou às suas pseudocerteza.

Perdas Ganhos

Unidades de Valor

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4) O CONTEXTO DAS FINANÇAS COMPORTAMENTAIS NA ATUALIDADE

4.1) A Inserção de um Novo Modelo

Um dos pilares das teorias modernas de finanças é a de que investidores

racionais processam informações de forma mais objetiva possível, ou seja, quando

diante de incertezas (risco), tomam sempre a decisão mais racional.

Será que isso é totalmente verdade? Será que um investidor comum de bolsa de

valores, quando diante de incertezas, faz sempre a escolha mais racional? Quais as

ferramentas que podem ser utilizadas para uma análise correta? Será que ela existe de

fato?

De acordo com a teoria das Finanças Comportamentais, um indivíduo realiza

suas escolhas em duas fases: a primeira é uma fase preliminar de análise das

probabilidades oferecidas, quando normalmente se faz uma simplificação das

probabilidades. Na segunda fase, a probabilidade de valor mais alto é escolhida.

A separação das decisões em duas fases e principalmente, a fase de

simplificação das probabilidades, proporciona geralmente decisões viesadas ou erros

sistemáticos. Assim como o indivíduo tem dificuldade para julgar subjetivamente

quantidades físicas, tem também dificuldades para julgar subjetivamente

probabilidades.

Em seu primeiro artigo publicado, Thaler (1980) observou que um colega

economista e enófilo tinha comprado algumas garrafas de vinho Bordeux alguns anos

antes, por dez dólares, e que este mesmo vinho era vendido na época, em leilões, por

duzentos dólares. O economista bebia algumas garrafas em ocasiões especiais, porém

não comprava garrafas novas e se recusava a vender suas garrafas pelos duzentos

dólares. Thaler nomeou este fenômeno de efeito doação. Tal efeito acontece porque o

ser humano normalmente exige um preço muito mais alto para vender um objeto do que

estaria disposto a pagar pelo mesmo objeto.

Já o efeito disposição mostra que investidores tendem a vender rapidamente os

investimentos quando estes sobem de preço após a compra, e a reter por muito tempo

quando eles caem após a compra.

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Este efeito é decorrente de uma assimetria no modo como se tomam decisões

envolvendo ganhos ou perdas. Experimentos mostram que, em um grupo de pessoas, a

maioria se mostrou avessa ao risco quando se tratava de ganhos. Foi oferecidos a

possibilidade de um ganho certo de $3.000 ou uma loteria com um ganho de $4.000

com 80% de probabilidade e zero com 20% de probabilidade. A maioria optou pelos

$3.000 certos, quando o valor esperado da loteria era de $3.200, ou seja, mostrou

aversão a risco.

O mesmo grupo de pessoas se mostrou propenso ao risco quando se tratava de

perdas. Foi oferecidas a possibilidade de uma perda de $3.000 certa, contra uma loteria

com chance de perder de $4.000 com 80% de probabilidade e de não se perder nada

com 20% de probabilidade. Neste caso, a maioria optou pela loteria.

Podemos observar este efeito com freqüência no mercado de ações, onde os

agentes que possuem em seu portifólio uma ação que apresenta lucro em relação ao seu

preço de compra tendem vendê-la rapidamente. Por outro lado, investidores que

possuem em seu portifólio uma ação que apresenta perda em relação ao seu preço de

compra, têm dificuldade em se desfazer desta ação. E, quanto maior for o prejuízo,

maior a dificuldade de vender tal ação.

Estes sentimentos de esperança e medo que funcionam inversamente acabam

prejudicando o investidor. Quando este está perdendo dinheiro em uma ação, o seu

sentimento de perda deveria ser ampliado, pois estava errado quando escolheu esta

ação. Porém, o que se observa é que o investidor tem ampliado o seu sentimento de

esperança de que a ação deverá subir, ou seja, o investidor se torna propenso a não

“realizar” esta perda, assumindo assim que errou em sua escolha.

Mecanismo inverso ocorre com investimentos acertados, em que o investidor se

torna propenso a rapidamente “realizar” seus lucros.

E, de que maneira fugir desta “miopia com aversão a risco?”

O primeiro passo é tornar-se ciente de sua existência e avaliar o real motivo de

sua propensão à compra ou à venda de determinado investimento.

Qualquer decisão racional de vender ou comprar um determinado ativo deve ter

uma visão estritamente do futuro, ignorando o preço pelo qual este ativo entrou em sua

carteira. Não importa em nada quanto o investidor pagou por determinada ação há um

mês para decidir se deve vendê-la hoje ou não, somente importa se o investidor

compraria esta ação hoje, pelo preço que está cotada. Se a resposta é sim, deve-se

mantê-la em sua carteira. Se a resposta é não, deve-se vendê-la. Na verdade, a cada dia,

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um investidor está “comprando” novamente todas as ações que já possui em sua

carteira.

Profissionais de investimentos passam por um longo período de treinamento

para que seu processo de tomada de decisão funcione desta forma. Estes profissionais

normalmente contam com estruturas rígidas de controles operacionais e são obrigados a

serem extremamente disciplinados em suas decisões. Portanto, para o investidor pessoa

física, em geral faz mais sentido utilizar a experiência destes profissionais, através de

fundos de investimentos ou outros veículos, do que tentar por conta própria comprar e

vender ativos no mercado financeiro.

Daniel Kahneman e Vernon Smith ganharam o Prêmio Nobel em Ciências

Econômicas em outubro de 2002 por suas pesquisas realizadas independentemente,

sobre como as pessoas tomam suas decisões econômicas, Os dois professores

descobriram que:

“Não são sistematicamente racionais, conforme defendí a teoria econômica tradicional. Os investidores tomam decisões por razões emocionais, com base em premissas incertas, conseguem enxergar relações de causa e efeito onde não há nenhuma, e assim por diante.”

Por tanto, quais os efeitos disso sobre os mercados?

O fato do mercado acionário se basear em decisões cumulativas de indivíduos

seria sugestivo de que este mercado não é eficiente ao determinar o preço correto das

ações?

Será que há uma abundância de oportunidades de arbitrariedade?

Neste contexto, podemos dizer que os investidores apresentam atitudes viesadas

em função de como se comportam em relação a seus problemas e seus resultados,

contrapondo-se com as premissas da teoria moderna das finanças.

Assim, os princípios das Finanças Comportamentais estão voltados para os

seguintes objetivos: os erros de decisão dos investidores pela demasiada confiança em

regras ou modelos, a influência de como são divulgadas e absorvidas as informações

disponíveis e se os preços de equilíbrio são afetados por estes erros ou comportamentos

viesados?

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Seus princípios tem aplicação prática em várias áreas de atuação das finanças

tais como:

O processo psicológico que envolve a tomada decisão de investimento, suas

estratégias e seus resultados;

A análise do movimento dos mercados, onde os investidores apresentam

sentimentos viesados nas suas decisões frente às informações disponíveis, como por

exemplo, a sobre-valorização das informações que podem impactar na formação de

preços pelo comportamento humano.

Explicação de anomalias de mercado em sua análise das percepções, do processo

de formação de opiniões e de construção da memória dos indivíduos para auxiliar no

entendimento da formação de bolhas especulativas, por exemplo.

Relacionamento com clientes para consultores financeiros, o estudo do

comportamento dos indivíduos, como, por exemplo, vieses de percepção, nível de

arrependimento ou atitudes frente a diferentes estratégias, torna-se fundamental no

processo de aconselhamento dos investidores.

Desenvolvimento de produtos financeiros com foco a aversão ou propensão a

risco, a perdas, conforme os perfis do diversos investidores.

Contratação de profissionais para gestão de recursos financeiros que devem ter

habilidades técnicas e psicológicas adequadas para evitar armadilhas de tomada de

decisão, como, por exemplo, excesso de confiança.

4.1) Modelos de Finanças Comportamentais.

Os modelos das Finanças Comportamentais têm como fundamento a teoria de

prospecto ou da perspectiva, mecanismo onde as probabilidades são substituídas por

pesos de decisão e os valores são atribuídos aos ganhos e às perdas ao invés de serem

relacionados aos resultados finais.

A representação gráfica disto é uma função de valor que é côncava no domínio

dos ganhos e convexa no domínio das perdas e normalmente mais inclinada nas perdas

do que nos ganhos, como vimos no capitulo anterior (figura 2).

Recentemente, modelos teóricos baseados em comportamento dos investidores têm

sido propostos para explicar possíveis sobre-reações ou sub-reações de mercado. Nesse

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sentido, as evidências mostram a existência de uma tendência de sub-reação de curto

prazo e de uma tendência de os preços sobre-reagirem no longo prazo.

a) Modelo de Barberis, Shleifer e Vishny

Barberis, Shleifer e Vishny (1998) construíram um modelo financeiro centrado na

evidência da existência de dois vieses de julgamento baseados na psicologia cognitiva:

o viés da representatividade e o conservadorismo.

Esses autores estabelecem que os lucros das empresas seguem um passeio

aleatório, porém os investidores percebem a existência de duas regras de formação

distintas de lucros, com probabilidades diferentes. Para os investidores, a regra de

formação de lucros mais provável envolve reversão à média. Neste caso, as ações

tendem a apresentar um comportamento de sub-reação, uma vez que os investidores, de

maneira errada, pensam que as alterações recentes nos lucros são temporárias.

Outro possível regime de lucros, com menor probabilidade estimada de ocorrência,

refere-se à existência de uma tendência no comportamento dos lucros. Após algumas

sucessivas alterações de lucros com mesmo sinal (variações positivas ou variações

negativas consecutivas), os investidores se convencem de que o regime associado à

tendência dos lucros está em vigor e, incorretamente, extrapolam a tendência,

ocasionando uma sobre-reação do preço.

b) Modelo de Daniel, Hirshleifer e Subramanyam

Para Daniel, Hirshleifer e Subramanyam (1998), no mercado existem dois tipos de

investidores os informados e os não-informados. Os investidores sem informação não

apresentam vieses de julgamento. Por outro lado os investidores informados estão

sujeitos a dois vieses: o excesso de confiança e a sobre-valorização de suas próprias

percepções.

O excesso de confiança leva os investidores a exagerarem a precisão de suas

análises particulares sobre o valor de um ativo. Esses investidores atribuem menor

ponderação às análises ou avaliações disponíveis publicamente, especialmente quando

os sinais públicos e suas avaliações particulares são contraditórios. Assim, a

sobrevalorização da informação do investidor e a sub-valorização da informação pública

tendem a produzir momento ou sub-reação no curto prazo e a reversão ou sobre-reação

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no longo prazo, quando a informação pública tende a superar os vieses

comportamentais.

c) Modelo de Hong e Stein

Hong e Stein (1999) estabeleceram que a precificação de ativos está ligada às

interações entre agentes heterogêneos não completamente racionais. Sendo estes

expectadores de notícias e operadores de momento. Os expectadores de notícias fazem

estimativas que são condicionadas apenas a opiniões particulares que formam sobre

fundamentos futuros, ignorando assim a informação sobre o histórico de preços

passados. Já os operadores de momento condicionam suas análises apenas em medidas

simples de preços passados e não observam notícias sobre fundamentos.

Neste modelo, supõe-se inicialmente um mercado onde apenas os expectadores de

notícia atuam e onde pode haver uma certa sub-reação, pois a informação é transmitida

com defasagem e, portanto, parcialmente incorporada nos preços no instante em que é

revelada ao mercado, levando à sub-reação.

Quando um grupo de operadores de momento é incluído neste mercado, estes

tentarão obter resultados em função da existência da sub-reação. Porém, se estes agentes

realizam estratégias baseados na observação de preços passados, tenderão a extrapolar

os preços de mercado além de seus valores intrínsecos, criando momento excessivo que

inevitavelmente conduz à sobre-reação. Assim, neste modelo, a existência da sub-reação

representa a origem da sobre-reação.

Estes estudos sobre sub-reação e sobre-reação podem identificar se fatores

comportamentais podem influenciar de alguma maneira a precificação dos ativos, pois

não dão apenas importância aos resultados de mercado tais como: Preço, volume,

dividendo e outros. Mas, volta sua atenção aos agentes que atuam no mercado, como

investidores, administradores e outros.

Nesse sentido, as Finanças Comportamentais abrem o caminho de que o

entendimento dos fenômenos do mercado só são possíveis a partir de uma análise da

psicologia dos indivíduos que atuam sobre este mercado.

O fato é que pelo comportamento dos indivíduos, verifica-se que estes são

suscetíveis a erros cognitivos (ligados à limitação de tempo, memória e atenção) e,

emocionais (julgamento baseado apenas nas emoções), dado que nem sempre os

indivíduos estão na direção mais correta rumo aos seus lucros.

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Em 2002, antes da premiação do Nobel em ciências econômicas concedida a

Daniel Kahneman e Vernon Smith, houve um debate4 na “The Wharton School of the

University of Pennsylvania” intitulado "Duas Visões de Eficiência no Mercado: uma

Discussão das Teorias de Finanças Comportamentais e Eficiência no Mercado", entre

Burton Malkiel professor de finanças da Princeton University e autor de A “Random

Walk Down Wall Street” que defendeu a teoria dos mercados eficientes. E, Richard

Thaler professor de finanças da Universidade de Chicago e diretor da Fuller & Thaler

Asset Management, empresa de gestão financeira com sede em San Mateo, na

Califórnia, que defendeu o ponto de vista do campo de finanças comportamentais.

O professor Malkiel apresentou o argumento que o mercado é um mecanismo

que utiliza informações coletivas dos participantes do mercado acionário para produzir

preços eficientes e que não há dinheiro fácil - notas de $100 fresquinhas esquecidas no

chão - para os investidores preverem como as ações irão se comportar. Em outras

palavras, é difícil bater seguidamente o Índice S & P 500.

O professor Thaler baseou-se no conceito de que a psicologia tem um importante

papel no movimento dos preços e que os padrões ou previsibilidades existentes no

mercado podem ser calculados de modo a auferir lucros.

Os dois professores partiram da premissa de que inicialmente o mercado não é

tão racional que não permita discernir padrões nos preços das ações.

Malkiel, ainda observou que fatores psicológicos afetam o mercado acionário e

que os mercados se excedem, criando bolhas como a loucura desencadeada pela

tecnologia da Internet no final dos anos 90, que elevou os preços das ações a níveis

insustentáveis. E, afirmou "nenhum dos padrões descobertos eram confiáveis, muitos se

autodestruíram logo que foram descobertos, e muitos não são economicamente

significativos”. Em seguida fez outra afirmação, "Eu realmente acredito que nossos

mercados de capital são visivelmente eficientes", continuou. "O mercado acionário é

bem menos previsível do que muitos de meus colegas acadêmicos afirmaram. Embora

estatisticamente o mercado não seja completamente incerto, a meu ver os investidores

fariam por bem agir como se ele fosse essencialmente imprevisível".

Thaler fez suas considerações de que, “Os preços dos títulos estão altamente

relacionados ao valor intrínseco, mas às vezes divergem significativamente", afirmou

4 Para uma maior consulta sobre o debate e suas ponderações consutar o site: (www.wharton.universia.net/index.cfm?fa=viewfeature&id=508&language=portuguese), publicado em 18/02/2003.

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ainda que. "É possível prever os preços das ações, mas não com muita precisão - e não

tente fazer isso em casa sozinho”.

Malkiel apresentou exemplos de supostas previsibilidades, baseados em

explicações behavorista como excesso de confiança na capacidade de prever o

movimento das ações e, ainda sobre os sentimentos de entusiasmo e desânimo dos

investidores que poderiam simplesmente refletir em ajustes nos preços das ações ás

condições econômicas.

Thaler iniciou sua defesa apresentando duas falácias da eficiência dos mercados,

a primeira, chamada por ele de "Teorema Não Existe Almoço Grátis", simplesmente

afirma que em um mercado eficiente os preços não são previsíveis, portanto não é fácil

ganhar dinheiro. A segunda falacia, chamada de "Teorema da Precisão dos Preços",

sugere que os preços dos ativos refletem o valor intrínseco dos títulos correspondentes e

que os preços são, portanto, racionais.

Segundo Thaler, Malkiel estava cometendo o erro de muitos economistas ao

argumentar que a primeira conclusão leva logicamente à segunda. Mesmo se os preços

forem imprevisíveis, declarou Thaler, "podem estar muito errados".

Assim os dois professores continuaram suas ponderações e defesas de suas

teorias apresentando outros exemplos, mas não podemos afirmar que algum deles se

saiu vencedor do debate, porém não podemos deixar de resaltar a importância do

mesmo.

Vários outros debates têm se dado em torno da discussão dos reais fundamentos

que embasam a teoria das Finanças Comportamentais, porém, o caminho a se seguir

nesta direção ainda será muito longo.

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5)CONSIDERAÇÕES FINAIS

Investidores e administradores de recursos em seu geral buscam modelos ou

comprovações de certeza, porém o ambiente em que tratamos (mercado) não se pode

haver certezas e, muito menos a eliminação da variável risco. Sendo assim, entendemos

que o programa de Finanças Comportamentais não veio em sua totalidade para eliminar

ou substituir a teoria da Hipótese dos Mercados Eficientes, mas sim complementá-lo

como ferramenta eficaz em tomadas de decisão.

Não podemos deixar de destacar a contribuição da Psicologia na formação do

perfil dos investidores utilizada nas decisões de investimento, quando se apresenta a

seguinte pergunta: Qual o seu perfil de investimento? Conservador, moderado ou

agressivo?

Entendemos agora que esta pergunta está intimamente ligada ao comportamento

do investidor, como seu sentimento de aversão à perda, seu excesso de confiança,

otimismo e outras variáveis apresentadas no capítulo 3 deste trabalho e, ainda

representam parcela significativa na tomada de decisão, porém não explicam em sua

totalidade os resultados obtidos.

Por maior que tenha sido os esforços nesse sentido ainda não é possível

apresentar uma teoria consistente que responda os fenômenos das anomalias dos

mercados, talvez porque os modelos estatísticos apresentados pelos defensores do

mercado eficiente não consigam prever de forma abrangente esses fenômenos. E, a

análise de fatores psicológicos defendidos pelos teóricos das Finanças Comportamentais

não são quantitativamente representados ou contabilizados.

Os estudos sobre arbritariedade demonstram ainda que mesmo com a existência

de agentes racionais, não se excluem as possibilidades de erros e ainda, sua

incapacidade de ajustá-los. Demonstrando assim, que sintomas explícitos de

irracionalidade podem ser representativos e duradouros.

A contribuição de fatores psicológicos às ciências econômicas é de incontestável

valor para a compreensão dos aspectos que norteiam as tomadas de decisão dos

investidores e ainda explicar em parte seus resultados financeiros, porém ainda se

demonstra inconclusivo se apresentado isoladamente.

O estudo do comportamento humano no que se refere ao dinheiro sofre

interferência direta do sentimento de aversão à perda, que é influenciada por uma

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diversa gama de fatores individuais revelados por sentimentos de medo, de angústia, de

apreensão ou de até mesmo pavor. Porém, cada indivíduo reage de maneira diferente a

esses sentimentos simplesmente por serem em sua essência diferentes, tem costumes

diferentes, hábitos diferentes, seguem critérios diferentes e ainda, possuem experiências

diferentes. Assim, podemos dizer, o sentimento de aversão à perda não se apresenta

como premissa para determinados fenômenos, mas sim para o entendimento dos

fenômenos.

O elemento comportamento do indivíduo, normalmente ignorado pelos

defensores do mercado eficiente, se revela, portanto como ferramenta necessária em

novas modelagens de problemas que visam entender os fenômenos do mercado. O

grande desafio, no entanto, é de que forma aplicá-los.

Nesse sentido, o caminho que ainda deverá ser seguido pelos estudiosos deste

desafio parece se esboçar no sentido da construção de modelos abrangente e confiáveis,

que agreguem fórmulas matemáticas complexas a fatores psicológicos do

comportamento humano para explicação dos fenômenos do mercado.

Indicamos ainda, no final deste trabalho (anexos), algumas publicações

pertinentes sobre o assunto, demostrando assim, que no ambiente nacional já existem

várias discuções relevantes.

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7) REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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ANEXO I

Leia a declaração que justifica Prêmio Nobel de Economia de 2002

Da Folha de S.Paulo

Leia abaixo a declaração da Academia Real Sueca de Ciências que justifica a premiação

de Daniel Kahneman e Vernon Smith para o Prêmio Nobel de Economia de 2002.

Kahneman e Smith foram premiados por inovações nos campos de economia

experimental e psicologia econômica, respectivamente. A versão original da declaração

pode ser lida no site http://www.nobel.se/economics/laureates/2002/public.html.

****

Academia Real Sueca de Ciências

Prêmio Banco da Suécia em Ciências Econômicas

em Memória de Alfred Nobel 2002 - Informações para o Público

Tradicionalmente, a teoria econômica tem confiado na existência de um "homo

economicus", cujo comportamento é determinado por interesse próprio e que é capaz de

tomar decisões racionalmente. A economia também tem sido lembrada como uma

ciência não experimental, em que pesquisadores —como em astronomia ou

meteorologia— têm tido de confiar exclusivamente em dados de campo, isto é,

observações diretas do mundo real. Durante as últimas duas décadas, entretanto, essas

visões passaram por uma transformação. Experimentos laboratoriais controlados

emergiram como componentes vitais da teoria econômica e, em certas situações,

resultados experimentais mostraram que postulados básicos na teoria econômica

deveriam ser modificados. Esse processo tem sido gerado por pesquisadores em duas

áreas: a de psicólogos cognitivos que têm estudado o julgamento humano e tomadas de

decisões e a de economistas experimentais que têm testado modelos econômicos em

laboratório. O prêmio deste ano é conferido para inovadores nesses dois campos:

Daniel Kahneman e Vernon Smith.

Economia psicológica e experimental

Economia experimental

Os primeiros experimentos na economia foram direcionados a testar o que é talvez o

mais sólido pensamento na teoria econômica: o de que em uma competição perfeita, o

preço de mercado estabelece um equilíbrio entre oferta e procura, em que o valor

conferido a um bem por um comprador limítrofe é tão alto quanto o de um vendedor

limítrofe. Nos primeiros experimentos em laboratório de Vernon Smith, pessoas eram

aleatoriamente apontadas como compradoras e vendedoras com diferentes valores

estimados de um bem, definidos como preço de venda mais baixo aceitável e máximo

preço de compra aceitável, respectivamente. Dada a distribuição de tais "preços de

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reserva", Smith foi capaz de determinar o preço teórico de equilíbrio, —o preço que é

aceitável para tantos vendedores como compradores. Já em 1962, quando publicou os

resultados de seus primeiros experimentos, Smith descobriu, para sua surpresa, que os

preços obtidos no laboratório foram muito próximos dos seus valores teóricos, ainda que

as pessoas não tivessem a informação necessária para calcular o preço de equilíbrio.

Smith e outros pesquisadores, entre eles Charles Plott, mais tarde executaram

experimentos parecidos para testar a concordância com a teoria e, de modo amplo,

confirmaram os resultados iniciais. Mais, descobriram que o resultado era balizado

exatamente pelo mesmo padrão do mercado.

Muitos experimentos têm tratado do resultado de leilões, que são tradicionalmente

usados para organizar mercados por bens materiais, ações ou outros instrumentos

financeiros. Mais recentemente, leilões também têm sido utilizados em processos de

desmonte e privatização de monopólios públicos, como direitos de transmissão. A teoria

da formação de preços distingue quatro formas básicas de leilão usadas na venda de um

único objeto:- o leilão inglês, em que compradores anunciam seus lances em ordem

crescente até que nenhum outro lance é dado;- o leilão holandês, em que um lance inicial

alto é gradualmente baixado até que um comprador manifeste sua aceitação;- o leilão de

primeiro preço, com lances selados, em que aquele que deu o lance mais alto paga seu

próprio lance;- o leilão de segundo preço e lance selado, em que aquele que ofereceu o

lance mais alto paga o valor do segundo lance.

Em experimentos controlados, Smith e seus colegas foram capazes de testar diversas

precondições teóricas. Por exemplo, descobriram —como previsto por teoria— que um

vendedor pode esperar o mesmo resultado nos leilões inglês e de segundo preço.

Enquanto isso, foram capazes de refutar a condição teórica da equivalência entre o leilão

holandês e o de primeiro preço. Os experimentos também demonstraram que os leilões

inglês e de segundo preço produzem a maior preço de venda médio, seguidos pelo leilão

de primeiro preço e, finalmente, pelo holandês.Smith também iniciou o uso de

experimentos laboratoriais como um "túnel de vento", em que mecanismos propostos

para privatização e licitação pública podem ser testados com antecedência. Já que esses

mecanismos são frequentemente complexos e é difícil estimar sua performance somente

na base da considerações teóricas, o método experimental se torna particularmente útil.

Em experimentos parecidos, Smith avaliou diferentes mecanismos para organizar

horários em aeroportos usando mercados dirigidos por computador. Ele também avaliou

modos diversos de organizar mercados de energia na Austrália e na Nova Zelândia, onde

os resultados influenciaram o padrão real de mercado.

Os valores em jogo em mercados do mundo real são frequentemente de uma magnitude

completamente diferente das recompensas que podem ser oferecidas em um modelo

experimental. Em particular, enquanto enfatizam a importância de mecanismos

monetários em experimentos, Smith desenvolveu métodos em que tais incentivos são

não apenas suficientemente fortes mas também desenvolvidos para melhorar a

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probabilidade de que os resultados sejam aplicáveis em situações reais de mercado. Um

grande problema é que as preferências pessoais (e não observadas) podem afetar o

comportamento em um experimento. Consequentemente, uma pessoa a quem é

designado o papel de comprador, com uma determinada função de demanda por um

bem, não agirá simplesmente de acordo com essa curva de demanda. Smith introduziu

uma técnica, conhecida como o método de valor induzido, que resolve esse problema e

oferece à pessoa incentivos para se comportar como planejado por quem aplicava o

experimento. Por meio dessa e de outras contribuições, bem como uma série de

recomendações práticas para procedimentos apropriados no laboratório, Smith

determinou padrões metodológicos para o que constitui um bom experimento na

pesquisa econômica.

Psicologia e economia

A pesquisa econômica frequentemente assume que pessoas são motivadas

primordialmente por incentivos materiais e fazem decisões de modo racional. Considera-

se que elas avaliam o estado da economia e o efeito de seu comportamento

processando de informações disponíveis de acordo com princípios estatísticos padrão.

Esse enfoque tem sido formulado axiomaticamente na chamada teoria de utilidade

esperada, que é a teoria econômica predominante para decisões sob incerteza.

A visão prevalecente na psicologia em geral, psicologia cognitiva em particular, é olhar o

ser humano como um sistema que codifica e interpreta a informação disponível de uma

maneira consciente, mas em que outros fatores, menos conscientes, também influenciam

decisões, em um processo interativo. Tais elementos incluem percepção, modelos

mentais para interpretar situações específicas, emoções, atitudes e memórias de

decisões anteriores e suas consequências.

Em uma ampla pesquisa sobre o comportamento humano baseado em entrevistas e

experimentos, Daniel Kahneman e outros psicólogos questionaram a assunção da

racionalidade econômica em algumas situações de decisão. Quem deve tomar decisão

no mundo real frequentemente parece não avaliar eventos incertos de acordo com as leis

de probabilidade; nem parece tomar decisões de acordo com a teoria da maximização da

utilidade esperada.

Em uma série de estudos, Kahneman —em colaboração com o finado Amos Tversky—

mostrou que pessoas são incapazes de analisar de modo completo situações em que se

deve tomar decisões completas quando as consequências futuras são incertas. Sob tais

circunstâncias, elas confiam, em vez disso, em atalhos heurísticos ou princípios

genéricos. Um viés fundamental é bem ilustrado em dados experimentais próprios de

Kahneman e Tversky da maneira como indivíduos julgam eventos aleatórios. A maior

parte dos assuntos experimentais determina as mesmas probabilidades em amostras

grandes e pequenas, sem levar em consideração que a incerteza sobre a variação do

meio declina drasticamente com o tamanho da amostra. As pessoas, portanto, parecem

aderir à lei dos pequenos números, sem a devida consideração da lei dos grandes

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números na teoria da probabilidade. Em um experimento bem conhecido, as pessoas

vêem como igualmente provável que, em um determinado dia, mais de 60% dos

nascimentos seja o de meninos em um hospital pequeno (com menos nascimentos) e em

um hospital grande (em que muitas crianças nascem).

De modo similar, um investidor que reconhece que um gerenciador financeiro lidera o

ranking dois anos em sequência pode concluir que o líder é sistematicamente mais

competente do que um investidor médio, enquanto a implicação estatística real é muito

mais fraca. Tais visões curtas para interpretar dados podem bem ajudar a esclarecer

diversos fenômenos em mercados financeiros difíceis de explicar com modelos

predominantes —como as ostensivas e grandes flutuações às quais as Bolsas estão

sujeitas. Em economia financeira, uma área de pesquisa ativa, a de finanças

comportamentais, evoluiu no sentido de aplicar inspirações da psicologia em uma

tentativa de compreender o funcionamento dos mercados financeiros.

Outro princípio genérico é a representatividade. Kahneman and Tversky executaram um

experimento em que indivíduos deveriam fazer a distinção entre "vendedor" e "membro

do parlamento" com base em determinadas descrições. Quando um personagem

escolhido aleatoriamente era definido como interessado em política e em participar de

debates, a maior parte dos participantes da pesquisa pensou que se tratava de um

membro do parlamento, independentemente do fato de que a maior parcela de

vendedores na população aumenta a probabilidade de que o indivíduo era um vendedor.

Mesmo após os entrevistados serem informados da incidência de membros do

parlamento e vendedores na população, isso não pareceu importar nos resultados.

Kahneman, portanto, demonstrou que, em situações com incertezas, o julgamento

humano normalmente explora princípios genéricos que sistematicamente contradizem

com propostas da teoria da probabilidade. Sua contribuição mais influente, entretanto, diz

respeito à tomada de decisões sob incertezas. Uma descoberta de impacto é a de que

indivíduos são muito mais sensíveis à maneira como um resultado se desvia de um nível

de referência (normalmente o status quo) do que ao resultado absoluto. Quando

confrontados com uma sequência de decisões sob risco, indivíduos, portanto, parecem

basear cada decisão em seus ganhos e perdas isoladamente, mais do que nas

consequências de uma decisão para suas riquezas como um todo. Mais além, a maior

parte dos indivíduos parece ser mais avessa a uma perda de um determinado tamanho

do que favoráveis a um ganho do mesmo tamanho. Esses e outros resultados

contradizem previsões da tradicional teoria da maximização da utilidade esperada.

Não satisfeitos em criticar teorias comuns de tomadas de decisões sob incerteza,

Kahneman e Tversky também desenvolveram uma alternativa, conhecida como teoria da

previsibilidade ("prospect theory", em tradução livre), com o objetivo de oferecer

explicações para observações empíricas. A teoria da previsibilidade e suas extensões

podem ser utilizadas para explicar melhor padrões de comportamento que parecem ser

anomalias na perspectiva da teoria tradicional: a propensão para optar por seguros

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custosos de pequena escala para bens móveis; disposição para dirigir muitos quilômetros

por um desconto de alguns dólares em uma compra pequena, mas relutância para fazer

o mesmo de modo a economizar a mesma quantia em um bem mais caro; ou resistência

a reduzir o consumo em resposta a más notícias sobre a renda futura.

Duas áreas de pesquisa que se fundem

A pesquisa moderna limítrofe entre economia e psicologia mostrou que conceitos como

racionalidade limitada, interesse próprio restrito e autocontrole limitado são fatores

importantes por trás de uma gama de fenômenos econômicos. Em particular, inspirações

da psicologia tiveram forte impacto em desenvolvimentos contemporâneos em economia

financeira. Por que, então, se demorou tanto tempo para que essas idéias ganhassem

reconhecimento na pesquisa econômica? Uma explicação é a de que métodos

experimentais só recentemente passaram a permear a economia. Em decorrência da

pesquisa experimental sobre a relação entre formação de preço e instituições de

mercado, um número crescente de economistas começou a ver métodos experimentais

como ferramentas de pesquisa indispensáveis. Hoje, uma nova geração de economistas

é a catalisadora de uma amalgamação gradual de duas tradições de pesquisa antes

distintas em economia experimental e psicologia econômica. Daniel Kahneman e Vernon

Smith, as figuras-chave dentro dessas tradições, contribuíram para uma empolgante

renovação na pesquisa econômica.

Os laureados

Daniel Kahneman

Departmento de Psichologia

Universidade Princeton

Princeton, NJ 08544

USA

www.princeton.edu/~psych/PsychSite/fac_kahneman.html

Cidadão dos EUA e de Israel. Nasceu em 1944 (68 anos) em Tel Aviv, Israel. PhD da Universidade da

California em Berkeley em 1961. Já lecionou na Universidade Hebraica (Usrael), Universidade da

Columbia (Canadá) e UC Berkeley. Desde 1993, professor de psicologia Eugene Higgins, e professor de

assuntos públicos na Universidade Princeton, NJ, EUA.

Vernon L. Smith

Centro Interdisciplinar de Ciências Econômicas

Universidade George Mason

4400 University Drive

Fairfax, VA 22030-4444

EUA

www.gmu.edu/departments/economics/facultybios/smith.html

Cidadão dos EUA. Naceu em 1927 (75 anos) em Wichita, KS, EUA. PhD da Universidade Harvard em

1955. Lecionou na Universidade Purdue, na Universidade de Massachusetts e Universidade de Arizona.

Desde 2001, professor de economia e direito na Universidade George Masin, VA, EUA.

Tradução de Marcelo Vaz

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ANEXO II

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ANEXO III JORGE GRESPAN especial para a Folha de S.Paulo

Anualmente, a concessão do Prêmio Nobel chama a

atenção do público para realizações alcançadas em

várias áreas da ciência. Mas o interesse inicial logo é

arrefecido pela dificuldade em compreender conceitos e

métodos geralmente muito distantes da linguagem

cotidiana, embora se trate, no caso da economia,

principalmente, de temas cada vez mais presentes na

vida das pessoas.

Neste ano, os pesquisadores Vernon L. Smith e Daniel

Kahneman foram premiados com o Nobel de Economia

por seu trabalho numa área limítrofe entre a psicologia e

a ciência econômica, tentando mostrar e provar que há

um elemento irracional que age na tomada de decisões

dos agentes de mercado —e que pode ser explicado

dentro de uma estrutura matemática complexa estudada

pela teoria dos jogos.

Trata-se de uma inovação, segundo a Academia de

Ciências da Suécia, pois rompe com o pressuposto de

racionalidade do "homo economicus", ao introduzir nas suas escolhas e avaliações um fator emocional de risco,

adequado à situação de incerteza e de crise em que estamos vivendo.

É um assunto difícil, mas o entendimento será menos árduo, se forem desfeitas, desde logo, algumas aparências.

Em primeiro lugar, o refinamento conceitual atingido em certas áreas da investigação em economia não implica, de

modo nenhum, que haja consenso a respeito dos seus pontos de partida teóricos. Ao contrário. Um indispensável olhar

para a história do pensamento econômico deixa bem claro existirem diversas escolas, com visões do objeto e métodos

muitas vezes conflitantes.

Deve-se retomar essa história porque, em segundo lugar, tais perspectivas se despem dessa complexidade e podem

ser apreendidas pelas suas opções teóricas, valorativas e, inclusive, políticas, mais acessíveis ao cidadão comum.

Em terceiro lugar, por fim, o olhar histórico permite julgar até que ponto há realmente novidade em pesquisas

específicas ou se elas são muito mais uma continuidade da investigação dentro de uma determinada tradição de

pensamento. A pesquisa vencedora do Nobel deste ano, por exemplo, parece corresponder a esta última alternativa.

Jorge Grespan, 43, é professor de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, autor de

"O Negativo do Capital" (Hucitec). Pratica esgrima na Federação Paulista, onde aprende a dar e a levar boas

estocadas.