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UNIVERSIDADE CÃNDIDO MENDES PSICOPEDAGOGIA PROBLEMAS DE LEITURA E ESCRITA NA ALFABETIZAÇÃO DE CRIANÇAS E OS FATORES INTERACIONAIS INTERVENIENTES Márcia Valéria Fernandes Maia Rio de Janeiro 2.003

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UNIVERSIDADE CÃNDIDO MENDES

PSICOPEDAGOGIA

PROBLEMAS DE LEITURA E ESCRITA NA ALFABETIZAÇÃO DE

CRIANÇAS E OS FATORES INTERACIONAIS INTERVENIENTES

Márcia Valéria Fernandes Maia

Rio de Janeiro

2.003

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MÁRCIA VALÉRIA FERNANDES MAIA

PROBLEMAS DE LEITURA E ESCRITA NA ALFABETIZAÇÃO DE

CRIANÇAS E OS FATORES INTERACIONAIS INTERVENIENTES

Monografia de conclusão

de curso apresentada ao

curso de Psicopedagogia

da Universidade Cândido

Mendes, como requisito

parcial para obtenção do

grau de pós-graduação

em Psicopedagogia.

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

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AGRADECIMENTO

A Deus, a minha família e a todos os meus amigos

pela força que me deram para traçar este caminho.

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MENSAGEM

“A arte de ler e de escrever”.

foi durante milhões de anos monopólio sagrado

de pequenas elites. Por volta de1750, no dealbar

da revolução industrial, haviam decorrido quase 5

mil anos sobre o aparecimento dos primeiros

rudimentos da arte da escrita. Contudo, mais de

90% da população mundial não tinham acesso à

arte.”“.

“Autor desconhecido”.

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RESUMO

Esta monografia tem como tema central o estudo de problemas de

leitura e escrita na alfabetização de crianças e de fatores interacionais

intervenientes. Para tanto se formulou como objetivo geral investigar que fatores

cognitivos e internacionais que interferem em crianças de 6 e 7 anos, em fase de

alfabetização sistemática e que desencadeiam problemas de leitura e escrita. O

trabalho está fundamentado em Ferreiro (1999), Freire (2000), Lima (1984),

Pichon Rivière (2000) e Teberoski (1988) que dedicaram suas obras ao estudo

das questões sobre o processo de ensino-aprendizagem da leitura e escrita. A

metodologia utilizada foi à pesquisa bibliográfica, sendo que a leitura das obras

dos autores citados anteriormente permitiram o esclarecimento da situação-

problema. Para tanto, buscamos realizar uma leitura das “crônicas” do cotidiano

de sala de aula com relação às relações interpessoais que se estabelecem, como

também as cenas dramáticas que no âmbito da classe se desencadeiam. Os

resultados alcançados , após a leitura das fontes consultadas, sublinham a

importância do estabelecimento de vínculo entre o que ensina e os que

aprendem, entre o que aprende o conteúdo trabalhado e, ainda entre os

atores/alunos entre si. A alfabetização em seu processo exige que respeitemos o

saber de experiência feito pelo aluno, pois só assim o aprendiz tem condições de

processar o conhecimento da leitura e da escrita. Os resultados assinalam

também que o articulador desse movimento de apropriação do conhecimento

sistemático pelo aluno, que é o professor, deve respeitar sua linguagem e

conseqüentemente a cultura que ele traz. Só dessa maneira é possível favorecer

o processo de desenvolvimento do aluno, tornando-0 participativo, reflexivo e

crítico em relação à leitura do mundo. O que estamos a apontar, reforça a idéia

de o alfabetizar se preocupar com o seu próprio processo de “alfabetização” da

realidade, de forma permanente e compromissada. Este trabalho pretende trazer

contribuições a todo professor que se depara com dificuldades que podem surgir

durante a alfabetização e ao longo da vida do sujeito.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ....................... ............................................................................ 7

CAPÍTULO I – PROBLEMAS PRESENTES NO PROCESSO DE ENSINO-

-APRENDIZAGEM DA LEITURA E DA ESCRITA .................... 9

1.1 – Dificuldades na aprendizagem ......................................... 13

1.1.1 – As dificuldades no processo de alfabetização .......... 14

CAPÍTULO II – RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO NO PROCESSO ENSINO

APRENDIZAGEM ...................................................................... 20

2.1 – Relações afetivas.......................................................... 22

2.2 – Como trabalhar a afetividade No ensino fundamental ..... 24

2.2.1 – Com os pés no cotidiano .......... .................................. 24

2.2.2 – Compreendendo o contexto ....................................... 25

2.2.3 – Aprendendo a conviver com as diferenças ................ 28

2.3 – Vejamos alguns exemplos de casos................................. 29

A – No mundo da lua..... ........................................................ 29

B – Nada importa ................................................................... 30

C – No canto da sala .............................................................. 31

D – Falando “elado” ............................................................... 33

CAPÍTULO III – ESTRATÉGIAS DE MUDANÇAS QUE FAVORECEM AS

QUESTÕES DA AFETIVIDADE NO ATO DE APRENDER ...... 35

3.1 – Direção da classe ............................................................. 37

3.2 – Participação alienada e passiva ....................................... 39

3.3 – Participação coletiva e ativa ............................................ 41

3.4 – Dinâmica interna de sala de aula .................................... 42

3.4.1 – Construção da participação coletiva e ativa ............... 44

3.4.2 – Diálogo e Poder ......................................................... 45

CONCLUSÃO .................................................................................................. 47

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................... 50

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INTRODUÇÃO

Esta pesquisa analisa os problemas de leitura e escrita na

alfabetização de crianças e os fatores interacionais intervenientes.

Tendo em vista que a cada dia que passa as crianças vêm

apresentando,cada vez mais, dificuldades na leitura e na escrita, sentimos a

necessidade de estudar os fatores interacionais intervenientes em crianças de 6

e 7 anos em fase de alfabetização sistemática.

• Quais os problemas presentes no processo de apreensão da leitura e da

escrita?

• Que fatores inter-relacionais interferem no processo de alfabetização

sistemática?

• Que estratégias de atuação favorecem o desejo de aprender dos alunos

alfabetizandos ?

• Estariam os fatores afetivos comprometendo a aprendizagem da leitura e da

escrita em sala de aula?

Investigar que fatores cognitivos e internacionais que interferem em

crianças de 6 e 7 anos, em fase de alfabetização sistemática e que

desencadeiam problemas de leitura e escrita.

„ Relacionar os principais problemas presentes no processo de apreensão

da leitura e da escrita.

„ Caracterizar os fatores inter-relacionais que interferem no processo de

alfabetização sistemática.

„ Propor estratégias de atuação que favoreçam o desejo de aprender dos

alunos alfabetizandos.

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Ao encontrarmos alunos com dificuldades de ler e escrever não

sabemos o porquê dos entraves vividos no processo de alfabetização.

Não raro, o que percebemos é que a prática do professor

alfabetizador ora se sustenta no uso de um só método, que seja ele analítico ou

sintético, ora no uso de uma cartilha, por ele escolhida. Assim, esses fatores e

outros relacionados às questões da afetividade, do clima de sala de aula e até

mesmo das experiências incidentais realizadas pelo aprendiz, são pouco

consideradas.

Este estudo visa portanto, aprofundar as questões relacionadas ao

processo de aprender ler e escrever do alfabetizando.

A metodologia adotada neste trabalho foi a pesquisa bibliográfica.

Buscamos nos materiais disponíveis base de estudos que contribuíssem para

atender o objetivo principal do tema do trabalho. Assim, para elaborar este

estudo foram consultados diferentes autores e fontes bibliográficas, bem como

apresentamos alguns casos e tentamos analisá-los à luz do referencial teórico.

Este estudo está organizado em capítulos cujos os títulos são:

capítulo I – introdução; capítulo II – problemas presentes no processo de

ensino-aprendizagem da leitura e da escrita; capítulo III – Relação professor-

aluno no processo ensino-aprendizagem ; capítulo IV – estratégias de mudanças

que favorecem as questões da afetividade no ato de aprender ;e capítulo V –

conclusão,

Esperamos que esta monografia possa contribuir para reflexão dos

professores, que trabalham com alfabetização e a importância de ele estabelecer

vínculos positivos na relação professor-aluno.

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CAPÍTULO I

PROBLEMAS PRESENTES NO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM

DA LEITURA E DA ESCRITA

Este capítulo aponta a necessidade de conhecermos os movimentos

que o alfabetizando realiza para aprender e os conflitos que enfrenta.

Muito antes de iniciar o processo formal de aprendizagem da

leitura/escrita, as crianças constroem hipóteses sobre este objeto de

conhecimento. Dificilmente uma criança parte da estaca zero em relação a esta

modalidade de aprendizagem, bastando, para isso, que tenha tido contato com

algumas formas de linguagem, de embalagens, revistas, jornais, cartazes nas

ruas, nomes de lojas, placas de ruas, folhetos diversos, histórias em quadrinhos

entre outros.

Quanto maior tiver sido este contato, mais capacitada ela estará

para tentear compreender a estrutura e as finalidades da representação escrita.

Mesmo aquelas mais desfavorecidas socialmente, já “sabem” muitas coisas a

respeito deste processo, embora tenham menor contato familiar em função da

carência de material escrito no meio cultural onde vive. Nas sociedades

modernas, a linguagem escrita tem um grande poder de penetração.

Passo a passo, ainda que distantes do que consideramos ler e

escrever, as crianças começam a se organizar em busca de entender o que

representam os risquinhos pretos que elas vêem por aí, acompanhados ou não de

desenhos e fotos.

Conhecendo os caminhos percorridos por elas para se apropriarem

deste conhecimento, talvez seja mais fácil descobrir meios que as ajudem a

vencer obstáculos que irão surgindo, criados pela própria complexidade da língua

escrita.

Segundo Ferreiro e Teberoski (1988), pesquisadoras reconhecidas

internacionalmente por seus trabalhos sobre alfabetização, na faixa dos seis

anos, a criança já faz corretamente a distinção entre texto e desenho, sabendo

que o que podemos ler é aquilo que contém letras, embora algumas ainda

persistam na hipótese de que tanto se pode ler as letras, quanto os desenhos.

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Significativamente, elas pertencem às classes sociais mais pobres e mantêm

menos contato com material escrito.

Por outro lado, para que algo sirva para ler é preciso que contenha

um certo número de letras, variável entre dois e quatro. Para as crianças, uma

letra sozinha não representa nada escrito. Rejeitam também, conjuntos com letras

repetidas, entendendo que só podem ser lidas palavras que contenham letras

diferentes. Atribuem concepções ao fato de poderem observar nos escritos que

vêem no seu cotidiano que a norma é encontrar uma variedade de letras

diferentes compondo as palavras. Nesses casos, as palavras são por elas

rejeitadas, pois como não são passíveis de leituras, palavras com menos de três a

quatro letras e que contenham letras iguais. No entanto, é justamente por aí que

os professores costumam iniciar o trabalho de alfabetização, ensinando vocábulos

curtos, com os mesmos fonemas repetidos como: bebê, babá, bobo etc. A língua

escrita é aprisionada no ensino das famílias silábicas.

Para uma criança em fase de descoberta, a escrita é interpretada

como uma forma de representar os nomes dos objetos. Sendo assim, ela se apóia

nos desenhos para “ler” o que está escrito.

Será preciso um longo caminho para que ela chegue à leitura/escrita

da forma que nós, adultos, a concebemos, percebendo que a cada som

corresponde uma determinada forma; que há grupos de letras separadas por

espaços em branco, grupos estes que correspondem a cada uma das palavras

escritas.

Se for escrita, na frente da criança, por exemplo, a oração: Paulo

chuta a bola, e a mesma for lida para ela, ao pedimos que a repita, apontando

as palavras, pode ocorrer que a palavra Paulo seja indicada e sobre ela lida a

oração. Se lhe for perguntado onde está tal ou qual palavra, ela apontará uma ou

outra, ao acaso, por ainda não perceber a correspondência entre a seqüência

sonora e a escrita.

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Segundo Ferreiro (1999), ainda sem saber realizar a

correspondência correta entre os símbolos escritos e os sons que os

representam, aos poucos, se mantiver contato com material de leitura e for

estimulada a “ler”, a criança conseguirá situar perfeitamente todas as palavras de

uma oração lida para ela, começando a perceber que a ordem da escrita

corresponde à ordem da emissão das palavras.

A exploração da escrita também será efetuada pela criança se ela

estiver habituada ao convívio com lápis e papel. Bem cedo, por volta dos três

anos, tentativas de escrita serão realizadas com o uso de traços ondulados

contínuos (semelhantes ao m em cursiva) ou de desenhos de círculos e riscos

descontínuos (como os que são vistos em letras de imprensa).

Pesquisas sobre o desenvolvimento deste processo, realizadas por

Ferreiro e Teberoski (1988), oferecem-nos dados interessantes sobre a

constituição do mesmo. Elas apontam diferentes níveis de aquisição da escrita.

No início desta construção, no nível 1, as tentativas voltam-se para a

reprodução dos traços básicos da escrita com que a criança se defronta no

cotidiano. O que vale é a intenção, pois embora o traçado seja semelhante, cada

um “lê”, em seus rabiscos, aquilo que quiser escrever. Sendo assim, cada um

pode interpretar a sua própria escrita, e não a dos outros.

Nesta fase, a expectativa é de que a escrita dos nomes seja

proporcional à idade ou tamanho da pessoa, objeto ou animal a que se refere.

Desta forma, a linha ondulada que representará a palavra papai, por exemplo,

será maior que aquelas que representam o nome e o sobrenome da própria

criança, o mesmo ocorrendo com a palavra boi em relação à palavra formiga.

Em muitos casos, o desenho apóia a escrita, de forma que, no início

das tentativas de leitura, a criança lê, tanto sobre as letras impressas quanto

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sobre as imagens. Letras, números e desenhos podem aparecer juntos como se

formassem palavras.

No nível 2, a hipótese central é de que para ler as coisas diferentes

é preciso usar formas diferentes. A criança procura combinar de várias maneiras

as poucas formas de letras que é capaz de reproduzir.

Assim, poderíamos ter:

• /aron/ lido como sapo

• /aorn/ lido como pato

• /raon/ lido como casa

A aquisição do formato das letras é mais acessível às crianças a

quem são oferecidas situações de convívio, por exemplo, com a escrita do seu

próprio nome. Nesta fase, ao tentar escrever, são respeitadas duas exigências

básicas: a quantidade de letras (nunca inferior a três) e a variedade entre elas.

Predomina a escrita entre imprensa maiúscula, o que indica claramente a origem

não escolar do conhecimento e, mesmo que não sejam usadas letras, os riscos,

traços e círculos também dizem respeito às mesmas exigências citadas.

No nível 3, são feitas tentativas de dar um valor sonoro a cada uma

das letras que compõem a palavra. Surge a chamada hipótese silábica, isto é,

cada grafia traçada corresponde a uma sílaba pronunciada, podendo serem

usadas letras ou outro tipo de grafia.

Há, neste momento, um conflito entre a hipótese silábica e a

quantidade mínima de letras exigida para que a escrita possa ser lida.

A criança, neste nível, trabalhando com a hipótese silábica, precisa

usar duas formas gráficas para escrever palavras com duas silabas, o que vai de

encontro às suas idéias iniciais de que são necessários, pelo menos, três

caracteres. Este conflito a faz caminhar para outro nível.

No nível 4 ocorre, então, a transição da hipótese silábica para a

alfabética. O conflito que se estabeleceu – entre uma exigência interna da própria

criança (o número mínimo de grafias) e a realidade das formas que o meio lhe

oferece faz com que ela procure soluções.

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Se ela se chamar Mariana, por exemplo, e conhecer razoavelmente,

seu nome escrito, começará a se indagar o porquê de tantas letras, pois, antes,

ela supunha que deveria usar apenas três (mia, mar, etc.), pronunciando uma

sílaba sobre cada letra.

Nesta etapa, a hipótese silábica começa a desmoronar, porém,

quando o meio não oferece estas informações, não ocorrem possibilidades de

conflito entre as hipóteses da criança, nem ela pode testá-las, para avançar na

construção de conhecimentos.

Muitas crianças ingressam na escola aos seis anos, ainda na fase

silábica ou mesmo em fase anterior. Obviamente seu percurso será mais lento.

No nível 5, finalmente, é atingido o estágio da escrita alfabética, pela

compreensão de que cada um dos caracteres da escrita corresponde a valores

menores que a sílaba e que uma palavra, se tiver duas sílabas, exigindo,

portanto, dois movimentos para ser pronunciada, requererá mais do que duas

letras para serem escritas.

Daí para à frente, haverá ainda muitos problemas causados pelas

dificuldades ortográficas, mas teremos concretizado a apreensão da estrutura da

língua escrita.

1.1 – Dificuldades na aprendizagem

O caminho da alfabetização, segundo Emília Ferreiro(1999), passa

necessariamente por etapas, nas quais a criança constrói o seu conhecimento,

independentemente da camada social a que pertença. As etapas são iguais,

podendo variar apenas de acordo com a idade da criança, nunca de sua condição

social.

“As crianças que estão crescendo em ambiente onde

a língua escrita existe – onde se lê e se escreve

não apenas como atos muito especiais, mas como

parte da vida diária, onde são estimuladas a

manusear livros, onde se permite a elas escrever e

desenhar, estas crianças adquirem muitas informações

sobre a língua escrita. Geralmente fazem parte por conta

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própria uma boa parte do caminho da alfabetização.

Se, ao contrário, a criança não tem contato com a língua

escrita, se em redor dela não há pessoas que possam

ler e escrever, é muito difícil que chegue a escola

sabendo o que dizer ” .(FERREIRO,2001,P.16).

1.1.1 – As dificuldades no processo de alfabetização

Encontramos ainda professores em escolas que não permitem que a

criança faça o aprendizado da escrita como o fez o da fala. Não lhe é dada

liberdade para tentar, perguntar, errar, comparar, corrigir: tudo deve ser feito

“certinho”, desde o primeiro dia de aula. Às vezes, a escola supõe que os

exercícios preparatórios são o caminho para o aluno desenvolver melhor a

habilidade para a escrita e a leitura. Alguns métodos são tão rígidos em suas

atividades, tão extensos em particularidades preparatórias, que não sobra tempo,

nem espaço para as crianças desenvolverem nas hipóteses sobre a escrita.

Sabemos que os atos de ler e escrever têm sua natureza não

mecânica, mas conceitual, daí podemos entender porque perdem o valor os

exercícios de treinamento.

Nós acreditamos que os processos de ler e escrever podem

prescindir dos períodos preparatórios, quando sabemos que, como um processo,

se inicia bem antes da entrada da criança na escola e não termina no final da

classe de alfabetização, nem mesmo nas séries iniciais do ensino fundamental.

Somando-se a essa postura, acrescentemos o desconhecimento da realidade

lingüística da criança. Podemos, então, entender melhor porque a escola custa

tanto a ensinar, e o aluno sofre tanto para aprender. Há um descompasso da

escola com a natureza da criança. A escola não respeita a sua bagagem de

conhecimentos e desconhece suas formas próprias de aprender.

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Segundo Vygotsky (1987), é através do contato com o material

escrito e com o “outro” (interlocutor, companheiro), a partir de trocas dialógicas

que este processo se constrói.

As crianças constroem hipóteses sobre o processo de leitura/escrita,

porém este não é um processo puramente individual. É preciso entendê-lo como

um processo inter. e intra-subjetivo.

O professor desempenha um papel importante na identificação da

dificuldade. Aquela criança que não consegue apropriar-se do conhecimento

deve ser identificado e acompanhado de perto. Após alguns meses de trabalho (3

– 6 meses), dentro da sala aula sem um progresso na aprendizagem, o aluno

merece uma atenção especial do professor que deverá trocar idéias com a

orientação pedagógica da escola para estudar o caso, em conjunto, para melhor

atendê-la.. São crianças muitas vezes consideradas como “imaturas” rótulo que é

dado ao que não aprende. Cuidado! Esta criança que não apresenta bom

desempenho pode estar vivendo uma dificuldade. A intervenção do educador e do

especialista é aconselhável. O que é fundamental é buscarmos detectar de

imediato a falta, a dificuldade para não se instalar um sentimento de fracasso,

influenciando a auto-estima no aluno.

Uma outra situação é quando a criança não consegue identificar e

escrever letras, ou juntá-las em palavras ou frases. Esta criança, iniciando o

primeiro ano do ensino fundamental, deve ser logo olhada para não chegar ao

final do ano com esta dificuldade..

Os principais elementos indicados para identificação destas

dificuldades são os profissionais da escola (professora, orientadoras pedagógicas,

e educacional e ou/ psicopedagoga etc) que exercem o importante papel na

formação da criança. Com a identificação de um mau rendimento escolar de uma

criança, deveremos investigar em diferentes níveis de dificuldade para saber se

trata de uma situação passageira, em um momento da vida da criança, ou se é

algo mais sintomático de um problema de um problema de aprendizagem.

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Quando o professor detecta que um aluno não está conseguindo

assimilar determinado conteúdo, é importante que desenvolva estratégias

variadas, colocando o assunto de diferentes maneiras, até que seja possível a

superação da dificuldade, pois não sendo atendidos, o que fica para trás, torna-se

cumulativo, transformando-se num obstáculo à aprendizagem posterior.

O professor deve levar em conta que a aprendizagem só se dá

ligada à parte afetiva da criança. Não se pode separar aprendizagem de afeto. É

importante que o professor conheça cada um de seus alunos e esteja atento às

dificuldades de cada um, para que essas não se transformem num problema.

Para evitar surgimento de dificuldades, deve-se tomar muito cuidado em respeitar

o nível cognitivo da criança. Elas, entre os 07 e 11 –12 anos de idade está numa

fase de intensa atividade intelectual. A criança ainda não tem a mesma

compreensão da linguagem que tem o adulto. Se os conteúdos lhe são passados

verbalmente, sem que haja a atividade do aluno sobre eles, a criança se prende à

mensagem do adulto, repete-a, memoriza-a, embora não as compreenda.

A repetição neste caso não é uma boa estratégia, por isso o professor

deve usar de muita criatividade na abordagem de diferentes facetas de um

mesmo ponto a ser estudado. Para isso imprescindível que se adote uma

metodologia de interação, tanto do professor com os alunos, com destes entre si,

isto é, muita oportunidade de questionamento e trabalho em grupo.

Através de trabalhos feitos com a criança o profissional

especializado pode detectar se a criança tem alguma das dificuldades abaixo

citadas.

Dislexia – é uma dificuldade duradoura na aquisição da leitura. Para

se constatar uma dislexia, é preciso descartar algumas outras situações que não

devem ser confundidas:

A criança não deve ter bloqueios emocionais que a impeçam de

aprender. Deve ter tido pelo menos dois anos de escolaridade, com uma didática

adequada. Isto significa que apenas aos 8 anos podemos afirmar que a criança é

disléxica.

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O quadro de dislexia pode variar desde uma incapacidade quase

total em aprender a ler, até uma leitura quase normal, mas silabada, sem

automatização. Surge em 7 a 10% da população infantil, independente de classe

socioeconômica. O quadro básico é a de uma criança que apresenta dificuldade

para identificação dos símbolos gráficos. O distúrbio se encontra em nível das

funções de percepção, memória e análise visual.

As áreas do cérebro responsáveis por estas funções se encontram

no lobo occipital e parietal, principalmente. A criança disléxica não deve ser

alfabetizada pelo método global, uma vez que não consegue perceber o todo.

Precisa de um trabalho fonético e repetitivo, pois terá muita dificuldade na fixação

dos fonemas. Necessidade de um plano de leitura que inicie por livros simples,

mas motivadores, aumentando gradativamente e só à medida que lhe for

possível, chegar à complexidade.

Disgrafia – o termo disgrafia é a dificuldade (parcial), porém não na

impossibilidade para a aprendizagem de escrita de uma língua. Existem dois

tipos:

Disgrafia específica ou propriamente dita e disgrafia motora. Na

primeira delas a criança estabelece uma relação entre o sistema simbólico e as

grafias que representam os sons, as palavras e as frases. A isto se denomina

simplesmente disgrafia. A segunda, ocorre quando a motricidade está

particularmente em jogo, mas o sistema simbólico não. A isto se denomina

discaligrafia, entendendo-a não somente como o resultado de uma alteração

motora, mas também de fatores emocionais (restrição do eu, etc.), o que altera a

forma de letra. Os indicadores que consideramos para a disgrafia recebem os

mesmos nomes que os indicadores de dislexia, apenas devemos observar que na

primeira eles ocorrem na escrita (inversão, substituição, translação, omissão,

agressão etc.) e, na segunda, na leitura. O termo disgrafia motora (discaligrafia)

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consiste na dificuldade de escrever em forma legível. Os indicadores mais

comuns da discaligrafia são:

• Micrografia;

• Macrografia;

• Ambas combinadas;

• Distorções ou deformações;

• Dificuldades nos enlaces;

• Traçados reforçados, filiformes, tremidos;

• Inclinação inadequada;

• Aglomerações etc.

A criança consegue falar e ler e as dificuldades ocorrem na

execução de padrões motores para escrever letras, números ou palavras. Pode

ocorrer defeito motor ou apenas em nível de integração (neste caso a criança vê a

figura, mas não sabe fazer os movimentos para escrever as letras). Geralmente

estas crianças são hipotônicas, desequilibradas, disárticas (fala lenta). Os graus

de comportamento são variáveis.

Os casos em que ocorre um distúrbio importante da integração

visual espacial e motricidade representam disfunção no parietal e no frontal.

Quando há dificuldade apenas na produção de uma letra proporcional e legível a

disfunção ocorre predominantemente no lobo frontal ou no cerebelo. Alguns

autores chamam este último quadro de discaligrafia ou disgrafia motora.

Esta situação não é de um desleixo ocasional, e sim, uma

deficiência constante. Não obtemos uma produção mais adequada repreendendo

a criança. Devemos comparar sua própria obra, para obter um parâmetro de sua

melhor produção. Este deve ser o objetivo a ser alcançado e não a perfeição, que

para esse aluno é inatingível. O professor deve trabalhar a conscientização do

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aluno para sua melhor performance e reforçá-lo, positivamente, sempre que

puder.

Disortografia – muitas vezes acompanha a Dislexia, mas pode

também vir sem ela.

É a impossibilidade de visualizar a forma correta da escrita das

palavras. A criança escreve, seguindo os sons da fala e sua escrita por vezes

torna-se incompreensível. Não adianta trabalhar por repetição, isto é, mesmo que

escreva a palavra vinte vezes, continuará escrevendo-a erroneamente. É preciso

trabalhar de outras formas, usando a lógica quando isso é possível, a

conscientização da audição em outros casos, como por exemplo: em “s” e “ss”, “i”

e “u” etc.

A disortografia pode ser observada na realização do ditado, quando

se apresentam trocas relacionadas à percepção auditiva. Por exemplo: F por V

(faca/vaca), a disfunção ocorre em no lobo temporal. Na escrita espontânea (por

redação, interpretação de textos lidos ou ouvidos) há também envolvimento das

áreas visuais (lobo parietal e occipital).

Estes dados nos ajudam a ter um olhar circunstancial para o

processo de alfabetização da criança. O perigo no entanto, é de rotular a criança

desta ou daquela disfunção e acomodarmo-nos nesses rótulos.

Acreditamos ser de suma importância a relação professor/aluno no

ato de aprender e que essa relação seja plena de afeto, compreensão e respeito

à natureza da criança.

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CAPÍTULO II

RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO

NO PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM

Na inter-relação professor aluno, onde ambos aprendem e ensinam,

procuramos respeitar as potencialidades de cada um, nas suas habilidades e

competências.

A contribuição do olhar e da escuta do professor na compreensão

do processo ensino-aprendizagem nos leva a considerar a relevância das

interações sociais do indivíduo no meio escolar.

O educando que mantém uma boa relação com seus professores,

com eles trocando impressões, através de brincadeiras e condições sobre os

mais diversos assuntos, parece mais apto aos estudos. O seu estado psicológico

e emocional o tornam mais sensível receptivo e, com isso ele participa com mais

interesse das atividades de aprendizagem. Ao contrário, aquele aluno que, por um

motivo ou outro, deixa de interagir positivamente com o professor, tratando-o

muitas vezes, com agressividade e ou indiferença perde uma boa parcela de

oportunidade de aprendizagem, no sentido de construir significados a partir de

múltiplas e complexas interações.

Cabe ao professor, através de sua sensibilidade e observação,

perceber o estado emocional negativo do aluno e, através de práticas adequadas,

procurar resgatar nele valores sociais através de situações humorísticas positivas,

onde os fatores afetivos, motivacionais inter-relacionais e são psicomotor de

grande importância.

Por outro lado, é natural do ser humano, cada um a sua maneira,

buscar a felicidade e também o prazer, e o professor deve trabalhar com estes

dados se está, efetivamente preocupado com o desenvolvimento emocional

intelectual e social do seu aluno.

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Para Costa (1991, p. 61) “ o papel do educando é criar espaços,

organizar meio e produzir acontecimentos que façam a educação acontecer”. No

entanto, a tensão e a angústia nem sempre podem ser evitadas pelo educador,

pois são partes da essência desse tipo de trabalho.

As crianças diferem largamente nos fatores que determinam sua

possibilidades para aprender. Para compreendermos aprendizagem e ensino, é

preciso conhecimento do aprendiz. Esse conhecimento implica que os

professores conheçam as diferenças individuais de cada criança. Também

implica que o professor compreenda os fatores que determinam a habilidades de

uma criança, tais como: maturação, experiência, aplicabilidade de matérias,

métodos e estabilidade emocional.

O professor, na sua interação com a criança, deve perceber que sua

arte é primordialmente importante para ela mesma, para o exercício de sua

imaginação, sobretudo para que ela encontre a ordem que, sem ser imposta, lhe

permita assumir e desenvolver a sua simplicidade como ser humano.

Assim sendo, urge que analisemos e questionemos a atual função

do educador dentro do sistema escolar de ensino e busquemos alternativa

inovadora para o processo de alfabetização, de forma e envolver o alfabetizando

no processo de construção e elaboração de sua própria escrita, tornando-a, assim

plena de significação e sentido para ele.

Segundo Smolka (1999) sente-se a necessidade de desenvolver

uma proposta para o processo de alfabetização onde a escrita, mais que um

instrumento técnico e uma atividade mecânica, seja um momento de interação e

interlocução entre todos os envolvidos no processo, valorizando as

particularidades e as aquisições de saberes de cada alfabetizando.

Portanto, é urgente que o professor especialmente na alfabetização,

reveja sua maneira e forma de melhor proporcionar às crianças espaços de

discussões, de elaboração de idéias próprias, que venham a favorecer e

fortalecer o processo de crescimento e apreensão da escrita na criança,

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aproveitando o saber preexistente das mesmas, tornando-se sujeito que ensina e

sujeito que aprende.

Emília Ferreiro (1999) dedicou-se ao estudo como a criança evolui

em suas representações do sistema gráfico. Embora seja difícil resumir sua

metodologia sem traí-la, ela observa como a criança representa,

espontaneamente, como as palavras devem ser escritas. Assim, podemos

escrever as fases (pré-silábica, silábica) pelas quais se estrutura o sistema de

escrita na criança. O que é protocolo de estudo para o psicólogo vai tornar-se

método para o professor.

É através do fazer criativo que a criança se prepara para ter o

comportamento criativo e o seu compromisso consigo mesma; é aí que a relação

professor-aluno deve ser desenvolvida na percepção do professor quanto ao

perceber a desenvoltura da criança e sua criatividade.

Mais do que uma profissão, ser professor é ser pai, mãe, amigo... O

sentimento de afeto é algo inato no ser humano. Mas ele precisa ser

desenvolvido desde os primeiros anos de vida do indivíduo, inclusive a escolar.

2.1. – Relações afetivas

Os vínculos afetivos fazem parte do desenvolvimento do ser

humano. Na instituição de educação infantil, o ambiente precisa ser saudável e

incentivar a auto-estima das crianças.

Isto ajuda o fortalecimento da autonomia. O educador deve acolher

cada criança de forma individual e afetiva, o que é um desafio permanente,

principalmente quando se trata de alfabetizar. É preciso ter em mente que o

cuidado com cada aluno deve estar integrado ao cuidado com a turma. O

educador não deve impedir os impulsos relacionados à ação das crianças pois é a

partir dessas ações que elas criam e recriam. Ao contrário, deve oferecer

oportunidades diárias de exercícios

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de construção de idéias, em jogos em sala de aula ou no pátio, sempre dando aos

alunos materiais com diferentes desafios.

É importante, também, desmontar o uso tradicional das carteiras

individuais substituindo por grupos de alunos. Devemos dividir a sala de aula em

vários cantos organizados com materiais diversos. Estes dois cuidados dão

liberdade de ação às crianças e lhes oferecem a chance da interação com seus

companheiros, dois dos principais objetivos da educação. O desenvolvimento

destas e de demais aptidões, dar-se-ão com eficiente aplicação da prática.

Certamente uma prática pedagógica fundamentada na afetividade possui maiores

condições de atender aos objetivos educacionais. Para tanto, o que questionamos

é: “como integrar a afetividade à pratica pedagógica da educação infantil?”

Ao respondermos à questão: “Como integrar a afetividade à prática

pedagógica na alfabetização ?”, visamos deixar claro a importância da afetividade

no desenvolvimento do indivíduo e demonstrar como inclui-lo na prática

pedagógica de maneira eficiente.

Procuramos, dessa maneira, auxilio em resultados da pesquisa, não

só com educadores, mas com alfabetizadores de educação infantil, assim como

os docentes que procuram a formação da área da Pedagogia. Lembrando que é

extremamente importante levarmos ao conhecimento dos pais a importância da

atividade lúdua, criativa na formação da criança em processo de alfabetização .

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2.2 – Como trabalhar com a afetividade no ensino fundamental

2.2.1 – Com os pés no cotidiano

Começa o período da tarde. A professora entra na sala. Tumulto.

Várias crianças falam ao mesmo tempo. Cadernos voam. Um aluno bate com a

cadeira no chão. A professora grita: “Vamos fazer silêncio, gente!”

Ruidosamente, os alunos tomam seus lugares. No meio da baderna,

a professora nota que apenas duas crianças permanecem sentadas e quietas

desde que ela entrou na sala. A professora pede silêncio novamente. Manda que

peguem o caderno. Alguém diz “Fessora” e começa a contar um episódio

qualquer acontecido em sua casa. Ela se esforça para demonstrar interesse. Faz

perguntas. Ao mesmo tempo, outro aluno também quer contar uma história. A

professora percebe que ele tem dificuldade para encadear as idéias de seu relato.

Ela, meio atordoada, tente dar atenção a ambos. Olha o relógio. Quase quinze

minutos de aula já se foram. Vira-se para a classe e pergunta: quem não fez a

tarefa. A gritaria é geral: “Eu fiz, eu fiz, eu fiz, fessora”. Cadernos surgem de todos

os lados. Eles são quase esfregados em seu rosto. “vê o meu, vê o meu!”

Essa história com certeza se parece muito com as cenas cotidianas

de algumas uma sala de aula. A professora percebe que seus alunos exigem que

atue de formas diversas para atender às necessidades diferentes. Essas

necessidades afetam a professora, e seus alunos são afetados por sua atuação.

É por isso que nosso olhar precisa estar bidirecionando. Precisamos perceber

essa comunicação de mão dupla, entre aluno e professor. Tudo o que acontece

com o aluno também nos afeta e vice-versa. É importante ter consciência de que

a atuação dos alunos é uma decorrência da nossa própria atuação.

Quando esse fato não é percebido, nossa tendência é considerar o

espírito baderneiro de uns e o isolamento de outros como algo cujo origem está

exclusivamente fora da classe.

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A irritação, a impaciência, o desgosto e o estresse são o resultado

da não compreensão e da má administração do processo ensino-aprendizagem.

Olhando reflexiva e bidirecionalmente, podemos nos perguntar o que sente nosso

aluno em função daquilo que ele percebe em nós? Quais os efeitos dessa

indagação nas nossas ações e nas ações dos alunos, em nossa relação de sala

de aula?

Essas perguntas são básicas e precisam ser consideradas ao

analisarmos o que está acontecendo em uma dada relação entre professor e

alunos. As respostas que encontramos nos permitirão identificar em que

precisamos investir para transformar as relações que estiverem prejudicando o

processo ensino-aprendizagem.

No esforço de intervir para transformar, o professor tem duas

principais direções de atuação. A primeira direção leva-o ao desenvolvimento de

ações de planejamento e de estruturação de condições psicossociais que

favorecem afetivamente o processo de ensino-aprendizagem. A segunda direção

vai encaminhá-lo no sentido de conhecer e aplicar adequadamente as ações

didático-pedagógicas propriamente ditas. Acrescentamos ainda uma outra direção

qual seria avaliar continuamente a aplicação e os resultados no processo.

Estaremos, aqui, tratando da primeira. Consideramos as ações de

planejamento e de estruturação de condições psicossociais como pré-condição

para o processo ensino-aprendizagem, pois é por meio delas que lidamos com

aquilo que se constitui no “ambiente” no qual manifestam-se as necessidades

acadêmicas de nossos alunos.

2.2.2 – Compreendendo o contexto

É fundamental conhecer nossos alunos e refletir sempre sobre as

relações interpessoais que ocorrem na classe (professor / alunos e alunos /

alunos). É normal, em todo agrupamento humano, haver pessoas com quem

conseguimos estabelecer laços de empatia e outras com as quais o

relacionamento é mais difícil. É freqüente também que tentemos nos livrar de

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quem nos incomoda. As pessoas muito diferentes de nós ou que não

correspondem às nossas expectativas são geralmente os alvos desse processo

de exclusão.

As diferenças entre as crianças não são, em geral, respeitadas

nem nas famílias, onde os pais costumam estabelecer comparações entre os

filhos, nem no sistema educacional, onde os programas e estratégias são rígidos,

preestabelecidos. Esperamos que o aluno seja capaz de aprender o que o

professor lhe transmite, ao invés de receber instrumentos para construir

o seu próprio conhecimento, de acordo com suas possibilidades de

aprendizagem.

As crianças que apresentam dificuldades de aprendizagem acumulam repetência,

não conseguem se alfabetizar, acabam abandonando a escola ou sendo

rotuladas de deficientes e encaminhadas para classes especiais.

Já as crianças com alguma deficiência mais evidente (física/motora,

sensorial e outras) são segregadas em instituições especializadas, perdendo a

chance de conviver e participar da sociedade em geral. Em ambos os

casos as crianças recebem um rótulo, do qual dificilmente conseguirão

se livrar.

Contudo, embora a tendência do sistema educacional seja excluir

aqueles que não estão adequados às expectativas da escola, o professor pode

romper com esse modelo de educação. O primeiro passo é deixar de classificar e

rotular, negando-se a ordenar e explicar o mundo pela mera atribuição de nomes,

“diagnósticos” que só servem para justificar “cientificamente” a exclusão

realizada pela escola. A simples atribuição de um “diagnóstico” não ajuda

compreender a complexidade de um indivíduo, quer seja isoladamente ou em

relação ao grupo. Isto é ainda mais verdadeiro se considerarmos que estamos

falando de um grupo pertencente a uma instituição normatizada e normatizadora

como é a escola. Para iniciar um processo de mudança de filosofia no sistema

educacional. (SMOLKA,1988)

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• Ver antes o aluno e depois suas dificuldades; avaliar seus aspectos positivos,

e não só os negativos. O aluno é muito mais do que aparenta ser na escola.

Ele freqüenta outros ambientes e é sempre esclarecedor saber como ele é

fora da classe.

• Verificar a origem do aluno: como é sua família e se ele apresenta problemas

também no lar. É importante indagar sobre as vivências escolares dos pais e

que valor dão à escola. Devemos tomar cuidado ao abordá-los, falar

amistosamente, sem julgá-los nem culpá-los pelos problemas apresentados

pelo aluno. É importante envolver-se e também envolvê-los para que

participem desse processo.

• Observar as dificuldades e os comportamentos inadequados e descobrir como

eles são desencadeados.

• Identificar as causas das dificuldades de nossos alunos, observando-os no

cotidiano da sala de aula, ao longo do tempo. Conversar com familiares, trocar

idéias com os demais colegas.

• Consultar outros profissionais que podem ajudar a compreender nossos dados

de observação do cotidiano em classe e propor dicas de procedimento.

• Criar situações em classe.

• Considerar o comportamento do aluno em relação ao grupo maior (aluno muito

tímido, por exemplo, pode se intimidar ainda mais num grupo muito ativo, por

exemplo).

• Refletir, nesse processo de investigação, se o incômodo que sentimos em

relação às falhas do nosso aluno não é causado pelo fato de ele apresentar

problemas que percebemos em nós mesmos e que não aceitamos. É preciso

deixar claro que o diagnóstico de uma doença ou deficiência não deve nunca

ser usado para impor um rótulo a um aluno. O diagnóstico serve para

identificar as reais capacidades e dificuldades do aluno, para que o professor

possa auxiliá-lo em sua adequação na escola. Esse processo diagnóstico tem

início na própria sala de aula, com dados colhidos pelo professor. O

encaminhamento a profissionais de outras áreas não isenta da

responsabilidade de educadores desse aluno.

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A família, primeiro núcleo do qual a criança faz parte, e a escola,

extensão dessa família, constituem os espaços onde o aluno vive maio parte do

seu tempo. As pessoas com as quais os alunos convivem são aquelas que melhor

os conhecem. Portanto, a opinião dessas pessoas é fundamental para se

compreender esse aluno.

2.2.3 – Aprendendo a conviver com as diferenças

A convivência torna-se insuportável quando somos obrigados a

partilhar nosso cotidiano com alguém que nos irrita ou nos agride

constantemente. O desconforto também existe, quando somos nós que irritamos

ou agredimos outra pessoa com freqüência. Também não é bom conviver com

alguém que nos ignora, ou que fazemos sempre questão de ignorar.

É muito importante identificar o motivo da agressão ou da irritação.

Os professores assumem, diante dos alunos, o papel de modelos. As visões de

homens e de sociedade que o aluno construirá, assim como suas vivências

sociais, serão fortemente influenciadas pelos relacionamentos desenvolvidos na

escola, na qual a figura do professor é sem dúvida a mais destacada.

Existem alunos cujas características nos afetam emocionalmente e,

por isso, às vezes fica difícil lidar profissionalmente com esse problema, no

entanto, por isso mesmo, é fundamental buscar a causa desses comportamentos

e adotar os procedimentos mais aprofundados para atender às necessidades do

nosso aluno, quer seja intervindo diretamente ou solicitando ajuda de pessoas

especializadas.

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2.3 – Vejamos alguns exemplos de casos que relatam, fatos da vivência escolar:

A – No mundo da lua

Nádia leciona numa escola pública para uma classe de segunda

série. O aluno Paulo Roberto causa preocupação. Ele tem aparência boa, é bem

comportado e parece vir de uma família bem estruturada. Pelo menos é essa a

impressão que Nádia tem quando vê à porta da escola com a mãe, uma moça

tranqüila, simpática e afetiva com ele e com o outro filho menor, que costuma

acompanhá-los. Paulo Roberto presta atenção às aulas, mas às vezes, ele parece

desligado. A professora o chama e ele não responde. De repente, parece voltar à

realidade e age como se nada houvesse. Nádia está muito intrigada com o

comportamento de Paulo Roberto.

Alunos desligados e distraídos são aqueles que parecem viver no

“mundo da lua”. Esquecem as coisas, são dispersivos. Muitas vezes, ficam

entretidos com uma mosca que passa voando, o movimento dos galhos de uma

árvore visível pela janela etc. Este tipo de comportamento pode ser provocado

por crises de ausência, que podem ser rápidas e passarem despercebidas,

causadas por fatores orgânicos de origem neurológica. A causa do “desligamento”

pode ser uma diminuição na audição ou visão, que, às vezes, pode ser difícil de

ser detectada, mas que dificulta a chegada de estímulos ambientais ao aluno.

Embora inteligentes, os alunos que apresentam essas características têm

dificuldades para responder aos estímulos relevantes no contexto da

aprendizagem.

Há casos de alunos mais sensíveis que, para fugir de realidades

duras e sofridas, refugiam-se no devaneio e na fantasia, dando a impressão de

desligamento ou distração. Na verdade, trata-se de um mecanismo de defesa.

O que podemos fazer para auxiliar esses alunos? Se o problema for

de origem orgânica, urge encaminhá-los para profissionais habilitados

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(neurologistas, oftalmologistas, otorrinolaringologistas) para uma avaliação

e tratamento adequado. Se a dificuldade tiver fundo emocional, é importante ouvir

o aluno, oferecer apoio e amizade e, se possível, contactar a família e encaminhá-

lo a algum recurso da comunidade que possa atender às suas necessidades.

Algumas estratégias podem ser utilizadas em sala de aula para que

o aluno esteja mais propenso a prestar atenção, tais como: pedir-lhe que se sente

em local, onde possa enxergar melhor a lousa. Além de ver e ouvir bem o

professor nesse local, é importante que os estímulos alheios à aprendizagem

tenham menor interferência.

• Dar-lhe instruções de forma clara e passo-a-passo, certificando-se de que as

informações foram bem compreendidas,

• Ter certeza de que o nível da tarefa solicitada seja condizente com o nível de

desenvolvimento e conhecimento do aluno.

B – Nada Importa

Na primeira semana de aula, Gilda, professora com grande

experiência profissional, percebeu que um de seus alunos era diferente. Apesar

de seus oito anos, Jair era um aluno franzino, pálido, com semblante triste, só

falava quando muito solicitado e parecia não ter vontade de fazer nada. Mantinha-

se sentado, quieto, sem ânimo. No recreio não participava das brincadeiras,

ficava de cócoras num canto, observando os outros e passou a ser chamado de

”lesma” e “tartaruga”.

Alunos apáticos parecem não se interessar pelo o que acontece no

ambiente. A sensação que nos causam é a de cansaço, tristeza, depressão. Em

geral esses alunos costumamos considerar, em classe como “bonzinhos”, pois

não incomodam. Mas, aí está um grande perigo: eles não incomodam, mas

também não aprendem !

Esta apatia pode ser fruto de fatores orgânicos como a desnutrição,

a subnutrição, a verminose e a falta de estímulos na primeira infância. Daí a

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importância dos programas de suplementação alimentar ou de alimentação

alternativa junto às populações mais carentes.

Se for transitória na vida da criança, a apatia pode ser causada por

fatores orgânicos que se tratados poderão ser eliminados. Mas a apatia também

pode ser resultado de fatores sócio-emocionais, como a falta de vínculos afetivos

na primeira infância, que causaram prejuízo ao seu desenvolvimento

biopsicossocial. Um dos estudos mais significativos sobre os efeitos danosos da

carência afetiva é a experiência feita por Spitz (1991) com bebês

institucionalizados. Por terem sido privados de vínculos afetivos, os bebês

recusavam-se a comer e acabavam morrendo de inanição e apatia. Pode, ainda,

haver predisposição genética. Nesse caso, o comportamento de apatia aparece

diante de um fator ambiental desagradável como agressividade excessiva dos

pais ou professores, disciplinas punitivas, discórdia marital e rejeição na família ou

na escola.

É importante estarmos atentos a esse alunos, mantendo diálogo

constante, chamando-os à participação e elogiando qualquer iniciativa, por menor

que seja. Também podemos solicitar o auxílio de outros alunos da classe, para

que se cheguem a ele e peçam a sua participação em jogos e brincadeiras. O

tratamento das causas orgânicas e o estabelecimento de vínculos de afeto e

confiança entre professor e aluno podem minorar bastante a dificuldade.

C – No canto da sala

Maria Lúcia tem oito anos e está na secunda série do segundo grau.

Na primeira série sentava-se na frente e, apesar de certas dificuldades, conseguiu

se alfabetizar. Era uma criança tranqüila que procurava se adequar ao grupo.

Como cresceu muito, este ano passou a sentar-se no fundo da sala. O seu

rendimento caiu e ela passou a se isolar, quase não participa das brincadeiras no

recreio, parece querer passar despercebida. Rita, a professora, começou

perceber que Maria Lúcia só responde quando ela a chama em voz alta ou

quando está mais próxima a ela.

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Conversando com a mãe, Rita soube que Maria Lúcia havia sido um

bebê muito doente, com infecções de ouvido constantes. A mãe era solteira,

trabalhava para sustentar a si mesma e a filha, e não tinha muita informação, nem

condição de cuidar da menina.

Qual será a causa da dificuldade de Maria Lúcia ?

A criança que tende ao isolamento, que prefere se manter afastada

de grupos, com dificuldades para se relacionar e parecendo temer a reação dos

outros a sua presença, pode ser portadora de algum problema emocional. A

criança muito reprimida e pouco estimulada desde o nascimento, ou até mesmo

rejeitada pode se sentir insegura, com uma auto-desvalorização muito grande.

Por isso prefere isolar-se quando em presença de um grupo maior. Mas esse

comportamento também pode surgir quando o aluno não escuta normalmente e

por isso apresenta dificuldades para falar e se desenvolver bem.

Também uma alteração do desenvolvimento, como o distúrbio

autista (no qual o isolamento aparece como apenas um dos sinais), pode ser a

causa do distanciamento do aluno.

Nesses casos é preciso observar se ele tem preferência por algum

colega de classe com quem consiga estabelecer laços de confiança e amizade.

Esse amigo pode servir de intermediário entre ele e os outros. É importante fazer

o aluno sentir-se aceito para que desenvolva confiança e segurança. As tarefas

propostas a ele devem ser sempre adequadas ao seu nível de conhecimento e de

realização, para que não se sinta ainda mais frustrado. As instruções devem ser

dadas de forma clara e simples, passo a passo, dando-lhe a ele tempo para

refletir e absorver o que está sendo dito. Também é preciso observar as condutas

mais positivas do aluno, ou seja, os momentos em que ele se encontra mais

disponível para ouvir, ser ouvido e ajudado, aproveitando-os para estimulá-lo à

participação.

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D – Falando “elado”

Fabiana é professora de uma escola pública estadual. Ela costuma

dar carona para seu vizinho João, de oito anos, que freqüenta a mesma escola,

embora não seja seu aluno. João era filho único, muito mimado e superprotegido

pelos pais. A mãe teve dificuldade para engravidar outra vez. Fez vários

tratamentos e, quando já havia desistido de ter outros filhos, engravidou e deu à

luz a uma linda menina. João tem demonstrado muito ciúme e agora deu para

falar errado, de forma infantilizada, o que vem prejudicando o seu rendimento

escolar e tem tornado João alvo de zombaria para os colegas.

A fala é uma das formas pelas quais o ser humano se expressa e

estabelece relações com aqueles que o cercam. É muito freqüente encontrarmos

crianças em idade escolar com distúrbios de fala prejudiciais ao seu rendimento.

Alterações como trocas de letras, gagueira, mudez, entre outras, podem ter

variações e, em muitos casos, estas se apresentam de forma inter-relacionada. A

maioria dos casos (cerca de setenta e cinco por cento) pode ser devido a fatores

orgânicos como deficiência auditiva, mental (por Síndrome de Down e outras) e

alterações neurológicas (provocadas por meningite; encefalites; problemas

durante o período de gestação, como a rubéola; traumas de parto e outros). A

criança convulsiva também pode vir a apresentar distúrbios da linguagem.

Com relação ao ambiente, a interação da criança com as pessoas

que a cercam, principalmente a mãe ou pessoa que cuida dela, é de extrema

importância para o desenvolvimento da linguagem. É muito freqüente o adulto não

falar com a criança, porque acha que ela não entende. É comum adultos falarem

de forma infantilizada, inadequada e errada, trazendo com isso prejuízos à

criança. Também podemos receber em classe alunos vindos de outros locais,

utilizando uma linguagem diferente da nossa (regionalismo).

Dificuldades na fala podem aparecer em crianças não desejadas; em

crianças que não correspondem, às expectativas dos pais; e em crianças mais

sensíveis, que se sentem rejeitadas após a vinda de um irmão ou a separação

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dos pais. Esses distúrbios são freqüentes em crianças que vêm de lares muito

rígidos, nos quais têm seus sentimentos recalcados etc. A gagueira, por exemplo,

pode ser produto dessas situações citadas.

Tantos casos relatados, nos conduzem a indagar se a afetividade é

um fator relevante no ato de aprender.

No próximo capítulo, detalharemos sobre esse aspecto.

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CAPÍTULO III

ESTRATÉGIAS DE MUDANÇAS QUE FAVORECEM

AS QUESTÕES DA AFETIVIDADE NO ATO DE APRENDER

Os graus de direcionamento das atividades na sala de aula variam

de professor para professor. Podem ser classificado em escala que vai do

controle absoluto à situação em que é deixada liberdade de iniciativa aos alunos,

com pouca interferência. Num extremo temos o que muitas vezes é definido como

professor tradicional; no outro, aquele professor considerado aberto e moderno.

Se observarmos bem, maior parte dos professores situam-se em uma posição

intermediária. O estilo de ensino está ligado à peculiaridade do professor. Em

geral, o professor impõe sua modalidade e por isso determina um “estilo” na

condução da classe.

No processo ensino aprendizagem (Pichon – Reviére,2000) existem

duas relações importantes:

• Inter-psíquica = é a relação aluno/ professor/ cultura (sala de aula);

• Intra-psíquica = é a interação (síntese) que faz de um temática com outros

conhecimentos já adquiridos e com outros mediadores.

Nessas relações acontece o encontro entre duas subjetividade que

são diferentes, mas que por isso mesmo buscam-se completar. Um vincula-se ao

outro num processo de trocar “pathos” e, em movimentos de aproximação

buscam olhar-se, olhando-se, ouvindo-se.

Nesse movimento o afeto pode circular, funcionando como um

mediador das relações positivas. Na presença do afeto o sujeito está disponível

para ouvir, trocar, aprender.

Pichon – Rivière (2000, p.12) classifica esse aproximar-se do outro

positiva ou negativamente como vínculo. Para ele, o vínculo é “uma estrutura

dinâmica em contínuo movimento, que engloba tanto o sujeito quanto o objeto,

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tendo esta estrutura características consideradas normais e alterações

interpretadas como patológicas”.

Assim, nas relações inter-psíquicas, ou seja, no interjogo

estabelecido entre o sujeito e os objetos, há algo que está fora do sujeito e que o

mobiliza a aproximar-se ou afastar-se e há algo que é interno ao sujeito (daí

psíquico) e que responde pelas experiências prévias vividas por ele e que já estão

vinculadas em seu mundo interno.

Para efeito de compreensão de como o sujeito aprende, dizemos

que há no processo esses dois tipos de relação a intra e a interpsíquica, mas, na

verdade, elas ocorrem em um mesmo movimento.

O objeto de aprendizagem é algo que está fora de sujeito, que vem

do outro, da natureza e precisa encontrar no mundo interno relações já

estabelecidas que favoreçam o processo de apreensão, reconstrução ou de

desconstrução. Isto significa dizer que há um movimento dialético do novo objeto

de conhecimento com as experiências prévias já adquiridas. Daí porque Pichon

Rivière (op. cit ) considerar que “o processo de aprendizagem da realidade

externa é determinado pelas características resultantes das aprendizagens

prévias da realidade interna, estabelecidas entre o sujeito e seus objetos

internos”. (p.15)

Percebemos, então, que há um movimento em espiral: o que é

interno, o que está dentro do sujeito, movimenta-se com o que está fora do sujeito

e vice-versa. Só haverá aprendizagem se esse vínculo for de aceitação, positivo,

caso contrário há o afastamento, a rejeição.

O sujeito é único e sempre responde à realidade na sua totalidade,

ou seja, mente, corpo e mundo externo são áreas que se influenciam, marcando a

conduta do indivíduo.

Se aprendizagem é conceituada como a adaptação ativa à

realidade, essa atividade terá que ter sua matriz no sujeito que aprende. Para

aprender ele terá que mobilizar seu corpo, herdado geneticamente, seu

organismo, para melhor articular as conexões nervosas, sua inteligência e o

desejo. Esse desejo vem do outro, de querer saber com o outro que está fora dele

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e que o mobilizará para aprender. Logo, se existe o outro, esse vínculo entre o

que ensina e o que aprende deve ser positivo. (FERNÁNDEZ, 2000)

3.1 - Direção de classe

O principal alvo é o aluno e através dos métodos de construção de

conhecimentos, o professor opera. Cabe ao professor direcionar a aprendizagem.

Podemos assim dizer que a direção de classe é um dos fatores que leva o

educando a formar e sistematizar determinados conhecimentos. Há, porém vários

discursos em relação ao não diretivismo, alegando as diferenças individuais,

criatividade e respeito ao aluno, tendo como princípio que o aluno aprende o que

quer e na hora que estiver disposto a querer aprender.

Sendo assim, o professor fica dispensado de ensinar. Pelo exposto,

houve uma confusão entre o respeito à individualidade, e a criatividade, pois a

educação é um processo diretivo. Mesmo quando o professor educador deixa o

aluno descobrir por si próprio, ele tem muitos objetivos a serem alcançados. Paulo

Freire (2000, p.28), nos diz que a “natureza da prática educativa, a sua

necessária diretividade, os sonhos que perseguem na prática não permite que ela

seja neutra, mas política sempre”.

Todos somos educadores e educandos, ao mesmo tempo, no

momento em que ensinamos e somos ensinados nas diversas circunstâncias de

nossas vidas.

Antes de ser professor devemos ser educadores, protagonistas do

novo, revendo, prevendo e organizando. Só assim podemos apresentar aos

alunos situações didaticamente estruturadas no sentido de auxiliá-los a perceber,

generalizar e formar o conhecimento. Por isso, a direção de classe é uma

necessidade como forma de estabelecer e propor atividades de ensino-

aprendizagem.

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A direção de classe supõe:

• Planejar as aulas;

• Selecionar e estruturar os conteúdos;

• Prever e utilizar adequadamente recursos incentivados e materiais

audiovisuais;

• Organizar atividades individuais e em grupos interessantes e bem dosados,

que auxiliem o aluno na construção do conhecimento;

• Avaliar continuamente os progressos realizados pelos alunos, mostrando os

seus avanços e dificuldades, e como podem aperfeiçoar o seu conhecimento.

Sugestões:

- Prever os conteúdos e atividades a serem desenvolvidos, bem como seus

objetivos, interesses e necessidades a nível do aluno. Planejamento de forma

flexível, satisfazendo as reais necessidades do aluno.

- Buscar fazer o aluno participante do planejamento da aula, dando sugestões.

- Clarear qual o objetivo que se quer chegar com este ou aquele conteúdo.

- Adotar atividades de diálogo no seu dia a dia de docente na sala, não

esquecendo que o aluno já traz experiências anteriores.

- Propor-lhes atividades desafiadoras, situações problematizadoras, nas quais

eles tenham que descrever, falar, relatar, dialogar, escrever, comparar,

observar, localizar etc.

- Ao expor um novo conteúdo, verificar nos alunos novas experiências sobre tal

assunto, buscando relacioná-los sempre com a realidade diária dos alunos.

- Perceber os avanços dos alunos no processo de construção do seu

conhecimento, avaliando continuamente, fornecendo-lhes os resultados, não

só com a nota, mas discutindo com eles os meios pelos quais foram avaliados

(provas, trabalho etc.) e no que erraram ou acertaram e como podem

melhorar em todos os aspectos, incentivando-os a prosseguir.

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- Ser breve na correção e retorno das avaliações, pois quanto mais for o

retorno, mais rápido os alunos poderão avançar na construção de seu próprio

conhecimento, valorizando sempre seus resultados, ainda que pequenos.

- Motivar os alunos para que eles mesmos pratiquem a auto-avaliação, com

atitudes críticas sobre seu comportamento e em relação a seus próprios

conhecimentos.

- Enfatizar o progresso dos alunos no seu processo de aprendizagem quanto

ao esforço e valorização, entendendo que assim podem reforçar a auto-

estima.

- Dividir, distribuindo tarefas e funções de maneira que cada aluno participe e

coopere ativamente da aula.

Devemos lembrar que em cada região encontramos realidades

diversificadas, como também encontramos cada classe com sua particularidade.

Realidades diferentes com características próprias requerem que cada professor

(educador) busque seu próprio aperfeiçoamento da aprendizagem.

No entanto, vale lembrar aqui que todo professor, enquanto

indivíduo, tem sua personalidade orientada por valores e princípios de vida, que

direta ou indiretamente influem no seu comportamento (atitudes) diário. É o

educador quem auxilia na formação da personalidade do educando. Na relação

professor-aluno o diálogo é indispensável. Isto favorece a auto-compreensão do

aluno, no seu papel de construtor do conhecimento. Professor-aluno devem

sempre propor, analisar e discutir juntos qualquer assunto. Isso motiva o aluno a

participar. Motivação é um processo psicológico, que depende de cada aluno e do

seu nível de aspiração.

3.2 – Participação alienada e passiva

Participação alienada e passiva é o que caracteriza a “integração” do

aluno, de forma geral no processo educacional como um todo. É um dado de

partida, que existe objetivamente e que não é específico de uma escola. Quando

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colocamos que o “aluno alienado” é nosso ponto de partida, estamos nos

referindo a um amplo processo social que torna a pessoa como objeto, que

embrutece os seus sentidos, que a torna egoísta e preconceituosa, competitiva e

agressiva, incapaz para um relacionamento cotidiano de respeito franco (não

formal) e coletivo, e como tal atinge tanto os alunos quanto os professores.

Temos, na sala de aula, tantos microcosmos quantas forem as

pessoas lá presentes. Cada uma com sua história, seu quadro de valores, suas

expectativas e ansiedades, seu potencial intelectual, suas situações afetivas

(remotas e recentes), suas idéias e crenças, sua visão de mundo, sua classe

social, tipo físico, sua participação em grupos exclusivos (que às vezes possuem

até linguagem), etc. O processo de alienação e objetivação transforma todas

estas diferenças em elementos de competitividade e fechamento. E as

desigualdades, mesmo que ocorram entre “iguais” (como os alunos),

transformam-se em verdadeiros abismos que separam brutalmente as pessoas

umas das outras. Acrescente-se a este mundo um elemento, o professor, cuja

função se destaca e se diferencia por sua própria dinâmica e teremos uma brutal

separação: a “terra de ninguém” que separa as duas trincheiras é exatamente

esta alienação.

Este processo de objetivação não separa apenas as pessoas umas

das outras. Separa uma pessoa, também, de si própria. Os nossos destinos se

desenvolvem sem que neles tenhamos quase que qualquer interferência. Eles já

se encontram determinados por um jogo cego e inconsciente que independe da

vontade de seus participantes: os alunos lá estão porque a família assim

determinou a esta determinação familiar não se origina numa escolha de valores

humanistas, mas geralmente de uma concepção “financeira”, de manutenção ou

de ascensão de “status”. Já o professor, que descaminhos o conduziram para a

sala de aula, onde o desânimo, a passividade, a quase completa falta de

estímulos predomina? São quase inexistentes os impulsos conscientes que

motivam o indivíduo a compor a sala de aula, seja aluno ou professor. Porém eles

estão lá, “forçados”, contra a vontade, submetidos a um mecanismo cego e

incompreensível. É este processo automático e mecânico da alienação que toma

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a participação em sala de aula (tanto do aluno como também do professor)

totalmente passiva.

Esta separação brutal dos indivíduos e a sua passividade mecânica

são processos objetivos que brotam diretamente do organismo social. As pessoas

isoladamente não são culpadas, a culpa encontra-se na relação social, que

estrutura as pessoas sob a violência objetivada. Ora, como podemos ter a ilusão

de que um dos participantes deste turbilhão, o professor, consiga desencadear

um processo de aprendizagem num universo tão diversificado quanto este? Se

suas palavras não têm o mesmo significado para as diferentes pessoas, se as

expectativas são as mais diversa se o próprio conteúdo que o professor pretende

passar não tem nada a ver com a realidade de cada um, sendo que, muitas

vezes, o próprio professor não sabe justificar o porquê daquele conteúdo, a não

ser com saídas evasivas como “é matéria obrigatória”, “vai precisar no

vestibular”?

3.3 – Participação coletiva e ativa

Ora, se a culpa é de relação entre os indivíduos isolados, é esta

relação que deve ser o nosso alvo prioritário. Se as pessoas encontram-se

brutalmente separadas, se existe “uma terra do ninguém” entre elas, é necessário

atravessá-la, quebrar os muros de bloqueio, unir os microcosmos num universo

criador. É necessário resgatar a humanidade perdida, quebrar o automatismo e a

passividade da participação, tornando as pessoas conscientes e senhoras de

seus destinos.

Repetindo: se a culpa é da relação social, é necessária transformá-

la, em nossa escola e na sala de aula. Criar uma nova relação educacional entre

os agentes da nossa comunidade, é esta nova relação que vai gerar novos

homens. A participação, alienada e passiva devemos, pois, opor à participação

coletiva e ativa.

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O aspecto coletivo da participação deve ser visto, não como um processo

despersonalizador mas, pelo contrário, como o principal instrumento de

construção de individualidade. Se a realização da humanidade e das pessoas

acontece, quando elas sentem que contribuem para a construção da felicidade

coletiva; se a felicidade nunca pode ser encarada como um bem individual, mas

sim um bem coletivo; se o “mal” não reside nas pessoas, mas nas relações entre

as pessoas: então, a construção de coletividade onde estas relações se

transformam, perdendo seu caráter embrutecedor, onde as pessoas se respeitam

francamente, onde o relacionamento não seja intermediado por preconceitos e

agressões, onde a homem deixa de ser uma coisa, é o meio mais eficaz de se

formar, individualmente participantes de forma ativa e responsável.

3.4 – Dinâmica interna de sala de aula

O fator predominante na dinâmica interna em sala de aula é o

posicionamento do professor. À medida, em que o professor vai se posicionando,

as coisas vão caminhando, porém é preciso que sejam repousados em

conhecimentos transmitidos, como também no modo de transmissão do

professor.

O melhor livro didático poderá ser inadequado e o trabalho ficará

comprometido, pois se apenas propõe caminhos, estimula buscas, sugere roteiros

que, no entanto, podem despertar amplas e fecundas possibilidades. A maior

parte dos livros didáticos apresenta apenas uma face da realidade, não falsa, mas

muitas vezes, pouco representativa para a maioria dos alunos.

A transmissão de um conjunto de conhecimentos desvinculado do

cotidiano deles ou a quem se destina, de um saber pronto e acabado, sempre

ocupou o primeiro plano das preocupações de muitas escolas, voltada

basicamente para a consolidação e manutenção da dominação econômica,

política e ideológica da sociedade capitalista. Ao contrário de levar os alunos a um

conhecimento mais profundo da realidade e a um posicionamento crítico frente à

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essa realidade, a aula na maior parte das vezes, parece servir apenas a

propósitos de memorização.

Há professores que parecem esquecer que para a assimilação dos

assuntos, importa não só a quantidade como também a qualidade dos conteúdos.

O relacionamento com a realidade vivencial do aluno é necessário a fim de levá-lo

a pensar criativamente, a resolver problemas, a manipular idéias, a fim de

proporcionar-lhe também liberdade para explorar e experimentar, em fim, de

conduzi-lo à reflexão e à ação. É de suma importância a presença do professor na

prática diária de sala de aula, pois cabe-lhe a tarefa, tão necessária, de trabalhar

o conteúdo do livro didático reflexivamente, comparando dos diferentes pontos de

realidade, que é dinâmica e mutável. Assim, “(...) aquelas respostas a que o aluno

aspira, têm necessidade de serem guiados pelo professor.” (TEBEROSKI, 1988,

p. 54)

Utilizando-se de estratégias variadas, alguns professores procuram

trabalhar os mesmos assuntos de novas formas, não tornando o assunto

cansativo. “(..) Aprende-se muito através do uso de procedimentos e atividades

variadas e, principalmente da discussão dos erros (...)”. Dependendo da ocasião,

o incentivo ao uso da biblioteca mostra caminhos para o aluno obter dados

complementares sobre o conteúdo.

Uma outra estratégia de valorizar os conhecimentos prévios dos

alunos é partimos de situações típicas de mensagens orais e mesmo gírias e

pedir-lhes que traduzam para a linguagem formal e vice-versa. A valorização da

própria linguagem dos alunos, mostra-lhe a diferença entre linguagem coloquial

(formas de expressão de acordo com a cultura que pertencem) e a linguagem

culta (de acordo com as normas gramaticais). Para a correção das falhas é

preciso naturalidade de expressão e a espontaneidade a comunicação, sem

menosprezo e nem de expô-los ao ridículo.

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3.4.1 – Construção da participação coletiva e ativa

Ao professor cabe, pois dirigir o processo de construção coletiva da

sala de aula. E esta direção não pode ser guiada pelos parâmetros de

contradições liberdade/ repressão, mas sim, pelos da coletividade/ alienação. O

professor como coordenador do processo, não pode ser omisso, mas

profundamente ativo. Assim ele não pode deixar levar-se por situações que não

são significativas para toda a classe, mas apenas a um pequeno grupo e até, para

um só aluno. Não deve perder de vista nunca o trabalho coletivo e a partir dele

dar respostas às diferentes solicitações, evitando sempre que uma só se imponha

as outras, mesmo que partindo dos mais brilhantes alunos. Ele deve estar atento

para os preconceitos, que são os fatores de marginalização, frutos da ideologia

dominante. Há que agir sobre eles sem discursos cansativos, mas com firmeza e

decisão suficientes que demonstram claramente o erro e que abre o caminho da

correção. Há que estar atento aos alunos mais frágeis, que escapam ao que é

esperado e saber desenvolver uma ação de orientação, dando ao aluno

condições de compreender as ordens de seus desvios, que permitam a

superação dos mesmos.

A construção do espírito de grupo em sala de aula é relevante, pois

quando o professor se volta para o trabalho coletivo e tem nele a principal

referência, é quando melhor vai poder avaliar os seus alunos e a si mesmo, como

integrantes da verdadeira prática libertadora.

A construção desse clima de sala de aula exige um auto--

questionamento constante do professor. “Será que tenho convicção de que estou

transmitindo algo importante para a vida deles? Tenho me preparado (dentro das

limitações) para as aulas ou vou apenas pelas experiências dos anos anteriores?

Tenho procurado formas adequadas de trabalhar o conteúdo? Que tipo de

relacionamento tenho tido com os alunos (em termos de maioria) confronto,

defesa, agressão, compreensão, afetividade, competição, hostilidade, poder,

ameaça ou amizade, respeito, diálogo, interesse, incentivo, desafio construtivo,

motivação? Tenho jogado a culpa só nos alunos:” vocês são alienados,

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individualistas, consumistas, irresponsáveis, infantis”, eximindo-me de qualquer

responsabilidade? A consciência crítica começa pela autoconsciência.”

3.4.2 – Diálogo e Poder

Um relacionamento novo na construção da participação coletiva só

se fará pelo diálogo franco. Temos de estabelecer afinidade psico-afetivas para

trabalhar com tal faixa etária. Por mais difícil que possa ser este tipo de diálogo é

muito importante, pois as contradições podem aparecer e fica mais fácil, tanto

para a classe, quanto para o professor, trabalhar com elas.

Para haver diálogo verdadeiro não pode haver formas agressivas de

pressão e de poder. Isto é quase impossível na escola, pois o professor detêm o

poder numa série de situações (notas, advertências etc.). Entretanto,

considerando o objetivo comum de melhorar as aulas, o professor deverá abrir

mão, o mais possível, de algumas destas formas de poder. Por outro lado, o

poder pode ser utilizado, de forma não agressiva, mas para o bem da

coletividade. Para tanto, deve ser legitimado por essa coletividade e novamente a

legitimação é o diálogo. É necessário que cada ato deste poder tenha o seu

conteúdo o mais claro possível.

Por que deve haver necessidade de exercer este poder? Devemos

estar atentos para o fato de que quando iniciamos um processo de

transformação,a primeira resposta pode não ser a melhor, pois é fruto de

autoritarismo assimilado, lembrando a questão do opressor e do oprimido,

levantada por Paulo Freire (1987). De modo geral podemos dizer que, se

fôssemos identificar opressor e oprimido numa sala de aula, com um professor

autoritário, os alunos ficariam como oprimidos. Pois, cada oprimido “hospeda” um

opressor dentro de si (modelo que foi assimilado pela própria educação

hierarquizada). Temos que reconhecer que temos limitações, mas também muitas

possibilidades inexploradas pedagogicamente.

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Para que o trabalho em sala de aula possa se desenvolver, há

necessidade de se terem condições mínimas favoráveis. Estas condições devem

ser construídas pelos elementos participantes do processo educativo. A

responsabilidade pela obtenção desse ambiente de trabalho é tanto do educador

quanto dos educandos: freqüentemente esperamos que outros, os superiores nos

passem as ordens, pois vivemos numa sociedade dominada pelos adultos. Na

sala de aula o professor representa o mundo dos adultos e isso já contribui para

que a criança ou, o jovem, tenham um tipo de comportamento semelhante àquele

que eles têm fora da escola com os adultos que o rodeiam. As relações que são

estimuladas geralmente são as de obediência, submissão, silêncio, enfim de

repressão de toda possibilidade de manifestações interior mais autêntica e

criativas deles. O professor, sendo o mediador do processo de ensino terá que

saber lidar com a sua autoridade.

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CONCLUSÃO

Elaborar um trabalho acadêmico que pudesse vir a ajudar a

profissionais da área que atuam na alfabetização, bem como, que contribuísse

para a instrumentalização teórica e prática da organização do trabalho

pedagógico destes educadores foi nossa meta.

Neste aspecto, a intenção não foi de formular um manual de

instruções, mas de produzir um estudo com argumentação teórica, que além de

conter uma proposta pedagógica e de trabalho, também fizesse uma abordagem

crítica das questões do ensino na alfabetização.

Cabe ao professor ter boa formação e senso crítico para realizar a

adaptação dos conteúdos metodológicos de ensino e avaliação a serem

trabalhados dentro da realidade da clientela escolar. Parece existir uma

preocupação acentuada de alguns professores em preparar os alunos para as

provas. Não procuram relacionar com a aprendizagem anterior e a realidade

vivenciada pelos alunos, fazendo com que os conteúdos do livro didático, muitas

vezes, pareçam abstratos e de difícil compreensão.

Os professores eliminam a etapa reflexiva da leitura ao fazer com

que os alunos se encaixem na interpretação fornecida no manual do professor,

certa, pronta e acabada. Fica reforçada a idéia de que o mais importante é a

técnica de leitura em si, nada mais. O texto, como é apresentado, não ajuda a

desenvolver nos alunos a reflexão, a criatividade e a criticidade. Transformando-

os em consumidores passivos de mensagem. Professor é aquele que guia e que

tem autoridade para guiar. É preciso reagir para elevar os alunos a

problematizarem, questionarem e construírem conhecimentos com criatividade.

É preciso que o professor ouça e se faça ouvir: faça com que os

alunos não só compreendam as idéias vinculadas pelos autores mas, os levam

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também a posicionarem-se diante delas, dando início ao confronto das idéias

evidenciadas.

A partir da dinâmica interna de sala de aula, do relacionamento

professor aluno, é possível também descobrir formas de influenciar a dinâmica

extrema parra tentar modificá-la e não apenas constatar sua existência. Neste

enfoque, a análise da transformação do conhecimento pelo professor diz respeito

não somente ao “como”, mas principalmente ai “que” e ao “quando” se ensina.

Deve partir em primeiro lugar do reconhecimento do contexto no qual está

inserido e a partir daí refletir sobre o que está sendo transformado.

O professor deve ser aquele que vai buscar caminhos, formas de

organizar e executar o trabalho pedagógico que respondam a uma nova

concepção de educação, que definam outros fins e que exijam novas

metodologias. Nesta nova postura, a mensagem transmitida por meio da

linguagem oral e escrita têm outro sentido: partir do aluno real que vive numa

sociedade real e atingir os fins últimos através da instrumentalização do aluno

para a modificação da sociedade. Este processo ocorre na medida em que o

professor e o aluno, ao utilizarem o diálogo dialéticamente intinizam o conteúdo

discutido com o contexto escolar e cultural mais amplo.

.A construção do relacionamento humano é fundamental para o

processo educativo. Os próprios alunos percebem que uma classe unida, onde há

calor humano, respeito, aceitação, é motivo de “dar gosto de vir para escola”,

ajudando, inclusive, a lidar com seus defeitos a construção do relacionamento

humano é fundamental para o processo educativo. Os próprios alunos percebem

que uma classe unida, onde há calor humano, respeito, aceitação, é motivo de

“dar gosto de vir para escola”, ajudando, inclusive, a lidar com seus defeitos

Esse relacionamento humano deve ser marcado pelo respeito e pelo

afeto, principalmente na época da alfabetização, da construção, reconstrução da

leitura de realidade que a criança realiza anualmente e que é essas leituras e

hipóteses que estabelece, que ela desenvolverá seu processo de lecto-escrita.

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Saber ouvir, olhar e perceber o movimento individual do

alfabetizando é saber lidar com um sujeito de potencialidade e de possibilidade.

Cabe a nós, educadores, estudar muito para saber identificar

problemas e procurar soluções para, sozinho ou em equipe, ajudar o nosso aluno

nesta construção. Às vezes a dificuldade é mínima e se nós não a reconhecemos

torna-se imensa.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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