126
Universidade de Brasília Faculdade de Ciências da Saúde Departamento de Enfermagem Programa de Pós Graduação em Enfermagem VALDENISIA APOLINARIO ALENCAR CONTRIBUIÇÕES DA INTERNAÇÃO DOMICILIAR PARA PROMOVER A DESOSPITALIZAÇÃO E PREVENIR A REOSPITALIZAÇÃO NO ÂMBITO DO SUS BRASÍLIA DF 2013

Universidade de Brasília Faculdade de Ciências da Saúde ...repositorio.unb.br/.../15227/1/2013_ValdenisiaApolinarioAlencar.pdf · doenças diagnosticas como primárias e codificadas

Embed Size (px)

Citation preview

  • Universidade de Braslia

    Faculdade de Cincias da Sade

    Departamento de Enfermagem

    Programa de Ps Graduao em Enfermagem

    VALDENISIA APOLINARIO ALENCAR

    CONTRIBUIES DA INTERNAO DOMICILIAR PARA PROMOVER A

    DESOSPITALIZAO E PREVENIR A REOSPITALIZAO NO MBITO DO SUS

    BRASLIA DF

    2013

  • 2

    Universidade de Braslia

    Faculdade de Cincias da Sade

    Departamento de Enfermagem

    Programa de Ps Graduao em Enfermagem

    VALDENISIA APOLINARIO ALENCAR

    CONTRIBUIES DA INTERNAO DOMICILIAR EM PROMOVER A

    DESOSPITALIZAO E PREVENIR A REOSPITALIZAO NO MBITO DO SUS

    Dissertao apresentada como requisito parcial para a

    obteno do titulo de Mestre em Enfermagem pelo

    Programa de Ps-Graduao em Enfermagem da

    Universidade de Braslia.

    rea de Concentrao:

    Polticas, prticas e cuidado em sade e enfermagem

    Linha de Pesquisa:

    Gesto da ateno sade e organizao dos servios

    de Sade

    Orientador: Prof. Dr. Emerson Fachin Martins

    BRASLIA DF

    2013

  • 3

  • 4

    VALDENISIA APOLINARIO ALENCAR

    CONTRIBUIES DA INTERNAO DOMICILIAR EM PROMOVER A

    DESOSPITALIZAO E PREVENIR A REOSPITALIZAO NO MBITO DO SUS

    Dissertao apresentada como requisito parcial para a

    obteno do titulo de Mestre em Enfermagem pelo

    Programa de Ps-Graduao em Enfermagem da

    Universidade de Braslia.

    Aprovado em 30 de setembro de 2013

    BANCA EXAMINADORA

    Professor Doutor Emerson Fachin Martins Presidente da Banca

    Universidade de Braslia

    Professor Doutor Jos Antnio Iturri de la Mata Membro Efetivo e externo ao PPGEnf

    Universidade de Braslia

    Professora Doutora Leila Bernarda Donato Gottems Membro efetivo e interno PPGEnf

    Universidade Catlica de Braslia

    Professor Doutor Elioenai Dornelles Alves Membro suplente e interno PPGEnf

    Universidade de Braslia

  • 5

    Dedico este trabalho a minha referncia de

    vida, minha me, exemplo de amor, trabalho e

    honestidade. Que tinha como lema de vida:

    minha famlia meu tesouro.

    Dedico tambm ao grande amor da minha

    vida, Ccero Alencar, ar dos meus pulmes.

    Meu amigo, meu companheiro, meu cmplice

    e eterno namorado. Sem voc nada teria

    sentido.

  • 6

    AGRADECIMENTOS

    Agradeo primeiramente a Deus, meu sustento e inspirao.

    Ao meu amado esposo, por sua pacincia, lealdade, cumplicidade, apoio e amor, eu no tenho

    palavras para expressar minha gratido. Voc um presente de Deus para minha vida.

    Aos familiares e amigos que acreditaram em mim e compreenderam minhas ausncias, em

    especial ao Valter e Valdizia Apolinrio.

    Aos queridos companheiros da ateno domiciliar do Distrito Federal em especial a equipe do

    Ncleo Regional de Ateno Domiciliar de Ceilndia pela cumplicidade, apoio, incentivo e

    principalmente por embarcarem na ousada proposta de construir um servio de ateno

    domiciliar na Ceilndia.

    Ao meu orientador, Emerson Fachin Martins, que foi para mim um pai acadmico, ensinando-

    me muito sobre cincia e, alm disso, ofertou lies sobre persistncia, valores morais,

    famlia, resilincia e esforo na busca de um ideal, eu serei eternamente grata por sua

    dedicao e voto de confiana.

    A toda a equipe do Ncleo Regional de Ateno Domiciliar da Regional de Sade de

    Ceilndia que, quase desde sua origem em 2009, tem sido parceira dos projetos de ensino,

    pesquisa e extenso coordenados pelo Prof. Dr. Emerson Fachin Martins. Obrigado por nos

    permitir fazer parte desta histria.

    Tenho um especial agradecimento aos pacientes e familiares admitidos no Programa de

    Internao Domiciliar do Ncleo Regional de Ateno Domiciliar de Ceilndia, pela

    oportunidade de aprendizado sobre cincias da sade, enfermagem, cuidado e muito mais

    pelos ensinamentos de vida, de resilincia, compaixo, dedicao, amor incondicional e zelo

    pelo outro. Vocs marcaram minha vida profundamente.

    A Regional de Sade de Ceilndia, parceira constante dos projetos desenvolvidos na

    Faculdade de Ceilndia (FCE) da Universidade de Braslia (UnB), nosso sincero

  • 7

    agradecimento por possibilitar o uso desta grande regional como cenrio de investigao desta

    pesquisa.

    A todos os estudantes que ao longo desses anos tem contribudo com a execuo do ensino-

    pesquisa-servio em Ceilndia, cenrio de trocas de conhecimento e experincia, em especial

    dedico aos alunos que diretamente contriburam com este trabalho: Arthur Rodrigues Bezerra,

    Ana Carolina Oliveira Costa, Daniela Aires Cardoso, Dyego Ramos Henrique, rika Cristina

    Botelho Pinho, Lucas Lobato de Souza, Lus Carlos Beda do Nascimento, Ndia Luiza

    Gonalves, Rayanne Peres Rosa, Renata Cristina Martins Silva, Samira Yusef Ali e outros.

    Ao Decanato de Extenso (DEX) da Universidade de Braslia (UnB) que desde 2010 at 2013

    tem apoiado administrativa e financeiramente as quadro edies anuais do Projeto de

    Extenso de Ao Contnua (PEAC): MELHOR EM CASA DESOSPITALIZANDO PELA

    ATENO NO DOMICLIO coordenado pelo Prof. Dr. Emerson Fachin Martins.

    Ao Decanato de Pesquisa e Ps-Graduao (DPP) da Universidade de Braslia (UnB) que, por

    meio da Diretoria de Fomento Iniciao Cientfica (DIRIC) em parcerias com o Conselho

    Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico (CNPq) e a Fundao de Apoio

    Pesquisa do Distrito Federal (FAPDF) subsidiou bolsas de iniciao cientfica para as

    estudantes de graduao Ana Carolina Dill de Quadros de Matos (Terapia Ocupacional),

    Beatriz dos Santos Mesquita (Fisioterapia), Joaquim Pedro Ribeiro Vasconcelos (Sade

    Coletiva), Ludmila de Souza Santos (Enfermagem), Sara de Frana Mendes (Enfermagem) e

    Pedro Henrique Corts de Sousa (Fisioterapia) que contriburam para a coleta parcial e

    sistematizao de dados utilizados nesta dissertao.

    Ao Prof. Dr. Oviromar Flores que em colaborao com o Prof. Dr. Emerson Fachin Martins

    coordenaram o projeto de pesquisa que viabilizou recursos financeiros para a elaborao da

    pesquisa apresentada nesta dissertao.

    Agradeo a Fundao de Apoio Pesquisa do Distrito Federal (FAPDF) que em parcerias

    estabelecidas com a Secretaria do Estado de Sade do Distrito Federal (SESDF), o Ministrio

    da Sade (MS) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico (CNPq)

    concederam recursos financeiros pela aprovao do projeto de pesquisa LIMITES E

  • 8

    POSSIBILIDADES NA DES-HOSPITALIZAO E PREVENO DE RE-

    HOSPITALIZAO DE PORTADORES DE DOENAS CRNICO-DEGENERATIVAS

    VIA FORTALECIMENTO DA POLTICA DE INTERNAO DOMICILIAR NO

    MBITO DO SUS que concorreu ao Edital FAPDF 13/2010 Pesquisa para o SUS: Gesto

    Compartilhada em Sade (PPSUS-DF processo: 193.000.346/2010).

    Ao Programa Nacional de Reorientao da Formao Profissional em Sade (PRO-SADE) e

    ao Programa de Educao pelo Trabalho para Sade (PET-SADE) que proporcionaram

    fora de trabalho financiada pela aprovao do projeto FORTALECIMENTO DA REDE DE

    ATENO SADE DE CEILNDIA: UM PROJETO DE REORIENTAO DA

    FORMAO E DO CUIDADO EM SADE que concorreu ao Edital 24/2011 e foi

    contemplado com recursos financeiros.

  • 9

    A casa nosso canto no mundo.

    A casa abriga o devaneio, a casa abriga o sonhador,

    a casa permite sonhar em paz.

    A casa nos ajuda a dizer: serei um habitante do mundo,

    apesar do mundo.

    A casa uma das maiores foras de integrao para os pensamentos,

    as lembranas e os sonhos do homem.

    Sem a casa o ser humano seria disperso,

    jogado no mundo...

    Gaston Bachelard

  • 10

    RESUMO

    ALENCAR, V.A. Contribuies da internao domiciliar em promover a

    desospitalizao e prevenir a reospitalizao no mbito do SUS. 2013. 131 folhas.

    Dissertao (Mestrado) Departamento de Enfermagem, Faculdade de Cincias da Sade,

    Universidade de Braslia, Braslia, 2013.

    Ateno domiciliar desponta como modalidade de assistncia que substitui ou complementa a

    ateno hospitalar que ainda carente de estudos que descrevam suas contribuies. Assim,

    objetivou-se investigar limites e possibilidades da internao domiciliar promover

    desospitalizao e prevenir reospitalizao de sujeitos admitidos em Programa de Internao

    Domiciliar (PID). Optou-se por delineamento de pesquisa observacional do tipo longitudinal

    em etapas retrospectiva e prospectiva com abordagens qualitativa e quantitativa. Os dados

    foram obtidos dos registros documentais do servio e dos sujeitos admitidos no perodo de

    maio de 2009 a dezembro de 2012. Os resultados apontaram uma populao idosa (71%

    acima de 60 anos), predominantemente masculina (52,5%), no alfabetizada (36,7%) e j

    aposentada (44,6%). As doenas crnicas representaram 97,2% do que foi encontrado. Das

    doenas diagnosticas como primrias e codificadas pela CID10 prevaleceu aquelas do

    captulo do aparelho circulatrio (39,5%), seguidas por cdigos distribudos nos captulos de

    neoplasias (27,7%), doenas do sistema nervoso central (21,5%) e consequncias de causas

    externas (4,5%). Em mdia, os sujeitos conviviam com a doena primria por 73 meses,

    podendo variar de 3 a 12 anos de cronicidade. Estes sujeitos permaneciam no PID por 378

    29 dias, recebendo em mdia 2,8 visitas ao ms. Admisso via desospitalizao no PID

    iniciou no ano de 2009 com uma frao de desospitalizao de 2,7% finalizando o ano de

    2012 com 46,9%. Dentre os admitidos com desfecho de alta, 75% no foram reospitalizados

    ou tiveram apenas 1 reospitalizao, sendo os admitidos com este desfecho significativamente

    diferentes dos admitidos ativos ou com desfecho de bito, em que se observou mais de 1

    reospitalizao. Conclui-se que o PID iniciou suas atividades com pequena contribuio na

    desospitalizao que aumentou progressivamente aps 4 anos, neste perodo constatou-se que

    o sucesso na assistncia domiciliar pode estar relacionado preveno de reospitalizao.

    Descritores: gesto em sade, indicadores bsicos de sade, servios de assistncia domiciliar,

    hospitalizao, doena crnica, enfermagem.

  • 11

    ABSTRACT

    ALENCAR, V.A. Home care contributions promoting dehospitalization and preventing

    dehospitalization within SUS. 2013. 131 sheets. Thesis (Master) Department of Nursing,

    Faculty of Health Science, University of Braslia, Braslia, 2013.

    Home care emerges as a support modality that replaces or complements hospital care, which

    is still poor of studies describing their contributions. Then, it was aim to investigate limits and

    possibilities of the home care promotes dehospitalization and prevents rehospitalization of

    subjects at a Home Care Program. It was used longitudinal observational research design by

    retrospective and prospective phases, including qualitative and quantitative approaches. Data

    were obtained from service and subject documental records during May 2009 until December

    2012. The results pointed elderly population (71% above 60 years old), predominantly male

    (52.5%), non-alphabetized (36.7%) and retired (44.6%). Chronic diseases represented 97.2%.

    From diagnosed diseases as primary and codified by ICF10, it was prevalent those within

    circulatory system (39.5%), neoplasia (29.3%), central nervous system diseases (21.5%) and

    consequence of external causes (4.5%) chapters. In average, subjects had primary disease for

    73 months, varying from 3 to 12 years of chronicity. These subjects remaining in the Home

    Care Program for 378 29 days, receiving 2.8 times on average 2.8 visits by month. Starts by

    dehospitalization into Home Care Program began on 2009 with dehospitalization fraction of

    2.7%, ending on 2012 with 46.9%. Among subjects with outcome of discharge, 75% was not

    rehospitalized or they had only 1 reospitalization, being significant different from subjects

    with outcomes ative or dead, where was observed less than 1 reospitalization. It was

    concluded that the Home Care Program began with few contributions to dehospitalization that

    were increased progressively after 4 years, nowadays it was evidenced that success in home

    care could be related with prevention of the rehospitalization.

    Key-words: management health, health status indicators, home care services, hospitalization,

    chronic disease, nursing.

  • 12

    RESUMEN

    ALENCAR, V.A. Aportes de la atencin domiciliaria en la promocin de la

    deshospitalizacin y prevenir rehospitalizacin el SUS. En 2013. 131 hojas. Tesis (Master)

    Departamento de Enfermera de la Facultad de Ciencias de la Salud de la Universidad de

    Brasilia, Brasilia, 2013.

    Cuidado en el hogar se est convirtiendo en una modalidad de ayuda que sustituye o complementa

    la atencin hospitalaria que an falta estudios que describen sus contribuciones. As, este estudio

    tuvo como objetivo investigar los lmites y posibilidades de atencin en el hogar y evitar

    reospitalizao promover la desinstitucionalizacin de los pacientes ingresados en Programa de

    Asistencia Domiciliaria (PID). Hemos elegido para la investigacin del diseo pasos

    longitudinales observacionales en estudio retrospectivo y prospectivo de los enfoques cualitativos

    y cuantitativos. Los datos se obtuvieron de los registros documentales de los servicios y los

    sujetos ingresados entre mayo de 2009 y diciembre de 2012. Los resultados mostraron una

    poblacin de edad avanzada (71 % ms de 60 aos), con predominio masculino (52,5 %),

    analfabetos 36,7 %) y ahora jubilados (44,6 %). Las enfermedades crnicas representan el 97,2 %

    de lo que se encontr. Enfermedades como diagnstico primario y codificado por CIE-10 se

    impusieron las del captulo del aparato circulatorio (39,5 %), seguido de los cdigos distribuidos

    en los captulos neoplasias (29,3 %) , enfermedades del sistema nervioso central (21,5 % %) y

    secuelas de causas externas (4,5 %) . En promedio, los sujetos vivan con la enfermedad primaria

    durante 73 meses y puede variar de 3 a 12 aos de cronicidad. Estos temas quedaron en PID de

    378 29 das, recibiendo una media de 2,8 visitas por mes. La admisin a travs de la

    desinstitucionalizacin PID se inici en 2009 con una fraccin de desinstitucionalizacin del 2,7

    % cerrando el ao 2012 con 46,9 %. Entre los admitidos con gran resultado, el 75 % no eran o

    tenan slo 1 reospitalizados reospitalizao, de ser admitido con este resultado significativamente

    diferente de los activos admitidos o el resultado de la muerte, en el que hubo ms de un

    reospitalizao. Llegamos a la conclusin de que las actividades PID comenzaron con una

    pequea contribucin a la desinstitucionalizacin que aumenta progresivamente a partir de cuatro

    aos, durante este perodo se encontr que el cuidado en casa con xito puede estar relacionado

    con la prevencin reospitalizao.

    Palabras-clave: gestin de la salud, los indicadores de salud, servicios de atencin domiciliaria, la

    hospitalizacin, enfermedad crnica, de enfermera.

  • 13

    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1 Pirmide etria Brasil, Amrica Latina e Caribe de 1950-2050. 024

    Figura 2 Evoluo temporal das taxas de fecundidade do Chile, Brasil. Estados Unidos da

    Amrica (EUA), Coria do Sul, China e Alemanha. 025

    Figura 3

    Trajetria de involuo da fertilidade no mundo e por grupo selecionado de regies

    mais e menos desenvolvidas e de pases com desenvolvimento classificado como

    mnimo.

    026

    Figura 4 Relao entre quantidade de funo e idade observada nos ciclos da vida e ilustrando

    diferenas entre envelhecimento fisiolgico e patolgico. 034

    Figura 5 Memorial cronolgico e marcos histricos da implementao dos Ncleos Regionais

    de Ateno Domiciliar no Distrito Federal. 055

    Figura 6 Memorial cronolgico e marcos histricos da implementao do Ncleo Regional de

    Ateno Domiciliar de Ceilndia. 056

    Figura 7

    Histograma da distribuio de frequncia da idade em anos completos observada na

    populao de sujeitos admitidos no Programa de Internao Domiciliar (PID) at

    dezembro de 2012.

    060

    Figura 8

    Histograma da distribuio de frequncia da renda familiar em salrios mnimos

    observada na populao de sujeitos admitidos no Programa de Internao Domiciliar

    (PID) at dezembro de 2012.

    061

    Figura 9

    Grfico de linhas indicando a incidncia de unidades de morbidade codificadas por tipo

    de comorbidade (da doena primria sextenria) encontrada na populao de sujeitos

    admitidos no Programa de Internao Domiciliar (PID) at dezembro de 2012.

    063

    Figura 10

    Histograma da distribuio de frequncia da cronicidade em meses da doena de base

    (primria) observada na populao de sujeitos admitidos no Programa de Internao

    Domiciliar (PID) at dezembro de 2012.

    064

    Figura 11

    Histograma da distribuio de frequncia do tempo de permanncia em dias observado

    na populao de sujeitos admitidos no Programa de Internao Domiciliar (PID) at

    dezembro de 2012.

    064

    Figura 12

    Grficos de linhas indicando a dinmica mensal de visitas, admisso e alta no

    Programa de Internao Domiciliar at dezembro de 2012. A curva identificada como

    ativo corresponde valor resultante das entradas por admisses e sadas por altas

    mensais.

    066

    Figura 13

    Grfico de linhas indicando a incidncia anual de pacientes admitidos e

    desospitalizados, bem como a frao de desospitalizao em porcentagem do total de

    admitidos encontrada na populao de sujeitos no Programa de Internao Domiciliar

    (PID) at dezembro de 2012.

    067

    Figura 14

    Blox plots indicando comparaes da idade, renda familiar, cronicidade e tempo de

    permanncia entre os sujeitos desospitalizados e os admitidos por outra via de entrada

    no Programa de Internao Domiciliar (PID) at dezembro de 2012.

    069

    Figura 15 Grficos de barras indicando a proporo de desfechos observados na populao de

    sujeitos admitidos no Programa de Internao Domiciliar (PID) at dezembro de 2012. 070

  • 14

    Figura 16

    Blox plots indicando comparaes entre os grupos de desfechos (bitos, ativos e altas)

    para os sujeitos admitidos no Programa de Internao Domiciliar (PID) at dezembro

    de 2012.

    072

  • 15

    LISTA DE TABELAS

    Tabela 1

    Detalhamento histrico dos marcos temporais da implentao e consolidao do

    Ncleo Regional de Ateno Domiciliar da Regional de Sade de Ceilndia (NRAD-

    CEI).

    057

    Tabela 2 Caractersticas pessoais e demogrficas da populao de sujeitos admitidos no

    Programa de Internao Domiciliar (PID) at dezembro de 2012. 058

    Tabela 3 Caractersticas sociodemogrficas da populao de sujeitos admitidos no Programa de

    Internao Domiciliar (PID) at dezembro de 2012. 059

    Tabela 4 Caractersticas econmicas e culturais da populao de sujeitos admitidos no Programa

    de Internao Domiciliar (PID) at dezembro de 2012. 060

    Tabela 5 Distribuio de frequncia das comorbidades codificadas pela CID10 na populao de

    sujeitos admitidos no Programa de Internao Domiciliar (PID) at dezembro de 2012. 062

    Tabela 6 Distribuio de frequncia das comorbidades codificadas pela CID10 na populao de

    sujeitos desospitalizados at dezembro de 2012. 068

  • 16

    LISTA DE ABREVEATURAS, SIGLAS E SMBOLOS

    aC Antes de Cristo

    AIDS Acquired Immunodeficiency Syndrome

    AVE Acidente Vascular Enceflico

    AVD Atividades de Vida Diria

    CID10 Classificao Internacional de Doenas 10 Edio

    CSC Centro de Sade de Ceilndia

    DCNT Doena Crnica No Transmissvel

    DF Distrito Federal

    ECVE Escala da Cruz Vermelha Espanhola

    EMAD Equipe Multiprofissional de Ateno Domiciliar

    EMAP Equipe Multiprofissional de Apoio

    EPM Erro Padro da Mdia

    ESF Estratgia Sade da Famlia

    EUA Estados Unidos da Amrica

    FCE Faculdade de Ceilndia

    GEAD Gerncia de Ateno Domiciliar

    HIV Human Immunodeficiency Virus

    IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

    NRAD Ncleo Regional de Ateno Domiciliar

    NRAD-CEI Ncleo Regional de Ateno Domiciliar da Regional de Sade de Ceilndia

    OMS Organizao Mundial da Sade

    ONU Organizao das Naes Unidas

    RAS Redes de Ateno em Sade

    PACS Programa de Agentes Comunitrios de Sade

    PAD Programa de Ateno Domiciliar

    PEAC Projeto de Extenso de Ao Contnua

    PET Programa de Educao pelo Trabalho

    PIB Produto Interno Bruto

    PID Programa de Internao Domiciliar

    PNH Poltica Nacional de Humanizao

  • 17

    PPGEnf Programa de Ps Graduao em Enfermagem

    RA Regio Administrativa

    RASS-AD Registro de Aes Ambulatoriais de Sade da Ateno Domiciliar

    SAD Servios de Ateno Domiciliar

    SIA Sistema de Informaes Ambulatoriais

    SIAB Sistema de Informao da Ateno Bsica

    SIH Sistema de Informaes Hospitalares

    SIM Sistema de Informaes de Mortalidade

    SINASC Sistema de Informao de Nascidos Vivos

    SIOB Sistema de informao de Oramento Pblico em Sade

    SES/DF Secretaria de Estado de Sade do Distrito Federal

    SUS Sistema nico de Sade

    UBS Unidade Bsica de Sade

    UN United Nations

    UnB Universidade de Braslia

    UTI Unidade de Terapia Intensiva

    WHO World Health Organization

  • 18

    SUMRIO

    1 APRESENTAO............................................................................................................................... 018

    2 INTRODUO.................................................................................................................................... 020

    3 REVISO DA LITERATURA........................................................................................................... 023

    3.1 TENDNCIAS NA ATENO A SADE DE UMA POPULAO EM CONSTANTE

    CRESCIMENTO.................................................................................................................. ................ 023

    3.2 O DESAFIO DAS CONDIES CRNICAS..................................................................................... 030

    3.3 ESTRATGIAS PARA O ENFRENTAMENTO DAS CONDIES CRNICAS: ATENO

    DOMICILIAR............................................................................. .......................................................... 036

    3.4 IMPORTNCIA DOS INDICADORES PARA GESTO NA SADE............................................. 041

    3.5 HOSPITALIZAO, DESOSPITALIZAO E PREVENO DE REOSPITALIZAO............ 044

    4 OBJETIVOS......................................................................................................................................... 050

    5 MTODOS........................................................................................................................................... 051

    5.1 DELINEAMENTO DA PESQUISA..................................................................................................... 051

    5.2 LOCAL DE ESTUDO................................................................................ ........................................... 051

    5.3 POPULAO ALVO.............................................................................. .............................................. 052

    5.4 ABORDAGEM QUALITATIVA.......................................................................................................... 053

    5.5 ABORDAGEM QUANTITATIVA....................................................................................................... 053

    5.5.1 Procedimento de coleta e variveis................................................................................................. 054

    5.5.2 Processamento e anlise estatstica................................................................................................. 054

    6 RESULTADOS..................................................................................................................................... 055

    6.1 MEMORIAL CRONOLGICO E MARCOS HISTRICOS.............................................................. 055

    6.2 CARACTERIZAO DA POPULAO............................................................................................ 059

    6.3 PERFIL EPIDEMIOLGICO E ASSISTENCIAL............................................................................... 062

    6.4 CONTRIBUIES PARA A DESOSPITALIZAO........................................................................ 068

    6.5 CONTRIBUIES PARA A PREVENO DE REOSPITALIZAO........................................... 071

    7 DISCUSSO......................................................................................................................................... 073

    8 CONCLUSES.................................................................................................................................... 090

    9 REFERNCIAS................................................................................................................................... 92

    10 ANEXOS............................................................................................................................................... 112

    10.1 ANEXO A............................................................................................................................................. 112

    11 APNDICES......................................................................................................................................... 121

    11.1 APNDICE A.......................................................................,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,......................... 121

  • 19

    1 APRESENTAO

    Meu interesse pela temtica coincide com o inicio da minha carreira como enfermeira,

    uma vez que meu primeiro emprego como enfermeira foi no servio pblico, na Secretaria de

    Estado de Sade do Distrito Federal (SES/DF), onde assumi o cargo de chefe do Ncleo

    Regional de Ateno Domiciliar de Ceilndia (NRAD-CEI), em janeiro de 2009. Antes disso

    apenas havia trabalhado como tcnica de enfermagem, em hospital militar, nos setores de

    quimioterapia, internao geral e Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Portanto, assumir a

    implantao de um servio de ateno domiciliar foi um duplo desafio, pois alm de adentrar

    a desconhecida rea da ateno domiciliar eu precisei aprender e dominar os diversos

    meandros e ferramentas da gesto em sade. Foi um perodo de grande crescimento pessoal e

    profissional.

    Logo no inicio das atividades do NRAD-CEI firmamos parceria com a Universidade

    de Braslia (UnB), na pessoa do Professor Dr. Emerson Fachin Martins, no intuito de vincular

    ensino-servio-pesquisa e extenso na rea da ateno domiciliar, nossas metas eram por um

    lado basear as aes de assistncia domiciliar dos profissionais do NRAD-CEI em evidncia

    cientfica e por outro, apresentar essa modalidade de atuao aos acadmicos das disciplinas

    de sade da Faculdade de Ceilndia (FCE), numa recproca troca de experincias e

    conhecimentos tendo como meta comum divulgar e fortalecer a poltica de ateno domiciliar

    no Sistema nico de Sade (SUS), contribuindo com a consolidao desse servio na

    Regional de Sade de Ceilndia.

    Nesse perodo o NRAD constituiu equipe multiprofissional que assumiu o desafio de

    implantar um programa de ateno domiciliar na maior regional de sade da SES-DF, tal

    esforo tem logrado bons resultados na ateno a sade de indivduos com doenas crnicas,

    desde sua origem primando pela qualidade e pela promoo de princpios como integralidade,

    acesso e equidade em sade por meio da ateno domiciliar.

    Uma das caractersticas do NRAD-CEI o forte envolvimento cientfico, sendo que

    at julho de 2013 foram desenvolvidos trs edies do Projeto de Extenso de Ao Contnua

    (PEAC), um Programa de Educao para o Trabalho (PET), em parceria com o Ministrio da

    Sade/ UnB/ NRAD e trs servidoras iniciaram suas ps graduao, stricto sensu, nvel

    mestrado, na UnB. A coordenao acadmica dos projetos e orientao das servidoras, agora

    estudantes da ps-graduao da UnB foi feita pelo Prof. Dr. Emerson Fachin Martins.

  • 20

    Em pouco tempo o NRAD-CEI estabeleceu-se como uma das referncias no servio de

    ateno domiciliar no Distrito Federal (DF), e em 2011 iniciei meu curso de mestrado, no

    Programa de Ps-Graduao em Enfermagem (PPGEnf) da UnB, com a meta de estudar dois

    relevantes indicadores assistncias da ateno domiciliar que o de promover

    desospitalizao e prevenir reospitalizao.

    A experincia de atuao na ateno domiciliar nestes quase quatro anos me fez

    repensar e reconstruir todo o projeto profissional construdo por mim durante toda a minha

    vida profissional. Na verdade eu no tinha ideia das possiblidades de atuao profissional

    tendo como cenrio a casa, o lar de um individuo, no tinha noo de toda a estrutura

    necessria para a prestao desse tipo de cuidado, quo complexo pode ser a assistncia no

    domicilio, bem como quo resolutivo, especialmente no servio pblico de sade. A ateno

    domiciliar tem sido uma experincia marcante no apenas profissionalmente, mas

    pessoalmente, como ser humano, enriquecedora a relao com o individuo e famlia, isto me

    cativa cada dia mais, exigindo dedicao, estudo constate, resilincia e diversas competncias

    profissionais, ..

    Sou defensora inveterada por acreditar que uma estratgia necessria no sentido de

    garantir e viabilizar o cumprimento dos princpios do SUS a uma parcela da populao que

    necessita desse tipo de assistncia, alm de ampliar as possibilidades de atuao aos

    profissionais de sade e otimizar os recursos existentes . Fato tambm a carncia de

    maiores investimentos em polticas pblicas e pesquisas para o fortalecimento e consolidao

    dessa modalidade de ateno sade.

  • 21

    2 INTRODUO

    Historicamente e antes mesmo da criao do SUS era possvel localizar pesquisa que

    apontava para programas experimentais focados na ateno domiciliar de pacientes crnicos

    frente grande quantidade de sujeitos hospitalizados desnecessariamente (hospitalizao

    redundante hospitalizao evitvel) que, alm disso, estavam mais suscetveis aos riscos

    decorrentes da internao hospitalar prolongada, ocupando leitos hospitalares com

    desperdcio de recursos financeiros e humanos (CORDEIRO et al., 1977).

    Mais de 30 anos depois, hoje no Brasil a internao domiciliar j conta com poltica

    pblica que institui sua insero no mbito do SUS (BRASIL, 2013a, 2013b, 2013c, 2013e,

    2013f, 2013h, 2013i). Principalmente direcionada a sujeitos portadores de doenas crnicas

    em estado de dependncia funcional, tal poltica de sade se faz valer no Distrito Federal por

    meio do Programa de Internao Domiciliar (PID) implantado pelos NRAD (BRASIL,

    2008a; 2008c).

    Apesar da evoluo histrica para assistncia das condies crnicas, o manejo e

    controle dessas condies um desafio que continua a dominar a agenda dos sistemas de

    ateno sade no mundo e no Brasil, visto que a preveno e a cura para muitas doenas

    ainda no esto disponveis e porque j existe uma grande parte da populao vivendo com

    condies crnicas incapacitantes (BRASIL, 2013d; BRASIL, 2011a; SCHMIDT et al., 2011;

    BAGSHAW et al., 2009; POT et al., 2009; RAVEN et al., 2009; RIZZI et al, 2009, TIBALDI

    et al, 2009; CORDEIRO et al., 1977).

    Neste contexto, a promoo da sade no deve limitar-se apenas preveno de

    doenas, mas tambm preveno de agravos consequentes s doenas crnico-

    degenerativas. Porm, se j complicado promover a prtica de aes preventivas

    mundialmente conhecidas como padro de alimentao, nveis de atividade fsica, hbito de

    fumar, dentre outros; desafio maior ainda colocar em prtica aes preventivas secundrias

    pouco conhecidas, relacionadas preveno de agravos em pacientes portadores de doenas

    crnicas (CAMARGOS et al., 2009, 2008, 2005; GASPAR et al., 2007; HAM, 2012).

    Uma srie de doenas, embora menos suscetveis a conduzir para morte prematura, so

    excessivamente onerosas em termos socioeconmicos por reduzir a produtividade e qualidade

    de vida, bem como por promover o sofrimento humano. Artrite, diabetes, asma, sequelas de

    acidente vascular enceflico, dentre outras so bons exemplos destas condies (WHO, 2013,

  • 22

    2011; BRASIL, 2011a; SCHMIDT et al., 2011; RIZZI et al., 2009; SINGH, 2008;

    MOCELIN et al., 2001).

    O modelo de sade no Brasil encontra srios problemas neste cenrio, pois tem como

    base organizacional a caracterstica de ser fragmentado em especialidade, hospitalocntrico,

    hierarquizado e estruturado para atender condies agudas acionadas pela demanda

    populacional. Assim, comum observar nos hospitais condies sensveis ateno primria

    (CALDEIRA et al., 2011; MOURA et al., 2010; FERNANDES et al., 2009; ALFRADIQUE

    et al., 2009) que se somam s internaes hospitalares de portadores de doenas crnicas que

    poderiam ser alocadas em servios de internao domiciliar (MENDES EV, 2012; SOUZA e

    COSTA, 2011; MOREIRA e DULTILHNOVAES, 2011; TIBALDI et al., 2009; DAL BEN et

    al., 2006; MESQUITA et al., 2005; SILVA et al., 2005).

    Alm disso, observa-se que apesar da competncia no tratamento das doenas, a

    assistncia hospitalar tornou-se ineficaz na resolutividade de algumas delas, elevando a mdia

    de permanncia dos pacientes internados e os episdios de reospitalizaes (MENDES EV,

    2012; DUTRA et al., 2011; GARBINATO et al., 2007) e favorecendo a reinternao dos

    mesmos sem sanar o problema que motivou internao (ESTRELLA et al., 2009; GUERRA

    e RAMOS-CERQUEIRA, 2007; PEIXOTO et al., 2004) .

    Desta forma, o PID representa uma estratgia na reverso da ateno centrada nos

    hospitais e proporciona a elaborao de uma nova sistemtica de ateno em sade e na

    humanizao desta ateno (SILVA KL et al., 2010; FEUERWERKER E MERHY, 2008;

    REHEM e TRAD, 2005; SILVA et al., 2005) . Entende-se que a anlise de programas em

    funcionamento deve contribuir para a definio de polticas pblicas de sade e para o

    aperfeioamento dos servios j implantados, rumo efetividade dos princpios do SUS.

    A relevncia do estudo se deve ao fato que ateno domiciliar tem ressurgido como

    uma tendncia mundial em resposta s demandas decorrentes da transio demogrfica e

    epidemiolgica, caracterizadas pelo envelhecimento populacional e pela prevalncia de

    doenas crnicas (SERAFIM et al., 2011; RAVEN et al., 2009; POT et al., 2009; VECINA

    NETO e MALIK, 2007; LACERDA, 2006; CLARCK, 2003; AMARAL, 2001).

    A anlise dos limites e possibilidades em desospitalizar pacientes com condies

    crnicas, bem como a preveno de reospitalizaes dos mesmos, representa conhecimento

    no suficientemente pesquisado que poder auxiliar no planejamento e implantao das atuais

    polticas pblicas de sade, bem como no estabelecimento de futuras polticas.

  • 23

    3 REVISO DA LITERATURA

    3.1 TENDNCIAS NA ATENO A SADE DE UMA POPULAO EM

    CONSTANTE CRESCIMENTO

    A ateno sade passa por um momento de reengenharia, principalmente empenhada

    na busca para responder s demandas provenientes das duas grandes transies populacionais

    decorrente do crescimento humano que impactaram diretamente a maneira de promover

    sade: (1) a transio demogrfica e (2) a transio epidemiolgica (VASCONCELOS et al.,

    2012; OPAS, 2012; VERAS, 2009; ALVES, 2008, 2004; VECINA NETO e MALIK, 2007).

    Embora o crescimento populacional seja preocupao presente desde os primrdios da

    humanidade, como constatado em obras de Plato, Aristteles, Ccero e Confcio (KIELING,

    2009) na histria recente que governos pelo mundo comearam a mobilizar aes no

    sentido de combater os problemas gerados por este crescimento, que representa um grande

    desafio para os servios de assistncia sade (MENDES EV, 2012; KIELING, 2009;

    VECINA NETO e MALIK, 2007; WONG e CARVALHO, 2006).

    Levantar questes relativas ao crescimento populacional requer plena compreenso do

    papel e significado do termo demografia que segundo informa ALVES (2003, p.131):

    O termo foi utilizado pela primeira vez em 1855 pelo pesquisador belga Achille

    Guillard. Do ponto de vista etimolgico, a palavra demografia formada a partir de

    dois vocbulos gregos: dmos (demo), que quer dizer povo, populao ou povoao,

    e grphein (grafia), que quer dizer ao de escrever, descrio ou estudo. Portanto, o

    objeto da Demografia a anlise das populaes humanas e suas caractersticas

    gerais. Mais especificamente, a Demografia estuda o tamanho da populao, sua

    composio por sexo e idade e sua taxa de crescimento (positiva ou negativa). A

    Demografia se autodefine como cincia, tendo como um dos seus objetos de estudo

    os problemas populacionais.

    Conceituado Demografia, fica claro entender que a importncia da transio

    demogrfica acelerada se da por seu resultado direto no aumento da longevidade,

    considerando a equao composta pela queda da mortalidade e pela reduo da natalidade

    (ALVES, 2008).

    Este novo comportamento da mortalidade e natalidade influenciou diretamente a

    alterao da estrutura etria da pirmide populacional em mbito mundial. Se no passado

    envelhecer era raro e at mesmo um privilgio, hoje caracterstica presente e comum para

    milhes de cidados, tanto em pases desenvolvidos com em pases em desenvolvimento

    (UM, 2013, 2013b; TURRA, 2012; CHRISTENSEN et al., 2009; KIELING, 2009).

  • 24

    Um mesmo comportamento etrio pode ser observado e estimado no perodo de 1950

    a 2050 para pases caribenhos e da Amrica Latina quando comparado ao Brasil (UN, 2003).

    A transio ocasionada pela diminuio da base da pirmide decorrente da reduo da

    natalidade e o alargamento do seu topo causado pela queda na mortalidade e aumento da

    longevidade, conforme observado na figura 1, ilustra o que j presenciado em 2013 e o que

    ir acontecer at 2050 (UN, 2013b, 2005, 2003)

    Figura 1. Pirmide etria Brasil, America Latina e Caribe de 1950-2050 (WONG e CARVALHO, 2006).

    Muitos aspectos so considerados contribuintes na queda da mortalidade e

    consequente longevidade observada nas populaes, dentre eles so citados os avanos

    biotecnolgicos na sade, as estratgias e programas de sade pblica, o maior acesso a

    saneamento bsico, crescente desenvolvimento socioeconmico e das foras produtivas, um

    maior acesso a bens e servios, melhorias que resultam em aumento na renda familiar e

    qualidade de habitao, bem como mudanas no acesso alimentao de qualidade que

    influencia diretamente na qualidade de vida (TURRA, 2012; KIELING,2009).

    Com relao reduo da natalidade e taxa de fecundidade, existe uma teoria,

    conhecida como teoria da modernizao, que afirma que as taxas de fecundidade

    permaneceram altas por longo perodo, mesmo aps o processo de urbanizao e

  • 25

    industrializao, o que possibilitou melhoria no padro de vida, maior acesso aos bens e

    servios e crescimento econmico (KIELING, 2009; ALVES, 2002; NOTESTEIN, 1945).

    A manuteno em alta das antigas taxas de fecundidade se dava pela influncia dos

    perodos de guerra e epidemias que provocava grande mortalidade, levando instituies a

    estimularem a natalidade (KIELING, 2009).

    Tal prtica era vista nas aes do prprio Estado que criavam leis e normas. Estmulo

    fecundidade tambm era influenciada no processo educativo; pela igreja por meio das

    crenas e costumes; bem como pelas prprias famlias que atendiam a ideologia de manter

    grande quantidade de filhos (KIELING, 2009; ALVES, 2008; BRITO, 2007).

    Aps algum tempo estas crenas e tabus em relao quantidade de filhos foi

    superada e inaugurou-se um novo tempo onde o controle da natalidade foi progressivamente

    adotado e facilitado pelo acesso a meios reguladores da fecundidade (KIELING, 2009;

    BRITO, 2007; ALVES, 2004). Relatos como o transcrito abaixo reforam esta viso:

    A transio da fecundidade um fenmeno social da maior importncia, pois, alm

    de afetar a dinmica do crescimento demogrfico, afeta a estrutura etria da

    populao, com grandes consequncias sobre o relacionamento entre as geraes e

    os diversos grupos de idade. As mudanas da estrutura etria transcendem os

    aspectos demogrficos, afetando as polticas de educao, sade, emprego e

    previdncia, tendo profundo efeito sobre o processo de planejamento

    socioeconmico do pas e sobre as polticas pblicas (ALVES, 2004, p.12)

    A evoluo temporal da taxa de fertilidade observada no perodo de 1980 a 2005

    aponta dentre seis pases que o Brasil era, em 1980, o pas com a maior quantidade de filhos

    por mulher (figura 2). Entretanto, com o passar dos anos, esse indicador foi diminuindo, at

    que em 2005 a populao brasileira passou a ser constituda por mulheres com menos de dois

    filhos, ficando abaixo de pases como o Chile e os Estados Unidos.

    Fonte: UN (2005) Figura 2. Evoluo temporal das taxas de fecundidade do Chile, Brasil. Estados Unidos da Amrica (EUA),

    Coria do Sul, China e Alemanha.

  • 26

    Mesmo frente s diferenas econmicas e sociais em todo o mundo, h uma

    similaridade nas taxas de fecundidade, com projees de reduo mundial do nmero de

    filhos por mulheres, tanto em pases desenvolvidos como nas naes mais pobres, como

    mostra o ltimo relatrio mundial da UN (2013b) da figura 3.

    Figura 3. Trajetria de involuo da fertilidade no mundo e por grupo selecionado de regies mais e menos

    desenvolvidas e de pases com desenvolvimento classificado como mnimo. Dados e projees de 1950-2100

    (variao mdia)

    Associado ao exposto observa-se que a expectativa de vida tem se alongado quase que

    linearmente na maioria dos pases desenvolvidos e sem sinais de desacelerao. Em pases

    onde a populao tem maior longevidade como os da Europa Ocidental, Europa Oriental,

    Estados Unidos, Canad, Austrlia, Nova Zelndia e Japo; a expectativa para crianas

    nascidas a partir do sculo XX, caso se mantenha o atual nvel de crescimento anual, pode

    chegar aos 100 anos de idade (UN, 2013b; TURRA, 2012; CHRISTENSEN et al., 2009).

    Anlises feitas por demgrafos (OEPPEN e VAUPEL, 2002), tomando como base

    regies com maior ndice de longevidade e considerando um perodo de quase dois sculos

    demonstraram que a expectativa de vida ao nascer, entre as mulheres, cresceu linearmente

    cerca de trs meses a cada ano.

    Entre os cientistas que estudam a transio na estrutura etria existem os chamados

    futuristas que argumento que a taxa de desenvolvimento tecnolgico ir avanar ainda neste

  • 27

    sculo, permitindo que se alcance a imortalidade dentro de 40-50 anos. No outro lado do

    debate, h os chamados realistas, grupo defensor da ideia da existncia de barreiras

    biolgicas e ambientais para a continuidade da regularidade histrica de queda da

    mortalidade. Sua proposio que a diminuio no ritmo de crescimento da expectativa de

    vida ao nascer ocorrer, por exemplo, pelo aumento na prevalncia de comportamentos de

    risco na populao jovem (obesidade, tabagismo, sedentarismo), pela violncia urbana e pelos

    efeitos da poluio sobre a sade (OEPPEN E VAUPEL 2002; OLSHANSKY et al., 2009;

    TURRA, 2012).

    A partir da extrapolao de sries histricas, a expectativa de vida ao nascer feminina

    atingir um sculo de vida no pas recordista em longevidade, ainda em 2060, segundo

    Oeppen e Vaupel (2002). Esta viso compartilhada pela maioria dos demgrafos, embora

    no seja consenso.

    Assistimos a um acelerado crescimento populacional, em que se observa no ano de

    1800 uma populao global em torno de um bilho de habitantes que cresceu hoje para

    nmeros que ultrapassam os oito bilhes de habitantes, tudo isso em cerca de duzentos anos

    (TURRA, 2012).

    Apesar da boa notcia do envelhecimento populacional, h uma preocupao com a

    qualidade deste envelhecimento. H vrias dcadas pesquisadores e formuladores de polticas

    no mundo todo tm se preocupado com o processo de envelhecimento saudvel, a senescncia

    (TURRA, 2012; IBGE, 2011; POULAIN, 2010; MORAES, 2008).

    fato a maior prevalncia de deficincia nesta populao e a maior demanda e custos

    na ateno desta parcela da populao. Maior longevidade pode significar mais anos de

    incapacidade, perda de autonomia e demanda por cuidado. Se por um lado os avanos tem

    propiciado maior longevidade isso no garantia de funcionalidade, independncia e

    autonomia (CAMPOLINA et al., 2013; URSINE et al., 2011; CAMARGOS et al., 2008,

    2009; BONARDI et al, 2007).

    A expresso transio demogrfica, originalmente Demographic Transition Model, foi

    inicialmente proposta em 1929, pelo norte americano Warren Thompson, na busca de tentar

    explicar a queda na mortalidade e natalidade, que ocasionou aumento da longevidade. Ela foi

    entendida como o estudo das modificaes que ocorrem nas populaes humanas desde o

    perodo das altas taxas de nascimento (natalidade) e altas taxas de mortalidade, at os

    perodos de baixas taxas de nascimento e mortalidade (THOMPSON, 1929).

  • 28

    Em sua construo terica, Thompson (1929), defendia trs etapas nessa transio: a

    primeira, em que a taxa de mortalidade cai e a taxa de natalidade permanece elevada,

    provocando um rpido crescimento da populao; a segunda, etapa em que a taxa de

    natalidade comea a cair, o que reduz progressivamente o crescimento populacional e a

    terceira etapa, quando tanto a taxa de natalidade quanto a de mortalidade mantm-se baixas,

    resultando em lento crescimento demogrfico.

    Associado a essa mudana demogrfica temos a transio do perfil epidemiolgico

    que, segundo Mendes EV (2012), pode ser entendida conforme transcrito abaixo:

    Tradicionalmente trabalha-se em sade com uma diviso entre doenas

    transmissveis e doenas crnicas no transmissveis. Essa tipologia, talhada na

    perspectiva da etiopatogenia, largamente utilizada, em especial, pela

    epidemiologia. verdade que essa tipologia tem sido muito til nos estudos

    epidemiolgicos, mas, por outro lado, ela no se presta para referenciar a

    organizao dos sistemas de ateno sade. A razo simples: do ponto de vista

    da resposta social aos problemas de sade, o objeto dos sistemas de ateno sade,

    certas doenas transmissveis, pelo longo perodo de seu curso, esto mais prximas

    da lgica de enfrentamento das doenas crnicas que das doenas transmissveis de

    curso rpido. Alm disso, uma tipologia que se assenta no conceito de doena e

    exclui outras condies que no so doenas, mas que exigem uma resposta social

    adequada dos sistemas de ateno sade (MENDES EV, 2012, p.33)

    O entendimento da atual situao sanitria imprescindvel para elaborao de

    estratgias eficazes, capazes de garantir acesso, qualidade, sustentabilidade e equidade. A

    Organizao Mundial de Sade (OMS) vem incorporando paulatinamente essa nova tipologia,

    que melhor representa o cenrio de sade, no se restringindo ao binmio de doena crnica-

    doena infecciosa, mas utilizando terminologia ampla que melhor representa a demanda e

    possibilita uma gesto e organizao dos sistemas de ateno sade em que o termo

    condio em sade pode ser referente tanto crnica como a aguda (WHO, 2013, 2011, 2008,

    2005, 2003).

    fato que algumas doenas agudas, aps a incorporao das biotecnologias em sade,

    passaram a evoluir com curso longo, tornando-se condies crnicas, como o caso da

    tuberculose, a AIDS, a hansenase, entre outras. Por isso, a categorizao baseada nas

    condies de sade tem sido utilizada por ser mais representativa da atual realidade em sade.

    Estas tipologias trazem em si a complexidade da ateno sade e refletem novas demandas

    que exigem inovadoras formas de prestao de cuidado (WHO, 2003). H dois elementos

    chave para entendimento deste conceito de condio de sade, a forma de enfrentamento e o

    tempo de durao. A forma de enfrentamento corresponde maneira pela qual a organizao

  • 29

    de sade e os prprios usurios do sistema de sade tratam a questo sade, se de forma

    episdica ou reativa, com foco nas doenas e na queixa-conduta ou se contnua, proativa e

    focada nas pessoas e famlias por meio de cuidados permanentes, contidos num plano de

    cuidado elaborado conjuntamente pela equipe de sade e pelas pessoas usurias (MENDES,

    2011; MENDES EV, 2012; CAMARGOS et al., 2009, 2005).

    Ainda, em relao s condies de sade, outra varivel importante a ser considerada

    o tempo de evoluo, onde as condies agudas geralmente evoluem em curto perodo de

    tempo, inferior a trs meses e tendem a se autolimitar. As condies crnicas evoluem em

    perodo maior, sendo relativamente longo (superior a trs meses) e geralmente se

    apresentando de forma definitiva e permanente (MENDES EV, 2012; SINGH, 2008; VON

    KORFF, 1997).

    Se no inicio do sculo a mortalidade, em sua maioria, era por doenas infecciosas;

    hoje temos um novo e complexo cenrio, caracterizado por tripla carga de doenas oriunda

    das relaes entre doenas infectocontagiosas e doenas crnicas (MENDES EV, 2012;

    SCHMIDT et al., 2011; VECINA NETO e MALIK, 2007).

    Atualmente permanece a antiga agenda, ainda no superada de doenas

    infectocontagiosa. H uma agenda relativamente nova, gerada pelo progressivo aumento da

    morbimortalidade ocasionado pelas doenas crnicas no transmissveis (DCNT) associadas

    s causas externas. Finalmente uma agenda recente, proveniente de uma carga importante de

    enfermidades que faziam parte da agenda antiga (doenas infectocontagiosas como dengue,

    tuberculose), somado a molstias infectocontagiosas emergentes (AIDS, hantaviroses,

    doenas espongiforme humana) que apesar do carter de doena infecciosa j no causa os

    mesmos danos letais, sendo controlada por longo perodo quando assumido o tratamento

    especfico. Tais fatores (agendas) impactaram diretamente no consumo dos servios de sade,

    o que forjou um novo perfil de morbimortalidade cujas velhas respostas j no resolvem as

    novas questes. Diante deste cenrio epidemiolgico necessrio maior recurso tecnolgico,

    financeiro, humano e estrutural para alcanar resultados efetivos na ateno a sade (WHO,

    2013; MENDES EV, 2012; MENDES, 2011;VECINA NETO e MALIK, 2007).

    Ao revisarmos a histria da ateno sade nos deparamos com um modelo

    hospitalocntrico onde as instituies eram originalmente organizadas para atendimento de

    problemas agudos e episdicos, como as doenas infectocontagiosas, as urgncias e os

    pontuais procedimentos cirrgicos (MENDES EV, 2012; MALTA e MERHY, 2010; VERDI

    et al., 2010; BITTENCOURT, 2010; BITTENCOURT e HORTALE, 2009; MERHY, 2005).

  • 30

    Entretanto, este modelo de sade, centrado na problemtica aguda, tornou-se

    obsoleto e ineficaz diante da atual agenda de tripla carga de doenas. Transpor os limites do

    antigo modelo condio sine qua non para garantir eficcia, equidade e sustentabilidade na

    sade (DUARTE e BARRETO, 2012; GADELHA et al. 2012; MENDES EV, 2012;

    CAMARANO, 2010; VECINA NETO e MALIK, 2007; REHEM e TRAD, 2005).

    A boa notcia que, apesar dos desafios importados do sculo passado, houve

    tambm avanos nas cincias da sade com a implementao de biotecnologias, a evoluo da

    sade coletiva, a ampliao das categorias profissionais, o crescimento da pesquisa cientfica,

    o que potencializou a resposta aos novos desafios (CAMPOLINA et al. 2013; DUARTE e

    BARRETO, 2012; BARCEL et al., 2012; VECINA NETO e MALIK, 2007;

    CAMARANO, 2010; MERHY, 2005; ROBINE et al, 2004; WHO, 2003)

    3.2 O DESAFIO DAS CONDIES CRNICAS

    A Organizao Mundial da Sade (WHO, 2003) apontou as condies crnicas em

    sade como um dos maiores desafios do sculo. Elas j so a maior causa de morte no mundo,

    sendo considerada uma epidemia global (WHO, 2013, 2011, 2004; BRASIL, 2011a, 2008b).

    As condies crnicas englobam todos os problemas de sade que persistem no tempo

    e requerem algum grau de gerenciamento do sistema de sade, incluem nessa categoria

    condies como diabetes, problemas cardiovasculares, problemas respiratrios, cncer,

    depresso, esquizofrenia, AIDS, deficincias fsicas permanentes e condies que exigem

    ateno dentro dos ciclos de vida como condies perinatais (gravidez e infncia), atividade

    laboral, entre outras (VASCONCELOS, 2012; MENDES, 2012; MENDES EV, 2011;

    CAPILHEIRA e SANTOS, 2011).

    As condies crnicas so um problema de sade complexo, pois alm de exigirem

    um gerenciamento continuo por um perodo de vrios anos ou dcadas, abarcam uma

    categoria extremamente vasta de agravos, o que gera um alto custo financeiro (MENDES

    EV, 2012; SCHMIDT et al., 2011; VERAS, 2009; LINCK, 2008; BARRETO e CARMO,

    2007).

    Considerando todas as mortes no mundo em 2008, num total de 57 milhes de bitos,

    mais da metade desses, ou seja, 63% se deram por condies crnicas, com destaque para

    doenas cardiovasculares, diabetes, cncer e doenas crnicas respiratrias, eleitas como

    prioridade para o enfrentamento em mbito global tanto pela Organizao das Naes Unidas

  • 31

    quanto para a Organizao Mundial de Sade. . Do total das mortes registradas, cerca de 80%

    ocorreu em pases de baixa e mdia renda, onde 29% dos indivduos tm menos de 60 anos de

    idades. Em contrapartida nos pases desenvolvidos, com maior renda, apenas 13% foram

    mortes prematuras. Tais dados comprovam a grande iniquidade gerada pelas condies

    crnicas com maior prejuzo nos pases menos desenvolvidos (WHO, 2013,2011, 2008;

    SCHMIDT et al., 2011).

    Determinantes sociais influenciam diretamente na origem e evoluo das condies

    crnicas, com especial nfase para fatores como as desigualdades sociais, a baixa

    escolaridade, as dificuldades no acesso s informaes, o baixo acesso a preveno em todos

    os nveis de ateno e promoo da sade, alm de fatores de risco modificveis como

    etilismo, tabagismo, sedentarismo e hbitos alimentares inadequados (ANTUNES et al., 2013;

    BUTLER et al., 2012; QUEIROGA et al., 2012; WHO, 2011; MUKAI et al., 2009, WHO,

    2009; CRIGHTON et al., 2007).

    Alm do nus para o Estado, h custos psicoemocionais e financeiros para a

    populao, famlia e individualmente para os cidados decorrentes das condies crnicas. A

    expectativa de que at o ano de 2020, as condies crnicas (incluindo tanto as doenas

    como as sequelas oriundas de traumas) e os distrbios mentais sero responsveis por 78% da

    carga global de doenas nos pases em desenvolvimento (SCHMIDT et al., 2011).

    H um impacto econmico causado pelas condies crnicas, percebido tanto em

    pases desenvolvidos como nos em desenvolvimento. Entretanto, nos pases de baixa e mdia

    renda, detecta-se um crculo vicioso em que os mais afetados pelas condies crnicas so

    pobres e isso aumenta ainda mais a pobreza, gerando maior custo econmico para as famlias,

    a sociedade, os sistemas de sade e o estado (WHO, 2003).

    Estes custos so diretos, quando se trata de internaes, medicamentos, insumos,

    tratamentos ambulatoriais; mas tambm eles podem ser indiretos, relativos prestao de

    servios, perda de produo devido ao recurso humano, aposentadorias precoces e benefcios

    sociais, o que impacta negativamente no desenvolvimento macroeconmico (UN, 2013a;

    THEODORE, 2011, WHO, 2011).

    A importncia da poltica de enfrentamento das condies crnicas se d frente ao

    assombroso cenrio que prev uma reduo de 0,5% a 1% do Produto Interno Bruto (PIB) em

    pases como Brasil, Canad, Paquisto e Nigria nos prximos anos. H estimativas

    conservadoras por parte da OMS quanto ao impacto negativo das condies crnicas no

    crescimento econmico brasileiro, apontando que as perdas na fora de trabalho e a

  • 32

    diminuio da renda e poupana familiar levaro a uma perda econmica na ordem de U$

    4,18 bilhes no intervalo dos anos de 2006 a 2015 (SCHMITD et al., 2011; BRASIL, 2011a;

    WHO, 2011, 2005, 2003; JACINTO et al. , 2010).

    Para o enfrentamento deste desafio necessrio uma reestruturao dos sistemas de

    sade, tanto no nvel macro (polticas), no meso (organizaes de sade e comunidade),

    quanto pelo nvel micro (interaes do paciente). Alm da estratgia local, tem sido

    fomentada uma estratgia mundial para enfrentamento deste problema, concatenando vrios

    setores de modo a estabelecer aes coordenadas com metas que contemplam o cenrio sade,

    poltica e economia (WHO, 2011, BRASIL, 2011a).

    Nas ltimas dcadas, no Brasil, as condies crnicas passaram a determinar a maioria

    das causas de bito e incapacidade prematura, ultrapassando as taxas de mortalidade por

    doenas infecciosas e parasitrias, representando uma grande parcela das despesas com

    assistncia hospitalar no SUS e no Setor Suplementar. O enfrentamento de tal questo exige

    uma interao multissetorial, com polticas pblicas bem estruturadas em todos os nveis,

    articulando os diversos atores envolvidos (ANTUNES et al., 2013; BRASIL, 2011, 2010;

    MOREIRA e DUTILHNOVAES, 2011; ALFRADIQUE et al., 2009, GONALVES et al.,

    2007; RICCI et al., 2005; PEIXOTO et al., 2004; MONTEIRO , 2004).

    A projeo que a principal causa de incapacidade no mundo, at o ano 2020, ser

    alguma das condies crnicas e, caso tais condies no sejam bem gerenciadas,

    representaro o problema mais dispendioso para os sistemas de sade. Este um fator de

    preocupao global, pois o aumento das condies crnicas impacta diretamente no

    crescimento econmico e no desenvolvimento das naes, sendo gerador de iniquidades

    sociais que contrariam os princpios do SUS (, BARROS, 2012; THEODORE, 2011; WHO,

    2010, 2003).

    Esta relao das condies crnicas com o crescimento econmico e com o aumento

    da pobreza eleva a problemtica relacionada ao desafio das condies crnicas para alm de

    uma questo sanitria, tornando-se uma questo social e, portanto, uma questo poltica.

    Diante disto, em 2011, foi convocada uma reunio pela Organizao das Naes Unidas

    (ONU) para programar um plano global de enfrentamento das condies crnicas.

    Historicamente esta foi a terceira vez que a ONU convocou uma reunio para discutir um

    plano global cujo tema era condio de sade, anteriormente a agenda tinha sido poliomielite

    e HIV/AIDS, ou seja, discusso de enfrentamento de doenas. Tal ato representa a magnitude

  • 33

    desta problemtica, evidenciando que seu enfrentamento exige uma organizao

    multidimensional (WHO, 2011; SCHMIDT et al., 2011, BRASIL, 2011a).

    Como proposta de resposta para tal demanda, foi lanado pelo Ministrio da Sade no

    Brasil em 2011 o plano de aes estratgicas para o enfrentamento das DCNT 2011-2020, em

    resposta a convocao da ONU e como estratgia para reverso da atual pandemia das

    condies crnicas (BRASIL, 2011a).

    O plano props intervenes que possibilitaram um melhor enfrentamento das

    condies crnicas, definiu e priorizou aes e investimentos para melhor controle das

    mesmas no prazo de 10 anos. Foram priorizadas quatro condies crnicas: as doenas

    cardiovasculares, as doenas respiratrias, o diabetes e o cncer (MALTA e SILVA JNIOR,

    2013; DUNCAN et al., 2012; BRASIL, 2011a).

    Apesar da discusso sobre condies crnicas, ainda ficou pouco discutida a questo

    do grande nmero de indivduos com condies crnicas estabelecidas, que convivem com

    inmeras comorbidades e somado a tais condies, convivem ainda com sequelas ou agravos

    (MONTEIRO et al., 2013; CECCON et al., 2013; CAMPOLINA et al., 2013; RIBEIRO et al.,

    2012; URSINE et al., 2011; HAM, 2007; GASPAR et al., 2007).

    O indivduo portador de uma condio crnica, convive geralmente com perda da

    integridade estrutural e funcional do corpo, bem como limitao em maior ou menor grau

    das atividades globais da vida , devido a uma reduzida capacidade ou mesmo por

    incapacidades para realizao das Atividades de Vida Diria (AVD), restrio da participao

    em atividades sociais, essa sequela causa nus para o individuo, famla e para o prprio

    Estado (GRATO et al., 2013; CAMARGOS et al., 2009).

    Como j introduzido na seo anterior, ao discutir os problemas gerados pelo

    crescimento populacional, ao celebrar-se o aumento da expectativa de vida brasileira, que j

    supera os 74 anos de vida na maioria das regies do pas (IBGE, 2012), preciso considerar

    o tempo de vida com qualidade, pois h estimativas de que apenas 59,6 destes anos so

    efetivamente vividos em condio saudvel (IBGE, 2011). Tal dado alarmante, pois apesar

    de j haver polticas especficas para a populao idosa (BRASIL, 2003) no temos

    consolidada polticas publicas de sade que atendam integral e equitativamente esta parcela

    da populao.

    Mesmo que o tempo a ser vivido com incapacidade funcional seja menor que o

    vivido livre dessas condies preciso pensar na demanda de cuidado requerida por

    esta populao. Afinal, em mdia, um brasileiro de 60 anos vai demandar de 3,5

    anos de acompanhamento para alimentar-se, tomar banho e/ou ir ao banheiro, o que

  • 34

    refletir diretamente nos gastos para atender a necessidade de cuidado e reabilitao,

    bem como no dia-a-dia da sua famlia ou na necessidade de insero em uma

    instituio de longa permanncia. Este tipo de discusso refora a ideia que, tanto

    para o idoso como para a sua famlia, a sociedade e o Estado, os investimentos em

    preveno, que sejam capazes de reduzir o tempo vivido com incapacidade, so

    ainda a melhor soluo para reduzir custos e ampliar a qualidade de vida nos anos

    remanescentes (CAMARGOS et al, 2008, p10).

    A figura 4 ilustra melhor esta problemtica, nela possvel observar a funcionalidade

    humana em funo da idade. Esta funcionalidade definida com quantidade de funo, sendo

    estabelecida uma faixa de quantidade de funo definida como limiar de incapacidade.

    Quando o sujeito encontra-se nesta faixa de quantidade de funo ele necessita de cuidados

    prprios das condies crnicas. Em tese, o envelhecimento fisiolgico (senescncia) no

    permitir que o indivduo alcance este limiar de incapacidade, diferente do envelhecimento

    patolgico (convalescncia) que mais comum, em que o idoso adentra o limiar de

    incapacidade.

    Fonte: Moraes (2008).

    Figura 4. Relao entre quantidade de funo e idade observada nos ciclos da vida e ilustrando diferenas entre

    envelhecimento fisiolgico e patolgico. A linha vertical descontnua indica o limite entre vida adulta e idosa e a

    faixa amarela definiu o limiar de incapacidade com base na quantidade de funo.

    As informaes sobre condies crnicas impulsionam a necessidade de estudos que

    discutam as possibilidades de respostas aos desafios advindos das sequelas e agravos

    decorrentes destas condies. Ainda so escassas as polticas pblicas, os programas sociais e

    de sade voltados para este pblico (CAMPOLINA et al., 2013; BAGSHAW et al., 2009;

    LINCK et al., 2008; BARRETO e CARMO, 2007; BONARDI et al., 2007, GASPAR et al.,

    2007).

  • 35

    Estratgias de preveno primria e secundria existem (BARCEL et al., 2012;

    RIBEIRO et al., 2012, MALTA e MERHY, 2010; POT et al., 2009; SINGH, 2008; WONG e

    CARVALHO, 2006), mas faltam ainda aes e programao consistente para a preveno

    terciria (BARRETO e CARMO, 2007; BONARDI, et al., 2007).

    No aspecto clnico e assistencial, essa populao de pessoas que necessita de

    preveno terciria por alguns denominada de pacientes de vidro, devido a fragilidade

    observada e a necessidade de minucioso cuidado e ateno contnua para a manuteno da

    estabilidade clnica (URSINE et al., 2011; DEL DUCA et al., 2012, CAMARGOS et al.,

    2009, 2003).

    A populao dos pacientes de vidro pouco aparece nas estatsticas oficiais, ficando

    geralmente restrita em instituies de longa permanncia ou em seus lares (DUNCAN et al.,

    2012; FLORIANI e SCHRAMM, 2004; TORRES et al., 2009). Nem mesmo os indicadores

    de sade representam bem esta populao, os indicadores de morbimortalidade usualmente

    utilizados no so capazes demonstrar ou traduzir suas peculiaridades (SOUZA e CORREIA,

    2010; SILVA BCN, 2010).

    Compe grande parcela dessa populao frgil os indivduos idosos. Nota-se que

    discutir a temtica do idoso, por si s, no garante promoo de sade para esta populao.

    preciso incluir a temtica condio crnica. So necessrios instrumentos para avaliar alm da

    quantidade a qualidade do envelhecimento populacional. Vrias propostas de avaliao da

    longevidade existem (BRASIL, 2013d, CAMPOLINA et al.,2013; VERAS, 2009), mas no

    representam adequadamente esta populao em termos de informar sobre suas condies de

    sade.

    Estimativas de expectativa de vida saudvel so exemplos de indicadores que tem

    capacidade de avaliar o envelhecimento integralmente (CAMPOLINA et al., 2013; DEL

    DUCA et al., 2012; IBGE, 2012, 2009). Tal informao relevante pela capacidade de ser

    preditor de sade e de consumo de servios, bem como por incluir nesse amplo debate das

    condies crnicas, alguns fatores como funcionalidade, incapacidade e autonomia.

    Iniciativas como esta so positivas, pois lanam um olhar profundo no cenrio

    epidemiolgico e demogrfico, demonstrando que h potenciais respostas capazes de

    promover, aperfeioar ou manter a funcionalidade dos indivduos e lanar luz aos aspectos

    relacionados ao cuidar dos indivduos que sobrevivem a enfermidades cronicamente. Diversos

    estudos relacionam a longevidade com as deficincias e incapacidades, indicando que embora

    a populao esteja vivendo mais, ela no tm vivido to bem (CAMPOLINA et al. 2013;

  • 36

    IBGE, 2009; CAMARGOS et al., 2009, 2008, 2005, GASPAR et al., 2007; RAMOS, 2005;

    PASCHOAL, 2002).

    Vrios estudiosos dessa temtica, em destaque aqui Camargos e colaboradores (2005),

    provocam ao indagar quem cuidar dessa populao crescente e ao questionar como sero

    vividos estes anos extras do aumento da expectativa de vida. um desafio saber quem, como

    e onde sero assistidos esses indivduos que so produto das grandes transies da sade e

    que apresentam complexidades diversas e necessidades preementes.

    3.3 ESTRATGIAS PARA O ENFRENTAMENTO DAS CONDIES

    CRNICAS: ATENO DOMICILIAR

    Revisando a histria da humanidade, desde os primrdios da escrita, h registros de

    cuidado a sade. Mesmo nas mais remotas referncias em sade h descrio desse tipo de

    cuidado ao ser humano (BARROS, 2012). Ao longo do tempo esses cuidados foram mais bem

    definidos e consolidados quanto ao local onde a assistncia era oferecida, quem era o cuidador

    e como era realizada tal assistncia. Esse cuidado foi sistematicamente sendo organizado em

    trs modalidades de ateno a sade: (1) hospitalar, (2) ambulatorial e (3) domiciliar

    (BARROS, 2012, LACERDA et al., 2006; AMARAL et al., 2001).

    Antigos registros egpcios apresentam a figura de Imhotep, indivduo polivalente que

    desenvolvia atividades na rea da medicina, arquitetura e direito; esse ento considerado

    mdico primitivo surge no perodo do sculo XIII aC, na terceira dinastia do Egito Antigo e

    atendia a populao tanto em locais especficos para o cuidado em sade, que seria uma

    espcie de ambulatrio ou hospital, como tambm no domicilio, tendo entre seus pacientes

    domiciliares o prprio Fara (BARROS, 2012; SILVA et al., 2005).

    Na Grcia, destaca-se o mdico Asklpios, que atendia seus pacientes tanto em suas

    casas como em templos, que dispunham de insumos e medicamentos para os tratamentos dos

    doentes, sendo esta estrutura similar a do atual sistema hospitalar (BARROS, 2012;

    ROONEY, 2012; AMARAL et al., 2001).

    O prprio pai da medicina, Hipcrates, em seu tratado sobre ares, guas e os lugares,

    datado do sculo V aC, destacava a residncia como um lugar adequado e propicio para o

    cuidado da sade (ROONEY, 2012; CAIRUS e RIBEIRO JUNIOR, 2005) .

    Influncia religiosa tambm observada tanto no cuidado a sade que era feito no

    ambiente hospitalar quanto no domiciliar. Entre o sculo XVI e XVII, o religioso So

  • 37

    Francisco de Sales, que fundou a ordem da virgem Maria, e So Vicente de Paula, padre

    francs que junto a viva Luisa de Marillac fundou o Instituto das filhas da caridade ou

    Ordem das irms da caridade, primando pelo cuidado a sade institucionalizado em

    conventos e casas de acolhimento, onde eram oferecidos cuidados para os mais pobres como

    obra de caridade, cuidados de higiene, conforto e alimentao. Alm de realizarem visitas nas

    parquias, este atendimento era expandido para os domiclios dos enfermos pobres

    (MEZZADRI, 1996; DODIN, 1979; CASTRO, 1957).

    Segundo Augusto e Franco (1980), neste perodo a ordem vicentina, adotava um

    manual denominado: Manual das filhas da Caridade, que destinava um trecho a orientaes

    quanto a visitas domiciliares, sob o ttulo, A procura de doentes, onde afirmava:

    1. [...] nada equivale a uma visita de enfermagem domiciliar, repetida todos os dias

    em horas diferentes.

    2. Se por acaso vos fecharem as portas, retirai-vos sem nada dizer.

    3. Diante de uma companhia duvidosa (famlia desajustada, pessoa de outra religio)

    ir diretamente ao doente, cumprimentando-o simplesmente.

    4. Ocupar-se exclusivamente do doente, agir como se estivesse sozinho, no escutar

    nada e nem olhar para nada.

    5. Terminados os cuidados e as determinaes feitas, sair rapidamente.

    6. Desconfiar de um homem s, doente.

    7. Conforme as doenas, elas daro remdios, faro sangrias, lavagens e outros

    medicamentos.

    8. Reclamar sempre a receita antes de comear a l-la atentamente at o fim [...]

    9. Em todos os cuidados pedir uma pessoa da famlia ou vizinha sempre mesma,

    para auxili-la, a fim de faz-los melhor e mais depressa com menor sofrimento para

    o doente. (AUGUSTO E FRANCO, 1980, p.51)

    Esta ao da ordem das irms da caridade representa o inicio da sistematizao da

    ateno domiciliar (PEREIRA, 2001). Neste mesmo perodo os mdicos realizavam o cuidado

    domiciliar para a populao mais abastada, com maior poder e recursos financeiros. Na

    Europa, durante o perodo do Iluminismo, os cuidados domiciliares foram adotados com

    entusiasmo refletindo a valorizao da sade pblica, com prticas que iam do atendimento

    hospitalar a visita domiciliar (AMARAL et al., 2001; BARROS, 2012, REINALDO E

    ROCHA, 2002).

    At mesmo a homeopatia deixou sua contribuio inicial ateno domiciliar, quando

    ao final do sculo XVII, seu fundador Samuel Hanneman passou a realizar atendimentos nas

    casas dos enfermos, com a firme crena de que ao mdico cabia lutar contra a enfermidade,

    onde fosse necessrio. Durante a visita domiciliar ele permanecia ao lado do paciente em seu

    domiclio a maior parte do tempo possvel (PAZ e SANTOS, 2003; AMARAL et al., 2001;

    TAVALORI et al., 2000).

  • 38

    Um dos primeiros marcos histricos, no principio da sistematizao da ateno

    domiciliar, que inaugurou uma nova fase nessa modalidade de ateno, foi o Dispensrio de

    Boston no ano de 1976, atualmente denominado de New England Medical Center. Ainda nos

    Estados Unidos, no ano de 1850 teve inicio outra organizao que ajudou a consolidar a

    ateno domiciliar internacionalmente, tendo como precursora Lilian Wald, visando

    promover aes de sade em domicilio, sendo conhecido depois como Public Health Nurse.

    Este movimento foi crucial para lanar as bases dos atuais programas de ateno domiciliar

    no mundo, influenciando tambm os movimentos pblicos de sade (AMARAL et al., 2001;

    PEREIRA, 2001; MONK-TUTOR, 1998).

    Importante tambm foi contribuio de William Rathbone, na Inglaterra, por volta

    do ano 1850, que se sensibilizou quanto ao cuidado domiciliar, aps ter sua esposa cuidada

    por Mary Robson e a partir disso buscou estender esse tipo de assistncia a outras pessoas, em

    especial aos mais carentes de sua regio, assim procurou a promissora Florence Nightingale,

    que o auxilio na implantao de uma escola para capacitao de enfermeiras visitadoras, que

    em 1859 foi vinculada a Liverpool Royal Infermary, oficializando em 1862 um servio de

    enfermagem distrital em Liverpol (PEREIRA, 2001). Florence Nightingale considerada uma

    das figuras mais importantes para a enfermagem, que contribuiu para a profissionalizao e

    consolidao da enfermagem com bases cientfica (LOPES e SANTOS, 2010).

    O estudo da evoluo histrica da ateno sade demonstra uma relao intricada

    entre as vrias modalidades de ateno a sade, sendo elas institucionalizadas ou realizada no

    domiclio. Observa-se que, apesar da ateno domiciliar nascer junto com as primeiras

    instituies de sade, tal ateno acabou sendo centralizada em hospitais. As formas de

    ateno sade foram evoluindo de modo diferenciado, sendo que os investimentos

    financeiros, tecnolgicos e de polticas pblicas foram por longo tempo maior e mais arrojado

    na ateno hospitalar, o que para alguns autores configurou o hospitalocentrismo, com

    consequente fragmentao da sade e medicalizao (BARROS, 2012; MENDES EV, 2012;

    VECINA NETO, 2007; AMARAL et al., 2001; PEREIRA, 2001).

    Voltando ao contexto nacional da histria da ateno domiciliar no Brasil, de acordo

    com Paz e Santos (2003), a ateno a sade no domiclio tem sua origem relacionada rea

    da sade coletiva, aos programas materno-infantil e ao controle de doenas

    infectocontagiosas.

    Segundo Barros (2012), h duas verses referentes ao inicio da ateno domiciliar

    brasileira, uma datada de 1919, correlacionada ao inicio da sade coletiva, onde enfermeiras

  • 39

    realizavam visitas domiciliares. A outra verso data de 1949 e relata o surgimento do Servio

    de Assistncia Mdica Domiciliar de Urgncia, precursor do atual modelo adotado pelo

    Servio de Atendimento Mvel de Urgncia (SAMU).

    J Amaral (2001), afirma que o inicio da ateno domiciliar brasileira se d com a

    criao do primeiro servio no Hospital do Servidor Estadual Pblico de So Paulo, em 1967,

    denominado de Assistncia Domiciliar a Sade (ADS) (BARROS, 2012, AMARAL, 2001,

    PEREIRA, 2001).

    Fato que hoje no pas a ateno domiciliar ressurgiu e reformulou-se de modo a

    adequar-se e apoiar a resposta dos sistemas de sade s emergentes demandas constatadas

    universalmente em todos os sistemas de sade. Conforme Barros (2012), cada modalidade de

    ateno sade acompanha as particularidades epidemiolgicas, socioeconmicas, culturais e

    polticas de cada pas. Isso ficou claro no rearranjo dos servios de ateno domiciliar em

    todo o mundo, que alm das aes de preveno a sade, presente em seus primrdios adotou

    a ateno ao paciente crnico e sequelado como populao alvo da maioria dos programas,

    inclusive no Brasil (BRASIL, 2013a, 2013b, 2013c, 2013e; BARROS, 2012).

    consenso que os atuais sistemas de sade no so desenhados para atender as

    condies crnicas. O modelo de tratamento agudo ainda dominante nas organizaes de

    sade como um todo e tem no hospital, nas unidades de pronto atendimento e nos

    ambulatrios seu local de referncia (FEUERWERKER e MERHY, 2008; REHEM e TRAD,

    2005; WHO, 2003).

    Os sistemas so fragmentados, fortemente hegemnicos e hierarquizados, havendo

    vrios pontos com diversas possibilidades de ateno, mas que no conversam entre si e

    consequentemente so incapazes de manter uma ateno continua e integral a populao

    (MENDES EV, 2012; Mendes, 2011; BRASIL, 2008a).

    Essa organizao dos sistemas de sade predominantemente global, comprovando

    que os sistemas esto falhando por no conseguir sincronizar-se com as mudanas

    epidemiolgicas e demogrfica mundiais, tendendo ao declnio das condies agudas e

    ascenso das condies crnicas (MENDES, 2010, HAM, 2007; WHO, 2003)

    Neste cenrio, a ateno domiciliar considerada ferramenta com grande potencial

    para responder aos novos desafios dos sistemas de sade. Isso tem sido percebido pelos

    sistemas de sade em todo o mundo, em especial no Brasil essa potencialidade foi verificada

    ao final do sculo XX, como ratifica Paz e Santos (2003), referindo-se a nova estruturao da

    ateno domiciliar brasileira, analisada ao final da dcada de 1990, embasada em Paskulin e

  • 40

    Dias (2002), Duarte e Diogo (2000) e Santos et al., (1999), que afirmam que apenas na

    ltima dcada, o cuidado domiciliar est voltando-se para o atendimento, principalmente, de

    pacientes com agravos de longa durao, incapacitados ou em fase terminal.

    Mas atualmente no pas h uma estratgia de reorganizao do sistema de sade para

    responder a crise gerada em especial pelas condies crnicas, sendo ela a adoo da ateno

    primria a sade como ordenadora do SUS. Neste contexto tem importncia a ateno

    domiciliar por integrar a APS, compondo assim uma das grandes apostas de reverso da

    lgica de ateno a sade centrada no hospital e no atendimento agudo e reativo (BRASIL,

    2013a, 2013b, 2013c, 2013e, 2011; FEUERWERKER e MERHY, 2008; REHEM e TRAD,

    2005; WHO, 2003).

    Hoje no Brasil contamos com uma poltica nacional de ateno domiciliar e com

    servios tanto na esfera pblica quanto no setor privado capaz de oferecer desde a baixa

    complexidade domiciliar, representada pela ESF, passando pela mdia complexidade,

    representada pelo PID, alcanando at a alta complexidade domiciliar, representada pelo

    Home Care. (BRASIL, 2013b; SERAFIM e RIBEIRO, 2011). No SUS a previso da ateno

    domiciliar contempla duas vertentes complementares, com diferentes nveis de

    complexidade: uma configurada pelo programa Melhor em Casa, que organiza os Servios de

    Ateno Domiciliar (SAD) e outra por meio da Estratgia Sade da Famlia (ESF) e do

    Programa de Agentes Comunitrios de Sade (PACS)(BRASIL, 2011b).

    O Melhor em Casa conta com arcabouo legal que normatiza a ateno domiciliar no

    mbito do SUS, financiando e monitorando esta estratgia de ateno a sade. Segundo dados

    do Ministrio da Sade, hoje a ateno domiciliar pblica, concretizada pelo Melhor em Casa

    alcana 16,2 milhes de brasileiros, estando presente em 20 estados e 67 municpios em todo

    o Brasil, e com proposta de expanso em todo o territrio nacional (BRASIL, 2013e).

    A outra modalidade da ateno domiciliar presente no pas, ESF e PACS, encontra-se

    normatizada pela Portaria 2.488 de 21 de Outubro de 2011 (BRASIL, 2011b). De acordo com

    dados do Ministrio da Sade de 2013, a ESF conta hoje com uma cobertura nacional de

    55,73% do territrio, contemplando 5.309 municpios onde esto implantadas 34.185 equipes.

    O PACS tem cobertura nacional de 64,34% do territrio, distribuda em 5.514 municpios

    onde h 255.772 equipes de PACS implantadas (BRASIL, 2013f)).

    Atualmente no sistema de sade brasileiro a ateno domiciliar representa uma

    modalidade de ateno sade substitutiva ou complementar s j existentes, caracterizada

    por um conjunto de aes de promoo sade, preveno e tratamento de doenas e

  • 41

    reabilitao prestadas em domiclio, com garantia de continuidade de cuidados e integrada s

    redes de ateno sade (BRASIL, 2013a, 2013b).

    Um dos maiores desafios impostos a ateno domiciliar conseguir prover cuidados

    domiciliares de qualidade, garantindo segurana ao paciente, famlia e aos profissionais de

    sade, adaptando-se a cenrios diferentes do hospitalar e ambulatorial, sendo muitas vezes

    limitado. Ao realizao promoo e preveno de sade no domicilio prioritrio garantir

    qualidade assistencial, estabilidade clnica, segurana, sem contudo desvirtuar o ambiente

    domiciliar, sem descaracterizar o lar. Vemos a Ateno Primria elaborar vrias estratgias

    de ateno domiciliar, com programas como o PID/PAD e a ESF, mas sem um dilogo entre

    os mesmos de modo a prestar um cuidado integral ao individuo e famlia no domicilio. Parece

    no haver um plano de ao conjunto que permita que as aes preconizadas sejam realizadas

    de forma complementar.

    Estudiosos do funcionamento dos programas de ateno domiciliar ratificam que a

    organizao de uma estratgia de ateno no domicilio tem inicio com um diagnstico de qual

    a real necessidade do paciente, sua situao clnica, econmica, social, familiar, as

    condies ambientais/sanitrias. S a partir disso traado um plano para melhor prover

    suas demandas. No nvel macro, tambm seria importante um diagnstico das estratgias de

    ateno no domicilio existentes, como elas conversam entre si e como organiza-las a ponto de

    promover uma ateno no domicilio mais resolutiva (DAL BEN e GAIDIZINSKI, 2006;

    FUGULIN, 2010, 2006, PERROCA e GAIDIZINSKI, 1998).

    3.4 IMPORTNCIA DOS INDICADORES PARA GESTO NA SADE

    Ao se fazer gesto em sade necessrio se estabelecer quais sero as ferramentas

    capazes de aferir a qualidade e quantidade dos recursos empregados que se traduza em uma

    assistncia de qualidade (RIPSA, 2013; TAMAKI et al. , 2012; REMOR et al.,2010).

    Agora, para se avaliar a qualidade da assistncia necessrio traduzir os conceitos e

    definies gerais, ou seja, estabelecer qual a melhor maneira de prestar assistncia em

    critrios operacionais, parmetros e indicadores, validados e calibrados pelos atributos da

    estrutura, processo e resultados (DONABEDIAN, 1988).

    Os indicadores so informaes tratadas de modo a torn-las acessveis, traduzindo

    assim fenmenos complexos, tornando-os quantificveis e compreensveis sendo possvel

  • 42

    avaliar, utilizar e transmitir aos diversos setores da sociedade informaes em sade,

    contribuindo para a planificao das polticas de sade e otimizando a informao (SCHOUT

    e NOVAES, 2007; FERREIRA, 2002).

    Indicadores podem ser definidos como ferramentas imprescindveis para a gesto em

    sade, entendidos como medidas-sntese que contm informao relevante sobre

    determinados atributos e dimenses do estado de sade, bem como do desempenho do sistema

    de sade, refletindo a situao sanitria de uma populao, suas tendncias, quais os grupos

    humanos com maiores necessidades de sade e possibilitando a estratificao do risco

    epidemiolgico e da identificao de reas crticas. Alm de importante insumo para a gesto

    imprescindvel para vigilncia das condies de sade (RIPSA, 2013; FELDMAN et al.,

    2005).

    Os dados coletados em si no constituem indicadores de sade, os dados so finitos

    em si prprios, s possuem significados medida que so capazes de gerar informao que

    embasem o processo de deciso, so na verdade sinalizadores, que indicam problemas

    potenciais ou boas prticas de cuidados, sendo ferramentas importantes para a gesto de sade

    (RIPSA, 2013; FIELDING E KUMANYKA, 2009; LEO et al., 2008).

    O indicador geralmente representado como uma varivel numrica, podendo ser um

    nmero absoluto (por exemplo, nmero total de cirurgias limpas realizadas) ou uma relao

    entre dois eventos, estabelecendo-se o numerador e denominador (por exemplo, nmero de

    cirurgias limpas/nmero total de cirurgias). O numerador o evento que est sendo medido ou

    reconhecido e precisa apresentar definio objetiva e clara, ser fundamentado por meio de

    estudos prvios, prontamente aplicveis, rapidamente identificados e clinicamente

    importantes em uma dada populao. O denominador do indicador corresponde populao

    de risco/interesse ou sob avaliao de risco para um dado evento definido do numerador. O

    indicador deve definir um perodo, permitir o desenvolvimento de ndices e ser o mais

    especfico possvel (BREVIDELI e FREITAS, 2012; FERREIRA, 2002).

    Para avaliar a qualidade da assistncia importante que as informaes sejam claras e

    representativas de todos os recursos utilizados para alcanar aquele resultado. Os indicadores

    so exatamente essas informaes, tratadas de modo a traduzir toda essa dinmica do

    processo, facilitando o entendimento de fenmenos complexos, tornando-os quantificveis e

    compreensveis pelos quais possvel avaliar, planejar, executar e reavaliar todo o processo

    de trabalho (GOUVA e TRAVASSOS, 2010; ALLEGRANZI et al, 2007; FERREIRA,

    2002).

  • 43

    H mais de 40 anos iniciou-se de forma sistematizada na sade um movimento que

    buscava avaliar a qualidade da assistncia prestada, recursos empreendidos e segurana do

    paciente, classicamente esta avaliao considerava trs dimenses, propostas por Donabedian

    (1990), sendo elas: estrutura, processo e resultados. Avedis Donabedien, pediatra armnio

    radicado nos Estados Unidos, considerado um dos precursores na utilizao e divulgao

    dos indicadores sade. Suas ideias aliceram os conceitos atuais de indicadores na sade

    utilizadas globalmente (FARACO, 2013; LEO et al.; 2008, DINNOCENZO et al., 2006;

    BITTAR, 2001).

    Hoje a utilizao de indicadores consenso mundial, presente tanto na sade pblica

    como nas instituies privadas, por meio de programas de avaliao de qualidade, organismos

    acreditadores nacionais e internacionais, bem como por normas de avaliao de qualidade de

    assistncia. A qualidade tornou-se meta para toda e qualquer instituio de sade e os

    indicadores so ferramentas imprescindveis para alcanar este objetivo. (FARACO, 2013;

    KURGANCT e TRONCHIN, 2008).

    Segundo a OMS (1993) qualidade da assistncia em sade engloba um conjunto de

    elementos que incluem: um alto grau de competncia profissional, a eficincia na utilizao

    dos recursos, um mnimo de riscos, um alto grau de satisfao dos pacientes e um efeito

    favorvel na sade (RACOVEANU, 1995).

    No Brasil, temos vrios sistemas de informaes e rgos que avaliam a qualidade da

    sade por meio de indicadores prprios. Considerando a grandiosidade do SUS, um dos

    maiores sistemas pblicos de sade do mundo, cujos principais produtos so as suas aes e

    servios, preciso uma organizada rede de informaes para mensurar a eficincia e

    efetividade desse sistema (REMOR et al. 2010).

    Um dos primeiros i