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UNIVERSIDADE VALE DO RIO DOCE FACULDADE DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
CURSO DE FARMÁCIA
ANALU RAMOS DA SILVA KÉSIA TEIXEIRA DE OLIVEIRA RENATO FARIA DOS ANJOS RONCALI COELHO SOARES
VITOR DOMINGOS PASSOS LIMA
TERAPIA COM CÉLULAS-TRONCO EMBRIONÁRIAS HUMANAS:
REFLEXÕES ÉTICAS, MORAIS E LEGAIS.
Governador Valadares-MG 2008
ANALU RAMOS DA SILVA KÉSIA TEIXEIRA DE OLIVEIRA RENATO FARIA DOS ANJOS RONCALI COELHO SOARES
VITOR DOMINGOS PASSOS LIMA
TERAPIA COM CÉLULAS-TRONCO EMBRIONÁRIAS HUMANAS: REFLEXÕES ÉTICAS, MORAIS E LEGAIS.
Monografia para obtenção do grau de bacharel em Farmácia, apresentada à Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade Vale do Rio Doce. Orientador: Prof.:Dr. Eduardo Rezende Galvão Co-Orientador: Prof.ª Adelaide Machado Coutinho Cavalcante
Governador Valadares-MG 2008
ANALU RAMOS DA SILVA KÉSIA TEIXEIRA DE OLIVEIRA RENATO FARIA DOS ANJOS RONCALI COELHO SOARES
VITOR DOMINGOS PASSOS LIMA
TERAPIA COM CÉLULAS-TRONCO EMBRIONÁRIAS HUMANAS: REFLEXÕES ÉTICAS, MORAIS E LEGAIS.
Monografia apresentada como requisito para obtenção do grau de bacharel em Farmácia pela Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade Vale do Rio Doce
Governador Valadares, ___ de ____________ de _____.
Banca Examinadora:
__________________________________________ Prof.:Dr. Eduardo Rezende Galvão - Orientador
Universidade Vale do Rio Doce
__________________________________________ Prof.ª: Adelaide Machado Coutinho Cavalcante - Co-Orientadora
Universidade Vale do Rio Doce
__________________________________________ Profª.: Dr.Lúcia Alves de Oliveira Fraga
Universidade Vale do Rio Doce
__________________________________________ Prof.: Glaydson Sarcinelli Fabri Universidade Vale do Rio Doce
Dedicamos este trabalho à nossas famílias por estarem sempre ao nosso lado, nos incentivando e apoiando em todos os momentos.
AGRADECIMENTOS
Agradecemos a Deus, presente em todos os momentos de nossas vidas, iluminando
nossos passos, orientando e guiando nestes caminhos e por ter colocado ao nosso
lado, pessoas tão especiais, para nos apoiar.
Aos nossos, pais e familiares pela força moral e afeto em todos os momentos.
Á Adelaide, nossa co-orientadora pela atenção, prontidão em nos atender sempre
que requeríamos a sua ajuda.
Enfim, agradecemos a todos os que, contribuíram para a elaboração deste estudo e
superação de mais esta etapa em nossas vidas.
RESUMO
O avanço científico não tem fim. A era dos homens vive, nesse novo milênio, um momento esplêndido na história das ciências. Quando se fala em pesquisa e terapia com células-tronco embrionárias, esta se falando da possível cura de doenças que foram e ainda são causas de milhares de morte em todo o mundo. A promessa que ela traz é a única esperança para aqueles que vivem há anos ou décadas em uma cadeira de rodas ou com Mal de Parkinson ou diabetes, e várias outras que no decorrer dessa pesquisa serão demonstradas. Essa esperança nasceu a partir da Lei nº. 11.105, de 24 de março de 2005, a chamada Lei de Biossegurança. Para muitos será chamada Lei da Esperança. Essa lei permite, em seu artigo 5º, a pesquisa e terapia com células-tronco a partir de embriões inviáveis, desde que atendidos todos os requisitos exigidos no dispositivo. Há dez anos acontecia nos Estados Unidos o primeiro contato do homem com células-tronco embrionárias, e não seria apenas mais uma pesquisa cientifica. Hoje, aquele estudo representa a esperança de muitas pessoas tanto no Brasil, quanto em qualquer parte do planeta onde as respectivas legislações lhes forem favoráveis. Pessoas que sofrem com moléstias em que as células-tronco de embriões reconstituem os tecidos lesados, dando vida nova, com dignidade e todas as demais garantias constitucionais. Todos sabem que o Brasil, agora, se junta aos países onde as pesquisas com células-tronco embrionárias são liberadas, e partir desse trabalho, saberão todos os motivos e fundamentos que levaram os responsáveis a decidir favoravelmente à esperança de milhares de pessoas. Palavras-chave: Células-tronco embrionárias. Lei de Biossegurança. Pesquisa e terapia com células-tronco de embriões. Biodireito. Legalidade das pesquisas com células-tronco de embriões.
ABSTRACT
The scientific advance is endless. The era of men is living, in this new millennium, a splendid moment in the history of science. When it comes to research and therapy with embryonic stem cells, is talking about the possible cure of diseases that have been and are still causes thousands of deaths around the world. The promise that they bring is the only hope for those who live for years or decades in a wheelchair, or with Mal Parkinson’s or diabetes, end several others that in the course of this research will be demonstrated. This hope was born from the Law nº. 11.105, from march 24, 2005, the so-called Law of Biosafety. For many, will be called Lam of Hope. This law allows, in its article 5, research and therapy using stem cells from embryos unviable, provided they met all the requirements on device. Ten years ago happened in the United States the first contact of man with embryonic stem cells, and would not be just another scientific research. Today, this study represents the hope of many people both in Brazil, as anywhere in the world where their laws are favorable to them. People who suffer from diseases where stem cells from embryos reconstituted the injured tissues, giving new life with dignity and all other constitutional guarantees. Everyone knows that Brazil, now joins the countries where the research with embryonic stem cells are released, and from this work, know all the reasons and led those responsible to decide favorably to the hopes of thousands of people. Key-words: Embryonic stem Cells. The Biosecurity Act. Research and therapy using stem cells from embryos. Biolaw. Legality of searches whit stem cells from embryos.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 – Blastocisto.................................................................................................21
Figura 2 – Divisão celular...........................................................................................23
Figura 3 – Clonagem terapêutica ..............................................................................24
Figura 4 –Cultivo de células-tronco embrionárias em laboratório ...........................26
LISTA DE SIGLAS
ABNT: Associação Brasileira de Normas Técnicas
ADIN: Ação Direta de Inconstitucionalidade
CCB: Código Civil Brasileiro
CF: Constituição Federal
CNBS: Conselho Nacional de Biossegurança
CONEP: Comissão Nacional de Ética em Pesquisa
CPB: Código Penal Brasileiro
CPC: Código de Processo Civil
CTN Bio: Comissão Técnica Nacional de Biossegurança
DNA: Ácido Desoxirribonucléico
EUA: Estados Unidos da América
MP: Ministério Público
OAB: Ordem dos Advogados do Brasil
OGM: Organismo Geneticamente Modificado
STF: Supremo Tribunal Federal
TJ: Tribunal de Justiça
PNB: Política Nacional de Biossegurança
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 15 2 CÉLULAS-TRONCO .............................................................................................. 19
2.1 CONCEITO ...................................................................................................... 19 2.1.1 Classificação ................................................................................................. 19
3 CONCEITO DE CÉLULAS-TRONCO EMBRIONÁRIAS ........................................ 21 3.1 CONCEITO LEGAL DAS CÉLULAS-TRONCO EMBRIONÁRIAS ................... 22
4 COMO SÃO OBTIDAS AS CÉLULAS-TRONCO EMBRIONÁRIAS ....................... 23 5 QUANTIDADE DE EMBRIÕES CONGELADOS NO BRASIL ................................ 27 6 PESQUISA COM CÉLULAS-TRONCO NO MUNDO ............................................. 27 7 FERTILIZAÇÃO IN VITRO COMO TÉCNICA DE REPRODUÇÃO ASSISTIDA ... 28 8 PESQUISAS COM CÉLULAS-TRONCO EMBRIONÁRIAS PARA FINS TERAPÊUTICOS ...................................................................................................... 29 9 ÉTICA E MORAL .................................................................................................... 32 10 REFLEXÕES ÉTICAS E MORAIS NA TERAPIA DE CÉLULAS TRONCO-EMBRIONÁRIAS HUMANAS. ................................................................................... 33 11 O PERIGO DO USO DO EMBRIÃO HUMANO COMO OBJETO DE VALOR COMERCIAL. ............................................................................................................ 35 12 OPORTUNISMO COMERCIAL E FALSAS ESPERANÇAS ................................. 37 13 AS RELIGIÕES E A TERAPIA COM CÉLULAS TRONCO-EMBRIONÁRIAS HUMANAS ................................................................................................................ 39 14 ASPECTOS LEGAIS SOBRE A TERAPIA E PESQUISAS COM CÉLULAS TRONCO-EMBRIONÁRIAS ...................................................................................... 43 15 BIOÉTICA ............................................................................................................. 44
15.1 PRINCÍPIOS DA BIOÉTICA .......................................................................... 45 15.1.1 Princípio da justiça ...................................................................................... 45 15.1.2 Princípio da autonomia ............................................................................... 46 15.1.3 Princípio da beneficência ............................................................................ 46
16 BIODIREITO ......................................................................................................... 47 16.1 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE DOS MEIOS E FINS ..................................... 47
17 TEORIAS SOBRE O INÍCO DA VIDA HUMANA .................................................. 48 18 ALGUNS ASPECTOS SOBRE A LEI DE BIOSEGURANÇA ............................... 49 19 ANÁLISE DO ARTIGO 5º DA LEI DE BIOSSEGURANÇA .................................. 51 20 EMBRIÕES EXCEDENTES ................................................................................. 54 21 A MORTE PARA O DIREITO ............................................................................... 56 22 PESQUISAS COM CELULAS-TRONCO EMBRIONÁRIAS E ABORTO ............. 58 23 AS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS QUE LEGITIMAM AS PESQUISAS ........ 59 24 DIREITOS DO NASCITURO ................................................................................ 60 25 DIREITO À VIDA .................................................................................................. 60 26 A VIDA EXTRA-UTERINA .................................................................................... 62 27 O DIREITO À SAÚDE .......................................................................................... 63 28 O PLANEJAMENTO FAMILIAR ........................................................................... 65 29 LIBERDADE DA ATIVIDADE CIÊNTIFICA .......................................................... 66 30 A PROMOÇÃO E INCENTIVO AO CIÊNTIFICO ................................................. 67 31 DIREITO A PERSONALIDADE CIVIL .................................................................. 68 32 CAPACIDADE PROCESSUAL DO NASCITURO ................................................ 70 33 A FIGURA DO NACITURO VERSUS A FIGURA DO EMBRIÃO ......................... 73
34 POSICIONAMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL ACERCA DA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N. 3510-0/DF .......................................... 75 35 CONCLUSÃO ....................................................................................................... 78 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: ......................................................................... 81 ANEXOS ................................................................................................................... 87
15
1 INTRODUÇÃO
Os avanços da ciência em todas as áreas do conhecimento humano são
efetivamente extraordinários. No entanto, não podemos fechar os olhos para um
estado de vazio ético contaminante, no qual, as referências tradicionais
desaparecem quase por completo. A sociedade nunca experimentou em escala tão
profunda avanços científicos tão marcantes. A tecnologia é a tônica em nosso
cenário cotidiano; o desenvolvimento científico é contínuo e parece não ter limites.
Alvos outrora inimagináveis tornaram-se relativamente banais em pouco tempo,
sendo rapidamente substituídos por novas descobertas.
As conquistas tecnológicas nas áreas do átomo, da informação e da genética,
associadas às revoluções que impuseram a toda sociedade são ainda mais
evidentes e preocupantes. Esses efeitos revolucionários e espetaculares rompem,
inauguram e voltam a romper sucessivamente vários paradigmas dentro de uma
lógica de competição exacerbada, de deslumbramento diante das novidades
tecnológicas e de uma total ausência de valores e normas éticas, fazendo
desaparecer quase por completo, os fundamentos ontológicos, metafísicos, e
religiosos que durante toda existência humana nortearam os rumos da ciência.
Esses avanços tecnológicos amiúde são contestados, pois não se sabe, de
antemão, as conseqüências que disso advirão. De fato, essas conquistas são uma
via de mão única que não admitem, jamais, retrocesso, uma vez concretizadas.
Galgado um estágio de desenvolvimento, não há mais como voltar atrás. A
sociedade apodera-se de tal forma dessas conquistas, que uma vez divulgadas
caem, em domínio público e perdem toda forma de controle ético, moral e muitas
vezes legal sobre o avanço conquistado, pois geralmente os burocratas da lei
(legisladores) não acompanham em tempo real esta evolução. Aldous Huxley, em
seu “Admirável Mundo Novo” já antevia essas modificações. As conquistas que
antes eram utopias, ou ficção “Hollywoodianas” hoje são realidades, trazendo sim
benefícios, mas também enormes riscos (Dupas, 2000).
Esses avanços atingiram a saúde e a medicina em todos os seus níveis e
áreas. Biologia molecular, engenharia genética, alimentos transgênicos, testes de
DNA, Genoma terapêutico e reprodutivo; são realidades que estão às escancaras,
trazendo consigo as discussões ético-jurídicas e morais em torno delas. De fato, as
16
questões éticas e morais, tomaram de assalto esses avanços e reclamam a posição
de paradigma para as decisões sobre o desenvolvimento das ciências da saúde,
principalmente quando estão envolvidas diretamente as questões da vida. Daí a
expressão bioética, ou ética da vida.
Neste contexto, as técnicas de reprodução e o manuseio de células
embrionárias com o objetivo terapêutico e de pesquisa são cada vez mais comuns,
e, dada à sua complexidade, provocam discussões jurídicas, éticas e morais das
mais relevantes. Temas relacionados ao Direito sucessório, Direito alimentar,
Direitos de personalidade, são a tônica da discussão, que aos poucos vêm sendo
sedimentada em nossa doutrina.
No Brasil, o patrimônio legal que rege as atividades relacionadas às terapias
e pesquisas com células tronco-embrionárias de embriões humanos estão ainda em
desenvolvimento, no entanto, são suficientes quanto ao objetivo de dar sustentação,
proteção e segurança jurídica aos profissionais envolvidos com o tema, alicerçados
em particular pela lei N°11.105, de 24 de março de 2005, mais conhecida como Lei
de Biossegurança. Outras leis como a Convenção Americana de Direitos Humanos
de 1969 ratificada pelo Brasil em 25/06/1992, o nosso Código Civil, a Lei n° 9.434 de
4 de fevereiro de 1997 (Lei de Transplantes) e a própria Constituição Federal são
constantemente evocadas principalmente por analogia, funcionando de forma eficaz
como instrumento de normalização de tais atos, que como qualquer outra atividade,
necessita de regulamentação firme e tranqüila no sentido de dar segurança jurídica
aos profissionais pelos atos praticados no exercício da profissão.
Neste sentido, a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), proferida em
29 de maio de 2008 que julgou constitucional a Lei de biossegurança, em particular
seu artigo 5°, abriu novos e promissores horizontes ao desenvolvimento de diplomas
legais que certamente vão ser desenvolvidos a partir de tal pronunciamento, com a
finalidade de reger com mais clareza e firmeza as atividades científicas relacionadas
com o uso de células tronco-embrionárias desenvolvidas a partir de embriões
humanos para fins de pesquisa e terapias.
Obstante ao aspecto jurídico-legal que aqui será tratado sucintamente, o
presente trabalho tenta visualizar o tema sob o prisma ético-moral o qual se
apresenta como sendo um dos maiores desafios desta questão, visto que, encontrar
limites para as atividades de pesquisas patrocinadas por investidores cada vez mais
ávidos e ansiosos por retornos financeiros, é praticamente impossível mediante a
17
existência de conflitos de interesses econômico-financeiros gigantescos de um lado,
e por outro, a necessidade urgente de se impor limites ético-morais a uma atividade
que vai lidar diretamente com a vida e dignidade humanas.
Embora haja, pelo menos à primeira vista, uma pretensão humanitária na
tentativa de gerar embriões em laboratório com o intuito de salvar vidas humanas,
melhorar sua qualidade, ou ainda, aumentar a expectativa de vida, não temos
dificuldades de imaginar situações constrangedoras como, por exemplo, a produção
de embriões para comercialização, o que acentuaria o dilema social que permite
àqueles com melhores condições financeiras acesso irrestrito aos tratamentos e
terapias, enquanto os mais necessitados continuariam excluídos do direito a
manutenção da vida caso dependessem usufruir de recursos tecnológicos de
vanguarda.
Atentos a essas questões, o trabalho de conclusão de curso desenvolvido a
seguir, propõe refletir sobre as peculiaridades inerentes ao assunto procurando dar
ênfase aos aspectos morais, legais e éticos relacionados entre si, enfocando a
terapia e pesquisa com células tronco-embrionárias de embriões humanos
excedentes das técnicas de reprodução assistidas.
Diga-se que o presente trabalho não tem a pretensão de esgotar o tema, mas
tão somente, provocar uma reflexão construtiva, propondo-se a tentar responder
questões como: Sob o ponto de vista ético, moral e legal, dentro do território
brasileiro, o uso de células tronco de embriões humanos para fins terapêuticos e de
pesquisa são efetivamente amparados pela legislação em vigor?
Trabalhando em função do questionamento acima, tentou-se confirmar a
hipótese em que os diplomas legais já existentes em nosso país já são suficientes
para autorizar o uso de células tronco embrionárias de embriões humanos para fins
de pesquisa e terapias e dão suporte legal aos investimentos garantindo segurança
jurídica e impondo limites éticos e morais às ações de pesquisadores e cientistas
envolvidos no tema. No entanto, precisamos evoluir ainda mais neste sentido, visto
que, as mudanças sociais, nas mais diversas esferas e dimensões muda a cada
momento. Criar mecanismos para acompanhar com mais rapidez a evolução
tecnológica experimentada a cada dia, seja nas áreas da ciência da saúde ou em
qualquer outra área do conhecimento humano se faz necessário e urgente.
A metodologia utilizada neste trabalho monográfico foi o da pesquisa
bibliográfica que usada como instrumento de construção do referencial teórico, pois
18
se configura como o método mais adequado para buscar respostas às questões
levantadas nesta monografia que tem como tema um dos assuntos mais discutidos
hoje em dia tanto no ambiente acadêmico quanto na comunidade científica mundial.
– O USO DE CÉLULAS-TRONCO EMBRIONÁRIAS HUMANAS: REFL EXÕES
ÉTICAS, MORAIS E LEGAIS - A partir deste tema tentaremos apresentar de modo
sucinto a posição, os conceitos e as teses de diversos autores sobre o tema em foco
e as opiniões mais autorizadas sobre ele, englobando em uma visão integrada, as
contribuições de diversas correntes filosóficas e de diversos especialistas.
Para a elaboração do presente trabalho, foi utilizadas técnica de
fichamentos, resumos, fonte de pesquisa indireta, como de revistas e livros jurídicos,
artigos científicos correlacionados com os temas abordados, legislação pátria
concernente ao tema proposto, projetos de lei em tramitação na Câmara dos
Deputados, tudo, em conformidade com as normas da ABNT (Associação Brasileira
de Normas Técnicas), para a elaboração de trabalhos acadêmicos.
19
2 CÉLULAS-TRONCO
2.1 CONCEITO
As células-tronco, definida como células com capacidade de gerar diferentes
tipos celulares e reconstituir diversos tecidos, apresenta a propriedade de auto-
renovação, ou seja, gerar uma cópia idêntica a si mesma.
O Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001, p. 669) traz o significado
de células-tronco:
Bio-célula indiferenciada capaz de gerar, por divisão mitótica
simétrica, duas células-filhas idênticas a ela ou, por divisão mitótica
assimétrica, uma célula-filha diferenciada e outra nova célula que
permanece indiferenciada e mantém a linhagem original.
No início do desenvolvimento humano, todas as células são indiferenciadas,
sendo que só posteriormente dão origem aos diversos tecidos que irão compor os
vários órgãos, aparelhos e sistemas do corpo humano. As células-tronco são células
indiferenciadas, capazes de se diferenciar, dando origem a células de funções
específicas.
2.1.1 Classificação
As células-tronco se classificam em totipotentes ou embrionárias,
pluripotentes ou multipotentes, oligopotentes e unipotentes.
As células-tronco totipotentes ou embrionárias são capazes de diferenciar-
se em todos os tecidos que formam o corpo humano, incluindo a placenta e anexos
embrionários, são encontradas nos embriões nas primeiras fases de divisão.
20
As células-tronco pluripotentes ou multipotentes são células que
conseguem se diferenciar em quase todos os tecidos humanos, excluindo a placenta
e anexos embrionários. Algumas pesquisas classificam as multipotentes como
células capazes de formar um número menor de tecidos do que as pluripotentes,
outros entendem que as duas definições são sinônimas.
As células-tronco oligopotentes , são células com capacidade de se
diferenciar em poucos tecidos.
As células-tronco unipotentes são células que conseguem diferenciar-se
em um único tecido. Esse tipo de célula pode ser encontrado no tecido cerebral
adulto e na próstata, por exemplo.
As células-tronco também podem ser classificadas de acordo com a sua
natureza, elas podem ser células-tronco embrionárias ou células-tronco adultas.
As células-tronco adultas encontram-se na placenta, cordão umbilical, tecidos
do corpo humano já as embrionárias, estas encontradas nos embriões de primeira
semana, são especialmente versáteis, podendo converter-se em qualquer um dos
tecidos do organismo.
As células-tronco adultas, devido à habilidade limitada em face das
embrionárias, não são o foco de estudo dos cientistas no momento, principalmente
no Brasil, com a recente declaração de constitucionalidade da Lei de Biossegurança.
Apesar de não serem objeto de estudo neste trabalho, as células-tronco adultas
possuem uma vantagem sobre as células-tronco embrionárias no uso terapêutico
podendo ser isoladas de tecidos do próprio paciente, eliminando o problema da
rejeição em caso de transplante, compatibilidade histoquímica com o organismo
receptor e o problema da destruição de embriões (Pereira, 2008).
Portanto, aí esta a justificativa para o trabalho dos cientistas do mundo inteiro,
estudar as células embrionárias, pois são especialmente versáteis, podendo
converter-se em qualquer um dos tecidos do organismo. Com o uso delas poderiam
ser tratadas doenças neuromusculares degenerativos, que afetam uma em cada mil
pessoas, apenas no Brasil, estimam-se, duzentas mil.
21
3 CONCEITO DE CÉLULAS-TRONCO EMBRIONÁRIAS
Menor ainda do que a ponta de uma agulha é o embrião na sua primeira
semana, que traz dezenas de células-tronco embrionárias. São derivadas de um
pré-embrião - a massa de células na primeira fase do desenvolvimento humano,
portanto, células-tronco embrionárias, ora denominadas células embrionárias trazem
a capacidade de se desenvolverem em diversos tipos celulares.
As células-tronco embrionárias são totipotentes, isto é, capazes de originarem
qualquer tipo de célula existente no nosso corpo. Seu potencial quase ilimitado fez
das células-tronco um foco significante nas pesquisas médicas. Imagine ter a
habilidade de devolver a memória a um paciente com Alzheimer, repor pele perdida
durante um terrível acidente ou habilitar uma pessoa em cadeira de rodas a andar
novamente, são potencialmente úteis em terapias de combate a doenças
cardiovasculares, neurodegenerativas, diabetes, acidentes vasculares cerebrais,
traumas na medula óssea espinhal, doenças hematológicas entre outras.
As células-tronco embrionárias são definidas por sua origem, e são derivadas
do estágio do blastocisto do embrião (Kirschstein, 2001a). O blastocisto corresponde
às células entre o quarto e quinto dias após a fecundação, mas antes ainda da
implantação no útero, que ocorre a partir do sexto dia (Kirschstein, 2001b; Moore,
2000). O blastocisto compreende cerca de 150 células e precede a fase embrionária,
denominada gástrula (Rey, 1999).
Figura 1: Blastocisto: Embrião humano de 5 dias
para a obtenção de células-tronco embrionárias.
Fonte:
http://www.comciencia.br/reportagens/celulas/10.shtml
22
As células-tronco embrionárias apresentam grande plasticidade. A
propriedade de plasticidade refere-se à capacidade da célula em originar diferentes
tipos de tecidos. A grande plasticidade das células-tronco embrionárias deve-se ao
fato do blastocisto ser capaz de originar todos os órgãos do corpo humano. Após a
fecundação, o zigoto divide-se e diferencia-se até produzir um organismo adulto que
consiste em mais de 200 tipos de células. Entre esses, neurônios, células
musculares (miócitos), células epiteliais, células sangüíneas, células ósseas
(osteócitos), cartilagem (condrócitos) e outras (Kirschstein, 2001a). Eis a chave
milagrosa para a cura de inúmeras doenças.
Os cientistas de todo mundo ainda estão atrás dessa capacidade de
direcionar o processo de diferenciação das células-tronco embrionárias, controlar
essa função milagrosa, pois esse processo permitiria que a partir das células
embrionárias , fossem cultivados controladamente os mais diferentes tipos celulares
abrindo a possibilidade de construir tecidos e órgãos in vitro, na placa de cultura ,
tornando viável a chamada bioengenharia.
3.1 CONCEITO LEGAL DAS CÉLULAS-TRONCO EMBRIONÁRIAS
Conforme disposto no art. 3º, inciso VI da Lei n º. 11.105 de 24 de março de
2005 consideram-se como células-tronco embrionárias, as células do embrião que
apresentam a capacidade de se transformar em células de qualquer tecido de um
organismo, sendo células humanas multiplicadas em laboratório em meio de culturas
especiais.
Ainda segundo Vieira (2006, p. 14), elas podem assim ser definidas:
[...] são células não especializadas, que se renovam através de divisão celular por longo período e que, portanto, podem significar a cura para diversas doenças e a própria vida para milhares de pessoas, já que, segundo os defensores de seu uso, é possível empregá-las como células substitutas de tecidos lesionados ou doentes, ou para suprir células que o organismo deixa de produzir devido a alguma deficiência.
As células-tronco embrionárias ainda possuem características peculiares,
uma vez que, podem ser utilizadas na regeneração de alguns tecidos e órgãos do
23
corpo humano, conforme divulgam os cientistas defensores do seu uso, bem como
para a cura de doenças, tidas até então como irreversíveis, a exemplo da doença de
Parkinson, que é degenerativa, ataca o sistema nervoso e, seus portadores têm em
geral tremores, lentidão de movimentos, rigidez muscular, desequilíbrio além de
alterações na fala e na escrita.
Quanto à sua utilização, diversos são os entendimentos sobre os riscos e
benefícios efetivos de tais células, bem como, existem plúrimas discussões acerca
dos limites éticos e legais que devem ser aplicados, vez que para o desenvolvimento
dessas pesquisas, utilizam-se embriões congelados, atendendo alguns critérios
objetivos, dispostos na Lei de Biossegurança.
4 COMO SÃO OBTIDAS AS CÉLULAS-TRONCO EMBRIONÁRIAS
Já foi dito que quando uma célula-tronco embrionária se divide, ela pode
formar qualquer um dos mais de 200 tipos diferentes de células no corpo humano,
além da capacidade de auto-renovação, ou seja, ela pode se reproduzir muitas
vezes.
As células-tronco embrionárias deverão ser extraídas do embrião antes do
inicio da diferenciação, fenômeno que ocorre por volta do sexto ou sétimo dia, ao fim
da primeira semana. Essa diferenciação celular consiste na etapa em que as células
começam a especializarem na formação dos diversos tecidos e órgãos.
Figura 2: Divisão celular: Formação do blastocisto, células-tronco embrionárias.
Fonte: CDCC/USP<http://www.cdcc.usp.br/ciencia/artigos/art_38/aprendendo.html>
24
O zigoto, as primeiras células do embrião e as células da massa celular
interna do blastocisto são todas totipotentes (Chikuchi, 2007).
No começo dos anos 80, cientistas aprenderam como extrair células-tronco
embrionárias de um rato e as desenvolveram em laboratório. Em 1998, eles
reproduziram as primeiras células-tronco humanas embrionárias. Os embriões
humanos que os cientistas conseguem para pesquisa podem ser feitos ou via
reprodução - fundindo esperma e óvulo, por clonagem, ou cultivo. Na primeira
modalidade de obtenção, os embriões são os fertilizados em clínicas e não utilizados
pelos casais que produzem inúmeros desses embriões em laboratórios, e que
apenas de um a três deles servirão para a implantação uterina.
Muitos dos embriões que não foram aproveitados na fecundação in vitro com
transferência de embriões para o útero estão sendo usados atualmente para
fornecer as células-tronco embrionárias. Os genitores podem doar os que sobram à
ciência, podendo ser objetos de estudo desde que seja atendido as exigências da
Lei da Biossegurança.
Outra maneira de criar embriões é pela técnica da clonagem terapêutica. Esta
técnica funde uma célula (de um paciente que precisa de terapia com células-tronco)
com um óvulo doador. O núcleo é removido do ovo e substituído pelo núcleo da
célula do paciente. Este ovo é estimulado a se dividir química ou eletricamente e o
embrião resultante carrega o material genético do paciente, o que reduz
significativamente os riscos de que seu corpo rejeite as células-tronco uma vez
implantadas. Na figura 3 é ilustrado o processo:
Figura 3: Clonagem Terapêutica
Fonte: HowStuffWorks< http://ciencia.hsw.uol.com.br/celulas-tronco.htm>
25
O cultivo de células de embriões humanos em laboratório funciona da
seguinte forma:
• As células-tronco são as células internas do blastocisto. Elas irão se
desenvolver em cada célula, tecido e órgão no corpo.
• Os cientistas removem as células-tronco dos blastocistos e as cultivam
(fazem-nas crescer em uma solução rica em nutrientes) numa placa de Petri
no laboratório.
• Após as células se copiarem várias vezes e se tornarem muito numerosas
para a placa de cultura, elas são removidas e coladas em várias outras
placas. Em alguns meses, várias células-tronco podem se transformar em
milhões de células-tronco.
26
Figura 4: Cultivo de células tronco embrionárias em laboratório
Fonte: Quadrante - Sociedade de Publicações Ciêntíficas http://www.quadrante.com.br/Pages/especiais031005.asp?id=168&categoria=Etica_Bioetica
É provável que os cientistas possam ate desenvolver órgãos inteiros em
laboratórios, desde que aprendam a direcionar a diferenciação das células-tronco.
Já há muitos anos trabalham em camundongos e aprenderam, a transformar as
células-tronco em células nervosas, produtoras de insulina, músculo cardíaco ou da
medula óssea entre outras. Quando essas células derivadas das embrionárias são
transplantadas em animais doentes, elas exercem um efeito terapêutico em modelos
27
de várias doenças, incluindo Parkinson, paralisia por trauma da medula espinhal,
diabetes e leucemia.
Com isso, a terapia com as células-tronco embrionárias já está comprovada
em animais, e por isso o enorme entusiasmo da comunidade cientifica em torná-las
uma realidade em seres humanos.
5 QUANTIDADE DE EMBRIÕES CONGELADOS NO BRASIL
A Lei de Biossegurança completou três anos de vigência em março de 2008,
e ainda não se sabe ao certo no país quantos embriões humanos existem
congelados nas clínicas e centros de reprodução assistida.
A quantidade já deveria estar sendo buscada há tempos, uma vez que cada
embrião deve ser codificado para acompanhamento, tendo em vista a venda
proibida. Além de tudo, a lei determina o tempo necessário para que sejam objetos
de pesquisa e terapia: três anos a partir da data de congelamento.
O que se tem até o presente momento, é que um único centro possui cerca
de 4.600(quatro mil e seiscentos) embriões congelados e fica na cidade de Ribeirão
Preto – SP, no Centro de Reprodução Humana Professor Franco Júnior, e que no
país, estima-se o total entre 6 a 10 mil embriões congelados.
Muitos especialistas acham que seriam necessários algumas centenas de
milhares de embriões para que fosse possível obter resultados terapêuticos
apreciáveis , pois um único tratamento exige vários milhões de células-tronco.
Por fim, o Brasil precisa ter rapidamente essa estatística em mãos, atualizada
e devidamente codificada, para que os nossos pesquisadores não tenham
prejudicados os trabalhos em face da inércia do poder público.
6 PESQUISA COM CÉLULAS-TRONCO NO MUNDO
28
É inquestionável o avanço das pesquisas em todo o mundo, questionando
cada legislação acerca de sua legalidade ou ilegalidade.
No continente americano, Brasil, EUA e México saíram na frente e legislaram
no sentido de que a prática se tornasse legal. O México é o único país latino-
americano além do Brasil que possui lei permitindo o uso de embriões, até mesmo a
criação de embriões para pesquisa.
Destaque também para a África do Sul, único país africano com legislação a
respeito, permitindo todas as pesquisas com embriões, inclusive a clonagem
terapêutica. Seguem a mesma linha China, Cingapura, Coréia do Sul, Israel, Japão,
Rússia e Reino Unido, essa uma das mais liberais de todas as legislações.
7 FERTILIZAÇÃO IN VITRO COMO TÉCNICA DE REPRODUÇÃO ASSISTIDA
A reprodução humana assistida surgiu com o propósito de solucionar os
problemas que os casais enfrentavam acerca da infertilidade, e a evolução das
ciências médicas, no decorrer dos anos, trouxe consigo algumas implicações,
notadamente quanto à figura do nascituro.
Quanto ao seu surgimento, ocorreu entre os anos de 1950 a 1975, onde
foram estudadas e intensificadas com óvulos humanos, principalmente nos Estados
Unidos, Suécia, Inglaterra e Austrália, formando embriões para sua posterior
implantação no útero.
No ano de 1978, nasceu o primeiro bebê de proveta, Louise Joy Brown, na
cidade de Oldham, na Inglaterra, fruto do trabalho dos pesquisadores Patrick
Steptoe e Robert Edward, concebida através dos gametas dos pais biológicos.
Esta técnica consiste em uma alternativa diante da impossibilidade da
procriação natural, utilizando-se desta para proporcionar a fecundação, de modo
que, sua pretensão é a de superar a infertilidade do casal que procura auxílio
médico a fim de gerar sua prole.
29
Acerca da concepção, “Rosenvald (2007, p. 131) observa que;” na fertilização
de proveta a concepção é laboratorial, realizada fora do corpo feminino, apenas
ocorrendo a implantação de embriões já fecundados”.
Este tipo de fertilização in vitro, é classificada como homóloga ou heteróloga,
uma vez que, aquela corresponde à inseminação em que são utilizados os gametas
do próprio casal, com a sua expressa anuência, e é utilizada em casos de hipo-
fertilidade, caracterizada pela incapacidade relativa de conceber. Venosa (2005, p.
259) “[...] pressupõe que a mulher seja casada ou mantenha união estável e que o
sêmen provenha do marido ou companheiro”.
Já na fertilização in vitro heteróloga, o sêmen é de uma terceira pessoa,
sempre gratuitamente, situação em que, é realizada a fecundação em laboratório,
para depois haver a implantação no corpo da mulher, com autorização expressa e
escrita do marido ou companheiro. (Rosenvald, 2007).
8 PESQUISAS COM CÉLULAS-TRONCO EMBRIONÁRIAS PARA FI NS TERAPÊUTICOS
Quando da utilização destas células para fins terapêuticos, a sua obtenção
se dá através da clonagem terapêutica, de embriões descartados em clínicas de
fertilização por apresentarem poucas chances de gerar uma vida ou terem sido
congelados há muito tempo.
O embrião que se encontra ainda em desenvolvimento, possui as células-
tronco, que, por conseguinte, dá origem aos diversos tipos de células que formam os
órgãos do embrião, tais como pulmões, coração, pele, cérebro, dentre outros
órgãos.
As células-tronco embrionárias surgem do estágio do blastocisto quando da
formação do embrião. Desde a embriogênese, segundo Vieira (2006, p. 14) “verifica-
se a presença das células-tronco cuja origem remonta ao início do desenvolvimento,
antes da implantação do embrião na parede uterina”, ressaltando que, a massa
celular do blastocisto é que originará as células do embrião, que são totipotentes,
apresentando grande potencial de diferenciação, observando que o seu emprego
30
terapêutico ainda apresenta riscos, e, segundo alguns pesquisadores é latente a alta
propensão à formação de tumores e a rejeição pelo sistema imunológico do
organismo transplantado.
Diante desta realidade, acerca dos embriões humanos, no que tange ao
desenvolvimento da medicina, bem como da biotecnologia, Conti (2004, p. 161)
indaga:
[...] o que fazer em relação ao embrião humano? Como protegê-lo? Como
devemos nos comportar em relação a eles? Como definir, neste terreno, os
limites entre justo, injusto, entre o bem e o mal? Questões graves. Questões
difíceis porque, como se sabe, as respostas apresentadas dependerão
diretamente das posições que adotarmos em relação ao estatuto do
embrião humano. Ou melhor, revelar-se-ão como conseqüência natural das
posturas inicialmente assumidas.
O estabelecimento de critérios legais e limites objetivos às pesquisas médicas
e biotecnológicas, em relação aos embriões humanos, dada à complexidade das
questões atinentes e, sobretudo por ser de grande relevância devem ser sempre
fundados sob a édige da moral, ética e princípios basilares que norteiam estas
práticas.
Quanto ao estatuto do embrião, três posições se divergem: para uma
primeira corrente, denominada concepcionista, este deve ser considerado como
pessoa humana, desde quando ocorreu a concepção, sendo então pessoa humana
inteira, sem diferenças quanto aos outros membros da coletividade. Alguns
doutrinadores são adeptos a este pensamento, dentre eles se destacam Francisco
dos Santos Amaral Neto, Ives Gandra, Pontes de Miranda, André Franco Montoro,
seguindo o que dispõe o Código Civil/2002, no seu art. 2º.
Existe também uma segunda corrente, que é denominada genético-
desenvolvimentista, que segundo Conti (2004 apud Leite 1996, p. 23):
[...] para a teoria genético-desenvolvimentista, o ser humano passa por uma
série de fases: pré-embrião, embrião e feto. O embrião humano, ao menos
nos primeiros tempos de sua existência não pode ser reconhecido como
uma pessoa humana, mas sim, um mero ‘amontoado de células’; células
humanas, certamente, mas como são igualmente humanas as células do
31
sangue ou os gametas elaborados pelo organismo humano, uma espécie de
material biológico, ainda informe. Os defensores desta teoria visualizam no
embrião um ‘antes’ e um ‘depois’ na aquisição da dignidade humana, o que
é difícil de aceitar no mundo jurídico.
Esta corrente é aceita por alguns médicos e adotada no relatório Warnock1,
na Grã-Bretanha, relatório este que considera o embrião, aquele ser que se
desenvolve da data em que ocorreu a fecundação até o 14º dia, podendo então ser
utilizado até antes desta data como sujeito de pesquisa, uma vez que, o sistema
nervoso ainda não está elaborado, e sua utilização deve acontecer somente sob
autorização e vigilância de um organismo de controle criado pelo legislador.
A terceira corrente, o considera como potencialidade de pessoa, um ser
humano ainda em potencial.
Ao serem realizadas, estas pesquisas esbarram inevitavelmente em direitos
que tem o nascituro, constitucionalmente garantidos, merecendo assim a tutela
jurisdicional, por ser uma pessoa plenamente desenvolvida.
_____________ 1 WARNOCK, Mary. Relatório Warnock sobre Fertilização e Embriologia Humana. Reino Unido: 1980.
32
9 ÉTICA E MORAL
Para bem entender o que é ética, necessário se faz citar alguns conceitos
clássicos desse ramo da filosofia, bem como recordar a origem do termo. Usadas
muitas vezes com o mesmo significado, as palavras ética e moral têm a mesma
origem etimológica: A palavra grega ethos e a palavra latina mos ou mores, ambas
significando hábitos e costumes.
A moral, como sinônimo de ética, pode ser definida como sendo um conjunto
de normas que, em determinado meio, promove a aprovação de comportamentos
humanos; enquanto a ética, como expressão única do pensamento correto, pode ser
definida como instrumento que conduz à idéia de universalidade moral, ou seja, uma
forma ideal de comportamento humano (Chauí, 1999).
Segundo Coutinho (2003) pode-se definir ética como sendo: “[...] a parte da
filosofia que estuda a moralidade dos atos humanos, enquanto livres e ordenados a
seu fim último”.
Ressalte-se que a ética, enquanto ramo do conhecimento tem por objetivo o
comportamento humano no interior de cada sociedade no decorrer do tempo
histórico, podendo e devendo mudar de acordo com cada momento, com cada
realidade. Neste sentido, o desenvolvimento científico se constitui como sendo um
dos motivos de quebra de paradigmas mais comuns, mudando no decorrer dos
tempos normas e conceitos éticos e morais que outrora pareciam ser ultra-
temporais.
Neste sentido, podemos dizer que não existe um conceito único para se
definir ética e moral aceito por todos que se dedicam ao estudo, mas sim, vários
entendimentos sobre seus significados. A ética quando observada por sua origem
semântica, se equivale a moral, enquanto o termo moral deriva-se do latim “mos” ou
“mores”, que pode ser definida como bons costumes (Carvalho, 2001).
Atualmente distingue-se ética de moral considerando-se que moral seja um
conjunto de princípios, valores e normas que regulam a conduta humana em suas
relações sociais, existente em determinado momento histórico. Moral fala
principalmente do coletivo e, na sociedade contemporânea, coexistem, em um
mesmo momento histórico ou contexto social, diferentes morais, fundadas em
33
valores e princípios diferenciados. Nesta pluralidade moral, a ética evidencia-se
como sendo opção individual, escolha consciente, adesão íntima e convicta de uma
pessoa a valores, princípios e normas morais que norteiam seus atos enquanto
sujeito coletivo (Séguin, 2001).
Paulo Antônio de Carvalho, em seu Ética e Saúde (1998, p. 26) conceitua
ética enquanto disciplina como sendo:
“reflexão crítica sobre o comportamento humano, reflexão que interpreta,
discute e problematiza, investiga os valores, princípios e o comportamento
moral à procura do “bom”, da “boa vida”, do “bem estar”da vida em
sociedade” a tarefa da ética é a procura e o estabelecimento de razões que
justificam o que “deve ser feito” e não “o que pode ser feito”. É a procura
das razões de fazer ou deixar de fazer algo, de aprovar ou desaprovar algo,
do que é bom e do que é mau, do justo e do injusto. Fala de motivação,
resultados, ações, ideais, valores, princípios e objetivos. A ética pode ser
considerada como uma questão de indagações e não de normatização do
que é certo e do que é errado”.
Assim, neste trabalho de conclusão de curso, ética e moral serão tratadas
com um mesmo sentido, substancialmente idênticos, ou seja, como ciência prática
que tende a procurar pura e simplesmente o bem do homem.
10 REFLEXÕES ÉTICAS E MORAIS NA TERAPIA DE CÉLULAS TRONCO-EMBRIONÁRIAS HUMANAS.
Desde que o homem tocou a natureza, assumiu a obrigação de geri-la sem
provocar catástrofes. E isso não é o que estamos vendo até então. Basta, para
tanto, nos lembrarmos do efeito estufa e suas conseqüências tão presentes em
nosso dia-a-dia. Com a finalidade de prevenir igual desastre em questões que lidam
diretamente com a vida, faz-se necessário a criação de padrões éticos e morais
estabelecidos rigidamente através de leis no intuito de coibir desvios e abusos no
trato com a vida humana. Assim criam-se balizamentos éticos para esses
desenvolvimentos cuja ciência auto titulou de Bioética; expressão surgida pela
34
primeira vez no título da obra de Van Rens Sealer Potter (Bioethics: bridge to future,
1971) considerando essa nova vertente da ciência como sendo a ciência da
sobrevivência.
Neste contexto, as terapias com células-tronco de embriões humanos estão
inseridas de forma completa e a discussão ética e moral são tão necessárias quanto
à própria existência dos conhecimentos envolvidos na matéria.
No entanto, a tônica do mundo moderno muitas vezes nos leva para
caminhos distantes dos valores éticos e morais. Falar de ética e moral em um
mundo que muitas vezes nos apresenta situações que geram individualismos,
competição, consumismo e poder, nem sempre nos parece simples. Um mundo
onde o “ter” parece sempre valer mais que o “ser”. Um mundo onde o lucro é sempre
o objetivo maior e principal. Um mundo onde o outro está sempre em segundo plano
e sentimentos e posturas como solidariedade, respeito, justiça, igualdade,
responsabilidade, legalidade nem sempre são considerados “gêneros” de primeira
necessidade pela sociedade moderna de forma geral. No entanto, é justamente
nesses momentos que falar de ética e moral se faz necessário.
Com o avanço natural da humanidade e os fantásticos índices de
desenvolvimento técnico-científico, nas mais diversas áreas da ciência, em particular
na área da medicina e saúde, as questões éticas e morais se apresentam de forma
importante se configurando, muitas vezes, de muita relevância e emergência.
Parece-nos, pelo menos em primeira instância ser o caso das terapias feitas com
células tronco-embrionárias de embriões humanos que tem como principal fonte de
matéria prima embriões excedentes das tentativas de reprodução “in vitro” de
clínicas espalhadas pelo mundo inteiro, em particular, e de nosso interesse, pelo
Brasil.
Questionamentos como: Teria o embrião direito à vida? Usar esses embriões
é o mesmo que usar seres humanos em experiências? Quando começa a vida?
Estaremos brincando com a vida humana ao usar esses embriões nas experiências
científicas em busca de soluções para doenças hoje consideradas incuráveis? Matar
um animal selvagem é crime previsto em lei, e usar embriões humanos em
experiências não seria igualmente considerado crime? Seria necessário uma
autorização especial do casal que originou o embrião excedente para seu uso em
experiências? O uso desses embriões não equivaleria, em tese, a um tipo de aborto
já que são embriões com grande potencial de desenvolvimento? Deixar “guardados”
35
esses embriões até que se tornem inviáveis também não equivaleria a um tipo de
aborto já que podem ser usados na provável cura de doenças gerando esperança e
vida para muitos? Os objetivos justificam os meios já que o uso destes embriões tem
potencial de diminuir o sofrimento de milhões de pessoas ao redor do mundo
gerando vida em qualidade e quantidade?
Questões polêmicas como essas, estão sendo debatidas cotidianamente por
religiosos, filósofos, juristas, sociólogos, profissionais da saúde de diversas áreas
como psicólogos, geneticistas, ginecologistas, etc. com o objetivo principal de
construir um parâmetro ético e moral que atenda as expectativas da sociedade como
um todo.
O julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN Nº3510) que
requeria a inconstitucionalidade da Lei n º. 11.105, de 24 de março de 2005, mais
conhecida como Lei de Biossegurança, pelo Supremo Tribunal Federal (STF) o qual
autorizou o uso das células tronco-embrionárias para fins de terapia e pesquisa,
dando por improcedente o pedido do então Procurador Geral da República deu “um
ponta-pé” inicial definitivo ao processo de discussão e construção de limites éticos,
morais e legais para todas as questões que envolvem o uso de tais técnicas, já que
ficou autorizado em território brasileiro o uso de células-tronco para fins de terapias
e pesquisas. Necessário agora se faz desenvolvermos leis mais claras e firmes no
sentido de dirimir eventuais dúvidas e restrições feitas por alguns dos julgadores da
(ADIN) Ação Direta de Inconstitucionalidade, apresentadas por ocasião do
julgamento.
11 O PERIGO DO USO DO EMBRIÃO HUMANO COMO OBJETO DE VALOR COMERCIAL.
É salutar constatar como a humanidade estremece quando se mexe com a
vida humana e desperta para a importância de se criar critérios éticos e morais no
sentido de colocar a ciência a serviço da vida e da dignidade humana. O avanço da
biogenética urge que seja acompanhado por avanços proporcionais da bioética e
36
parece unânime a advertência de cuidados redobrados para a aplicação desses
avanços em organismos humanos.
Uma preocupação constante que envolve todo e qualquer desenvolvimento
científico é saber o quanto tal desenvolvimento adquire valor comercial. No horizonte
das pesquisas e terapias com células-tronco essa preocupação parece evidente e se
apresenta de forma especial, pois, ao ser humano é reconhecida uma dignidade
inviolável, indisponível a qualquer tipo de redução ao estado de coisa. Essa é uma
conquista da civilização e seria muito grave retornar aos tempos nos quais, nem
todos os seres humanos eram considerados pessoas, podendo ser comprados,
vendidos e tratados como simples objetos ou animais de valor comercial.
Mediante a existência de conflitos de interesses econômico-financeiros
gigantescos de um lado, representado por investidores sedentos de lucros
financeiros, e por outro, a necessidade urgente de se impor limites ético-morais a
uma atividade que vai lidar diretamente com a vida e dignidade humanas o risco de
se comercializar embriões, ou mesmo células devidamente preparadas é eminente,
pois, seria extremamente fácil atribuir valor financeiro ao embrião, já que, este seria
o resultado de investimentos altíssimos e encontraria facilmente um mercado ávido
por utilizar tais recursos. Para Adam Smith, em sua obra Riqueza das Nações
editada em 1776 esclarece [...] “economicamente falando, para que algo adquira
valor econômico, dois pressupostos são necessários: que a coisa ou serviço tenha
utilidade e que alguém tenha necessidade de uso desse objeto ou serviço” [...], e
isso, não é difícil imaginar, pois, cada vez mais, a imprensa internacional veicula
notícias sobre compra e venda de órgãos humanos para fins de transplantes, e
sobre crianças raptadas e assassinadas para retirar partes dos seus corpos com o
mesmo objetivo. Geralmente, trata-se apenas de notícias sensacionalistas e pouco
documentadas, que assustam e que, paradoxalmente, ofuscam fatos realmente
ocorridos.
Assim, balizamentos éticos devem ser desenvolvidos, a fim de delimitar a
ação de investidores com objetivo único de lucros gigantescos; por outro lado, ao
mesmo tempo, não impor tamanhas limitações capazes de inibir todo e qualquer tipo
de investimento nesta área por parte da iniciativa privada paralisando as pesquisas
devido a não expectativa de retorno financeiro para investidores, pois, sabe-se a
importância da iniciativa privada quando se trata de investimentos em pesquisas.
37
Recursos oriundos somente do setor público seriam insuficientes no
desenvolvimento tecnológico em todo e qualquer seguimento.
12 OPORTUNISMO COMERCIAL E FALSAS ESPERANÇAS
As pesquisas com células-tronco estão sendo veiculadas na grande mídia ao
redor de todo mundo, muitas vezes de forma sensacionalista devido principalmente,
por um lado ao seu grande potencial de cura a elas atribuído pelos cientistas que
com elas estão trabalhando, e por outro lado, ao grande interesse da população em
geral que deposita nesta técnica as esperanças de uma vida melhor e mais longa.
Estudos realizados com animais divulgados por canais nem sempre
especializados, como também, pela mídia televisada, e, mais recentemente pela
internet, proporciona aos interessados no assunto, pacientes e seus familiares,
acesso amplo e fácil a informações sobre linhas de pesquisas, mas, nem sempre
garantindo um bom nível de segurança e isenção, muito menos pautadas em
resultados cientificamente comprovados o que na maioria das vezes geram
otimismos exacerbados e falsas expectativas por resultados que não podem ainda
ser apoderados pela população em geral.
Assim, as pesquisas com células-tronco embrionárias tornaram-se uma das
maiores controvérsias éticas, morais e políticas da atualidade gerando debates
calóricos principalmente sobre seus possíveis meios de obtenção e usos
terapêuticos.
Já existem trabalhos publicados envolvendo tratamento de doença de
Parkinson, diabetes, distúrbios circulatórios, doenças cardiovasculares e
neuromusculares, entre outras; Seus resultados, porém, ainda carecem de melhores
bases científicas e muito ainda falta para liberação e utilização rotineira e prática do
método terapêutico em questão. É verdade, que essas pesquisas poderão propor
novas opções terapêuticas para várias doenças. No entanto, a ampla divulgação e
ênfase com conotação sensacionalista com o objetivo primordial de aumentar os
níveis de audiência - mídia televisada – e de tiragem – mídia escrita - que os meios
de comunicação social estão dando ao assunto só servem para gerar grande, falsa,
38
e perversa expectativa nos milhares de pacientes e de seus familiares, que
desesperados e fragilizados, acreditam na cura, em curto prazo de diversas
patologias crônicas até hoje sem solução para as ciências médicas. Mais grave
ainda, é a constatação diária que tais idéias falsas tenham contaminado também a
mente de alguns profissionais da aérea da saúde, que, sabe-se lá o motivo,
(ignorância ou “esperteza”) passaram a transmitir aos seus pacientes, a
possibilidade de cura de moléstias até então, sem tratamento na atualidade.
Essa realidade vem gerando grandes preocupações por parte das
autoridades competentes, em particular, às Associações Médicas e Conselhos
Federais das diversas profissões da área da saúde no sentido de orientar os
profissionais, fiscalizá-los, prevenir e coibir eventuais abusos por parte de seus
filiados menos desavisados que podem, em tese, tirar proveito e vantagens
financeiras de situações que o dever de ofício manda que o profissional gere um
ambiente de proteção para o cliente e jamais situações de exploração.
É perfeitamente claro que avanços da área da biogenética são efetivamente
grandes e prometem progressos consideráveis já nessas próximas décadas. Porém,
necessário se faz esclarecer que tais pesquisas ainda se encontram em estágios
iniciais e ainda temos longos caminhos a percorrer não se podendo precisar quais
serão exatamente os benefícios trazidos ao ser humano. O que se tem hoje volta-se
a repetir: é uma ampla quantidade de informação que a mídia expõe ao público de
forma obscura e sensacionalista sem especificar o que realmente significa cada
coisa e cada estágio de desenvolvimento científico carecendo muitas vezes de uma
revisão e censura ética por parte dos órgãos de imprensa no sentido de evitar falsas
expectativas a fim de não provocar nos telespectadores e leitores, em particular
àqueles mais fragilizados psicologicamente por situações de doenças em si próprios
ou em algum ente querido, pseudo-esperanças, pois, o que se busca nas pesquisas
com células-tronco, não são milagres mas sobretudo, terapias seguras e
consistentes. Os benefícios trazidos ao ser humano, de acordo com o que indicam
as experiências já realizadas serão muitos, mas, ainda não é possível a aplicação
imediata o que provavelmente acontecerá nas próximas décadas. (Fortes, 1998)
Assim, as pessoas devem ser conscientizadas de que as pesquisas se
destinam a um futuro, talvez nem tão distante, porém não imediato. Por enquanto,
ainda sobram esperanças e faltam resultados concretos. As pesquisas continuam
39
em torno de todo o mundo e talvez num futuro próximo, poderemos usufruir, na
prática, dos benefícios das terapias com células-tronco.
13 AS RELIGIÕES E A TERAPIA COM CÉLULAS TRONCO-EMBR IONÁRIAS HUMANAS
De onde viemos? Para onde vamos? O que é bom? O que é mal? Quais os
limites entre o bem e o mal? Onde e quando começa a vida? Existe vida após a
morte? Aborto é assassinato? Pesquisar células-tronco é brincar com pequenos
seres humanos? Manipular embriões é crime? Questões filosóficas como essas
existem desde que o homem, em sua trajetória de evolução, se deu conta de sua
própria existência e ao invés de se tornarem simples com o passar do tempo, vão se
complicando ainda mais com o avanço da ciência, principalmente, quando esta
trabalha com questões que envolvem diretamente a vida humana. No intuito de
responder questionamentos como esses que à primeira vista parecem simples, o
homem se vale de experiências filosóficas, já que é impossível sua comprovação de
forma empírica, o que gera na maioria das vezes mais polêmica, pois muitas
definições são influenciadas por religiões que tendem a definir tais questões
alicerçadas em parâmetros apenas filosóficos.
Com relação ao início da vida, por exemplo, temos as definições científicas e
as definições religiosas, e, nem uma, nem outra foi capaz de determinar com
tranqüilidade e precisão o início da vida humana. Para a ciência existem pelo menos
cinco marcos iniciais que podem ser adotados, denominados de: Visão genética;
Visão embriológica; Visão neurológica; Visão ecológica; Visão metabólica. Vejamos:
1) Visão genética: Para essa definição a vida começa na fecundação; quando
espermatozóide e óvulo se encontram e combinam seus genes para formar um
indivíduo com um conjunto genético único. 2) Visão embriológica: Essa corrente
defende que a vida começa na terceira semana de gravidez, quando é estabelecida
a individualidade humana. Isso porque até o 12° dia após a fecundação o embrião é
capaz de se dividir dando origem a duas ou mais pessoas. 3) Visão Neurológica:
Neste princípio adota-se a mesma postura para se definir tanto o início da vida como
também seu marco final, ou seja, se a vida termina com o final da atividade
40
neurológica, seu marco inicial também pode ser definido no momento do início
dessa atividade. O ponto negativo nessa definição é que não existe consenso
médico para o início dessa atividade. 4) Visão ecológica: Essa definição defende a
tese na qual o início da vida se dá quando o feto adquire a capacidade de se manter
vivo fora do útero o que acontece em média a partir da 20ª semana até a 24ª
semana quando os pulmões já estão formados e com condições fisiológicas de
funcionamento. 5) Visão metabólica: Essa definição afirma que a discussão sobre o
início da vida é irrelevante, uma vez que não existe um momento único em que se
pode determinar o início da vida já que o ser humano é um conjunto de sistemas
biológicos interdependentes que começa com a fecundação e termina depois da
puberdade por volta dos 19º ano de vida do ser humano.
No âmbito da religião a definição do marco inicial da vida se faz tão complexo
quanto no âmbito científico. As cinco principais religiões dominantes no mundo não
conseguem chegar a um consenso e cada uma delas adota uma postura. Para o
Catolicismo, a vida começa na concepção, ou seja, no encontro do óvulo com o
espermatozóide seja nas trompas da mulher, ou em provetas de laboratórios de
fertilização “in vitro”. Este posicionamento adotado pela Igreja católica para
determinar o início da vida se constitui o principal argumento usado pela igreja para
posicionar-se terminantemente contra o uso de células tronco embrionárias em
terapia e pesquisas.
Neste sentido, o Vaticano pronunciou-se a respeito do tema na “Declaração
sobre a produção e o uso científico de Células-tronco Embrionárias” da Academia
Pontificial para a Vida, em agosto de 2001 da seguinte forma:
“Nenhum fim, crido como sendo bom, tal como o uso de células-tronco [embrionárias] para a preparação de outras células diferenciadas a serem usadas naquilo que parecem ser procedimentos terapêuticos prometedores pode justificar a destruição de vida embrionária. Um fim bom, não faz reta uma ação que em si mesma é má”(Academia Pontificial para a Vida ,2001).
A Igreja Católica fundamenta-se na chamada ética consistente com a vida,
que é baseada no profundo respeito pela vida humana em todas as suas formas e
condições. Assim, para a igreja católica é necessário proteger a vida a começar do
mais fraco entre os homens, ou seja, o feto, ainda que seja em sua forma mais
primitiva e frágil. Neste contexto, entende-se que a pesquisa com células tronco-
41
embrionárias embora reconhecidamente, traga benefícios a muitos da sociedade,
isso se daria pela destruição das formas mais vulneráveis de vida humana, ou seja,
o feto ainda em fase embrionária, carente de proteção por parte de todos e do
Estado. No entanto, o posicionamento da Igreja Católica, não é propriamente exato,
pois ela não declara necessariamente que a vida humana começa com a fertilização,
evitando sempre, em seus documentos oficiais, expressar com todas as letras essa
postura, mas ensina, tão somente, que a vida humana precisa ser respeitada a partir
da fertilização.
Neste sentido, o saudoso Papa João Paulo II, comentou em sua Encíclica
Evangelium Vitae (1995):
[...] O que está em risco é tão importante que, a partir da posição de obrigação moral, a mera probabilidade de que uma pessoa humana esteja envolvida seria suficiente para justificar uma proibição absolutamente clara de qualquer intervenção que almejar o matar um embrião humano. Precisamente por essa razão, além de todos os debates científicos e afirmações filosóficas aos quais o Magistério não se comprometeu, a Igreja sempre ensinava e continua a ensinar que o resultado da procriação humana, a partir do primeiro momento da sua existência, deve estar garantido aquele respeito incondicional, o qual moralmente se deve ao ser humano na sua totalidade e unidade como corpo e espírito(João Paulo II, Papa.1995).
Assim, a Igreja Católica posiciona no sentido de que qualquer benefício
futuro, não justificaria a destruição de embriões e consequentemente, usar ou
experimentar algo relacionado com as pesquisas já existentes de células-tronco
embrionárias também seria imoral além de servir como instrumento de
encorajamento indireto para tais pesquisas( Mussi ,2004).
Para o Judaísmo, a vida começa apenas a partir do 40º dia da fecundação
quando se sabe que o feto começa a tomar forma (aspecto) humana. Antes disso, a
interrupção da gravidez não se constitui ato contrário à religião judaica o que faz
com que o judaísmo permita o uso de células tronco embrionária para fins
terapêuticos e de pesquisa.
A bioética judaica é a mais condescendente. Ela tende a permitir, por
exemplo, que todas as formas de biotecnologia reprodutiva, para o objetivo de
procriação, incluindo clonagem humana reprodutiva, impondo somente uma
condição para pesquisas e terapias. Para tanto, tem que existir normas de
segurança comprovadas tanto para as mães como para o feto.
42
Assim, os judeus, têm se mostrado favoráveis às pesquisas com células
tronco-embrionárias obtidas tanto por clonagem humana ou excedentes de terapias
reprodutivas, ou seja, embriões excedentes das tentativas de fertilização “in vitro”. O
consenso é considerar que tais terapias, além de permissíveis, deveriam ser
obrigatórias para os embriões descartáveis já que têm potencial terapêutico podendo
gerar uma vida melhor para muitos na sociedade. Esse posicionamento decorre do
preceito divino existente na tradição judaica de manter a saúde a qualquer custo, o
que implicaria no dever de usar todos os métodos disponíveis e adequados, naturais
ou artificiais, para se alcançar esse objetivo. Alguns posicionamentos da tradição
judaica são no sentido de que o feto torna-se pessoa humana após o quadragésimo
dia após a fecundação, como já foi colocado acima, sendo que a partir dessa data o
feto torna-se sujeito de plenos direitos.
Outra corrente defende a tese de que o feto só adquire personalidade civil e
jurídica, após deixar o corpo da mãe com seu nascimento, sendo que até então ele,
o feto, não se constitui indivíduo detentor de caráter ou personalidade. Porém, é
unânime o entendimento de que o embrião in vitro é considerado uma forma de vida
humana, mas não uma pessoa detentora de direitos legais e objeto de proteção de
Estado (Germanne, 2004).
Portanto, para os bioéticos judaicos, proibir essas pesquisas seria muito mais
imoral que deixá-los ficar inviáveis em laboratórios para qualquer fim.
O Islamismo adota como marco inicial da vida a partir do 120º dia após a
fecundação, dia em que se acredita que ALÁ sopra a alma do indivíduo conferindo o
dom da vida ao feto. Assim, para o Islã, é permitido o uso de células tronco, já que
ainda não se trata de um indivíduo possuidor de vida (Soares, 2001).
No Budismo não há consenso sobre o uso células tronco, pois para eles a
vida é um processo contínuo e ininterrupto. A vida não começa nem mesmo na
fecundação, mas está presente em tudo que existe e não tem começo nem fim
(Soares 2001).
O Hinduísmo adota uma postura muito próxima a da igreja católica já que
acredita que a vida começa com a fecundação. E como o embrião é possuidor de
alma, também é possuidor de direito à vida, não podendo ser usado para fins de
pesquisa e terapias (Soares, 2001).
43
14 ASPECTOS LEGAIS SOBRE A TERAPIA E PESQUISAS COM CÉLULAS TRONCO-EMBRIONÁRIAS
É notório que, os avanços ocorridos nas mais diversas áreas do
conhecimento, no que tange às pesquisas científicas, notadamente em relação às
genéticas, têm ocorrido muito velozmente, justificados pela modernização dos
métodos de pesquisas, melhor aparelhamento e diversidade de recursos,
investimentos por parte da comunidade científica em um ramo da ciência que,
estuda as informações contidas nos genes, dentre outros temas correlacionados,
tudo isso, justificado na possível cura de doenças genéticas, degenerativas ou
causadas por acidentes como, por exemplo, lesões de medula as quais geralmente
deixam o paciente com lesões físicas permanentes.
Em face dos avanços científicos e tecnológicos, os fatos vão surgindo e,
exigem do Direito uma resposta e consequentemente uma regulamentação que, por
conseguinte, gerará o estabelecimento de limites e critérios que serão aplicados a
cada caso concreto.
Outrossim, o Direito deve ser principio lógico e construído no caso concreto,
não podendo ignorar as novas descobertas no campo científico, que geram
obrigatoriamente reflexões filosóficas seja no campo da ética da moral e do próprio
Direito, fazendo com que muitas vezes teorias conservadoras, enraizadas e bem
construídas sirvam de subterfúgio para aqueles que excluem essas questões dos
debates.
A proposta deste capítulo é a de refletir sobre as questões inerentes às áreas
de interesse quando se trabalhar com células tronco-embrionárias, já que envolve
questões multidisciplinares, em especial aos profissionais da área da saúde e do
direito refletindo sobre os direitos do embrião (nascituro) e a forma desses direitos
serem respeitados ao se realizarem pesquisas com células tronco-embrionárias,
notadamente o direito à vida e personalidade civil, direitos estes garantidos na
Constituição Brasileira de 1988, em especial, no caput do art. 5º e no art. 2º do
Código Civil Brasileiro (CCB), respectivamente versos o interesse e a necessidade
daqueles que necessitam e esperam ansiosamente por uma oportunidade de cura e
aumento tanto na quantidade quanto na qualidade de suas vidas (CCB. Lei nº.
10.406 de 10 de Janeiro de 2002)
44
Contudo, para que esses direitos possam ser garantidos, algumas questões
polêmicas, dentre as quais o momento em que começa a vida, são emergentes e
merecem um estudo aprofundado, sob a ótica da Bioética, do Direito e, sobretudo,
numa atitude multidisciplinar.
Nesse contexto, emergem discussões éticas relacionadas com essas
pesquisas genéticas, especialmente quanto à utilização de células tronco-
embrionárias, os direitos do nascituro ao se realizarem tais pesquisas, os limites
legais, éticos e morais impostos à ciência na manipulação dos embriões excedentes.
É importante considerar que não é objetivo deste capítulo, esgotar as
discussões acerca do assunto a ser tratado, mas secundariamente, objetiva
fomentá-las, por serem contemporâneas e importantes na aplicação do Direito,
sempre pautadas sobre o crivo da ética e da melhor forma de se utilizarem as novas
tecnologias.
15 BIOÉTICA
Inicialmente ao se tratar deste ramo da ética aplicada às condutas humanas,
aos resultados que delas advém e, da tecnologia que, vigora no mundo moderno, é
importante salientar que é uma disciplina, é também considerada ciência, pois tem
objeto próprio e método de estudo e, por conseguinte gera um interesse público e
tem amparo legal.
Pode ser definida como sendo um ramo da investigação filosófica, dada à
necessidade de se tratar de um modo mais adequado e sistematizado os diversos
problemas gerados no bojo do progresso da tecnologia científica, tem a ver com a
vida em geral e com os perigos que ela se expõe em decorrência das manipulações
que são feitas pelo homem.
A Bioética surgiu no mundo ocidental, no século XVIII, de etimologia bio –
vida, ética – ethos, que significa morada do ser, é realizada por meio de uma atitude
interdisciplinar.
45
Ressalte-se que “[...] a Bioética nasceu de uma necessidade humana de se
reafirmar perante o avanço incessante da ciência e da tecnologia, que ultrapassam o
limite tolerável da mínima moralidade humana”. (Fernandes, 2004, p. 148).
Por ser um ramo do conhecimento multidisciplinar, o fundamento é a pessoa,
de forma que, estabelece-se uma relação ética, e, ao tratar notadamente da vida,
este ramo encontra no Direito um instrumento de efetivação, pois, não busca
somente a garantia da vida, mas também algo que a acompanha, a dignidade, que
tem no Direito uma concretização, existindo limites para que se possa haver uma
distinção entre o que é lícito do que é ilícito.
A Bioética conjuntamente com o Direito buscam um ponto de equilíbrio entre
o progresso trazido, por novas técnicas, experiências no campo da genética e os
benefícios que são anunciados, ou até mesmo alcançados com esse progresso.
15.1 PRINCÍPIOS DA BIOÉTICA
Como ciência, possui princípios basilares que a fundamentam, serve de
parâmetros ao se analisar o caso concreto e, dentre esses princípios, três serão
objeto do presente trabalho, a saber: princípio da justiça, princípio da autonomia e
princípio da beneficência.
15.1.1 Princípio da justiça
Este princípio se baseia na imparcialidade na distribuição dos riscos e
benefícios, que repercute diretamente nas desigualdades sociais.
A teoria da justiça mais divulgada na atualidade é a justiça como equidade,
baseando-se numa estrutura de sociedade que seria regida por princípios que, todos
poderiam querer e com imparcialidade, todos estariam dispostos a aderir.
Refere-se à obrigação de igualdade de tratamento e, em relação ao Estado,
de justa distribuição das verbas para a saúde, para as pesquisas, dentre outras. Não
46
é um tratamento igual dispensado a todos do mesmo modo, uma vez que são
diferentes as situações clínicas e sociais, deveria comportar, todavia, a adesão a
alguns objetivos como, por exemplo, o valor da vida e o respeito a uma
proporcionalidade das intervenções.
15.1.2 Princípio da autonomia
Existe uma determinação que, o respeito pelas pessoas incorpora ao menos
duas convicções éticas: a primeira, diz respeito ao tratamento do ser humano como
ente autônomo e a segunda, refere-se às pessoas cuja autonomia está diminuída,
devem ser objeto de proteção.
Segundo Carvalho (2001, p. 132) o princípio da autonomia:
[...] se inscreve na tradição da cultura moderna, estando associado à relevância que o sujeito assume na modernidade, às reivindicações de liberdade de pensamento, à confiança no poder e razão como instância de crítica dos dogmas religiosos e da tradição. A autonomia está vinculada não só a aspiração de apreensão racional do mundo, mas também à pretensão de dominá-lo e subordiná-lo às necessidades e finalidades humanas.
O seu pressuposto básico a autodeterminação, inclusive auto-governo,
representando respeito à capacidade que tem a pessoa de se governar, escolher,
dividir, avaliar, sem que estivessem presentes restrições externas ou internas.
15.1.3 Princípio da beneficência
Este princípio se justifica nas preocupações morais de procurar os bens e
evitar os prejuízos, e encontrará sua essência, seu conteúdo, em uma comunidade
moral, sobretudo particular em que, há uma visão comum de ordenação de bens e
prejuízos.
47
Pode ser conceituado, segundo Séguin (2001, p. 40-41) como um princípio
que “[...] remonta à antiguidade clássica com o juramento hipocrático, o qual enfatiza
a necessidade de não provocar danos, maximizar os benefícios e minimizar os
riscos possíveis, buscando o bem-estar dos enfermos”.
Quanto à sua aplicação, àqueles que trabalham no campo da saúde, a
exemplo de médicos e enfermeiros, impõe-se uma atitude negativa, a de não fazer
experiências ou mesmo tratar seus pacientes sem a devida permissão, surgindo
com isso um conflito entre fazer o bem e respeitar o paciente naquilo que ele quer.
16 BIODIREITO
O Biodireito já se impõe hoje como um dos mais recentes ramos do Direito
que, tem como objeto as normas que regulamentam a conduta humana, face às
novidades da medicina e da biotecnologia.
Assim pode ser compreendido como sendo o conjunto de normas esparsas
que tem por objeto regular as atividades e relações desenvolvidas pelas biociências
e biotecnologias, com o fim de manter a integridade e a dignidade humana frente ao
progresso, benefício ou não, das conquistas científicas em favor da vida.
Ë importante frisar que o Biodireito revela-se como fenômeno social,
visualizando a ciência do Direito como sócio-valorativa, ciência de problemas
práticos com resultados concretos, e não deduções apriorísticas, ciência de
decisões criativas e não automáticas.
Possui também relação direta com a Bioética, pois esta última quando sai do
campo axiológico e ocorre sua positivação no ordenamento jurídico, há uma
transmudação em Biodireito.
16.1 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE DOS MEIOS E FINS
48
Este princípio, basilar deste ramo do Direito prescreve que, caberá ao
Biodireito na defesa da vida humana, sem que isso represente óbice aos avanços
científicos, formular normas jurídicas de calibração equilibrada que permitam então,
uma maior adequação entre os propósitos, meios e fins, como propõe a lógica do
razoável, objetivados pelas biociências e biomédicas em benefício da humanidade.
17 TEORIAS SOBRE O INÍCO DA VIDA HUMANA
Existem várias teorias tanto no meio científico quanto jurídico, sobre o marco
inicial do começo da vida humana, com critérios diversificados, fundamentos
diversos e, principalmente sob a influência da religião, da política e da moral.
No que se refere às pesquisas em que são utilizadas as células tronco-
embrionárias, necessário se faz que sejam estabelecidos critérios bem delineados,
afim, de se terem parâmetros, por exemplo, para fixação e aferição das
responsabilidades cíveis, penais, administrativas aos possíveis infratores das
normas legais, de forma clarividente.
Quantos às teorias, por existirem uma diversidade considerável, algumas das
quais já mencionadas no capítulo anterior, aqui serão abordadas apenas as
seguintes visões ou teorias mais importantes no horizonte do Direito: a)
concepcionista; b) natalista; c) embriológica; d) neurológica; e) a vida começa com a
nidação; f) cognotivista; g) visão ecológica; h) quando o ser humano reconhece a
diferença existente entre os demais e ele próprio, com base na convivência.
Os adeptos da teoria concepcionista, defendem a idéia de que, por meio da
concepção, já se pode dizer que há vida em uma pessoa, já os natalistas,
consideram o ato do nascimento como marco na qual a pessoa começa a existir.
Sobre as teorias embriológica e neurológica, Szklarz (2007 p. 1) explica que:
[...] a vida começa na 3ª semana de gestação, quando o embrião adquire individualidade. Antes disso, ele pode se dividir e dar origem a outros indivíduos. Essa visão permite o uso de contraceptivos como a pílula do dia seguinte. Já a teoria neurológica aplica a definição de morte para marcar o início da vida: se a morte é o fim das ondas cerebrais, então vida é o início dessa atividade, o que ocorreria somente após a 8a semana de gestação.
49
No que se refere à visão de que, a vida começa com a fixação do ovo no
útero, ou seja, a nidação, seus seguidores justificam seu pensamento, na
possibilidade de desenvolvimento do embrião, observando que a fixação ocorre
dentro do útero em média até o 40º dia da gestação.
Já a teoria cognotivista, considera como início da vida, o momento em que já
está em funcionamento o seu cérebro.
Destarte a teoria que se baseia na visão ecológica, sustenta que a vida
começa quando o feto pode viver fora do útero. Para isso é preciso que os pulmões
estejam prontos, o que ocorre por volta da 25ª semana de gestação (SZKLARZ,
2007).
18 ALGUNS ASPECTOS SOBRE A LEI DE BIOSEGURANÇA
A Lei nº. 11.105, de 24 de março de 2005 foi criada com o objetivo de
regulamentar o artigo 225, incisos I e II da Constituição Federal vigente, estabelecer
normas de segurança, mecanismos de fiscalização das atividades em que ocorra o
envolvimento dos organismos geneticamente modificados e seus derivados e, para
tanto criou o Conselho Nacional de Biossegurança (CNBS), reestruturou a Comissão
Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) e, em seus artigos dispôs acerca da
Política Nacional de Biossegurança, além de revogar algumas leis e medidas
provisórias que regulamentavam os assuntos pertinentes às estas matérias.
O Conselho Nacional de Biossegurança, órgão criado com o advento da
referida lei, é um órgão de assessoramento do Presidente da República no que se
refere à implantação e formulação da Política Nacional de Biossegurança e tem
como principais atributos: a) fixar as diretrizes, bem como os princípios a serem
observados para a ação da administração das entidades e órgãos federais, que em
relação a esta matéria têm competências; b) liberação do uso comercial de OGM
(organismo geneticamente modificado), após pedido da CTNBio, observada a
conveniência e oportunidade sociais e econômicas e o interesse nacional; c) avocar
e decidir em última e definitiva instância, com base na manifestação da CTNBio e,
se necessário for, dos órgãos e entidades constantes no art. 16 desta lei, processos
50
que se relacionem as atividades que visem o uso comercial de OGM e derivados.
O Conselho Nacional de Biossegurança (CNBS) é composto pelos Ministros
de Estado: Chefe da Casa Civil (presidente do conselho); da Ciência e Tecnologia;
do Desenvolvimento Agrário, da Agricultura, Pecuária e Abastecimento; da Justiça;
da Saúde; do Meio Ambiente; do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior;
das Relações Exteriores; da Defesa; Secretário Especial de Aqüicultura e Pesca da
Presidência da República.
Quanto à Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), em
relação ao seu funcionamento, composição e competências, estes delineamentos
estão dispostos nos artigos 10 ao 15, em destaque o art. 10, caput que assim
dispõe:
[...] a CTNBio, integrante do Ministério da Ciência e Tecnologia, é instância colegiada multidisciplinar de caráter consultivo e deliberativo, para prestar apoio técnico e de assessoramento ao Governo Federal na formulação, atualização e implementação da PNB e de OGM e seus derivados, bem como no estabelecimento de normas técnicas de segurança e de pareceres técnicos referentes à autorização para atividades que envolvam pesquisa e uso comercial de OGM e seus derivados, com base na avaliação de seu risco zoofitosanitário, à saúde humana e ao meio ambiente(CTNBio,2006).
Ressalte-se que, a referida lei trouxe mudanças consideráveis no mundo
jurídico, especialmente quanto à utilização de células tronco embrionárias,
originárias da técnica de reprodução assistida denominada fertilização in vitro, e não
utilizadas no respectivo procedimento, atendidos aos requisitos legais, conforme
descrito em outros capítulos anteriores deste trabalho.
O artigo 5º da respectiva lei foi alvo de uma ação direta de
inconstitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal, de autoria do Procurador
Geral da República, Cláudio Fontelles, que exercia o cargo na época de sua
propositura, sob a alegação de que o aludido artigo não estaria em consonância com
o texto constitucional, tendo sido proferida a decisão dos Ministros da Suprema
Corte, pugnando pela improcedência da ADIN interposta.
51
19 ANÁLISE DO ARTIGO 5º DA LEI DE BIOSSEGURANÇA
A Lei n.º11.105, de 24 de março de 2005 – Lei de Biossegurança, foi
aprovada mediante placar soberano: 96% do Senadores e 85% dos Deputados
votaram a favor da norma, o que desde já , sinaliza a legalidade e razoabilidade .
A polêmica gerada em torno das pesquisas e da terapia com as células-tronco
embrionárias se resume a um único dispositivo legal, o artigo 5º da Lei n.º 11.105 de
24 de março de 2005 (Lei de Biossegurança) , responsável pela regulamentação do
uso de células-tronco embrionárias , quanto à forma, momento e outras condições
que serão analisadas sistematicamente.
Relevante se torna a transcrição do artigo, para o melhor juízo:
[...]Art.5º. È pertimida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento atendidas as seguintes condições: I – sejam embriões inviáveis; ou II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais , na data da publicação desta Lei, ou que ,já congelados na data da publicação desta Lei, depois de completarem 3 (três) , contados a partir da data do congelamento. § 1º Em qualquer caso, é necessário o consentimento dos genitores. § 2º Instituições de pesquisa e serviços de saúde que realizem pesquisa ou terapia com células-tronco embrionárias humanas deverão submeter seus projetos à apreciação e aprovação dos respectivos comitês de ética em pesquisa. § 3º É vedada a comercialização do material biológico a que se refere este artigo e sua pratica implica o crime tipificado no art. 15 da Lei 9434 de 04 de fevereiro de 1997.
Para que se entenda por inteiro o teor desse laudável preceito, aqui será feita
uma abordagem no intento de que o bom entendimento seja alcançado.
O fim a que se destina a terapia celular com as células de embriões é a
medicina regenerativa, em que se busca a substituição de células ou tecidos
lesados, objetivando a restauração de suas funções. A importância desse é revelada
quando a realidade é trazida a estudo, pois , as moléstias que são alvos desse
52
tratamento constituem causas de morte em todas as sociedades modernas , como
as doenças cardíacas, diabetes melito, cânceres, doenças genéticas e
degenerativas entre tantas outras.
A pesquisa com células-tronco de embriões foi enfim, permitida. No entanto
algumas restrições devem ser observadas para que a finalidade da norma seja
trazida à tona, guiada por uma bússola abarrotada de legalidade.
Da leitura do artigo, diz-se que a primeira restrição importa esta relacionada à
indicação do uso das células embrionárias unicamente nas atividades de pesquisa e
terapia. Não haverá ser outro o fim da utilização das células-tronco de embriões
senão as pesquisas e, outrossim , a terapia.
Apesar de já estudada em capitulo anterior, nos convém reforçar o conceito
de células-tronco embrionárias. Assim, são elas as células contidas em
agrupamento, que são encontradas apenas nos embriões humanos de até
14(quatorze) dias. A opinião quanto a esse marco temporal não é unânime no
universo cientifico, pois outros reduzem esse tempo para a fase de blastocisto,
ocorrente em torno de 5 dias depois da fecundação de um óvulo por um
espermatozóide.
Uma segunda limitação esta ligada ao objeto das pesquisas, devendo os
embriões derivarem de fertilização in vitro – uma das técnicas de reprodução
assistida.Difere-se a fertilização in vitro da fertilização in vida. Esta última, dar-se á
tão somente no interior de um útero, enquanto na primeira modalidade ocorre a
fecundação em laboratório. Tais embriões não serão aproveitados pelo casal no
respectivo tratamento, e, por esse motivo servirão de matéria prima para as
pesquisas e terapias.
Uma terceira restrição diz respeito ao estado em que se encontram os
embriões. Não obstante a numerosidade excessiva de embriões fertilizados in
vitro decorrente do procedimento, os embriões de uso permitido ainda deverão estar
dentre aqueles que a Lei chama de inviáveis para o desenvolvimento seguro de uma
nova pessoa.
No universo da Bioética, a inviabilidade de que se trata o artigo 5º da Lei em
estudo é constada a partir de “parecer” medico de extrema delicadeza. O
diagnostico de inviabilidade do embrião deve constituir procedimento medico seguro
e atestar a impossibilidade do embrião se desenvolver. Mesmo que um embrião
inviável venha a ser transferido para um útero, não se desenvolverá em uma futura
53
pessoa. Os demais destinos possíveis para eles são o congelamento permanente, o
descarte ou a pesquisa cientifica.
Os embriões ainda deverão estar congelados há mais de três anos. Trata-se
de um espaço de tempo razoável, que leva em conta tanto a possibilidade de os
genitores optarem por uma nova e futura implantação do embrião congelado, quanto
a impossibilidade de sua utilização, para esse mesmo fim, depois de decorrido o
triênio de congelamento.
De autoridade soberana está a condição do uso dos embriões ao
consentimento dos genitores. Esse pré – requisito está relacionado à aceitação do
casal - doador para que o material genético dele advindo seja deslocado de sua
originaria destinação procriadora para as investigações de natureza cientifica e
finalidade terapêutico-humana. Adiante, esse assunto terá nova abordagem sob um
outro aspecto interessante.
Os projetos das instituições e serviços de saúde, candidatos ao recebimento
das células-tronco embrionárias deverão ser apreciados e aprovados pelos
respectivos comitês de ética em pesquisa. Medida essa que se revela como um
nítido compromisso da Lei com as exigências de caráter bioético.
A última restrição de que se trata o artigo 5º da Lei de Biossegurança
reconhece a dignidade do material nela tratado, elevando o grau de reprovação
social quando a sua manipulação se der de maneira incorreta. Será tipificado como
criminoso aquele que comercializar o embrião de que se trata o dispositivo, com
base na Lei de Doação de Órgãos – Lei 9.434/97, artigo 5º, § 3º. A utilização fora
dos moldes previstos no mencionado artigo também o será fato incriminador.
A Lei ainda tipifica como delito penal a prática da engenharia genética em
células germinal, zigoto ou embrião humano, além da clonagem humana (artigos 6º,
25 e 26 da Lei 11.105/05).
O que se conclui da essência do artigo agredido pela ADIN 3510 é todo um
bem concatenado bloco normativo que, sob explícitas, cumulativas e razoáveis
condições de incidência, favorece a propulsão de linhas de pesquisa cientifica das
supostas propriedades terapêuticas de células extraídas de embriões humanos
armazenados in vitro. E que acabaram por dar vida às irrefragáveis palavras da
então presidente do Superior Tribunal Federal (STF) à época do decisum, Ministra
Ellen Gracie (2008, p.9) que exaustivamente debateu dizendo: “Não vejo qualquer
ofensa à dignidade humana na utilização de pré-embriões inviáveis ou congelados
54
há mais de três anos nas pesquisas de células-tronco que não teriam outro destino
que não o descarte”.
A vista das anotações, não restam dúvidas acerca da legalidade da matéria
recentemente aprovada pela Suprema Corte deste país, levando esse Colegiado ao
momento de maior amplitude de sua história.
Da ADIN 3510, emanou-se a realização da primeira audiência publica na
“biografia” do Supremo Tribunal Federal. A inédita experiência em toda a trajetória
do STF encontra respaldado no § 1º do artigo 9º da Lei 9.868/99, que prevê a
possibilidade da realização de audiência publica quando a matéria ou circunstancia
de fato necessitar de esclarecimento de perito sobre a questão.
O Relator da ADIN, (Brito, 2008 p.4), optou por chamar a possibilidade de se
realizar a audiência pública como “notável mecanismo constitucional de democracia
direta ou participativa”.
Enfim, de porte do instrumento que permite a utilização das células-tronco
embrionárias em pesquisas cientificas e terapias, passa-se necessariamente ao
exame da conseqüência da aprovação do artigo 5º da Lei de Biossegurança.
20 EMBRIÕES EXCEDENTES
A fertilização in vitro é uma das técnicas de reprodução humana assistida,
ocorre que, da utilização desse procedimento, tem-se inevitavelmente o surgimento
de embriões excedentes, muitos deles inviáveis, que serão descartados ou
congelados por tempo indefinido, sem qualquer chance de virem a ser implantados
em um útero e ensejarem na formação de uma pessoa humana.
Da interpretação do Texto Constitucional conclui-se que é possível que um
casal recorra às técnicas de reprodução assistida que incluam a fertilização artificial
ou in vitro para procriarem. Nesse sentido, devera esse mesmo casal estar obrigado
ao aproveitamento reprodutivo de todos os óvulos eventualmente fecundados? È
evidente que a resposta é NÃO.
55
Na técnica de reprodução assistida não é possível que se experimentem um,
dois ou três óvulos, mas sim todos os eventualmente produzidos pela doadora e
dela retirados no curso do procedimento, após a indução pela injeção de hormônios.
Justifica-se essa necessidade com o escopo de evitar novas práticas
incômodas, custosas e arriscadas ao corpo da mulher num curto espaço de tempo.
Não há nenhuma norma no país que obrigue o casal ao aproveitamento de
todos os embriões produzidos no procedimento. Caso houvesse, cairia por terra o
planejamento familiar previsto na Constituição Federal de 1988.
Esse pensamento deve e certamente será adotado no Brasil. Há uma
distinção entre a condição do pré-embrião (massa indiferenciada de células da qual
um ser humano pode ou não emergir) e do embrião propriamente dito (unidade
biológica detentora de vida humana individualizada).
O aproveitamento, nas pesquisas científicas com células-tronco, dos
embriões gerados no procedimento de reprodução humana assistida é infinitamente
mais útil e nobre do que o descarte em vão dos mesmos.
Em voto também favorável à pesquisa com as células-tronco embrionárias, o
Ministro Marco Aurélio mencionou o pensamento do biólogo David Baltimore (2008,
p. 12), que assim respondeu ao ser indagado sobre o objeto do presente trabalho
monográfico:
[...] Não sei falar a respeito do aspecto jurídico do assunto, mas do ponto de vista cientifico é uma discussão sem sentido. Afinal os embriões humanos foram descartados porque o casal já teve o numero de filhos que queria ou por qualquer outra razão. O fato é que os embriões serão destruídos de qualquer modo. A questão é saber se serão destruídos fazendo o bem a outras pessoas ou não. A meu ver, a resposta é obvia.
O também Ministro do STF, (Brito, 2008 p.50), que votou a favor das
pesquisas científicas, assim elucidou em seu voto acerca dos embriões excedentes:
“não se pode compelir nenhum casal ao pleno aproveitamento de todos os embriões
sobejantes (excedentários) dos respectivos propósitos reprodutivos”.
Como se não bastassem tais dizeres, o ministro tece o seguinte raciocínio, a
fim de que fique claro o melhor entendimento acerca das várias possibilidades
práticas de posse dos embriões excedentários.
56
[...] se todo casal tem o direito de procriar; se esse direito pode passar por sucessivos testes de fecundação in vitro a produção de embriões em numero superior à disposição do casal para aproveitá-los procriativamente se não existe, enfim, o dever legal do casal quanto a esse cabal aproveitamento genético, então as alternativas que restavam à Lei de Biossegurança eram somente estas: a primeira, coordenar os embriões à perpetuidade da pena de prisão em congelados tubos de ensaio; a segunda deixar que os estabelecimentos médicos de procriação assistida prosseguissem em sua sina de jogar no lixo tudo quanto fosse embrião não-requestado para o fim de procriação humana; a terceira opção estaria, exatamente, na autorização que fez o art. 5º da Lei.
21 A MORTE PARA O DIREITO
Para que se possa falar em inconstitucionalidade de uma Lei, estará sempre
em conflito flagrante com o Diploma Maior. Vejamos se o artigo 5º da Lei de
Biossegurança é norma de flagrante institucional.
A Lei que regula a doação de órgãos, Lei 9.434/97, no que tange ao desfecho
desse raciocínio, dispôs que a morte encefálica é o marco da cessação da vida de
qualquer pessoa física ou natural. Para o Direito, é viva a pessoa que preserva as
suas funções neurais, que possui atividade cerebral.
Prova de tal argumento é a transcrição do artigo 3º, da Lei 9.434/97;
[...] A retirada ‘post mortem’ de tecidos , órgãos ou partes do corpo humano, destinados a transplante ou tratamento devera ser precedida de diagnósticos de morte encefálica , contatada e registrada por dois médicos não participantes das equipes de remoção e transplante, mediante a utilização de critérios clínicos e tecnológicos definidos por resolução do Conselho Federal de Medicina.
O que se vê, portanto é que diante da constatação medica de morte
encefálica, a lei dá por finda a personalidade humana.
57
Para o entendimento majoritário, vida humana já rematadamente adornada
com o atributo da personalidade civil é o fenômeno que transcorre entre o
nascimento com a vida e a morte cerebral.
Acerca dessas considerações, somadas a todo o conteúdo do capitulo
anterior, que se incumbiu de elucidar a essência dos embriões de primeira semana,
de onde são extraídas as células-tronco embrionárias, conclui-se que o embrião de
que trata o artigo 5º da Lei de Biossegurança não é jamais uma vida a caminho.
Ao embrião do qual serão retidas as células-tronco faltam todas as
possibilidades de ganhar as primeiras terminações nervosas, que são anúncio
biológico de um cérebro humano em gestação. Isto quer dizer, não há cérebro, nem
concluído nem em formação.
O embrião referido no dispositivo atacado pela ADIN 3510 não passa de uma
vida vegetativa que se antecipa a do cérebro, pois esse ainda não foi sequer
formado. E na verdade, não chegará nunca tendo em vista seu estado de
congelamento de que relata o artigo 5º da Lei de Biossegurança.
Antes do décimo quarto dia haveria uma inadequação no uso da terminologia
“embrião”, por existir, ate o fim dessa etapa inicial, apenas uma massa de células
indiferenciadas geradas pela fertilização do óvulo. Somente após esse estagio pré-
embrionário, com duração de 14 dias, é que surge o embrião com uma estrutura
propriamente individual, com:
1. O aparecimento da linha primitiva, que é a estrutura da qual se originara a
coluna vertebral;
2. A perda da capacidade de divisão e de fusão do embrião;
3. A separação do conjunto celular que formará o feto daquele outro que gerará
anexos embrionários, como a placenta e o cordão umbilical.
Quando leciona acerca do destino do embrião excedente, o relator Ayres Brito
(2008, p.63) pronuncia:
[...] A única trilha que se lhe abre é a do desperdício de seu acreditado poder de recuperar a saúde e ate salvar a vida de pessoas, agora sim, tão cerebradas quanto em carne e osso, músculos, sangue, nervos e cartilagens , a repartir com familiares, médicos e amigos as limitações , dores e desesperanças de uma vida que muitas vezes tem tudo para ser venturosa e que não é.
58
O fim das pesquisas com as células-tronco de embriões é a perfeita harmonia
com nosso ordenamento constitucional, que desde o seu preâmbulo qualifica a
liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça
como valores supremos de uma sociedade mais do que tudo fraterna.
A afirmação de incompatibilidade do artigo 5º da Lei 11.105/05 com a
Constituição Federal de 1988 foi perfeitamente rechaçada, porque à lei ordinária é
permitido fazer coincidir a morte encefálica com a cessação da vida de uma pessoa
humana; também já está assim positivamente regrado que a morte encefálica é o
preciso ponto terminal da personalizada existência humana, a justificar a remoção
de órgãos, tecidos e partes do corpo ainda fisicamente pulsante para fins de
transplante, pesquisa e tratamento; enfim, o embrião humano do artigo 5º da Lei de
Biossegurança constitui-se num ente absolutamente incapaz de qualquer resíduo de
vida encefálica afim de que possa falar em aborto ou avença ao direito à vida.
22 PESQUISAS COM CELULAS-TRONCO EMBRIONÁRIAS E ABOR TO
É sabido que a lei coloca a salvo, “desde a concepção, os direitos do
nascituro”, como se pode conferir no 1º artigo do Código Civil.
Há quem diga que a atividade constante do artigo 5º da Lei nº. 11.105/05
equipara-se ao aborto. No aborto, o bem jurídico a ser tutelado é um organismo ou
entidade pré-natal, quer em estado embrionário, quer em estado fetal, mas sempre
no interior de um útero. Jamais em qualquer Placa de Petri, cilindro metálico ou
outro recipiente mecânico.
A utilização de embriões para os fins mencionados no artigo 5º da Lei de
Biossegurança de forma alguma poderá ser comparada à pratica do aborto.
A arte de se extrair células-tronco de embriões nada tem a ver com a
interrupção de gravidez humana.
O procedimento não trata sequer de interromper uma producente trajetória
extra-uterina do material constituído e acondicionado em tubo de ensaio,
59
simplesmente porque esse modo de interromper em laboratório e permanecer
confinado in vitro é, para o embrião, insuscetível de progressão reprodutiva.
Assim, para toda e qualquer corrente de pensamento que vê na autorização
para a pesquisa e terapia com células-tronco embrionárias uma conduta semelhante
a pratica do aborto, esta o juízo do Ministro e Relator da ADIN 3510, (Brito, 2008,
p.41), que assim expôs em seu voto: “à falta do húmus ou da constitutiva ambiência
orgânica do corpo feminino, o óvulo da fecundado, mas em estado de
congelamento, estaca na sua própria linha de partida genética”.
A Lei de Biossegurança não veicula autorização para extipar do corpo
feminino esse ou aquele embrião. Eliminar ou desentranhar esse ou aquele zigoto a
caminho do endométrio, ou nele já fixado. Não é essa a intenção/finalidade da Lei.
Para finalidade de pesquisa e terapia, o embrião conserva pelo menos
durante algum tempo, a totipotencia, para diferenciar-se em outro tecido, dentre
eles, neurônios, osteoblastos, célula da musculatura lisa, entre outros que nenhuma
outra célula-tronco adulta possa fazer o mesmo.
23 AS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS QUE LEGITIMAM AS PE SQUISAS
A menor fonte de positividade em nosso ordenamento jurídico é a
Constituição Federal de 1988, é fato concreto que legitima a função do artigo 5º da
Lei nº. 11.105/05 ao invés de reprimi-lo. De nossa própria Magna Carta é possível
extrair argumentos suficientes que vem a corroborar o cerne do mencionado
dispositivo.
Podemos enumerar as seguintes garantias como inerentes ao presente
estudo: a ausência de qualquer norma que regule a vida de um embrião fora do
útero, o direito à saúde, o direito a livre expressão da atividade cientifica, o dever do
Estado em propiciar, de maneira igualitária, ações e serviços para a promoção,
proteção e recuperação da saúde, o dever de promover e incentivar o
desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológica, e, enfim, a
previsibilidade de um planejamento familiar.
60
24 DIREITOS DO NASCITURO
Existem vários direitos que devem ser respeitados, notadamente os direitos
constitucionalmente previstos, importantes para defesa dos interesses do nascituro
em juízo e fora dele e, dentre os vários direitos, dois serão tratados no presente
trabalho, o direito à vida e personalidade civil.
Quanto aos direitos do nascituro, estes são tutelados desde que ocorre a
concepção e Conti (2004, p. 163) ressalta que “logo, o embrião ainda que in vitro
também se insere nesta proteção; isto é, o concepto é considerado sujeito de direito
reconhecendo-se-lhe caráter de pessoa no exato momento da fecundação”.
25 DIREITO À VIDA
Este direito é pressuposto para os demais direitos, funcionando como uma
cláusula geral; é objetivo constitucionalmente assegurado, sendo mencionado em
primeiro lugar pela Constituição da República, no art. 5º:
[...] todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade [...].
Quanto ao direito à vida Moreira (2004, p. 149) afirma que:
61
[...] desde logo, parece ocioso afirmar que o nascituro tem vida. Que
nos conste, ninguém jamais objetou à propriedade da expressão “vida intra-
uterina”, protege-se o feto, como ser vivo, como se protege o ser humano já
nascido. Cuida-se, é óbvio, de um tipo de vida diferente daquele a que dá
acesso o parto; mas, em todo caso, vida. Quando o art. 2º, primeira parte,
se refere a “nascimento com vida”, o que há de ser novo é o prolongamento
– seja embora por pouquíssimo tempo – da vida (que já existia), agora sob
outra forma, após a saída do feto do corpo da mulher.
Vale ressaltar que o direito à vida, não é o direito de viver indefinidamente, ou
permanecer vivo por determinado lapso de tempo: seria algo não compatível com a
realidade humana, mas o direito de não tê-la abreviada por ato voluntário (não
necessariamente intencional) de outrem e, do lado passivo corresponde a um dever
de abstenção, atribuído a todos. (MOREIRA, 2004).
A Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José), em
que o Brasil é signatário, reza no seu art. 4º, nº. 1, acerca do princípio de que toda
pessoa tem direito de que se respeite a sua vida, direito este que deve ser protegido
por lei e em geral desde o momento em que ocorre a concepção.
Sobre o que dispõe o Código Civil Brasileiro em seu art. 2º, acerca da
personalidade e direitos do nascituro, Sartori (2005, p. 1) explica que:
[...] faz referência à concepção, ao ressalvar o direito do nascituro, mas deixa hialino que está a tratar do embrião que venha a lograr nascimento com vida ou que possa vir a ser uma pessoa e, portanto, necessariamente implantado em útero ou ali presente naturalmente.
Há de se ressaltar que a vida humana é indisponível, não é um artefato, uma
matéria inanimada construível, desmontável, é algo único, o ser que recebe a vida
dos pais ou dos que auxiliam na tecnologia, coexiste com os outros, não podendo
sua liberdade prescindir do reconhecimento da liberdade do outro. (Duarte, 1999).
Assim sendo, o direito à vida não se subordina a qualquer conjectura, atinente
ao tempo em que durará a vida extra-uterina, é um princípio fundamental e, a partir
dele é que a ação humana, guiada pela tecnologia, deve ser analisada e regrada,
62
tendo como parâmetro a bioética, que reconhece a vida do ser humano, como
indisponível desde seu início, da concepção à morte natural.
26 A VIDA EXTRA-UTERINA
É sabido que a nossa Constituição Federal não diz quando começa a vida
humana, nada dispondo sobre qualquer forma de vida humana pré-natal, ou seja,
antes do nascimento. Ao falar em dignidade da pessoa humana, diz-se dessa no
sentido notarial, biográfico, moral e espiritual. Em nenhum momento há menção
acerca de embrião, ou ate mesmo feto.
No instante em que o Texto Republicano se reporta a direitos da pessoa
humana, livres exercícios de direitos individuais e até mesmo nos direitos e
garantias fundamentais, está falando de direitos e garantias do indivíduo como
pessoa. Alguém, não interessando a nacionalidade, sexo, cor, raça ou condição
sócio econômica, mas sempre um ser humano já nascido.
Ayres Brito (2008) com muita propriedade, chega a dizer que “a constituição
faz expresso uso do adjetivo residentes no país (não é um útero materno e menos
ainda um tubo de ensaio ou uma placa de Petri)”.
Ainda no desbravar do texto maior em vigência, este, das tantas vezes em
que fala da criança, como no artigo 227 e seus parágrafos 1º, 3º, 4º e 7º diz do
individuo ou criatura humana que já consegui ultrapassar a fronteira da vida intra-
uterina; todo o tempo em que se viveu em estado de embrião e feto não é contado
para a Constituição como sujeito detentor de direitos.
A vida inviolável referida no art. 5º da Constituição Federal de 1988 é
exclusivamente reportante a um individuo já personalizado. Ela não faz de todo e
qualquer momento da vida humana um objeto de tutela jurídica, mas sim da vida que
já é própria de uma concreta pessoa, porque nativiva e, nessa condição, dotada de
dignidade física ou natural.
A maneira com que se protege os estágios da Biologia humana, a partir de
agora, tem o seu merecido respeito. Na defesa das pesquisas com células-tronco de
embriões (Brito, 2008) utiliza-se da seguinte comparação, “é o caso, por exemplo, de
63
um cadáver humano, protegido por nosso ordenamento. No entanto, não há como
comparar as proteções jurídicas e éticas oferecidas a uma pessoa adulta com a de
um cadáver”.
Podemos, ainda, entrar em um campo de certa forma ”metafísico” para
elucidar que pessoa humana propriamente dita, e embrião não se equivalem quanto
à potencialidade de adquirir direitos.
O embrião é o embrião, o feto, é o feto, e a pessoa humana é a pessoa
humana. Esta não se antecipa à metamorfose dos outros dois organismos. É o
produto final dessa metamorfose. Da mesma forma se dá entre a planta e a
semente, a chuva e a nuvem; não se podendo afirmar que a semente já seja planta
e a nuvem já seja chuva.
Assim, o óvulo fecundado fora do útero não é a vida. Inexistindo pessoa
humana, não se fala em dignidade; tese defendida também pela Ordem dos
Advogados do Estado de São Paulo.
“Não há pessoa humana embrionária, mas, embrião de pessoa humana”.
27 O DIREITO À SAÚDE
O uso das células-tronco embrionárias no tratamento de doenças é infinita
esperança, tanto dos que delas perecem, como para os cientistas. Se esses
aprenderem a dirigir as células embrionárias na diferenciação em outros tipos de
células ou tecidos, poderão, então, usá-las para dois importantes fins médicos.
Primeiro, podem ser usadas para testar novos medicamentos, para segurança
e efeito. Uma medicação poderia ser testada em um tipo específico de célula para
medir sua resposta mais rapidamente de qualquer teste clínico. Por exemplo, os
cientistas poderão utilizar as células-tronco de embriões da linhagem do câncer para
testar uma nova droga contra o crescimento do câncer.
Uma segunda especialidade seria usar as células-tronco de embriões para
reparar células ou tecidos danificados por doença ou ferimento. Uma aplicação
potencial é injetar células-tronco embrionária no coração para reparar células que
foram danificadas por um ataque cardíaco.
64
Na esfera jurídica, agora, o direito à saúde é o primeiro dos direito sociais de
natureza fundamental. É o que se infere da leitura do artigo 6º da Constituição
Federal de 1988. É também, novamente consagrada no espaço reservado à
Seguridade Social, vindo em primeiro lugar seguida da Previdência e da Assistência
Social.
Muito familiar nos parece à determinação § 4º do artigo 199 da Carta Magna,
que já parecia prever que em um futuro bem próximo as células-tronco embrionárias
seriam o “exército” da esperança de milhares de pessoas.
Assim diz o mencionado dispositivo:
[...] Art. 199 A assistência à saúde é livre à iniciativa privada. § 4º A Lei disporá sobre as condições e os requisitos que facilitem a remoção de órgãos, tecidos e substâncias humanas para fins de transplante, pesquisa e tratamento, bem como a celta, processamento e transfusão de sangue e seus derivados, sendo vedado todo tipo de comercialização.
O direito a saúde de que se fala, convém lembrar que é “direito de todos e
dever do estado”(caput do art. 196 da Constituição). Tal direito deve caminhar em
harmonia com o avanço cientifico.
A par dessas garantias constitucionais, de que maneira as células-tronco de
embriões poderão ajudar na concretização desse direito?
As células-tronco embrionárias são essencialmente para a pesquisa e terapia
porque possuem a capacidade, como nenhuma outra, de se diferenciar em qualquer
tipo de tecido, ou seja, conseguem dar origem a quaisquer uns dos mais de 200
tecidos que forma o corpo humano, o que representa um grande potencial para a
Medicina.
A aplicação prática das células embrionárias está, portanto, na produção de
tecidos para terapias medicinais. As células do art. 5º da Lei de Biossegurança
ajudarão no tratamento de um grande numero de doenças como Mal de Parkinson ,
Alzheimer, traumatismo da medula espinhal, infarto, queimaduras, doenças do
coração, diabetes, etc.
Segundo dados levantados pela Revista Época edição de 29 de abril de 2007
p.13/17, o contingente de brasileiros que sofrem de algumas doenças genéticas
65
graves está em torno de cinco milhões; quanto aos portadores de diabetes a
projeção varia de 10 a 15 milhões de pessoas.
Em meio a tantas outras, uma doença ganha destaque no país, por atingir
cerca de 300 mil pessoas: o Mal de Parkinson. As células-tronco embrionárias
poderão ser usadas para reparar células cerebrais com o Mal de Parkinson. Os
pacientes têm defeitos nas células que produzem neurotransmissores químicos
denominados de dopamina. Sem dopamina seus movimentos se tornam trêmulos e
desordenados. A implantação de células novas ainda indiferenciadas no cérebro
dessas pessoas, pelo menos em tese, poderão dar origem a formação de novas
células capazes de produzir dopamina em quantidade suficiente para o bom
funcionamento do organismo. O tratamento tão promissor é acobertado pela
Constituição Federal, no tocante a garantia do direito a saúde, e acesso irrestrito a
todos que dele necessitam.
28 O PLANEJAMENTO FAMILIAR
O Magno Texto Federal passa a dispor sobre a figura do planejamento
familiar no capitulo destinado às regras da família. Planejamento este fruto da livre
decisão do casal. Assim leciona o § 7º do art. 226 da C.F:
[...} Art.226.(...) § 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.
Diante disto, chega-se a conclusão de que ao casal é atribuído o direito de
dispor sobre o tamanho de sua família e, consequentemente, sobre a possibilidade
de sustentá-la materialmente.
66
A figura jurídico-constitucional acima extraída revela a possibilidade de um
planejamento familiar para o exercício de uma paternidade responsável como objeto
de plena estatal. Assim, esse poder público, se vê tão proibido de se contrapor a
autonomia de vontade decisória do casal quanto obrigado a se postar como
aparelho de suprimento dos meios educacionais e científicos para tão celebrar
desfrute desse direito subjetivo (Morais , 2001).
No mais para Ayres Brito (2008) da fertilização in vitro entende-se:
[..] Peculiarizado meio ou recurso cientifico a serviço da ampliação da família como entidade digna da especial proteção do Estado.Não importa, para o direito, o processo pelo qual se viabiliza a fertilização do óvulo feminino(natural ou artificialmente).O que importa é possibilitar ao casal superar os percalços de sua concreta infertilidade, e, assim, contribuir para a perpetuação da espécie humana.
A discussão exposta, sobre o planejamento familiar é fato que justifica o
capítulo a cerca dos embriões excedentes. Desta forma não esta o casal obrigado
ao aproveitamento de todos os embriões surgidos no processo ao qual se submeteu
para o simples fim de dar origem a um filho; Lei alguma existe no sentido que os
demais embriões excedentes devem entrar no planejamento do casal. Muito pelo
contrario, o que há é um principio constante do primeiro artigo do Texto Republicano
que garante ao casal e a seus descendentes instrumentos capazes de garantir a
dignidade da pessoa humana (Brito 2008).
29 LIBERDADE DA ATIVIDADE CIÊNTIFICA
A chave pra todos os direitos do cidadão está, indubitavelmente, no espaço
destinado aos Direitos e Garantias Fundamentais, ainda, Nos Direitos e Deveres
Individuais e Coletivos. Tais preceitos estão enlancados no art. 5º da Lei Maior.
O que tem haver a pesquisa cientifica de que trata o art. 5º da Lei de
Biossegurança com essas garantias constitucionais?Tudo.
67
Este expresso no inciso IX do art.196 Da CF.1988 que determina que é livre a
expressão da atividade intelectual, artística, cientifica, e de comunicação.
É possível que seja feita uma análise da abrangência do vocábulo expressão
do dispositivo acima. Primeiro, a liberdade de construção ou de elaboração do
conhecimento cientifico em si; depois, igual liberdade de promover a respectiva
enunciação para além das próprias paredes de onde surgiu a tese (Campos, 2008).
Além deste, o eterno mestre professor (Morais, 2001) nos brinda com o
ensinamento de que:” a liberdade de expressão e de manifestação de pensamento
não pode sofrer nenhum tipo de limitação”.
Neste sentido, nem mesmo é plausível imaginar a sociedade atual vedada de
sua liberdade de pensar e de, expressar tal pensamento. O desenvolvimento
científico atingiu os níveis atuais graças a mentes brilhantes que deixaram para seus
descendentes obras que ainda serão usufruídas também por várias décadas ou
séculos.
O avanço da ciência permitiu a descoberta de incontáveis curas de doenças
que hoje salvam vidas de milhares de pessoas no mundo inteiro.
Sem a liberdade dos cientistas certamente o mundo ainda estivesse sofrendo
com simples dores de cabeça, tosse, enjôos, ou qualquer outra enfermidade do mais
singular grau de complexidade.
Neste sentido, estão inseridas as pesquisas com células-tronco embrionárias.
A liberdade da atividade científica, mormente fiscalizadas sob os mais rígidos
padrões éticos e morais devem sempre ser autorizados e apoiados pelo Estado
garantindo o desenvolvimento humano de forma completa, pois a liberdade da
atividade cientifica é direito que garante o progresso da humanidade.
30 A PROMOÇÃO E INCENTIVO AO CIÊNTIFICO
Todo um capítulo do Texto Republicano de 1988 é destinado à ciência e
tecnologia; artigos 218 e 219.
68
Se de nada valesse o “recheio” deste importante capitulo constitucional para
nossa sociedade, talvez não estaríamos hoje discutindo terapia com células-tronco.
Dessa forma nos ensina os artigos:
(...) Art. 218. O Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológicas. § 1º A pesquisa científica básica receberá tratamento prioritário do Estado, Tendo em vista o bem público e o progresso das ciências. (...) § 3º O Estado apoiará a formação de recursos humanos nas áreas de ciência, pesquisa e tecnologia, e concederá aos que dela se ocupem meios e condições especiais de trabalho.
Tudo tem a ver com a autorização do art. 5º da Lei de Biossegurança e o
preceito acima exposto. A Lei Maior encarrega o Estado de promover e incentivar o
avanço científico no país tendo em vista o bem público e o progresso da ciência.
Ora, o que previsto no dispositivo ofendido pela ADIN 3510 objetiva, acima de
tudo avançar no campo científico visando preservar esse fundamento, a devolver as
pessoas acometidas de enfermidades ou as vítimas de acidentes uma vida útil
razoavelmente satisfatória (Brito, 2008).
O Brasil se junta agora a paises como África do Sul, Alemanha, China,
Cingapura, Coréia do Sul, Espanha, França, Israel, Japão, México, Reino Unido,
Rússia, Suíça e Turquia, na busca da progressão na esfera das ciências médicas,
elevando a dignidade da pessoa humana como objetivo e produto final de toda e
qualquer pesquisa.
31 DIREITO A PERSONALIDADE CIVIL
A personalidade jurídica, diante das novas perspectivas trazidas pela
Constituição de 1988, contemporaneamente não pode ser pensada tão somente sob
69
o prisma de ser apenas aptidão para ser sujeito de direito, mas correlacionada com
a dignidade humana, onde se reconhecem garantias e direitos fundamentais, para
que a pessoa possa viver dignamente, e a personalidade por ser um conjunto de
características de cada pessoa, seus direitos são subjetivos, condizentes como a
própria condição de pessoa.
Observe-se que a pessoa pode ser definida como sendo:
[...] um ente coletivo ou físico susceptível de direitos e obrigações, na órbita
jurídica, é o sujeito de direito e, a pessoa natural é formada por uma
complexa estrutura de corpo, alma e intelecto, não podendo mais se afirmar
que é um ser biologicamente criado, em razão de mecanismos científicos de
concepção artificial atualmente existentes. (FARIAS e ROSENVALD, 2007,
p. 102).
Por isso, toda pessoa é dotada de personalidade, por ser esta integrante da
pessoa, necessária para o exercício da cidadania.
Ressalte-se que a personalidade jurídica não pode ser entendida tão somente
na hipótese de titularidade de direitos, mas deve ser compreendida como um
atributo para que essa pessoa possa atuar no plano jurídico, podendo desta forma,
reivindicar a proteção jurídica a ser dispensada aos direitos concernentes à
personalidade.
Neste diapasão, um importante direito previsto na legislação
infraconstitucional, lei n. 10.406 de 10 de janeiro de 2002, notadamente no art. 2º,
caput, dispõe acerca do começo da personalidade civil, em que existe a ressalva
desde a concepção dos direitos do nascituro, preservando-lhes até o seu
nascimento com vida.
A vida do nascituro é influenciada por dados sociais, pela vida biológica e
social da mãe, e Souza (2004, p. 155) ressalta que:
[...] se há uma carga genética referente às vidas de seus antepassados
biológicos do nascituro, este também já é um ser social, pois a experiência
vivida no corpo de sua mãe já influencia o seu futuro. Logo é um ser social.
Ë pessoa em formação
70
Destarte, acerca do tratamento jurídico dispensado ao nascituro, este é
pessoa, pois já sofre os efeitos das relações sociais, é um ser coletivo e único,
mesmo dependente diretamente da mãe, que detém características próprias,
advindas dos genes dos seus antepassados e produto do meio social em que vive.
Quanto à discussão sobre a amplitude dos direitos do nascituro, esta é
superada uma vez que, ao se afirmar que ao nascituro é reconhecido apenas os
direitos expressamente assegurados, não prevalece vez que:
[...] a) primeiro porque desconsidera o texto da lei que reconhece
expressamente os direitos dos nascituros quando dispõe que “a lei põe a
salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”; b) segundo, por ser o
nascituro uma pessoa dotada de cérebro, portanto pessoa que já sente, que
carrega uma enorme carga de informações genéticas dos seus
progenitores, assim como pessoa em transformação, que influencia e é
influenciada pelo meio social. (SOUZA, 2004, p. 158).
Ao se realizarem as pesquisas com células-tronco embrionárias, devem ser
feitas reflexões acerca dos direitos do nascituro, existindo três soluções em alguns
ordenamentos jurídicos mundiais, a saber: a diferenciação entre concebido e homem
pessoa, equiparação total entre concebido e homem pessoa e, diferenciação parcial,
importantes para a fixação de parâmetros a serem utilizados no caso concreto.
32 CAPACIDADE PROCESSUAL DO NASCITURO
Inicialmente é importante frisar que a capacidade processual se difere da
personalidade, pois, aquela se refere à possibilidade de aqueles que são dotados de
personalidade, poderem ser também sujeitos de direito.
A capacidade processual está prevista nos arts. 07 ao 13 do CPC, contendo
disposições acerca desta capacidade de estar em juízo, da representação dos
incapazes, dos casos de nomeação de curador especial, das situações em que é
71
necessário o consentimento do cônjuge, bem como as hipóteses de representação
ativa e passiva, conforme dispõe o art. 12 do CPC. (BRASIL, 2005).
Vários entes desprovidos de personalidade podem ser partes em processo, e
nesta qualidade são titulares de direitos. Neste contexto Moreira (1999, p. 146)
expõe que:
[...] o art. 12 do Código de Processo Civil alude à massa falida (inciso III), à herança jacente ou vacante (inciso IV), ao espólio (inciso V), ao condomínio (inciso IX) e – como de propósito! – às “sociedades sem personalidade jurídica” (inciso VII). Mais: no próprio campo civil, há o caso notório do denominado “condomínio edilício”, autorizado, mediante representação pelo síndico, a praticar, “em juízo ou fora dele, os atos necessários à defesa dos interesses comuns’(art. 1.348, nº II). Apesar de não incluído no rol das pessoas jurídicas de direito privado (art. 44), é trivial a existência das relações jurídicas entre o condomínio e terceiros (v.g, empregados, empreiteiros, fornecedores de materiais), das quais decorrem, para ele, direitos e obrigações.
No art. 1.798 do Código Civil de 2002, existem disposições quanto à
legitimidade para suceder. As pessoas já nascidas ou já concebidas no momento da
abertura da sucessão estão legitimadas para suceder.
Outros dispositivos esparsos, espalhados pelos Código Civil e de Processo
Civil, remontam à situações especiais, que legitimam o nascituro no exercício de
seus direitos.
Acerca deste tema, recente decisão em recurso de agravo de instrumento
com pedido de liminar n. 137.023-0/0-00 – São Bernardo do Campo – Voto nº.
13.059, proferida pelo Desembargador José Mário Antônio Cardinale, da Câmara
Especial do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, agravo este,
interposto pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo em desfavor da Fazenda
do Estado de São Paulo na data de 23.10.2006, em que foi admitida pelo douto
julgador a possibilidade, em tese, de o nascituro integrar o pólo ativo da ação, desde
que, representado pelos genitores ou por quem determina a lei, conforme ementa do
acórdão abaixo transcrita:
[...] MENOR – Ação proposta por nascituro buscando o atendimento pré-natal à sua genitora, que se encontra presa – Decisão do juiz a quo que determinou a emenda da inicial por entender que o nascituro, por não possuir personalidade jurídica, não tem legitimidade ativa ad causam – Não
72
conhecimento do agravo no tocante ao pleito que visa a concessão da antecipação da tutela ainda não apreciada em primeira instância – Nascituro que pode ser parte, desde que representado pelos genitores ou por quem determina a lei civil – Provimento do agravo apenas para reconhecer a possibilidade do nascituro vir a juízo, sem adentrar no mérito de sua legitimidade para a causa presente e, tampouco, a competência da Justiça da Infância e da Juventude – Necessidade de anulação do despacho que determinou a emenda da inicial – Agravo conhecido em parte e, na parte conhecida, provido, nos termos do acórdão .(SÃO PAULO, 2007. p.1)
Dentre os fundamentos utilizados na ação principal, através da qual o agravo
de instrumento foi interposto, o Defensor Público Marcelo Carneiro Novaes,
evidenciou a situação da mãe, que não vinha recebendo o atendimento pré-natal
adequadamente, para que pudessem então serem garantidos os direitos à saúde, a
integridade e a vida da mãe e do bebê.
Acerca da capacidade processual, o Código de Processo Civil, trouxe no seu
bojo, vários dispositivos a este respeito e, quanto ao seu exercício, especificamente
os artigos. 877 e 878, através da qual, por meio de ação cautelar, a genitora grávida
que, quiser provar seu estado, requererá ao juiz que, ouvido o Ministério Público,
nomeie um médico para constatar tal alegação, com a finalidade de ter a posse dos
bens do nascituro que está sendo gerado em suas entranhas, em relação aos
direitos sucessórios existentes.
Nesta situação, ao ser apresentado o laudo que reconheça a sua gravidez,
podendo ser dispensado o exame, em caso de concordância dos herdeiros do
falecido em aceitarem a declaração da requerente, a representação processual do
nascituro se dá através de sua mãe que, tem a posse de seus bens, administrando-
os em nome do mesmo.
A previsão acerca da medida cautelar, do Código Processual Civil difere da
decisão acima transcrita, uma vez que a genitora nesta situação é quem representa
os interesses do nascituro, ao passo de que, naquele caso concreto, o
Desembargador reconheceu a capacidade jurídica do nascituro de figurar no pólo
ativo da ação, sob a alegação de ser a criança a principal beneficiada com os
exames médicos pré-natais que seriam realizados pela mãe, em consonância com o
que dispõe o Estatuto da Criança e do Adolescente, que traz disposições claras
acerca da proteção que deve ser dispensada à criança.
73
O juiz inicialmente, na ação principal determinou a emenda a inicial, por
entender que o nascituro não poderia integrar o pólo ativo da demanda, por não
reconhecer a legitimidade do nascituro de demandar em juízo.
A tramitação do agravo de instrumento corre em segredo de justiça, em razão
da matéria, razão pela qual não se tem acesso aos andamentos processuais,
mormente fornecidos pelo site do Tribunal de Justiça de São Paulo, contudo, a
divulgação do acórdão foi feita por alguns sites da internet, dentre eles o da Ordem
de Advogados de São Paulo que, em matéria escrita pelo seu Presidente,
transcreveu o acórdão, conforme ANEXO B.
Naquele caso acima referenciado, Buglione (2007, p. 03) ressalta que:
[...] no caso dos fetos com capacidade processual [...] as decisões criam quatro conseqüências imediatas: 1. modificam o sentido de personalidade jurídica; 2. ampliam os direitos de personalidade; 3. modificam os pressupostos processuais e 4. alteram o conceito de capacidade processual. O ponto é que salvaguardar os direitos é somente assegurar que os genitores, e na ausência deles, o Ministério Público, possam ajuizar ação que venha a impedir a violação de direitos que irão se configurar com o nascimento com vida.
Por ser polêmica, inovadora e divergente do que, mormente vinha sendo
decidido nos tribunais brasileiros, mostra-se como uma tendência moderna, ao se
analisar a capacidade processual disposta no Código de Processo Civil brasileiro,
portanto, vários são os questionamentos que emergem nos mais diversos
aspectos e, nos levam a uma reflexão sobre pessoas e sujeitos de direito, que
passarão a ser temas centrais desses questionamentos e, ao serem deliberados
estarão re(definindo) a própria condição humana.
33 A FIGURA DO NACITURO VERSUS A FIGURA DO EMBRIÃO
74
Inicialmente é importante trazer o conceito do que vem a ser embrião, para
uma análise posterior, mais aprofundada acerca destas diferenças, sendo portanto
segundo Conti (2004, p. 257):
[...] é assim denominado quando existe um botão embrionário, isto é,
compreende todo o desenvolvimento situado entre o aparecimento do botão
embrionário e o término do surgimento de todas as partes do corpo, no final
do segundo mês.
Destarte, o nascituro pode ser entendido como sendo aquele que há de
nascer, ou ainda, o ser humano já concebido, cujo nascimento se aguarda, por ser
um fato futuro e certo, conceito este, que modernamente tem sofrido influência
principalmente da engenharia genética, de forma a ampliá-lo e, por conseguinte
entendê-lo também como não sendo somente o feto em gestação, mas para muitos
doutrinadores divergentes nos seus posicionamentos, o próprio zigoto.
Sobre o que vem a ser concepto, entende-se como o ser humano no período
da vida que vai desde o seu início, na concepção, até o nascimento, assim que o
termo nascituro compreende aquele que está para nascer; gerado, mas ainda não
nascido. Usa-se o termo embrião para designar o nascituro durante as primeiras
semanas de vida, reservando-se o termo feto para designá-lo no período
subseqüente. (Brandão, 1999).
As fases iniciais do embrião são denominadas mórula e blastocisto, e o ovo
ou zigoto, surgem da fusão dos gametas, como estágios da célula inicial, concluindo
assim que o nascituro tem os seguintes estágios de desenvolvimento: zigoto,
mórula, blastocisto, pré-embrião, embrião e feto.
A respeito destes apontamentos iniciais surge então, uma problemática
acerca do momento em que se deve considerar juridicamente o nascituro, quando
da utilização das técnicas de reprodução assistidas, especialmente a técnica de
fertilização in vitro.
Esclarece ainda Conti (2004 apud LEITE 1995, p. 387) que:
75
[...] os direitos do nascituro são tutelados desde a concepção, logo o
embrião, ainda que in vitro também se insere nesta proteção; isto é, o
concepto é considerado sujeito de direito reconhecendo-se-lhe caráter de
pessoa no exato momento da fecundação.
Em sentido contrário, a teoria genético-desenvolvimentista, com base em
critérios científicos, considera que a vida existe a partir da fixação do embrião no
útero materno (nidação), entendimento adotado pela medicina, em razão do embrião
fecundado em laboratório, morrer se não for implantado no útero da mulher (SÁ,
2002).
Esta última corrente é aceita por vários médicos, sendo adotada pelo
Relatório Warnock, na Grã-Bretanha, conforme descrito nos itens anteriores.
Após a distinção acima relatada, podemos identificar com mais detalhes um
do outro, o que possibilita estabelecer raciocínios éticos-jurídicos acerca da proteção
que deve ser dispensada, o que vem a ser embrião e nascituro e, principalmente
quando o Estado deve intervir, tutelando assim, os direitos que devem ser
resguardados.
34 POSICIONAMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL ACERC A DA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N. 3510-0/DF
A Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3510-0/DF foi proposta no Supremo
Tribunal Federal pelo então Procurador Geral da República, Cláudio Fontelles, na
data de 5.3.2005, alegando que o artigo 5º da lei nº. 11.105 de 24 de março de
2005, era incompatível com o texto constitucional.
Segundo a Ministra Ellen Gracie, Presidente da Suprema Corte na época em
que proferiu seu voto foram apontados como parâmetros de verificação mais
evidentes, o fundamento da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III da Constituição
Federal), a garantia da inviolabilidade do direito à vida, o direito à livre expressão da
atividade científica, o direito à saúde, o dever do Estado de propiciar, de maneira
76
igualitária, ações e serviços para promoção, proteção e recuperação da saúde e de
promover e incentivar o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação
tecnológica.
Nota-se que, a ação tramitava na Suprema Corte há pelo menos 03 (três)
anos á época do primeiro julgamento e a Presidente do STF, Ministra Ellen Gracie,
em seu voto proferido antecipadamente sobre a ADIN em deslinde, afirmou não
haver vício de inconstitucionalidade da norma questionada e que, a ordem jurídica
nacional atribui a qualificação de pessoa ao nascido com vida, elencando também,
outros fundamentos em seu voto escrito, conforme ANEXO A.
Outro Ministro da Suprema Corte a proferir seu voto, foi o Ministro Ayres Brito,
relator, pugnando pela improcedência da ADIN interposta e, fundamentou seu voto,
com dispositivos constitucionais diversos e ressaltando que:
[...] a Carta Magna fala do indivíduo como pessoa, ser humano, já nascido, desconsiderando o estado de embrião e feto, mas a legislação infraconstitucional cuidou do direito do nascituro, do ser que está a caminho do nascimento (BRITO, 2008, p. 1).
Com fundamento na Constituição Federal, o Ministro ressaltou que o art. 226,
dispõe que, o casal tem o direito de planejar a família e não há nenhuma
determinação a respeito da obrigatoriedade de se terem filho pelo meio natural,
justificando assim a utilização da fertilização in vitro como técnica de reprodução.
Neste contexto defendeu que, quanto ao direito à saúde, previsto nos artigos
196 a 200 da Constituição Pátria, bem como da obrigatoriedade do Estado em
garantí-la, autoriza o uso das células tronco para tratamentos de diversas doenças.
Sustentou ainda sobre o aproveitamento dos embriões em pesquisas que,
visem à cura de doenças degenerativas, neopatias, distúrbios musculares, dentre
outros tipos, que atingem cerca de 5 milhões de brasileiros.
No dia 5.3.2008 o Ministro Menezes Direito pediu vista dos autos na data do
primeiro julgamento, em que tinham sido proferidos os votos dos Ministros
antecipadamente.
Por ocasião do segundo julgamento, os ministros que ainda não tinham
proferido seus votos, foram ao plenário nos dias 28 e 29 de maio de 2008.
77
Seis ministros da Suprema Corte, votaram no sentido de considerar que, o art.
5° da Lei de Biossegurança não merece reparo, que f oram: Carlos Ayres Brito, Ellen
Gracie, Carmen Lúcia Antunes Rocha, Joaquim Barbosa, Marco Aurélio e Celso de
Mello.
Os ministros Cezar Peluzo e Gilmar Mendes, consideraram que a referida lei é
constitucional, mas pretendiam que o Tribunal declarasse, na decisão acerca da
necessidade de que, essas pesquisas fossem fiscalizadas com rigor, do ponto de
vista ético, pela Comissão Nacional de ética em pesquisa (CONEP), o que foi
acolhido pela Corte.
Há de se observar que os três ministros restantes, ou seja, Carlos Alberto
Menezes Direito, Ricardo Lewandowski e Eros Grau, fizeram diversas ressalvas para
a liberação das pesquisas e, votaram no sentido de permitir tais pesquisas, todavia,
desde que não ocorra para tanto, a destruição dos embriões ainda inviáveis, ao se
retirarem as células tronco embrionárias.
Assim, é mister ressaltar o posicionamento dos Ministros no que tange à
constitucionalidade das pesquisas com células tronco embrionárias, desde que
cumpridos os requisitos da Lei de Biossegurança, estas podem ser realizadas, sem
que exista para tanto ofensa à Magna Carta.
78
35 CONCLUSÃO
O respeito incondicional pela vida humana é o caminho certo, e mais seguro,
para colocar os recursos disponíveis, a serviços de todas as pessoas humanas
independentemente de sua condição sócio-econômico-cultural.
No contexto das terapias com células-tronco de embriões humanos e o uso
de células pluripotentes, questões éticas e morais vão muito além do fato de se
poder colocar ou não os resultados dessas pesquisas disponíveis para toda e
qualquer pessoa independentemente de sua condição sócio econômica, mas
consiste, sobretudo, no fato de se poder ou não usar embriões humanos como fonte
principal de “matéria prima”, já que um embrião pode ser considerado um sujeito
detentor de direitos, pois, se trata para muitos, de um ser com todas as
potencialidades de uma pessoa humana qualquer.
O desenvolvimento tecnológico atrelado ao progresso deve encontrar um
meio para que haja a garantia do equilíbrio entre os benefícios a serem alcançados
e o respeito à dignidade da pessoa humana.
Para tanto, as questões polêmicas que, demandam soluções mais complexas
por parte dos operadores do Direito, estas serão resolvidas, utilizando-se da lei, de
um raciocínio jurídico que analisará o contexto social, político, econômico e,
sobretudo moral e ético, com base nos princípios norteadores da Bioética e do
Biodireito e sempre numa atitude multidisciplinar, para evitar a supressão de direitos,
tampouco para que não aconteça o desrespeito às garantias constitucionalmente
garantidas.
Observa-se que, as pesquisas científicas, especificamente as que se utilizam
das células-tronco embrionárias, no Brasil estão ainda em fases iniciais, dada a
regulamentação recente advinda da Lei de Biossegurança, promulgada no ano de
2005, com posicionamentos divergentes na comunidade científica, quanto aos riscos
e benefícios quando da realização destas.
Várias são as teorias existentes acerca do início da personalidade e da
própria vida humana, sustentadas em métodos e critérios diferenciados, ora
biológicos, ora filosóficos, relevantes, pois, servem de parâmetros para formulação
de sanções cíveis, penais, administrativas.
79
É inegável que as técnicas de reprodução assistidas são uma solução para
aqueles que, buscam na biotecnologia uma forma de se resolverem suas
dificuldades em razão da infertilidade, mas, sobretudo, na fertilização in vitro, são
fertilizados mais de um óvulo in vitro, fora do corpo da mulher, trazendo com isso
alguns questionamentos sobre os direitos desses embriões, uma vez que não
gozam de proteção jurídica tal qual o nascituro.
As reflexões morais e ético-jurídicas são importantes, pois, são grandes os
avanços tecnológicos e científicos, que contribuem para a evolução humana,
contudo, por ser uma Ciência sócio-valorativa, a sociedade esperará do Direito, uma
forma equilibrada de se resolverem estas questões, não mais num contexto
meramente normativo, mas o estabelecimento de parâmetros fundados em
princípios, sempre sob a ótica da ética e da moral.
Assim, a terapia com células-tronco embrionárias é considerada como sendo
o futuro da medicina regenerativa. Entre as áreas mais promissoras esta o
tratamento do diabetes, de doenças neuromusculares e doenças neurológicas como
o Mal de Parkinson. Com as células-tronco de embriões será possível ainda,
promover a regeneração de tecidos lesionados por causas não hereditárias como
acidentes ou câncer.
Na “era do conhecimento”, em que vivemos que continue a batalha em
beneficio da saúde humana e contra eventuais tramas do destino e da natureza num
contexto de solidária, compassiva e fraternal legalidade longe de se traduzir em
desrespeito aos congelados embriões in vitro. O que se tem na verdade, é
verdadeiro apreço e reverência a criaturas de natureza humana que sofrem e se
desesperam frente a um infortúnio que muitas vezes lhes parece maior que a ciência
dos homens e a própria vontade divina.
Muitas pessoas ainda sonham com “um novo parto”, que seria o tratamento
com células tronco de embriões inutilizáveis para o fim reprodutivo. Na realidade, tal
situação possibilita ao próprio embrião cumprir sua destinação natural de servir a
espécie dos homens restituindo-o vida em qualidade e quantidade.
Mantendo a esperança sem a qual a vida do homem torna-se fútil, que se
aguarde o amanha, não se apagando a luz que no Brasil surgiu com a Lei de
Biossegurança.
Em relação aos diplomas legais que regem toda e qualquer atividade
relacionada à pesquisa e terapias com células-tronco embrionárias humanas,
80
podemos afirmar com ampla convicção que a sociedade brasileira esta devidamente
amparada legalmente no sentido de patrocinar tais atividades.
81
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87
ANEXOS
ANEXO A – Voto da Ministra Ellen Gracie na Ação Dir eta de
Inconstitucionalidade 3.510-0 Distrito Federal
Supremo Tribunal Federal
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 3.510-0 DISTRI TO FEDERAL
RELATOR: MIN. CARLOS BRITTO
REQUERENTE(S): PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA
REQUERIDO (A/S): PRESIDENTE DA REPÚBLICA
ADVOGADO (A/S): ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO
REQUERIDO (A/S): CONGRESSO NACIONAL
INTERESSADO (A/S): CONECTAS DIREITOS HUMANOS
INTERESSADO (A/S): CENTRO DE DIREITO HUMANOS - CDH
ADVOGADO (A/S): ELOISA MACHADO DE ALMEIDA E OUTROS
INTERESSADO (A/S): MOVIMENTO EM PROL DA VIDA - MOVITAE
ADVOGADO (A/S): LUÍS ROBERTO BARROSO E OUTRO
INTERESSADO (A/S) : ANIS - INSTITUTO DE BIOÉTICA, DIREITOS HUMANOS E
GÊNERO
ADVOGADO(A/S) : DONNE PISCO E OUTROS
ADVOGADO(A/S) : JOELSON DIAS
INTERESSADO(A/S) : CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL -
CNBB
ADVOGADO(A/S) : IVES GRANDRA DA SILVA MARTINS E OUTROS
88
V O T O A Senhora Ministra Ellen Gracie - (Presidente): Senhores Ministros, é
indiscutível o fato de que a propositura da presente ação direta de
inconstitucionalidade, pela delicadeza do tema nela trazido, gerou, como há muito
não se via, um leque sui generis de expectativas quanto à provável atuação deste
Supremo Tribunal Federal no caso ora posto.
Equivocam-se aqueles que enxergaram nesta Corte a figura de um árbitro
responsável por proclamar a vitória incontestável dessa ou daquela corrente
científica, filosófica, religiosa, moral ou ética sobre todas as demais. Essa seria,
certamente, uma tarefa digna de Sísifo.
Conforme visto, ficou sobejamente demonstrada a existência, nas diferentes
áreas do saber, de numerosos entendimentos, tão respeitáveis quanto antagônicos,
no que se refere à especificação do momento exato do surgimento da pessoa
humana.
1. Buscaram-se neste Tribunal, a meu ver, respostas que nem mesmo os
constituintes originários e reformador propuseram-se a dar. Não há, por certo, uma
definição constitucional do momento inicial da vida humana e não é papel desta
Suprema Corte estabelecer conceitos que já não estejam explícita ou implicitamente
plasmados na Constituição Federal. Não somos uma Academia de Ciências. A
introdução no ordenamento jurídico pátrio de qualquer dos vários marcos propostos
pela Ciência deverá ser um exclusivo exercício de opção legislativa, passível,
obviamente, de controle quanto a sua conformidade com a Carta de 1988.
2. Por ora, cabe a esta Casa averiguar a harmonia do artigo 5º da Lei nº.
11.105, de 24.03.2005, (Lei de Biossegurança) com o disposto no texto
constitucional vigente.
Para tal intento, foram apontados na presente ação, como parâmetros de
verificação mais evidentes, o fundamento da dignidade da pessoa humana (art. 1º,
III), a garantia da inviolabilidade do direito à vida (art. 5º, caput), o direito à livre
expressão da atividade científica (art. 5º, IX), o direito à saúde (art. 6º), o dever do
Estado de propiciar, de maneira igualitária, ações e serviços para promoção,
proteção e recuperação da saúde (art. 196) e de promover e incentivar o
desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológica (art. 218, caput).
89
Não há como negar que o legislador brasileiro, representante da vontade
popular, deu resposta a uma inquietante realidade que não mereceu maiores
considerações na peça inicial da presente ação direta.
A fertilização in vitro, como técnica de reprodução humana assistida, tem
ajudado, desde o nascimento da britânica Louise Brown, há quase trinta anos, a
realizar o sonho de milhares de casais com dificuldade ou completa impossibilidade
de conceber filhos pelo método natural.
Porém, a utilização desse procedimento gera, inevitavelmente, o surgimento
de embriões excedentes, muitos deles inviáveis, que são descartados ou
congelados por tempo indefinido, sem a menor perspectiva de que venham a ser
implantados em algum órgão uterino e prossigam na formação de uma pessoa
humana.
Penso que o debate sobre a utilização dos embriões humanos nas pesquisas
de células-tronco deveria estar necessariamente precedido do questionamento
sobre a aceitação desse excedente de óvulos fertilizados como um custo necessário
à superação da infertilidade.
Todavia, conforme registrado nas manifestações juntadas aos autos, essa
relevantíssima questão sobre os procedimentos de reprodução assistida, apesar da
tramitação de alguns projetos de lei, nunca foi objeto de regulamentação pelo
Congresso Nacional, havendo, nessa matéria, tão-somente, uma resolução do
Conselho Federal de Medicina (Resolução 1.358, de 11.11.1992). Recorde-se que a
primeira brasileira fruto de uma fertilização in vitro nasceu em 7 de outubro de 1984.
Portanto, esse era o cenário fático e lacunoso com o qual se deparou o
legislador brasileiro em 2005, quando foi chamado a deliberar sobre a utilização
desses mesmos embriões humanos, inviáveis ou já há muito tempo criopreservados,
nas promissoras pesquisas científicas das células-tronco, já desenvolvidas, em
diversas e avançadas linhas, nos mais importantes países do mundo.
3. No Reino Unido, o Human Fertilisation and Embrilogy Act, legislação
reguladora dos procedimentos de reprodução assistida e das pesquisas
embriológica e genética naquele país, foi aprovada pelo Parlamento britânico em
1990, após amplo debate social, político e científico iniciado em 1982.
O referido Diploma permitiu a manipulação científica dos embriões oriundos
da fertilização in vitro, desde que não transcorridos 14 dias contados do momento da
fecundação.
90
Conforme demonstrou Letícia da Nóbrega Cesarino no artigo Nas fronteiras
do “humano”: os debates britânico e brasileiro sobre a pesquisa com embriões1,
esse limite temporal presente na lei britânica teve como razão a prevalência do
entendimento de que antes do décimo quarto dia haveria uma inadequação no uso
da terminologia “embrião”, por existir, até o final dessa etapa inicial, apenas uma
massa de células indiferenciadas geradas pela fertilização do óvulo.
Segundo essa conceituação, somente após esse estágio pré-embrionário,
com duração de 14 dias, é que surge o embrião como uma estrutura propriamente
individual, com (1) o aparecimento da linha primitiva, que é a estrutura da qual se
originará a coluna vertebral, (2) a perda da capacidade de divisão e de fusão do
embrião e (3) a separação do conjunto celular que formará o feto daquele outro que
gerará os anexos embrionários, como a placenta e o cordão umbilical. Tais
ocorrências coincidem com a nidação, ou seja, o momento no qual o embrião se
fixaria na parede do útero.
Essa formulação científica, que diferencia o pré-embrião do embrião, coincide
com o pensamento de Edward O. Wilson, que ao discorrer, na aclamada o Human
Nature sobre o instante imediatamente posterior à fecundação do óvulo humano,
assim asseverou, verbis:
“The newly fertilized egg, a corpuscle one two-hundredth of na inch in
diameter, is not a human being. It is a set of instructions sent floating into the
cavity of the womb. Enfolded within its spherical nucleus are an estimated
250 thousand or more pairs of genes, of which fifty thousand will direct the
assembly of the proteins and the remainder will regulate their rates of
development. After the egg penetrates the blood-engorged wall of the
uterus, it divides again and again. The expanding masses of daughter cells
fold and crease into ridges, loops, and layers. Then, shifting like some
magical kaleidoscope, they self-assemble into the fetus, a precise
configutation of blood vessels, nerves, and other complex tissues.”
A professora Letícia Cesarino, acima referida, corroborando pensamento de
Michael Mulkay, conclui que a agregação deste conjunto de ‘fatos’ na nova categoria
‘pré-embrião’ permitiu, assim, remover o objeto da experimentação científica do
escopo do discurso moral para inseri-lo num universo técnico.
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4. No Brasil (após inclusão em projeto que objetivava a urgente
regulamentação do processo de liberação dos organismos geneticamente
modificados), surge o art. 5º da Lei 11.105/2005, que autoriza o manejo das células-
tronco embrionárias de uma maneira restrita, com a precaução sempre
recomendada nos primeiros passos dados nos terrenos ainda pouco conhecidos e
explorados.
A primeira restrição imposta diz respeito à indicação do uso das células
embrionárias exclusivamente nas atividades de pesquisa e de terapia.
Outra limitação relevante é a definição de qual universo de embriões
humanos poderão ser utilizados: somente aqueles que, produzidos por fertilização in
vitro – técnica de reprodução humana assistida – não são aproveitados no
respectivo tratamento. Fica clara, portanto, a opção legislativa em dar uma
destinação mais nobre aos embriões excedentes fadados ao perecimento. Por outro
lado, fica afastada do ordenamento brasileiro qualquer possibilidade de fertilização
de óvulos humanos com o objetivo imediato de produção de material biológico para
o desenvolvimento de pesquisas, sejam elas quais forem.
Além de excedentes no procedimento de fertilização in vitro, os embriões de
uso permitido ainda deverão estar dentre aqueles considerados inviáveis para o
desenvolvimento seguro de uma nova pessoa ou congelados há mais de três anos.
Presente, assim, a fixação de um lapso temporal razoável, que leva em conta tanto a
possibilidade dos genitores optarem por uma nova e futura implantação do embrião
congelado quanto a improbabilidade de sua utilização, para esse mesmo fim, após
decorrido um triênio de congelamento.
As restrições não param por aí. É preciso, ainda, para que os embriões
possam ser regularmente destinados à pesquisa, o expresso consentimento dos
genitores e que os projetos das instituições e serviços de saúde, candidatos ao
recebimento das células-tronco embrionárias, sejam anteriormente apreciados e
aprovados pelos respectivos comitês de ética em pesquisa.
Saliente-se que a Lei de Biossegurança, reconhecendo a dignidade do
material nela tratado e o elevado grau de reprovação social na sua incorreta
manipulação, categorizou como crime a comercialização do embrião humano, com
base na lei de doação de órgãos (art. 5º, § 3º), bem como a sua utilização fora dos
moldes previstos no referido artigo 5º. Tipificou, ainda, como delito penal, a prática
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da engenharia genética em célula germinal, zigoto ou embrião humano e a
clonagem humana (arts. 6º, 25 e 26).
5. Assim, por verificar um significativo grau de razoabilidade e cautela no
tratamento normativo dado à matéria aqui exaustivamente debatida, não vejo
qualquer ofensa à dignidade humana na utilização de pré-embriões inviáveis ou
congelados há mais de três anos nas pesquisas de células-tronco, que não teriam
outro destino que não o descarte.
Aliás, mesmo que não adotada a concepção acima comentada, que
demonstra a distinção entre a condição do pré-embrião (massa indiferenciada de
células da qual um ser humano pode ou não emergir), e do embrião propriamente
dito (unidade biológica detentora de vida humana individualizada), destaco a plena
aplicabilidade, no presente caso, do princípio utilitarista, segundo o qual deve ser
buscado o resultado de maior alcance com o mínimo de sacrifício possível. O
aproveitamento, nas pesquisas científicas com células-tronco, dos embriões gerados
no procedimento de reprodução humana assistida é infinitamente mais útil e nobre
do que o descarte vão dos mesmos.
A improbabilidade da utilização desses pré-embriões (absoluta no caso dos
inviáveis e altamente previsível na hipótese dos congelados há mais de três anos)
na geração de novos seres humanos também afasta a alegação de violação ao
direito à vida.
6. Ante todo o exposto, julgo improcedente o pedido formulado na presente
ação direta de inconstitucionalidade.
É como voto.
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ANEXO B – Agravo de instrumento n.º 137.023-0/0-00 – São Bernardo do
Campo – Voto n.º 13.059
Presidente da OAB SP comenta decisão do TJ sobre Na scituro
12/01/2007
Tribunal de Justiça reconhece titularidade do feto como pólo ativo de ação.
Para o presidente da OAB SP, Luiz Flávio Borges D´Urso a decisão do Órgão
Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo, de conceder agravo parcial,
reconhecendo relativamente a capacidade jurídica do feto, por entender que a mãe
está representada, é um avanço, lembrando que se refere à titularidade da ação e
não ao mérito.
"Criou-se um mecanismo que estende ao titular de direito, o nascituro, devidamente
representado pela mãe, seus direitos garantidos judicialmente e previstos na
Constituição Federal", avalia D´Urso. A decisão decorre de um agravo de
instrumento, com pedido de liminar, impetrado pela Defensoria Pública de São
Paulo em favor de presa grávida da Cadeia Pública de São Bernardo do Campo,
que não estava recebendo tratamento pré-natal adequado.
O relator do acórdão, desembargador José Cardinale, argumentou em sua decisão
que "Destarte, admitida, em tese, a possibilidade da presença do nascituro no pólo
ativo da ação, de rigor a anulação do despacho de fl. 44, que determina a emenda
da inicial, ressalvando-se que a legitimidade do nascituro para postular o direito de
sua mãe ao recebimento de tratamento pré-natal deve ser aferido pelo juízo a que
no momento processual adequado, assim como a competência da Vara da Infância
e da Juventude para conhecer e julgar a causa".
Segundo a Defensoria Pública, o feto integrou o pólo ativo da ação, com base no
Estatuto da Criança e do Adolescente, que traz definições claras sobre a proteção
legal à criança, que estaria sendo a principal beneficiada com os exames médicos
que seriam realizados pela mãe. Na primeira instância, o juiz determinou a emenda
da inicial para regularização do pólo ativo da ação, por não reconhecer a
legitimidade do nascituro para demanda em juízo.
Veja a íntegra da decisão.
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Agravo de Instrumento nº 137.023-0/0-00 – São Berna rdo do Campo – Voto nº 13.059
Agravante: Nascituro de
Agravado:
MENOR – Ação proposta por nascituro buscando o atendimento pré-natal à sua
genitora, que se encontra presa – Decisão do juiz a quo que determinou a emenda
da inicial por entender que o nascituro, por não possuir personalidade jurídica, não
tem legitimidade ativa ad causam – Não conhecimento do agravo no tocante ao
pleito que visa a concessão da antecipação da tutela ainda não apreciada em
primeira instância – Nascituro que pode ser parte, desde que representado pelos
genitores ou por quem determina a lei civil – Provimento do agravo apenas para
reconhecer a possibilidade do nascituro vir a juízo, sem adentrar no mérito de sua
legitimidade para a causa presente e, tampouco, a competência da Justiça da
Infância e da Juventude – Necessidade de anulação do despacho que determinou a
emenda da inicial – Agravo conhecido em parte e, na parte conhecida, provido, nos
termos do acórdão .
1.Trata-se de Agravo de Instrumento interposto pelo nascituro de ... em face
de decisão proferida pelo MM. Juízo da Vara da Infância e da Juventude de São
Bernardo do Campo (fl. 44), que determinou a emenda da inicial, para regularização
do pólo ativo da ação de obrigação de fazer com pedido de antecipação da tutela. A
demanda principal busca a proteção dos direitos do nascituro, eis que sua genitora
encontra-se detida em estabelecimento prisional que não oferece condições
mínimas para uma gestação saudável, colocando em risco o nascimento do autor
com vida.
Determinada a emenda da inicial, não restou apreciado o pedido de
antecipação da tutela.
Dessa forma, interpõe o autor o presente agravo com pedido de liminar,
tendente ao reconhecimento da legitimidade ad causam do nascituro para demandar
em juízo e a concessão da tutela antecipada ex vi dos artigos 527, inciso II, 558 e
273 do Código de Processo Civil.
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A liminar foi indeferida (fls. 47/48).
A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo provimento parcial do
agravo (cf. fls. 51/54).
2. Não se conhece do recurso na parte que pleiteia o deferimento por esta
Corte do pedido de antecipação de tutela formulado perante o Juízo a quo e a
citação da ré, ora agravada, para contestar a ação.
Com efeito, determinada a emenda da inicial, o pleito de urgência não restou
apreciado em primeira instância, não sendo lícito à instância revisora manifestar-se
sobre postulação ainda não contemplada pelo julgador monocrático.
Nesse sentido, vale deixar consignado o seguinte excerto do parecer
ministerial:
“Quanto ao pedido de citação e cumprimento de obrigação de fazer, não pode
ser atendido. Como não houve decisão indeferindo nada disso, o recurso não pode
impugnar o nada. Não pode ser conhecido nessa parte” (fl. 54).
3. Na parte conhecida, o agravo comporta provimento.
É a decisão impugnada do seguinte teor, verbis
“Antes do mais, a inicial deverá ser emendada, no prazo de dez dias, pena
de indeferimento, regularizando o pólo ativo e a representação processual, pois em
se tratando de proteção jurídica ao nascituro, desprovido de personalidade civil, ex vi
do art. 2º do novel Código Civil, incumbe aos seus pais o dever de defender os seus
direitos”. (fl. 44).
A questão, cinge-se, portanto, à possibilidade do nascituro vir a juízo.
Eleito o nascituro para integrar o pólo ativo da ação, não poderia o juiz
determinar a emenda da inicial por entender impossível a figuração do feto como
autor em qualquer espécie de demanda. Isso porque, segundo a jurisprudência,
pode o feto, devidamente representado, desde o momento da concepção, ainda que
desprovido de personalidade jurídica, pleitear judicialmente seus direitos:
“Investigação de paternidade – Ação proposta em nome de nascituro pela
mãe gestante – Legitimidade ‘ad causam’ – Extinção do processo afastada.
Representando o nascituro pode a mãe propor a ação investigatória, e o nascimento
com vida investe o infante na titularidade da pretensão de direito material, até então
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apenas uma expectativa de direito” (TJSP – Ap. Cível nº 193.648. Rel. Des. Renan
Lotufo).
Destarte, admitida, em tese, a possibilidade da presença do nascituro no pólo
ativo da ação, de rigor a anulação do despacho de fl. 44, que determina a emenda
da inicial, ressalvando-se que a legitimidade do nascituro para postular o direito de
sua mãe ao recebimento de tratamento pré-natal deve ser aferido pelo juízo a quo
no momento processual adequado, assim como a competência da Vara da Infância
e da Juventude para conhecer e julgar a causa.
4. Por esses fundamentos, aos quais se acrescem os da bem lançada
manifestação da douta Procuradoria Geral de Justiça, não se conhece em parte do
agravo e, na parte conhecida, a ele se dá provimento, nos termos do acórdão.
JOSÉ CARDINALE
Relator