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A Arte Urbana em Maceió Março 2013 edição 01 ano 01 nº 01

Urbanidartes - Arte Urbana em Maceió

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O projeto Urbanidartes nasceu com o objetivo de estimular e divulgar a produção de arte urbana em Maceió.

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A Arte Urbana em Maceió

Março 2013edição 01

ano 01nº 01

ÍNDICE

13. Joe Santos

15. Jorge Schutze

17. Grupo Pupa

19. Rodrigo Simplez

6. Bruno Brandão

7. Bruno Zagri

10. Gustavo Costa

11. Camila Alves

CONTATOS:

[email protected] Facebook: Urbanidartes

QUEM FEZ

Maryana Santos reportagem

Myllena Diniz reportagem

Natália Oliveira reportagem

Renata Menezes reportagem e edição

Rodolfo Ventura diagramação e edição de arte

AGRADECIMENTOS:

Aos artistas que contribuí-ram concedendo as entre-vistas e aos parceiros na divulgação do projeto.

PROJETO URBANIDARTES

As intervenções art íst icas surgem em Maceió como uma oportunidade de levar a arte e suas reflexões àqueles que pouco sabem sobre a existência dela. Com a arte urbana, aos pou-cos, o cenário maceioense ganha cores e movimentos que vão de encontro aos tradicionais: As intervenções com performances destoam da movimentação de pessoas que caminham pé-ante--pé em direção aos seus trabalhos; os graf ites, estênceis, desenhos e tantas outras formas de artes visuais impressas em paredes servem como forma de embelezar ruas, fazer denúncias ou levantar reflexões. Apesar do grande contraste com a paisagem urbana, essas intervenções parecem invisí-veis aos olhares distraídos dos transeuntes, que muitas vezes ignoram os art istas e suas obras e seguem suas vidas, pensando que a arte é encontrada apenas dentro de museus e galer ias de arte. Sabendo da deficiência das pessoas em perceber que a arte lhes cerca até mesmo nos pontos de ônibus, surge o Urbanidartes. O pr incipal objet ivo do projeto é de servir como espaço de catalogação da Arte Urbana em Maceió para que os moradores da cidade consigam enxergá-las como obras tão art íst icas quanto as que estão trancafiadas em museus. Além disso, o es-paço pretende ser incentivador da prát ica de intervenções urbanas e disseminador de reflexões a respeito do assunto.

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Bruno Brandão

Há três anos, quem passa-va pelo corredor entre os bairros de Jaraguá e Pajuçara se deparava com uma simpática pintura de Charlie Chaplin próxima a um banco de praça. A imagem durou pouco tempo na parede, cerca de seis meses, devido ao vandalis-mo. Hoje está coberta por tinta preta e resta apenas a lembrança do ícone do cinema mundial que dava boas-vindas aos turistas que chegavam de navio. Feito por Bruno Br, o dese-nho foi realizado graças à técnica

do Stencil, que utiliza um molde vazado para reproduzir a imagem em superfícies. O artista conta que aprendeu a usar a técnica em 2008 e passou a aplicá-la em camisetas para vender. Com o tempo, ob-servando outros artistas, como Banksy, percebeu que era possível fazer imagens maiores para aplicar em paredes e passou a trabalhar também com a decoração de inte-riores, decorando principalmente quartos de amigos. Em 2009, fez sua primeira pintura em local público, num ponto de ônibus próximo à sua casa. De lá pra cá, somente mais duas pinturas foram realizadas pe-

las ruas de Maceió: dois cachorros na ponte do Riacho Salgadinho, cobertos uma semana depois pela prefeitura, e o Charlie Chaplin de Jaraguá. Das três pinturas, apenas a do ponto de ônibus, mais antiga, sobrevive. Bruno conta que o interes-se pelas artes visuais surgiu ainda na infância. Por causa disso, quan-do tinha oito anos, foi matriculado por seus pais em aulas de Artes Plásticas com o artista Ednilson Sales. “As aulas foram importantes para ter noções sobre as técnicas usadas para desenhar, principal-mente sombreamento, perspectiva e profundidade”, explica Bruno. Apesar das técnicas apren-didas na infância, foi com o Stencil que Bruno Br encontrou seu estilo. Suas pinturas são marcadas por desenhos em vetor que seguem a estética do branco e preto. Das aulas com Ednilson, ficou o gosto por desenhar natureza morta e, por isso, os principais elementos de sua pintura são peças de mo-biliário urbano, como postes de iluminação e bancos de praça. Quando questionado sobre o motivo para não ter realizado mais pinturas pela cidade, Bruno explica que pesa o medo de ser autuado pela polícia, mas que isso não significa que não voltará a pintar.

Bruno Brandão por Renata Menezes

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Bruno Zagripor Myllena Diniz

Há doze anos, o carioca Bruno Zagri tem colorido a cidade do Rio de Janeiro e circuitos cul-turais das artes urbanas. Há três, o artista transformou o grafite em sua principal fonte de renda - ao lado da ilustração, do desenho e da serigrafia. Ele tornou sua marca inconfundível, com estética lúdica, subliminar e sutil. Agora, instala-do em Maceió, o artista pretende difundir a Arte Urbana na capital alagoana. Criado na Favela de Man-guinhos, Zagri encontrou nas artes uma forma de expressão e de refú-gio. A paixão pelo desenho surgiu para um menino de apenas onze anos de idade, em meio ao cenário de violência, tráfico de drogas e opressão. “Eu cresci numa favela onde a violência e o tráfico de dro-gas estavam sempre presentes, mas minha família me protegeu desse universo. Então, eu passei muito tempo em casa e comecei a desen-volver habilidade com o desenho. Nessa época, minha arte era mais introspectiva. Era o reflexo da reali-

dade em que eu vivia”, relembra. De garoto que gostava de desenho para artista urbano não demorou muito. Aos 14 anos, Zagri conheceu o grafite em projeto desenvolvido na escola, estimulado por um grupo que também tinha como vertentes o rock e o skate. Em 2005, foi bolsista do Centro de Cultura do Rio de Janeiro, onde teve aulas de pintura, desenho e serigrafia. Anos depois, Zagri já dava aulas para pessoas de todas as idades. “Negro, nascido na favela e sem formação acadêmica: essa era a minha realidade. Mas, eu fui atrás de aprendizado e de formação. Com o tempo, eu já trabalhava com restauração de patrimônio e dava aulas de grafite em escolas públicas, no Centro de Cultura do Rio e na UVA [Universidade Veiga de Almeida]”, destaca. As referências de Zagri são encontradas nos Estados Uni-dos, na Europa e, até mesmo, no Nordeste brasileiro. Do britânico Banksy ao paraibano Shiko, as obras do artista carioca também passam pela influência dos trabal-hos do espanhol Ariz, considerado

por ele um contemporâneo de identidade visual única.

Dois momentos A trajetória de Zagri é marcada por duas fases. As primeiras intervenções artísticas do carioca possuem caráter de protesto e são ricas em crítica so-cial. Em 2009, seu trabalho passou por transição decisiva e ganhou mais cores. O novo momento do artista trouxe elementos lúdicos, esperançosos e alegres. “Comecei com artes sub-versivas, de protesto, fruto da re-alidade de quem vive numa favela e está sempre sendo abordado pela polícia. Mas, esses trabalhos não surtiram efeito no meio social. As pessoas não absorviam a men-sagem, principalmente pelo fato de muita gente não ser politizada. Então, comecei a fazer desenhos mais lúdicos. Eu percebi que a esperança estava nas crianças e passei de um momento obscuro para um mais alegre”, revela. Com mais cor e leveza, os trabalhos passaram a ter identi-dade própria. A arte do jovem de Manguinhos contrastou com

Bruno Zagri

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a poluição sonora e visual das grandes cidades. “Quando eu vivia no seio da marginalidade, eu que-ria chocar. Quando eu criei minha própria identidade, deixei de lado a função social e comecei a usar as cores. Megalópoles como Rio de Janeiro e São Paulo vivem sob o caos. Há excesso de propaganda, engarrafamento e barulho. Através do meu trabalho, eu passei a incentivar coisas boas e a produzir mensagens de modo sutil”, salienta o artista. Muitas obras de Zagri ex-ploram o jogo das aparências. Em alguns casos, personagens feios e mal tratados estão escondidos em fantasias de ursos fofos. “As aparências enganam e eu mostro isso no meu trabalho. Há ursinho fofo, mas tatuado. Há persona-gens feios, mas que dizem ‘ame’.

Há sociopatas por trás de fantasias bonitas”, ressalta. O mesmo acontece em O Soldado Brasileiro. O artista brin-ca com a realidade dos soldados brasileiros e deixa seu personagem vestido de modo improvisado. A panela é o capacete e a tampa, o escudo; os pés estão praticamente descalços e a roupa, rasgada.

Compromisso e dedicação O reconhecimento chegou para alguém que nunca esperou re-sposta ou financiamento do gover-no para levar a arte à população em situação de vulnerabilidade socio-econômica. Com próprio recurso, Bruno Zagri já realizou exposição em sua casa e abriu as portas de sua residência para a comunidade, no período em que morou na Favela da Maré, também situada no Rio de

Janeiro.O artista também levou o conhe-cimento do grafite para jovens e adultos da favela Manguinhos. As atividades trouxeram oportuni-dades para os moradores da co-munidade e renderam ao artista o prêmio Mais Cultura, promovido pelo Ministério da Cultura (MinC), em 2011.As intervenções artísticas na ci-dade do Rio de Janeiro são, ainda, destaque no documentário Aerosol Carioca, do jornalista Lu Olivero, em fase de elaboração. O grafite de Bruno Zagri também é uma das apostas da produção Parce, do argentino Martín Escriche.

Maceió: parede ainda em branco “Tudo o que um artista urbano quer é uma parede grande e lisa”, afirmou o artista carioca.

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Há um mês morando em Maceió, Zagri percebe que o grafite ainda sofre preconceito na capital de Alagoas e que não tem espaço no circuito cultural do Estado. A terra dos marechais ainda é uma pare-de em branco à espera de inter-venções e de conscientização. De acordo com o artis-ta, a capital alagoana ainda não reconhece o grafite como ex-pressão artística. Para ele, grande parte da população local associa a arte de grafitar ao vandalismo da pichação. “No Rio, o grafite é rentável, é valorizado. Aqui, as pessoas não exploram tanto essa esfera artística. Por isso, eu quero trazer para Maceió, de modo mais sólido, a ideia de que o grafite está impregnado na moda, no design,

nas propagandas, nas produções cinematográficas e em tantas out-ras áreas. Eu quero que a inter-venção urbana seja uma realidade aqui”, relata. O carioca também revela planos que prometem estimular o movimento de arte urbana na cidade e inserir bairros perifé-ricos no circuito cultural. “Nós queremos montar um coletivo na cidade, que envolva não só o grafite, mas as artes urbanas de modo geral. A cultura é muito rica no Nordeste, mas pouco explorada em Alagoas. O que vem daqui é muito original e merece destaque. Estamos nos articulando para o surgimento de um coletivo que irá movimentar bairros como o Graciliano Ramos, para que a arte

- um patrimônio público - esteja ao alcance de todos”, enfatiza. Zagri ainda reforça que grafite e pichação não andam jun-tos e têm objetivos distintos. Para ele, o pichador não possui for-mação política e reflete a própria alienação em sua atividade. “O grafite é uma linguagem atual, que ainda está engatinhando. É algo transformador, que leva autoes-tima e dignidade para as pessoas. O grafite torna o ambiente mais agradável. A pichação, por sua vez, é uma rasura. O pichador é alienado, é alguém que não teve instrução e que precisa aprender a fazer arte. O grafite tem história e fundamento, já a pichação é vandalismo e só alimenta o ego de quem a faz”, refletiu.

“Nós queremos mon-tar um coletivo na cidade, que envolva não só o grafite, mas as artes urbanas de modo geral. A cultura é muito rica no Nordeste, mas pouco explorada em Alagoas. O que vem daqui é muito original e merece destaque”

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Gustavo Costa

Gustavo Costa faz arte urbana usando lápis, canetas Nanquim e marcadores coloridos em postes de Maceió e almeja começar a colar grandes mandalas na cidade em breve. O artista co-meçou a desenhar há quatro anos, quando cursava o terceiro ano do ensino médio, instigado principal-mente pela internet, considerada uma espécie de escola por muitos graffiteiros, onde a arte urbana é difundida mundo afora. A arte urbana, assim como qualquer outra, deixa um impacto, uma mensagem, podendo ser in-terpretada pelo receptor de dife-rentes maneiras. Segundo Gus-tavo, o que lhe move a desenhar é justamente essa possibilidade. “O que me move é a esperança de colocar algo de diferente na vida de quem passa, ou de incentivá-las a modificar positivamente o seu redor”, explica.

Mesmo não seguindo uma referência específica, Gustavo confessa que admira o trabalho de artistas que utilizam o contraste do preto e branco, além de formas geométricas, estética usada em seus trabalhos. Durante sua curta tra-jetória, já participou de quatro exposições, sendo uma delas em Garanhuns, Pernambuco, durante o famoso Festival de Inverno que acontece no mês de julho. Por não gostar de ser pressionado, Gusta-vo não trabalha sob encomenda, apenas vende trabalhos prontos. Já no cenário local, ele acredita que a arte urbana de Maceió está ressur-gindo e tem esperança de contri-buir com esse desenvolvimento brevemente.

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Gustavo Costapor Natália Oliveira

Gustavo Costa

Foto: Gustavo Costa

“O que me move é a esperança de colocar algo de di-ferente na vida de quem passa, ou de incentivá-las a mo-dificar positivamen-te o seu redor”

Foto: Gustavo Costa

Camila Alves se interes-sa por pintura desde a infância. Fascinada pelas cores e formas, a artista tenta usar a arte como for-ma de se comunicar com o outro. “A arte, para mim, é uma forma de me expressar, de comentar, de gritar o que todos não querem aceitar, não querem ver, mas que existe”, ressalta Camila. Nem tudo na vida é belo, e é isso que Camila quer transmitir em suas pinturas: a realidade, que nem sempre é feita só de coisas boas. “A arte também tem que

Camila Alves

protestar”, reforça. Sua primeira pintura foi realizada quando freqüentava as aulas na Escola de Artes Paesi dei Balocchi, na Itália e contava sobre a imaginação de uma criança cha-mada Holly Heuser, que relaciona-va o ciclo menstrual a um bule de café. “O quadro ilustrava um robô feito de latinhas de Campbell’s, bules e xicaras de café, em plena crise menstrual, bem colorido e divertido, com as pernas abertas sobre absorventes”, descreve Ca-mila. Ainda durante sua mora-

dia na Itália, a artista optou por fazer diversos cursos ligados ao universo artístico, e, em busca de novos materiais, descobriu as canetas Posca, um marcador de tinta multiuso, que proporcionou uma importante inovação em suas esculturas e telas em MDF. Camila começou a fazer arte urbana depois de ingressar no curso de Publicidade e Propa-ganda, em Maceió, onde conheceu Rodrigo Simplez, grafiteiro, com quem trocou experiências sobre arte. A partir de então, passou a dar cor às paisagens urbanas de Maceió com desenhos geralmente delicados, feitos com as canetas Posca, mas seus temas são bas-tante variados. “Não tenho só um objetivo, minhas artes querem causar sentimentos e por isso não pretendem passar só uma mensa-gem. Os temas são inúmeros, os projetos são grandes, os persona-gens infinitos e sempre aperfeiçoa-dos”, explica. Quando questionada sobre o que lhe leva a realizar inter-venções urbanas, ela explica: “O lugar, a vida, o clima, as pessoas me inspiram para falar um pouco mais do que não é propriamente dito. Através das cores posso ilus-trar um pouco do nosso dia a dia, aquele que o ser humano prefere não encarar”. Ela ressalta ainda sua preferência por pintar em lugares agitados e diz que mesmo pintan-do em locais fechados está sempre cercada de amigos que comparti-lham com ela da mesma experiên-cia. “Poucas vezes minhas pinturas aconteceram em um lugar fecha-do, onde eu estava sozinha, um lugar sem cor e sem movimento. Sempre pintei em lugares muito agitados, cheios de pessoas falan-do, dançando, ouvindo música, comendo, em puro estado de mo-vimento e euforia, isso me inspira”, conta.

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Camila Alvespor Maryana Santos

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12Camila Alves.

Fotografia: Bia Chinatsu

Fotografia: Bia Chinatsu

“Não tenho só um objetivo, minhas artes querem causar sentimentos e por isso não pretendem passar só uma mensagem. Os temas são inúmeros, os projetos são grandes, os personagens infinitos e sempre aperfeiço-ados”

Com pinturas de seres que estão entre o humano e o extrater-restre, Joe Santos dá vida a muros degradados pelo abandono desde 2012. Apesar do pouco tempo, já realizou pinturas em diversos bairros, dentre eles Feitosa, Jacare-cica, Jatiúca, Mangabeiras e Ponta Verde. Joe conta que a preferência por muros abandonados não sur-giu à toa. Além do desejo de em-belezá-los, dessa forma é mais fácil evitar possíveis problemas com a polícia, já que a prática do grafitti em prédios particulares ou perten-centes ao patrimônio público sem autorização ainda é criminalizada. Muito antes de pintar nas ruas, Joe Santos já demonstrava interesse pelas artes visuais. “Eu desenho desde moleque”, conta

Joe Santoso artista. Na adolescência, sua tia lhe matriculou em um curso de pintura, em que passou dois meses. Depois disso, decidiu ser autodidata e, já em 2009, seus desenhos deixaram de ser apenas um hobby e Joe começou a pintar em telas, que até hoje ainda são comercializadas, geralmente entre seus amigos, com preços entre 40 e 200 reais. O interesse por fazer arte urbana surgiu depois. “Eu senti a necessidade de pintar na rua para ter contato direto com quem consome a arte, no momento da criação”, explica. No começo de 2012, o artista se inscreveu no edital Compacto.Arte, lança-do pelo Coletivo Popfuzz, e foi selecionado para intervir na sede da organização. Depois da inter-venção, realizada em parceria com o amigo Lucas, o interesse au-mentou. “Chamei o Lucas e fomos

pintar na Praça do Skate, logo depois conheci o Simplez e come-çamos a pintar juntos. De lá pra cá as coisas vêm fluindo bem”, conta Joe. Admirador de artistas famosos, como Os Gêmeos, René Magritte, Van Gogh, Maurits Escher e o alagoano Suel, Joe acha que seus desenhos ainda não possuem uma unidade, já que os temas e as inspirações variam de caso em caso. “Eu faço reflexões diversas, às vezes me inspiro em músicas, às vezes foco em situa-ções do cotidiano, mas o que mais me inspira é o local da pintura, procuro usar o próprio local como parte da arte”, explica o grafiteiro.

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Joe Santospor Renata Menezes

Foto: Renata Menezes

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Joe Santos

Foto: arquivo pessoal do artista

Foto: arquivo pessoal do artista

“Eu senti a ne-cessidade de pintar na rua para ter contato direto com quem consome a arte, no momento da criação.”

Jorge Schutze

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Foto: Thiago Sam

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O professor de dança Jorge Schutze começou a realizar inter-venções urbanas pela necessidade de entender as formas de relação entre artista e espectadores e as possíveis construções que podem nascer daí. “Eu percebi que dan-çar sozinho em uma sala fechada não era tão rico em respostas para mim, aí comecei a fazer na rua, que é um espaço mais vivo”, expli-ca. O primeiro trabalho reali-zado em Maceió, onde vive há 12 anos, foi “Estado de Graça”, que tinha relação direta com o escritor Graciliano Ramos e com Alagoas, que, para Jorge Schutze, é um Es-tado cômico. “A primeira sensação que eu tinha quando cheguei era de que Alagoas era um Estado sem valores, a própria vida não tinha valor aqui”, explica. Depois do primeiro tra-balho, Schutze se uniu a outros dançarinos e assim foi criada a Companhia Limitada (Cia Ltda), em 2006. O nome foi dado devido à queda no número de partici-pantes, mas depois suscitou novas reflexões a Jorge, que começou a atribuir nomes jurídicos às per-formances realizadas pelo grupo,

com o objetivo de desdobrar novos significados para eles. “O nome do grupo vem de um termo jurídico que significa que a em-presa tem um número reduzido de sócios e, no caso da Companhia, ele significava que temos uma limitação, não só no número de pessoas, mas porque nós temos li-mites estabelecidos por nós e pelo meio”, detalha o dançarino. Dessa forma, o primeiro trabalho realizado com o grupo Cia. Ltda. foi chamado de “Socie-dade Anônima”, buscando refletir sobre o lugar das pessoas que formam o povo dentro da socieda-de. “Eu nem sei o que significa o termo juridicamente, mas o nome me interessava porque parece que a gente é uma sociedade, mas que a gente não tem nome socialmen-te. Você mora em tal lugar, mas não é uma pessoa. Pessoa é o pre-feito, o resto é povo, colocado em um tom só, sem individualidade”, ressalta. Depois de “Sociedade Anônima”, vieram mais trabalhos com o mesmo foco: “Registro Ge-ral”, “Recursos Humanos” e “Estu-dos Sociais”, entre outros. “Como minha vontade era de mexer com o que está instituído na socieda-de, esses nomes vieram a calhar”, conta Jorge.

Além dos trabalhos rea-lizados em grupo, Jorge Schutze atua sozinho nas ruas com o projeto “Despacho”, que está em desenvolvimento desde 2009. Ele explica que a performance surgiu espontaneamente, desde a core-ografia até seu nome. “Eu estava na rua, dançando sem nenhuma pretensão de fazer arte, quando passou um cara e falou ‘isso não é uma dança, é um despacho’, a intenção era de tirar onda, mas o nome caiu como uma luva”, conta Jorge. “Despacho” é provavel-mente o trabalho mais amadureci-do de Jorge, já que as intervenções do público, tão buscadas por ele, estão presentes em todo o proces-so de criação. Ele mesmo confirma a totalidade da obra e afirma: não tenho vontade de criar um quebra nozes, só quero evoluir “Des-pacho”, transcender, o que não consegui ainda. Segundo ele, sua intenção nunca foi de criar obras esteticamente convincentes para levar aos palcos, mas sim levantar questões sobre o mundo em que vivemos, sobre como torná-lo mais humano. Enquanto professor, Jorge desenvolve com seus alunos um trabalho que também foca a inte-ração entre espectadores e dança-rinos. Segundo ele, não interessa ao grupo a criação de uma obra fechada, acabada, mas sim o pro-cesso de desenvolvimento, já que até mesmo os ensaios são realiza-dos em locais públicos, o que leva a performance a ser construída junto com o espaço. “Nossa obra é ir, testar, ver, encantar, assus-tar, colocar o que a gente faz em contato com o povo. Não tem um objetivo final, o objetivo é aqui, presente, agora”, ressalta.

Para saber mais, acesse: http://companhialimitda.blogspot.com.br/

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Jorge Schutzepor Renata Menezes

Foto: Glauber Xavier

O gosto pela arte incen-tivou a criação do grupo Pupa, formado inicialmente por Arlindo Cardoso, Lucas Cardoso e Daniel Cavalcante. Através da curiosida-de e interesse pela atividade ar-tística, os componentes do grupo foram inspirados principalmente por pesquisas e estudos na inter-net. Rodeados pela falta de conhecimento e motivados em transmitir a arte para as pessoas sem que elas precisem ir a museus, galerias de arte e outros - até pela carência dos mesmos na cidade –, decidiram pesquisar formas que pudessem transmitir alguma men-sagem para a sociedade. Foi então que conheceram o significado da expressão “intervenção urbana”. Em busca do objetivo de

PupaIntervenções Urbanas

obter uma sociedade mais sensi-bilizada, o grupo criou um curso de intervenção urbana como um programa de extensão do Instituto Federal de Alagoas (IFAL), com o auxílio e iniciativa da professora Eliza Magna, que ao fim trouxe para o Pupa mais uma integrante, Bianca Melo. Tendo como referência para suas intervenções o grupo Poro, de Minas Gerais, os inte-grantes buscam transmitir refle-xões baseadas em conceitos e críti-cas para sociedade. “A intervenção urbana é muito mais do que uma arte para colorir as cidades, é uma arte que, em seu contexto históri-co, foi utilizada em questões polí-ticas e também como uma forma de defesa aos direitos das pessoas”, ressaltam os integrantes do Pupa. Arlindo reforça que “a in-tervenção é uma expressão como a pintura, só que é uma expres-

são que acaba atribuindo muitas outras expressões em uma só, então quando você vai fazer uma intervenção, acaba tendo uma re-lação muito grande não só com a relação de fazer arte, mas também com a questão do que essa arte pode envolver nas pessoas, porque quando você faz a intervenção você está mexendo com os senti-mentos das pessoas. Quando você acaba colocando uma obra num espaço público, está fazendo com que uma pessoa possa relembrar de acontecimentos que podeser muito bom para elas”. A primeira intervenção do grupo foi realizada no Edifício Brêda, localizado no Centro de Maceió. A idéia surgiu quando perceberam que nos arredores daquele local as pessoas não se comunicavam, porque vivam na correria, buscando somente consumir. Vendo que faltava mais

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Pupapor Maryana Santos

Foto: arquivo pessoal dos artistas

sensibilidade nas pessoas, deci-diram levar balões carregando mensagens de autoajuda, que fo-ram lançados do último andar do edifício, fazendo com que as pes-soas passavam ali pudessem parar um pouco e refletir. Mesmo com o pouco entendimento das pessoas sobre o sentido da intervenção – algumas pensaram que os balões carregavam dinheiro -, o principal objetivo, que era a interação, foi alcançado. O grupo acredita que, para a intervenção urbana se destacar e diminuir o preconceito de muitos, é necessário cultivar a sensibilida-de na educação desde a infância, através de uma nova metodologia de ensino artístico, despertando e interesse e amor pela arte, para que a arte não seja vista apenas como mais uma disciplina, mas sim como forma de expressar sen-timentos, construindo indivíduos mais sensíveis.

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Foto: arquivo pessoal dos artistas

Foto: arquivo pessoal dos artistas

“A intervenção é uma expressão como a pintura, só que é uma ex-pressão que acaba atribuindo muitas outras expressões em uma só,”

Rodrigo Simplez19

Foto: Natália Oliveira

Num dia difícil, andar pelas ruas e se deparar com um muro inusitado, apreciar a arte por uns segundos e depois seguir sua rotina, com um ar revigora-do, esquecendo os problemas aos poucos. Essa é a recompensa para Rodrigo Araújo, mais conhecido com Esy pelos companheiros de arte urbana. Rodrigo é um estudante de publicidade que tem a arte nas mãos. Bem antes de começar a graffitar, quando ainda era crian-ça, já desenhava e se interessava por arte. Na 5ª série do ensino fundamental, descobriu o graffiti e decidiu que queria fazer isso, o que viria a se realizar em 2007. “Graffiti é um trampo que você faz e não tem dono, um filho que você solta. Todo mundo pode ver, a galeria está exposta”, diz. Os primeiros passos de Rodrigo foram inspirados em trabalhos estrangeiros. Apesar de continuar admirando graffitis de outros países e cidades, principal-mente os de São Paulo e Salvador, cuja riqueza cultural é refletida diretamente no trabalho dos graffiteiros, Rodrigo passou a se desprender de alguns modelos e a buscar criações próprias. A bus-ca por esse estilo próprio refletiu até mesmo em sua assinatura: antigamente, assinava suas artes como “Esy”, porém, procurando algo mais simples, característico e menos influenciado pela cultura norte-americana, adotou o codi-nome “Simplez”. Antes de mais nada, Ro-drigo alerta que o graffiti não é de cunho comercial. Para ele, é uma arte desprendida que deve ser feita somente na rua ou não tem valor. Seu primeiro graffiti foi simples: uma idéia posta num desenho, um saco de tinta em pó, bisnaga e

um spray. Foi assim que Rodrigo engatinhou para a arte urbana. Em sua opinião, o elevado preço dos materiais não é um empecilho quando o assunto é graffitar. Até tinta guache serve. Muitos grafiteiros adaptam o espaço à arte que desejam fazer. Sempre buscando coisas novas, Rodrigo se inspira em momentos cotidianos, ao observar uma re-vista, cena de um filme, inclusive ao reparar na expressão facial de alguém que cruzou seu caminho, diferenciando seu processo de criação dos demais artistas urba-nos. Ele escolhe um muro, prepa-ra o desenho, servindo como base, e começa a deixar sua marca nas ruas. Do início ao fim, o graffiti é uma prática prazerosa. O resul-tado é de grande expectativa, mas, o melhor momento é ver a arte se desenvolvendo, principalmente se for uma atividade em grupo, onde cada um compartilha ideias, brinca e a criação flui mais leve e divertida. Música é fundamental durante o processo, mas só depois das marcações serem feitas no

muro, já que é preciso concentra-ção nesse momento. O graffiti é um dos ele-mentos do hip hop e, com isso, um bom rap não pode faltar. Rodrigo ouve Criolo, Emicida, mas, como um autêntico nordestino, não deixa de apreciar forró. Até death metal está em seu repertório. No entanto, o que realmente influen-cia a trilha sonora de seu trampo é a vibe do momento. Com uns rabiscos aqui e ali, Rodrigo montou um persona-gem caolho num muro localizado na Avenida Comendador Gustavo Paiva, próximo ao Lar São Do-mingos, em Cruz das Almas. O muro também foi graffitado por outras pessoas de seu grupo numa manhã de domingo. Segundo Rodrigo, sempre que tem mate-rial, ele vai à rua para graffitar, às vezes chegando a dez trampos por mês. Até hoje, ele ainda não se considera como artista. É apenas um pintor, que aprecia todos seus trampos, à espera de um graffiti para ser eleito o melhor de sua trajetória.

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Rodrigo Simplezpor Natália Oliveira

Foto: Natália Oliveira