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1 RICARDO HENRIQUE DE JESUS PARÂMETROS POLÍTICOS, HISTÓRICOS E LEGAIS ENTRE AS CARTAS MAGNAS DE 1824 E 1988

Versão final ciência política

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RICARDO HENRIQUE DE JESUS

PARÂMETROS POLÍTICOS, HISTÓRICOS E LEGAIS ENTRE AS CARTAS

MAGNAS DE 1824 E 1988

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“Há, para todas as coisas, um tempo determinado por Deus.3.1. Tudo tem seu tempo determinado, e há tempo para todo propósito debaixo do céu.2. Há tempo de nascer, e tempo de morrer; tempo de plantar e tempo de se arrancar o que se plantou;3. Tempo de matar, e tempo de curar; tempo de derrubar, e tempo de edificar;4. Tempo de chorar, e tempo de rir;Tempo de prantear, e tempo de dançar;5. Tempo de espalhar pedras, e tempo de ajuntar pedras; tempo de abraçar, e tempo de afastar-se de abraçar;6. Tempo de buscar, e tempo de perder; tempo de guardar, e tempo de lançar fora;7. ... tempo de estar calado, e tempo de falar.” Ec.3:1 a 7.

Dedico este estudo a minha esposa e companheira pelos seus incentivos e, em especial, a orientadora Maria da Gloria D. Medeiros pela contribuição e orientação na primeira

parte do estudo.

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RESUMO

A Constituição é norma suprema da nação, ordenamento jurídico maior em que subsume todo sistema de regras normativas do país, ponto de alicerce e respaldo para formação do sistema de normas, além de estruturar as balizas para a organização político-administrativa do Estado. É fonte principal da instituição do Estado Democrático de Direito e formação do Estado Constitucional. Esta pesquisa teve por objetivo analisar se no contexto legal, histórico e político, a Carta Magna de 1988 tem parâmetros de congruência política, histórica e legal com a Carta Magna outorgada em 1824, descrevendo o contexto político e legal da Carta Política de 1824; esclarecendo contexto político e legal da Carta Política de 1988 e estabelecendo comparações, influências e similitudes entre as duas Cartas Políticas. Para alcançar esses objetivos, este estudo propôs uma pesquisa exploratória bibliográfica e documental, de caráter qualitativo, onde se observou o contexto evolutivo- histórico e político da formação do Estado de Direito no âmbito constitucional, narrando em seus vários aspectos tudo que influenciou, por concorrer diretamente para, o surgimento da Carta Constitucional do Império e da Carta Magna de 1988, percebendo-se que tanto numa Carta quanto na outra houve uma crise pela luta do Estado Constitucional, primeiramente, com a Monarquia Constitucional e a influência do liberalismo político e econômico da época e a luta pela institucionalização do Estado Democrático de Direito e suas bases, em virtude do regime de exceção de direitos civis, políticos e sociais vividos na época.

Palavras-chave: Constituição de 1824-1988. Comparações. Influências. Similitudes.

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ABSTRACT

The Constitution is the Supreme Law of the nation, greater legal order in which subsume all normative rules system of the country, the Foundation and support for formation of standards system, in addition to structuring the beacons for the political-administrative organization of the State. Is major source of institution of the democratic State of law and formation of Constitutional State. This study aimed to analyze the legal, historical and political context, the Carta Magna of 1988 has parameters of political, historical and legal congruence with the Magna Carta granted in 1824 by describing the political and legal context of the Political Charter of 1824; clarifying political and legal context of the 1988 policy and establishing comparisons, influences and similarities between the two policies. To achieve these objectives, this study proposed a bibliographical and documental research exploratory, qualitative character, where he observed the evolutionary context-historical and political training formation of the rule of law in the constitutional context, narrating in his various aspects all influenced, by competing directly for the emergence of the Constitutional Charter of the Empire and of the Carta Magna of 1988, realizing that both in Letter and in another there was a crisis for the fight of the Constitutional State, first, with the Constitutional Monarchy, and the influence of political and economic liberalism of the time and the struggle for the institutionalization of the democratic State of law and their bases, by virtue of the exception regime of civil, political and social rights experienced at the time.

Keywords: Constitution of 1824-1988. Comparisons. Influences. Similarities

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................ 6

1 CONTEXTO POLÍTICO, HISTÓRICO E LEGAL DA CARTA POLÍTICA DE 1824 ...................................................................................................... 9

2 CONTEXTO POLÍTICO, HISTÓRICO E LEGAL DA CARTA POLÍTICA DE 1988 ...................................................................................................... 21

3 COMPARAÇÕES, INFLUÊNCIAS E SIMILITUDES ENTRE AS CARTAS CONSTITUCIONAIS 1824/1988 ................................................................ 41

CONCLUSÃO ................................................................................................. 48

REFERÊNCIAS................................................................................................ 50

ANEXOS ......................................................................................................... 52

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INTRODUÇÃO

A Constituição é norma suprema da nação, ordenamento jurídico maior em

que subsume todo sistema de regras normativas do país, ponto de alicerce e

respaldo para formação do sistema de normas, além de estruturar as balizas para a

organização político-administrativa do Estado. É fonte principal da instituição do

Estado Democrático de Direito e formação do Estado Constitucional.

O presente trabalho visa verificar se no contexto legal, histórico e político, a

Carta Magna de 1988, tem parâmetros de congruência política, histórica e legal com

a Carta Magna outorgada em 1824. Neste diapasão, procurou-se descrever o

contexto político e legal da Carta Política de 1824 e de 1988, estabelecendo

comparações, influências e similitudes entre as duas Cartas Políticas.

Para alcançar esses objetivos, este estudo propôs uma pesquisa exploratória

bibliográfica e documental, de caráter qualitativo, onde se observou o contexto

evolutivo- histórico e político da formação do Estado de Direito no âmbito

constitucional, narrando em seus vários aspectos tudo que influenciou, por concorrer

diretamente para o surgimento da Carta Constitucional do Império e da Carta Magna

de 1988.

Primeiramente sobre o contexto político, histórico e legal da Carta Política de

1824, verificaram-se vários aspectos que incidiram para que houvesse razões

suficientes para respaldar a decisão de elaborar a Carta Política do Império e, neste

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aspecto, passou-se a contextualizá-los para haver maior compreensão do

desenvolver dos acontecimentos.

A crise do sistema colonial, dando início ao fortalecimento em alta escala do

capital industrial, onde as idéias de Adam Smith de crítica à política mercantil,

restrições a monopólios, a tratados comerciais e trabalho escravo, foi abordada

levando-se em ênfase o enfraquecimento do Sistema Colonialista.

As influências liberais da Europa que movimentavam a vida Política e a febre

do liberalismo também foram aspectos de referência no tema abordado.

O sentido do constitucionalismo apresentado por D. Pedro, que via nele uma

forma para estabelecer o seu mandato imperativo, implementando a monarquia

constitucional, foi visto, pois D. Pedro entendia que a constituição deveria coibir

abusos por parte do monarca, da classe política e do povo.

Nessa ótica, traçou-se um estudo comparativo existente entre o projeto da

Carta Constitucional do império e a Constituição outorgada de 1824, que foi

elaborada após a dissolução da Constituinte pelo imperador D. Pedro quando da

convocação de um conselho composto por notáveis juristas.

Alguns artigos da Carta Constitucional de 1824 foram abordados, onde

assuntos como o de ser o Brasil a associação Política de todos os cidadãos, foram

aliados a temas como o governo monárquico, constitucional e representativo além

da divisão harmônica entre os poderes, destacando-se que o Poder Moderador era

chave de toda organização política. Neste contexto, fez-se menção também a

inviolabilidade dos direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros, que tinham por

base a liberdade, a segurança individual e a propriedade, esta garantida pela

constituição do império.

De acordo com os autores Quirino e Montes (1986), estabeleceu-se um

organograma estrutural do processo eleitoral da época, esclarecendo-se de que

forma era exercida a cidadania pelo Direito de voto.

Traçou-se o contexto político histórico e legal que antecedeu a Carta Política

de 1988, passando-se do regime de exceção vivido pelo país nos idos de 1964 a

1985, onde se deixava claro que se suprimiram as aspirações democráticas pela

repreensão a todo e qualquer movimento de mudança do regime político existente,

onde a maior mostra disto foi o AI-5, que fulminou quase que completamente os

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poderes da Constituição de 1967. Nessa corrente, passou a uma análise sucinta dos

Governos de Medici, Geisel, Figueiredo e Sarney. Neste último, fez-se menção as

principais ocorrências como a instituição da Assembléia Nacional Constituinte, suas

fases, os acontecimentos vividos e parte dos discursos dos manifestos dos

Governadores e do discurso de posse do Presidente da Anac (Assembléia Nacional

Constituinte).

Também mereceu destaque o preâmbulo da Carta Constitucional de 1988

além de alguns princípios, direitos e garantias fundamentais, pela importância na

abordagem do tema.

Por fim, se estabeleceu comparações, influências e similitudes entre as

Cartas de 1824 e 1988, tratando-se de abordar os vários acontecimentos que

desencadearam as principais comparações entre as duas Cartas apesar do hiato

temporal.

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1 CONTEXTO POLÍTICO, HISTÓRICO E LEGAL DA CARTA POLÍTICA DE 1824

Vários aspectos incidiram para que houvesse razões suficientes para

respaldar a decisão de elaborar a Carta Política de 1824 e, neste parâmetro, passa

se a contextualizá-los do ponto de vista histórico, político e legal para que se possa

haver maior compreensão do desenvolver dos acontecimentos.

A crise do sistema colonial deu inicio a um fortalecimento em alta escala do

capital industrial, onde as idéias de Adam Smith de crítica a politica mercantil,

restrições a monopólios, a tratados comerciais e trabalho escravo, passavam a

afirmar as relações internacionais, havendo um regime de livre concorrência entre as

nações e a superioridade do trabalho livre sobre a mão de obra escrava. Com isto

enquanto na Inglaterra berço da revolução industrial, encaminhava-se a corrente

industrial e suas novas formas de colonialismo, Portugal e Espanha defendiam o

colonialismo de praxe ou comum ou, ainda, o tradicional, onde se tornava evidente a

existência da crise de todo sistema colonialista. Neste contexto, com a crise do

sistema colonial tradicional, passou a entrar em choque os sistemas absolutistas de

governos, surgindo com isto, de outro lado, as lutas liberais e nacionalistas que se

sucederam, sobretudo na Europa e na América.

As influências liberais da Europa movimentaram a vida política no século e a

febre do liberalismo, que era a ideologia que a classe burguesa defendia contra as

instituições dos regimes autoritários respaldados no excesso de poder real,

privilégios da nobreza e do feudalismo ao desenvolvimento econômico da época, se

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irradiavam ou se expandiam por toda Europa. Nesta situação política o então

regente D. João VI, não poderia deixar de ceder às influências que o liberalismo

político e a Revolução Francesa causaram para os movimentos políticos que varriam

Portugal. Para D João, segundo Scantimburgo (1996), os dias haviam mudados e

cabia a ele saber que o imperialismo absolutista do representante da Coroa

Portuguesa estava em transformação, pois havia de se esperar que o liberalismo

que alcançava Portugal também passasse a influenciar suas decisões no Brasil

onde, aliás, diferentemente do liberalismo da Europa, a luta não se travava por

disputas da classe burguesa, mas sim por adeptos do movimento liberal geralmente

representados pelas categorias rurais (grandes proprietários de terras-latifundiários),

que tinham como base limite a não renuncia da propriedade escrava, diferentemente

das idéias lançadas na Inglaterra que condenava o trabalho servil ou escravo. Para

Costa (1987), entretanto, a escravidão constituiria o limite do liberalismo no Brasil,

pois em todos os movimentos revolucionários levantava-se o problema, que era

frequentemente discutido por elitistas e escravocratas, já que se temia a existência

de número de homens pretos, livres, e escravos em superioridade a de brancos.

Não alheio a nenhum destes aspectos pré-falados D João enfrentava o

descontentamento de Portugal e dos brasileiros pela abertura dos Portos e

consequente tarifas preferenciais à Inglaterra, já que estes acontecimentos

quebravam o monopólio de Portugal em relação aos ganhos, através de fretes

marítimos, alfandegas de importação e exportação com ampla base de tributação

voltada aos lucros da Coroa Portuguesa. Estes fatos, no entretanto, concorreram

também para que houvesse um enfraquecimento do Governo Regente de D. João

VI, que tentara minimizar a crise com medidas que limitassem os lucros e vantagens

dos ingleses. Neste particular, então, seguiram-se medidas que revogavam os

entraves à produção e ao comércio da colônia em cuja permanência era

incompatível com a situação de nova sede monárquica. Segundo Mota (l987) estas

medidas foram o livre estabelecimento de fabricas e manufaturas, autorização para

os vassalos venderem livremente suas mercadorias, declaração do livre comercio

para qualquer tipo de gênero, autorização aos conselhos da fazenda a conceder

licença para o pau brasil, permissão à entrada de navios de qualquer nação nos

portos portugueses e saída dos nacionais e graduação do Brasil à condição de Vice-

Reino.

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Ainda segundo Mota (1987) D. João oscilava entre a necessidade de

liberalizar a economia de acordo com os acontecimentos tendenciais da época e as

exigências da Inglaterra. Neste aspecto, adotar os princípios do liberalismo

econômico consistiria em arruinar os fundamentos da Coroa e desestruturar o

sistema colonial. Daí porque as constantes antagonias de sua política econômica e

os inúmeros conflitos servirem para acentuar as divergências entre as colônias e

metrópole, posto que as colônias desejavam as vantagens de se abrir cada vez mais

para liberdade, enquanto as metrópoles se convenciam da necessidade de restringir

a liberdade.

Costa (1987) corrobora que a abertura dos portos a todas as nações em

1808, a localização da sede do Governo no Rio de Janeiro, a elevação em l815 do

Brasil à categoria de Reino Unido e as medidas objetivando dotar a colônia de uma

série de instituições adequadas à sua nova função de sede de governo,

prejudicaram profundamente os interesses metropolitanos.

Daí porque o retorno de D João a Portugal era, no entendimento da época,

imprescindível para que houvesse a possibilidade de restauração do Pacto Colonial

e do cancelamento dos benefícios concedidos ao Brasil e, por consequência o

fortalecimento da economia de Portugal, que estava bastante afetada pelos

acontecimentos políticos- econômicos e pela ascensão da Inglaterra com a abertura

dos Portos.

Durante a regência de D. João além da crise do sistema colonial houveram

episódios que concorrerão também para formação do Estado Constitucional, pois

conforme Costa (1987) o processo revolucionário constitucional da cidade do Porto,

que era originário da Espanha, exigia uma Constituição nos moldes da Constituição

espanhola e contava com adesão de Comerciantes, militares, fazendeiros,

funcionários da Coroa radicados no Brasil, em cujo os interesses eram de uma

conquista liberal que poria por terra o absolutismo, os monopólios e os privilégios

que ainda sobreviviam no contexto político. Neste diapasão, acreditava-se que um

Governo Constitucional daria a oportunidade de representar nas cortes os interesses

da colônia.

Segundo Junior, Machado e Mergulhão (2011) ainda sobre o período de

regência de D. João, a Revolução Pernambucana foi algo decisivo para a influência

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do nascedouro de um Estado Constitucional, posto que de todos os movimentos

revolucionários da época, foi a Revolução de 1817 o mais republicano de todos eles.

Por outro lado, como sucessor de D. João, D. Pedro, para Scantimburgo

(1996), aprendera o sentido do Constitucionalismo, pois via nele uma forma de

estabelecer seu mandato imperativo recebido na investidura a imperador e, de outra

parte, era forma de implementar a monarquia constitucional.

Scantimburgo (1996) assevera que não foram fáceis os primeiros tempos da

Constituinte, pois houvera muitos choques de idéias, sobretudo com Andrade

Antonio Carlos, que defendera o pensamento republicano. No entanto, a constituinte

passou a fluir, segundo as tendências liberais da época, tendo D. Pedro sido

considerado por patrono do liberalismo pelo respeito aos direitos individuais e a

opinião pública. Não se podia dizer que ele (D. Pedro) era um democrata, pois as

idéias absolutistas eram fruto do seu temperamento, mas não tinha idéias tão

conservadoras como as do seu Pai. Entretanto, chegou a afirmar seu desejo de uma

Constituição digna do Brasil e de si mesmo.

Dom Pedro entendia que a Constituição deveria coibir abusos por parte do

monarca e por parte da classe política e, bem assim, do povo. Sendo assim, era

necessário implantar no país Leis que não fossem desobedecidas. Para tanto, a

assembleia se prontificou em aceitar o discurso de D. Pedro. No entanto, havia

facções entre os deputados que não sendo unanimes divergiam em suas ideologias.

Neste aspecto poderia se classificar três tipos de ideologia: A primeira delas, as dos

Bonifácios, que era aquela que pregava a existência de uma monarquia forte,

constitucional e centralizada para se evitar o esfacelamento ou desestrutura do País,

defendendo a abolição do tráfico de escravos e da escravidão e, bem assim,

defendendo uma reforma agrária e o desenvolvimento econômico do País, que

deveria estar livre de empréstimos estrangeiros; a segunda, a dos portugueses

absolutistas, que era aquela que defendia uma monarquia centralizada e absoluta

com privilégios econômicos e sociais; e a última, a dos liberais federalistaS, que era

aquela que pregava uma monarquia proforme e descentralizada com a manutenção

da escravidão. Para D. Pedro a ideologia que mais o identificava era a dos

Bonifácios.

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Alguns autores, por outro lado, mencionam que o esboço da Constituição de

1823, sofreu forte influência da Constituição Francesa e Norueguesa e houve

diversas diferenças entre o projeto e a Constituição de 1824. No ponto sobre o

federalismo, havia um entendimento centralizador onde o Brasil ficaria dividido em

comarcas que eram estabelecidas conforme jurisdição, sendo este aspecto de

cunho jurídico e não territorial administrativo. No tocante ao eleitor era uma visão

bem mais restrita do que na Constituição de 1824. Sobre quem seria considerado

cidadão, somente os homens livres assim poderiam ser chamados, porque aqueles

que fossem escravos e que viessem a ser livres não adquiririam a cidadania. Quanto

à separação de poderes o projeto constituinte previa só os três poderes, enquanto a

constituição previa um quarto poder, o Moderador. Propôs-se, de outra parte, que o

monarca seria uma pessoa no sentido figurativo e que os seus projetos sempre

estariam sujeitos à assembleia e dispensariam a sanção Monarca. Este aspecto

levou D. Pedro a entrar em choque com a Assembléia que para ele se afrontava

com os seus ideais soberanos de regente.

Passou-se a haver dissenção e disputa entre o imperador e a assembleia

constituinte, que tinha nos ideais dos liberais federalistas, uma oposição fechada

contra as posições do ministério de Bonifácio, que através de decreto eliminava os

privilégios dos lusitanos e mandava sequestrar os bens e imóveis dos portugueses

que houvessem apoiado Portugal durante a independência brasileira.

Para Costa (1987) ao lado de D. Pedro, Bonifácio, era o principal responsável

pelos acontecimentos que culminaram definitivamente com a separação do Brasil de

Portugal como também pela consolidação da independência e a manutenção da

unidade nacional. Costa (1987) assevera ainda que Bonifácio exercera papel

importante nas influências políticas ao imperador, sobretudo porque sonhara com

um governo apoiado nas camadas conservadoras, nem democrático, nem

absolutista. Para ele parecia pouco compreensível a estrutura econômica do país

baseada na mão de trabalho escrava, pois tinha diante dos seus desejos um modelo

de economia europeia sustentada na industrialização. Tinha entre seus ideais o

trabalho livre, a colonização e a imigração, a pequena propriedade e a mecanização

da lavoura. Na instrução ao governo provisório de São Paulo aos deputados da

Provincia as Cortes Portuguesas, por exemplo, incluiu em artigo que todas as terras

dadas as seismarias que não fossem produtivas deveriam ser revertidas aos bens

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nacionais. Nisto suas pretensões esbarrariam na resistência dos proprietários e

traficantes de escravos. Atacado pelos liberais por assumir uma posição

conservadora e por seus projetos de transformação social, Bonifácio dependia mais

ainda da benevolência do imperador.

Nesse contexto, os entraves políticos criados a Bonifácio e a tentativa de

redução da constituinte aos poderes do imperador, criaram forte descontentamento

com o andamento daquele trabalho legislativo a ponto de D. Pedro I dissolver a

assembleia constituinte e criar um Conselho de Estado, que em apenas quinze dias

finalizou a elaboração da Carta Magna. Este conselho, entretanto, conforme

preconizado por autores, não era o desejo, na verdade, do Imperador, posto que ele

não tinha intenção de imperar como um déspota, pois sua ambição era ser guardado

pelo amor a seu povo e pela fidelidade das suas tropas e não pela imposição de

tirania. No entanto, apesar deste entendimento e posição pessoal em 13 de

novembro de 1823, o imperador D. Pedro I, segundo Brasil (1974) exarou o seguinte

Decreto de sua lavra que se transcreve na íntegra:

Havendo eu, por decreto de 12 do corrente dissolvido a Assembleia Geral Constituinte e Legislativa, e igualmente prometido um projeto de Constituição, que deverá (como tenho resolvido por melhor) ser remetido às Câmaras, para estas sobre ela fazerem as observações, que lhe parecem justas, e que apresentarão aos respectivos Representantes das Provincias, para delas fazerem o conveniente uso, quando reunidos em Assembléia, que legitimamente representa a Nação: e como para fazer semelhante projeto com sabedoria, e apropriação às luzes, civilização, e localidades do império, se faz indispensável, que eu convoque homens probos, e amantes da dignidade imperial, e da liberdade dos povos: Hei por bem criar um Conselho de Estado, em que também se tratarão os negócios de maior monta, e que será composto de dez membros; os meus seis atuais Ministros, que já são conselheiros de Estado natos, pela lei de 20 de outubro próximo passado, o Desembargador do Paço Antonio Luiz Pereira da Cunha, e os Conselheiros da Fazenda Barão do Santo Amaro, José Joaquim Carneiro de Campos e Manoel Jacinto Nogueiro de Gama: os quais terão de ordenado 2:400$000 anuais, não chegando a esta quantia os ordenados, quer por outros empregos tiverem. O ministro e Secretário de Estado dos Negócios do Império o tenha assim atendido, e faça executar, expedindo, e faça executar, expedindo ordens necessárias. Paço, em 13 de novembro de 1823, 2º da independência e do Império. (BRASIL, 1974, P.11)

Ainda segundo se preconiza, esse conselho era composto por juristas de

notável saber jurídico como Vilela Barbosa Maciel da Costa, Nogueira Gama e Melo

dentre outros, e a primeira Constituição foi outorgada e jurada solenemente na

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Catedral do Império em março de 1824, tendo recebido influência das Cartas da

França e da Espanha. Para o autor, a Constituição era um belo documento de

liberalismo com sistema representativo baseado na soberania nacional e podia se

dizer ser a mais liberal da época, superando inclusive as Europeias.

O preâmbulo da Carta de 1824 que se segue abaixo, conforme Brasil (1974)

guarda grande importância demonstrando já à época, as tendências liberais de uma

monarquia constitucional:

Dom Pedro Primeiro, por graça de Deus e unânime aclamação dos povos, imperador constitucional e defensor perpetuo do Brasil:

“Fazemos saber a todos os nossos súditos, que, tendo-nos requerido os povos deste império, juntos em câmaras, que nós quanto antes jurássemos e fizéssemos jurar o projeto de Constituição, que havíamos oferecido às suas observações para serem depois presentes à nova Assembléia Constituinte, mostrando o grande desejo que tinham de que ele se observasse já como Constituição do Império, por lhes merecer a mais plena aprovação, e dele esperarem a sua individual e geral felicidade política; nós juramos o sobredito projeto para observarmos, e fazermos observar como Constituição, que dora em diante fica sendo, deste império;...” (BRASIL, 1974, P.12

Também podem ser lembrados alguns dispositivos da mesma Carta Política

pela importância que eles representam para o contexto político e legal:

Artigo 1º: “o Brasil é a associação Política de todos os cidadãos brasileiros”.

Vê-se a primeira vista uma tendência liberal, posto que, associação

pressupõe uma sociedade, que é a harmonia ou relação entre idênticas idéias

sugeridas. No entanto, só um grupo seleto de pessoas como, quais, aquelas que

mantinham a possibilidade de votar nas assembleias paroquias poderiam exercer na

íntegra o seu direito de cidadania e somente aqueles que eram elencados no artigo

6º, poderiam ser chamados de cidadãos.

Artigo 3º: “O governo é monárquico, constitucional e representativo”.

Note-se que aqui ficava evidente uma monarquia constitucional onde se

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rompia os liames com o autoritarismo e o absolutismo e buscava-se, portanto, um

caminho liberal contra o status quo da nobreza e do clero.

Artigo 5º: “A Religião católica apostólica romana continua a ser a religião do

império. Todas as outras religiões serão permitidas com seu culto doméstico.”

Apesar da supremacia da religião católica, houve a liberdade de culto, o que

se pode constituir para época um avanço de caráter da liberdade do pensamento

ainda que se preservasse a impossibilidade de exteriorizar através dos templos

religiosos a liberdade do culto.

Artigo 9º: “A divisão e harmonia dos Poderes Políticos é o princípio

conservador dos Direitos dos Cidadãos e o mais seguro meio de fazer efetivas as

garantias que a Constituição oferece”.

Já nesta época havia a preservação as garantias fundamentais, pois quando

se previa que a harmonia entre os poderes era meio de garantir e conservar os

direitos do cidadão estava-se deixando claro que o respeito às instituições de Estado

e a organização administrativa politica da nação também garantiam e asseguravam

garantias constitucionais ao direito de cidadão.

Artigo 11º: “Os representantes da Nação brasileira são o imperador e a

Assembleia Geral”.

Percebe-se que a pessoa do imperador não poderia deixar de ser

representante da nação, pois a própria Carta de 1824, nos artigos 98 e 99, nomina

que o imperador era o Chefe Supremo da Nação, não estando seus atos sujeitos ou

submetidos a nenhum referendo ou apreciação de quem quer que fosse, sendo,

portanto, inviolável e sagrado nas suas ações. Na mesma esteira, era a Assembléia

Geral, assim como o imperador, representante da nação brasileira pelo fato talvez

de a Assembléia Geral ser formada pela composição da Câmara dos Deputados e

pelo Senado e ter entre suas atribuições a de velar pela Constituição e a promoção

do bem geral da nação (artigo 15, inciso IX da mesma Carta) além de representar a

nação que nos termos do artigo 1º, era formada pelos Cidadãos. Assim, sendo as

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Assembleias Gerais eleitas pelos eleitores de Província que por sua vez eram

escolhidos pelas Assembleias Paroquias formadas pelos cidadãos, estariam

representando os interesses destes mesmos cidadãos, que por sua vez

representavam a Nação (art. 1º).

Artigo 14º “A Assembléia Geral compõe-se por duas Câmaras: Câmara dos

Deputados e Câmara dos Senadores ou Senado”

A Assembleia Geral era eleita pelo sistema representativo dos eleitores da

província que por seu turno era escolhida pelas Assembléias de Paróquia, que era

formada pelos cidadãos ativos. Já a Câmara dos Deputados que compunha a

Assembléia era eletiva e temporária e era estabelecida conforme o número da

população, tendo entre suas principais atribuições a de por à exame a administração

passada com seus abusos praticados além de decretar a acusação dos Ministros de

Estado e conselheiros. O Senado, por sua vez, era vitalício e tinha como principal

atribuição conhecer dos delitos cometidos pelos membros da família imperial,

Ministros de Estado, Conselheiros de Estado, Senadores e Deputados além de

conhecer da responsabilidade dos Senadores e Conselheiros de Estado e, bem

assim, de convocar Assembléia na morte do imperador.

Artigo 98º “O poder Moderador é a chave de toda organização Politica, e é

delegado privativamente ao imperador como Chefe Supremo da Nação e seu

primeiro representante, para que incessantemente vele sobre a manutenção de

independência, equilíbrio e harmonia dos demais Poderes Políticos.”

Neste artigo vê-se que o Poder Moderador era o quarto poder privativo do

imperador, atuando como mecanismo de absorção de atritos entre os demais

poderes e como poder sobreposto no qual nenhum outro poder se lhe sobrepunha

em autoridade. Era a fiel balança que iria permitir ao imperador a situação de

primazia das suas decisões por ser o poder chave de todo a organização politica.

Tinha a particularidade de ser ponto de equilíbrio e de manutenção da

independência nacional, pois dava ao imperador poder soberano de tomar decisões

como imperador constitucional e defensor perpetuo do Brasil na ordem soberana.

Era um poder absoluto e pessoal do Imperador.

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Artigo 179 “A inviolabilidade dos direitos civis e políticos dos cidadãos

brasileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual e a propriedade, é

garantida pela Constituição do império...”

Aqui se depreende que a inviolabilidade de direitos civis e políticos constitui

rol de garantias fundamentais no qual o Estado se reserva a protegê-las por

alcançarem a esfera jurídica do cidadão nos seus interesses individuais. Neste

aspecto, o próprio Estado além de garantir o direito individual por ser uma garantia

fundamental também veda qualquer intromissão do próprio aparato estatal, havendo,

neste particular, um não fazer ou um se abster do próprio Estado que assim agindo

preservava direitos essenciais e fundamentais do indivíduo.

Quirino e Montes (1986) asseveram também aspectos relevantes da Carta

Constitucional de 1824 como, sejam:

• A constituição estabelece no Brasil um governo monárquico hereditário

representativo constitucional onde o imperador é supremo e inviolável;

• Os poderes políticos são quatro: executivo, legislativo, judiciário e moderador.

Neste último qual, seja, Moderador está a chave de toda a organização

política, sendo delegada exclusivamente ao imperador, que como chefe

Supremo da Nação e seu primeiro representante, vela pela manutenção da

independência, equilíbrio e harmonia dos Poderes Políticos. Nestes

parâmetros poderíamos dizer que este poder era o que se sobrelevava aos

demais, tendo força coativa e força de equilíbrio, sendo pessoal do

imperador, que com suas decisões e atribuições próprias de imperador podia

nomear e demitir ministros de Estado e suspender magistrados;

• O imperador é o chefe do poder executivo, cabendo-lhe nomear bispos bem

como comandantes de Mar e Terra;

• O legislativo representa um terceiro poder em que os cidadãos podem

exercer a influência política pela escolha de seus representantes. Todavia, o

Poder Legislativo é delegado à assembleia com sanção do imperador. No,

entretanto, esta assembleia é composta por duas câmaras, as dos deputados

Page 19: Versão final ciência política

19

e dos senadores, sendo que a primeira é eleita temporariamente, enquanto a

segunda é vitalícia e realizada por eleição provincial;

• Segundo a constituição todos que podem ser eleitores podem ser

deputados. No entanto, para que se pudesse ser senador as exigências eram

maiores, pois que era necessário que a pessoa tivesse pelo menos 40 anos e

que fosse dotada de grande conhecimento, capacidade e virtudes e, bem

assim, que tivesse rendimento anual por bens equivalente a oitocentos mil

reis;

• Quem eram as pessoas que tinham direito de participar da escolha dos seus

representantes? As eleições para membros dos conselhos das províncias

eram feitas de forma indireta, uma vez que se elegia primeiro os cidadãos da

assembleia paroquial, os eleitores de província e, por sua vez, estes, elegiam

os representantes da nação e da província. Logo a eleição dos

representantes era feita em duas etapas, primeiro se escolhiam os membros

da assembleia paroquial, que elegiam os chamados grandes eleitores, que

por sua vez elegiam os membros das câmaras legislativas. A assembleia

paroquial era o que se pode chamar atualmente do poder municipal.

• Podia-se estabelecer, de acordo com a estrutura constitucional, um

organograma do processo eleitoral da época, esclarecendo de que forma era

exercida a cidadania pelo direito de voto:

ASSEMBLEIA GERAL CONSELHOS GERAIS DE PROVÍNCIA

SENADO: vitalício, CÂMARA DOS DEPUTADOS: Membros dos ConselhosTrês vezes o número temporária, com duração de man- Gerais de Província. de Senadores, dos dato estabelecido por lei. Número quais o Imperador es- estabelecido por lei conforme a colhe um. população.

ESCOLHEM

Eleitores de Província

ESCOLHEM

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20

Assembleias Paroquiais = todos os cidadãos ativos

Fonte: Brasil, 1974

• Eram considerados cidadãos ativos: os nascidos no Brasil ou os estrangeiros

naturalizados que estivessem no gozo dos direitos políticos. Eram necessárias ainda as seguintes exigências: maiores de 25 anos; se casados ou oficiais militares os maiores de 21; Bacharéis formados e clérigos de ordem sacra; pessoas com rendas de pelo menos Cem mil Réis; não fossem filhos de família em companhia dos pais a não ser que fossem oficiais públicos; não fossem criados de servir; não fossem religiosos de vida em conventos ou de vida no claustro;

• Para ser cidadão ativo, se transformando em grande eleitor onde se poderia

votar nas eleições de deputados, senadores e membros dos Conselhos de Províncias, era necessário ter pelo menos Duzentos mil Réis, não ser liberto e nem ser criminoso pronunciado além de que qualquer cidadão que tivesse sentença condenatória à prisão perderia seus direitos políticos;

• Quando se via que a organização do legislativo era na assembleia geral e nos

conselhos de província e, bem assim, a nomeação dos integrantes do judiciário e dos membros do senado, era pelo imperador, vê-se que não era grande a influência do povo nas decisões políticas, visto que era enorme a participação do poder de concentrar decisões nas mãos do imperador.

• É preciso lembrar que a totalidade da população escrava estava à margem

sequer tendo direitos civis e muito menos direitos políticos, pois era excluída da própria sociedade.

Bastos (1989), por seu turno, afirma que a Constituição outorgada de 1824, embora trouxesse características que não eram aceitáveis nos dias atuais como democráticas, era respaldada num forte liberalismo a ponto de elencar um rol de direitos individuais e a separação clássica dos poderes acrescentada por um quarto poder chamado Moderador.

Por fim, apesar dos avanços para época vigente e de ser a terceira Constituição mais antiga depois das Cartas do Estados Unidos e da França, as imperfeições do regime não retrataram fielmente a vontade popular, mas sim ainda as raízes de um absolutismo monárquico que mesmo fazendo a vezes de um constitucionalismo monárquico não atendia o conjunto de forças politicas, ideológicas e econômicas que aspirasse a vontade do povo que ficava a mercê de uma maciça intervenção do imperador, como inviolável, absoluto e sagrado.

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21

Em anexo, segue a Carta Constitucional do Império em sua integra (ANEXO 1).

2 CONTEXTO POLÍTICO, HISTÓRICO E LEGAL DA CARTA POLÍTICA DE 1988

O chamado regime de exceção vivido pelo país nos idos de 1964 a 1985 foi

algo decisivo para a abertura do processo democrático que culminou com a Carta

Magna atual. Neste período suprimiram-se as aspirações de ideais democráticas

pela repreensão a todo e qualquer movimento de mudança do regime político

existente. A maior mostra disto foi a instituição do chamado AI-5 que fulminou quase

que completamente os poderes da Constituição de 1967. A partir deste ato

institucionalizou-se o arbítrio pela exceção de direitos e garantias onde o que se

reafirmava eram o controle e a suspensão de direitos. O congresso nesta época foi

fechado e os que se contrapunham ao regime existente eram presos. José ( 2010)

assevera que o AI-5 foi responsável pela cassação de mandatos como, seja, 113

mandatos de deputados federais e senadores, 190 deputados estaduais, 38

vereadores e 30 prefeitos. Assevera ainda o mesmo autor que o aparato policial é o

que imperava nesta época e que eram muitos os números de mortos e

desaparecidos além de torturados.

Ainda para José (2010) merece referencia os governos de Médici, Geisel e

Figueiredo. O governo de Médici foi assumido em 1969 após doença de Costa e

Silva e recusa dos militares de que o Vice Presidente Pedro Aleixo assumisse. Esta

época é considerada a de mais rigor e repressão do regime político existente além

também de uma forte bandeira nacionalista com visão de um país grande pela

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22

defesa do mar territorial (200 milhas) e de aspectos do nacionalismo de 50 a 60. Já

Geisel de 1974 a 1979 teve a política de distensão lenta e gradual do regime

dominante, adotando uma linha política mais moderada, nem tanta repressão e nem

tanta democracia. Buscou-se um equilíbrio entre uma coisa e outra, querendo

legitimar um Estado forte como agente econômico e político que, alias, tinha regras

que evitavam os excessos - mortes, torturas e etc - do aparelho repressivo. Ainda

nesta época reduz-se novamente a distensão, fecha-se o Congresso Nacional,

torna-se permanente as eleições de governadores, muda-se o sistema de

representação do Congresso, dando-se força ao Nordeste, institui-se a figura do

senador biônico e impõe-se a restrição da Lei Falcão às eleições (todas estas

medidas constituem-se no Pacote de Abril). Ao fim do Governo Geisel era possível

se vislumbrar a situação política no país: a oposição parlamentar ganhava forças; a

sociedade civil se organizava e se mobilizava; e a classe dominante já estava

insatisfeita com as aberturas politicas, que eram vistas como posições contrarias a

esta mesma classe. Pode-se dizer que a trajetória de Geisel não foi tão pacífica, não

só porque a oposição pretendia ir muito mais além, mas também porque setores

mais radicais dentre os militares queriam a volta aos tempos de Médici. Já com

Figueiredo as medidas de abertura dão prosseguimento e era possível se

estabelecer o que era uma oposição aceitável e quais os setores oposicionistas

seriam intoleráveis. Neste período a chamada linha dura ou ditatorial começou a

atenuar e a haver uma insatisfação de setores que sempre eram os mais

favorecidos da sociedade. Houve também o crescimento de movimentos populares,

eclesiásticos, sindicais e da sociedade civil. Nos movimentos sindicais a grande

novidade era do ABC paulista, onde precisamente do Sindicato dos metalúrgicos de

São Bernardo dos Campos, iniciava-se lutas por reposições salariais e geravam-se

movimentos grevistas dos trabalhadores. Ainda no Governo Figueiredo houve anistia

concedida no segundo semestre de 1979, permitindo-se não só a soltura de

prisioneiros políticos, como também o retorno ao país de exilados e consequente

recuperação de direitos políticos que haviam sido cassados. A vida política neste

ponto voltava a se oxigenar, abrindo oportunidade para a atuação de centenas de

militantes até então proscritos, presos e exilados. Neste mesmo período, o então

general Goubery, chefe da Casa Civil, tentando dividir a oposição e quebrar a

hegemonia do MDB, porque afinal o partido crescia de eleição em eleição, cria uma

novo Legislação extinguindo tanto o partido MDB quanto a Arena, esperando com

Page 23: Versão final ciência política

23

isto a criação de vários partidos de oposição, o que gerou a troca da legenda para

PMDB e a criação do atual PT, PP, PTB, PDS e PDT. O mesmo autor continua

arrazoando pela importância, que a ditadura passou por três grandes fases até

encerrar-se em 1985. A primeira de 1964 a 1968, com Castelo Branco e Costa e

Silva, onde se tentava uma ditadura constitucional, conservando aspectos de

legalidade democrática. A segunda de 1968 a 1974, época em que ocorre

radicalização e se instaura uma ditadura clássica com suas consequências. A

terceira entre 1974 e 1985, com Geisel e João Batista Figueiredo, época da

chamada abertura política. Nestes períodos a burguesia brasileira não perdeu sua

hegemonia, pois soube produzir transição não só pacífica como de acordo com seus

interesses, afastando a interferência decisiva de classes subalternas.

A chamada Nova República, se deu com o advento da posse do então

presidente José Sarney, neste período, segundo José (2010), no plano político, uma

das primeiras medidas foi o restabelecimento de eleições diretas para Presidente,

voto de analfabeto, legalização dos partidos políticos, liberalidade para o regime de

censura, não intervencionismo em sindicatos, eleições diretas para prefeitos de

capital, manutenção da Lei de imprensa, da Lei de Segurança Nacional e do Decreto

1077 - Decreto de Censura.

No aspecto da política econômica o Governo Sarney foi por demais exigido

em face da herança do período do regime militar e das constantes crises

internacionais. Em fevereiro de 1987 decretou-se o Plano Cruzado, o qual

estabelecia a troca do cruzeiro pelo cruzado, extinguia-se a correção monetária e

estabelecia-se o gatilho salarial para toda vez que a inflação chegasse à casa de

20%. No entanto, não se logrou êxito e dois outros planos foram criados. O Plano

Bresser, que tentava reenquadrar as contas públicas e despesas da administração e

o Plano Verão idealizado por Mailson da Nobrega, que decretava mais um

congelamento.

Ainda no plano político econômico a demora de Sarney em corrigir o plano de

correção econômica, causou seu verdadeiro insucesso. No entanto, neste aspecto

pode se fazer a ressalva de que esta demora não passava de uma manobra política,

na qual o partido PMDB que controlava o Ministério da Fazenda, não poderia ter sua

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24

imagem política abalada por medidas de reajuste no Plano econômico, uma vez que

ele era a hegemonia no governo.

Segundo José (2010) o Governo Sarney iniciou a política de desmonte das

estatais, descapitalizando-as a ponto de não poderem acompanhar o

desenvolvimento do setor privado, serem ineficientes e terem déficit público alto com

funcionários em demasia que ganhavam altos salários.

O período de Sarney foi marcado por acontecimentos como a instituição da

Assembleia Nacional Constituinte e promulgação da Carta Magna.

A Assembleia Nacional Constituinte encerrou o período de transição

democrática vivido pelo país, sendo a expressão de grandes conflitos de interesses

a ponto de referenciar as aspirações e anseios populares por ser forma de tradução

do chamado poder constituinte. Nela houve a afluência de vários setores da

sociedade, onde havendo demasiada e permanente mobilização de partidos

políticos, deu-se intensa e incessante busca de acordos entre lideranças das

diferentes forças partidárias para consenso de decisões. Neste aspecto, o Processo

Constituinte foi solene e formal sofrendo a influência e atuação de grupos de

pressão, movimentos sociais, grupos econômicos e grupos de formação de opinião

pública. Destacou-se a atuação do Partido do Movimento Democrático Brasileiro dos

então deputados Ulisses Guimarães e Mario Covas que tinham a totalidade dos

Governos de Estado e folgada maioria na Constituinte, que foi fragilizada pela

quebra da unidade de bancada do partido, pela renuncia do seu líder na constituinte

e pela saída de cerca de 70 Constituintes eleitos pelo PMDB. Neste diapasão, houve

o crescimento dos chamados partidos de esquerda pela coalizão e consenso entre

eles e daí a chamada frente progressista que influenciou em pontos decisivos de

alta importância, quebrando a hegemonia do bloco conservador majoritário da

Constituinte. Pillati (2008) assevera que as questões mais polêmicas da Assembleia

Constituinte foram aquelas que se reportaram a constituição material da sociedade e

Estado brasileiro, como, seja propriedade latifundiária, recursos naturais, atividades

econômicas, concessões dos serviços públicos, distinção entre capital nacional e

estrangeiro, posse da terra, exploração petrolífera, recursos minerais, energia

hidráulica, serviços de radio, telecomunicação e televisão.

Page 25: Versão final ciência política

25

Coelho (2000) afirma que o fenômeno sociológico e político da constituinte

era de longas datas e derivou basicamente de um movimento de oposição ao regime

de exceção de1964. Neste movimento a reconstitucionalização do país através da

Convocação da Assembleia Nacional Constituinte livre e soberana que do ponto

jurídico-formal resultou de um ato convocatório do corpo constituinte que instalou

seus trabalhos através de regimento interno, foi posto em discussão e votação o

corpo normativo Constitucional, que através de promulgação deu efetividade a Carta

Constitucional. Corrobora o autor que a constituinte foi muito variada e envolvia

grupos sociais e políticos que atuavam no regime de clandestinidade durante o

regime autoritário onde se pôde perceber a influência de vários movimentos que se

encaminharam para o desencadear dos acontecimentos voltados ao surgimento da

Carta Magna como, quais: Carta do Recife em 1971, pregando a convocação de

uma constituinte; crise de 1977, com o pacote de abril que levou o MDB a oficializar

um movimento de convocação de uma constituinte; lei da anistia e reforma partidária

que substituiu a antiga Arena e MDB, levando o quadro partidário a se organizar

com o surgimento de partidos como PDS, PMDB, PP, PMDB, PTB, PDT e PT;

convocação do congresso Pontes de Miranda, por decisão da OAB em 1981;

surgimento de organização específica pela Constituinte - sindicatos, federações,

centrais sindicais, associações, movimentos estudantis, universidades,

representações profissionais, igrejas (CNBB), entidades nacionais – OAB, ABI,

SBPS, movimento político-ideológico. Ainda discorrendo o autor, dois fatos foram

marcantes para o movimento constituinte: Campanha pelas diretas e eleição de

Tancredo Neves. O primeiro fato, as eleições diretas, um movimento que marcou o

Brasil e a sociedade, mesmo tendo havido a rejeição da emenda a Constituição

Dante de Oliveira, que não teve o número de votantes entre deputados e senadores

suficientes para a aprovação. O segundo fato, a eleição de Tancredo Neves pelo

Colégio Eleitoral no dia 15 de janeiro de 1985, que antes de ser eleito não tinha bons

olhos ao movimento da Constituinte. Todavia, na convenção do PMDB onde

oficializou sua candidatura, assumiu o compromisso de velar pela discussão da

aprovação da Constituição, e no seu discurso logo após a sua eleição, assumiu em

público a tarefa de promover a organização institucional do Estado, prometendo um

Estado moderno com busca a um consenso à Nova Carta Política, através de

grande debate constitucional nos auditórios, na rua, nas universidades enfim na

sociedade para a escolha dos delegados ao Poder Constituinte com o fim de

Page 26: Versão final ciência política

26

elaborarem a Lei Fundamental da nação, que para ele não podia estar adstrita aos

juristas, aos sábios e aos políticos, mas ao povo através de uma profunda reflexão

nacional pelos seus representantes eleitos que no seu entendimento deveriam

redigir uma Carta Política, clara, imperativa em seus princípios, flexível quanto ao

modo, para evitar crises políticas e conjunturais, contida na inteligência da Lei e por

fim ajustada as circunstâncias históricas.

A estrutura de composição da Assembleia Nacional Constituinte era

decorrente de estrutura unicameral com duas casas de representação, Câmara de

Deputados e Senado Federal, cujos membros na condição de constituintes eram

chamados a se reunirem nos termos da Emenda Constitucional nº 26/85 que

asseverava “ Os Membros da Câmara dos Deputados e do Senado Federal reunir-

se-ão, unicamente em Assembleia Nacional Constituinte, livre e soberana, no dia 1

de fevereiro de 1987, na sede do Congresso Nacional. O presidente do Supremo

Tribunal Federal instalará e dirigirá a sessão de eleição de seu Presidente. A

Constituição será promulgada depois da aprovação de seu texto, em dois turnos de

discussão e votação pela maioria absoluta dos Membros da Assembleia Nacional

Constituinte”.

Pilatti (2008) assevera que o número de constituintes era de 559, cabendo ao

PMDB 306 constituintes, ao PFL 132, ao PDS 38, ao PDT 26, ao PTB 18, ao PT 16,

ao PL 7, ao PDC 6, ao PCB e PC do B 3, cada um, ao PSB 2, ao PMB e PSC um

constituinte. Ainda havia 23 eleitos em 1982, sobre os quais, conforme Pilatti (2008)

acendeu-se a polêmica para impugnação da participação dos senadores eleitos em

1982. Sustentava os deputados Plínio Arruda(PT) e Roberto Freire(PC) em 2º

sessão da ANC, que os senadores eleitos em 1982 não tinham delegação do povo

para participar da Assembleia Nacional Constituinte. Em contra partida Fábio

Lucena(PMDB) e Gastone Righ(PTB), sustentavam que a Emenda 26/85, fazia

menção a todos os senadores sem acepção entre os eleitos em 1986 e os eleitos

em 1982. Houve manifestação dos lideres do PDS, Amaral Neto, do líder do PT, Luiz

Inácio Lula da Silva e do líder o PC do B, Haroldo Lima, os dois últimos apoiavam a

tese de que os senadores eleitos em 1982, não poderiam participar da ANC. O

então senador Fernando Henrique Cardoso (PMDB), contra as questões de ordem,

pediu ao presidente da ANC, Ministro José Carlos Moreira Alves, que a decisão

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27

fosse levada a plenário. Após a sessão plenária houve a decisão dos votos pela

confirmação pró-participação dos eleitos com mandato a partir de 1982.

Segundo Oliveira (1993), o trabalho da constituinte desenvolveu-se em 7

etapas, as quais, por sua vez, desdobraram-se em 25 fases distintas,

conforme se resume no quadro a seguir:

Etapas/ Fases

Preliminar

Regimento Interno da ANC Sugestões: Cidadãos, Constituinte e Entidades

Subcomissões Temáticas

Anteprojeto do Relator Emenda ao Anteprojeto do Relator Anteprojeto da Subcomissão

Comissões Temáticas

Emenda ao Anteprojeto da Subcomissão Substitutivo do Relator Emenda ao Substitutivo Anteprojeto da Comissão

Comissão de Sistematização

Anteprojeto de Constituição Emenda Mérito (CS) ao Anteprojeto

Emenda Adequação (CS) ao Anteprojeto Projeto de Constituição

Emenda (1P) de Plenário e Populares Substitutivo 1 do Relator

Emenda (ES) ao Substitutivo 1 Substitutivo 2 do Relator

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28

Plenário

Comissão de Redação

Epílogo Promulgação

Fonte: Oliveira, 1993

Com isso, a elaboração do projeto da Constituição caberia as seguintes

Comissões: Comissão da Soberania e dos Direitos e Garantias do Homem e

da Mulher; Comissão da Organização do Estado; Comissão da Organização

dos Poderes e Sistema do Governo; Comissão de Organização Eleitoral,

Partidária e Garantia das Instituições; Comissão do Sistema Tributário,

Orçamento e Finanças; Comissão da Ordem Econômica; Comissão da Ordem

Social; e Comissão da Família, da Educação, Cultura e Esportes, da Ciência e

Tecnologia e da Comunicação. Cada uma das Comissões teria um Presidente

e um Vice além de relator, podendo, conforme já detalhado, ser dividida em

Subcomissões, que elegiam presidentes e relatores.

Merece destaque, por outro lado, conforme Pereira (2007), em alguns

pontos, o discurso em manifesto dos Governadores em apoio a ANAC, e o

discurso de posse do Presidente da Constituinte Ulisses Guimarães, os quais

expressam o momento histórico político vivido pela nação, abordando

aspectos da expectativa de vida para o povo, da política econômica e dos

ideais democráticos, sociais e políticos.

No manifesto dos Governadores pôde-se destacar os seguintes

aspectos:

- apoio as mudanças profundas que o país aspira expressamente

manifestadas pelo voto e pelos movimentos em praças públicas;

- o dever que decorre de inegável legitimidade das urnas para cumprir

em favor do povo as inadiáveis soluções conjunturais e estruturais da Nação;

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29

- a 15 de novembro o país realizou, há mais de vinte anos, a sua

primeira eleição livre, passo decisivo para transição do autoritarismo

democrático à democracia;

- a democracia tem que ser forte para assegurar o direito à livre

manifestação dos cidadãos e organizações sociais;

- o povo não quer a recessão que paralisa a atividade produtiva, pois

corrói o salário, impõe a miséria, a fome, o genocídio, destrói o mercado

interno e a economia nacional;

- política de distribuição de renda compatível com a sociedade e

democracia, sem arrocho salarial e com salário mínimo que atenda a vida

digna;

- tratamento da divida externa, respeitando a soberania nacional, uma

vez que ela (divida externa) resultou da política unilateral de taxas de juros

insuportáveis, não podendo ser motivo de sofrimento e fome para o povo;

- suspensão de parte da divida, vinculando as remessas de valores ao

PIB ou valores da exportação;

- fortalecimento da federação;

- estado de direito democrático com governo transparente, austero,

participativo e eficiente;

- e efetivação da reforma agraria sobre as terras improdutivas.

No discurso de posse do Presidente da ANC, Ulisses Guimarães,

destacam-se os seguintes pontos:

- em nossas mãos está a soberania do povo e tarefa de construir com a

lei um Estado democrático, moderno, justo que sirva ao homem e não um

Estado que o submeta;

- faremos uma constituição para justiça, para liberdade e para soberania

nacional;

- a constituição deve ser – e será – o instrumento jurídico para o

exercício da liberdade e da plena realização do homem brasileiro;

- o caminho vivido pelo país desde a campanha por diretas já

demonstra que o Brasil não cabe mais no limite histórico dos exploradores;

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30

- condenamos o liberalismo clássico, pois o papel regulador de preços e

salários, que deixa as livres forças do mercado atuarem com carteis, não

pode deixar de intervir no mercado econômico, mas que a sua força busque a

paz social;

- não há um só exemplo de nação forte, sem um bom sistema de

educação. A cidadania começa no alfabeto.

De tudo isso e sobre todos esses fatores, resulta que a Assembleia Nacional

Constituinte representava o poder constituinte de um lado e poder reformador do

outro. Poder Constituinte porque participa da criação da lei basilar da sociedade,

pois nele estava o caráter amplamente aceito da titularidade popular na medida em

que prevalecia a soberania do povo como princípio jurídico-político, posto que é o

povo através dos seus representantes eleitos que se sub-rogam no poder popular de

decidir sobre a sobrevivência ou não da Constituição Positiva, suas alterações e

substituições. Poder reformador porque é poder autônomo que não depende de

nenhum outro e é através dele que se altera, elabora, substitui e se revoga

soberanamente.

Por outro lado, em segundo momento, o governo Sarney promulga em 05 de

outubro de 1988 a Carta Constitucional da República, fruto do poder constituinte

outorgado aos Congressistas do Senado e da Câmara dos Deputados, sendo

elaborada com nove títulos dispostos em 247 artigos além do conteúdo das

Disposições Constitucionais Transitórias. Nela, discorre José (2010), afigura-se texto

digno de um Estado de Bem-Estar social comparável com as sociedades ocidentais

mais modernas e mais desenvolvidas do Mundo Capitalista. Pode se vislumbrar que

pela disposição de Cartas Politicas anteriores, houve uma inversão por importância

de matéria, na Carta Magna atual, fica elencado os Direitos Individuais e Coletivos,

Sociais e Políticos no título II e, imediatamente anterior, os Princípios Fundamentais;

já em Cartas anteriores vem disposta a Organização do Estado primeiro. Ainda se

pode observar institutos inovadores do Direito de Ação como, seja, o Mandado de

Segurança Coletivo, impetrado por entidade Sindical, o Mandado de Injunção, com o

qual por falta de Lei regulamentadora da matéria supre-se o próprio direito pela

promoção do mandado de injunção. Outro meio via acionária inovador, é o Habeas

Data, meio hábil de assegurar informações em bancos de dados de entidade pública

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31

sobre pessoa do impetrante. Na mesma esteira é o Direito de Petição aos poderes

públicos em defesa de direitos ou contra a ilegalidade ou abuso de poder e o

Habeas Corpus no qual sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer

violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de

poder, possa impetrá-lo. Não se deve olvidar da ação popular.

Merece destaque, pela importância, o preâmbulo da Carta Magna:

Nós, representantes do Povo brasileiro, reunidos em Assembleia

Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício de direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. (BRASIL, 1988)

O preâmbulo constitui um enunciado programático dos fundamentos

principais assumidos pela Assembleia Nacional Constituinte para a efetiva

permanência do chamado Estado Democrático de Direito e seus valores sócio

jurídico e políticos fundamentados numa sociedade justa em seus valores e

comprometida interna e internacionalmente com a solução pacífica das

controvérsias.

Para Bulos (2002) preambulo não é um conjunto de preceitos, mas de

princípios. Tais princípios exercem uma força centrípeta sobre as demais normas da

constituição, projetando sua eficácia no nível da interpretação.

E continua Bulos (2002) que existe vasta doutrina a respeito de demarcar a

natureza do preâmbulo: tese da irrelevância jurídica ( o preâmbulo situa-se fora do

domínio do direito); tese da eficácia idêntica ( o preâmbulo é um conjunto de

preceitos que possui eficácia igual a qualquer dispositivo constitucional); e, tese da

relevância específica (o preâmbulo participa das características jurídicas da

constituição).

Page 32: Versão final ciência política

32

Os Direitos e Garantias Fundamentais também elencam o conteúdo

normativo da Carta Magna, neles o indivíduo tem ou recebe prerrogativas que se

sobrelevam ao ponto de, na ordem jurídica, serem reconhecidas em face do Estado,

que por sua vez, mesmo apesar de sua potestade jurídica ou da soberania de seu

poder em relação ao indivíduo, não ignora que este mesmo indivíduo, tenha

preservada a garantia de seus direitos a ponto de o próprio Estado não violar o

âmbito da esfera jurídica de direitos do cidadão. Neste contexto pode-se dizer que o

aparato do poder estatal deixa de operar seus efeitos, quando em confronto com

garantias fundamentais do indivíduo, possa violar ou agredir a esfera jurídica dos

direitos do próprio indivíduo a ponto de invadir suas garantias individuais. Bom dizer,

não é apenas um dever de se abster do Estado em relação a alguns direitos, mas

também dever de prestar assistência destes mesmos direitos do cidadão em relação

as garantias de sua existência como bens e valores do indivíduo.

Para Bastos (1989) as garantias fundamentais se basearam na Declaração

Francesa e na Declaração Americana. Na primeira, através da Declaração dos

Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, que por sua vez se baseou mais

fortemente em Rousseau e na sua obra o Contrato Social, pois como se afigura no

artigo primeiro da Declaração, expressa-se a mesma frase que abre a obra de

Rousseau, “O contrato Social”, quando se diz categoricamente que “Os Homens

nascem livres”. Para Rousseau, que parte do postulado do Direito Natural, há um

estado de natureza no qual o homem é livre e um contrato social, onde estariam

limitadas as liberdades individuais pela vontade geral da sociedade que limita o

homem a submeter-se a ela. Neste diapasão onde estaria a liberdade? Estaria na

expressão da vontade da maioria, que por sua vez sujeita o homem a vontade geral

que escaparia a vontade particular. Obedecendo a Lei em que o próprio homem

contribuiu para existência dela, estaria o homem obedecendo senão a ele mesmo.

Por outro lado, as garantias fundamentais se baseariam na Declaração Americana,

que declara na mais importante delas, Declaração do Estado da Virginia, em seu

artigo 1º “ Que todos os homens são por natureza igualmente livres e independentes

e tem certos direitos inatos, dos quais quando entram em estado de sociedade, não

podem privar ou despojar seus pósteros que são: o gozo da vida e liberdade com

meios de adquirir felicidade e segurança.” O respaldo desta Declaração foram os

mesmos da Declaração Francesa, sendo que com forte influência do liberalismo

Page 33: Versão final ciência política

33

inglês e de autores como Locke, Montesquieu e Rosseau além das causas

específicas da liberdade de culto dos religiosos que fugiam da Inglaterra por razões

de perseguições religiosas.

E continua Bastos (1989) discorrendo no mesmo entendimento já esposado

que as liberdades públicas tiveram como causa o liberalismo, que por sua vez

assegurava uma liberdade contra o Estado, garantindo o Direito a Vida, a

locomoção, a expressão de pensamento e de propriedade. Neste aspecto nasceu a

formação da vontade do Estado, preservando direitos clássicos que não

desapareceram, mas tão somente mudou seu caráter absoluto no tocante a

imperiosidade de compartilhar o direito com outros princípios constitucionais. Um

exemplo é a destinação da propriedade.

Aspecto por demais importante e que fulcra as garantias fundamentais por ser

da sua própria essência, é a igualdade de todos perante a lei ou o caráter isonômico

do reconhecimento de direitos e obrigações. Neste ponto, veda-se e elimina-se

qualquer tipo de atitude discriminatória em relação à pessoa e aos bens e valores da

vida. É por assim dizer uma igualdade formal diante do que preconiza a lei. Alguns

doutrinadores mencionam tratar-se de igualdade substancial ou um tratamento de

igualdade de todos os homens perante os bens da vida, sendo a equiparação de

todos os homens no que diz respeito ao gozo e fruições de direitos e sujeição de

deveres. Para Bastos (1989) o princípio da igualdade material está inserido nas

Constituições sob a forma de normas programáticas, tendentes a planificar

desigualdade na fruição dos bens, quer materiais, quer imateriais. É em outras

palavras, o direito de todo cidadão não ser desigualado pela Lei, senão em

consonância de critérios albergados.

Outro princípio no qual ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma

coisa a não ser em virtude de lei preconiza o respaldo da Lei no exercício do limite a

liberdade individual. Neste aspecto o Estado como detentor de potestade e o

particular no uso de seu direito não pode fazer cumprir ou deixar de cumprir alguma

coisa senão em virtude de lei que o autorize. É por assim dizer, o princípio da

legalidade que eleva a lei à condição suprema de estabelecer o comportamento de

fazer ou deixar de fazer algo. Trata-se de condição de Estado de Direito ante

autoridade do preceito da lei, quer perante o indivíduo, quer perante o Estado e suas

Page 34: Versão final ciência política

34

organizações. É a garantia constitucional expressada pelo império da vontade da Lei

em um comportamento comissivo ou omissivo.

Esses princípios pré-mencionados encerram conteúdo normativo no artigo 5º

e seus incisos e além deles podem se destacar pela importância o rol de princípios e

direitos que se segue.

• Princípio da Liberdade de Culto ou crença religiosa é o que se pode

chamar do direito do indivíduo livremente deliberar sobre sua consciência de crença

religiosa além de livremente assegurar a liberdade de cultos religiosos. Neste

princípio preserva-se a liberdade de pensamento nos termos da própria Carta a

ponto de não haver intromissão na liberdade individual de crença e na realização de

sua exteriorização através de cultos.

• Direito a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da

imagem, sendo assegurado o direito a indenização pelo dano moral e material. Na

intimidade está presente o aspecto reservado da vida, da privacidade pessoal, dos

valores que preservam a pessoa em relação aos outros. Na vida privada há o óbice

à intromissão pessoal, quer por informações indevidas, quer por revelações

indevidas da intimidade do indivíduo em pessoa ou por outros meios que

exteriorizem os valores íntimos. Na honra esta tudo aquilo que fere a reputação do

indivíduo perante os outros, tirando a dignidade da reputação dos valores do

indivíduo; é a injuria; a calunia e a difamação. Na privacidade da imagem há

vedação a reprodução real da pessoa quer por foto, quer por meio de filmagem.

Nela normalmente a pessoa é ferida por ser violada na sua imagem em decorrência

de sua profissão ou ofício que a coloca em meio público de exposição capaz de

torna-la conhecida.

• Direito de liberdade do exercício de qualquer trabalho, ofício ou

profissão. Neste aspecto vemos presente o livre exercício profissional para que o

trabalhador possa ser qualificado subjetivamente ou objetivamente naquilo em que

livremente exerça por atividade, ofício ou profissão. Pode-se dizer que este direito

está implícito aos princípios fundamentais insculpidos no artigo 1º da Carta Magna

quais, sejam, o Valor Social do Trabalho e da livre iniciativa.

Page 35: Versão final ciência política

35

• Princípio da Inafastabilidade da Jurisdição corresponde a dizer que a

lesão ou ameaça ao Direito não será excluída da apreciação do judiciário, o que

quer dizer que toda ofensa ao direito pode ser objeto de apreciação pela prestação

jurisdicional do Estado, mediante o direito subjetivo de ação pelas vias do devido

processo legal. É de se verificar que a apreciação em matéria administrativa não faz

coisa julgada. Logo a rejeição de direito do postulante a recurso por via

administrativa é mais do que razão para motivar o acionamento do direito por lesão

ou ameaça de lesão. Para Araújo e Júnior (2010) conclui-se que o que preconiza o

dispositivo constitucional no artigo 5º, inciso XXXVI, é que o poder geral de cautela

expresso neste inciso, mesmo a míngua de disposição infraconstitucional expressa,

deve-se presumir concedido, quer em medidas liminares ou cautelares como forma

de resguardo do indivíduo das ameaças de direitos.

• Princípio do devido processo legal é a garantia constitucional ao

processo no desencadear de seus atos até a entrega da coisa julgada. Nele esta

implícito a garantia do contraditório de ampla defesa com os meios a ela inerentes.

Para Araújo e Junior (2010) citando Nelson Nery Junior, bastaria a norma

constitucional haver adotado o princípio do due processo of law para que dai

decorressem todas as consequências processuais que garantiriam aos litigantes o

direito a um processo e uma sentença justa. È por assim dizer gênero do qual todos

os demais princípios são espécies.

• A dignidade da Pessoa Humana é outro princípio fundamento do texto

constitucional. Neste princípio, segundo Araújo e Junior (2010) as pessoa humana é

o valor constitucional supremo que agrega diante de si a unanimidade dos demais

direitos e garantias fundamentais do homem expressos na constituição. Daí estar

intrinsecamente ligado o direito à vida, os direitos pessoais tradicionais, mas

também os direitos sociais, os direitos econômicos, os direitos educacionais, bem

como as liberdades públicas em geral. Quando a constituição proclama a dignidade

da pessoa humana, está corroborando um imperativo de justiça social.

• Direitos sociais também considerados direitos fundamentais elencam a

Carta Constitucional e podem ser considerados o direito a educação, a saúde, ao

trabalho, a moradia, ao lazer, a segurança, a previdência social, a infância, a

proteção a maternidade e a assistência aos desamparados.

Page 36: Versão final ciência política

36

Pode-se dizer que os direitos sociais encampam toda ação decorrente

de critério de justiça distributiva na sociedade e representam toda gama de direitos

que mesmo assegurado individualmente excedem os limites das garantias pessoais

do próprio indivíduo, alcançando pela sua abrangência a esfera da própria

sociedade por dar melhores condições de sobrevivência e igualdade entre os

indivíduos.

Para Silva (2012), os Direitos Sociais são aqueles que têm objetivo de

garantir aos indivíduos condições materiais tidas como imprescindíveis para pleno

gozo de seus direitos, por isso tendem a exigir do Estado intervenções na ordem

social segundo critérios de justiça distributiva tendendo sempre a diminuir as

desigualdades sociais.

Nesse grupo de direitos, pode-se se vislumbrar que a Carta Magna elencou

normas de direito expressas na, Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), dando

ordem pública de caráter constitucional a direitos como FGTS, décimo terceiro

salário, remuneração do trabalho noturno maior que o salário diurno, salário-família,

duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e 44 semanais, repouso

semanal remunerado, licença gestante, aviso prévio, proibição de diferenças de

salários, remuneração do serviço extraordinário superior a 50 % do normal, ação

quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho com prazo prescricional de

cinco anos para trabalhadores urbanos e rurais, com o limite de até dois anos até a

extinção do contrato, reconhecimento das convenções e acordos coletivos e

igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o

trabalhador avulso.

Ainda no tocante a direitos sociais, é possível dizer que entre avanços sociais

no campo do direito coletivo está o que prescreve o artigo 8º, inciso III, da Carta

Constitucional “ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou

individuais da categoria, inclusive em questões individuais ou coletivas”. Neste

dispositivo houve inovação no tocante a assistência por representação sindical,

posto que o legislador constituinte prevê uma assistência anômala, extraordinária da

categoria na qual o sindicato postula direito alheio em nome próprio, havendo um

caráter concorrente entre o substituto processual, sindicato, e os substituídos de

dada categoria profissional, detentores do direito material postulado pelo sindicato.

Page 37: Versão final ciência política

37

Pode-se dizer que do ponto de vista jurídico-formal o sindicato é detentor da

subjetividade jurídica para a ação e os substituídos daquela categoria profissional,

detentores da subjetividade jurídica do direito material posto em questão. No

entanto, há concorrência para o direito de ação.

• Direitos Políticos constituem outra gama de direitos elencados na

nossa Carta Magna, no capítulo quarto do título segundo, conforme se passa a

mencionar os mais importantes.

O voto direto e secreto como valor igual para todos é o direito de soberania

popular que se manifesta pela representação da vontade do cidadão participante do

processo eletivo, através do chamado sufrágio universal, que nos termos da Lei

pode ser exercido através de plebiscito, referendo e iniciativa popular. No primeiro,

plebiscito, há uma consulta popular a respeito de proposição normativa. Já no

segundo, referendo, ao contrario, há uma consulta popular sobre texto de Lei já

incorporado no ordenamento vigente. Tanto uma forma de expressão da vontade

popular quanto a outra, representa uma ordem expressa que regra a exteriorização

da vontade por soberania popular. A iniciativa popular, por sua vez, representa a

exteriorização da expressão popular através de representação mínima de três

décimos porcento em pelo menos cinco Estados da Federação. Agra (2010) discorre

que na iniciativa popular cada eleitor deve ser nominado individualmente com

endereço e dados que possibilitem saber o número de seu titulo eleitoral. Há

também de se observar que a iniciativa popular pode ser patrocinada por partidos

políticos e entidades da sociedade civil e somente deve se limitar a um assunto.

No tocante ao alistamento eleitoral o voto é obrigatório para os maiores de

dezoito anos, sendo facultativo para analfabetos, maiores de setenta anos e maiores

de dezesseis e menores de dezoito. Neste ponto o texto constitucional é claro sem

mais contornos referenciando de forma expressa a condição pessoal para ser eleitor

e o poder ser eleitor através de deliberação volitiva da pessoa que alcançar os

requisitos prescritos para esta mesma volitividade facultativa.

Ainda pela importância, sobre os Direitos Políticos, a Carta traça parâmetros

para elegibilidade: ser de nacionalidade brasileira; ter pleno exercício de direitos

políticos; ter alistamento eleitoral; ter domicílio eleitoral na circunscrição; ter filiação

partidária; ter idade mínima dependendo do cargo a ser postulado. A elegibilidade é,

Page 38: Versão final ciência política

38

portanto, a condição sine qua non para que o candidato adquira condição de tornar

possível a posse em cargo eletivo. Neste diapasão, então, pode-se dizer que no

tocante a nacionalidade estaríamos diante de atributo personalíssimo da pessoa

humana no concerne a requisito de aquisição de seu direito de cidadania no país.

Trata-se de atributo pessoal intransferível, só sendo adquirido pela própria pessoa.

Já no concernente ao pleno exercício dos direitos políticos, diz –se a prerrogativa de

poder gozar e fruir da plena atividade de cargo eletivo, quer por provimento em

eleição no executivo ou legislativo, através do sistema proporcional ou majoritário.

No tocante ao alistamento eleitoral ou a inscrição do candidato, trata-se de requisito

indispensável para tornar possível a existência do registro jurídica eleitoral do

candidato e de sua candidatura. Já o domicílio eleitoral na circunscrição é o animus

de exercer a atividade eletiva em determinado âmbito territorial de jurisdição

eleitoral. Quanto a filiação partidária só aqueles que estão em pleno gozo de seus

direitos políticos podem filiar-se com a ressalva de ser possível também àqueles

eleitores considerados inelegíveis. Para Silva (2012) a filiação partidária é o ato pelo

qual um eleitor adota um programa e passa a integrar um partido político, sendo

vínculo de elegibilidade do cidadão por um partido político. Disto decorre que para

eleição em cargo eletivo, o eleitor deve se filiar a partido político com antecedência

de um ano. Há pessoas ou categorias nas quais existem vedações de atividade

política partidária prevista em lei: Magistrados; membros do Ministério Público;

membros do TCU; membros da defensoria pública; serventuário da justiça eleitoral.

No que concerne a idade mínima para elegibilidade, é preconizado que para

Presidentes, Vice Presidente e Senadores a idade mínima limite é de trinta e cinco

anos; já para Governador e Vice Governador a idade limite mínima é de trinta anos;

Deputado Federal, Deputado Estadual, Distrital e Prefeito Vice Prefeito e Juiz de

Paz, a idade é de vinte e um anos como limite mínimo; e vereador a idade limite

mínima é de 18 anos.

A Carta Magna ainda no artigo 14, parágrafo 4º, trata dos inalistáveis e

inelegíveis. Por inalistáveis entende-se segundo Agra (2010) aqueles cidadãos que

tiveram seus direitos políticos perdidos ou suspensos pelo tempo que durar a

suspensão. São os estrangeiros e os conscritos. Conscritos são os militares no

serviço militar obrigatório. Ainda o mesmo autor arrazoa que o impedimento é no

caso de serviço militar obrigatório, sendo alistável o cidadão antes ou depois do

Page 39: Versão final ciência política

39

serviço militar obrigatório. E continua o autor arrazoando que os estrangeiros,

cidadãos que não tenham nacionalidade brasileira, não podem votar ou se alistar

como candidatos. No tocante aos inelegíveis ou aqueles que não têm capacidade

eleitoral passiva, sendo impedido no exercício do direito de se inscrever

politicamente em cago público eletivo, a Constituição estabelece em seu parágrafo

7º, artigo 14, que o cônjuge e os parentes afins até segundo grau ou por adoção de

Presidente da República, Governador e Prefeito ou de quem os haja substituído nos

seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à

reeleição, são inelegíveis.

Outro aspecto de grande relevância elencado na Carta Constitucional é o que

se preconiza no teor do artigo 16 da Carta Magna “A lei que altera o processo

eleitoral entrará em vigor na data da sua publicação, não se aplicando à eleição que

ocorra até um ano da data de sua vigência (Redação dada pela Emenda

Constitucional nº 4/93).” Este dispositivo foi fundamental para assegurar a decisão

por maioria de votos da não aplicabilidade imediata da Lei Complementar 135/ 2010,

a qual previa aplicação imediata da tipicidade prevista neste texto legal. O

entendimento foi de que o princípio da anterioridade legal de um ano para a Lei que

altere o processo eleitoral constitui cláusula pétrea eleitoral e a lei interfere

sobremodo no próprio processo eleitoral, devendo ser aplicada na espécie a Carta

Constitucional no seu artigo 16 por tratar-se de norma com eficácia temporal para

início de aplicabilidade.

O entendimento da Corte Suprema já mudou, pois se antes no entendimento

daquela corte não havia condições para aplicabilidade imediata da Lei 135/2010 ou

Lei da Ficha Limpa pelas razões do efeito inter-temporal da anterioridade do preceito

legal para as eleições de 2010, hoje já não existe este entendimento face o

transcurso desta mesma anterioridade para Lei 135/2010 para as eleições

vindouras. Não raro também pela decisão do Supremo da Constitucionalidade da Lei

135/2010.

Ainda no tocante a aspectos dos direitos políticos, a Carta Constitucional diz

ser livre a criação, extinção, fusão incorporação de partidos políticos, devendo ser

assegurada a soberania nacional, os direitos fundamentais da pessoa humana, o

regime democrático e o pluripartidarismo.

Page 40: Versão final ciência política

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Nestes aspectos vê-se que a Carta preserva a liberdade política e suas

formas de expressões, criações, nascimento e extinção, desde que as garantias

fundamentais da pessoa humana estejam preservadas pela sua liberdade de

consciência política e que haja respeito ao regime democrático ou expressões do

posicionamento político do povo além de ser possível o pluripartidarismo político.

Todos estes aspectos devem preservar a soberania nacional que não permitirá a

subordinação e a ingerência política a partidos políticos, mediante recursos

financeiros de entidade ou governos estrangeiros.

Note-se na mesma corrente que entre os fundamentos do Estado brasileiro,

constituindo o Estado Democrático de Direito está o pluralismo político ou

diversidade política como reconhecimento expresso onde vários partidos são

reconhecidos no exercício do seu poder político, segundo as regras e diretrizes da

sua criação nos respectivos estatutos da entidade e conforme o procedimento

eleitoral previsto em lei.

A Constituição ainda assegura aos partidos políticos autonomia para definir

sua estrutura interna, organização e funcionamento e critérios para adotar a escolha

e o regime de suas coligações eleitorais sem obrigatoriedade de vinculação entre

candidatos a nível nacional.

Essa é a gama mais importante de direitos e princípios constitucionais que

interessam a esta obra.

Page 41: Versão final ciência política

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3 COMPARAÇÕES, INFLUÊNCIAS E SIMILITUDES ENTRE AS CARTAS CONSTITUCIONAIS 1824/1988

A Carta Constitucional de 1824 teve sua proclamação antecedida de vários

acontecimentos que desencadearam seu surgimento.

Em primeiro lugar, antecedeu a Carta de 1824, uma crise no sistema colonial

enfraquecida pela grande alta do comércio industrial, posto que se deixava de lado o

comércio de mercearias e de matéria prima para se dá ênfase ao comércio de

produtos industrializados e manufaturados com a livre concorrência entre as nações.

Neste ponto as relações internacionais não eram mais regidas em seus aspectos

comercias pela superioridade das metrópoles em detrimento das colônias, mas sim

pela livre concorrência de mercado pelo império do capital industrial. Nisto, então,

havia uma superioridade do trabalho livre sobre a mão de obra escrava, posto que o

sistema capitalista até por questões de maior fluxo de capital para o comércio e suas

relações dava mais ênfase as relações de trabalho, já que empreendidas pelo

trabalho livre.

O liberalismo político da época também falou mais alto para o advento da

Carta de 1824, já que se tratava de luta contra instituições dos regimes autoritários

da época pelo excesso de poder real e privilégios da nobreza, do sistema feudalista

e forte absolutismo e concentração do poder monárquico. E neste aspecto o regente

D. João VI também adepto do liberalismo político trouxe ao Brasil Colonial grande

Page 42: Versão final ciência política

42

influência deste regime político que concorreu decisivamente para o

constitucionalismo nacional.

Outro aspecto que desencadeou e concorreu para a Carta de 1824 foram os

movimentos revolucionários, sobretudo o da Revolução de 1817 fundamentada na

crise Econômica Regional, no fim do absolutismo monárquico português,

independência do Brasil e proclamação da Republica.

A revolução constitucional do Porto com o desencadeameto da Carta Magna

Portuguesa e a proposta de uma Monarquia dual com o Brasil e o sentimento de

independência e sua proclamação com o fico de D. Pedro, rompendo com a Coroa

Portuguesa também concorreram para a Monarquia Constitucional do Brasil.

Outro fato existente e que Alguns autores não reconhecem, mas que houve

grande influência para concorrer para Carta Constitucional de 1824, era o medo de

uma revolta de negros e mestiços, através de movimento revolucionário, já que

tratava-se da camada da sociedade que não tinha cidadania e que era posta à

margem dos direitos civis.

Pode-se dizer que a Carta Constitucional do Império foi outorgada após um

processo de golpe do então imperador D. Pedro que dissolveu a Constituinte da

época, que estava sobre forte influência dos ideais de correntes republicanas, uma

vez que entendia que o imperador deveria submeter seus atos e decisões à

Assembleia, não sendo inviolável e soberano em seu poder. Daí porque o imperador

D. Pedro resolveu, sentindo-se violado em seu mandato imperial, dissolver a

Assembleia Constituinte e convocar um Conselho de notáveis para elaborar o texto

jurídico constitucional.

Já a Carta Constitucional de 1988 foi antecedida de uma forte luta pela

institucionalização da democracia no país, posto que havia um regime de exceção

que não reconhecia ou restringia Direitos Políticos, Direitos de Cidadania e Direitos

Civis. Este período durou de 1964 a 1985, atingindo seu auge de maior exceção

com o Ato do AI- 5, que representava a repreensão a todo e qualquer movimento de

mudança do regime político existente além de institucionalizar o arbítrio pelo direito

onde não se havia garantias, mas sim a afirmação do controle e suspensão de

direitos. Neste período houve o fechamento do congresso e a cassação de direitos

Page 43: Versão final ciência política

43

políticos de deputados e senadores, havendo grande repressão por aparato militar

além de mortos, desaparecidos, torturados e presos. Era período de grande

processo inflacionário e crescimento da dívida externa com cavalar política de juros

internacionais para correção da dívida, onde o Fundo Monetário Internacional regia o

fluxo de divisas do país, estabelecendo, em face da influência das regras financeiras

impostas, as diretrizes para política interna do País e influência para as regras das

relações internacionais no campo econômico.

Como visto, o contexto repressivo político e recessivo econômico aliado a luta

pela busca do reconhecimento das garantias individuais, dos direitos políticos, dos

direitos da cidadania e de direitos sociais além da tentativa da emancipação política

do povo com a Emenda Dante de Oliveira para as diretas já e as eleições indiretas

de Tancredo Neves, também foram aspectos de influência relevante para a Carta

Constitucional de 1988.

Nesses aspectos, então, pode-se dizer que não houve similitude para as

influências das duas Cartas, no entanto, havia a busca pela identidade política da

nação nos diferentes períodos. Por um lado, houve as influências do liberalismo

político, movimento burguês que visava entre as suas principais causas o

enfraquecimento do absolutismo real pela quebra da autoridade excessiva do poder

real, concentração monárquica e privilégios da nobreza; por outro, houve a luta pela

democracia e pela implantação na nação do chamado Estado Democrático de

Direito com o respeito aos direitos políticos, sociais e individuais com suas garantias

fundamentais. Tudo em confronto com regime de exceção de direitos e sua rigidez

política.

No campo econômico havia uma crise do sistema colonial e um fortalecimento

do capital industrial, que forçava o Brasil a aderir ao liberalismo econômico. Houve

ainda um período recessivo e suas conseqüências sociais além de uma dívida

externa excessiva, que forçava o país a aderir às regras impostas pelo FMI,

enfraquecendo sua soberania.

Alguns movimentos revolucionários do Brasil como, qual, e, sobretudo, a

Revolução Pernambucana uma das causas decisivamente preocupantes na época,

influenciou ou concorreu também para Carta de 1824 pelo temor de algo de

proporções revolucionárias maiores e a preocupação em garantir a ordem no país.

Page 44: Versão final ciência política

44

Já para Carta de 1988, não houve processo revolucionário, mas algo que

influenciou para formação da Assembleia Nacional Constituinte (ANC) foi a luta do

povo pelas diretas já ou emenda Dante de Oliveira.

No campo jurídico legal, podem-se mencionar alguns dispositivos da Carta de

1824, que apesar do hiato legal até a Carta de 1988, de alguma forma por um

processo de recepção das demais Cartas Constitucionais, influenciaram princípios e

normas constitucionais de 1988.

Logo no artigo 1°, da Carta do Império, vê-se que há traços marcantes da

Soberania Nacional respaldada nos princípios de independência, quer quanto a sua

política interna não admitindo laço de união ou federação e quer na sua política

internacional quando considera o Brasil uma Nação livre e independente. Neste

contexto, em si tratando da Soberania Nacional a Carta Política de 1988, alude,

expressamente, como fundamento principal, conforme disposição no Artigo 1°, inciso

I, a soberania.

Ainda no artigo primeiro da Carta Política de 1824, afigura-se que o Brasil é a

associação política de todos os cidadãos brasileiros, enquanto na Carta

Constitucional atual todo poder emana do povo. Nestes parâmetros há grande

diferença, posto que enquanto uma Carta faz menção que o Brasil é a associação

política de cidadãos a outra referência que todo poder emana do povo e que o Brasil

é a união indissolúvel dos entes federados. De se ver por ressaltar que somente as

pessoas seletas do artigo 6° da Carta Constitucional do Império podiam ser cidadãos

brasileiros e, por conseguinte, compor a estrutura Política da associação do Império.

Na Carta Política de 1824 do artigo 6º ao artigo 8º, faz-se menção aos

brasileiros natos e naturalizados, esclarecendo-se quem são os cidadãos brasileiros,

a perda do título de cidadão brasileiro e quando havia suspensão do exercício de

direitos políticos. Já na Carta atual faz-se menção a nacionalidade, especificando

quem são os brasileiros natos e naturalizados. Em ambas as Cartas com suas

especificidades, trata-se da nacionalidade ou atributo inerente à pessoa ou

personalíssimo da pessoa que nasceu no Brasil ou adquiriu a nacionalidade

brasileira.

Page 45: Versão final ciência política

45

No tocante a divisão, independência e harmonia entre poderes, não havia o

conceito tripartido dos poderes apregoados por Montesquier, mas sim uma divisão,

diferentemente da de hoje, que preceituava o Poder legislativo, Judiciário, Executivo

e o Moderador. Neste ficava claro que a chave de toda organização política

dependia deste poder e que o imperador, sendo chefe supremo da Nação, mantinha

através deste mesmo poder a independência, equilíbrio e harmonia dos demais

poderes, atuando como instrumento de absorção de atritos que se sobrepunha ou

estava sobreposto a qualquer autoridade, sendo suas decisões soberanas como

imperador constitucional.

Note-se que não há nada igual ao poder Moderador da época, apesar de

haver os três poderes de então hoje. No entanto, pode-se dizer que existe hoje

instrumentos que podem não fazer as vezes do poder moderador, mas guarda

alguma relação com autoridade que se atribuía à época ao referido poder, que

mesmo não sendo similar guarda traços. É o caso das chamadas Medidas

Provisórias como instrumento atípico usado pelo executivo, através de prerrogativa

pessoal do Presidente da Republica. Nestas, diferentemente do Decreto-Lei, que

também era usado por autoridade do Presidente da Republica, que o editava e tinha

força de Lei a partir de sua edição, sendo tacitamente acolhido quando não

houvesse à apreciação do Congresso nos sessenta dias subsequentes a sua edição

e tendo em caso de sua rejeição a eficácia dos atos jurídicos que fossem praticados

com sua égide de existência, o Presidente da República em face da relevância e

urgência manda para o Congresso a mensagem de Lei em forma de medida para

que seja no prazo de sessenta dias prorrogável por mais sessenta, em caso de não

apreciação em 45 dias, ser votada ou, em caso contrário, não sendo votada perca

sua eficácia, voltando-se ao status quo e sendo por decreto legislativo disciplinada

as relações jurídicas dela decorrentes em caso de não apreciação pelo congresso.

Não se pode dizer que se faz às vezes do Poder Moderador, mas o Tribunal

de Contas exerce a função de freios e contra pesos, se sobrepondo a todo e

qualquer poder, pois para Naufel (1988) é órgão de controle, sem subordinação

direta a qualquer dos poderes constitucionais da República e dos Estados Membros,

por ser responsável pela competência de acompanhar e fiscalizar a execução do

orçamento e julgamento das contas, despesas e atos que envolvam o interesse

financeiro dos órgãos e entes públicos e seus permissionários.

Page 46: Versão final ciência política

46

No tocante ao poder legislativo havia Assembleia Geral composta da Câmara

dos Deputados e da Câmara de Senadores ou Senado. Neste parâmetro podemos

dizer que a Assembleia fazia as vezes do atual Congresso Nacional além de seus

membros serem invioláveis por atos e opiniões, sendo necessária a permissão da

Câmara para que um senador ou deputado fosse processado, dando-se já na época

a chamada imunidade parlamentar.

O processo de criação e aprovação da Lei era bem parecido com o atual onde

na época o imperador dava ou negava a sanção aos decretos e os enviava as

Câmaras do Império, tribunais e demais localidades onde se pudesse fazer público.

No Executivo o Imperador era o chefe do poder que o exercia com os

ministros. Neste poder muitas das atribuições eram idênticas as atuais atribuições

do Presidente da República no exercício do seu Poder. Neste aspecto, houveram

influências para os dias atuais tais como nomear magistrados, prover cargos,

nomear comandantes da força de terra e de mar, nomear embaixadores e

diplomatas, dirigir negociações políticas, fazer tratados, declarar guerra e fazer paz,

conceder honras, títulos e ordens militares, expedir decretos, instruções,

regulamentos, jurar observar e fazer observar a Constituição, impossibilidade de se

ausentar do Pais, senão em virtude de consentimento da Assembléia Geral entre

outras.

O Conselho de Estado, fazendo as vezes do Conselho de Republica e do

Conselho de Defesa Nacional atuais, era ouvido em todo os negócios graves e

medidas gerais da pública administração principalmente pela declaração de guerra,

ajustes de paz, negociações com nações estrangeiras, destacando-se e sendo

órgão de consulta do imperador.

Processo de reforma constitucional já previsto, mas guardando certa

complexidade com tempo delimitado de revisão, discussão, expedição e sanção do

Imperador, sendo observado como matéria de ordem na primeira sessão para sua

apreciação.

Não havia o chamado controle de constitucionalidade, sendo atribuição da

Assembleia Geral a de fazer leis, interpretá-las, suspendê-las e revogá-las além de

velar pela guarda da Constituição. Note-se que à época o Supremo Tribunal de

Page 47: Versão final ciência política

47

Justiça, não exercia a guarda da constituição que era feita pelo poder legislativo

(artigo 15 da Constituição do Império).

Garantias de direitos civis e políticos do cidadão expressos tal qual a atual

Carta Constitucional, elencando-se garantias fundamentais como as de não fazer ou

deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de Lei, Lei sem disposição de efeito

retroativo, preservando-se por critério inter-temporal de direitos já consolidados,

liberdade de pensamento, de palavras e de religião, apesar do catolicismo ser a

religião oficial, liberdade de ir e vir, podendo sair e entrar do império sem permissão,

princípio da formação de culpa ou nota de culpa, ninguém podendo ser preso sem

culpa formada, exceto nos casos legais, prisão legal, ninguém podendo ser preso a

não ser em flagrante delito ou por ordem escrita de autoridade legítima, igualdade

substancial da Lei ou igualdade formal com a Lei igual para todos, abolição do crime

de tortura e açoites, pena igual para todos na medida do delito, pois a pena não

podia passar da pessoa do delinquente, garantia do direito de propriedade, proteção

ao direito de invenções, inviolabilidade de correspondências, direito de petição,

podendo o cidadão apresentar queixas ou petições por escrito e expor infrações da

constituição perante as autoridades competentes e preservação expressa ao direito

individual, não podendo ser suspensos direitos individuais em detrimento dos

poderes constitucionais.

Pode-se dizer que esses aspectos já pré-mencionados são as principais

similitudes, comparações e influencias que mais chamam a atenção pela

importância.

Page 48: Versão final ciência política

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CONCLUSÃO

Conclui-se que os motivos ou causas ensejadoras da Carta Política de 1824,

não chegaram a se coadunar com os aspectos e razões ensejadoras da Carta

Política de 1988. No entanto, houve situações políticas que desencadearam ou

precipitaram movimentos que inarredavelmente concorreram diretamente para as

duas Catas Políticas.

Primeiramente havia no país a avidez de um constitucionalismo liberal,

inflamado pela própria febre do liberalismo, movimento burguês que pregava o

individualismo pela ausência do absolutismo real e ascensão das idéias de Adam

Smith além de um total enfraquecimento do sistema colonialista pela adoção do

fortalecimento das metrópoles. Com isto, Portugal se enfraqueceu economicamente,

nascendo já pelo movimento constitucionalista da cidade do Porto, a intenção de um

Governo Monárquico Constitucional de caráter Dual. Daí a visão do regente

imperador de ver o País se emancipar politicamente das rédeas de Portugal além do

grande medo de processos revolucionários que causariam dificuldades em

asseverar o processo de independência anteriormente proclamado e que seria

sedimentado com uma monarquia constitucional.

Em um segundo momento político, havia o arbítrio da exceção pelo Direito, o

que possibilitou o desencadear de grandes movimentos de processo democráticos

como, quais: Carta do Recife em 1971, que pregava a convocação de uma

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constituinte; crise de 1977, com o pacote de abril que levou o MDB a oficializar um

movimento de convocação de uma constituinte; lei da anistia e reforma partidária

que substituiu a antiga ARENA e MDB, levando-se o quadro partidário a se

organizar com o surgimento de vários outros partidos como PDS, PMDB, PDT e PT;

convocação de congresso de Pontes de Miranda, por decisão da OAB em 1981;

surgimento de organizações específicas pela constituinte – sindicatos, federações,

centrais sindicais, associações, movimentos universitários, estudantis,

representações profissionais, igrejas; campanhas pelas diretas e eleição de

Tancredo Neves; instalação do Poder Constituinte com a Anac, que culminou com a

atual Carta Magna e consequente ingresso no país do Estado Democrático de

Direito com a ascensão pela emancipação de Direitos Políticos, Sociais e Garantias

Fundamentais.

Pode-se dizer que a luta pelo Estado Constitucional de Direito valorada pela

busca de um processo de maturidade política no qual, de um lado, se pregava a

ausência de absolutismo real e, do outro, o fim da exceção pelo Estado Democrático

de Direito, foram indubitavelmente aspectos que comprovam a similitude na luta pela

instalação do Estado de Direito com garantias de valores fundamentais, sociais e

políticos.

A incidência da influência de crises econômicas que desencadearam

movimentos que repercutiram até as efetivas Cartas Políticas, onde num primeiro

estágio se vivia a crise do sistema colonial e ascensão do liberalismo econômico e,

noutro, um período recessivo econômico com dívida externa e regras traçadas pelo

FMI, foram decisivamente causas de grande relevância para as Cartas de 1988 e de

1824

No campo jurídico, verifica-se que alguns dispositivos da Carta Política de

1824 por uma espécie de processo de recepção das demais cartas constitucionais,

influenciaram princípios e normas constitucionais de 1988. Noutros, em contrário

senso, não houve a influência direta, mas alguns direitos trataram o mesmo título

jurídico em uma roupagem sistemática diferente. É o caso, na Carta de 1824, do

artigo 1º, 9º, 11º, 14º, artigo 179, com rol de garantias fundamentais muito similares

ao artigo 5º da Carta Magna de 1988 e seus incisos além de outros.

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50

Por fim, pode-se dizer que alguns direitos assegurados na Carta do Império

tiveram um grau de similitude, aproximando-se de direitos elencados na Carta

Política Atual.

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ANEXO I

Presidência da RepúblicaCasa Civil

Subchefia para Assuntos Jurídicos

CONSTITUICÃO POLITICA DO IMPERIO DO BRAZIL (DE 25 DE MARÇO DE 1824)

EM NOME DA SANTISSIMA TRINDADE.

TITULO 1º

Do Imperio do Brazil, seu Territorio, Governo, Dynastia, e Religião.

Art. 1. O IMPERIO do Brazil é a associação Politica de todos os Cidadãos Brazileiros. Elles formam uma Nação livre, e independente, que não admitte com qualquer outra laço algum de união, ou federação, que se opponha á sua Independencia.

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Art. 2. O seu territorio é dividido em Provincias na fórma em que actualmente se acha, as quaes poderão ser subdivididas, como pedir o bem do Estado.

Art. 3. O seu Governo é Monarchico Hereditario, Constitucional, e Representativo.

Art. 4. A Dynastia Imperante é a do Senhor Dom Pedro I actual Imperador, e Defensor Perpetuo do Brazil.

Art. 5. A Religião Catholica Apostolica Romana continuará a ser a Religião do Imperio. Todas as outras Religiões serão permitidas com seu culto domestico, ou particular em casas para isso destinadas, sem fórma alguma exterior do Templo.

TITULO 2º

Dos Cidadãos Brazileiros.

Art. 6. São Cidadãos Brazileiros

I. Os que no Brazil tiverem nascido, quer sejam ingenuos, ou libertos, ainda que o pai seja estrangeiro, uma vez que este não resida por serviço de sua Nação.

II. Os filhos de pai Brazileiro, e Os illegitimos de mãi Brazileira, nascidos em paiz estrangeiro, que vierem estabelecer domicilio no Imperio.

III. Os filhos de pai Brazileiro, que estivesse em paiz estrangeiro em sorviço do Imperio, embora elles não venham estabelecer domicilio no Brazil.

IV. Todos os nascidos em Portugal, e suas Possessões, que sendo já residentes no Brazil na época, em que se proclamou a Independencia nas Provincias, onde habitavam, adheriram á esta expressa, ou tacitamente pela continuação da sua residencia.

V. Os estrangeiros naturalisados, qualquer que seja a sua Religião. A Lei determinará as qualidades precisas, para se obter Carta de naturalisação.

Art. 7. Perde os Direitos de Cidadão Brazileiro

I. O que se nataralisar em paiz estrangeiro.

II. O que sem licença do Imperador aceitar Emprego, Pensão, ou Condecoração de qualquer Governo Estrangeiro.

III. O que for banido por Sentença.

Art. 8. Suspende-so o exercicio dos Direitos Politicos

I. Por incapacidade physica, ou moral.

II. Por Sentença condemnatoria a prisão, ou degredo, emquanto durarem os seus effeitos.

TITULO 3º

Dos Poderes, e Representação Nacional.

Art. 9. A Divisão, e harmonia dos Poderes Politicos é o principio conservador dos Direitos dos Cidadãos, e o mais seguro meio de fazer effectivas as garantias, que a Constituição offerece.

Art. 10. Os Poderes Politicos reconhecidos pela Constituição do Imperio do Brazil são quatro: o Poder Legislativo, o Poder Moderador, o Poder Executivo, e o Poder Judicial.

Art. 11. Os Representantes da Nação Brazileira são o Imperador, e a Assembléa Geral.

Art. 12. Todos estes Poderes no Imperio do Brazil são delegações da Nação.

TITULO 4º

Do Poder Legistativo.

CAPITULO I.

Do: Ramos do Poder Legislativo, e suas attribuições

Art. 13. O Poder Legislativo é delegado á Assembléa Geral com a Sancção do Imperador.

Art. 14. A Assembléa Geral compõe-se de duas Camaras: Camara de Deputados, e Camara de Senadores, ou Senado.

Art. 15. E' da attribuição da Assembléa Geral

I. Tomar Juramento ao Imperador, ao Principe Imperial, ao Regente, ou Regencia.

II. Eleger a Regencia, ou o Regente, e marcar os limites da sua autoridade.

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III. Reconhecer o Principe Imperial, como Successor do Throno, na primeira reunião logo depois do sem nascimento.

IV. Nomear Tutor ao Imperador menor, caso seu Pai o não tenha nomoado em Testamento.

V. Resolver as duvidas, que occorrerem sobre a successão da Corôa.

VI. Na morte do Imperador, ou vacancia do Throno, instituir exame da administração, que acabou, e reformar os abusos nella introduzidos.

VII. Escolher nova Dynastia, no caso da extincção da Imperante.

VIII. Fazer Leis, interpretal-as, suspendel-as, e rovogal-as.

IX.Velar na guarda da Constituição, e promover o bem geral do Nação.

X. Fixar annualmente as despezas publicas, e repartir a contribuição directa.

XI. Fixar annualmente, sobre a informação do Governo, as forças de mar, e terra ordinarias, e extraordinarias.

XII. Conceder, ou negar a entrada de forças estrangeiras de terra e mar dentro do Imperio, ou dos portos delle.

XIII. Autorisar ao Governo, para contrahir emprestimos.

XIV. Estabelecer meios convenientes para pagamento da divida publica.

XV. Regular a administração dos bens Nacionaes, e decretar a sua alienação.

XVI. Crear, ou supprimir Empregos publicos, e estabelecer-lhes ordenados.

XVI. Determinar o peso, valor, inscripção, typo, e denominação das moedas, assim como o padrão dos pesos e medidas.

Art. 16. Cada uma das Camaras terá o Tratamento - de Augustos, e Dignissimos Senhores Representantes da Nação.

Art. 17. Cada Legislatura durará quatro annos, e cada Sessão annual quatro mezes.

Art. 18. A Sessão Imperial de abertura será todos os annos no dia tres de Maio.

Art. 19. Tambem será Imperial a Sessão do encerramento; e tanto esta como a da abertura se fará em Assembléa Geral, reunidas ambas as Camaras.

Art. 20. Seu ceremonial, e o da participação ao Imperador será feito na fórma do Regimento interno.

Art. 21. A nomeação dos respectivos Presidentes, Vice Presidentes, e Secretarios das Camaras, verificação dos poderes dos seus Membros, Juramento, e sua policia interior, se executará na fórma dos seus Regimentos.

Art. 22. Na reunião das duas Camaras, o Presidente do Senado dirigirá o trabalho; os Deputados, e Senadores tomarão logar indistinctamente.

Art. 23. Não se poderá celebrar Sessão em cada uma das Camaras, sem que esteja reunida a metade, e mais um dos seus respectivos Membros.

Art. 24. As Sessões de cada uma das Camaras serão publicas á excepção dos casos, em que o bem do Estado exigir, que sejam secretas.

Art. 25. Os negocios se resolverão pela maioria absoluta de votos dos Membros presentes.

Art. 26. Os Membros de cada uma das Camaras são inviolaveis polas opiniões, que proferirem no exercicio das suas funcções.

Art. 27. Nenhum Senador, ou Deputado, durante a sua deputação, póde ser preso por Autoridade alguma, salvo por ordem da sua respectiva Camara, menos em flagrante delicto de pena capital.

Art. 28. Se algum Senador, ou Deputado fòr pronunciado, o Juiz, suspendendo todo o ulterior procedimento, dará conta á sua respectiva Camara, a qual decidirá, se o processo deva continuar, e o Membro ser, ou não suspenso no exercicio das suas funcções.

Art. 29. Os Senadores, e Deputados poderão ser nomeados para o Cargo de Ministro de Estado, ou Conselheiro do Estado, com a differença de que os Senadores continuam a ter assento no Senado, e o Deputado deixa vago o seu logar da Camara, e se procede a nova eleição, na qual póde ser reeleito e accumular as duas funcções.

Art. 30. Tambem accumulam as duas funcções, se já exerciam qualquer dos mencionados Cargos, quando foram eleitos.

Art. 31. Não se pode ser ao mesmo tempo Membro de ambas as Camaras.

Art. 32. O exercicio de qualquer Emprego, á excepção dos de Conselheiro de Estado, o Ministro de Estado, cessa interinamente, emquanto durarem as funcções de Deputado, ou de Senador.

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Art. 33. No intervallo das Sessões não poderá o Imperador empregar um Senador, ou Deputado fóra do Imperio; nem mesmo irão exercer seus Empregos, quando isso os impossibilite para se reunirem no tempo da convocação da Assembléa Geral ordinaria, ou extraordinaria.

Art. 34. Se por algum caso imprevisto, de que dependa a segurança publica, ou o bem do Estado, fôr indispensavel, que algum Senador, ou Deputado sáia para outra Commissão, a respectiva Camara o poderá determinar.

CAPITULO II

Da Camara dos Deputados.

Art. 35. A Camara dos Deputados é electiva, e temporaria.

Art. 36. E' privativa da Camara dos Deputados a Iniciativa.

I. Sobre Impostos.

II. Sobre Recrutamentos.

III. Sobre a escolha da nova Dynastia, no caso da extincção da Imperante.

Art. 37. Tambem principiarão na Camara dos Deputados

I. O Exame da administração passada, e reforma dos abusos nella introduzidos.

A discussão das propostas, feitas polo Poder Executivo.

Art. 38. E' da privativa attribuição da mesma Camara decretar, que tem logar a accusação dos Ministros de Estado, e ConseIheiros de Estado.

Art. 39. Os Deputados vencerão, durante as Sessões, um Subsidio, pecuniario, taxado no fim da ultima Sessão da Legislatura antecedente. Além disto se lhes arbitrará uma indemnisação para as despezas da vinda, e volta.

CAPITULO III.

Do Senado.

Art. 40. 0 Senado é composto de Membros vitalicios, e será organizado por eleição Provincial.

Art. 41. Cada Provincia dará tantos Senadores, quantos forem metade de seus respectivos Deputados, com a differença, que, quando o numero dos Deputados da Provincia fôr impar, o numero dos seus Senadores será metade do numero immediatamente menor, de maneira que a Provincia, que houver de dar onze Deputados, dará cinco Senadores.

Art. 42. A Provincia, que tiver um só Deputado, elegerá todavia o seu Senador, não obstante a regra acima estabelecida.

Art. 43. As eleições serão feitas pela mesma maneira, que as dos Deputados, mas em listas triplices, sobre as quaes o Imperador escolherá o terço na totalidade da lista.

Art. 44. Os Logares de Senadores, que vagarem, serão preenchidos pela mesma fórma da primeira Eleição pela sua respectiva Provincia.

Art. 45. Para ser Senador requer-se

I. Que seja Cidadão Brazileiro, e que esteja no gozo dos seus Direitos Politicos.

II. Que tenha de idade quarenta annos para cima.

III. Que seja pessoa de saber, capacidade, e virtudes, com preferencia os que tivirem feito serviços á Patria.

IV. Que tenha de rendimento annual por bens, industria, commercio, ou Empregos, a somma de oitocentos mil réis.

Art. 46. Os Principes da Casa Imperial são Senadores por Direito, e terão assento no Senado, logo que chegarem á idade de vinte e cinco annos.

Art. 47. E' da attribuição exclusiva do Senado

I. Conhecer dos delictos individuaes, commettidos pelos Membros da Familia Imperial, Ministros de Estado, Conselheiros de Estado, e Senadores; e dos delictos dos Deputados, durante o periodo da Legislatura.

II. Conhecer da responsabilidade dos Secretarios, e Conselheiros de Estado.

III. Expedir Cartas de Convocação da Assembléa, caso o Imperador o não tenha feito dous mezes depois do tempo, que a Constituição determina; para o que se reunirá o Senado extraordinariamente.

IV. Convocar a Assembléa na morte do Imperodor para a Eleição da Regencia, nos casos, em que ella tem logar, quando a Regencia Provisional o não faça.

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Art. 48. No Juizo dos crimes, cuja accusação não pertence á Camara dos Deputados, accusará o Procurador da Corôa, e Soberania Nacional.

Art. 49. As Sessões do Senado começam, e acabam ao mesmo tempo, que as da Camara dos Deputados.

Art. 50. A' excepção dos casos ordenados pela Constituição, toda a reunião do Senado fóra do tempo das Sessões da Camara dos Deputados é illicita, e nulla.

Art. 51.O Subsidio dos Senadores será de tanto, e mais metade, do que tiverem os Deputados.

CAPITULO IV.

Da Proposição, Discussão, Sancção, e Promulgação das Leis.

Art. 52. A Proposição, opposição, e approvação dos Projectos de Lei compete a cada uma das Camaras.

Art. 53.O Poder Executivo exerce por qualquer dos Ministros de Estado a proposição, que lhe compete na formação das Leis; e só depois de examinada por uma Commissão da Camara dos Deputados, aonde deve ter principio, poderá ser convertida em Projecto de Lei.

Art. 54. Os Ministros podem assistir, e discutir a Proposta, depois do relatorio da Commissão; mas não poderão votar, nem estarão presentes á votação, salvo se forem Senadores, ou Deputados.

Art. 55. Se a Camara dos Deputados adaptar o Projecto, o remetterá á dos Senadores com a seguinte formula - A Camara dos Deputados envia á Camara dos Senadores a Proposição junta do Poder Executivo (com emendas, ou sem ellas) e pensa, que ella tem logar.

Art. 56. Se não puder adoptar a proposição, participará ao Imperador por uma Deputação de sete Membros da maneira seguinte - A Camara dos Deputados testemunha ao Imperador o seu reconhecimento polo zelo, que mostra, em vigiar os interesses do Imperio: e Lhe supplica respeitosomente, Digne-Se tomar em ulterior consideração a Proposta do Governo.

Art. 57. Em geral as proposições, que a Camara dos Deputodos admittir, e approvar, serão remettidas á Camara dos Senadores com a formula seguinte - A Camara dos Deputados envia ao Senado a Proposição junta, e pensa, que tem logar, pedir-se ao Imperador a sua Sancção.

Art. 58. Se porém a Camara dos Senadores não adoptar inteiramente o Projecto da Camara dos Deputados, mas se o tiver alterado, ou addicionado, o reenviará pela maneira seguinte - O Senado envia á Camara dos Deputodos a sua Proposição (tal) com as emendas, ou addições juntas, e pensa, que com ellas tem logar pedir-se ao Imperador a Sancção Imperial.

Art. 59. Se o Senado, depois de ter deliberado, julga, que não póde admittir a Proposição, ou Projecto, dirá nos termos seguintes - O Senado torna a remetter á Camara dos Deputodos a Proposição (tal), á qual não tem podido dar o seu Consentimento.

Art. 60. O mesmo praticará a Camara dos Deputados para com a do Senado, quando neste tiver o Projecto a sua origem.

Art. 61. Se a Camara dos Deputados não approvar as emendas, ou addições do Senado, ou vice-versa, e todavia a Camara recusante julgar, que o projecto é vantojoso, poderá requerer por uma Deputação de tres Membros a reunião das duas Camaras, que se fará na Camara do Senado, e conforme o resultado da discussão se seguirá, o que fôr deliberado.

Art. 62. Se qualquer das duas Camaras, concluida a discussão, adoptar inteiramente o Projecto, que a outra Camara lhe enviou, o reduzirá a Decreto, e depois de lido em Sessão, o dirigirá ao Imperador em dous autographos, assignados pelo Presidente, e os dous primeiros Secretarios, Pedindo-lhe a sua Sancção pela formula seguinte - A Assembléa Geral dirige ao Imperador o Decreto incluso, que julga vantajoso, e util ao Imperio, e pede a Sua Magestade Imperial, Se Digne dar a Sua Sancção.

Art. 63. Esta remessa será feita por uma Deputação de sete Membros, enviada pela Camara ultimamente deliberante, a qual ao mesmo tempo informará á outra Camara, aonde o Projecto teve origem, que tem adoptado a sua Proposição, relativa a tal objecto, e que a dirigiu ao Imperador, pedindo-lhe a Sua Sancção.

Art. 64. Recusando o Imperador prestar seu consentimento, responderá nos termos seguintes. - O Imperador quer meditar sobre o Projecto de Lei, para a seu tempo se resolver - Ao que a Camara responderá, que - Louva a Sua Magestade Imperial o interesse, que toma pela Nação.

Art. 65. Esta denegação tem effeito suspensivo sómente: pelo que todas as vezes, que as duas Legislaturas, que se seguirem áquella, que tiver approvado o Projecto, tornem successivamente a apresental-o nos mesmos termos, entender-se-ha, que o Imperador tem dado a Sancção.

Art. 66. O Imperador dará, ou negará a Sancção em cada Decreto dentro do um mez, depois que lhe for apresentado.

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Art. 67. Se o não fizer dentro do mencionado prazo, terá o mesmo effeito, como se expressamente negasse a Sancção, para serem contadas as Legislaturas, em que poderá ainda recusar o seu consentimento, ou reputar-se o Decreto obrigatorio, por haver já negado a Sancção nas duas antecedentes Legislaturas.

Art. 68. Se o Imperador adoptar o Projecto da Assembléa Geral, se exprimirá assim - O Imperador consente - Com o que fica sanccionado, e nos termos de ser promulgado como Lei do Imperio; e um dos dous autographos, depois de assignados pelo Imperador, será remettido para o Archivo da Camara, que o enviou, e o outro servirá para por elle se fazer a Promulgação da Lei, pela respectiva Secretaria de Estado, aonde será guardado.

Art. 69. A formula da Promulgação da Lei será concebida nos seguintes termos - Dom (N.) por Graça de Deos, e Unanime Acclamação dos Povos, Imperador Constitucional, e Defensor Perpetuo do Brazil: Fazemos saber a todos os Nossos Subditos, que a Assembléa Geral decretou, e Nós Queremos a Lei seguinte (a integra da Lei nas suas disposições sómente): Mandamos por tanto a todas as Autoridades, a quem o conhecimento, e execução do referida Lei pertencer, que a cumpram, e façam cumprir, e guardar tão inteiramente, como nella se contém. O Secretario de Estado dos Nogocios d.... (o da Repartição competente) a faça imprimir, publicar, e correr.

Art. 70. Assignada a Lei pelo Imperador, referendada pelo Secretario de Estado competente, e sellada com o Sello do Imperio, se guardará o original no Archivo Publico, e se remetterão os Exemplares della impressos a todas as Camaras do Imperio, Tribunaes, e mais Logares, aonde convenha fazer-se publica.

CAPITULO V.

Dos Conselhos Geraes de Provincia, e suas attribuições.

Art. 71. A Constituição reconhece, e garante o direito de intervir todo o Cidadão nos negocios da sua Provincia, e que são immediatamente relativos a seus interesses peculiares.

Art. 72. Este direito será exercitado pelas Camara dos Districtos, e pelos Conselhos, que com o titulo de - Conselho Geral da Provincia-se devem estabelecer em cada Provincia, aonde não, estiver collocada a Capital do Imperio.

Art. 73. Cada um dos Conselhos Geraes constará de vinte e um Membros nas Provincias mais populosas, como sejam Pará, Maranhão, Ceará, Pernambuco, Bahia, Minas Geraes, S. Paulo, e Rio Grande do Sul; e nas outras de treze Membros.

Art. 74. A sua Eleição se fará na mesma occasião, e da mesma maneira, que se fizer a dos Representantes da Nação, e pelo tempo de cada Legislatura.

Art. 75. A idade de vinte e cinco annos, probidade, e decente subsistencia são as qualidades necessarias para ser Membro destes Conselhos.

Art. 76. A sua reunião se fará na Capital da Provincia; e na primeira Sessão preparatoria nomearão Presidente, Vice-Presidente, Secretario, e Supplente; que servirão por todo o tempo da Sessão: examinarão, e verificarão a legitimidade da eleição dos seus Membros.

Art. 77. Todos os annos haverá Sessão, e durará dous mezes, podendo prorogar-se por mais um mez, se nisso convier a maioria do Conselho.

Art. 78. Para haver Sessão deverá achar-se reunida mais da metade do numero dos seus Membros.

Art. 79. Não podem ser eleitos para Membros do Conselho Geral, o Presidente da Provincia, o Secretario, e o Commandante das Armas.

Art. 80. O Presidente da Provincia assistirá á installação do Conselho Geral, que se fará no primeiro dia de Dezembro, e terá assento igual ao do Presidente do Conselho, e á sua direita; e ahi dirigirá o Presidente da Provincia sua fala ao Conselho; instruindo-o do estado dos negocios publicos, e das providencias, que a mesma Provincia mais precisa para seu melhoramento.

Art.. 81. Estes Conselhos terão por principal objecto propôr, discutir, e deliberar sobre os negocios mais interessantes das suas Provincias; formando projectos peculiares, e accommodados ás suas localidades, e urgencias.

Art. 82. Os negocios, que começarem nas Camaras serão remettidos officialmente ao Secretario do Conselho, aonde serão discutidos a portas abertas, bem como os que tiverem origem nos mesmos Conselhos. As suas resoluções serão tomadas á pluralidade absoluta de votos dos Membros presentes.

Art. 83. Não se podem propôr, nem deliberar nestes Conselhos Projectos.

I. Sobre interesses geraes da Nação.

II. Sobre quaesquer ajustes de umas com outras Provincias.

III. Sobre imposições, cuja iniciativa é da competencia particular da Camara dos Deputados. Art. 36.

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IV. Sobre execução de Leis, devendo porém dirigir a esse respeito representações motivadas á Assembléa Geral, e ao Poder Executivo conjunctamente.

Art. 84. As Resoluções dos Conselhos Geraes de Provincia serão remettidas directamente ao Poder Executivo, pelo intermedio do Presidente da Provincia.

Art. 85. Se a Assembléa Geral se achar a esse tempo reunida, lhe serão immediatamente enviadas pela respectiva Secretaria de Estado, para serem propostas como Projectos de Lei, e obter a approvação da Assembléa por uma unica discussão em cada Camara.

Art. 86. Não se achando a esse tempo reunida a Assembléa, o Imperador as mandará provisoriamente executar, se julgar que ellas são dignas de prompta providencia, pela utilidade, que de sua observancia resultará ao bem geral da Provincia.

Art. 87. Se porém não occorrerem essas circumstancias, o Imperador declarará, que - Suspende o seu juizo a respeito daquelle negocio - Ao que o Conselho responderá, que - recebeu mui respeitosamente a resposta de Sua Magestade Imperial.

Art. 88. Logo que a Assembléa Geral se reunir, Ihe serão enviadas assim essas Resoluções suspensas, como as que estiverem em execução, para serem discutidas, e deliberadas, na fórma do Art. 85.

Art. 89. O methodo de proseguirem os Conselhos Geraes de Provincia em seus trabalhos, e sua policia interna, e externa, tudo se regulará por um Regimento, que lhes será dado pela Assembléa Geral.

CAPITULO VI.

Das Eleições.

Art. 90. As nomeações dos Deputados, e Senadores para a Assembléa Geral, e dos Membros dos Conselhos Geraes das Provincias, serão feitas por Eleições indirectas, elegendo a massa dos Cidadãos activos em Assembléas Parochiaes os Eleitores de Provincia, e estes os Representantes da Nação, e Provincia.

Art. 91. Têm voto nestas Eleições primarias

I. Os Cidadãos Brazileiros, que estão no gozo de seus direitos politicos.

II. Os Estrangeiros naturalisados.

Art. 92. São excluidos de votar nas Assembléas Parochiaes.

I. Os menores de vinte e cinco annos, nos quaes se não comprehendem os casados, e Officiaes Militares, que forem maiores de vinte e um annos, os Bachares Formados, e Clerigos de Ordens Sacras.

II. Os filhos familias, que estiverem na companhia de seus pais, salvo se servirem Officios publicos.

III. Os criados de servir, em cuja classe não entram os Guardalivros, e primeiros caixeiros das casas de commercio, os Criados da Casa Imperial, que não forem de galão branco, e os administradores das fazendas ruraes, e fabricas.

IV. Os Religiosos, e quaesquer, que vivam em Communidade claustral.

V. Os que não tiverem de renda liquida annual cem mil réis por bens de raiz, industria, commercio, ou Empregos.

Art. 93. Os que não podem votar nas Assembléas Primarias de Parochia, não podem ser Membros, nem votar na nomeação de alguma Autoridade electiva Nacional, ou local.

Art. 94. Podem ser Eleitores, e votar na eleição dos Deputados, Senadores, e Membros dos Conselhos de Provincia todos, os que podem votar na Assembléa Parochial. Exceptuam-se

I. Os que não tiverem de renda liquida annual duzentos mil réis por bens de raiz, industria, commercio, ou emprego.

II. Os Libertos.

III. Os criminosos pronunciados em queréla, ou devassa.

Art. 95. Todos os que podem ser Eleitores, abeis para serem nomeados Deputados. Exceptuam-se

I. Os que não tiverem quatrocentos mil réis de renda liquida, na fórma dos Arts. 92 e 94.

II. Os Estrangeiros naturalisados.

III. Os que não professarem a Religião do Estado.

Art. 96. Os Cidadãos Brazileiros em qualquer parte, que existam, são elegiveis em cada Districto Eleitoral para Deputados, ou Senadores, ainda quando ahi não sejam nascidos, residentes ou domiciliados.

Art. 97. Uma Lei regulamentar marcará o modo pratico das Eleições, e o numero dos Deputados relativamente á população do Imperio.

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TITIULO 5º

Do Imperador.

CAPITULO I.

Do Poder Moderador.

Art. 98. O Poder Moderador é a chave de toda a organisação Politica, e é delegado privativamente ao Imperador, como Chefe Supremo da Nação, e seu Primeiro Representante, para que incessantemente vele sobre a manutenção da Independencia, equilibrio, e harmonia dos mais Poderes Politicos.

Art. 99. A Pessoa do Imperador é inviolavel, e Sagrada: Elle não está sujeito a responsabilidade alguma.

Art. 100. Os seus Titulos são "Imperador Constitucional, e Defensor Perpetuo do Brazil" e tem o Tratamento de Magestade Imperial.

Art. 101. O Imperador exerce o Poder Moderador

I. Nomeando os Senadores, na fórma do Art. 43.

II. Convocando a Assembléa Geral extraordinariamente nos intervallos das Sessões, quando assim o pede o bem do Imperio.

III. Sanccionando os Decretos, e Resoluções da Assembléa Geral, para que tenham força de Lei: Art. 62.

IV. Approvando, e suspendendo interinamente as Resoluções dos Conselhos Provinciaes: Arts. 86, e 87.

V. Prorogando, ou adiando a Assembléa Geral, e dissolvendo a Camara dos Deputados, nos casos, em que o exigir a salvação do Estado; convocando immediatamente outra, que a substitua.

VI. Nomeando, e demittindo livremente os Ministros de Estado.

VII. Suspendendo os Magistrados nos casos do Art. 154.

VIII. Perdoando, e moderando as penas impostas e os Réos condemnados por Sentença.

IX. Concedendo Amnistia em caso urgente, e que assim aconselhem a humanidade, e bem do Estado.

CAPITULO II.

Do Poder Executivo.

Art. 102. O Imperador é o Chefe do Poder Executivo, e o exercita pelos seus Ministros de Estado.

São suas principaes attribuições

I. Convocar a nova Assembléa Geral ordinaria no dia tres de Junho do terceiro anno da Legislatura existente.

II. Nomear Bispos, e prover os Beneficios Ecclesiasticos.

III. Nomear Magistrados.

IV. Prover os mais Empregos Civis, e Politicos.

V. Nomear os Commandantes da Força de Terra, e Mar, e removel-os, quando assim o pedir o Serviço da Nação.

VI. Nomear Embaixadores, e mais Agentes Diplomaticos, e Commerciaes.

VII. Dirigir as Negociações Politicas com as Nações estrangeiras.

VIII. Fazer Tratados de Alliança offensiva, e defensiva, de Subsidio, e Commercio, levando-os depois de concluidos ao conhecimento da Assembléa Geral, quando o interesse, e segurança do Estado permittirem. Se os Tratados concluidos em tempo de paz envolverem cessão, ou troca de Torritorio do Imperio, ou de Possessões, a que o Imperio tenha direito, não serão ratificados, sem terem sido approvados pela Assembléa Geral.

IX. Declarar a guerra, e fazer a paz, participando á Assembléa as communicações, que forem compativeis com os interesses, e segurança do Estado.

X. Conceder Cartas de Naturalisação na fórma da Lei.

XI. Conceder Titulos, Honras, Ordens Militares, e Distincções em recompensa de serviços feitos ao Estado; dependendo as Mercês pecuniarias da approvação da Assembléa, quando não estiverem já designadas, e taxadas por Lei.

XII. Expedir os Decretos, Instrucções, e Regulamentos adequados á boa execução das Leis.

XIII. Decretar a applicação dos rendimentos destinados pela Assembléa aos varios ramos da publica Administração.

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XIV. Conceder, ou negar o Beneplacito aos Decretos dos Concilios, e Letras Apostolicas, e quaesquer outras Constituições Ecclesiasticas que se não oppozerem á Constituição; e precedendo approvação da Assembléa, se contiverem disposição geral.

XV. Prover a tudo, que fôr concernente á segurança interna, e externa do Estado, na fórma da Constituição.

Art. 103. 0 Imperador antes do ser acclamado prestará nas mãos do Presidente do Senado, reunidas as duas Camaras, o seguinte Juramento - Juro manter a Religião Catholica Apostolica Romana, a integridade, e indivisibilidade do Imperio; observar, e fazer observar a Constituição Politica da Nação Brazileira, e mais Leis do Imperio, e prover ao bem geral do Brazil, quanto em mim couber.

Art. 104. O Imperador não poderá sahir do Imperio do Brazil, sem o consentimento da Assembléa Geral; e se o fizer, se entenderá, que abdicou a Corôa.

CAPITULO III.

Da Familia Imperial, e sua Dotação.

Art. 105. O Herdeiro presumptivo do Imperio terá o Titulo de "Principe Imperial" e o seu Primogenito o de "Principe do Grão Pará" todos os mais terão o de "Principes". O tratamento do Herdeiro presumptivo será o de "Alteza Imperial" e o mesmo será o do Principe do Grão Pará: os outros Principes terão o Tratamento de Alteza.

Art. 106.0 Herdeiro presumptivo, em completando quatorze annos de idade, prestará nas mãos do Presidente do Senado, reunidas as duas Camaras, o seguinte Juramento - Juro manter a Religião Catholica Apostolica Romana, observar a Constituição Politica da Nação Brazileira, e ser obediente ás Leis, e ao Imperador.

Art. 107. A Assembléa Geral, logo que o Imperador succeder no Imperio, lhe assignará, e á Imperatriz Sua Augusta Esposa uma Dotação correspondente ao decoro de Sua Alta Dignidade.

Art. 108. A Dotação assignada ao presente Imperador, e á Sua Augusta Esposa deverá ser augmentada, visto que as circumstancias actuaes não permittem, que se fixe desde já uma somma adequada ao decoro de Suas Augustas Pessoas, e Dignidade da Nação.

Art. 109. A Assembléa assignará tambem alimentos ao Principe Imperial, e aos demais Principes, desde que nascerem. Os alimentos dados aos Principes cessarão sómente, quando elles sahirem para fóra do Imperio.

Art. 110. Os Mestres dos Principes serão da escolha, e nomeação do Imperador, e a Assembléa lhes designará os Ordenados, que deverão ser pagos pelo Thesouro Nacional.

Art. 111. Na primeira Sessão de cada Legislatura, a Camara dos Deputados exigirá dos Mestres uma conta do estado do adiantamento dos seus Augustos Discipulos.

Art. 112. Quando as Princezas houverem de casar, a Assembléa lhes assignará o seu Dote, e com a entrega delle cessarão os alimentos.

Art. 113. Aos Principes, que se casarem, e forem residir fóra do Imperio, se entregará por uma vez sómente uma quantia determinada pela Assembléa, com o que cessarão os alimentos, que percebiam.

Art. 114. A Dotação, Alimentos, e Dotes, de que fallam os Artigos antecedentes, serão pagos pelo Thesouro Publico, entregues a um Mordomo, nomeado pelo Imperador, com quem se poderão tratar as Acções activas e passivas, concernentes aos interesses da Casa Imperial.

Art. 115. Os Palacios, e Terrenos Nacionaes, possuidos actualmente pelo Senhor D. Pedro I, ficarão sempre pertencendo a Seus Successores; e a Nação cuidará nas acquisições, e construcções, que julgar convenientes para a decencia, e recreio do Imperador, e sua Familia.

CAPITULO IV.

Da Successão do Imperio.

Art. 116. O Senhor D. Pedro I, por Unanime Acclamação dos Povos, actual Imperador Constittucional, e Defensor Perpetuo, Imperará sempre no Brazil.

Art. 117. Sua Descendencia legitima succederá no Throno, Segundo a ordem regular do primogenitura, e representação, preferindo sempre a linha anterior ás posteriores; na mesma linha, o gráo mais proximo ao mais remoto; no mesmo gráo, o sexo masculino ao feminino; no mesmo sexo, a pessoa mais velha á mais moça.

Art. 118. Extinctas as linhas dos descendentes legitimos do Senhor D. Pedro I, ainda em vida do ultimo descendente, e durante o seu Imperio, escolherá a Assembléa Geral a nova Dynastia.

Art. 119. Nenhum Estrangeiro poderá succeder na Corôa do Imperio do Brazil.

Art. 120. O Casamento da Princeza Herdeira presumptiva da Corôa será feito a aprazimento do Imperador; não existindo Imperador ao tempo, em que se tratar deste Consorcio, não poderá elle effectuar-se, sem approvacão da Assembléa Geral. Seu Marido não terá parte no Governo, e sómente se chamará Imperador, depois que tiver da Imperatriz filho, ou filha.

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CAPITULO V.

Da Regencia na menoridade, ou impedimento do Imperador.

Art. 121. O Imperador é menor até á idade de dezoito annos completos.

Art. 122. Durante a sua menoridade, o Imperio será governado por uma Regencia, a qual pertencerá na Parente mais chegado do Imperador, segundo a ordem da Successão, e que seja maior de vinte e cinco annos.

Art. 123. Se o Imperador não tiver Parente algum, que reuna estas qualidades, será o Imperio governado por uma Regencia permanente, nomeada pela Assembléa Geral, composta de tres Membros, dos quaes o mais velho em idade será o Presidente.

Art. 124. Em quanto esta Rogencia se não eleger, governará o Imperio uma Regencia provisional, composta dos Ministros de Estado do Imperio, e da Justiça; e dos dous Conselheiros de Estado mais antigos em exercicio, presidida pela Imperatriz Viuva, e na sua falta, pelo mais antigo Conselheiro de Estado.

Art. 125. No caso de fallecer a Imperatriz Imperante, será esta Regencia presidida por seu Marido.

Art. 126. Se o Imperador por causa physica, ou moral, evidentemente reconhecida pela pluralidade de cada uma das Camaras da Assembléa, se impossibilitar para governar, em seu logar governará, como Regente o Principe Imperial, se for maior de dezoito annos.

Art. 127. Tanto o Regente, como a Regencia prestará o Juramento mencionado no Art. 103, accrescentando a clausula de fidelidade na Imperador, e de lhe entregar o Governo, logo que elle chegue á maioridade, ou cessar o seu impedimento.

Art. 128. Os Actos da Regencia, e do Regente serão expedidos em nome do Imperador pela formula seguinte - Manda a Regencia em nome do Imperador... - Manda o Principe Imperial Regente em nome do Imperador.

Art. 129. Nem a Regencia, nem o Regente será responsavel.

Art. 130. Durante a menoridade do Successor da Corôa, será seu Tutor, quem seu Pai lhe tiver nomeado em Testamento; na falta deste, a Imperatriz Mãi, em quanto não tornar a casar: faltando esta, a Assembléa Geral nomeará Tutor, com tanto que nunca poderá ser Tutor do Imperador menor aquelle, a quem possa tocar a successão da Corôa na sua falta.

CAPITULO VI.

Do Ministerio.

Art. 131. Haverá differentes Secretarias de Estado. A Lei designará os negocios pertencentes a cada uma, e seu numero; as reunirá, ou separará, como mais convier.

Art. 132. Os Ministros de Estado referendarão, ou assignarão todos os Actos do Poder Executivo, sem o que não poderão ter execução.

Art. 133. Os Ministros de Estado serão responsaveis

I. Por traição.

II. Por peita, suborno, ou concussão.

III. Por abuso do Poder.

IV. Pela falta de observancia da Lei.

V. Pelo que obrarem contra a Liberdade, segurança, ou propriedade dos Cidadãos.

VI. Por qualquer dissipação dos bens publicos.

Art. 134. Uma Lei particular especificará a natureza destes delictos, e a maneira de proceder contra elles.

Art. 135. Não salva aos Ministros da responsabilidade a ordem do Imperador vocal, ou por escripto.

Art. 136. Os Estrangeiros, posto que naturalisados, não podem ser Ministros de Estado.

CAPITULO VII.

Do Conselho de Estado.

Art. 137. Haverá um Conselho de Estado, composto de Conselheiros vitalicios, nomeados pelo Imperador.

Art. 138. O seu numero não excederá a dez.

Art. 139; Não são comprehendidos neste numero os Ministros de Estado, nem estes serão reputados Conselheiros de Estado, sem especial nomeação do Imperador para este Cargo.

Art. 140. Para ser Coaselheiro de Estado requerem-se as mesmas qualidades, que devem concorrer para ser Senador.

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Art. 14I. Os Conselheiros de Estado, antes de tomarem posse, prestarão juramento nas mãos do Imperador de - manter a Religião Catholica Apostolica Romana; observar a Constituição, e às Leis; ser fieis ao Imperador; aconselhal-o segundo suas consciencias, attendendo sómente ao bem da Nação.

Art. 142. Os Conselheiros serão ouvidos em todos os negocios graves, e medidas geraes da publica Administração; principalmente sobre a declaração da Guerra, ajustes de paz, nogociações com as Nações Estrangeiras, assim como em todas as occasiões, em que o Imperador se proponha exercer qualquer das attribuições proprias do Poder Moderador, indicadas no Art. 101, á excepção da VI.

Art. 143. São responsaveis os Conselheiros de Estado pelos conselhos, que derem, oppostos ás Leis, e ao interesse do Estado, manifestamente dolosos.

Art. 144. O Principe Imperial, logo que tiver dezoito annos completos, será de Direito do Conselho de Estado: os demais Principes da Casa Imperial, para entrarem no Conselho de Estado ficam dependentes da nomeação do Imperador. Estes, e o Principe Imperial não entram no numero marcado no Art. 138.

CAPITULO VIII.

Da Força Militar.

Art. 145. Todos os Brazileiros são obrigados a pegar em armas, para sustentar a Independencia, e integridade do Imperio, e defendel-o dos seus inimigos externos, ou internos.

Art. 146. Emquanto a Assembléa Geral não designar a Força Militar permanente de mar, e terra, substituirá, a que então houver, até que pela mesma Assembléa seja alterada para mais, ou para menos.

Art. 147. A Força Militar é essencialmente obediente; jamais se poderá reunir, sem que lhe seja ordenado pela Autoridade legitima.

Art. 148. Ao Poder Executivo compete privativamente empregar a Força Armada de Mar, e Terra, como bem lhe parecer conveniente á Segurança, e defesa do Imperio.

Art. 149. Os Officiaes do Exercito, e Armada não podem ser privados das suas Patentes, senão por Sentença proferida em Juizo competente.

Art. 150. Uma Ordenança especial regulará a Organização do Exercito do Brazil, suas Promoções, Soldos e Disciplina, assim como da Força Naval.

TITULO 6º

Do Poder Judicial.

CAPITULO UNICO.

Dos Juizes, e Tribunaes de Justiça.

Art. 151. O Poder Judicial independente, e será composto de Juizes, e Jurados, os quaes terão logar assim no Civel, como no Crime nos casos, e pelo modo, que os Codigos determinarem.

Art. 152. Os Jurados pronunciam sobre o facto, e os Juizes applicam a Lei.

Art. 153. Os Juizes de Direito serão perpetuos, o que todavia se não entende, que não possam ser mudados de uns para outros Logares pelo tempo, e maneira, que a Lei determinar.

Art. 154. O Imperador poderá suspendel-os por queixas contra elles feitas, precedendo audiencia dos mesmos Juizes, informação necessaria, e ouvido o Conselho de Estado. Os papeis, que lhes são concernentes, serão remettidos á Relação do respectivo Districto, para proceder na fórma da Lei.

Art. 155. Só por Sentença poderão estes Juizes perder o Logar.

Art. 156. Todos os Juizes de Direito, e os Officiaes de Justiça são responsaveis pelos abusos de poder, e prevaricações, que commetterem no exercicio de seus Empregos; esta responsabilidade se fará effectiva por Lei regulamentar.

Art. 157. Por suborno, peita, peculato, e concussão haverá contra elles acção popular, que poderá ser intentada dentro de anno, e dia pelo proprio queixoso, ou por qualquer do Povo, guardada a ordem do Processo estabelecida na Lei.

Art. 158. Para julgar as Causas em segunda, e ultima instancia haverá nas Provincias do Imperio as Relações, que forem necessarias para commodidade dos Povos.

Art. 159. Nas Causas crimes a Inquirição das Testemunhas, e todos os mais actos do Processo, depois da pronuncia, serão publicos desde já.

Art. 160. Nas civeis, e nas penaes civilmente intentadas, poderão as Partes nomear Juizes Arbitros. Suas Sentenças serão executadas sem recurso, se assim o convencionarem as mesmas Partes.

Art. 161. Sem se fazer constar, que se tem intentado o meio da reconciliação, não se começará Processo algum.

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Art. 162. Para este fim haverá juizes de Paz, os quaes serão electivos pelo mesmo tempo, e maneira, por que se elegem os Vereadores das Camaras. Suas attribuições, e Districtos serão regulados por Lei.

Art. 163. Na Capital do Imperio, além da Relação, que deve existir, assim como nas demais Provincias, haverá tambem um Tribunal com a denominação de - Supremo Tribunal de Justiça - composto de Juizes Letrados, tirados das Relações por suas antiguidades; e serão condecorados com o Titulo do Conselho. Na primeira organisação poderão ser empregados neste Tribunal os Ministros daquelles, que se houverem de abolir.

Art. 164. A este Tribunal Compete:

I. Conceder, ou denegar Revistas nas Causas, e pela maneira, que a Lei determinar.

II. Conhecer dos delictos, e erros do Officio, que commetterem os seus Ministros, os das Relações, os Empregados no Corpo Diplomatico, e os Presidentes das Provincias.

III. Conhecer, e decidir sobre os conflictos de jurisdição, e competencia das Relações Provinciaes.

TITULO 7º

Da Administração e Economia das Provincias.

CAPITULO I.

Da Administração.

Art. 165. Haverá em cada Provincia um Presidente, nomeado pelo Imperador, que o poderá remover, quando entender, que assim convem ao bom serviço do Estado.

Art. 466. A Lei designará as suas attribuições, competencia, e autoridade, e quanto convier no melhor desempenho desta Administração.

CAPITULO II.

Das Camaras.

Art. 167. Em todas as Cidades, e Villas ora existentes, e nas mais, que para o futuro se crearem haverá Camaras, ás quaes compete o Governo economico, e municipal das mesmas Cidades, e Villas.

Art. 168. As Camaras serão electivas, e compostas do numero de Vereadores, que a Lei designar, e o que obtiver maior numero de votos, será Presidente.

Art. 169. O exercicio de suas funcções municipaes, formação das suas Posturas policiaes, applicação das suas rendas, e todas as suas particulares, e uteis attribuições, serão decretadas por uma Lei regulamentar.

CAPITULO III.

Da Fazenda Nacional.

Art. 170. A Receita, e despeza da Fazenda Nacional será encarregada a um Tribunal, debaixo de nome de 'Thesouro Nacional" aonde em diversas Estações, devidamente estabelecidas por Lei, se regulará a sua administração, arrecadação e contabilidade, em reciproca correspondencia com as Thesourarias, e Autoridades das Provincias do Imperio.

Art. 171. Todas as contribuições directas, á excepção daquellas, que estiverem applicadas aos juros, e amortisação da Divida Publica, serão annualmente estabelecidas pela Assembléa Geral, mas continuarão, até que se publique a sua derogação, ou sejam substituidas por outras.

Art. 172. O Ministro de Estado da Fazenda, havendo recebido dos outros Ministros os orçamentos relativos ás despezas das suas Repartições, apresentará na Camara dos Deputados annualmente, logo que esta estiver reunida, um Balanço geral da receita e despeza do Thesouro Nacional do anno antecedente, e igualmente o orçamento geral de todas as despezas publicas do anno futuro, e da importancia de todas as contribuições, e rendas publicas.

TITULO 8º

Das Disposições Geraes, e Garantias dos Direitos Civis, e Politicos

dos Cidadãos Brazileiros.

Art. 173. A Assembléa Geral no principio das suas Sessões examinará, se a Constituição Politica do Estado tem sido exactamente observada, para prover, como fôr justo.

Art. 174. Se passados quatro annos, depois de jurada a Constituição do Brazil, se conhecer, que algum dos seus artigos merece roforma, se fará a proposição por escripto, a qual deve ter origem na Camara dos Deputados, e ser apoiada pela terça parte delles.

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Art. 175. A proposição será lida por tres vezes com intervallos de seis dias de uma á outra leitura; e depois da terceira, deliberará a Camara dos Deputados, se poderá ser admittida á discussão, seguindo-se tudo o mais, que é preciso para formação de uma Lei.

Art. 176. Admittida a discussão, e vencida a necessidade da reforma do Artigo Constitucional, se expedirá Lei, que será sanccionada, e promulgada pelo Imperador em fórma ordinaria; e na qual se ordenará aos Eleitores dos Deputados para a seguinte Legislatura, que nas Procurações lhes confiram especial faculdade para a pretendida alteração, ou reforma.

Art. 177. Na seguinte Legislatura, e na primeira Sessão será a materia proposta, e discutida, e o que se vencer, prevalecerá para a mudança, ou addição á Lei fundamental; e juntando-se á Constituição será solemnemente promulgada.

Art. 178. E' só Constitucional o que diz respeito aos limites, e attribuições respectivas dos Poderes Politicos, e aos Direitos Politicos, e individuaes dos Cidadãos. Tudo, o que não é Constitucional, póde ser alterado sem as formalidades referidas, pelas Legislaturas ordinarias.

Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte.

I. Nenhum Cidadão póde ser obrigado a fazer, ou deixar de fazer alguma cousa, senão em virtude da Lei.

II. Nenhuma Lei será estabelecida sem utilidade publica.

III. A sua disposição não terá effeito retroactivo.

IV. Todos podem communicar os seus pensamentos, por palavras, escriptos, e publical-os pela Imprensa, sem dependencia de censura; com tanto que hajam de responder pelos abusos, que commetterem no exercicio deste Direito, nos casos, e pela fórma, que a Lei determinar.

V. Ninguem póde ser perseguido por motivo de Religião, uma vez que respeite a do Estado, e não offenda a Moral Publica.

VI. Qualquer póde conservar-se, ou sahir do Imperio, como Ihe convenha, levando comsigo os seus bens, guardados os Regulamentos policiaes, e salvo o prejuizo de terceiro.

VII. Todo o Cidadão tem em sua casa um asylo inviolavel. De noite não se poderá entrar nella, senão por seu consentimento, ou para o defender de incendio, ou inundação; e de dia só será franqueada a sua entrada nos casos, e pela maneira, que a Lei determinar.

VIII. Ninguem poderá ser preso sem culpa formada, excepto nos casos declarados na Lei; e nestes dentro de vinte e quatro horas contadas da entrada na prisão, sendo em Cidades, Villas, ou outras Povoações proximas aos logares da residencia do Juiz; e nos logares remotos dentro de um prazo razoavel, que a Lei marcará, attenta a extensão do territorio, o Juiz por uma Nota, por elle assignada, fará constar ao Réo o motivo da prisão, os nomes do seu accusador, e os das testermunhas, havendo-as.

IX. Ainda com culpa formada, ninguem será conduzido á prisão, ou nella conservado estando já preso, se prestar fiança idonea, nos casos, que a Lei a admitte: e em geral nos crimes, que não tiverem maior pena, do que a de seis mezes de prisão, ou desterro para fóra da Comarca, poderá o Réo livrar-se solto.

X. A' excepção de flagrante delicto, a prisão não póde ser executada, senão por ordem escripta da Autoridade legitima. Se esta fôr arbitraria, o Juiz, que a deu, e quem a tiver requerido serão punidos com as penas, que a Lei determinar.

O que fica disposto acerca da prisão antes de culpa formada, não comprehende as Ordenanças Militares, estabelecidas como necessarias á disciplina, e recrutamento do Exercito; nem os casos, que não são puramente criminaes, e em que a Lei determina todavia a prisão de alguma pessoa, por desobedecer aos mandados da justiça, ou não cumprir alguma obrigação dentro do determinado prazo.

XI. Ninguem será sentenciado, senão pela Autoridade competente, por virtude de Lei anterior, e na fórma por ella prescripta.

XII. Será mantida a independencia do Poder Judicial. Nenhuma Autoridade poderá avocar as Causas pendentes, sustal-as, ou fazer reviver os Processos findos.

XIII. A Lei será igual para todos, quer proteja, quer castigue, o recompensará em proporção dos merecimentos de cada um.

XIV. Todo o cidadão pode ser admittido aos Cargos Publicos Civis, Politicos, ou Militares, sem outra differença, que não seja dos seus talentos, e virtudes.

XV. Ninguem será exempto de contribuir pera as despezas do Estado em proporção dos seus haveres.

XVI. Ficam abolidos todos os Privilegios, que não forem essencial, e inteiramente ligados aos Cargos, por utilidade publica.

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XVII. A' excepção das Causas, que por sua natureza pertencem a Juizos particulares, na conformidade das Leis, não haverá Foro privilegiado, nem Commissões especiaes nas Causas civeis, ou crimes.

XVIII. Organizar–se-ha quanto antes um Codigo Civil, e Criminal, fundado nas solidas bases da Justiça, e Equidade.

XIX. Desde já ficam abolidos os açoites, a tortura, a marca de ferro quente, e todas as mais penas crueis.

XX. Nenhuma pena passará da pessoa do delinquente. Por tanto não haverá em caso algum confiscação de bens, nem a infamia do Réo se transmittirá aos parentes em qualquer gráo, que seja.

XXI. As Cadêas serão seguras, limpas, o bem arejadas, havendo diversas casas para separação dos Réos, conforme suas circumstancias, e natureza dos seus crimes.

XXII. E'garantido o Direito de Propriedade em toda a sua plenitude. Se o bem publico legalmente verificado exigir o uso, e emprego da Propriedade do Cidadão, será elle préviamente indemnisado do valor della. A Lei marcará os casos, em que terá logar esta unica excepção, e dará as regras para se determinar a indemnisação.

XXIII. Tambem fica garantida a Divida Publica.

XXIV. Nenhum genero de trabalho, de cultura, industria, ou commercio póde ser prohibido, uma vez que não se opponha aos costumes publicos, á segurança, e saude dos Cidadãos.

XXV. Ficam abolidas as Corporações de Officios, seus Juizes, Escrivães, e Mestres.

XXVI. Os inventores terão a propriedade das suas descobertas, ou das suas producções. A Lei lhes assegurará um privilegio exclusivo temporario, ou lhes remunerará em resarcimento da perda, que hajam de soffrer pela vulgarisação.

XXVII. O Segredo das Cartas é inviolavel. A Administração do Correio fica rigorosamente responsavel por qualquer infracção deste Artigo.

XXVIII. Ficam garantidas as recompensas conferidas pelos serviços feitos ao Estado, quer Civis, quer Militares; assim como o direito adquirido a ellas na fórma das Leis.

XXIX. Os Empregados Publicos são strictamente responsaveis pelos abusos, e omissões praticadas no exercicio das suas funcções, e por não fazerem effectivamente responsaveis aos seus subalternos.

XXX.. Todo o Cidadão poderá apresentar por escripto ao Poder Legislativo, e ao Executivo reclamações, queixas, ou petições, e até expôr qualquer infracção da Constituição, requerendo perante a competente Auctoridade a effectiva responsabilidade dos infractores.

XXXI. A Constituição tambem garante os soccorros publicos.

XXXII. A Instrucção primaria, e gratuita a todos os Cidadãos.

XXXIII. Collegios, e Universidades, aonde serão ensinados os elementos das Sciencias, Bellas Letras, e Artes.

XXXIV. Os Poderes Constitucionaes não podem suspender a Constituição, no que diz respeito aos direitos individuaes, salvo nos casos, e circumstancias especificadas no paragrapho seguinte.

XXXV. Nos casos de rebellião, ou invasão de inimigos, pedindo a segurança do Estado, que se dispensem por tempo determinado algumas das formalidades, que garantem a liberdede individual, poder-se-ha fazer por acto especial do Poder Legislativo. Não se achando porém a esse tempo reunida a Assembléa, e correndo a Patria perigo imminente, poderá o Governo exercer esta mesma providencia, como medida provisoria, e indispensavel, suspendendo-a immediatamente que cesse a necessidade urgente, que a motivou; devendo num, e outro caso remetter á Assembléa, logo que reunida fôr, uma relação motivada das prisões, e d'outras medidas de prevenção tomadas; e quaesquer Autoridades, que tiverem mandado proceder a ellas, serão responsaveis pelos abusos, que tiverem praticado a esse respeito.

Rio de Janeiro, 11 de Dezembro de 1823.- João Severiano Maciel da Costa.- Luiz José de Carvalho e Mello.- Clemente Ferreira França.- Marianno José Pereira da Fonseca.- João Gomes da Silveira Mendonça.- Francisco Villela Barboza.- Barão de Santo Amaro.- Antonio Luiz Pereira da Cunha.- Manoel Jacintho Nogueira da Gama.- Josè Joaquim Carneiro de Campos.

Mandamos portanto, a todas as Autoridades, a quem o conhecimento e execução desta Constituição pertencer, que a jurem, e façam jurar, a cumpram, e façam cumprir, e guardar tão inteiramente, como nella se contem. O Secretario de Estado dos Nogocios do Imperio a faça imprimir, publicar, e correr. Dada na Cidade do Rio de Janeiro, aos vinte e cinco de Março de mil oitocentos e vinte e quatro, terceiro da Independencia e do Imperio.

IMPERADOR Com Guarda.

João Severiano Maciel da Costa.

Carta de Lei, pela qual VOSSA MAGESTADE IMPERIAL Manda cumprir, e guardar inteiramente a Constituição Politica do Imperio do Brazil, que VOSSA MAGESTADE IMPERIAL Jurou, annuindo às Representações dos Povos.

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Para Vossa Magestade Imperial ver.

Luiz Joaquim dos Santos Marrocos a fez.

Registrada na Secretaria de Estado dos Negocios do Imperio do Brazil a fls. 17 do Liv. 4º de Leis, Alvarás e Cartas Imperiaes. Rio de Janeiro em 22 de Abril de 1824.

Josè Antonio de Alvarenga Pimentel.