CRIMESINVISÍVEISEXECUÇÕES EXTRAJUDICIAIS EM BANGLADESH
ANISTIAINTERNACIONAL
Anistia Internacional - agosto de 2011 Índice: ASA 13/005/2011
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Dificilmente passa uma semana emBangladesh sem que pessoas sejambaleadas em operações do Batalhão deAção Rápida (BAR). O BAR é uma forçapolicial especial criada com o apoio popularpara combater atividades de ganguescriminosas em todo o país. No entanto,desde sua implantação, em 2004, o BAR jáfoi implicado na morte ilegal de pelo menos700 pessoas. Ao menos 200 dessas mortesocorreram durante o mandato do atualgoverno da Liga Awami, apesar dapromessa da primeira-ministra de dar fimàs execuções extrajudiciais.
Tais mortes são geralmente explicadascomo acidentais ou como resultado daação em legítima defesa dos agentes doBAR, já que as vítimas são dadas comomortas em “fogo cruzado”. Em muitoscasos, as vítimas foram mortas após serem
presas. No entanto, investigaçõesconduzidas tanto pelo BAR como por umórgão judicial nomeado pelo governo nãoresultaram em processos judiciais. O BARtem negado, sistematicamente,responsabilidade por qualquer morteilegal, enquanto o resultado dasinvestigações judiciais é mantido emsegredo. Agentes do BAR dizem queoutros desvios de conduta têm sidotratados por meio de ação administrativacontra agentes transgressores dainstituição. Ao deixar de tomar medidasjudiciais contra o batalhão, os governosatual e passado de Bangladesh têm,efetivamente, endossado as alegações e ascondutas do BAR em tais casos.
Denúncias de que o BAR fez amplo uso detortura e força excessiva também em nadaresultaram. Apesar de persistentes
denúncias, as autoridades locais nãotomaram medida alguma para processar aequipe do BAR.
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Rahima Khatun foi atingida com um tiro na cabeçapor agentes do Batalhão de Ação Rápida (BAR), em 3de junho de 2011, em uma favela próxima aNarsingdi, um distrito da região central deBangladesh. Rahima, 35 anos, contestou quando osagentes tentaram prender seu marido. Segundosdepois, ela foi gravemente ferida por uma baladisparada por uma das armas dos agentes. Já fora deperigo, após receber tratamento médico intensivo, epresa por suposto tráfico de drogas, ela é a primeiramulher baleada pelo BAR de que se tem notícia.
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Desde sua implantação, em 2004,o BAR já foi implicado na morte depelo menos 700 pessoas.
Acima: Agentes do BAR em confronto com trabalhador do setor de vestuário durante manifestação em Dhaka, junho de 2010. As denúncias de que o
BAR recorre sistematicamente à tortura e ao excesso de força têm sido ignoradas pelo governo.
Capa: Imagem da exposição fotográfica Crossfire (Fogo cruzado), de Shahidul Alam, que chama atenção para as execuções extrajudiciais em
Bangladesh. A exposição foi inicialmente proibida pelas autoridades no momento de sua abertura, em março de 2010.
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LIMON HOSSAIN
Em 23 de março de 2011, Limon Hossain, umestudante de 16 anos, foi baleado na perna poragentes do BAR em Jhalakathi. Seus ferimentosforam tão graves que, quatro dias depois, suaperna teve de ser amputada. A família de LimonHossain disse que ele foi atingido enquantotrazia o gado de volta do pasto. Tal como asfamílias de muitas outras vítimas, a família deLimon disse que o BAR não possuía motivoalgum para atirar nele e que os agentes envolvidos deveriam ser levados à Justiça.
Em uma coletiva de imprensa realizadaimediatamente após o incidente, o diretor-geraldo BAR admitiu: “Limon Hossain não era umcriminoso notório, mas sim vítima de uma trocade tiros entre o BAR e criminosos”. Mais tarde,porém, as autoridades do BAR voltaram atrás nadeclaração, dizendo que o tiro havia sidojustificado e que Limon era membro de uma
gangue criminosa. Eles alegaram que a gangueabriu fogo primeiro e que Limon Hossain foiatingido quando o BAR revidou. Limon temnegado sistematicamente ser um criminoso oumembro de uma gangue criminosa.
Autoridades governamentais, incluindo aministra do Interior, endossaram as declaraçõesdo BAR, apesar das conclusões de um inquéritogovernamental independente – nunca tornadopúblico –, o qual teria apurado que nem Limonnem sua família tinham envolvimento comatividades criminosas.
“Não há ninguém a quem eu possa apelar porjustiça agora, a não ser a primeira-ministra”,disse Limon à Anistia Internacional. “Quero serpunido, se uma investigação imparcial eindependente me considerar culpado. Se não, euquero punição para os que me seguraram pelo
colarinho da camisa antes de atirarem naminha perna.”
Desde o início, a investigação policial pareceutendenciosa. A polícia investigou as alegaçõesdo BAR de que Limon estava envolvido ematividades terroristas, mas recusou-se aregistrar a queixa da mãe de Limon contra oBAR. De acordo com Henoara Begum, a equipedo BAR deliberadamente ignorou seu apelo paralevar o filho ao hospital imediatamente após otiro. Se tivessem feito isso, diz ela, talvez aperna de Limon não precisasse ter sidoamputada.
Com a recusa da polícia em aceitar sua queixa,Henoara Begum buscou e conseguiu uma ordemjudicial, em 26 de abril, obrigando a polícia aregistrar a queixa; mas não se sabe se elestomaram alguma providência.
“Não há ninguém a quem eupossa apelar por justiça agora,a não ser a primeira-ministra”.Limon Hossain, baleado por agentes do BAR quando tinha 16 anos, falando àAnistia Internacional, em junho de 2011
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BATALHÃO DE AÇÃO RÁPIDAO BAR foi criado em março de 2004, comoresposta do governo ao colapso da ordempública, particularmente no oeste e centrode Bangladesh. Nos distritos de Rajshahi,Khulna e Dhaka, grupos armados criminososou poderosas gangues mercenáriasconspiraram com políticos locais paraoperarem redes de contrabando ouextorquirem dinheiro da população local.
Poucos meses depois de sua criação, asoperações do BAR já se caracterizavam porum padrão de mortes descritas pelasautoridades como “mortes em fogo cruzado”.Muitas dessas mortes tinham todas ascaracterísticas de execuções extrajudiciais.Ocorreram, em geral, em locais desertos, apósa prisão do suspeito. Em alguns casos, haviatestemunhas do ato da prisão, mas asautoridades do BAR continuavam sustentandoque as vítimas haviam sido mortas em “fogocruzado”, em “trocas de tiros” ou em“disputas com armas de fogo”.
IMPUNIDADEQuase todos os supostos casos dehomicídios ilegais praticados pelo BARficaram sem punição. Governossucessivos têm resistido persistentementeaos apelos de organizações nacionais einternacionais de direitos humanos paradar fim a tais tipos de mortes. O amploapoio público ao BAR torna fácil para ogoverno esquivar-se de suaresponsabilidade em relação a esseassunto.
Uma rede de impunidade impede ainvestigação, por meio do sistema dejustiça criminal, dos abusos cometidospelo BAR. Mais de 20 famílias de vítimasdisseram à Anistia Internacional que apolícia recusou-se a registrar suas queixascontra o BAR, a não ser que a famíliasolicitasse uma ordem judicial. Mesmoassim, a polícia não conduziainvestigações completas e imparciais.Nenhum desses casos levou à instauraçãode processos judiciais.
Na noite de 10 de julho de 2009, agentesdo BAR levaram quatro homens – Tapan,Kamal, Pappu and Hridoy – ao HospitalEscola de Dhaka. Todos haviam sidoatingidos por arma de fogo. O BAR alegaque eles foram feridos durante uma trocade tiros com seus agentes, mas familiares etestemunhas locais dizem que eles forampresos pelo BAR horas antes de seremferidos. Tapan morreu em função dosferimentos. Os outros três homens teriamsido enviados para a prisão, acusados deposse ilegal de armas. Um dossobreviventes disse a uma organização dedireitos humanos que o BAR forçou-os aficarem parados em frente a uma árvoreantes de atirar pouco abaixo do joelhodeles.
A impunidade das ações do BAR pode tercontribuído para um ambiente em queoutros órgãos de segurança, tais como apolícia, acreditem que também podem seesquivar de prestar contas pelas violaçõesque cometem. Ao menos 30 pessoas forammortas em operações policiais desde oinício de 2010, com a polícia tambémcaracterizando as mortes como resultadode “trocas de tiros” e “disputas com armasde fogo”.
O BAR e a polícia devem ser investigadospor supostas execuções extrajudiciais e, seconsiderados culpados, devem serresponsabilizados. Ao não tomaremmedidas para impedi-los, os governosbengali passado e atual são, em últimainstância, responsáveis pelas violaçõescometidas.
Número de vítimas mortas/feridas por órgãos de aplicação da leiJaneiro 2010 – Junho 2011
Baseado em levantamento feito pela Anistia Internacional a partir das notícias de jornais durante o período. De umtotal de 125 pessoas mortas em tais operações, 93 foram mortas pelo BAR, 30 pela polícia e 2 por outras forças.
Polícia
49
BAR
131
140
120
100
80
60
40
20
Guarda costeira
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“FOGO CRUZADO”, “TROCAS DETIROS”, “DISPUTAS COM ARMASDE FOGO” OU EXECUÇÃO?Desde o início, diversas histórias de “fogocruzado” do BAR eram difíceis de acreditar,tendo sido desmentidas por persistentesrelatos de que muitos dos que, segundo ainstituição, morreram durante troca de tiros,foram, antes, presos pelo BAR.
Em resposta a questionamentos sobre acredibilidade das histórias de “fogocruzado”, um porta-voz do BAR disse àAnistia Internacional, em maio de 2010,que a agência estava agora relutante emutilizar o termo “fogo cruzado” porquecriava “um equívoco, no sentido de queapresentava a pessoa morta quase comoum espectador”. Ele disse que a maioriadas pessoas mortas eram criminosos que abriram fogo contra as forças do BAR.
Essa é a abordagem adotada agora peloBAR em relação à imprensa. De 88incidentes de pessoas atingidas por armade fogo em ações do BAR entre janeiro de 2010 e junho de 2011, apenas quatroforam atribuídos a “fogo cruzado”. Orestante foi atribuído a “trocas de tiros” ou “disputas com armas de fogo”.
Independentemente da maneira comoessas mortes são descritas, permanecem assuspeitas de que tenham sido execuçõesextrajudiciais.
MORTES SEM EXPLICAÇÃO
Em alguns casos, o BAR nem mesmoexplicou como as pessoas que, segundotestemunhas, teriam sido presas pelo BARforam mais tarde encontradas mortas.
Nazmul Huq Murad, Forkan Ahmed eMizanur Rahman desapareceram em 17 deabril de 2010. Murad, um fugitivo suspeitode homicídio, havia marcado encontro comseu irmão nesse mesmo dia, mas nuncacompareceu. Em 18 de abril, o irmão deMurad recebeu um telefonema anônimodizendo que Murad estava sob custódia doBAR. O advogado de defesa do acusado nocaso de homicídio deu a mesmainformação à família, em 18 de abril. Asaveriguações da família não levaram aqualquer notícia dele até 27 de abril,quando seu corpo foi encontrado na áreade Mohammadpur, em Dhaka. Estavaenterrado em uma vala com os outros doishomens, Forkan e Mizanur. Os corposapresentavam graves ferimentos, incluindo
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Número de pessoas supostamente
mortas ou feridas em operações
da polícia/BAR
Janeiro 2010 – Junho 2011
Baseado em levantamento feito pela Anistia Internacional apartir das notícias de jornais durante o período.
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facadas. Marcas de ataduras em seuspulsos indicavam que eles haviam sidoamarrados com uma corda. As famílias deMizanur e Forkan também receberammensagens de que os dois haviam sidopresos pelo BAR em 17 de abril. O BARnão admitiu que os homens tivessemestado sob sua custódia, e nenhumainvestigação confiável foi iniciada.
TORTURA
Ex-detentos disseram à AnistiaInternacional que o BAR costuma torturaros presos rotineiramente. Os métodos detortura incluem espancamento, chutes,suspensão a partir do teto, privação dealimento e de sono e choques elétricos nosórgãos genitais.
Os presos têm sido torturados até“confessarem” a prática de crimes. Mais deuma dúzia de vítimas disse à AnistiaInternacional que foi ameaçada com “fogocruzado”, caso não confessasse. Após“confessarem”, as vítimas foram entreguesà polícia, que então abriu processoscriminais contra eles, com base nasalegações do BAR.
Nesses processos, a data registrada daprisão foi o dia em que a vítima foi entregue
à polícia, não o dia em que o BAR efetuoua prisão. Dessa forma, a polícia temauxiliado o BAR a falsificar os registros e aencobrir as violações de direitos humanoscometidas por seus agentes.
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Acima, da esquerda: Nasir Ahmed,
Asaduzzaman Rubel, Mohammed Asadul
Hauqe Shahin, todos mortos em fogo cruzado
com o BAR; Mohammed Idris, torturado até a
morte pela polícia; Masum Fakir, jornalista
bengalês, em um hospital de Dhaka.
Masum contou que foi torturado pelos agentes
do BAR após ter sido preso em 22 de outubro
de 2009.
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“Fui mantido pendurado a partir do teto e medisseram que, se eu não concordasse com o que elesdissessem, eles me matariam.”Rabiul Islam, descrevendo à Anistia Internacional a tortura a que foi submetido por agentes do BAR
“SENTI QUE IA MORRER”Rabiul Islam, de 31 anos, foi preso poragentes à paisana em um hotel na cidadede Khulna, em 24 de outubro de 2009.Vendado e algemado, ele foi levado até asdependências do BAR, na área deKhalishpur. Lá, além de ser interrogado, elefoi espancado, ficou pendurado a partir doteto e teve choques elétricos aplicados aoseu pênis.
Rabiul Islam conversou com a AnistiaInternacional, em Khulna.
Fizeram-me sentar em uma cadeira
de rodas. Minhas mãos e pés foram
amarrados. Primeiro, a cadeira foi
girada de maneira a me deixar tonto
e, em seguida, fui espancado nessa
posição. O espancamento começou
em uma sala pequena, cerca de 10
minutos após chegarmos ao posto 6
do BAR. Eram três os que estavam a
me espancar: um deles, o capitão,
dava ordens; o outro me batia; e o
terceiro auxiliava no espancamento.
Eu estava com os olhos vendados.
Fui torturado por cerca de meia
hora. Depois, fui deixado no chão,
algemado e vendado. Então, tiraram
a venda e me deram um pouco de
comida. Quando acabei de comer,
eles me vendaram e algemaram
novamente, e me deixaram no chão.
Na manhã seguinte, em torno das 7
horas, eles me deram dois minutos
para tomar o café da manhã. Depois,
me vendaram e algemaram mais uma
vez, e me levaram para outro lugar.
Eles diziam: ‘Nós sabemos que você
tem armas, então admita’. Fui
mantido naquele segundo lugar por
cerca de 16 dias. Lá, minhas mãos
foram amarradas acima da minha
cabeça e presas ao teto. Fui mantido
pendurado e me disseram que, se eu
não concordasse com o que eles
dissessem, eles me matariam. Nesse
lugar, fui interrogado duas ou três
vezes, mas, na maior parte do tempo,
fiquei pendurado a partir do teto por
cerca de uma hora e meia seguidas.
Em algum momento, eles prenderam
fios em meu pênis e me deram
choques elétricos. Senti que ia morrer.
Eu tinha como certo que logo
morreria. Todo o meu corpo ficou
rígido, seguido por violento tremor.
Depois de muitos dias, fui levado à
delegacia de polícia de
Mohammadpur, em 9 de novembro
de 2009. A polícia abriu um processo
criminal contra mim, dizendo: ‘Olhe,
não há nada que possamos fazer. O
BAR nos disse para abrir esse
processo contra você’.
Depois que abriram o processo, fui
levado ao tribunal. No entanto, o
registro mostrava o dia 9 de
novembro de 2009 como a data da
minha prisão, embora eu tivesse sido
preso, de fato, em 24 de outubro de
2009, e ficado sob custódia do
BAR. Eu fiz uma objeção, mas
ninguém escutou. Vários dias
depois, fui levado ao tribunal
novamente e, então, enviado para a
prisão central de Dhaka.
Ainda que eu tenha sido preso em
Khulna, os registros policiais
apontam a delegacia de polícia de
Mohammadpur, em Dhaka, como o
local da prisão. Fui mantido na
prisão central de Dhaka por cerca de
seis meses e meio. Então, o tribunal
me concedeu fiança.
Todo mês, tenho de viajar de Khulna
ao tribunal de Dhaka. É um imenso
fardo financeiro para mim.
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Imagem da exposição fotográfica Crossfire
(Fogo cruzado), de Shahidul Alam, que chama
atenção para as execuções extrajudiciais em
Bangladesh.
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RESPONSABILIDADE DO ESTADOOs dois principais partidos políticos deBangladesh – o Partido Nacional deBangladesh e a Liga Awami – não têmdemonstrado compromisso com alimitação dos poderes do BAR.
Enquanto candidata, nas últimas eleiçõesgerais, a atual primeira-ministra, SheikhHasina, prometeu acabar com asexecuções extrajudiciais. Nos primeirosmeses no cargo, a primeira-ministra faloude uma política de “tolerância zero” emrelação às execuções extrajudiciais.Outras autoridades governamentaisrepetiram sua promessa. Essasesperanças foram frustradas no fim de2009, quando as autoridades, incluindo aministra do Interior, alegaram que nãohavia execuções extrajudiciais no país.
Essa negação blindou o BAR contra aJustiça e liberou a primeira-ministra desua promessa. Isso equivale a renovar ocontrato de impunidade para o BAR.
FALSAS INVESTIGAÇÕESAté agora, a responsabilidade principalpor investigar as mortes ocorridas duranteações do BAR tem sido atribuída aopróprio BAR. Há nisto um claro conflito deinteresses. Quando o acusado éencarregado de investigar uma acusaçãocontra si próprio, os princípios básicos daindependência e da imparcialidade estãocomprometidos. O acusado está livre paradestruir provas, distorcer registros e
manipular os resultados. O conteúdo dasaveriguações do BAR permanece secreto;seus resultados têm sido repetidamenteos mesmos. Nenhuma das investigaçõesdo BAR tornadas públicas culpou seupróprio pessoal por uma morteextrajudicial; pelo contrário, taisinvestigações, quando ocorreram,culparam as vítimas, classificando-ascomo criminosos e retratando suas mortescomo justificadas.
Autoridades do Ministério do Interiordisseram à Anistia Internacional que “emtodos os casos que resultaram em mortes,foram realizados inquéritos judiciais,conforme previsto na lei. Nenhum dosrelatórios dos inquéritos judiciais apontouque algum disparo de arma de fogo peloBAR possa ter sido injustificado”.
Mesmo quando os resultados deinquéritos judiciais sobre mortes queenvolveram forças de segurança vazarampara a imprensa e a informação vazadacontradizia as alegações do BAR, asautoridades governamentais endossaramas conclusões do BAR.
Em novembro de 2009, a Suprema Corteordenou que o governo explicasse asuposta execução extrajudicial de umpreso sob custódia do BAR, noticiada pelaimprensa. O governo negou que a vítimativesse sido morta sob custódia. Naverdade, a ministra do Interior afirmou:“Não está havendo qualquer fogo cruzadono momento. Nenhum incidente desse
tipo ocorreu desde que nosso governoassumiu o cargo”.
O direito à vida deve ser respeitado eprotegido sempre. Há procedimentosespecíficos que Bangladesh deve seguirpara garantir que as forças de segurançanão cometam execuções extrajudiciais.Tais procedimentos estão contidos nasnormas e nas leis internacionais dedireitos humanos, as quais incluem osPrincípios da ONU relativos a umaPrevenção Eficaz e à Investigação dasExecuções Extrajudiciais, Arbitrárias eSumárias e os Princípios Básicos da ONUsobre o Uso da Força e de Armas de Fogopor Funcionários Responsáveis pelaAplicação da Lei.
Uma resolução da Assembleia Geral daONU, adotada em 12 de novembro de2010, lembra os Estados de seu dever de“conduzir investigações exaustivas eimparciais sobre todos os supostos casosde execuções extrajudiciais, arbitrárias ousumárias” e de levar os responsáveis àJustiça, mediante audiências justas epúblicas. A resolução também insta osEstados a dar às vítimas e familiarescompensação adequada e a garantir quetais crimes jamais se repitam.
As informações disponíveis mostram queesses princípios não têm sido aplicados àsinvestigações de supostas execuçõesextrajudiciais praticadas pelo BAR e poroutras forças de segurança emBangladesh.
“Não está havendo qualquer fogo cruzado nomomento. Nenhum incidente desse tipo ocorreudesde que nosso governo assumiu o cargo.”Ministra do Interior de Bangladesh, novembro de 2009
TRANSFERÊNCIAS DEARMAMENTOS PARABANGLADESHApesar de seu histórico de execuçõesextrajudiciais, tortura e uso excessivo daforça, a polícia e o BAR de Bangladeshcontinuam a receber provisão de umaampla gama de equipamentos militares epoliciais, incluindo pistolas,metralhadoras, agentes tóxicos (gáslacrimogêneo), lançadores de granadas ehelicópteros, de muitos países fabricantesde armas. Tais países incluem Áustria,Bélgica, China, República Checa, Itália,
Polônia, Rússia, Eslováquia, Turquia eEstados Unidos. Além disso, telegramasdiplomáticos secretos da embaixada dosEUA em Dhaka, obtidos e divulgados peloWikileaks em dezembro de 2010, afirmamque a polícia britânica tem treinado osagentes do BAR. Na visão da AnistiaInternacional, qualquer país queintencionalmente envie armas ou outrasprovisões para equipar uma força quesistematicamente viola os direitoshumanos pode, em alguma medida, serresponsabilizado por essas violações.
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Imagem da exposição fotográfica Crossfire
(Fogo cruzado), de Shahidul Alam, que chama
atenção para as execuções extrajudiciais em
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A Anistia Internacional é um movimento global com mais de 3 milhões deapoiadores, membros e ativistas, em mais de 150 países e territórios, que realizacampanhas para acabar com os mais graves abusos contra os direitos humanos.
Trabalhamos por um mundo em que cada pessoa possa desfrutar de todos osdireitos contidos na Declaração Universal dos Direitos Humanos e em outrasnormas internacionais pertinentes.
A Anistia Internacional é independente de quaisquer governos, ideologiaspolíticas, interesses econômicos ou religiões, sendo financiada principalmentepor seus membros e por doações privadas.
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Agosto de 2011
Amnesty InternationalInternational SecretariatPeter Benenson House1 Easton StreetLondon WC1X 0DWUnited Kingdom
amnesty.org
RECOMENDAÇÕESAo governo de Bangladesh
� Estabelecer um órgão independente e
imparcial para investigar sem demora, de
forma rigorosa e efetiva todas as denúncias,
desde 2004, de execuções extrajudiciais,
tortura e detenção não registrada.
� Tornar públicas as conclusões de tais
investigações.
� Levar os responsáveis à Justiça, em um
julgamento justo, independentemente de sua
posição ou cargo.
� Revelar a verdade e garantir reparações
às vítimas das violações de direitos humanos.
À comunidade internacional, particularmente
aos países e entidades que contribuem com
doações a Bangladesh:
� Levar à atenção do governo de
Bangladesh as preocupações da Anistia
Internacional com relação às execuções
extrajudiciais no país, incitar o governo a pôr
fim a essas violações e levar os responsáveis
à Justiça, mediante julgamentos justos.
� Abster-se de fornecer a Bangladesh
armas que serão utilizadas pelo BAR e por
outras forças de segurança para cometer
execuções extrajudiciais e outras violações
de direitos humanos.
Acima: Estudantes protestam contra a prisão e suposta tortura do jornalista Masum Fakir pelo BAR, Dhaka, Bangladesh, outubro de 2009. Veja a
página 7.
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