INSTITUTO FEDERAL DO PARANÁ
INSTITUTO LATINO AMERICANO DE AGROECOLOGIA EDUCAÇÃO,
CAPACITAÇÃO E PESQUISA DA AGRICULTURA CAMPONESA
ESCOLA LATINO AMERICANA DE AGROECOLOGIA
CURSO SUPERIOR TECNOLOGIA EM AGROECOLOGIA
LUANA CARLA CASAGRANDA
A IMPORTÂNCIA DA PRODUÇÃO DE SEMENTES AGROECOLÓGICAS DE
HORTALIÇAS E ADUBAÇÃO VERDE NO ASSENTAMENTO CONTESTADO
PARANÁ
LAPA – PR
2013
2
LUANA CARLA CASAGRANDA
A IMPORTÂNCIA DA PRODUÇÃO DE SEMENTES AGROECOLÓGICAS DE
HORTALIÇAS E ADUBAÇÃO VERDE NO ASSENTAMENTO CONTESTADO
PARANÁ
Trabalho de Conclusão de Curso
realizado na Escola Latino Americana de
Agroecologia, por meio do Instituto
Federal do Paraná, para o Curso de
Tecnologia em Agroecologia.
Orientador: Prof. Dr. Hansjörg Rinklin
Co-orientadora: Franciane
Gotardo
LAPA – PR
2013
3
Dedico este trabalho a todas e todos campesinos, sujeitos e transformadores de uma
sociedade onde os sujeitos são emancipadores da humanização.
Em especial a minha família, minha base MST e a todos os movimentos sociais pela
luta incansável e permanente com a causa camponesa; aos seus princípios e valores; À
identidade, à pertença ao trabalho e a militância;
A realidade de nossas bases, comunidades, assentamentos e acampamentos;
A todos os homens e mulheres lutadores do povo que deram sua vida, sua dedicação à
luta, no horizonte a uma emancipação humana, na relação homem-natureza vivendo em
equilíbrio.
4
AGRADECIMENTOS
Aos Movimentos Sociais pela conquista de realizar este curso de
formação, sendo uma ferramenta de construção transformação.
A Escola Latina Americana de Agroecologia pelo esforço em desenvolver
o curso de início ao fim, e na parceria ao Instituto Federal do Paraná.
Ao orientador Prof. Dr. Hansjörg Rinklin pelo apoio e incentivo desde o início
na busca de realizar um bom trabalho.
Á co-orientadora Franciane Gotardo pelo esforço e dedicação no auxilio
ao desenvolvimento do trabalho.
E por fim agradeço a toda minha família, que sempre apoiou e incentivou
a realização deste trabalho, em especial ao meu companheiro Leonel e ao nosso
filho João Pedro, que sempre estiveram presentes ao meu lado, incentivando e
apoiando, meu estudo.
“A classe roceira e a classe operária
Ansiosa espera a Reforma Agrária
Sabendo que ela dará a solução
Para a situação que está precária
Saindo o projeto do chão brasileiro
De cada roceiro plantar sua área
Sei que na miséria ninguém viveria
E a produção já aumentaria
Quinhentos por cento até na pecuária.
Esta grande crise que há pouco surgiu
Maltrata o caboclo, ferindo o seu brio
Dentro de um país rico e altaneiro
Morrem brasileiros de fome e de frio
Em nossas manchetes ricas em imóveis
Milhões de automóveis já se produziu
Enquanto o coitado do pobre operário
Vive apertado ganhando um salário
Que sobe depois que tudo subiu.
Nosso lavrador que vive do chão
Só tem a metade de sua produção
Porque a semente que ele semeia
Tem que ser à meia com o seu patrão
Os nossos roceiros vivem num dilema
E o seu problema não tem solução
Porque o ricaço que vive folgado
Acha que o projeto se for assinado
Estará ferindo a Constituição
A grande esperança que o povo conduz
Pedindo a Jesus pela oração
Pra guiar o pobre por onde ele trilha
E a cada família não faltar o pão
Que ele não deixe o Capitalismo
Levar ao abismo a nossa nação
A desigualdade que existe é tamanha
Enquanto o ricaço não sabe o que ganha
O pobre do pobre vive de tostão.” (CULTURA, p.20)
Música: “A Classe Roceira” (Zilo e Zalo).
6
RESUMO
Este estudo tem como objeto de pesquisa uma analise sobre a importância das sementes
agroecológicas de hortaliças e adubação verde para as famílias camponesas do
Assentamento Contestado. Pelo fato de existir no assentamento um projeto de sementes
agroecológicas sendo desenvolvido pelas famílias, daí então surge esta pesquisa no âmbito
de qualificar ainda mais esta produção de sementes agroecológicas. Trazendo presente
também as sementes hoje no mercado, sendo cada vez mais privatizadas pelas
transnacionais, deixando assim de pertencer aos que desde o princípio às cultivou
culturalmente, de fato “os camponeses” tendo assim conquistado o direito de ter a
autonomia em relação ao controle das sementes. Neste sentido a pesquisa qualitativa
identificou as vantagens, limites e desafios a serem construídos pelas famílias na
importância das sementes, pois ela é um patrimônio dos povos e está a serviço da
humanidade, portanto as famílias que estão participando do projeto, o interesse inicial
foram pelo fator econômico que envolve a produção, mas em geral também compreende
que a produção de sementes envolve a garantia da autonomia camponesa e da soberania
alimentar. Através da produção de sementes, as famílias demonstraram certa pertença ao
Movimento Sem Terra, pois o mesmo em seus princípios e valores discute esta relação de
resgate as sementes agroecológicas, e no âmbito da agroecologia como uma forma de
viver, são de extrema importância que o camponês garanta sua autonomia às sementes.
Palavras-chaves: Sementes Agroecológicas. Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra. Agroecologia. Soberania Alimentar.
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RESUMEN
Este estudio es un objeto de análisis de la investigación acerca de la importancia de las
semillas agroecológicas de vegetales y abonos verdes de las familias campesinas en la
liquidación impugnada. Debido a que hay un proyecto en el asentamiento de semillas
agroecológicas que se desarrollan las familias, entonces surge en el contexto de esta
investigación calificar aún más esta producción de semillas agroecológicas. Llevar
también las semillas en el mercado de hoy en día, cada vez más privatizada por
corporaciones transnacionales, dejando a los que pertenece desde el principio a las culturas
cultivadas en efecto "campesinos" y el ganó del derecho de gozar de autonomía en relación
con el control de semillas. En este sentido, la investigación cualitativa ha identificado las
ventajas, limitaciones y desafíos a ser construidas por las familias sobre la importancia de
las semillas, ya que es un patrimonio del pueblo y está al servicio de la humanidad, por lo
que las familias que participan en el proyecto, el interés inicial fueron el factor económico
que consiste en la producción, sino también en general entiende que la producción de
semillas consiste en garantizar la autonomía campesina y la soberanía alimentaria. A través
de la producción de semillas, las familias mostraron algunos pertenecientes al Movimiento
Sin Tierra, porque incluso en sus principios y valores discutió esta relación rescatar
semillas agroecológicas, y dentro de la agroecología como una forma de vida, es de suma
importancia que el campesino asegure su semilla e consiga su propia autonomía.
Palabras clave: Semillas Agroecológicas. Movimiento de los Trabajadores Rurales Sin
Tierra. Agroecología. Soberanía Alimentaria.
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SUMÁRIO
CONSIDERAÇÕES INICIAIS ...................................................................................... 9
METODOLOGIA ........................................................................................................ 13
CAPÍTULO I – SEMENTES E AGROECOLOGIA ................................................... 13
1.1 A Origem das Sementes e da Agricultura ...................................................... 14
1.2 A In,fluência da Revolução Verde na Agricultura ............................................. 17
1.3 A Agroecologia .................................................................................................. 19
CAPÍTULO II- O MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA
(MST), A PRODUÇÃO DE SEMENTES E A SOBERANIA ALIMENTAR ............. 20
2.1 O MST, o Debate da Agroecologia ................................................................... 20
2.2 Sementes Patrimônio dos Povos Garantia da Sustentabilidade e da Soberania
Alimentar ................................................................................................................. 22
CAPÍTULO III- DESAFIOS PARA A PRODUÇÃO DE SEMENTES
AGROECOLÓGICA S DE HORTALIÇAS E ADUBAÇÃO VERDE NO
ASSENTAMENTO CONTESTADO ........................................................................... 24
3.1 Localização e Contextualização Geográfica do Assentamento ......................... 24
3.1.1 Histórico do Assentamento Contestado e o Projeto “Sementes Para Todos”25
3.2 Um Olhar para a Produção de Sementes Agroecológicas no Assentamento
Contestado – Vantagens , Limites e Desafios .......................................................... 27
CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................... 34
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................... 37
ANEXOS ...................................................................................................................... 38
9
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
O presente trabalho originou-se da vivência de estágio realizado no final do ano de
2011 na Cooperativa Agroindústria e Comércio Terra Livre, localizada no Assentamento
Contestado município da Lapa- Pr. O eixo central era as tecnologias desenvolvidas a
Cooperativa junto às famílias em seus respectivos Agroecossistemas1 e sistemas de
produção, especialmente na frente da produção de sementes, identifiquei a necessidade das
famílias em produzir suas próprias sementes.
Neste período estava sendo executado o projeto “Semente Para Todos” realizado
pela Associação para o Desenvolvimento da Agroecologia (AOPA) em Cooperação com o
FKM. O Projeto Semente Para Todos, tem como objetivo, implantar processos de resgate,
seleção, melhoramento e produção comunitários de sementes agroecológicas na agricultura
familiar, visando o redesenho dos sistemas produtivos através da agrobiodiversidade,
reforçando as redes sociais e sua sustentabilidade2.
Hoje vivemos com um modelo de agricultura insustentável, devido à mudança na
matriz tecnológica de produção iniciada á décadas atrás. Frente à problemática provocada
pela modernização na agricultura, o campo se encontra com grandes dificuldades, pois
perdeu sua autonomia em especial na área da produção de sementes, no melhoramento
genético das mesmas, agravando cada dia mais a produção das sementes e alimentos
agroecológicos. Cada trabalho voltado nesta área é de grande valia para a agricultura e
quem depende dela para sobreviver, recuperar a autonomia das sementes todo camponês
necessita, na continuidade já praticada por muitas gerações passadas, mas pelo fato desta
mudança causar este impacto tão grande na agricultura é que nos vemos hoje
comprometidos em lutar a favor das sementes agroecológicas e não nas sementes
1 Agroecossistema: “É uma unidade com que a Agroecologia trabalha. Ele é uma unidade de análise.
Um agroecossistema é um ecossistema artificializado pelas práticas humanas ligadas á agricultura,
sendo esta vista como um conjunto de valores, relações sociais, políticas, culturais, econômicas,
tecnológicas e ambientais.” (MST; et al, 2005, p.13).
2 “Do ponto de vista ambiental, a promoção da sustentabilidade de um agroecossistema depende,
basicamente, de que seu manejo leve à otimização de processos como a disponibilidade e o equilíbrio no
fluxo de nutrientes, a proteção e a conservação da superfície do solo, a preservação e a integração da
biodiversidade e a exploração da adaptabilidade e da complementaridade no uso dos recursos genéticos
vegetais e animais”. (MACHADO, et al, p. 103).
10
geneticamente modificadas3, onde o homem com sua capacidade consegue modificar um
gene de uma planta e dar a ela atributos específicos, que na sua natureza não existia.
Reavivando o projeto já existente no Assentamento, este trabalho soma-se com o
intuito de melhorar não somente a produção, mas toda a cadeia da alimentação de nossa
população. Por meio desta discussão, onde envolve a produção e a comercialização dos
alimentos e principalmente a qualidade dos mesmos, existe uma normativa em respeito da
produção agroecológica no país. Segundo o Projeto Sementes Para Todos, trás que no dia
18 de Dezembro de 2008, o ministro de estado da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
Reinhold Stephanes, em sua atribuição criou a normativo Nº 64 da lei 10.831 de 23 de
dezembro 2003, as regulamentações e instruções normativas, onde diz o seguinte:
Art. 97. As sementes e mudas deverão ser oriundas de sistemas orgânicos.
§ 3° A partir de cinco anos da publicação desta Instrução Normativa, fica
proibida a utilização de sementes e mudas não obtidas em sistemas orgânicos de
produção.
Art. 98. É proibida a utilização de organismos geneticamente modificados em
sistemas orgânicos de produção vegetal.
Art. 99. É vedado o uso de agrotóxico sintético no tratamento e armazenagem de
sementes e mudas orgânicas. (STEPHANES, R. 2008, p.21).
Já completados os cinco anos desta normativa criada em 2008, hoje no ano de 2013,
portanto já estaria valendo esta lei, mas o Brasil se encontra com uma grande deficiência
em produzir em grande escala sementes e mudas orgânicas, respeitando a normativa, o que
se tem não é suficiente para atender toda demanda. Tornando assim uma procura muito
grande de sementes e mudas orgânicas em todo país, e a agricultura necessita de um aporte
para atender sua produção orgânica, do início ao fim do ciclo da planta. Retomando o que a
normativa acima apresentou, na lei fica proibido utilizar qualquer tipo de agrotóxico
sintético, usar organismos geneticamente modificados na produção de vegetais orgânicos,
percebe-se o quão do trabalho de resgatar a produção própria de sementes agroecológicas
em cada unidade camponesa, necessita ser de extrema urgência, pois se olharmos
sutilmente na agricultura que está sendo desenvolvida atualmente, a situação já se encontra
fragilizada, pela degradação do meio ambiente, contaminação das águas, da terra e dos
alimentos, além do aquecimento global que afeta toda natureza. O objetivo do agronegócio
é totalmente diferente, seu interesse principal é o lucro, o dinheiro sem medir sequer
alguma consequência com os atos praticados contra toda natureza.
3 Sementes Geneticamente modificadas são sementes elaboradas em laboratórios.
11
Para enfrentarmos esta ofensiva do agronegócio, após já ter gerado grande perda em
toda nossa biodiversidade, no desequilíbrio da natureza, nós movimentos sociais lutamos a
fim de um Projeto Popular para o Brasil, nos articulamos em também resgatar a cultura
camponesa, roubada por este modelo de agricultura implantado no país pelas
transnacionais. Recuperar e resgatar, cuidar e cultivar da vida, das sementes nativas,
crioulas, que foram passando de geração a geração, mas que hoje muitas delas já não se
têm mais se perdeu a autonomia de um bem que é a germinação da vida, o início da vida
que nos sustenta nos dá força vital para vivermos e habitarmos na terra.
Com a implantação do projeto de Assentamento no ano 2000, foram desencadeando-
se sistemas de produção predominantes na comunidade, o qual predomina o sistema de
produção voltado para a Agroecologia. Em cima desta realidade é que este trabalho tem
como objetivo analisar as dificuldades encontradas pelas famílias em produzir suas
próprias sementes de hortaliças e adubação verde agroecológicas, a importância da
produção de sementes para as famílias, e a forma de organização da produção de sementes.
Sendo o forte da produção, as hortaliças e em menor escala a adubação verde. Junto às
camponesas e camponeses assentados, trazer cada vez mais para dentro do movimento, o
debate da importância da produção de sementes, pois isto promove o resgate da cultura e
da identidade camponesa, e conhecimentos na produção agroecológica das mesmas.
Este trabalho possui também um intuito de não apenas resgatar as sementes, mas de
também analisar a troca de sementes feita pelas famílias, se esta cultura existe no
assentamento, se as famílias habitualmente costumam trocar sementes por sementes.
Por meio de uma pesquisa qualitativa, elaborou-se uma análise sobre a importância
da produção de sementes agroecológica de hortaliças e adubação verde no Assentamento
Contestado.
Parto da hipótese que as famílias ao produzirem suas próprias sementes possuem
autonomia sob sua produção. Há muita dificuldade de garantir o cultivo devido a vários
fatores internos e externos. No entanto, produzem para o auto-sustento familiar.
O primeiro capítulo abordará o tema: Sementes e Agroecologia, trazendo presente à
origem das sementes e da agricultura e a importância das sementes para a germinação da
vida, entendendo o modelo de produção predominante implantado na agricultura,
12
relembrando o que foi a revolução verde e sua influência na agricultura, finalizando o
capítulo com a Agroecologia contrapondo este paradigma, ou seja, gerando novamente
uma sustentabilidade ao campo e ao camponês e a camponesa. Em AHRENS (p. 8, 2011),
cita em sua cartilha um conceito de agroecologia definido por CAPORAL e
COSTABEBER (2009): “a agroecologia é entendida como um enfoque científico destinado
a apoiar a transição dos atuais modelos de desenvolvimento rural e de agricultura
convencional para estilos de desenvolvimento rural e de agricultura sustentável”.
No segundo capítulo, falará do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
(MST) e a Soberania Alimentar, descrevendo o MST e o debate da Agroecologia, Sementes
Patrimônio dos Povos Garantia da Sustentabilidade e da Soberania Alimentar e a Produção
de Sementes dentro do Movimento.
O terceiro capítulo discute a produção de sementes agroecológicas no
Assentamento Contestado, trazendo um olhar das famílias assentadas para: as dificuldades;
as vantagens e os desafios na produção de sementes de hortaliças e adubação verde
agroecológicas.
13
METODOLOGIA
A metodologia de trabalho aconteceu primeiramente, por meio de uma pesquisa
teórica, buscando publicações de autores algumas explicações da problemática a ser
trabalhada. Realizando uma pesquisa minuciosa, baseada na observação participante e na
entrevista semiestruturada, utilizando-se um roteiro orientador.
Para compreender os desafios que as famílias do Assentamento Contestado
encontram para garantir em sua unidade de produção agroecológica, sementes de hortaliças
e adubação verde, utilizou-se a metodologia de pesquisa qualitativa. “Ela trabalha com o
universo dos significados, dos motivos, das aspirações, das crenças, dos valores e das
atitudes, entendidos como parte da realidade social.” (MINAYO, 1993, p.21-22). Esta se
define em um conjunto onde ser humano não só age, ele pensa e reflete sobre o que fez e
interpreta a sua realidade.
Com esta metodologia de trabalho pode-se realizar perguntas fechadas e abertas,
em que o entrevistado tem a possibilidade de discorrer sobre o tema em questão “sem se
prender a indagação formulada” (MINAYO, 1993, p.64), podendo assim trazer com mais
clareza e tranquilidade sua opinião sobre o tema.
A pesquisa ocorreu com nove famílias das cento e oito existentes no Assentamento.
As famílias foram classificadas em três diferentes grupos, de três famílias cada. O grupo
um, são famílias de base na produção agroecológica, iniciantes no projeto Produção de
Sementes para Todos. O grupo dois são também famílias agroecológicas, mas que não
possuem envolvimento no projeto, e o grupo três são famílias que ainda estão no processo
de transição agroecológica, produzem convencionais.
14
CAPÍTULO I – SEMENTES E AGROECOLOGIA
1.1 A Origem das Sementes e da Agricultura
Pincelando o universo sobre a origem das sementes e da agricultura, iniciamos a
proza com alguns fundamentos teóricos como se deu todo este desenlace.
Os estudos acadêmicos da realidade agraria no Brasil lamentavelmente são muito
recentes. Evidentemente, essa ausência e verdadeira carência de estudos sobre a
nossa realidade, nos mais abrangentes aspectos, é consequência do longo período
de “escuridão” cientifica que nos impuseram nos 400 anos colonialismo.
(STEDILE, 2005, p. 16).
Correspondente ao autor, vemos que estes 400 anos de colonialismo foram um
grande retrocesso no desenvolvimento das ideias e teses sobre a questão agraria em nosso
país, e mesmo com o primeiro estudo publicado em 1960, por Roberto Simonsen,
afirmando que no país sempre predominaram relações de produção capitalistas no
desenvolvimento da agricultura brasileira. Para STEDILE (2005, p. 15), a questão agrária
é um conjunto de interpretações e analises da realidade agrária, com o intuito de explicar a
organicidade à posse, a propriedade e ao uso da terra na sociedade brasileira.
A civilização brasileira pode-se dizer que se originaram através da ocupação do
território pelos povos nômades, migrantes vindo da Ásia, cruzando o Alasca e chegando à
América, estudos mostram os primeiros sinais de vida humana no Brasil no estado do
Piauí. Portanto pelo que a história nos mostra estes povos, viviam em agrupados
socialmente, dedicando-se da caça, da pesca, da coleta de frutos silvestres, raízes, folhas e
grãos; predominando em partes a agricultura, pois a natureza já os oferecia alimentação, e
mais tarde domesticaram cultivos de mandioca, amendoim, abacaxi, o tabaco, banana e o
milho. Esta produção existente dizia respeito ao comunismo primitivo por organizarem-se
em agrupamentos sociais. Viviam em grupos migrando pelo mundo inteiro, dependendo
dos recursos naturais para a sobrevivência de todos, aos poucos foram adaptando-se aos
fenômenos da natureza e criando seus conhecimentos e saberes, suas práticas e técnicas
foram evoluindo, gerando um processo de evolução para a humanidade, segundo
MORISSAWA (200, p. 8) cerca de 10 mil anos atrás, quando se deu os primeiros indícios
de agricultura registrados na História, encontrados na Mesopotâmia, entre os rios Tigre e
15
Eufrates, região do Oriente Médio, lá onde hoje está o Iraque. A história nos conta que a
produção iniciou com trigo e cevada, e ossos de cabra. Em estudos publicados por HEISER
(1977, p. 7), “no novo mundo, a agricultura começou alguns milhares de anos mais tarde
do que no Oriente Médio, e teve suas origens no México”, sendo as primeiras culturas de:
abóboras, feijões e pimentas-chili.
Com o passar dos anos a humanidade foi construindo sua história, evoluindo
sempre mais no mundo todo. A natureza também foi se constituindo e tendo suas
modificações. Com isso surgiu então à necessidade de adaptação e disponibilização de
recursos naturais para a sobrevivência das comunidades, os povos foram desenvolvendo
suas técnicas e práticas para esta realidade.
Neste processo contínuo de descoberta e evolução, também se encontram as
sementes. Pela observação da capacidade que as sementes tinham (e têm) de
germinar e produzir novas plantas descobriu-se a agricultura. É atribuía às
mulheres a descoberta da agricultura. Segundo nos conta a história, as mulheres
dos povos e tribos antigos jogavam ao redor de suas moradias sementes retiradas
dos frutos colhidos pelos homens nas matas. Com o tempo, observaram que
nasciam plantas que até então não existiam ali. Passaram, então, a coletar
sementes e cultivar, ao redor de suas casas, plantas que serviam de alimentos.
Estava descoberta a agricultura. Isso aconteceu há 12 mil anos. Com a descoberta
da agricultura, os povos, que até então eram nômades, ou seja, mudavam-se
constantemente de lugar em busca de alimentos, passaram a fixar moradia. Com
a possibilidade de morar em um só lugar, foram organizando-se as primeiras
vilas, que evoluíram para o que hoje conhecemos cidades. (CPT, 2006, p. 11).
A descoberta das sementes pelos caçadores e coletores, povos nômades, aos poucos
foi ganhando importância e destaque na natureza, pelo simples fato de um pequeno grão
germinar e desenvolver uma planta um ser vivo. Recordamo-nos daquele tempo em que o
pai ensinava ao filho o que havia aprendido com seu pai, seu avô e os conhecimentos
passavam de geração a geração, a cultura camponesa se enriquecia de ensinamentos,
técnicas, saberes populares, trazidos de uma longa história de luta e de resistência. Dentre
estes saberes se destaca a produção das sementes, dos alimentos próprios das famílias, cada
qual plantava para a quantidade à sua subsistência, semeavam, colhiam e selecionavam as
melhores para o ano seguinte, isso consequentemente, e após alguns anos de utilização da
mesma semente, trocava-se com vizinhos, amigos, com o intuito de melhorar sua genética.
Para HEISER (1977, p. 2), por volta de 10.000 anos atrás o homem deixou de ser
caçador-colhedor para torna-se um produtor de alimentos, e à medida que aumentava a
produção surgiram às aldeias e, com o tempo, formaram-se as cidades, e a civilização se
16
pôs em marcha. “Uma diferença importante entre caçadores-colhedores e os agricultores é
que aqueles geralmente são nômades, enquanto estes são sedentários”. (HEISER, 1977 p.
2). O aumento da produção é origem de um processo de domesticação das sementes
(MEIRELLES, 2006) explica melhor este processo.
Houve um tempo em que as plantas que hoje são cultivadas na agricultura
existiam somente como plantas que cresciam de forma selvagem nas matas e
campos. Como plantas silvestres, não precisavam ser plantadas para nascer, nem
de cuidados para crescer e dar frutos. Sua utilização pelos grupos humanos dava-
se através da coleta, e não do cultivo‟. (...) Desta forma, podemos dizer que as
plantas e animais que hoje cultivamos e criamos – flores, temperos, hortaliças,
frutíferas, grãos, fibras, porcos, aves, gados de corte, gados de leite – são fruto de
um processo de domesticação e seleção, realizado por agricultores e agricultoras,
através de gerações e gerações, em diferentes partes do nosso planeta. Ou seja,
agrobiodiversidade é o resultado de um processo milenar de interação entre a
natureza e o ser humano através da prática da agricultura. (MEIRELLES; RUPP,
p. 06, 2006).
Portanto, com a domesticação e seleção de espécies animais e vegetais, realizada
por camponeses e camponesas4 a nossa identidade enquanto classe, e não agricultor
5.
(CARVALHO, 2005) nos explica que é uma transformação ideológica, onde o camponês é
visto de atrasado e o agricultor, familiar é moderno, o processo do capitalismo tenta
esconder a identidade, a história de resistência do camponês.
Relembrando nossa história, em 1930, onde houve a interrupção da migração de
camponeses europeus decorrente da I Guerra Mundial (1912-1918) e com a adoção do
modelo agroexportador 6, fez com que o número da população de trabalhadores brasileiros
se reduzisse por minoria, isso foi um, massacre às populações nativas que aqui habitavam.
Neste período surge também o campesinato, com uma identidade de trabalhadores
escravizados (STEDILE, 2005, p. 27). Menciona isso em duas etapas: a primeira é quando
foram trazidos dois milhões de camponeses pobres da Europa, para trabalhar no Brasil, e a
segunda é quando as populações mestiças foram se, formando ao longo dos 400 anos de
colonização e com a miscigenação entre várias etnias nasceram descendentes que não eram
4 “Camponês é aquele que tem acesso aos Recursos Naturais, seja a posse e/ou o uso da terra, água, florestas,
biodiversidade, etc., cujo trabalho está centrado na força da família, embora possa contratar serviços
temporário e/ou prestar serviços para terceiros e a centralidade da reprodução social está na família.”
(CARVALHO, 2005). 5 Agricultor: este termo é utilizado pelo sistema convencional do agronegócio, assim também como a
„agricultura familiar‟, fazendo com o homem do campo perca sua identidade de camponês, 6 Agroexportador: produção agrícola em grandes áreas, praticando monocultura e produzindo apenas para o
exterior, para STEDILE, (2005, p. 29).
17
capitalistas, passaram a migrar, ocupando terras de forma individual ou coletiva, dando o
surgimento ao camponês, que plantava somente para sua subsistência.
Durante a II Guerra Mundial, por volta de 1930, houve uma nova fase na questão
agrária, o modelo agroexportador entra em,, crise, por suas próprias contradições, havendo
como ponto principal a “subordinação econômica e política da agricultura à indústria”
(STEDILE, 2005, p.28), a razão deste motivo,, acontece pelo fato de que este modelo
capitalista dependente necessitava da importação de, máquinas e mão de obra, gerando
dividas encerando o ciclo das atividades do mesmo, os escravos fugiram das fazendas , não
sendo mais explorados, passam a incorporam a sociedade, ,aumentando o processo de
urbanização e a necessidade de produzir mais alimentos. É o início do novo setor da
indústria ligado à agricultura, a industrialização dependente, a REVOLUÇÃO VERDE,
ocorre neste período que foi organizado e planejado pelos países indústria lizados no pós-
guerra mundial.
1.2 A Influência da Revolução Verde na Agricultura
Em 1945 após a Segunda Guerra Mundial, o mundo todo presenciou uma
transformação para a agricultura: a chamada “REVOLUÇÃO VERDE”. Iniciou nos
Estados Unidos em 1930, e chegando fortemente no Brasil em 1960, trazida pelos
americanos, apresentada com uma grande promessa de “revolução”, pois iria esverdear
toda a terra, a produção de alimentos seria em abundância, tão enorme que iria acabar com
a fome do planeta. Mas a ligação que a Revolução Verde teve com a Segunda Guerra
Mundial, foi que as invenções produzidas utilizadas na guerra, com o seu término,
perderiam a utilidade, seriam descartadas, mas para não perder estas invenções e sim gerar
lucro com elas, criou-se então uma nova tecnologia para a agricultura, a venda do pacote
tecnológico aos agricultores, onde nele contém maquinários pesados, energia de petróleo,
sementes registradas, produtos químicos (estes se tornaram os remédios para as plantas), e
créditos para financiamento do pacote e com juros altos.
Para GÖRGEN (2004, p. 26), a Revolução Verde foi um Programa de
desenvolvimento do capitalismo na agricultura, com caráter de gerar lucro no mercado. O
autor ainda destaca quatro pontos onde este lucro se baseia na agricultura:
18
- da genética vegetal com produção e multiplicação de sementes hibridas ou
“melhoradas”, resistentes a doenças e pragas e adaptadas para receber altas doses
de adubos químicos;
- da aplicação de novas técnicas agrícolas ou tratos culturais – aplicação
intensiva de adubos químicos e venenos;
- da mudança da infra-estrutura agrícola e aplicação de mecanização pesada e
intensiva em todas as atividades possíveis;
- da genética animal com animais de raças “melhoradas”, uso de antibióticos,
hormônios e produtos químicos.
De fato foi planejado todo este pacote tecnológico para agricultura, onde o poder se
concentrou com os países industrializados dominando toda a cadeia de comercialização e
produção. No Brasil grandes empresas multinacionais instalaram-se para dar suporte a esta
privatização da agricultura. Para (PACKER, p. 9) a Monsanto é a maior empresa de
sementes do mundo, a Syngenta outra campeã de vendas do milho transgênico e
agrotóxico, e as demais empresas que atuam na mesma linha sendo: “Bayer, Basf,
DowCrospscience e Du Pont, empresas de biotecnologia que monopolizam a patente e
comércio de sementes e agrotóxicos, e portanto da própria cadeia agroalimentar”, para
estas empresas alcançarem até hoje lucro, necessitou-se de meios para esta conquista,
como por exemplo, a mídia que trazia em sua propaganda uma modernização para a
agricultura, eficiência, competição, contrapondo os camponeses com sues conhecimentos
populares, tradicionais, herdados de geração a geração, os desmoralizando de atrasados,
sem tecnologias, de supersticiosos que acreditam na influência da lua, trazendo ao
camponês um constrangimento social, os obrigando a adotarem o novo modelo para não
ficarem pra trás na produção.
A influência da Revolução Verde na agricultura foi e está sendo cada vez mais
intensa e devastadora. Em (PINHEIRO, 1999, p. 21) “o maior impacto ocorreu na América
Latina, onde houve uma desestruturação total da agricultura, com a devastação da natureza,
êxodo rural e concentração da terra nas mãos de poucos e uma monocultura7 exclusiva”.
Não apenas a América Latina, mas o mundo inteiro sente na pele todos estes estragos, as
mudanças ocorridas ao longo das décadas, que a revolução verde trouxe á humanidade.
Segundo (PINHEIRO, 1999), os impactos negativos aos países não industriais, do quanto à
revolução verde proporcionou o beneficiamento apenas dos bancos internacionais e das
7 “Monocultura= todo o esquema montado levou o agricultor apensar que ia ficar rico plantando um só
produto, aquele que tinha financiamento, assistência técnica, cooperativa para armazenar sementes
selecionadas, adubos e venenos à mão”.(CORTEZ, et al, p. 39, 2005).
19
empresas transnacionais de insumos para a agricultura, onde estas obrigavam o agricultor a
comprar sementes certificadas e fiscalizadas, para ter acesso ao credito rural. A verdade é
que estas poucas transnacionais dominantes não estão interessadas no futuro da
humanidade e sim no lucro que podem ganhar com toda esta carga de produtos químicos,
maquinários utilizados na agricultura que deteriorizam o solo, a vida do solo, o potencial
das plantas, a perda da biodiversidade, a contaminação das águas, dos alimentos e de todos
os seres vivos que precisam da natureza pura fértil, limpa para garantir a sustentabilidade
de toda esta cadeia produtiva.
As sementes tradicionais cultivadas pelos povos camponeses, aos poucos foram
sendo perdidas pela entrada das sementes registradas das empresas industriais, gerando
uma enorme perda da biodiversidade8 de plantas, animais e toda a cadeia alimentar. As
reversas naturais são uma garantia e segurança de biodiversidade e evolução das espécies.
1.3 A Agroecologia
Frente à situação devastadora e desumana que a dita globalização transformou a
agricultura, por meio da Revolução Verde, o povo organizado com o intuito de contrapor
esta ofensiva da agricultura convencional, abre as portas à agricultura agroecológica, é
AGROECOLOGIA que com seu manejo totalmente ecológico, dá novas esperanças de
recuperarmos parte do que já se foi perdido com a Revolução Verde. De acordo com
(Gusmán, 2.000, p. ), a Agroecologia surge no final dos anos 70, devido às manifestações
feitas pela crise ecológica do campo, mais tarde foi redescoberta, fazendo com que os
estudos da agronomia, aos poucos ganhassem mais força. No passado da humanidade
muitos conhecimentos foram experimentados com sucesso por várias culturas tradicionais,
os conhecimentos demonstraram que estas experiências poderiam ser à saída dos
problemas ambientais existentes. Assim, a Agroecologia surge com a função de analisar e
organizar os fenômenos naturais, e aos poucos, cria uma concepção preocupada na
sustentabilidade do meio ambiente.
A Agroecologia não é uma ciência exata, concreta, pois ainda está sendo construída
e estudada pelos pesquisadores em seus experimentos e observações, e nas práticas
8 “Desde o início, o agricultor sabia que as plantas selvagens, parentes das suas domesticadas, eram também
muito importantes, pois elas possibilitavam que novas espécies fossem criadas. isto é denominado de
BIODIVERSIDADE. (PINHEIRO, 1999, p. 4).
20
camponesas. Sua função está em fornecer o suporte científico e as ferramentas
metodológicas necessárias para que a participação de toda sociedade se torne a força
geradora da sustentabilidade familiar, da segurança alimentar de nossa nação.
Altieri (2004) argumenta que: sob a perspectiva da produção, a
sustentabilidade somente poderá ser alcançada no contexto de uma
organização social que proteja a integridade dos recursos naturais e
estimule a interação harmônica entre os seres humanos, o agroecossistema
e o ambiente. (AHRENS, et al, 2011, pg. 8).
As bases epistemológicas da Agroecologia estão na relação e integração entre
homem-natureza-ambiente, onde é possível criar condições de auto sustentação, gerando o
equilíbrio natural para ter a sustentabilidade, em outras palavras, esta relação é um anel,
onde todos necessitam de todos para manter-se no ambiente em equilíbrio, assim como diz
o trecho desta canção, sobre a natureza:
“a gente cultiva ela e ela cultiva a gente”.
CAPÍTULO II- O MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA
(MST) A PRODUÇÃO DE SEMENTES E A SOBERANIA ALIMENTAR
2.1 O MST, o Debate da Agroecologia
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra criado em 1984, atua em 23
estados brasileiros, com mais de 1,5 milhão de pessoas, com 300 mil famílias assentadas e
150 mil que ainda vivem em acampamentos9. O MST como um movimento social, busca
sempre trazer presente em sua pauta politica a necessidade de reforma agrária no
enfrentamento à grande crise gerada pela industrialização dependente, que ao invés de
acabar com a fome, pelo contrario, problematizou mais a pobreza e a miséria da população
brasileira, e na concentração de poder dominado por poucos.
O MST não luta apenas pela terra, mas pela educação, saúde, resgate cultural,
educação ambiental, esporte lazer no âmbito em que homem e mulher trabalhem de forma
igualitária exerçam as mesmas funções de uma sociedade, onde vise a democracia sem
exploração. Sem a luta não é conquistado nada em nossa vida todos temos nossos direitos e
deveres, portanto temos que lutar de forma organizada, um exemplo claro é A Luta Pela
Reforma Agrária, que preserve a natureza juntamente com a conscientização dos
trabalhadores.
9 (CORTEZ, et al, Bionatur, 2005, p. 58).
21
Segundo (CORTEZ, et al, 2005, p. 59) o MST desenvolve experiências
agroecológicas e florestais, em assentamentos se produz diversos alimentos, como: arroz,
soja, amendoim mandioca, milho, café, pêssego, frangos, e suínos totalmente orgânicos,
estabelecendo uma nova forma de produção no campo que vise a sustentabilidade do
agroecossistema, uma ferramenta para a transformação da sociedade, assim como a
agroecologia corresponde aos princípios e objetivos que norteiam o movimento na luta
pela reforma agrária, a partir da visão política do movimento social.
A Agroecologia no Movimento está presente dentro dos debates, reuniões,
encontros, e principalmente nas Jornadas de Agroecologia, realizadas anualmente no
Paraná, resultante de “uma coalizão política constituída em 2001, que resultou de um
amplo processo dialógico entre os Movimentos Sociais do Campo e Organizações Não-
Governamentais atuantes no estado do Paraná” (TARDIN, 2009). Bandeira fortíssima de
luta do MST, que desde os anos 80 promovem a Luta Pela Terra e Pela Reforma Agrária e
a Agroecologia.
O primeiro encontro realizado foi em 2002, em Ponta Grossa com uma média de
quatro mil participantes, e a cada ano aumenta a participação de pessoas vindas de outros
países, fazendo com que a Jornada se torne de sempre mais uma ferramenta do povo
camponês, na luta ofensiva do agronegócio. Seu lema original é: Jornada de Agroecologia
– Terra Livre de Transgênicos e Sem Agrotóxicos, com objetivos estratégicos, atua na rede
de cooperação nos processos político-organizativos, econômicos e culturais locais e
regionais num movimento camponês agroecológico, (TARDIN, 2009) “tem impulsionado a
transição agroecológica associada à luta política que culminou na aprovação de legislações
e políticas governamentais coibitivas aos transgênicos e aos agrotóxicos, e ao
enfrentamento direto as transnacionais Monsanto e Syngenta”.
A Agroecologia vem ao encontro deste objetivo, no horizonte do equilíbrio social e
ambiental, estabelecer novas relações entre seres humanos e a natureza. O fortalecimento
desta proposta à classe trabalhadora busca, nos diferentes espaços resgatar, formar,
capacitar camponesas e camponeses, crianças e jovens do campo, compreendendo a
realidade local, sendo que de certa forma resgatam suas raízes, suas culturas, roubadas pelo
modelo capitalista oriundo da Revolução Verde, sistema este opressor, alienante e
desumanizador do ser humano, e toda natureza.
22
No momento crítico que presenciamos, no desenvolvimento continuo do
capitalismo, e a globalização neoliberal, não há meios de que a reforma agrária sustentável
no horizonte da agroecologia seja consolidada e realizada. Para esta conquista deve haver
mudanças estruturais na sociedade com um todo. (CORTEZ, et al, 2005) discute um novo
projeto popular para a agricultura brasileira, onde a base seria revalorizar reorganizar a
agricultura camponesa de forma justa e igualitária a todos e todas.
O processo é minucioso e importante, portanto devemos que avançar, nesta
construção da valorização das sementes como patrimônio dos povos a serviço de toda a
humanidade seja ela rica ou pobre, pois o homem não se diferencia pela aparência e sim
pela sua essência.
2.2 Sementes Patrimônio dos Povos Garantia da Sustentabilidade e da
Soberania Alimentar
A produção de sementes na agroecologia é importante no resgate das culturas
camponesas tradicionais, na recuperação da biodiversidade dos agroecossistemas, sendo
respeitada por toda sociedade como um bem da humanidade a serviço de todos e todas, e
não algo privado, comercializado para gerar lucro à apenas alguns. As sementes são
patrimônio de quem as cultiva e cuida, devem ter o livre acesso a toda sociedade,
(CORTEZ, et al, 2005) afirma: “semente é vida, é a base de alimento, de multiplicação, de
sobrevivência, autonomia, liberdade, perpetuação, poder popular, independência, auto-
suficiência”. É de saber popular que as sementes fazem parte da vida, não só humana, mas
de todas as espécies vivas, são significantemente pertencentes à quem as cultiva desde os
tempos mais remotos.
Embora essas variedades tradicionais sejam consideradas parte da herança
comum da humanidade, elas têm sido submetidas, por muitas organizações
ocidentais, a processos de pirataria biológica, sem recompensar adequadamente
as comunidades rurais que cumpriram o papel de administradoras desse
patrimônio. (CARVALHO, p.161, 2003)
Na realidade esta “pirataria biológica” como traz o autor, nos dias de hoje acontece
e muito com vários tipos de espécies, e além do mais exercem esta violação contra a
natureza, pois modificam geneticamente uma espécie e a vendem por um valor inviável
que o camponês monetariamente não tem acesso.
O mesmo autor em sua obra revive o que as sementes significam: fazem parte da
herança da humanidade; “qualquer ato que pretenda limitar o uso de qualquer semente, por
23
qualquer ser humano, é muito mais que uma violência é um ato de lesa-humanidade,
portanto além de arbitrário, é inadmissível, inaceitável e irracional” (p. 256).
E para reafirmar este sério
conceito outro autor também questiona a ação do homem sobre as sementes, quais as
consequências geradas quando não é trabalhado humanizamente com nosso bem precioso
herança da humanidade:
Como os ecossistemas são complexos, auto-organizados e autorreprodutíveis,
a insustentabilidade pode ser gerada quando a intervenção humana desestrutura
esse processo de complexificação, auto-organização e autorreprodução. Nos
ambientes tropicais, como sabemos, a biodiversidade joga um papel-chave na
estabilidade e equilíbrio dos ecossistemas. Portanto, já podemos afirmar que a
homogeneização das monoculturas é um fator de simplificação e
desestabilização dos ecossistemas naturais. (SILVA, Apud CALDART, et al, p.
730, 2012).
Com o intuito de contrapor a realidade que vivenciamos do modelo do agronegócio,
desenhada forma neoliberal de comandado pela elite, a Via Campesina10
propõe o conceito
de Soberania Alimentar que define como:
“o direito dos povos de definir suas próprias políticas e estratégias sustentáveis
de produção, distribuição e consumo de alimentos que garantam o direito a
alimentação para toda a população com base na pequena e média produção,
respeitando suas próprias culturas e a diversidade de modos camponeses,
pesqueiros e indígenas de produção agropecuário, de comercialização e de gestão
dos espaços rurais, nos quais a mulher desempenha um papel fundamental. A
soberania alimentar favorece a soberania econômica, política e cultural dos
povos. Defender a soberania alimentar é reconhecer uma agricultura com
camponeses, indígenas e comunidades pesqueiras, vinculadas ao território;
prioritariamente orientada a satisfação das necessidades dos mercados locais e
nacionais.(...)” (Declaração final do Fórum Mundial de Soberania Alimentar,
assinada pela Via Campesina, Havana, Cuba/2001, citada por Campos,
2006:154/155) (CAMPOS, et al, 2007).
10
Via Campesina: articulação mundial de organizações camponesas, que reúne mais de 100 milhões de
camponeses e camponesas de quatro continentes (Ásia, América, África e Europa), no Brasil fazem parte:
MST, MPA, MMC, MAB, PJR, CPT, e FEAB.
24
CAPÍTULO III- DESAFIOS PARA A PRODUÇÃO DE SEMENTES
AGROECOLÓGICA DE HORTALIÇAS E ADUBAÇÃO VERDE NO
ASSENTAMENTO CONTESTADO
3.1 Localização e Contextualização Geográfica do Assentamento
O Assentamento Contestado está localizado na antiga Fazenda Bom Jardim,
posteriormente denominada Fazenda Santa Amélia, no município da Lapa, Paraná.
Encontra-se na porção norte do município a 15 km da sede e a 85 km de Curitiba.
O clima no município segundo a classificação climática de Koeppen, a
região possui um clima subtropical úmido, mesotérmico, com verões frescos e geadas
severas frequentes no inverno, não apresentando estação seca, com a temperatura média
entre 15 a 18º C; com umidade relativa do ar de 80 a 85%.
A principal atividade econômica do município é a agricultura. Tem um pólo
industrial próximo ao centro da cidade em pleno desenvolvimento e atividades comerciais.
No último levantamento realizado pelo IBGE em 2010 o município apresentou os
seguintes dados:
População = 44.932 habitantes
Densidade demográfica = 21,46 habitantes por km²
Zona Urbana = 27.222 habitantes
Zona Rural = 17.710 habitantes
Latitude 25‟ 46‟02 latitude sul Longitude 49‟10 longitude W Gr Altitude 908
metros acima do mar, no centro (na Gruta do Monge a altitude chega a 1.015 metros acima
do nível do mar).
Segundo dados pesquisados no documentário (Histórico do Assentamento
Contestado – ELAA), a área apresenta amplos recursos hídricos em seu interior, e é por
extenso trecho, margeada pelo Rio Iguaçu. As famílias estabeleceram avançado acordo de
preservação ambiental, fixando regras no regimento interno do Assentamento, incluindo a
proibição da caça, o que tem favorecido a reprodução da fauna silvestre, que é numerosa,
25
uma vez que encontra amplo espaço seguro de sobrevivência com farta alimentação
natural.
Os 3.190 hectares estão distribuídos da seguinte forma: 1.240 hectares é área de
reserva legal, com floresta nativa e campos nativos; 1.020 hectares distribuídos em lotes
familiares para fins agropecuários; 773 hectares de reflorestamento, com eucalipto e pinus
– esta área é de gestão coletiva das 110 famílias e 167 hectares é área imprópria à
produção.
Fonte: retirado do PDA da Lapa.
3.1.1 Histórico do Assentamento Contestado e o Projeto “Sementes Para
Todos”
O Assentamento Contestado é uma conquista decisiva diretamente para as famílias
assentadas e estrategicamente para o MST, haja vista sua localização nas proximidades da
região metropolitana de Curitiba, a conquista do assentamento é fruto do processo de
negociação política do MST a nível nacional no primeiro período do governo FHC, e com
o INCRA. Em 1995, em audiência com o Presidente da República Fernando Henrique
Cardoso, os dirigentes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, apresentam a
solicitação para a desapropriação da fazenda, então o INCRA entregou às famílias sem
26
terra que já ocupavam a área desde fevereiro, em ato de emissão de posse de sete de
dezembro de 1999.
O Assentamento é constituído por 108 famílias, iniciando no ano 2.000, sua área
total é de 3.180 hectares. As famílias estão organizadas em 10 núcleos de vizinhança com
média de 10 famílias cada. Em cada núcleo, ou agrovilas, há dois coordenadores, sendo
que um deve ser mulher, para a participação feminina, enquanto os demais membros
ocupam funções nas equipes de produção, educação, saúde, comunicação e cultura, infra-
estrutura, formação e finanças.
A cooperação ocorre de forma espontânea entre as famílias em distintas formas de
ajuda e solidariedade, e um grupo de famílias constituiu um sistema de cooperação em
condomínio denominado Dom José Gomes. Este grupo é constituído por um núcleo de
militantes que desempenham distintas atividades internas e externas segundo necessidades
do MST. A agroecologia foi assumida por um grupo expressivo de famílias, no entanto por
diversas razões houve desistências, sendo continuado pelo grupo Dom José Gomes e mais
algumas famílias articuladas no sistema da REDE ECOVIDA. Com a conquista da
construção da Cooperativa Terra Livre.
A coordenação geral e todas as equipes têm duas reuniões ordinárias por mês, e
dessa forma gestionam os interesses e as necessidades das famílias assentadas. Dentre as
108 famílias, 89 já estão praticando a agroecologia e destas famílias a grande maioria já
esta com toda a produção agroecológica, enquanto as demais estão em processo de
transição agroecológica, e outras 19 ainda praticam a agricultura convencional11
.
O projeto de produção de sementes para todos, trabalha no enfoque de implantar
processos de resgate, seleção, melhoramento e produção de sementes agroecológicas
comunitários na agricultura familiar, visando o redesenho dos sistemas produtivos através
da agrobiodiversidade, reforçando as redes sociais e sua sustentabilidade. O projeto é
desenvolvido pela AOPA em cooperação a FKM, foi iniciado o projeto com
aproximadamente 10 famílias, onde se estabeleceu uma unidade familiar o campo do
experimento, mas no decorrer das atividades que necessitava a serem feitas, as demais
famílias não conseguiram acompanhar o campo de experimento, finalizando assim o
11
Dados coletados a campo.
27
grupo, mas não a produção, pois nos dias atuais as famílias estão produzindo em suas
unidades a própria produção, com um acompanhamento técnico.
Essas famílias desenvolvem a produção de hortaliças, e através do programa da
Companhia Nacional de Abastecimento – CONAB abastecem instituições beneficentes e
filantrópicas com sua produção ecológica, nos municípios da Lapa, Balsa Nova e Campo
Largo, além do PAA (Programa de Aquisição de Alimentos).
3.2 Um Olhar para a Produção de Sementes Agroecológicas no Assentamento
Contestado – vantagens , limites e desafios
O Movimento em seus objetivos traz claramente que luta a favor da construção de
uma sociedade, onde não haja explorados nem exploradores, a terra assim como todas as
riquezas é um bem comum e deve estar disponível a todos e todas com distribuição
igualitária, e um dos caminhos é a Reforma Agrária. Está afirmado que também é um dos
objetivos garantir que a produção da agropecuária esteja voltada para a soberania
alimentar, a eliminação da fome e ao desenvolvimento econômico e social dos
trabalhadores.
O movimento trás pra nós também isso, de resgatar nossas sementes. (Entrevista
nº3).
Nestas palavras identificamos a causa da luta do movimento pela recuperação e
resgate das sementes crioulas, nativas, da troca de sementes, que nossos antepassados
(pais, avôs, bisavôs) cultivavam, assim como as famílias do Contestado mesmo afirma que
o camponês sempre produziu semente, desde os tempos de crianças aprendendo com os
pais, faziam a escolha das melhores para serem cultivadas no ano seguinte, muitas também
produzem pouco, mas já é um sinal que há produção na unidade.
“Na verdade a produção de semente o camponês sempre faz, mesmo sem
perceber, se voltar aos tempos de criança, de ver o que nossos pais fazia
plantava, tirava um pouco pra semente e era sempre a melhor, isso é uma coisa
antiga que meus pais fazia, mesmo sem orientação”. (Entrevista nº 3).
Identifica se que a produção das sementes tem relação com os aprendizados da
infância dos camponeses sendo um costume ou um habito cultural adquirido durante a
28
existência dos mesmos. Na infância aprendeu se cuidar, cultivar e melhorar a produção de
semente, isso se manifesta nos conhecimentos que as famílias do assentamento possuem.
Nós fazia as troca desde infância acompanhava a experiência da mae desde novo
me preocupei com o cuidado das sementes, porque hoje as sementes compradas
não se sabe o que tá comprando. (entrevista nº 1)
Com a produção de sementes produzidas pelo próprio camponês adquire se no meio
social em que as famílias convivem certa autonomia na produção de sementes mais
saudável, pois as mesmas passam a não depender totalmente do mercado externo e das
sementes das transnacionais.
Meu conhecimento já passa de vinte anos, a importância das sementes é que a
gente não precisa ir comprar das multinacionais. A semente que você ta
plantando a dez, vinte anos não perde a fecundidade e as compradas do mercado
não dá para produzir nem dois anos, já nascem mortas. (entrevista nº 9).
Ainda para as famílias que produzem de forma agroecológica no assentamento,
suas opiniões é que produzindo suas próprias sementes, as sementes tornam se fonte de
renda familiar agregando valor a própria semente e ao produto final.
A produção de sementes da autonomia, porque alguns tipos de sementes se a
gente não produzi não se encontrar no mercado, periga de nós acaba perdendo, a
gente esta vendo cada vez mais uma perda de variedade antiga porque
comercialmente não é importante, que nem o amendoim, a mandioca, porque a
tendência é ir padronizando. E da adubação verde se for pensar só em comprar se
tona muito caro, é só se organizar. (Entrevista nº 4).
Os camponeses tem como proposito produzir diversidade de alimento para o
campo e a cidade, isso é realizado através da comercialização da sua produção e também
de garantir as sementes para o campo, já que é um grande obstáculo que as famílias
encontram no dia a dia. O assentamento em sua trajetória sempre se preocupou com o
cuidado a terra entendendo a importância de preservar a biodiversidade e tem uma melhor
relação com a natureza e seu agroecossistema, avançando da produção convencional para a
produção agroecológica.
Sempre fui apaixonado pela natureza, nós trabalhando para os outros não dava
para plantar o que a gente queria o MST é que nem um pé de fruta ver que a
diferença do que a gente planta e o que temos convencional. A natureza é nossa,
se nós morrermos com 60 anos e os novos com 30 de tantas porcarias que come
quem esta na cidade não tem como escapar. Nós temos o prazer de comer nossos
próprios produtos. (Entrevista nº2).
Outro valor presente para as famílias na importância da produção de sementes de
hortaliças e adubação verde é a efetiva preocupação do cuidado com a vida e a
29
disponibilidade de poder praticar experiências em diferentes épocas de plantio durante o
ano. Tendo em vista as especificidades produtivas das sementes, ou seja, temos variedades
que se desenvolvem em períodos de frio (inverno) e variedades que desenvolvem no verão.
Precisamos ter aprimoramento em conhecer a terra, o clima, desinfestação da
terra com a adubação verde, ter mais conhecimento técnico, e produzir as
próprias mudas. A falta de técnica, falta de profissionalismo, perdi a qualidade
precisa também ter estrutura montada. (Entrevista 5).
Para garantir a produção das sementes no inicio as famílias trabalhavam em uma
única Unidade de Produção coletiva. Houve varias tentativas em realizar a produção em
grupo principalmente com outro projeto de iniciativa com a BIONATUR e as ASPTA, o
qual não resultou em uma satisfatória implantação pelo fato de haver uma preocupação
exagerada somente com a comercialização, deixando de lado a preocupação em garantir
trocas de sementes de dentro do assentamento. As famílias então decidem envolver se em
um novo projeto da AOPA.
Antes do projeto da AOPA se fazia como se sabia, sem muita informação, sem
técnicas para melhorar a produção, os cuidados que se tem que ter com cada
cultivo, agora melhorou, os detalhes para aumentar a qualidade, a produção para
o assentamento e para os outros grupos da REDE ECOVIDA.(Entrevista nº4).
Nós participamos em 2004 do 2º Encontro Estadual da BIONATUR, foi
discutido que era preciso regionalizar a produção, para não precisar que as
sementes viagem. No 4º encontro discutiu se a mesma coisa, e não foi
conseguido resolve, deve se considerar os fatores climáticos, nos plantios não
tivemos resultados apropriados.O que da pra entender é a BIONATUR se
enrolou ela entrou na lógica do mercado. (entrevista nº 3).
Nos dias atuais as famílias, portanto produzem individualmente em seu
agroecossistema, através da organização do assentamento com o projeto Sementes Para
Todos. Levou se em conta o conhecimento dos camponeses para a implantação e o
fortalecimento da produção de sementes agroecológicas para o sustento familiar, a garantia
da soberania alimentar, a biodiversidade e diversidade além do camponês obter o controle
das sementes.
Para as famílias que estão envolvidas no sistema convencional, mas que produzem
partes das sementes orgânicas, também consideram a importância de estimular a produção
de sementes agroecológicas, pois essa está ligada à busca pela qualidade das sementes, dos
alimentos, visando a rentabilidade econômica. No entanto, as famílias colocam que o
tempo para se adquirirem as sementes é muito demorado, geralmente elas se preocupam
30
em garantir a produção de alimentos e não da própria semente, por ter a necessidade de
para produzir a semente demanda de um ciclo maior da planta, e para o alimento
geralmente o ciclo é mais curto.
A produção das famílias que produzem convencional sempre foi individual, para
que possam se envolver na produção agroecológica consideram os seguintes elementos:
Para produzir a muda tem que ter recurso, precisa reativar o recurso que já se
teve no assentamento e reativar o viveiro, ter mais famílias envolvidas para
garantir a mão de obra necessária. Nós camponeses não temos recurso para
comprar tudo, temos que produzir para o sustento e o que sobra para o comércio,
nem que seja um pouquinho para cada coisa. Os camponeses são os que menos
tem que depender do mercado, ai tem uns que pega a terra e não planta nem pra
comer muito menos para vender, a terra é bom para nós. (Entrevista nº 6).
No aspecto de manejo as famílias desse sistema interpretam que para produzir
orgânico em pequena quantidade é viável mais em escala os insumos torna o plantio
inviável. Os fatores climáticos também interferem na produtividade, fazendo com que as
famílias migram de sistemas de acordo com a rentabilidade econômica.
Orgânico dá só que tem que preparar o solo eu já plantei e já deu milho tudo é
preparo do solo, solo adequado e ter as camadas certas . Utilizar arradão não é
bom estraga o solo. O produto orgânico é para o consumo, para venda em grande
quantidade não dá. (Entrevista nº 6).
Eu tinha horta orgânica mais mudei para o morango convencional só que se ele
não der resultado eu vou voltar para horta, porque para produzir o morango e o
milho convencional no final a produção não gera lucro e sim gastos. Eu tenho
grande interesse em ter todo lote orgânico. (Entrevista nº 7).
As famílias que estão envolvidas no sistema convencional efetivam a troca de
sementes entre si, tanto da própria semente, quanto aquelas sementes adquiridas dos
alimentos. Compreendendo a semente como parte da organização da autonomia, vista
também pelas famílias que produzem orgânicos como patrimônio do assentamento.
Nesse sentido, as famílias agroecológicas produzem diversas variedades de
sementes, sobretudo de hortaliças, uma pequena quantidade de adubação verde, e
quantidade significativa de sementes de grãos. As sementes não são comercializadas, são
utilizadas para o próprio plantio e replantio das safras, e também são estimuladas e
organizadas trocas e doações de sementes, sendo essa uma prática cultural enraizada nas
famílias.
Nas feiras de sementes foi trocado mucuna, ervilhaca, mandioca, sempre que
tiver oportunidades. (Entrevista nº5).
31
O olhar que as famílias agroecológicas e convencionais têm em relação às
vantagens da produção de sementes de hortaliças e adubação verde, se expressa na
importância de se resgatar as sementes compreendendo que ela é o futuro da humanidade.
Tendo o controle das sementes os camponeses garantem a soberania alimentar e a
diversidade da semente e do alimento, além de produzir cultura e diversidade. Com a
produção de sementes os camponeses tem possibilidade de unificar sua unidade de
produção. Tendo como objetivo principal suprir sua necessidade imediata e o excedente
comercializar, além de realizar a troca com as famílias envolvidas ou não no projeto.
Com a iniciativa do projeto avançou a relação entre o técnico e o camponês, as
famílias passaram a serem informadas e capacitadas nas técnicas produtivas, em relação ao
manejo e a preservação das sementes. E ainda existe uma possibilidade relatada pelos
camponeses de que o assentamento se torne uma unidade de beneficiamento de semente.
O projeto oferece ainda para os camponeses a busca de novos conhecimentos,
entendendo a necessidade de aprimorar os saberes conjuntamente com a equipe técnica
envolvida.
A produção de sementes chama a atenção das famílias pelo fato de propiciar renda
econômica, para garantia do sustento familiar, já que ela é bastante valorizada no mercado.
Outro fator positivo na produção foi o interesse despertado em vizinhos que não participam
do projeto, mas que no contato hoje produzem também sementes.
O projeto por, tanto trouxe presente o desejo de produzir, os camponeses
passaram a perceber que produzir orgânico dá certo, ele traz nossa fonte de
renda.... temos semente de alho, amendoim e sementes em forma muda,
trocamos sementes temos diversidade na horta, temos sementes até de londrina,
variedade de cará , alçafrão, gengibre, e também tem bastante frutíferas que
estamos reproduzindo, estamos tentando acriola, sempre a categoria F1.
(Entrevista nº3).
Embora o projeto envolva grande parte das famílias, as mesmas possuem muitos
limites em produzir sementes, que precisam serem superados, em relação a influência de
fatores climáticos, da região a exemplo, umidade relativa do ar, fortes ventos, pouca
incidência de luz, que representam uma perca na produtividade, além disso existe também
limites em relação a condição do solo, no assentamento predominas se solo arenoso, com
baixo teor de matéria orgânica, e o solo deteriorizado pelo influente uso intensivo de
maquinários e equipamentos inapropriados a pequena produção.
32
A produção ainda é bastante dependente de insumos externos, pelas famílias não
aproveitarem os recursos naturais existentes dentro do agroecossistema, como exemplo, o
esterco de animais, sendo, portanto dependentes da aquisição de insumos. Outro fator
limitante das famílias manejarem a produção é a pouca força de trabalho existente nas
famílias para conduzirem os seus agroecossistemas, entendendo que para plantar e produzir
sementes, a mesma demanda de maior cuidado.
No inicio da implantação do projeto, a produção era organizada em apenas uma
área de unidade produtiva a qual sérvio de experimento, desta iniciativa. Com a
impossibilidade das famílias não conseguirem se deslocar ao local, foi criado a forma atual
de implantação de semente, o qual individualizou o projeto.
Em relação aos desafios que as famílias encontram em produzir suas próprias
sementes, é de reunir o coletivo para planejar o desenvolvimento das atividades. Tem-se
também como desafio construir um viveiro individual ou coletivo, que supra a necessidade
e a demanda das famílias envolvidas ou não no projeto.
De acordo ainda com as famílias, é preciso garantir a comercialização coletiva e
não parcial das sementes produzidas no assentamento, pois tem se iniciativa isolada, que
não é suficiente para atender além, das famílias do assentamento, as comunidades
camponesas.
É um projeto lento de produzir sementes, mas é audacioso. A semente é da gente
e se quiser comer, doar, isso é ter autonomia. Temos como objetivo sermos
produtores de sementes e também militantes e mais, participar da igreja. O
desafio é à força de trabalho, e também precisamos retomar a produção de milho,
porque no mercado não se acha mais semente agroecológica. (Entrevista nº 3).
Para as famílias é importante garantir além da produção de sementes de hortaliças e
adubação verde, a produção de grãos. As sementes de grãos foram sendo habitualmente
perdidas, em virtude das consequências do sistema convencional de produção. Destaca se
também a dificuldade das famílias em implementar a produção de adubação verde nos
seus agroecossistemas, havendo pouco interesse em obter essa semente.
Percebe se, portanto a efetiva contribuição da produção de sementes de hortaliças e
adubação verde para os camponeses, e também para o campesinato. Mesma tendo em
vista, que este projeto é de caráter inicial, as famílias estão compreendendo cada vez mais
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a extrema importância de o camponês consolidar sua autonomia econômica, politica e
social, pois na agroecologia devemos considerar que todos estes fatores são essenciais
para a implantação e fortalecimento da agricultura agroecológica.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com a realidade que o campesinato vem enfrentando na área da produção de
sementes é cada vez mais delicado esta situação, por isso, enquanto tecnólogos em
Agroecologia o nosso compromisso junto aos movimentos sociais, está na contribuição às
bases, com os assentados, com as comunidades, a fim de proporcionar a todos camponeses
e camponesas que cultivem seus saberes, suas crenças, fazendo com que o resgate e a
cultura camponesa tenham sua chama sempre acessa, forte e que nunca se apague, pois só
assim é que teremos a soberania alimentar à nossa nação.
Durante a realização deste trabalho, identifiquei alguns elementos em torno da produção de
sementes que considero de fundamental relevância para auxiliar nos debates e práticas dos
camponeses em especial do Assentamento Contestado, o qual contribui nesta pesquisa.
Primeiramente percebe se que as famílias entram no projeto pelo fator econômico, e pela
possibilidade de garantir a renda familiar dos assentados. Com o envolvimento e a
participação das mesmas na organização do projeto as famílias despertam se para a
importância da produção de sementes no assentamento e também para a agricultura
camponesa. Elas entendem que a produção de sementes envolve a garantia da autonomia
camponesa e da soberania alimentar.
Passa se então introduzir nas famílias uma nova concepção de vida que não diz respeito
apenas ao aspecto econômico, envolve diversas relações, sejam elas de fator meramente
econômico até os aspectos mais políticos e sociais que movimenta a relação cultural das
famílias do assentamento contestado.
Percebi certa presença de pertença ao movimento o qual os camponeses estão organizados,
tendo como referencia os princípios e valores que norteiam seu movimento social em torno
do debate da produção Agroecologia, ganhando a cada dia mais força, no sentido de criar
caminhos para a sustentabilidade econômica, política, cultural e social.
No dialogo com as famílias identifiquei que elas visualizam de forma confusa as sementes,
elas manifestaram suas opiniões, mas no sentido da produção de sementes como alimento,
do que a semente como garantia do patrimônio cultural dos povos. Isso acontece pelo fator
de as famílias estarem envolvidas na entrega da sua produção de alimentos para programas
governamentais.
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Existe no pensamento das famílias que a produção orgânica e a produção agroecológica
são tratadas da mesma maneira, não sabendo distinguir com clareza a diferença que
existem entre os diferentes sistemas de produção, tratados nesse trabalho.
Enquanto tecnólogo em agroecologia, entendo, que a diferença entre um sistema e outro se
define na seguinte questão: onde o orgânico é a substituição de insumos químicos por
insumos orgânicos, além de não complementar toda a produção sem venenos de todo o
agroecossistema, ou seja, apenas uma parte do agroecossistema não é utilizado produtos
químicos. E na produção agroecológica é mais dinâmica por entender que um
agroecossistema agroecológico é um conjunto de relações onde tudo está interligado na
garantia da sustentabilidade familiar, na diversidade de espécies, e na construção da
soberania alimentar.
Desenvolver pesquisas e tecnologias agroecológicas adequadas aos agroecossistemas, que
promovam a sustentabilidade cultural, social, econômica e ambiental, além da elevação da
produtividade do trabalho e da terra, são tecnologias adequadas às realidades vividas,
preservação sempre a natureza e todo seu conjunto natural em equilíbrio.
Observei que os desafios que as famílias possuem em produzir suas sementes,
estão sendo superados, primeiramente para resgatar suas culturas, terem a liberdade e
autonomia em plantar seus produtos, ou seja, tem vasta importância no aspecto cultural,
social e econômico, pois assim as famílias também garante sua renda quando passam a
produzir suas próprias sementes não dependendo das empresas para obter as sementes e
mudas, tornando assim a sua produção e seu agroecossistema sustentável.
É a partir de iniciativas, dos movimentos sociais que existe a preocupação da
segurança da vida, da soberania alimentar, gerando assim, um meio onde possa causar nos
demais, a pertença a este compromisso da classe trabalhadora social em garantir a geração
e continuidade da vida na terra. As sementes são o início da vida, se inicia com elas o
processo da vida e da germinação. Produzir sementes é produzir soberania alimentar.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Agricultoras, Povos e Comunidades Tradicionais
ANEXOS
ANEXO 1 – Entrevista semiestruturada com o grupo gestor projeto AOPA do
Assentamento Contestado – Grupo 1:
1. O que a família pensa em relação à produção própria de semente de hortaliças e
adubação verde agroecológicas?
2. Como ocorre a organização de produção agroecológica dentro do Assentamento
Contestado? O trabalho é coletivo ou individual?
3. Trabalham com quantos tipos de sementes? Conseguem ser independentes em
alguma delas?
4. Fazem troca de sementes? Por quê? E como acontece?
5. Em relação ao projeto de produção de sementes até hoje o que a família avalia de:
a) Avanços;
b) Dificuldades;
c) Desafios para melhorar adiante.
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ANEXO 2 – Entrevista semiestruturada com famílias de produção agroecológicas
não envolvidas no projeto – Grupo 2:
1. O que a família pensa em relação à produção própria de semente de hortaliças e
adubação verde agroecológicas?
2. Como ocorre a organização de produção agroecológica dentro do Assentamento
Contestado? O trabalho é coletivo ou individual?
3. Trabalham com quantos tipos de sementes? Conseguem ser independentes em
alguma delas?
4. Fazem troca de sementes? Por quê? E como acontece?
5. Quais são os desafios para serem superados? E como podemos melhorar a produção
de sementes agroecológicas?
ANEXO 3 – Entrevista semiestruturada com as famílias do Assentamento Contestado que
produzem convencionalmente – Grupo 3:
1. O que a família pensa em relação à produção própria de semente de hortaliças e
adubação verde agroecológicas?
2. Como ocorre a organização de produção agroecológica dentro do Assentamento
Contestado? O trabalho é coletivo ou individual?
3. Trabalham com quantos tipos de sementes? Conseguem ser independentes em
alguma delas?
4. Fazem troca de sementes? Por quê? E como acontece?
5. Quais as dificuldades que a família encontra para não produzir agroecológico?