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Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ensino de Ciências LABORATÓRIO DE CIÊNCIAS: UM ESPAÇO DE DESCOBERTAS UM OLHAR SOBRE A EXPERIÊNCIA DO COLÉGIO PEDRO II NA IMPLANTAÇÃO DA PROPOSTA CURRICULAR PARA O ENSINO DE CIÊNCIAS NAS SÉRIES INICIAIS MÍRIAM MOREIRA DUQUE Orientador: Prof ª. Drª. Flávia Monteiro de Barros Araújo. NILÓPOLIS 2010

Dissertação míriam moreira duque

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Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ensino de Ciências

LABORATÓRIO DE CIÊNCIAS: UM ESPAÇO DE DESCOBERTAS UM OLHAR SOBRE A EXPERIÊNCIA DO COLÉGIO PEDRO II

NA IMPLANTAÇÃO DA PROPOSTA CURRICULAR PARA O ENSINO DE CIÊNCIAS NAS SÉRIES INICIAIS

MÍRIAM MOREIRA DUQUE

Orientador: Profª. Drª. Flávia Monteiro de Barros Araújo.

NILÓPOLIS 2010

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Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ensino de Ciências

LABORATÓRIO DE CIÊNCIAS: UM ESPAÇO DE DESCOBERTAS UM OLHAR SOBRE A EXPERIÊNCIA DO COLÉGIO PEDRO II

NA IMPLANTAÇÃO DA PROPOSTA CURRICULAR PARA O ENSINO DE CIÊNCIAS NAS SÉRIES INICIAIS

MÍRIAM MOREIRA DUQUE Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ensino de Ciências do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Ensino de Ciências.

Orientador: Profª. Drª. Flávia Monteiro de Barros Araujo

NILÓPOLIS 2010

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Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ensino de Ciências

LABORATÓRIO DE CIÊNCIAS: UM ESPAÇO DE DESCOBERTAS UM OLHAR SOBRE A EXPERIÊNCIA DO COLÉGIO PEDRO II

NA IMPLANTAÇÃO DA PROPOSTA CURRICULAR PARA O ENSINO DE CIÊNCIAS NAS SÉRIES INICIAIS

MÍRIAM MOREIRA DUQUE

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ensino de Ciências do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Ensino de Ciências.

Aprovada em ____ de ________ de 20__

Banca Examinadora

____________________________________ Profª. Drª Flávia Monteiro de Barros Araujo

Presidente da Banca Universidade Federal Fluminense

____________________________________ Profª Drª Maylta Brandão dos Anjos – Membro interno

Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro

____________________________________ Profª Phd. Edil Vasconcellos de Paiva – Membro externo

Universidade do Estado do Rio de Janeiro

NILÓPOLIS 2010

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Agradecimento

Agradeço...

A intercessão de Maria Santíssima junto a Deus, que guiou meu caminho nesta jornada e

me concedeu a virtude da perseverança para consolidar esta etapa da minha vida.

A minha querida orientadora, que confiou na minha capacidade de aprendizagem e,

pacientemente, me ensinou a amadurecer a escrita, o discurso e a prática de uma

pesquisadora.

Às representantes do Laboratório de Currículos, que colaboraram para o desenvolvimento

desta pesquisa e que foram extremamente atenciosas.

Às professoras do Colégio Pedro II, que me receberam e aceitaram o desafio de integrar

esta pesquisa, colaborando com informações e permitindo a produção do documentário

com o relato da experiência vivida.

A toda a minha família, em especial a minha mãe e aos meus filhos, pelo apoio irrestrito,

preocupação e interesse, além da compreensão pelas minhas ausências.

Ao meu marido, que sempre incentivou meu crescimento acadêmico, profissional e

pessoal, sendo capaz de compreender meus momentos de ausência como esposa e minhas

inquietações, contribuindo imensamente para esta conquista.

Aos amigos do IFRJ, companheiros de todo momento, que dividiram experiências e

compartilharam reflexões sobre esta pesquisa.

À Anna Rosaura, pela determinação, competência técnica e paixão com que desenvolveu o

projeto do documentário produzido neste trabalho.

Finalmente, às amigas da “Chama”, que indiretamente contribuíram para manter em mim a

força para conclusão deste projeto e, em especial, à Vânia Dutra pela colaboração direta na

revisão do trabalho.

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A principal meta da educação é criar homens que sejam

capazes de fazer coisas novas, não simplesmente repetir

o que outras gerações já fizeram. Homens que sejam

criadores, inventores, descobridores. A segunda meta da

educação é formar mentes que estejam em condições de

criticar, verificar e não aceitar tudo que a elas se propõe.

Jean Piaget

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RESUMO

A disciplina de Ciências na Unidade São Cristóvão I, do Colégio Pedro II, apresenta, nos últimos anos, um bom índice de aprovação escolar. De acordo com as estatísticas da escola, um número reduzido de alunos é retido nesse componente, apontado pelos discentes como um dos mais motivadores. Essa realidade difere daquela tradicionalmente encontrada em muitas escolas de primeiro segmento, onde o ensino de ciências é considerado enfadonho, teórico, expositivo, pouco enfatizado em relação às outras áreas do conhecimento. Contrariando a perspectiva tradicional, a proposta curricular construída na instituição para a área de Ciências nos anos de 1980, do 1º ao 5º ano do ensino fundamental, teve como eixo principal a atividade prática. Para desenvolver as atividades práticas, foi criado, pelo corpo docente, o Laboratório de Ciências (LC). A peculiaridade do trabalho pedagógico realizado, sobretudo, no espaço do laboratório, despertou o interesse pela realização desta pesquisa. O trabalho investigativo recuperou o processo de implantação da proposta curricular nos anos de 1980. O resgate e análise daquela experiência contribuíram para a compreensão dos processos de construção do saber docente, enfatizando a importância da formação continuada para a implantação de novas metodologias no ensino de ciências. No campo da formação continuada, o trabalho pode sugerir, para a comunidade educacional, um processo bastante viável de ser implementado, principalmente por não demandar investimentos extraordinários. Já para o campo do ensino de Ciências, especialmente por tratar-se de experiência nas séries iniciais, em que a ocorrência de atividades práticas na área não constitui atividade usual, este estudo pode apontar sugestões de encaminhamentos metodológicos significativos para a prática docente. Palavras-chave: Atividades Práticas; Ensino de Ciências; Formação Continuada.

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ABSTRACT

The discipline of Sciences in the campus of São Cristóvão I, Pedro II school, has, in the last years, presented a good approval rating. According to the statistics of the school, a small number of students is retained in this component, appointed, by the students, as one of the most motivating. This situation differs from the one that is traditionally found in many schools of the first segment, where the science education is considered boring, theoretical, expositive, rather emphatic in comparison to other areas of knowledge. Contrary to the traditional view, the proposed curriculum built on the institution to the area of science in the 1980s, from 1st to 5th year of elementary school, had the center line on practical activity. To develop practical activities, was created by the teachers the Sciences Laboratory (SL). The peculiarity of the pedagogical work performed, mainly, in the laboratory, awakened interest in conducting research. The investigative work rescued the implementation process of the proposed curriculum in the 1980s. The recovery and analysis of this experience contributed to the understanding of the processes of teaching knowledge, emphasizing the importance of the continuing education for the implementation of new methodologies in science education. In the field of continuing education, the work may suggest to the educational community a quite viable process to be implemented, mainly because it does not require extraordinary investments. On the other hand, for the field of science teaching, especially because it is developed with the initial grades, where the occurrence of practical activities in the science area is not a usual activity, this study may point out some suggestions to improve the methodological orientation to the teaching practice. Keywords: Continuing Education; Practical Activities; Science education

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LISTA DE SIGLAS

AC Alfabetização Científica

CPDOC Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil

da Fundação Getúlio Vargas

CPII Colégio Pedro II

CTS Ciência Tecnologia e Sociedade

DGP Diretoria de Gestão de Pessoal

EF Ensino Fundamental

LC Laboratório de Ciências

LC Letramento Científico

LC/SEE Laboratório de Currículo da Secretaria de Educação do Estado do Rio de

Janeiro

OCDE Organization for Economic Cooperation and Development

PAP Programa de Assessoria Pedagógica

PCN Parâmetros Curriculares Nacionais

PGE Plano Geral de Ensino

PISA Programme for International Student Assessment

PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

RA Região Administrativa

ROSE The Relevance of Science Education

SAAC Setor de Atividades Artísticas e Culturais

TIMSS Third International Mathematics and Science Study

UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura.

UNICEF Fundo das Nações Unidas para a Infância

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Formação acadêmica e experiência profissional das entrevistadas .................. 34 Tabela 2 – Unidades didáticas – Ciências ........................................................................ 83 Tabela 3 – Unidades didáticas – Ciências ........................................................................ 86 Tabela 4 – Unidades didáticas –Ciências ......................................................................... 87 Tabela 5 – Plano de unidades didáticas – 1o segmento do EF. .......................................... 95 Tabela 6 – Formação Docente ....................................................................................... 104 Tabela 7 – Formação Continuada : Assessoria ............................................................... 106 Tabela 8 – Formação Continuada: planejamento coletivo .............................................. 107 Tabela 9 – Formação Continuada: reflexão sobre a prática............................................. 107 Tabela 10 – Objetivos do ensino de Ciências ................................................................. 113 Tabela 11 – Concepção do Ensino de Ciências .............................................................. 114 Tabela 12 – Laboratório de Ciências.............................................................................. 116 Tabela 13 – Construção coletiva do trabalho.................................................................. 120

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 12

CAPÍTULO 1 – O PERCURSO DA PESQUISA ........................................................... 19

1.1 Da caracterização da instituição: por que o Colégio Pedro II?......................................23

1.2 Breve histórico do Colégio Pedro II...............................................................................25

1.3 A Unidade São Cristóvão I.............................................................................................28

1.4 Os sujeitos da pesquisa...................................................................................................31

1.5 A trajetória da investigação............................................................................................35

CAPÍTULO 2 – BREVE TRAJETÓRIA DO ENSINO DE CIÊNCIAS NO BRASIL .... 41

CAPÍTULO 3 – ATIVIDADES PRÁTICAS NO ENSINO DE CIÊNCIAS.................... 50

3.1 Ciência, Tecnologia e Educação Científica....................................................................50

3.2 Educação Científica........................................................................................................52

3.3 Atividade Prática............................................................................................................59

CAPÍTULO 4 – FORMAÇÃO CONTINUADA COMO ESPAÇO DE CONSTRUÇÃO

DE SABERES................................................................................................................. 66

CAPÍTULO 5 - DOS PLANOS GERAIS DE ENSINO PRODUZIDOS NOS ANOS DE

1980: construções e reconstruções ................................................................................... 80

5.1 O ensino de Ciências no primeiro Plano Geral de Ensino ........................................... 80

5.2 O PGE de 1985.......................................................................................................... 84

5.3 O PGE de 1986.......................................................................................................... 88

5.4. O PGE de 1988......................................................................................................... 98

CAPÍTULO 6 – O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DO CURRÍCULO DE

CIÊNCIAS..........................................................................................................................103

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CAPÍTULO 7- APRESENTAÇÃO DO PRODUTO FINAL...........................................123

CONSIDERAÇÕES FINAIS: ..................................................................................... 127

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................... 133

Anexo I – ROTEIRO DE ENTREVISTA - DOCENTES .............................................. 140

Anexo II – ROTEIRO DE ENTREVISTA - ASSESSORES ......................................... 141

Anexo III – ROTEIRO DE ENTREVISTA - CHEFE DE DEPARTAMENTO............ 142

Anexo IV – CESSÃO DE DIREITOS SOBRE DEPOIMENTO ORAL ........................ 144

Anexo V – AUTORIZAÇÃO DE USO DE IMAGEM, VOZ e TEXTO........................ 145

Anexo VI – AUTORIZAÇÃO DE USO DE IMAGEM, VOZ e TEXTO DE MENOR.. 146

Anexo VII – BILHETE AOS PAIS DOS ALUNOS QUE PARTICIPARAM DA

PESQUISA ................................................................................................................... 147

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INTRODUÇÃO

A área de Ciências, no primeiro segmento do Ensino Fundamental do Colégio

Pedro II, apresenta, nos últimos anos, um bom índice de desempenho escolar por parte dos

alunos, se comparado com as demais disciplinas ministradas nessa etapa escolar. As

estatísticas da escola evidenciam que poucos alunos são retidos nesse componente

curricular, considerado pelos alunos um dos mais motivadores.

Tal realidade difere daquela tradicionalmente encontrada em muitas escolas

públicas, onde o ensino de ciências, no primeiro segmento, é considerado teórico,

expositivo, pouco valorizado em relação às outras áreas do conhecimento e, muitas vezes,

ministrado como apêndice curricular obrigatório, principalmente nas séries iniciais.

Contrariando essa perspectiva, a proposta curricular desenvolvida na instituição,

construída nos anos de 1980 e ressignificada ao longo das décadas posteriores, buscou

valorizar a área, enfatizando a sua importância na formação humana, principalmente no

que diz respeito à sua contribuição para o desenvolvimento do espírito investigativo dos

alunos. Para tanto, o programa proposto para a área de Ciências, do 1º ao 5º ano do

fundamental, teve como fundamento uma nova concepção de ensino de Ciências e como

eixo principal, o desenvolvimento de atividades práticas.

A elaboração dos programas de atividades práticas para o ensino de Ciências está

relacionada ao processo de implantação do primeiro segmento da Educação Fundamental

no Colégio Pedro II, nos anos de 1980, instituição que, à época da criação da Unidade I

(Pedrinho), já contava com cento e quarenta e sete anos de existência. Para a instituição,

que possuía uma grande experiência no segundo segmento do ensino fundamental e médio,

mergulhar em um projeto para atender a uma clientela com faixa etária e especificidades

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tão diferentes, mais que um desafio, demandou boa vontade política, determinação e

investimento em “capital humano”.

Para além da demanda da organização curricular e administrativa do novo

segmento escolar, a criação dos Pedrinhos constituiu-se no primeiro e único espaço de

acesso democrático ao Colégio Pedro II, que, até então, tinha, como única forma de

ingresso, a prova de seleção – processo este que, na maior parte das vezes, viabiliza o

acesso à camada de alunos que frequentou cursinhos preparatórios1.

A criação dos Pedrinhos operou uma transformação na estrutura quase que

sesquicentenária da instituição. Para implantar o primeiro segmento, foram selecionados,

através de concurso público, novos professores. Esse grupo era composto por docentes

formados obrigatoriamente no Curso Normal, mas com trajetórias acadêmicas

diversificadas, o que tornava a equipe multidisciplinar quanto ao curso de graduação. O

ingresso do novo grupo foi cercado de expectativas e exigências.

Para elaborar a proposta pedagógica do primeiro segmento do Ensino Fundamental,

a equipe de docentes contou com a assessoria do Laboratório de Currículos2, que

desenvolveu o denominado Programa de Assessoria Pedagógica. Além de oferecer cursos

em que eram discutidas teorias da aprendizagem, de autores sócio-interacionistas, o

programa previa o acompanhamento da implantação do novo currículo por cerca dois anos

e meio. Nos cursos, divididos em módulos, era debatida a fundamentação teórica. Nos

encontros, realizados quinzenalmente com as assessoras, eram examinadas e discutidas as

atividades elaboradas pelos docentes para a sala de aula. A assessoria enfatizava a

1 A frase célebre do diretor geral do Colégio à época destaca o quanto a criação dos Pedrinhos contribuiu para a democratização do acesso à instituição. Em discurso oficial, o gestor da instituição afirmou, referindo-se à democratização do acesso, que “os alunos do Colégio Pedro II amorenaram”. 2 O Laboratório de Currículos constituía um órgão da Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro, especialmente criado para orientar ações no campo da educação do novo Estado do Rio de Janeiro, surgido com a fusão dos antigos Estados da Guanabara e do Rio de Janeiro, no Governo Faria Lima (1975-1979).

Page 14: Dissertação míriam moreira duque

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importância da implementação de um ensino ativo na instituição, destacando que os

professores deveriam aprender a não dar repostas prontas e, sim, a fomentar a participação

dos alunos. O trabalho encerrava dificuldades para os docentes, que eram levados a

estudar, a refletir e a questionar práticas e modelos apreendidos em seus cursos de

formação.

No âmbito da implantação da referida proposta curricular, foi criado, pelo corpo

docente, o Laboratório de Ciências (LC), espaço destinado ao desenvolvimento das

atividades práticas. A peculiaridade do trabalho pedagógico realizado, sobretudo, no

espaço do laboratório, despertou alguns questionamentos acerca dos caminhos adotados

pelo ensino de ciências no primeiro segmento do Colégio Pedro II. Como foram definidas

as diretrizes para o ensino de Ciências no primeiro segmento? Que objetivos estavam

delineados para o ensino de Ciências nas séries iniciais durante o período estudado? Houve

preocupação com a inserção de atividades práticas desde o início? Que concepção de

ensino de Ciências está inserida na proposta pedagógica da instituição? Como os

professores se viram no processo de elaboração da proposta? Que espaço foi reservado à

contribuição do docente na elaboração curricular, numa instituição reconhecidamente

tradicional? Qual a contribuição do programa de formação continuada para a consolidação

de novas práticas pedagógicas na instituição?

Essas indagações despertaram o interesse pela compreensão dos fatores que

colaboraram para a implantação e a consolidação da proposta de ensino de Ciências

evidenciada pelos bons resultados apresentados pela área. O foco dirigiu-se para o

processo de implantação da proposta curricular para o Ensino de Ciências, construída pelos

docentes do primeiro segmento do Ensino Fundamental (EF) da Unidade São Cristóvão I,

do Colégio Pedro II do Rio de Janeiro (CP II), nos anos de 1980. A escolha da unidade

escolar de São Cristóvão decorre do fato desta ter sido a primeira a implantar o primeiro

Page 15: Dissertação míriam moreira duque

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segmento na instituição, cabendo à sua equipe de docentes a formulação do Projeto

Político Pedagógico (PPP) do primeiro segmento do ensino fundamental, quando ainda não

havia determinação legal para a definição do Projeto Pedagógico para todas as escolas3.

Sem desconhecer que o problema delimitado encerra diversos caminhos de análise,

a investigação buscou reconstruir o processo de implantação da área de Ciências, no

primeiro segmento do EF, nos anos de 1980. O exame desse processo apontou para a

importância do espaço de planejamento como estratégia de formação continuada. A

indagação acerca dos fatores que influenciaram a consolidação da área, e o consequente

bom desempenho dos alunos em ciências, evidenciou a existência da construção coletiva

do trabalho pedagógico como prática regularmente prevista no planejamento institucional.

A realização de reuniões institucionais sistemáticas nas quais o programa em gestação era

debatido, revisto, recontextualizado à luz de teorias da aprendizagem, avidamente lidas

pelo grupo, emergiu como uma hipótese importante, que teria contribuído para a

implementação da proposta. Nessas reuniões, o debate entre os docentes era oportunizado,

promovendo a adequação e a renovação das atividades pedagógicas cotidianas com ênfase

na construção de novas propostas de práticas para a aula de laboratório. Além das reuniões

de planejamento, ocorriam encontros de estudos organizados no âmbito do Programa de

Assessoria Pedagógica. O desafio não foi pequeno, mas auxiliou o grupo a delinear um

caminho que foi incorporado à rotina da escola, não mais sob a forma de assessoramento,

mas nas reuniões institucionais de planejamento. O resultado foi uma proposta para o

ensino de Ciências que, ressignificada ao longo dos anos, valorizou a importância da

participação dos alunos nas atividades práticas.

Assim, como objetivo central deste trabalho, destaca-se:

3 Tal determinação foi estabelecida com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional no 9394/96.

Page 16: Dissertação míriam moreira duque

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� analisar o processo de implantação da proposta de ensino de Ciências, elaborada nos anos

de 1980, para o primeiro segmento do Ensino Fundamental do Colégio Pedro II, que teve

como eixo principal o desenvolvimento de atividades práticas.

Como objetivos específicos:

� recuperar o Programa de Assessoria Pedagógica, realizado nos anos de 1980, analisando a

sua contribuição para a consolidação da proposta curricular para o ensino de ciências;

� analisar a importância do espaço institucional de planejamento como estratégia relevante

de formação continuada para a construção de práticas pedagógicas bem sucedidas;

� debater a importância e o papel das atividades práticas para o desenvolvimento da

educação científica, na perspectiva da alfabetização científica, na escola básica;

� identificar fatores que colaboraram para a implementação da proposta de ensino de

Ciências, evidenciada pelos bons resultados apresentados pelos alunos nessa área do

conhecimento.

� Elaborar um documentário a partir dos dados produzidos nessa investigação, relatando o

processo vivenciado nos anos de 1980, que resultou na implantação de uma nova

concepção de ensino de ciências na instituição.

Acredita-se que a presente pesquisa, ao promover a recuperação e a análise daquela

experiência, pode contribuir para a compreensão dos processos de construção do saber

docente e para o desenvolvimento do ensino de Ciências. No campo da formação

continuada, o trabalho pode sugerir, para a comunidade educacional, um processo bastante

viável para ser implementado. Já para o campo do ensino de Ciências, especialmente por

tratar-se de experiência na área do 1º ao 5º ano, em que a ocorrência de atividades práticas

na área não constitui atividade usual, este estudo pode apontar sugestões metodológicas

significativas para a prática docente.

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Este trabalho está estruturado em sete capítulos. No primeiro capítulo, dedicado à

discussão dos aspectos metodológicos, descreveram-se os procedimentos e os critérios

adotados para a delimitação do foco da investigação e o percurso da pesquisa.

No capítulo seguinte, é apresentado um retrospecto histórico da inserção da

disciplina de Ciências no currículo escolar brasileiro, recuperando-se o processo de

constituição da área. Buscou-se destacar as transformações operadas no ensino de

Ciências, relacionando-as ao contexto histórico. O objetivo foi detectar os eixos principais

das discussões disseminadas nas últimas décadas que informaram o currículo de Ciências

na educação básica.

No terceiro capítulo, é organizada uma discussão acerca do que pode ser

considerado como atividade prática no ensino de Ciências, levando-se em conta a

necessidade de delimitação de um conceito. Ressalta-se que as novas exigências

educacionais, decorrentes do contexto atual de transformações rápidas, desafiam os

docentes a elaborar propostas didático-metodológicas que superem o modelo tradicional de

ensino de Ciências. A necessidade de renovação do ensino de Ciências está relacionada ao

investimento na educação científica. A concepção de educação científica, na perspectiva da

Alfabetização Científica (AC), tratada nesta seção, remete à necessidade de ressignificar as

práticas em todos os níveis da educação formal, sobretudo nas séries iniciais da educação

básica.

No quarto capítulo, considerando o foco na formação continuada, buscou-se

rastrear a literatura recente do campo. A finalidade é trazer elementos teóricos que possam

contribuir para iluminar os resultados obtidos nas entrevistas e na pesquisa documental.

Para tanto, são mapeados conceitos como saber docente, prática reflexiva e formação

continuada de professores.

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18

A discussão acerca dos Planos Gerais de Ensino (PGE), documentos elaborados no

Colégio Pedro II, que norteiam a organização curricular, é exposta em um capítulo

subsequente. Foram examinados os quatro documentos produzidos para a área de Ciências

entre os anos de 1984 e 1988.

No penúltimo capítulo, apresenta-se a análise dos dados produzidos nas entrevistas.

A elaboração de considerações trazidas nesta seção teve por base a organização dos dados

em categorias de análise, construídas a partir das recorrências verificadas no conteúdo das

entrevistas com os sujeitos envolvidos na pesquisa.

O último capítulo apresenta o produto final do trabalho investigativo e propõe

algumas estratégias de utilização deste material para a realização de atividades em cursos

de formação de professores.

Nas considerações finais, são veiculadas algumas conclusões e apontadas algumas

pistas para novos estudos, reconhecendo com clareza suas limitações e o caráter provisório

inerente ao trabalho científico.

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19

CAPÍTULO 1 – O PERCURSO DA PESQUISA

A pesquisa em educação deve contribuir para uma melhor compreensão da

realidade, não perdendo de vista as possibilidades de delinear estratégias para interferir

neste contexto, com o objetivo de transformá-lo.

A literatura assinala que a validade dos resultados de um trabalho científico está

relacionada à utilização de critérios teórico-metodológicos adequados, o que significa

afirmar que uma pesquisa deve ter como pressuposto o rigor metodológico, contando com

um aparato metodológico claro e coerente.

Nesse sentido, é importante que o investigador considere duas diferentes posturas

que podem comprometer os resultados da pesquisa, como alerta Minayo (1995): por um

lado, o risco de endeusar as técnicas, o que “produz um formalismo árido ou respostas

estereotipadas”; por outro, o “seu desprezo”, que, na opinião da autora, “leva ao empirismo

sempre ilusório em suas conclusões ou a especulações abstratas e estéreis” (p.16).

A pesquisa em tela procura não perder de vista as recomendações de Minayo. A

realização do trabalho envolveu diversas etapas. Na primeira, foi organizada a revisão da

literatura, com ênfase no campo do ensino de Ciências e da formação de professores. O

exame da literatura iluminou as interpretações produzidas, possibilitando o debate acerca

da relevância das atividades práticas para o ensino de Ciências e a importância da criação

dos espaços de trocas de experiências entre os professores. Na segunda, foram examinados

os documentos oficiais da instituição, procurando-se detectar alterações no programa de

Ciências, tendo em vista a construção de uma proposta cujo eixo recaía sobre as atividades

práticas. Foram realizadas, também, entrevistas semiestruturadas com indivíduos que

participaram do processo durante o período focalizado, tendo como objetivo a reconstrução

da experiência. Ainda nessa etapa, no âmbito da escola, ocorreram as observações. Estas

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20

foram realizadas durante as reuniões institucionais de planejamento e tiveram como foco o

processo de seleção e construção das atividades práticas que seriam utilizadas

posteriormente na elaboração do produto final deste trabalho.

Neste capítulo, são debatidos os aspectos metodológicos da pesquisa e a trajetória

traçada. São apresentados os critérios que orientaram a escolha do Colégio Pedro II (CPII)

e, em especial, da Unidade Escolar São Cristóvão I (USCI). Há também a apresentação do

perfil dos sujeitos envolvidos na pesquisa, bem como as técnicas e instrumentos de

produção de dados. As análises produzidas foram subsidiadas pela teoria da análise de

conteúdo, tendo como base Laurence Bardin. Como assinala BORBOREMA (2008):

Bardin (2004) traz contribuições que evidenciam que historicamente a análise de conteúdo transita entre o rigor metódico e a necessidade de ir além das aparências, de realizar inferências, assumindo duas funções: a função heurística ou o desejo de fazer descobertas e a função de administração da prova, isto é, hipóteses que necessitam ser verificadas (p. 93).

Considera-se importante ressaltar a contribuição de Bardin, para quem a análise de

conteúdo é um procedimento que recusa a compreensão de que os fatos possuem

transparência. Para o autor, a análise de conteúdo busca alcançar algo para além da simples

leitura do “real”, tentando investigar algo novo. Nessa perspectiva, persegue os objetivos

de superar incertezas e enriquecer a leitura dos fenômenos. Para Bardin (2004), a análise

de conteúdo constitui:

Um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens. (p.37)

Segundo o autor, existem saberes nos conteúdos das mensagens que necessitam ser

identificados. Por conseguinte, o principal objetivo da análise de conteúdo é a inferência de

conhecimentos relativos aos conteúdos das mensagens. Assim, o papel do pesquisador, que

Page 21: Dissertação míriam moreira duque

21

Bardin chama de analista, é compreender o sentido da significação, mas também ficar

atento a outras significações que possam estar em segundo plano. De acordo com o autor,

“O analista é como um arqueólogo. Trabalha com vestígios: os documentos que pode

descobrir ou suscitar. Mas os vestígios são a manifestação de estados, de dados e de

fenômenos. Há qualquer coisa para descobrir por e graças a eles” (op.cit., p.34).

Como esclarecido anteriormente, a análise de conteúdo consiste em um conjunto de

técnicas de análise das comunicações. Entre as técnicas que compõem a análise de

conteúdo, Bardin cita a análise categorial, a análise de avaliação, a análise da

enunciação, a análise da expressão, a análise das relações e a análise do discurso.

A técnica adotada neste estudo foi a análise categorial. A análise categorial é a

mais antiga e a mais utilizada. Tem como dinâmica a divisão do texto em categorias,

segundo reagrupamentos por correspondência. Portanto, essa técnica consiste na

classificação dos diferentes elementos encontrados numa mensagem e no agrupamento

desses elementos por categorias identificadas pelo investigador. A primeira vista, pode-se

pensar que essa técnica se assemelha à análise documental, no entanto, o grande diferencial

está no processo de inferência.

Por fim, destaca-se que o uso da análise de conteúdo, neste processo investigativo,

foi importante para a captura de significados, sentidos e interpretações a partir das

experiências relatadas pelos docentes durante as entrevistas.

Tendo em vista o objetivo geral da pesquisa – analisar o processo de construção do

programa de atividades práticas, empreendido no CP II, nos anos de 1980 –, a realização

de um estudo de caso pareceu um percurso adequado. De acordo com Yin (apud GIL,

1999, p.23), “o estudo de caso é um estudo empírico que investiga um fenômeno atual

dentro do seu contexto de realidade e no qual são utilizadas várias fontes de evidência.”

Para o autor, a utilização de múltiplas fontes de evidência constitui o principal recurso de

Page 22: Dissertação míriam moreira duque

22

que se vale o estudo de caso para conferir significância a seus resultados. Isso torna a

coleta de dados no estudo de caso mais complexa, pois pode envolver tanto a coleta de

dados pessoais, que Gil (2002), chama de dados de gente, quanto de dados documentais,

ou de papel. Os dados podem ser produzidos mediante análise de documentos, entrevistas,

depoimentos pessoais, observação espontânea, observação participante e análise de

artefatos físicos.

Ressaltando ainda a importância da adoção criteriosa de recursos de coleta de

dados, Gil (op.cit.) recomenda que os resultados obtidos no estudo de caso devem ser

provenientes da convergência, ou da divergência, das observações obtidas de diferentes

procedimentos. Segundo o autor, dessa maneira se torna possível conferir validade ao

estudo, evitando que este fique subordinado à subjetividade da interpretação do

pesquisador.

Ainda segundo Gil, o estudo de caso pode ser desenvolvido em diferentes etapas,

contudo, não é possível encontrar consenso entre os teóricos que estudam o tema acerca de

quais devem ser essas etapas.

Dentre os vários itens de natureza metodológica, para o autor, o que apresenta

maior carência de sistematização é o referente à análise e à interpretação dos dados. Em

sua opinião, por valer-se de variados instrumentos de coleta de dados, o processo de

análise pode admitir que a interpretação dos dados seja de natureza predominantemente

qualitativa.

Page 23: Dissertação míriam moreira duque

23

1.1 Da caracterização da instituição: por que o Colégio Pedro II?

A escolha do Colégio Pedro II está relacionada à peculiaridade do trabalho

pedagógico desenvolvido na referida área curricular na instituição. A equipe de docentes

que elaborou a proposta curricular do primeiro segmento teve como princípio, na disciplina

de Ciências, as atividades práticas. Essa equipe, selecionada através de concurso público,

elaborou o currículo do primeiro segmento do Ensino Fundamental, formulando os

programas das disciplinas sob a forma de atividades integradas4.

Assinala-se que, em diversas escolas públicas, os docentes se limitam a

implementar adequadamente um currículo elaborado por instâncias superiores, em geral,

por órgãos de direção, ou mesmo secretarias de educação. Desse modo, o currículo

constitui uma interpretação de determinações emanadas por especialistas distantes da sala

de aula. Nesse contexto, segundo Lopes (2004), estabelece-se um embate: os dirigentes

questionam a escola por ela não conseguir se adequar às orientações curriculares, e os

educadores questionam os dirigentes por estes produzirem diretrizes de difícil

implementação e de cuja formulação não participaram. A experiência investigada foge a

essa lógica, tendo em vista o papel desempenhado pelos professores no processo. Essa

situação está relacionada ao fato de o Colégio Pedro II ser uma Autarquia Federal que

possui autonomia de gestão técnica e pedagógica, o que possibilita a criação de um espaço

de participação dos docentes na discussão do currículo da instituição.

Observa-se, ainda, que a escolha do Colégio Pedro II, além de atender aos objetivos

deste estudo, permitiu a ampliação das questões inicialmente delineadas, apontando para a

importância da prática como espaço de recontextualização das diretrizes curriculares

(LOPES, 2004). Para Lopes (op.cit., p. 116), é “importante superar a concepção prescritiva 4 Segundo a Lei n. 5692/71, em vigor no período focalizado na pesquisa, o currículo do primeiro segmento era organizado sob a forma de atividades integradas.

Page 24: Dissertação míriam moreira duque

24

das políticas curriculares, que tenta limitar a produção de sentidos dos saberes docentes

gestados na prática cotidiana das salas de aula”. A autora compreende o espaço da

recontextualização como momento individual, singular e dialético, e considera que esse

processo é inerente ao fazer docente. Portanto, numa experiência como a relatada neste

estudo, o distanciamento entre o currículo prescrito e o vivido é significativamente

diminuído.

Outro aspecto relevante a ser mencionado, relacionado à escolha da instituição,

refere-se à formação acadêmica do corpo docente selecionado para implantar o primeiro

segmento do EF. Todos os novos professores tinham cursado a escola normal. Alguns,

entre eles, já possuíam nível universitário, mas em áreas bem diversificadas. Na mesma

equipe, existiam pedagogos, licenciados em Matemática, Biologia, Química, História,

Geografia, Letras, o que enriquecia a discussão curricular. As contribuições eram advindas

de diferentes campos do conhecimento.

Destaca-se, também, que, à época da implantação do primeiro segmento do EF, o

Colégio Pedro II já contava com uma experiência de cento e quarenta e sete anos de

existência. Esse lastro de experiência operou simbolicamente, aumentando o nível de

exigência e as expectativas depositadas no grupo de professores que compuseram a equipe

que se responsabilizou pela organização curricular do primeiro segmento do EF.

Com o objetivo de ilustrar a importância da experiência relatada neste trabalho,

cumpre situar a instituição escolhida no contexto da educação brasileira. Ressalta-se que os

resultados do trabalho alcançados estão relacionados às condições de trabalho do professor

e ao espaço que lhe é consentido ocupar. Necessário se faz esclarecer que, ao se utilizar a

expressão “espaço consentido”, não se excluem as lutas cotidianas constantemente

travadas no interior da escola. Entretanto, há que se reconhecer que, embora ainda distante

Page 25: Dissertação míriam moreira duque

25

do ideal, no Colégio Pedro II as condições de trabalho docente são superiores às de muitas

instituições de primeiro segmento do EF público do país.

1.2 Breve histórico do Colégio Pedro II

O Colégio Pedro II é uma instituição federal situada na cidade do Rio de Janeiro,

com grande tradição no cenário educacional do país. É a única instituição da rede federal

que, sem estar ligada a nenhuma universidade, oferece formação nos dois segmentos da

educação básica: Ensino Fundamental com nove anos e Ensino Médio com três, desde

1984.

A origem do Colégio Pedro II, conforme Andrade (1999), “remonta à primeira

metade do século XVIII, ao Abrigo dos Órfãos de São Pedro, obra de caridade da antiga

paróquia do mesmo nome, no centro da cidade do Rio de Janeiro.” De acordo com a

autora, o Bispo D. Antônio de Guadalupe fundou o Colégio dos Órfãos de São Pedro em

1733, por Provisão da Câmara Eclesiástica, e o transformou em Seminário de São Joaquim,

também por Provisão Eclesiástica, em 1739, sendo localizado em antigo casarão da Rua

Larga, atual Av. Marechal Floriano.

A autora relata que, em 1818, o Rei D. João VI extinguiu o Seminário de São

Joaquim, utilizando suas dependências para o aquartelamento dos soldados do Corpo de

Artífices e Engenheiros da Divisão Portuguesa, recém chegada o Brasil.

Em 1821, atendendo às súplicas de vários moradores, o Príncipe Regente

restabeleceu o Seminário de São Joaquim em seu prédio de origem. Por ocasião do período

de Regência Trina, em 1831, o Ministro do Império José Lino Coutinho mudou a natureza

do educandário religioso, implantando a habilitação para o trabalho, nas práticas de

Page 26: Dissertação míriam moreira duque

26

torneiro, entalhador, litógrafo, e a instrução militar, “exercício das armas”, para a

preservação da ordem pública. (ANDRADE, 1999)

Segundo Andrade, além do corpo docente constituído de intelectuais de renome, a

seletividade do corpo discente, marcada pelos exames de admissão, além dos programas de

ensino de base clássica e tradição humanística, e o pagamento das anuidades são fatores

que “deram ao ensino secundário oficial uma função de preparação dos alunos para o

ensino superior” (op.cit., p. 29 ). No século XIX, o Colégio de Pedro II era o único colégio

que conferia o Grau de Bacharel em Letras a seus formandos, o que significava ingresso

direto nos cursos superiores.

A partir de 1889, o Colégio Pedro II sobreviveu a períodos de crise institucional,

com a perda de seu patrono Pedro II, a mudanças de nome (Instituto Nacional de Instrução

Secundária / Ginásio Nacional) e a alterações da política educacional efetuadas com as

Reformas de Ensino. Apesar da perda de privilégios legais (extinção do Título de Bacharel

em Ciências e Letras), de acordo com Andrade, o colégio continuou constituindo uma

referência para o ensino secundário, em que buscavam-se espelhar ginásios estaduais e

escolas particulares.

Page 27: Dissertação míriam moreira duque

27

Figura 1 Colégio Pedro II

Fonte: Andrade (2009)

Observa-se que há, na instituição, certo sentimento de orgulho, evidenciado pelos

atores da comunidade escolar. A imagem do Colégio Pedro II, como um referencial de

ensino de qualidade, está presente nas expectativas das diversas gerações de pais que

matriculam seus filhos na instituição.

Na atualidade, a instituição possui unidades, na cidade do Rio de Janeiro, em seis

bairros: Centro, Humaitá, Tijuca, Engenho Novo, São Cristóvão e Realengo, e unidades

“descentralizadas”, nos municípios de Niterói e Duque de Caxias. Todas elas subordinadas

às mesmas orientações administrativas e pedagógicas, desenvolvendo proposta curricular e

diretriz de avaliação idênticas.

Os chamados “Pedrinhos”, unidades que trabalham com o primeiro segmento do

ensino fundamental, são quatro: Tijuca I, Humaitá I, Engenho Novo I e São Cristóvão I.

Essas escolas foram criadas em meados dos anos de 1980 e fazem parte, portanto, da

história recente da instituição. A primeira delas foi a de São Cristóvão, fundada em

Page 28: Dissertação míriam moreira duque

28

fevereiro de 1984, pelo diretor geral à época, professor Tito Urbano da Silveira (1979-

1988). Em 2010, foi inaugurada mais uma unidade voltada para o primeiro segmento no

bairro de Realengo no Rio de Janeiro.

1.3 A Unidade São Cristóvão I

O ingresso dos alunos na Unidade São Cristóvão I5 se dá através de sorteio público.

Conforme dados produzidos a partir da secretaria escolar da Unidade, verifica-se que há,

em relação ao local de moradia dos alunos, uma grande diversidade. De acordo com os

relatórios pesquisados, é possível observar que a procura da população local pelas vagas na

instituição não é superior à de candidatos residentes em outros bairros do Rio de Janeiro.

Os relatórios escolares informam que, de modo geral, o corpo discente da Unidade

São Cristóvão I é formado por alunos que têm expectativas variadas em relação à escola.

Chegam ao colégio trazendo repertórios culturais diversos e experiências pessoais bastante

distintas relacionadas à condição sócio-econômica da família.

A dinâmica da unidade escolar sempre foi a de garantir espaço para a diversidade,

promovendo a discussão de estratégias pedagógicas que dessem conta do desafio de lidar

com essa realidade. Antecedendo o trabalho de organização das turmas, no período de

“adaptação”, os alunos que ingressam no primeiro ano sempre passam por uma “testagem”,

avaliação escrita, cujo objetivo é mesclar6 os alunos, numa tentativa de combater a imagem

ilusória da homogeneidade.

5 A Unidade São Cristóvão, devido ao seu tamanho, foi dividida em áreas: Unidade São Cristóvão I – destinada ao primeiro segmento do EF; Unidade São Cristóvão II – destinada ao segundo segmento do EF; Unidade São Cristóvão III – destinada ao Ensino Médio; e Complexo Educacional de São Cristóvão – área comum de atendimento. 6 Colocar, na mesma turma, alunos em níveis de aprendizado diferentes, propositalmente.

Page 29: Dissertação míriam moreira duque

29

O corpo docente e os demais funcionários técnico-administrativos são, em sua

maioria, funcionários do quadro permanente da instituição. Há um total de 105 docentes.

Destes, 89 pertencentes ao Departamento do Primeiro Segmento7; 05, ao Departamento de

Educação Musical; 05, ao Departamento de Desenho e Educação Artística; e 06, ao

Departamento de Educação Física e Folclore. Dentre os professores do Departamento de

Primeiro Segmento, 03 se encontram na equipe da direção8; 08, na coordenação

pedagógica de área9; 05, na Orientação Pedagógica de série10; 04 atuam na coordenação de

turno11; e os demais atuam em sala de aula, nas áreas de Núcleo Comum, Literatura,

Laboratório de Informática, Laboratório de Ciências e Sala de Leitura12.

No ano letivo de 2009, a unidade escolar São Cristóvão I contava com 980 alunos,

divididos em quarenta turmas e distribuídos nos cinco anos do primeiro segmento do

Ensino Fundamental. O horário regular de aula, no primeiro turno, era de 7:00 a 12:00h e,

no segundo turno, de 13 a 18h. Havia um intervalo de 30 minutos de recreio. No primeiro

segmento do EF, não há aulas regulares aos sábados – como acontece com o segundo

segmento do Ensino Fundamental e com o Ensino Médio –, sendo reservados esses dias

para a realização de reunião de pais e atividades pedagógicas variadas, como feiras e

exposições, além das tradicionais festas juninas e da família13.

7 O Departamento do Primeiro Segmento é formado por professores que atuam nas séries iniciais, do 1º ao 5º ano. 8 Um diretor e dois adjuntos. 9 O coordenador pedagógico de área atua na organização vertical dos componentes curriculares. Há um para cada uma das áreas: Língua Portuguesa, Matemática, Estudos Sociais, Ciências, Artes, Música, Literatura e Educação Física, do 1º ao 5º ano. 10 Os orientadores pedagógicos atuam no planejamento da série. Há um Orientador para cada ano, do 1º ao 5º ano. 11 A coordenação de turno tem tarefa ligada à administração dos turnos, e sua atuação envolve o trabalho com todos os atores da comunidade escolar, mais especificamente junto aos funcionários técnico- administrativos da escola e pais. Essa função é ocupada exclusivamente por docentes. 12 Dados relativos ao ano letivo de 2009. 13 A Unidade Escolar São Cristóvão I optou por realizar uma festa da família – atividade em que a família do aluno é convidada a ir ao colégio para participar de atividades variadas e oficinas diversas em companhia do aluno, em substituição às tradicionais festas de dia das mães e dos pais. Tais atividades curriculares são facultativas, e, na opinião dos gestores, têm atendido melhor às necessidades da comunidade não só em função dos novos arranjos familiares, quanto ao horário dos pais.

Page 30: Dissertação míriam moreira duque

30

A U.E. São Cristóvão I conta com um complexo educacional no qual estão

inseridos: um horto botânico, um teatro (Teatro Mário Lago), uma piscina semi-olímpica e

três espaços culturais. O “Espaço Cultural do Colégio Pedro II” oferece um hall para

exposições e divulgação de trabalhos em pintura, gravura, fotografia e outras formas de

manifestações artísticas; o “Espaço Musical” desenvolve atividades programadas por

professores do Departamento de Educação Musical, como aula de instrumentos de sopro,

cordas e percussão, e canto coral. O Setor de Atividades Artísticas e Culturais (SAAC),

vinculado ao Departamento de Educação Física e Folclore, desenvolve atividades de dança

e teatro. Esses espaços adjacentes à U.E. São Cristóvão I oferecem atividades facultativas

aos alunos, podendo ser utilizados também para o desenvolvimento de atividades

curriculares regulares inseridas nos planejamentos pedagógicos.

A Unidade Escolar São Cristóvão I possui dois pavimentos, sendo a parte superior

ocupada integralmente com salas de aula, perfazendo o total de vinte salas.

Atualmente, a U.E. São Cristóvão I possui três salas de Educação Artística, duas

destinadas às atividades plásticas e outra para o desenvolvimento de atividades cênicas,

duas salas de Música, duas de Literatura, almoxarifado, Laboratório de Informática, duas

salas de reunião, setor de multimeios, sala de coordenação pédagógica dividida em dois

ambientes, sala do Setor de Supervisão e Orientação Pedagógica (SESOP)14, Laboratório

de Ciências, mecanografia, secretaria, copa, gabinete da direção, sala da direção adjunta,

sala da coordenação de turno, sala de professores, biblioteca escolar, dois auditórios,

cantina, refeitório, três pátios internos cobertos, dois descobertos, banheiros femininos e

masculinos em cada andar.

14 O SESOP congrega as funções do Serviço de Orientação Educacional e da Supervisão Pedagógica.

Page 31: Dissertação míriam moreira duque

31

1.4 Os sujeitos da pesquisa

Ao apresentar o perfil dos sujeitos15 envolvidos na pesquisa, é preciso destacar que

todos são professores. Há docentes que pertencem ao quadro permanente do Colégio Pedro

II e outros que, por ocasião da elaboração da proposta pedagógica do primeiro segmento

do ensino fundamental, integraram o corpo de Assessores Pedagógicos do Laboratório de

Currículos.

Ao se optar por dar voz aos professores que participaram diretamente da

implantação do primeiro segmento do Colégio Pedro II, houve a intenção de resgatar o

processo vivido, de investigar a trajetória de construção do currículo de Ciências, tentando

detectar os fatores que contribuíram para os resultados tradicionalmente alcançados nessa

área. O foco recaiu sobre aqueles que participaram das diferentes etapas de construção e

implementação da proposta.

Com esse objetivo, foram selecionadas três docentes que estiveram envolvidas no

ensino de Ciências, no período estudado, e que atuam há pelo menos vinte anos na área.

Essas professoras deram aulas de Ciências, atuaram no Laboratório de Ciências e

ocuparam a coordenação pedagógica da disciplina. O cuidado na seleção dos indivíduos foi

um ponto relevante para a realização da pesquisa. A possibilidade de se encontrarem atores

com esse perfil só foi possível devido à característica peculiar da instituição, na qual, em

função da organização curricular, é possível ter professor não polivalente16 no primeiro

segmento do EF.

15 Visando preservar as identidades dos sujeitos envolvidos, não foram mencionados seus nomes. 16 No Colégio Pedro II, os 1º, 2º e 3º anos têm professor polivalente. No 4º ano, há um docente para Língua Portuguesa e Estudos Sociais, e outro para Matemática e Ciências. No 5º ano, há um professor para cada uma das áreas. O professor de laboratório atua exclusivamente no laboratório, desenvolvendo atividades práticas para as quatro séries.

Page 32: Dissertação míriam moreira duque

32

Outra professora selecionada desempenhou a função de Chefe de Departamento no

período da criação dessa instância institucional. Cabe ressaltar que, desde a sua criação em

1985, esse departamento possui o maior colegiado da instituição.

Devido à inexperiência da instituição com as séries iniciais do Ensino Fundamental

implantadas em 1984, o departamento possuía significativa autonomia. A iniciativa de

elaborar um programa de capacitação docente partiu dessa primeira chefia, e tinha o

objetivo de dar “uma cara” ao trabalho do primeiro segmento. É importante destacar que já

havia perspectiva de implantação desse segmento nas demais unidades do colégio.

Foram selecionadas, ainda, duas das cinco professoras que compunham a equipe de

assessores do Laboratório de Currículos. Uma delas tinha sob sua orientação a área de

Ciências e a outra, a área de Estudos Sociais. A escolha da Assessora de Estudos Sociais

foi baseada na ênfase que era dada às atividades práticas na elaboração da proposta

curricular da área.

O processo de localização das professoras/assessoras demandou pesquisa nos

órgãos nos quais atuaram antes de se terem aposentado. A estratégia funcionou

parcialmente, tendo sido necessário, ainda, recorrer à investigação verbal junto a outros

docentes, num trabalho de pesquisa “boca a boca”, para se conseguir o contato de uma das

professoras. A docente em questão, além de estar a mais tempo afastada de suas atividades

profissionais, havia se mudado para outro município do RJ.

Apresentamos abaixo alguns critérios adotados para a seleção das professoras17 que

participaram da pesquisa. Todas são docentes que:

a) vivenciaram o processo de implantação do programa de Ciências;

17 Foi adotado o gênero feminino, pois todos os entrevistados são do sexo feminino. No trato geral dos dados, bem como nas citações exemplificadoras, não foram identificados os entrevistados, utilizando-se, com efeito, apenas as letras A,B,C,D,E e F para citá-los, precedidas pela identificação entrevistada, sempre no feminino.

Page 33: Dissertação míriam moreira duque

33

b) estiveram envolvidas em propostas pedagógicas que valorizavam atividades

práticas;

c) participaram do Programa de Assessoria Pedagógica, implantado por ocasião

da elaboração da proposta curricular para o primeiro segmento do Ensino

Fundamental.

Houve o cuidado para que os sujeitos envolvidos não fossem todos docentes com

formação em Ciências Biológicas18, garantindo que, do total de entrevistados, não

houvesse mais de cinquenta por cento com formação na área.

Ao selecionar o grupo de professores envolvidos na pesquisa, pretendeu-se:

a) levantar as expectativas destes no momento de implantação do espaço

específico para as atividades práticas;

b) detectar as dificuldades experimentadas e as percepções destes acerca do

processo vivenciado;

c) avaliar o processo de debates e estudos, marcado pela reflexão em torno dos

problemas da prática cotidiana dos docentes, que foi incorporado à rotina do

trabalho de planejamento pedagógico, mesmo depois de finalizado o trabalho

das assessoras;

d) investigar de que forma a participação desses docentes nessas atividades se

constituiu numa estratégia de formação continuada implementada pelo Colégio

Pedro II de forma não intencional.

Sobre os sujeitos envolvidos na pesquisa, apresentamos alguns dados no quadro

que segue:

18 Há uma tendência natural para que o professor faça a opção por atuar em sua área de formação, mas como, para o trabalho nas séries iniciais, não há exigência de formação específica, há professores com formação em outras áreas do conhecimento que optam por dar aula de Ciências.

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34

Tabela 1 – Formação acadêmica e experiência profissional das entrevistadas

Experiência anterior ao ingresso no CPII

Formação acadêmica Tempo de Magistério

Cargos de atuação no CPII

Professor A

2 anos como professora do primeiro segmento do EF

da Rede Pública do município do Rio de

Janeiro.

Curso Normal, licenciada em Ciências Biológicas, Mestre em Educação e Doutora em Ecologia

Social.

27 anos Professora de núcleo comum, coordenação de

série, coordenação de Ciências, professora de

laboratório do LC. Professor

B 2 anos como professora do segundo segmento do EF

da Rede Pública do Estado do Rio de Janeiro.

Curso Normal, licenciada em Biologia,

Pós Graduação lato sensu em Ensino de Ciências.

27 anos Professora de núcleo comum, coordenação de

série, coordenação de Ciências,

professora do LC. Professor

C 10 anos como professora do primeiro segmento do EF da Rede Pública do

município do Rio de Janeiro.

Curso normal, graduação em Pedagogia, Pós

Graduação lato sensu em Educação.

35 anos Professora de núcleo comum, coordenação de

série, coordenação de Ciências, professora de

laboratório do LC. Professor

D 14 anos como professora do primeiro segmento do EF da Rede Pública do

Estado do Rio de Janeiro.

Curso Normal. 29 anos Chefe de Departamento do

primeiro segmento do EF, professora de núcleo comum, professora do LC.

ProfessorE

20 anos como professora de Biologia do Curso

Normal da Rede Pública do Estado do Rio de

Janeiro e membro do LC.

Curso Científico e graduação em Filosofia e

História Natural.

Professora aposentada.

Assessora pedagógica da área

de Ciências.

Page 35: Dissertação míriam moreira duque

35

Professor

F Fora a trajetória acadêmica anterior, possuía 26 anos de experiência voltada para o antigo ensino

primário, inicialmente no Centro de Pesquisas do RS

atuando junto às escolas normais e posteriomente

no LC do RJ.

Curso clássico, bacharelado em

Geografia. Especialização em Geomorfologia na

Espanha e na França.

Professora aposentada.

Assessora pedagógica da área de Estudos Sociais.

1.5 A trajetória da investigação

O trabalho de pesquisa envolveu diferentes etapas que incluíram a pesquisa

bibliográfica, a análise de documentos da instituição19, a observação das reuniões de

planejamento e a realização de entrevistas de tipo semiestruturada.

A pesquisa bibliográfica teve como objetivo rastrear a literatura sobre ensino de

Ciências e formação continuada de professores. Foram examinados livros, teses e artigos

sobre as temáticas. Com relação ao ensino de Ciências, buscou-se detectar as tendências

que orientaram o campo, debater a importância da educação científica na perspectiva da

alfabetização científica e delimitar uma concepção de atividade prática. A literatura sobre a

formação de professores permitiu, por sua vez, compreender melhor os processos

formativos.

O exame dos documentos oficiais teve como objetivo possibilitar o rastreamento de

informações, tendo em vista a reconstrução do processo investigado. Entre os textos

examinados, constam: os Planos Gerais de Ensino (PGEs), formulados nos anos de 1980; o

programa de atividades práticas desenvolvido durante o período de Assessoria Pedagógica

(1985 a 1987); dados estatísticos relativos à formação docente; fichas de frequência de

19 A coleta de dados documentais foi realizada em diferentes seções administrativas do Colégio Pedro II, entre as quais: a Unidade Escolar São Cristóvão I, no Departamento de Primeiro Segmento do EF, na Diretoria de Ensino, na Diretoria de Gestão de Pessoas, na Diretoria de Administração e no Núcleo de Documentação e Memória (NUDOM).

Page 36: Dissertação míriam moreira duque

36

pessoal docente e exemplares da Facta 20. A consulta às fichas de frequência de pessoal

docente21 possibilitou identificar e selecionar os sujeitos envolvidos na pesquisa, com os

quais foram realizadas as entrevistas.

A produção de dados através de observação objetivou a aproximação da perspectiva

dos sujeitos e a descoberta de aspectos novos do problema. De acordo com Ludke e André

(1986), na medida em que o observador acompanha in loco as experiências dos sujeitos,

pode tentar apreender a sua visão de mundo, isto é, o significado que eles atribuem à

realidade que os cerca e às suas próprias ações.

As observações foram realizadas na Unidade Escolar São Cristóvão I. Foram

observadas quatro reuniões semanais de planejamento do quarto ano do EF. O foco dirigiu-

se para o processo de seleção e construção de atividades práticas, isto porque, além da

observação ter possibilitado a coleta de dados que subsidiaram as conclusões da pesquisa,

nessas atividades de planejamento foram selecionadas as atividades práticas utilizadas na

elaboração do produto final.

O planejamento de série é uma atividade regular na unidade escolar São CristóvãoI.

A importância atribuída a esse momento de encontro dos professores que atuam na mesma

turma é tão grande, que a direção da unidade, ao definir os horários da escola, tem como

um dos critérios principais garantir um horário comum para que os docentes possam se

reunir semanalmente, a fim de planejar e acompanhar o plano de ensino..

Um fenômeno curioso que pôde ser apreendido durante o período de observação: os

docentes que têm mais tempo de atividade pedagógica do Colégio Pedro II são os que mais

reconhecem a importância da manutenção desses momentos de troca entre os pares. Esse

20 Publicação institucional na qual são divulgados os atos oficiais do Colégio. 21 Documento institucional produzido mensalmente, no qual constam, entre outras informações, a função desenvolvida pelo docente.

Page 37: Dissertação míriam moreira duque

37

foi um dos pontos interessantes que pôde ser destacado durante o processo de observação

dos encontros de planejamento.

Nesses momentos de observação, houve a oportunidade de realizar constatações

curiosas, como a de depreender uma espécie de “inquietação” que parece impregnar os

docentes no momento de concepção da atividade pedagógica. Essa inquietação não poderia

ser associada a questões de conteúdo, pois esse ponto não parecia merecer preocupação por

parte dos professores, que têm bom nível de formação, mas parecia fundamentar-se em um

desejo explícito de tentar inovar, fazer diferente e melhor do que fora feito no ano anterior.

Numa analogia a Clara Luz22, pode-se afirmar que os docentes, a exemplo da personagem

do livro que queria inventar suas mágicas e se recusava a fazer mágica pelo livro

amarelado das antigas fadas, também pareciam se recusar a repetir, seguidamente, as

atividades sugeridas nos livros didáticos e, até mesmo, as que já haviam sido construídas e

utilizadas pela equipe em anos anteriores.

Alguns docentes verbalizavam a necessidade de se ter algo a “sair do forno”,

“fresco”, “atual”, algo que demandasse relacionamento com fatos recentes, como notícias

de jornal ou qualquer outra fonte de informação que contextualizasse o conteúdo a ser

trabalhado com aspectos que pudessem estar embebidos de cotidianidade.

Outra inferência possível, a partir da observação das atividades, foi a constatação de

que o tempo de docência parece ter feito os professores confiarem mais no valor

pedagógico do trabalho construído coletivamente e contextualizado, e menos nos livros

didáticos. Daí o trabalho com o livro didático ter caráter de complementação e

enriquecimento pedagógico23.

22 Personagem do livro infanto-juvenil “A Fada que tinha idéias” da Fernanda Lopes de Almeida. 23 Os livros didáticos fornecidos pelo MEC ocupam as estantes da sala de aula e servem de fonte de consulta para algumas atividades. O material didático utilizado nas aulas de ciências é produzido pelos professores e alunos.

Page 38: Dissertação míriam moreira duque

38

O processo de produção de dados a partir da observação foi um momento do

trabalho de pesquisa que ofereceu informações importantes acerca do problema

investigado. Isso porque possibilitou a apreensão de aspectos subjetivos relevantes para

este estudo de caso, que tem caráter qualitativo. Há aspectos decorrentes do processo de

observação, sobretudo no que diz respeito à teia de relações que envolvem questões que

determinam o clima do ambiente de trabalho docente e o processo de tomada de decisões

na instituição escolar.

Ainda reconhecendo que o olhar do pesquisador, como o de qualquer outro

espectador, esteja sob o efeito de lentes produzidas a partir da síntese de suas experiências

culturais, considerar dados relacionais, na perspectiva da subjetividade, não destitui o valor

e o espaço da análise desse elemento na elaboração e execução do trabalho pedagógico.

Desse modo, é possível inferir que o “clima” institucional é produto do conjunto de

relações que se estabelecem no interior do ambiente escolar e, no caso deste estudo,

embora não constando das hipóteses elencadas para a determinação do problema que se

investigava, se constituiu em elemento determinante na configuração da experiência

relatada.

O processo de realização das entrevistas durou aproximadamente três meses. Num

total de seis, as entrevistas foram gravadas em áudio e vídeo, com o objetivo de identificar

as interpretações pessoais de docentes cuja atividade profissional esteve permanentemente

voltada ao ensino de Ciências, para crianças de 6 a 10 anos, faixa etária que alcança os

alunos que cursam o nível de ensino sobre o qual esta pesquisa foi realizada.

De acordo com Lüdke e André (1986), a entrevista é uma técnica que exige

capacidade de ouvir atentamente e estimular o fluxo das informações, criando um

movimento de interação e de influência recíproca entre o entrevistador e o entrevistado. O

fundamental para o tipo de estudo que se pretendeu desenvolver, estava na possibilidade de

Page 39: Dissertação míriam moreira duque

39

utilização da entrevista do tipo semiestruturada24 pela flexibilidade que caracteriza esse

instrumento de coleta de dados. Dessa forma, foi possível captar as informações desejadas,

bem como esclarecer e aprofundar questões levantadas a partir das observações e na

análise documental.

Durante as entrevistas, foi possível observar, no início, o comportamento

cerimonioso por parte dos professores e da própria pesquisadora. O registro da imagem em

câmera digital ficou sob a responsabilidade de um operador e talvez tenha sido a presença

inibidora da câmera a responsável por esse clima inicial. Foi possível perceber, em todas as

entrevistas, que, alguns minutos após iniciada a conversa, o entrevistado se envolvia no

relato de sua experiência, e a presença da câmera e de seu operador era ignorada. Mesmo

reconhecendo a insegurança inicial em todo começo de entrevista, ao rever as imagens, é

possível verificar que o nível de interferência da pesquisadora foi sendo gradativamente

ampliado ao longo da pesquisa. Inicialmente as intervenções são tímidas e feitas em um

tom de voz bastante baixo, o que vai se modificando ao longo do processo. Da mesma

forma, o relato dos entrevistados, também do início para o fim da entrevista, vai ganhando

conteúdo e desenvoltura.

As entrevistas com professores do CPII foram realizadas na própria escola, no

interior do laboratório de ciências, nas unidades São Cristóvão I, Tijuca I e Humaitá I. É

importante esclarecer que, inicialmente (1984), todos os sujeitos envolvidos na pesquisa

atuavam na unidade São Cristóvão I. Posteriormente, com a implantação do primeiro

segmento nas outras seções, os professores foram se alocando conforme suas necessidades,

na maioria das vezes em função da proximidade com o local de moradia.

24 Foram feitas, verbalmente, uma série de perguntas abertas em uma ordem prevista, e outras foram acrescentadas para que fosse possível o esclarecimento de algumas falas. O roteiro da entrevista é apresentado no anexo III, e, no anexo IV, consta o modelo de autorização utilizado nas entrevistas.

Page 40: Dissertação míriam moreira duque

40

Foram realizadas, ainda, entrevistas com as assessoras do Laboratório de Currículos

selecionadas para participarem da pesquisa. Essas docentes foram responsáveis pela

coordenação do processo de implantação da proposta nos anos de 1980.

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41

CAPÍTULO 2 – BREVE TRAJETÓRIA DO ENSINO DE CIÊNCIAS NO BRASIL

Neste capítulo, recupera-se o processo de constituição da área de ciências na

educação brasileira. Para tanto, foi organizada uma revisão da literatura sobre o tema, que

buscou identificar quais os principais eixos da discussão travada nesse campo.

Destaca-se que as transformações ocorridas no ensino da disciplina preconizaram a

adoção de novas concepções e metodologias. Tais transformações estão relacionadas a um

determinado contexto histórico e aos interesses das forças políticas dominantes, que

relacionavam a possibilidade de desenvolvimento social e econômico ao progresso

científico-tecnológico.

Ao rever as leis e os programas oficiais de ensino, é possível verificar que a

disciplina passou a integrar o currículo do primeiro segmento do Ensino Fundamental

recentemente sem, contudo, desfrutar de muita relevância na matriz curricular, tanto do

Ensino Fundamental como do Ensino Médio.

De acordo com Antunha (1978), é só a partir da vigência da Lei Francisco

Campos25, em 1932, que se inicia o processo de estruturação da educação no país,

primeiramente, por meio da Lei Orgânica do ensino secundário e, posteriormente, com os

demais decretos-lei, que estruturariam o ensino primário26 e o profissional27.

A Lei Orgânica do ensino secundário28, promulgada em 1942, fez figurar

oficialmente, de forma estruturada, a disciplina de Ciências nas duas últimas séries do

25 A reforma Francisco Campos, decreto-lei nº 21241/1932, impôs uma estruturação para o sistema de ensino brasileiro. 26 Nível de ensino referente ao primeiro segmento do E.F.,conforme LDB nº 9394/96. 27 O autor destaca ainda que a estruturação do ensino coincide com a primeira implantação do sistema regular de formação de professores secundários, em nível universitário do país, por meio da criação das Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras. 28 Decreto-lei nº 4244/1942.

Page 42: Dissertação míriam moreira duque

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curso ginasial29. No 2º ciclo30, as disciplinas da área eram inseridas no último ano do curso

clássico31 e durante os três anos do curso científico32.

No ensino primário33, o decreto-lei nº8529 de 1946, também conhecido como Lei-

Orgânica do ensino primário, estabeleceu as disciplinas obrigatórias a serem cursadas em

cada um dos cinco anos que compunham o ciclo. A disciplina de Ciências Naturais e

Higiene era inserida no curso primário complementar, ou seja, no 5º ano, o último do ciclo.

Um breve exame da legislação permite inferir a pequena importância atribuída ao

componente curricular “Ciências Naturais”. O movimento em direção a mudanças

significativas no status conferido à disciplina de Ciências foi lento. A grande alavanca

propulsora da transformação em direção à valorização desse componente curricular será a

Segunda Grande Guerra, que impôs ao mundo um processo de desenvolvimento científico

e tecnológico jamais visto anteriormente. O processo de reconstrução das nações

envolvidas no conflito bélico exigia a preparação de futuros cientistas. Ilustrando a ideia,

Jenkins apud Krasilchik (1987, p. 6) afirmam que: “a Segunda Guerra Mundial foi, para o

ensino de Ciências, assim como para o resto, um divisor de águas”.

Krasilchik (1987) destaca o lançamento do Sputnik, em 1957, como evento

emblemático para a arrancada do progresso científico soviético, sendo também

considerado pela comunidade acadêmica como marco para a disputa hegemônica

desenvolvimentista que se estabeleceu na época.

Nesse contexto, grandes projetos curriculares foram criados com o objetivo de

alcançar a hegemonia científica e tecnológica, inicialmente nos Estados Unidos e, em

29 Nível de ensino referente ao segundo segmento do Ensino Fundamental, conforme LDB nº9394/96. 30 Nível equivalente ao Ensino Médio, conforme LDB nº 9394/96. 31 Curso equivalente ao Ensino Médio, para os aspirantes aos cursos de nível superior na área de Ciências Humanas. 32 Curso equivalente ao Ensino Médio, para os aspirantes aos cursos de nível superior na área de ciências exatas e biomédicas. 33 Nível de ensino referente ao primeiro segmento do E.F. conforme LDB nº 9394/96.

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seguida, em países europeus. Dentre outros países influenciados pelo modelo americano,

figura o Brasil, que também moldou o ensino de Ciências em conformidade com os

projetos internacionais. Segundo Krasilchik:

(...) esse movimento, que teve a participação intensa das sociedades científicas, das Universidades e de acadêmicos renomados, apoiados pelo governo, elaboraram o que também é denominado na literatura especializada de “sopa alfabética”, uma vez que os projetos de Física (Physical Science Study Commitee- PSSC), de Biologia (Biological Science Curruculum Study- BSCS), de Química (Chemical Bond Approach- CBA e Matemática (Science Mathematics Study Group- SMSG) são conhecidos universalmente pelas suas siglas (KRASILCHIK, 2000, p.85).

A autora assinala que este foi um período marcante e crucial na história do ensino

de Ciências, podendo-se observar, ainda na atualidade, a influência das tendências

curriculares dessa época nas disciplinas de Ciências tanto no Ensino Fundamental como no

Médio.

A busca desenvolvimentista incentivou o debate nos meios políticos e acadêmicos

sobre o papel da ciência, o que resultou em investimentos na melhoria do ensino de

Ciências. Como exemplo do esforço empreendido nessa direção, Krasilchik (1987) cita a

criação do Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura (IBECC), por um grupo de

professores na década de 1950, além de lembrar que o ensino de Ciências nos anos de 1950

e 1960 fora marcado pela presença da literatura didática européia e norte-americana, que se

constituíam, na maioria das vezes em “meras traduções”.

No referido período, os programas oficiais da disciplina tinham como finalidade a

transmissão de conteúdos, apresentando conceitos e fenômenos descontextualizados, sem

estabelecer relação entre a ciência e os demais contextos sociais que a determinavam.

Também as implicações decorrentes dos avanços tecnológicos e suas respectivas

aplicações eram desconsideradas. A neutralidade da ciência era inquestionável.

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44

Com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 4024,

em 1961, foi instituída a obrigatoriedade do ensino de Ciências em todas as séries do curso

ginasial34. A ampliação curricular conferida ao ensino de Ciências já sinalizava a

transformação nos objetivos do trabalho que se delineava, abandonando a característica

elitista, restrito para a preparação de uma nova geração de cientistas e passando a se

constituir em elemento necessário à formação do cidadão (KRASILCHIK, 1987).

A valorização do método científico, a partir dos anos de 1960, influenciou, também,

a modificação metodológica no contexto da prática de ensino. Conforme Gagné (1970),

apud Zimmernann (2000), o objetivo das Ciências Naturais passou a ser o de oferecer

condições para o estudante vivenciar o método científico. A respeito dos projetos que

valorizavam a participação dos alunos em atividades experimentais nesse período, Paiva

(2008) afirma que:

(...) esses projetos curriculares se ampliaram, incorporando a participação de cientistas, de professores secundários, de psicólogos e de especialistas em currículo e avaliação. Entre os obstáculos enfrentados pelos projetos, estão a resistência do sistema educacional e dos professores à execução dos projetos e à necessidade de aqueles se atualizarem a estes. Por isso, muitos deram origem aos Centros de Ciências, os quais, permanentemente, analisavam o material didático existente, planejavam o novo, selecionavam os conteúdos, definiam a sua sequência, sua forma e a sua apresentação (p.27).

As inovações, entretanto, não provocaram as mudanças esperadas no ensino de

ciências. Os centros de ciências passaram a diversificar suas atividades, contribuindo tanto

na produção de material didático quanto na promoção de cursos de treinamento e

atualização de professores.

Krasilchik (1987) ressalta a relevância de dois eventos que, nos anos de 1960,

divulgaram a psicologia cognitivista e marcaram, de forma significativa, o ensino de

34 Curso equivalente ao segundo segmento do ensino fundamental (6º ao 9º ano), de acordo com a LDB nº 9394/96.

Page 45: Dissertação míriam moreira duque

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Ciências: a publicação da obra The Process of Education de J. Bruner (1963) e o encontro

promovido pelas Universidades de Cornell e da Califórnia denominado “Piaget

Redescoberto”. A publicação de Bruner foi produzida a partir de uma conferência realizada

no final dos anos de 1950, em que os temas educacionais, como currículo e motivação da

aprendizagem, foram tratados sob o enfoque cognitivista.

Os eventos promovidos pelas universidades americanas, ao abordarem o

desenvolvimento curricular juntamente com os estudos cognitivistas, produziram efeitos

que se evidenciaram nas décadas seguintes.

No Brasil, as mudanças políticas ocorridas nos anos de 1960 trouxeram

transformações na concepção de escola e no papel da ciência. O país passava por um

período de modernização e desenvolvimento, o que gerava a necessidade de mão de obra

qualificada. Sob a égide da Lei no 5692/71, que fixava as diretrizes e bases para o ensino

de 1º e 2º graus, a educação passou a ter por finalidade a formação do cidadão e a

preparação para o trabalho.

Essa nova lei determinou a obrigatoriedade do ensino de Ciências no primeiro e

segundo graus. No 2º grau35, entretanto, com a determinação legal da qualificação para o

trabalho, as disciplinas científicas receberam a abordagem profissionalizante.

Krasilchik apud Paiva (2008, p.28) critica essa lei, ressaltando que esta, em vez de

valorizar as disciplinas científicas, acabou por descaracterizá-las quando as fragmentou em

diversas disciplinas profissionalizantes.

O ensino de Ciências vai ganhando importância à medida que o desenvolvimento

científico e tecnológico conquista reconhecimento como elemento estratégico para o

processo de desenvolvimento econômico, cultural e social de uma nação.

35 Nível de escolaridade equivalente ao Ensino Médio na atual LDB no 9394/96.

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A partir dos anos de 1980, com alguns anos de atraso em relação ao contexto

internacional, as obras de autores interacionistas começam a ser debatidas e apropriadas

por educadores brasileiros, sobretudo as contribuições de Jean Piaget. Com a disseminação

das teorias construtivistas, promove-se a discussão em torno de novas propostas para o

ensino de Ciências, calcadas na adoção de novas metodologias de ensino. O ensino de

Ciências passa a ter como princípio norteador da prática o desenvolvimento do pensamento

lógico-crítico.

Dessa forma, mesmo sem novas prescrições legais ou qualquer modificação na

LDB em vigor à época, as temáticas abordadas nas escolas e as metodologias de trabalho

no ensino de Ciências foram sofrendo alterações.

As crises, social e energética e os problemas ambientais, causadas pelo

desenvolvimento, marcavam também esse período, resultando no desenvolvimento da

ecologia. Emerge, nessa época, uma preocupação em discutir as implicações sócio-

ambientais geradas pelo desenvolvimento científico-tecnológico. Essas discussões

repercutem na escola básica, que agrega mais um objetivo ao ensino de Ciências, a

educação ambiental.

A Conferência Mundial de Educação para Todos36, realizada no ano de 1990, em

Jomtien, na Tailândia, juntamente com a declaração de Nova Delhi, assinada pelos países

em desenvolvimento, que possuem os maiores contingentes populacionais, foram eventos

que determinaram posições consensuais na luta pela ampliação das oportunidades de

aprendizagem para todos. A partir do esforço empreendido, os países seriam “capazes de

tornar universal a educação fundamental e ampliar as oportunidades de aprendizagem para

crianças, jovens e adultos” (BRASIL, PCN, 1997, v.1, p.14).

36 Conferência organizada pela UNESCO, UNICEF, PNUD e Banco Mundial.

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Os compromissos assumidos internacionalmente levaram o governo federal

brasileiro a coordenar a elaboração do Plano Decenal de Educação Para Todos (1993-

2003), um conjunto de diretrizes políticas, voltadas para a garantia da igualdade de acesso

e recuperação da qualidade da escola pública. Esse plano, em conformidade com o texto

constitucional de 1988, afirma:

(...) a necessidade e a obrigação de o Estado elaborar parâmetros claros no campo do currículo, capazes de orientar as ações educativas do ensino obrigatório, de forma a adequá-los aos ideais democráticos e à busca da melhoria da qualidade do ensino nas escolas brasileiras (BRASIL, PCN,1997, v.1, p.15).

Nesse contexto, é aprovada a nova Lei de Diretrizes e Bases no 9394/96. O texto da

Lei busca retratar uma nova fase da educação brasileira, consolidando e ampliando o dever

do Estado para com a educação, especialmente no Ensino Fundamental, e assegurando a

todos a formação indispensável para o exercício da cidadania.

Art. 22 - A educação básica tem por finalidades desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores (BRASIL, 1996).

Percebe-se que a preparação para o trabalho aparece na nova lei, mas de forma

flexível. A formação da cidadania como finalidade específica, também passa a ser

abordada no ensino de Ciências, o que contempla o movimento CTS (Ciência Tecnologia e

Sociedade).

Como parte do esforço governamental no sentido de implementar novas orientações

para o currículo da educação básica, o governo federal, por meio do MEC, elaborou os

Parâmetros Curriculares Nacionais37. Os PCN de 1ª à 4ª série, contêm recomendações que

sugerem aos professores que concentrem a atenção na qualidade do ensino e da

37 Os PCN do Ensino Fundamental estão organizados em dez volumes: 1- volume introdutório; 2-Língua Portuguesa; 3- Matemática; 4- Ciências Naturais; 5- História e Geografia; 6- Artes; 7- Educação Física; 8- Apresentação dos Temas Transversais e Ética; 9- Meio Ambiente e Saúde; 10- Pluralidade Cultural e Orientação Sexual.

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aprendizagem. Destaca-se, no conteúdo dos PCN, a proposta de encaminhamento

metodológico numa perspectiva cognitivista, fundamentada em teorias construtivistas.

Considera-se que a adoção dessa perspectiva figura na redação desses documentos oficiais

de forma impositiva.

Reexaminando o conceito de Ciência na perspectiva da nova lei, verifica-se que

este encontra-se associado ao compromisso social. A preocupação com a qualidade da

“escola para todos” inclui um novo componente no vocabulário e nas preocupações dos

educadores, a “Alfabetização Científica”. No interior do movimento “Ciências para todos”,

surge o enfoque que relaciona o ensino de Ciências à vida diária e à experiência do aluno.

Nesse contexto, temas como a exclusão social, a luta pelos direitos humanos e a

conquista da melhora da qualidade de vida não podem ficar à margem dos currículos. Pela

demanda da justiça social, muitas das temáticas anteriormente ligadas exclusivamente ao

ensino de Ciências são consideradas temas transversais nos Parâmetros Curriculares:

educação ambiental, educação sexual e saúde. A tradição escolar, entretanto, ainda confere

a responsabilidade de seu ensino às Ciências.

Na atualidade, são amplamente discutidos os domínios da educação científica,

evocando processos pedagógicos que, como no dizer de Santos:

(...) busquem formas de contextualização do conhecimento científico em que alunos o incorporem como um bem cultural que seja mobilizado em sua prática social. Propiciar, portanto, a educação científica como um processo de domínio cultural dentro da sociedade tecnológica, em que a linguagem científica seja vista como ferramenta cultural na compreensão de nossa cultura moderna, é o grande desafio na renovação no ensino de Ciências (SANTOS, 2007, p.487).

Essas discussões sucintamente apresentadas repercutiram na organização dos

currículos da educação básica. Nessa direção, observam-se, na proposta delineada no

Colégio Pedro II, a preocupação com os processos ativos de construção da aprendizagem e

o esforço na busca de formas de contextualização do conhecimento científico.

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CAPÍTULO 3 - ATIVIDADE PRÁTICA NO ENSINO DE CIÊNCIAS

No contexto atual de transformações rápidas, que afetam diversos aspectos da vida

cotidiana, o desenvolvimento científico-tecnológico coloca para a sociedade demandas que

promovem novas exigências educacionais, com desdobramentos na relação entre educação,

ciência, desenvolvimento e exercício da cidadania.

Nesse cenário, a ciência é deslocada do espaço das certezas e despida da capa

inquestionável da neutralidade, desafiando os docentes na elaboração de propostas

didático-metodológicas que deem conta de superar o modelo pedagógico tradicional, em

que o ensino de Ciências foi delineado numa abordagem teórica e expositiva (SANTOS,

2007).

Neste capítulo, são debatidas as perspectivas recentes trazidas para o campo do

ensino de Ciências. Assim, focando o novo paradigma que emerge nesse campo de estudo,

é discutida a necessidade de reestruturação do trabalho pedagógico com a finalidade de

viabilizar a educação científica na perspectiva da alfabetização científica. É colocado

também, para o debate, o papel da “atividade prática” na reformulação metodológica

necessária ao ensino de Ciências.

3.1 Ciência, Tecnologia e Alfabetização Científica

A atividade científica pode ser considerada, na atualidade, uma das principais

realizações do homem contemporâneo, e, sem temer, se poderia afirmar que essa atividade,

mais que qualquer outra, pôde distinguir o século XX daqueles que o antecederam.

A incontestável natureza social da Ciência, que a transforma em produção cultural

da humanidade, não garante, entretanto, que os benefícios dela oriundos sejam distribuídos

de forma justa e democrática:

Page 50: Dissertação míriam moreira duque

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Os benefícios da Ciência são, no entanto, distribuídos assimetricamente entre os países, grupos sociais e sexos. O desenvolvimento científico tornou-se um fator crucial para o bem estar social a tal ponto que a distinção entre povo rico e pobre é hoje feita pela capacidade de criar ou não o conhecimento científico (UNESCO, 2000, apud ZANCAN, 2000, p.3).

No que se refere à tecnologia, esta reflete e molda o sistema de valores e estende as

habilidades humanas para mudar o mundo. No dizer de Zancan (2000), a tecnologia é uma

força poderosa no desenvolvimento da civilização. A autora ressalta que, ao se tornarem

sofisticadas, as produções tecnológicas estreitam a ligação com a Ciência, tornando difícil,

em alguns campos, separar uma da outra. Em função de a tecnologia afetar mais

diretamente o sistema social e cultural do que as pesquisas científicas, as implicações

imediatas de seus sucessos e fracassos refletem-se mais diretamente na atividade humana.

Por esse motivo, “a ciência e a tecnologia devem ser dirigidas para aumentar a

competitividade, o emprego e a justiça social” (UNESCO apud ZANCAN, 2000, p.3).

De acordo com Zancan (op. cit, p.3), apenas “15% da população mundial fornece

todas as inovações tecnológicas produzidas pelo homem. Mais da metade da população do

planeta está apta a adotar as tecnologias para produção e consumo”. Há ainda, como

restante, a população tecnologicamente excluída, que vive nos países periféricos,

concentrados em sua maioria nos trópicos e imersos na pobreza. A esse respeito, a autora

continua. enfatizando que é: “hoje reconhecido que a tecnologia é mais excludente que o

capital e, juntamente com a Ciência, define o futuro de um povo”.

Nesse contexto, cresce o movimento em prol da renovação do ensino de Ciências,

voltado para a educação científica. Considerando a dificuldade de compreensão do mundo

atual sem o auxílio dos conhecimentos básicos de ciência e tecnologia, é urgente, no dizer

de Santos, “analisar o papel da educação científica na formação do cidadão” (2007, p.475).

Page 51: Dissertação míriam moreira duque

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3.2 Educação Científica

Tradicionalmente, os currículos escolares de Ciências das séries iniciais do EF

estão configurados de forma conteudística, baseada na memorização de uma grande

quantidade de fatos descontextualizados e sem relacionamento com a vida cotidiana do

discente. Assim sendo, para que os conhecimentos escolares possam servir de subsídio

para a fundamentação de raciocínio crítico e para a tomada de decisões conscientes no que

diz respeito à vida em sociedade, torna-se essencial reorganizar o currículo. Como destaca

Chassot (2000, p. 27), “a nossa responsabilidade maior em ensinar Ciência é procurar que

nossos alunos e alunas se transformem, com o ensino que fazemos, em homens e mulheres

mais críticos.”

Na atualidade, no campo do ensino de Ciências, são desenvolvidos estudos sobre

educação científica na perspectiva da alfabetização científica (AC) ou do letramento

científico (LC). Aos termos AC/LC têm sido, contudo, atribuídas definições e concepções

diferentes. Para Norris e Philips (2003), apud Santos (2007, p.478), seria possível dividi-

los em dois grandes grupos de categorias: “um que incorpora as teses relativas à

especificidade do conhecimento científico, e outro que abrange as categorias relativas à

função social deste conhecimento”. Dessa forma, pode-se depreender que uma se refere ao

conhecimento e ao desenvolvimento de habilidades da atividade científica, e outra que diz

respeito a conhecimentos, habilidades e valores relacionados à função social da atividade

científica, incluindo categorias de natureza cultural, prática e democrática.

Tendo em vista as preocupações deste estudo com os encaminhamentos

necessários para a reformulação do ensino de Ciências, na perspectiva da educação

científica, não há como deixar de considerar algumas contribuições significativas

elaboradas por diversos autores do cenário nacional ou internacional sobre AC/LC.

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Para Sasseron e Carvalho (2008), no exame da literatura nacional, é possível

perceber que, no cerne das discussões levantadas pelos pesquisadores que utilizam o termo

“Letramento Científico” (MAMEDE e ZIMMERMANN, 2007; SANTOS e MORTIMER,

2001) e pelos pesquisadores que adotam o termo “Alfabetização Científica” (BRANDI e

GURGEL, 2002; AULER e DELIZOICOV, 2001; LORENZETTI e DELIZOICOV, 2001;

CHASSOT, 2000), encontram-se as mesmas preocupações com o ensino de Ciências. Ou

seja, com as razões que orientam o planejamento desse ensino para a construção de

benefícios práticos para as pessoas, a sociedade e o meio ambiente.

As autoras, ao comentarem a utilização dos termos por pesquisadores

internacionais, destacam que:

[...] na literatura estrangeira, percebemos também uma variação no uso do termo que define o ensino de Ciências preocupado com a formação cidadã dos alunos para ação e atuação em sociedade. Os autores de língua espanhola costumam utilizar a expressão “Alfabetización Científica” (Díaz, Alonso e Mas, 2003, Cajas, 2001, Gil-Pérez e Vilches-Peña, 2001); nas publicações em língua inglesa, aparece o termo “Scientific Literacy” (Norris e Phillips, 2003, Laugksch, 2000, Hurd, 1998, Bybee, 1995, Bingle e Gaskell, 1994, Bybee e DeBoer, 1994); e, nas publicações francesas, encontramos o uso da expressão “Alphabétisation Scientifique” (FOUREZ, 2000, 1994, ASTOLFI, 1995).

Os pesquisadores brasileiros, que utilizam o termo Letramento Cientifico,

justificam sua escolha amparados na contribuição das pesquisadoras Kleiman e Soares.

Segundo a última estudiosa, a alfabetização é o “resultado da ação de ensinar ou aprender a

ler e escrever: estado ou condição que adquire um grupo social ou um indivíduo como

consequência de ter-se apropriado da escrita” (SOARES, 1998, p.18). Kleiman (1995,

p.19) comenta sobre a complexidade do conceito, mas adota sua definição como sendo o

“conjunto de práticas sociais que usam a escrita enquanto sistema simbólico e enquanto

tecnologia, em contextos específicos para objetivos específicos”.

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53

Retomando Soares, para quem o termo alfabetização tem sido empregado com

sentido restrito à ação de ler e escrever, o termo letramento define o “estado ou condição

de quem não apenas sabe ler, mas cultiva e exerce práticas que usam a escrita” (1998,

p.47). Em consonância com essa definição da autora, um indivíduo que sabe ler e escrever

pode não ser letrado, se não puder fazer uso social da leitura, se, apesar ler (decodificar),

não é capaz de compreender a mensagem das notícias dos jornais, ou não é capaz de

escrever e interpretar ordens ou avisos escritos. A autora considera que o contrário pode

ocorrer, uma pessoa não alfabetizada poderia ser considerada letrada se, em seu cotidiano,

tiver acesso a informações do mundo letrado, por meio de pessoas que utilizem por ela os

instrumentos de leitura e escrita, colocando-a na sociedade de forma que esteja apta à

execução de práticas sociais.

Chassot (2000), apesar de considerar inadequado o termo Alfabetização Científica,

acaba adotando-o, mas com o mesmo sentido atribuído ao Letramento Científico por

Soares (1998). O autor justifica sua escolha pelo fato de o vocábulo “letramento” não ser

dicionarizado.

Krasilchik e Marandino (2004), apud Santos (2007, p. 479), entendem que o termo

Alfabetização Científica já se consolidou na prática e, nesse sentido, as autoras consideram

que a alfabetização já engloba a ideia de letramento. Assim, Alfabetização Científica, para

Krasilchik e Marandino (2004, p.26), é definida como “capacidade de ler, compreender e

expressar opiniões sobre ciência e tecnologia”, sentido que se aproxima da definição de

Chassot (2000, p. 34), que define o termo como “conjunto de conhecimentos que

facilitariam aos homens e mulheres fazer uma leitura do mundo em que vivem”.

Sasseron e Carvalho utilizam a expressão “Alfabetização Científica” baseadas na

ideia de alfabetização concebida por Paulo Freire. As autoras destacam que, para o

pedagogo:

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54

“a alfabetização é mais que o simples domínio psicológico e mecânico de técnicas de escrever e de ler. É o domínio destas técnicas em termos conscientes. (...) Implica numa autoformação de que possa resultar uma postura interferente do homem sobre seu contexto.” (p.111, 1980). Assim pensando, a alfabetização deve possibilitar ao analfabeto a capacidade de organizar seu pensamento de maneira lógica, além de auxiliar na construção de uma consciência mais crítica em relação ao mundo que o cerca (2008, p.334).

Mesmo reconhecendo a tendência, de um número significativo de autores, em

considerar especificidades que justifiquem a diferenciação entre os termos AC/LC, neste

trabalho foi adotado o termo Alfabetização Científica, por se entender que, na atualidade, o

que mudou foi a concepção social da alfabetização. Entende-se que o se requer de uma

pessoa alfabetizada hoje em dia é bem diferente do que lhe seria exigido nos anos de 1950,

meados do século XX. Do ponto de vista do uso social da escrita, o mundo contemporâneo

exibe uma complexidade cada vez maior de circunstâncias de uso da leitura e da escrita, de

modo que estas se tornam cada vez mais frequentes e variadas. O processo de alfabetização

permite ao indivíduo que a ele se submete transitar, com eficiência e sem temor, numa

intrincada trama de práticas sociais ligadas às atividades de leitura e escrita.

Na mesma perspectiva, ao se adotar o termo AC, entende-se que o indivíduo

alfabetizado cientificamente estará igualmente apto a atuar de forma consciente nos

diversos espaços sociais por onde transita, optando por práticas coerentes com os valores

relacionados à função social da atividade científica. Ainda nessa direção, espera-se que ele

seja capaz de produzir e interpretar textos, fatos, notícias, decisões políticas, etc. nos mais

variados graus de dificuldade, posicionando-se em virtude de propósitos igualmente

variados que a vida em sociedade exige.

Para Santos (2007), o conceito de alfabetização científica está presente na literatura

da educação científica, isto porque o indivíduo a ela submetido não seria aquele que

domina os termos e fórmulas científicas, mas aquele que conseguiria

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55

[...] compreender satisfatoriamente as especificações de uma bula de um medicamento; adotar profilaxia para evitar doenças básicas que afetam a saúde pública; exigir que as mercadorias atendam às exigências legais de comercialização, como especificação de sua data de validade, cuidados técnicos de manuseio, indicação dos componentes ativos; operar produtos eletroeletrônicos etc. Além disso, essa pessoa saberia posicionar-se, por exemplo, em uma assembleia comunitária para encaminhar providências junto aos órgãos públicos sobre problemas que afetam a sua comunidade em termos de ciência e tecnologia (p. 480).

Para o autor, outro valor que recentemente tem sido agregado à concepção de AC é

o cultural. Nessa perspectiva, o conhecimento científico é considerado parte da cultura

humana, que possui processos próprios de produção de conhecimentos que resultam da

atividade da mente por meio do desenvolvimento de atividades específicas e

preponderantemente de natureza experimental.

Na atualidade, o modelo de ensino de Ciências predominante no cenário

educacional brasileiro demanda a elaboração de um novo perfil curricular que incorpore

ações pedagógicas que superem as atuais, sem o quê estaria inviabilizada a educação

científica na perspectiva da AC. Mesmo sendo vastos os domínios em que as mudanças

metodológicas precisam ser implantadas, Santos (2007, p. 483) afirma que três aspectos

vêm sendo amplamente considerados: a natureza da ciência, a linguagem científica e os

aspectos sócio-científicos. Esses aspectos relacionam domínios que necessariamente

precisam ser incorporados às práticas docentes no ensino de Ciências.

Quanto à natureza da ciência, Santos (2007) entende que aprender ciência implica

compreender como os cientistas trabalham e quais as limitações de seu campo de estudo,

daí a indicação de inserir conhecimentos de história, filosofia e sociologia da ciência. Mais

que acrescentar conteúdos ao extenso plano da disciplina, a inclusão desses conhecimentos

é essencial para que o discente entenda a ciência com a limitação de uma atividade humana

e não como atividade neutra, asséptica, descolada da realidade sócio-cultural da

humanidade. Essa compreensão da noção da provisoriedade e da incerteza das teorias

Page 56: Dissertação míriam moreira duque

56

científicas permite derrubar a visão de que o conhecimento científico é algo estático,

acabado, definitivo.

Quanto à linguagem científica, Santos (2007, p.484) cita o trabalho de Mortimer

(1998), que, apropriando-se dos estudos de Halliday e Martin (1993) e de Bakthin (1992,

1997), “demonstra que a linguagem científica é um gênero discursivo que foi construído

socialmente pelos cientistas em sua prática”. Para Mortimer (1998), apud Santos (2007,

p.484), enquanto a linguagem científica é estrutural e aparentemente descontextualizada,

sem narrador, nominalizando processos, a linguagem cotidiana é linear, automática,

dinâmica, geralmente produzida por um narrador em uma sequência de eventos.

Estudos realizados por pesquisadores nessa área demonstram que há uma

peculiaridade no gênero discursivo científico que o torna árido e pouco familiar aos alunos.

Estudiosos ressaltam que o discurso científico frequentemente recorre à utilização de

esquemas, gráficos, diagramas e tabelas, além da interpretação de fórmulas. Sendo assim, o

ensino de Ciências, na perspectiva da AC, deve auxiliar o aluno na construção de discurso

argumentativo científico, que possa diferir da argumentação do senso comum.

Entretanto, o ensino de Ciências não tem investido na Alfabetização Científica. O

processo de memorização de vocábulos, de sistemas classificatórios e de fórmulas, que

caracteriza o trabalho na área, não tem auxiliado o aluno a se apropriar do significado da

linguagem científica, não permitindo ao discente fazer uso da argumentação científica.

No tocante aos aspectos sociocientíficos, a inserção de currículos numa abordagem

CTS, com a função de problematizar as questões sociais, marcou a preocupação inicial dos

educadores e pesquisadores. Recentemente, há a orientação para que os aspectos

sociocientíficos sejam abordados na perspectiva de se ampliar a compreensão do discente

acerca da natureza da atividade científica e da argumentação, além de fornecer elementos

que possibilitem a reflexão crítica de valores.

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57

Santos (2007) destaca que o ensino de Ciências tem sido frio, apático, absoluto,

inquestionável. Na maioria das vezes, é desenvolvido com base em atividades

descontextualizadas, por meio de resoluções de problemas ou questões que não requerem

compreensão e domínio de conceitos mais amplos.

A educação científica na perspectiva da AC deve ser concebida como produção

cultural humana. Sob esse enfoque, seria possível promover numa nova paginação

curricular e metodológica que aproximasse o conteúdo de Ciências desenvolvido na escola

da experiência cotidiana do aluno, de tal forma que ele pudesse ver “ciência” no parque, no

quintal de sua casa, na padaria...

O ensino de Ciências deve oferecer ao discente experiências que viabilizem a

familiaridade com elementos do universo cultural produzido pela ciência. Nessa

perspectiva, como recursos didáticos nas aulas de Ciências, devem ser utilizados: artigos

informativos, jornais, artigos científicos, bulas de remédio, rótulos, manuais técnicos,

programas de televisão, filmes, visita a espaços não formais de educação38 etc.

Reconhecer a educação científica como processo em que a linguagem científica

seja instrumento na construção de sentidos para a leitura de mundo, é um grande desafio

para o ensino de Ciências, sobretudo ao se considerar que o Brasil é um país onde a

população de iletrados na própria língua nacional alcança proporções alarmantes. Assim, a

demanda da alfabetização científica torna-se significativamente superior, constituindo-se

em um objetivo difícil e distante de ser alcançado. Para Santos (2007, p.488), a capacidade

de compreensão de modelos científicos talvez não se venha consolidando nem mesmo nos

cursos de graduação em Ciências, que, em geral, mais enfatizam domínio vocabular e

38 Nesse sentido, Krapas & Rebello (2001, p. 70) afirmam que os espaços de educação não formal têm importante papel no processo de socialização da ciência. Marandino (2006), Leal & Gouveia (2002) apud Santos (2007, p. 487) recomendam que esses espaços deixem de ser usados como espaços de contemplação, mas que atendam ao papel de socializar a ciência.

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58

resolução de problemas do que compreensão da natureza da atividade científica. Daí o

autor afirmar que:

Dentro desses dois extremos de pobreza formativa e mito utópico de letramento ideal, existe um espaço curricular a ser ocupado por meio de ações educativas transformadoras em sala de aula, que está no resgate da função social da educação científica. Para isso, não são necessários laboratórios sofisticados, grade horária ampliada e incorporação de novos conteúdos, mas sim mudanças de propósitos em sala de aula (SANTOS, 2007, p.488).

Dessa forma, a concepção de educação científica, na perspectiva da AC, remete à

necessidade de ressignificar as práticas educativas em todos os níveis da educação formal,

sobretudo nas séries iniciais da educação básica. Nesse contexto, dentre as mudanças que

precisam ser promovidas, coloca-se a necessidade de revisão das propostas de atividades

práticas, que pode apontar o início da necessária ruptura com o ensino de memorização

vocabular, que tem caracterizado o ensino de Ciências ao longo da história.

3.3 Atividades Práticas

A exemplo do que ocorre com os conceitos de alfabetização e letramento

científicos, a expressão “atividade prática” no ensino de Ciências também apresenta

sentidos diferentes. Assim, Dourado (2000, p.13) destaca que uma leitura superficial

poderia levar à compreensão errônea da expressão atividade prática, considerada como

sinônimo de “trabalho laboratorial”, “trabalho experimental” ou ainda “trabalho de

campo”. O autor aponta a necessidade de delimitar o campo específico para cada uma

dessas modalidades de trabalho em Ciências, destacando que “existe um certo grau de

ingenuidade” na suposição de que o trabalho prático implica necessariamente trabalho de

laboratório.

Assim, no dizer de Hodson (1998), apud Dourado (2000, p.13), “trabalho prático,

enquanto recurso didáctico à disposição do professor, inclui todas as actividades em que o

aluno esteja activamente envolvido (no domínio psicomotor, cognitivo e afectivo)”. Nessa

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59

perspectiva, a definição de atividade prática é mais abrangente, podendo nela inserir-se

também o trabalho laboratorial e o trabalho de campo, cujo critério distintivo corresponde

ao local de realização da atividade.

A concepção de trabalho experimental para Dourado (2000) envolve experiências

em que necessariamente há critérios de controle e manipulação de variáveis. O que

distingue uma atividade experimental de uma não experimental é a metodologia adotada. É

possível verificar, a partir das definições apresentadas por Dourado (2000), que as

diferenças apresentadas entre os conceitos não são de natureza idêntica, o que impede que

“se excluam entre si”. Dessa forma, é possível encontrar trabalho laboratorial que não é

experimental e trabalho laboratorial experimental, da mesma forma que é possível ter um

trabalho de campo experimental ou não.

A despeito das discussões acima levantadas, o que se verifica é que a literatura

disponível no campo do ensino de Ciências refere-se às atividades práticas como atividades

experimentais de forma genérica.

Neste trabalho, foi utilizada a expressão “atividades práticas” para designar as

atividades desenvolvidas nos laboratórios de Ciências do Pedrinho.

Na atualidade, a importância das atividades práticas no ensino de Ciências é

ressaltada pelos diversos atores envolvidos no processo educacional. Contudo, a utilização

curricular da atividade prática comumente designada como trabalho experimental envolve

contradições.

Nos últimos anos, as teorias acerca da natureza do processo de aquisição do

conhecimento apontam a necessidade de reformulação das práticas pedagógicas. Entre elas

é suscitada também a reformulação das atividades práticas no ensino de Ciências, de modo

que sua inserção no currículo da disciplina seja coerente com esses novos referenciais

teóricos. Moreira, Caballero e Neves (2006, p.385) destacam que a evolução do papel da

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60

experimentação, no ensino de Ciências, recebeu contribuições importantes no campo da

psicologia, especialmente da “teoria da aprendizagem significativa”.

Segundo esses autores, (2006, p. 385) o trabalho experimental evoluiu através do

tempo, de modo que é possível identificar três fases distintas do trabalho experimental no

ensino de ciências: uma fase introdutória, delimitada entre o início do século XX até

meados do mesmo século, quando “registra-se a exploração de ideias para protocolos

experimentais e seu aperfeiçoamento” (op. cit. p.385).

Num segundo momento, a partir dos anos de 1960, no contexto de desenvolvimento

de projetos curriculares como o PSSC e Nuffield,o laboratório adquiriu uma posição de

destaque no ensino das Ciências. Nessa fase, os métodos científicos eram considerados tão

importantes quanto os próprios conhecimentos científicos. (BYBEE e DEBOER, 1994,

apud MOREIRA, CABALLERO e NEVES, 2006).

Na terceira fase destacada pelos autores, o trabalho experimental é considerado um

recurso “facilitador de aprendizagem”. Subjacentes ao modelo curricular das reformas

educacionais implantadas nos anos de 1980 e de 1990, estão as teorias psicopedagógicas de

Piaget, Bruner e Ausubel.

Ainda sobre a contribuição da psicologia da aprendizagem, os autores destacam a

contribuição de Ausubel sobre a Aprendizagem Significativa39. Moreira, Caballero e Neves

(2006, p. 386) comentam que Ausubel reconhece vantagens no ensino por descoberta,

apontando alguns aspectos positivos do trabalho experimental no ensino de Ciências, desde

que “não seja utilizado de forma rotineira e redutora”, admitindo, dessa forma, que “o

trabalho experimental tem potencialidades, e pode proporcionar aos alunos a oportunidade

de se relacionarem com os processos científicos”. 39 Segundo Ausubel, a aprendizagem significativa é o processo pelo qual uma “nova informação se relaciona, de maneira não arbitrária e não literal, com um aspecto relevante da estrutura de conhecimento do indivíduo”. (MOREIRA e BUCHWEITZ, 1993, apud MOREIRA, CABALLERO e NEVES 2006, p. 386).

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Moreira, Caballero e Neves (op. cit. , p. 386) trazem também a contribuição de

Novak (2000) para a compreensão das atividades práticas no ensino de Ciências. O autor

destacou a interdependência entre professor, aluno, conhecimento, contexto e avaliação na

Aprendizagem Significativa. Para Novak, a aprendizagem é produto de “uma negociação e

partilha de significados, estando subjacente à integração construtiva do Pensamento,

Sentimento e Acção (NOVAK, 2000a, p. 13, apud MOREIRA, CABALLERO e NEVES

2006, p. 386).

Moreira (2000) traz um avanço para o tema ao afirmar que “o fator isolado mais

importante para a aprendizagem é o conhecimento prévio, a experiência prévia, e o

aprendiz deve manifestar uma predisposição para relacionar de maneira não arbitrária e

não liberal o novo conhecimento com o conhecimento prévio” (p. 62). Parafraseando

Postman e Weingartner (1969), Moreira (2000) afirma que o foco do professor que deseja

eficiência na aprendizagem deve estar na “aprendizagem significativa subversiva, ou

crítica”, que poderia ser entendida como:

Aquela que permitirá ao sujeito fazer parte de sua cultura e, ao mesmo tempo, estar fora dela, manejar a informação, criticamente, sem sentir-se impotente frente a ela; usufruir a tecnologia sem idolatrá-la; mudar sem ser dominado pela mudança; conviver com a incerteza, a relatividade, a causalidade múltipla, a construção metafórica do conhecimento, a probabilidade das coisas, a não dicotomização das diferenças, a recursividade das representações mentais; rejeitar as verdades fixas, as certezas, as definições absolutas, as entidades isoladas.

Moreira (2000) ressalta a necessidade de se corrigir o foco das atividades docentes

em geral, incluindo-se também as atividades experimentais40. Nessa direção, o autor afirma

que no ensino de Ciências “ainda se ensinam ‘verdades’, respostas ‘certas’, entidades

isoladas, causas simples e identificáveis, estados e ‘coisas’ fixos, diferenças somente

dicotômicas” (MOREIRA, 2000, p. 49). Outro aspecto criticado é a falta de estímulo ao 40 Moreira refere-se ao termo mencionando as contribuições de Postman e Weingartner no último capítulo do livro Teaching as a subversive activity (1969), em que os autores denunciavam que a escola ainda se ocupava de ensinar conceitos fora de foco.

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questionamento, quando o professor “transmite” o conhecimento. O autor denuncia a

incoerência entre o discurso educacional e a prática educativa: “O discurso educacional

pode ser outro, mas a prática educativa continua a não fomentar o ‘aprender a aprender’

que permitirá à pessoa lidar frutiferamente com a mudança, e sobreviver” (p. 49). Nesse

quadro, segundo Moreira (2000), ao invés de contribuir para que os discentes construam

significados para conceitos importantes no ensino de Ciências, como: “relatividade,

probabilidade, incerteza, sistema, função, assimetria, causalidade múltipla, graus de

diferença, representações, modelos”, a educação agregou “novos conceitos fora de foco à

lista de Postman e Weingartner”. Dentre os novos conceitos citados por Moreira (2000),

destacam-se:

1. O conceito de informação como algo necessário e bom; quanto mais informação, melhor, estamos em plena era da informação. 2. O conceito de idolatria tecnológica; a tecnologia é boa para o homem e está necessariamente associada ao progresso e à qualidade de vida. 3. O conceito de consumidor cônscio de seus direitos; quanto mais consumir melhor, quanto mais objetos desnecessários comprar melhor, mas deve fazer valer seus direitos de consumidor (p. 49).

Apontando a escola como instituição que transmite a ilusão da certeza, Moreira

(2000) também a denuncia como formadora de indivíduos para a sociedade de consumo.

De acordo com o autor, esse processo estaria implícito no esforço empreendido pela escola

para atualizar-se tecnologicamente e competir com outros mecanismos de difusão da

informação. Vendo a realidade atual como “tudo fora de foco“, Moreira (2000, p. 49)

propõe “a aprendizagem significativa crítica, como estratégia de sobrevivência na

sociedade contemporânea”. O argumento de Moreira, quando propõe oito princípios a

serem inseridos na prática pedagógica, visa preparar os alunos para lidarem com os

problemas de um mundo em rápida transformação, aceitando dúvidas e limitações. E, em

relação aos docentes, visa fazê-los refletir sobre as suas práticas de modo que sintam

necessidade de romper com a rotina e criar novas estratégias que promovam a

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63

Aprendizagem Significativa, inclusive nas atividades práticas. Para dar conta de tal

demanda, Moreira (2000) recomenda os seguintes princípios:

1. Aprender/ensinar perguntas ao invés de respostas (Princípio da interação social e do questionamento)2. Aprender a partir de distintos materiais educativos (Princípio da não centralidade do livro de texto).3. Aprender que somos perceptores e representadores do mundo (Princípio do aprendiz como perceptor/representador). 4. Aprender que a linguagem está totalmente implicada em qualquer e em todas as tentativas humanas de perceber a realidade (Princípio do conhecimento como linguagem). 5. Aprender que o significado está nas pessoas, não nas palavras (Princípio da consciência semântica). 6. Aprender que o homem aprende corrigindo seus erros (Princípio da aprendizagem pelo erro). 7. Aprender a desaprender, a não usar conceitos e estratégias irrelevantes para a sobrevivência (Princípio da desaprendizagem). 8. Aprender que as perguntas são instrumentos de percepção e que definições e metáforas são instrumentos para pensar

(Princípio da incerteza do conhecimento). (op. cit. , p. 49).

Para Moreira, Caballero e Neves (2006), isso é importante, sobretudo no trabalho

prático. Os autores afirmam que o laboratório parece ser o local privilegiado para refletir

sobre situações problemáticas, exercitando o pensamento crítico e a criatividade. Nessa

perspectiva, para que o ensino de Ciências possa atingir os objetivos propostos pela

educação científica na perspectiva da alfabetização científica, faz-se necessária a obtenção

de dados significativos, recorrendo-se à experimentação.

Hodson (1988, p. 53) destaca que “é preciso admitir, no entanto, que a defesa do

oferecimento extensivo de trabalho em laboratório é feito mais na base de ‘sentimentos

profissionais’ fortes sobre seu valor do que com base em pesquisas empíricas acerca de sua

efetividade”. Segundo o autor, há evidências de pesquisas sugerindo que o trabalho prático

pode ser “amplamente improdutivo”. Isso porque o status adquirido pelos experimentos no

ensino de Ciências deve-se ao fato de os professores acreditarem que a ampla utilização

destes na ciência os condicionaria também a considerá-los como “parte necessária e

integral no ensino de Ciências”. O autor destaca que dois pressupostos poderiam ser

aceitos como “responsáveis” pela falta de produtividade das atividades práticas no

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currículo escolar: o primeiro diz respeito ao papel dos experimentos na ciência e no ensino

de Ciências, que não podem ser considerados idênticos, e o segundo seria a compreensão

do papel do próprio experimento na atividade pedagógica, que tem sido problemático.

Os produtos pedagógicos que resultam da aplicação desses pressupostos na

elaboração curricular do ensino de Ciências, especialmente daqueles que dizem respeito ao

trabalho prático, na opinião de Hodson (1987), apud Hodson (1988 p. 54), “são mal

concebidos, confusos e de pouco valor educacional”. O autor ressalta que não defende a

exclusão do trabalho prático do currículo escolar, “mas uma reforma na prática atual,

baseada em uma reavaliação crítica dos papéis do trabalho prático (...) no ensino de

Ciências”.

Dessa forma, segundo o autor, “qualquer método didático que requeira que o

aprendiz seja ativo, mais do que passivo, está de acordo com a crença de que os alunos

aprendem melhor pela experiência direta. Sendo assim, o trabalho prático nem sempre

precisa incluir atividades de laboratório”. Por isso, para Hodson (1988), sob a designação

de atividades práticas no ensino de Ciências, podem ser contempladas atividades como

estudos de caso, aprendizagem auxiliada por computador, demonstrações feitas pelo

professor, exibição de filmes/vídeos apoiados por atividades de registro de dados,

representações de papéis, tarefas escritas, confecção de modelos, pôsteres, álbuns de

recorte e trabalhos de vários tipos em biblioteca.

Assim sendo, Hodson (1988) relembra que nem todo trabalho prático na ciência

escolar é trabalho de laboratório, e que nem todo trabalho de laboratório pode ser

considerado experimento. O autor questiona, ainda, se algum trabalho de laboratório na

escola poderia ser classificado como “experimento”, no sentido que o termo recebe na

ciência.

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Ao longo do capítulo, não foram poucas as críticas feitas acerca da inadequação das

práticas pedagógicas que contribuem para que o ensino de Ciências continue afastado dos

princípios que norteiam a educação científica, tão necessária. Conforme foi visto, todo

processo pedagógico, desde a interpretação de uma proposta curricular até o trabalho

desenvolvido em sala de aula, envolve o professor. O processo leva-o a fazer escolhas que

determinam os resultados da ação educativa. Nesse ponto, evidencia-se a importância de

processos de formação continuada que favoreçam a consolidação de novas propostas para

o ensino de Ciências.

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CAPÍTULO 4 – FORMAÇÃO CONTINUADA COMO ESPAÇO DE

CONSTRUÇÃO DE SABERES

Neste capítulo é rastreada a literatura recente do campo da formação de professores,

tendo em vista a compreensão dos processos de formação continuada. Observa-se, no

texto, a existência de um debate sobre a temática efetuado por autores nacionais e

internacionais divulgados amplamente em nosso país nas últimas décadas. Ressalta-se,

ainda, que a reflexão em torno do conceito envolve o diálogo com as concepções de saber

docente e prática reflexiva. A recuperação desses conceitos pode contribuir para elucidar a

experiência investigada. O objetivo é delimitar elementos teóricos, tendo em vista a análise

e a interpretação dos dados produzidos na pesquisa.

Dessa forma, ao se investigar o processo de reflexão e socialização de saberes,

vivenciado pelos docentes na instituição pesquisada, busca-se destacar a importância do

professor como profissional que desempenha função de intelectual que, na interação com

seus pares, supera deficiências relacionadas à formação inicial, potencializando, assim, a

capacidade criativa de seu trabalho e sua ação sócio-política.

Falar em formação continuada remete-nos à reflexão acerca da ideia de formação.

Essa expressão pode comportar diferentes concepções. Neste estudo, a perspectiva de

formação adotada é a que considera a relação entre sujeito e conhecimento em constante

movimento, na qual a história e a experiência, entendida como acontecimento, assumem

papel relevante na constituição de ambos.

Entende-se, assim, a formação como um continuum, como um processo que se

desenvolve ao longo da vida. De acordo com Lima (2004, p.19), a ideia de continuum,

requer o estabelecimento de “um fio condutor que vá produzindo os sentidos e explicitando

os significados ao longo de toda a vida do professor, garantindo, ao mesmo tempo os nexos

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entre a formação inicial, a continuada e as experiências vividas”. A autora destaca que a

simples prática não dá conta dessa tarefa, se não contiver a reflexão, vista como elemento

indispensável na promoção de nexos.

Na mesma direção, Araujo, em diálogo com a literatura, considera que:

Esta perspectiva da formação como um processo contínuo (...) amplia a visão de que formação de professores é circunscrita a determinados momentos da vida profissional como os cursos preparatórios e os treinamentos em serviço. A formação do professor se inicia, neste raciocínio, antes mesmo do curso normal e se prolonga durante toda sua trajetória profissional. (1998, p. 52)

Dar à experiência o reconhecimento devido no processo de aquisição de

conhecimentos passa pela constatação de que o sujeito constrói o saber ao longo de seu

percurso de vida. Este trabalho tem como pressuposto a concepção de que o professor se

apropria de saberes e também os produz em sua atividade docente.

Essa discussão remete à reflexão em torno da epistemologia da prática. De acordo

com Tardif (2000, p.10), a epistemologia da prática é o “estudo dos saberes utilizados

realmente pelos profissionais em seu espaço de trabalho cotidiano para desempenhar todas

as suas tarefas”. Destaca-se, entretanto, que, ao se trazer a prática docente para o centro das

discussões, reconhecendo-a como instância de formação continuada, não se subestima a

importância do conhecimento teórico, nem da formação inicial como etapa relevante na

preparação profissional do docente. Além disso, o olhar que este estudo sugere não

desconsidera o contexto social mais amplo, no qual se inserem a prática docente e o

universo sócio-político e cultural dos agentes.

Nessa perspectiva, Guimarães (2004, p.53) alerta para o perigo que pode

representar o enfoque subjetivo e individual, decorrente de pesquisas cuja perspectiva se

baseie preponderantemente na epistemologia da prática, o que poderia, em sua opinião,

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“tornar a prática docente autossuficiente e impermeável às contribuições de outras

perspectivas de estudos para a formação do professor”.

Acrescentando a dimensão política a suas análises, Lelis (2001) alerta para algumas

questões que considera desafiadoras: “que cuidados precisamos tomar para não

privilegiarmos em excesso a realidade intra-escolar, micro-social, e perdermos com isto

dimensões contextuais do trabalho docente no plano político social mais amplo? (op. cit.

p.54)

Em termos históricos, o debate acerca da prática reflexiva tem raízes nas reflexões

de Dewey41 (apud GARCIA, 1995), que, na década de 1930, já preconizava a ação

reflexiva como “o exame activo, persistente e cuidadoso de todas as crenças ou supostas

formas de conhecimento, à luz dos fundamentos que as sustentam e das conclusões para

que tendem”. Para o autor, o início do processo de reflexão se daria por meio da

problematização da prática. Dewey fez uma importante distinção entre as ações reflexivas

e as ações de rotina. Ao fazer tal distinção, o autor sugere a necessidade de se estabelecer

um equilíbrio entre essas ações, ou seja, entre o ato e o pensamento.

Segundo Dewey (apud ZEICHNER, 1993, p.18), “a reflexão não consiste num

conjunto de passos ou procedimentos específicos a serem usados pelos professores. Pelo

contrário, é uma maneira de encarar e responder aos problemas, uma maneira de ser

professor”. Das ideias de Dewey, segundo Garcia (1995), deriva a necessidade de formar

professores que reflitam sobre sua prática, fazendo da reflexão um importante instrumento

de desenvolvimento do pensamento e da ação.

O conceito de reflexão foi significativamente difundido a partir da contribuição de

Schön (1983) 42. O autor criou a expressão reflective practitioner, pondo em relevo a

existência de um conhecimento que é gerado na ação, durante o exercício de uma dada 41 DEWEY, J. Como Pensamos. Barcelona: Paidós,1989. 42 SCHÖN, Donald A. The reflective practitioner. New York: Basic Books, 1983.

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atividade profissional. Schön tece críticas ao modelo da racionalidade técnica, que ignora

as competências práticas requeridas em situações divergentes. O autor propõe “uma nova

epistemologia da prática, implícita nos processos intuitivos e artísticos que alguns

profissionais, de facto, levam a cabo em situações de incerteza, instabilidade, singularidade

e conflito de valores” (apud GÓMEZ, 1995, p.101).

Segundo Gómez (1995, p.96), a racionalidade técnica, que traduz a imagem do

professor como técnico, é “uma concepção epistemológica da prática, herdada do

positivismo, que prevaleceu ao longo de todo o século XX”. No dizer do autor, essa

concepção orientou a educação e a socialização dos profissionais em geral e, dentre estes, a

dos docentes.

Na atualidade, a literatura afirma a complexidade da prática pedagógica,

ressaltando que a atividade docente envolve a elaboração de respostas a dilemas e conflitos

de valores em situações marcadas pela imprevisibilidade. O docente, em seu cotidiano

profissional, depara-se com situações para as quais as regras técnicas não são suficientes,

sendo necessárias habilidades que o capacitem à reflexão e à tomada de decisão, nas quais

frequentemente estão presentes valores e juízos essenciais para a formação discente.

A partir da década de 1990, ganhou destaque a contribuição de autores como

Tardif, Lessard e Lahaye (1991), Nóvoa (1992) e Zeichner (1993). Esses autores,

inspirados nos estudos de Schön, debatem a categoria de professor reflexivo e o conceito

de reflexão na ação, defendendo a idéia de que os professores produzem um conhecimento

específico, pessoal, intuitivo, experimental, não sistemático em sua prática profissional.

Gómez defende a idéia de que a reflexão não é apenas um processo psicológico

individual dissociado do contexto, no qual se efetivam e se desenvolvem as interações

sociais, pois:

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A reflexão implica a imersão consciente do homem no mundo da sua experiência, um mundo carregado de conotações, valores, intercâmbios simbólicos, correspondências afectivas, interesses sociais e cenários políticos. O conhecimento acadêmico, teórico, científico ou técnico, só pode ser considerado instrumento dos processos de reflexão se for integrado significativamente, não em parcelas isoladas da memória semântica, mas em esquemas de pensamento mais genéricos activados pelo indivíduo quando interpreta a realidade concreta em que vive e quando organiza a sua própria experiência. (1995, p.103)

Para Elliot, é possível distinguir dois tipos diferentes de desenvolvimento reflexivo:

O professor empreende uma investigação sobre o problema prático e se fundamenta nessa análise para mudar algum aspecto da sua prática. Neste enfoque, a reflexão inicia a ação, ou seja, o desenvolvimento da compreensão precede a decisão de mudar as estratégias docentes; O professor modifica algum aspecto de sua prática como resposta a algum problema prático. Posteriormente verifica se a ação foi eficaz, isto é, faz uma avaliação reflexiva sobre a ação e incorpora-a como estratégia de modificação do problema. Neste caso, a ação inicia a reflexão. (1993, p.37)

Garcia (1995) descreve três diferentes níveis da reflexão: o nível técnico

corresponde à análise das ações explícitas, as ações que o professor faz, passíveis de serem

observadas; o nível prático implica o planejamento e a reflexão das ações, ressaltando o

seu caráter didático; o nível crítico é o da análise ética ou política da própria prática,

considerando ainda suas repercussões contextuais. Esse último nível é fundamental para o

desenvolvimento da consciência crítica dos professores sobre suas possibilidades de ação,

assim como suas limitações.

Com o objetivo de recusar a ideia de mitificação da “prática reflexiva”, Zeichner

(1993) destaca alguns elementos importantes para o debate. Segundo o autor, a reflexão do

professor não deve se limitar às questões de sala de aula, mas abranger também as

condições sociais nas quais essa prática se desenvolve. A reflexão tem também caráter

político, pois não pode “ignorar questões como a natureza da escolaridade e do trabalho

docente ou as relações entre raça e classe social por um lado e o acesso ao saber escolar e o

sucesso escolar por outro” (1993, p.26). Nessa perspectiva, a reflexão dos professores pode

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ser entendida como prática social em grupo, pois os professores interagem, se apóiam e

crescem uns com os outros. Esse princípio apresenta um valor estratégico, na medida em

que pode favorecer mudanças institucionais e sociais.

Zeichner (1999) ressalta o significado da reflexão na prática do professor como o

sujeito político, comprometido com seu tempo. No processo de formação do professor, a

reflexão crítica “incorpora um compromisso ético e social na procura de práticas

educativas e sociais mais justas e mais democráticas” (p.44).

É necessário também o estabelecimento de condições que promovam ou facilitem a

formação reflexiva durante a prática profissional. O trabalho em equipe e a troca de

experiências entre os professores podem se revelar como importantes instrumentos na

determinação de tais condições.

Nascimento (1997) destaca que a formação continuada pode ser entendida como

toda e qualquer atividade de formação posterior à formação inicial do professor que está

atuando nos estabelecimentos de ensino. Dessa forma, a autora inclui, no rol da formação

continuada, os cursos de especialização e extensão oferecidos pelas instituições de ensino

superior e todas as demais atividades de formação disponíveis nos diversos sistemas de

ensino.

A formação continuada se coloca como uma importante questão quando se tem

como objeto o desenvolvimento do professor. Desse modo, ela não implica apenas a

aquisição de conhecimentos, mas o conhecimento de si e da realidade, num processo de

reflexão contínua e coletiva sobre a ação pedagógica (NASCIMENTO, 1997).

Nóvoa (1991) enfatiza a necessidade de articulação entre a formação contínua e o

desenvolvimento pessoal (investimento na pessoa do professor e em sua experiência),

profissional (investimento na profissão e seus saberes) e organizacional (investimento na

escola e seus projetos). Esse processo, que o autor denomina “trilogia da formação

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72

contínua”, configura uma concepção inovadora e sugere algumas rupturas significativas

com os modelos dominantes de formação continuada. Mas o próprio autor adverte que

“(...) é preciso interrogar as práticas” (p.20).

Demailly (apud NASCIMENTO, 1997, p.70-71) debate quatro modelos formais de

formação continuada:

� a forma universitária, que tem por finalidade essencial a transmissão do

saber e da teoria. De caráter voluntário, caracteriza-se por uma relação entre

formador-formando semelhante à que se estabelece entre os profissionais

liberais e seus clientes;

� a forma escolar, na qual o ensino, de caráter obrigatório, é organizado por

um poder legítimo exterior aos professores, seja a Igreja, o Estado ou a

Nação. Os professores ou os formadores encarregam-se de ensinar saberes

definidos num programa oficial, do qual não são os responsáveis;

� a forma contratual, que se caracteriza por uma relação de tipo contratual

entre formador e formando ou também com outros parceiros, na qual, por

meio de uma negociação, define-se o programa pretendido e as modalidades

materiais e pedagógicas da aprendizagem, e a forma interativo-reflexiva,

que se caracteriza por iniciativas de formação ligadas à resolução de

problemas reais, com a participação dos formandos, e ligadas a uma

situação de trabalho.

Assim, novos saberes (saberes do ofício) são construídos coletiva e paralelamente

ao processo de formação. Para Demailly, nessa perspectiva, estes modelos nunca se

encontram em “estado puro”, por isso aponta formas mistas de organização da formação

contínua.

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Nóvoa (1991, p.20) reafirma essa posição ao destacar que: “as estratégias de

formação contínua são necessariamente híbridas, apelando, segundo uma coerência própria

e contextualizada, a diferentes contributos teóricos e metodológicos”. Considerando essa

afirmativa e evitando uma postura dicotômica, Nóvoa reconhece dois grandes grupos de

modelos de formação contínua de professores:

Modelos Estruturantes (tradicional, comportamentalista, universitário, escolar), organizados previamente a partir de uma lógica de racionalidade científica e técnica, e aplicados aos diversos grupos de professores. Modelos Construtivistas (personalista, investigativo, contratual, interactivo-reflexivo), que partem de uma reflexão contextualizada para a montagem dos dispositivos de formação contínua, no quadro de uma regulação permanente das práticas e dos processos de trabalho. (op. cit., p.21)

A formação continuada de professores, para Candau (1997), pode ser analisada sob

duas perspectivas. Numa concepção clássica, na qual a formação continuada de professores

é concebida sob a lógica das “reciclagens” e atualização dos professores, em espaços

considerados tradicionalmente como “lócus” de produção do conhecimento. Ou seja, o

espaço da universidade e outros a ela articulados.

Candau (1997) questiona a concepção de formação continuada subjacente a essa

perspectiva, interrogando se ela “não está informada por uma visão em que se afirma que a

universidade corresponde à produção do conhecimento e os profissionais do ensino de

primeiro e segundo graus, à sua aplicação, socialização e transposição didática.” A autora

então propõe a reflexão: “Esta é a perspectiva que queremos reforçar na área de educação

em geral, e, especialmente, na área de ensino?” (p. 54).

Candau afirma que, em reação a essa concepção clássica, tem sido desenvolvida

uma série de estudos e reflexões no sentido de possibilitar uma nova concepção de

formação continuada de professores, de modo a contribuir efetivamente para a sua prática

pedagógica cotidiana e para os desafios de nosso tempo.

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A autora destaca três teses que sintetizam os principais eixos atuais de investigação

sobre a formação continuada.

A primeira delas enfatiza a escola como um “lócus” de formação do professor.

Dessa forma, desloca-se o espaço da universidade para a escola de educação básica, para o

contexto da prática. É importante esclarecer que a prática a qual a autora se refere é

considerada como um processo formativo e, como tal, não é espontâneo. Nesse sentido, a

referência será uma prática reflexiva e coletiva, visto que “uma prática repetitiva, uma

prática mecânica não favorece este processo” (op. cit., p.57). Considerar o exercício

profissional como “lócus” formativo é também reconhecer a necessidade de contínua

reflexão crítica do professor em seu trabalho diário, na medida em que este pode também

produzir a sedimentação de práticas obsoletas.

A segunda refere-se à valorização do saber docente. Nessa direção, Candau destaca

as contribuições de Tardif, Lessard e Lahaye (1991), quando afirmam que:

O saber docente é um saber “plural, estratégico e desvalorizado”. Plural porque constituído dos saberes das disciplinas, dos saberes curriculares, dos saberes profissionais e dos saberes da experiência. Estratégico porque, como grupo social e por suas funções, os professores ocupam uma posição especialmente significativa no interior das relações complexas que unem as sociedades contemporâneas aos saberes que elas produzem e mobilizam com diversos fins. Desvalorizado porque, mesmo ocupando uma posição estratégica no interior dos saberes sociais, o corpo docente não é valorizado em face aos saberes que possui e transmite. (TARDIF, LESSARD E LAHAYE, 1991, apud CANDAU, 1997, p.59)

A terceira tese refere-se ao ciclo de vida profissional dos professores. Com base

nos estudos de Huberman (1992)43, a autora destaca a importância de considerar as

43 Huberman identifica cinco etapas básicas, que não devem ser entendidas de forma estática, linear e homogênea, mas numa relação dialética. São elas: A entrada na carreira, etapa de “sobrevivência e descoberta”, a fase de estabilização, momento de identificação profissional e segurança; a fase de diversificação, momento de questionamentos e experimentação, de buscas plurais; o momento de serenidade e distância afetiva e/ou conservadorismo e lamentações e, finalmente atinge-se um momento de desinvestimento, de recuo e interiorização, característico do final da carreira profissional. (HUBERMAN, 1992, apud CANDAU, 1997, p. 63)

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diferentes etapas do desenvolvimento profissional do magistério na formulação das

propostas de formação continuada.

Os eixos de análise apresentados por Candau configuram uma nova perspectiva de

formação continuada, relevante para o desenvolvimento deste estudo, pois enfatizam a

prática pedagógica cotidiana como espaço potencial de construção de saberes docentes,

uma das hipóteses acerca dos fatores que contribuem para o bom desempenho dos alunos

na disciplina de Ciências.

Considerando o saber docente como resultado de um processo complexo, não

linear, mas dinâmico, este estudo parte do pressuposto de que o professor é um sujeito

histórico-social, autor/produtor de saberes e conhecimentos em sua prática cotidiana,

através das diversas relações e interações que estabelece em seu meio. Entende-se, como

Candau (1997), que o docente é sujeito de sua própria formação, inserido em um ciclo de

vida profissional. Dependendo da fase do ciclo de vida do professor, seus problemas,

expectativas e necessidades são diferenciadas. Esse é um aspecto pouco considerado nos

programas de formação continuada para professores.

Considerar o professor como sujeito é reconhecer que ele produz rupturas, na

medida em que relaciona e integra conhecimentos apreendidos, seja na formação inicial ou

ao longo de sua trajetória profissional, aos saberes e às experiências construídos em sua

prática pedagógica. A ruptura é, então, elemento constitutivo da continuidade, pois esta se

estabelece justamente entre a formação prévia e o exercício profissional.

Conceber o professor como sujeito do conhecimento é também assumir postura

política diante dos problemas e desafios educacionais. Tardif (2000b, p.127) nos adverte de

que “a desvalorização dos saberes dos professores pelas autoridades educacionais,

escolares e universitárias não é um problema epistemológico ou cognitivo, mas político”.

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Historicamente, os professores têm tido pouca voz nas tomadas de decisões e nas

estruturas de poder que regem a vida escolar. Contudo, ser sujeito do conhecimento

significa também envolver-se na luta coletiva para garantir espaço na estrutura macro-

política, apropriando-se da pesquisa e posicionando-se como atores sociais capazes de

expressar objetivamente suas necessidades, expectativas e interesses individuais e

coletivos.

De acordo com Tardif (2002), a prática do professor é constituída por diferentes

saberes, com os quais mantém diferentes relações: os saberes da formação profissional,

que se referem aos saberes didático-pedagógicos transmitidos pelas instituições

formadoras; os saberes disciplinares, que estão ligados aos diversos campos do

conhecimento integrados à universidade e organizados sob a forma de disciplinas; os

saberes curriculares, que são aqueles veiculados pelos programas, diretrizes e manuais

escolares; e os saberes da experiência, que se referem à experiência de trabalho do

professor e à sua história de vida.

Este trabalho privilegia os chamados saberes “experienciais”, (TARDIF, 2002;

BONDÍA, 2002). Para Bondía (op. cit., p.26), esse saber “se dá na relação entre o

conhecimento e a vida humana”, o que requer uma nova concepção de ciência, uma

concepção que inclua sua temporalidade e, consequentemente, a provisoriedade de suas

verdades, assim como a imprevisibilidade e os acasos próprios da vida humana.

Bondía (2002) recomenda que não se pode confundir experiência com experimento:

este, originado da ciência moderna, se define como uma etapa, um caminho objetivo,

seguro e previsível; aquela, por sua vez, é concebida, pelo autor, como algo que possui um

caráter pessoal e subjetivo. Segundo Bondía (2002):

A experiência, a possibilidade de que algo nos aconteça ou nos toque, requer um gesto de interrupção, um gesto que é quase impossível nos tempos que correm: requer parar para pensar, parar para olhar, parar para escutar, pensar mais devagar, olhar mais devagar, e escutar mais devagar;

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parar para sentir, sentir mais devagar, demorar-se nos detalhes, suspender a opinião, suspender o juízo, suspender a vontade, suspender o automatismo da ação, cultivar a atenção e a delicadeza, abrir os olhos e os ouvidos, falar sobre o que nos acontece, aprender a lentidão, escutar aos outros, cultivar a arte do encontro, calar muito, ter paciência e dar-se tempo e espaço. (p.24)

A experiência como acontecimento se constitui na e por meio da reflexão, que

poderá possibilitar a criação e a pesquisa. Nóvoa (1995) acrescenta que a experiência deve

ser entendida num “quadro conceptual de produção de saberes” e não apenas concebida em

dimensões pedagógicas. Por isso defende a criação de:

Redes de (auto)formação participada, que permitam compreender a globalidade do sujeito, assumindo a formação como um processo interactivo e dinâmico. A troca de experiências e a partilha de saberes consolidam espaços de formação mútua, nos quais cada professor é chamado a desempenhar, simultaneamente, o papel de formador e de formando. (p.26)

Tardif, Lessard e Lahaye (1991) referem-se ao saber da experiência como “a

cultura docente em ação”, ou seja, como saberes que brotam da prática do professor e não

dos cursos de formação ou dos currículos. Esses saberes são construídos ou mobilizados a

partir da vivência do professor, com suas tensões, seus conflitos e suas rotinas. Em seu

trabalho, muitas vezes, ele se depara com situações que requerem saberes outros, que não

científicos, disciplinares ou didático-pedagógicos. Nessas situações, sua afetividade, seus

valores e sua própria história de vida, especialmente sua história de vida escolar, têm

grande importância.

Segundo Tardif (2000, p.117), o professor:

aborda sua prática e a organiza a partir de sua vivência, de sua história de vida, de sua afetividade e de seus valores. Seus saberes estão enraizados em sua história de vida e em sua experiência do ofício de professor; portanto, eles não são somente representações cognitivas, mas possuem também dimensões afetivas, normativas e existenciais. Eles agem como crenças e certezas pessoais a partir das quais o professor filtra e organiza sua prática.

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Para Tardif, Lessard e Lahaye (1991, p.227), os professores tendem a valorizar os

saberes produzidos ao longo de sua prática educativa, tomando-os como referencial para a

avaliação de seu próprio desenvolvimento profissional.

Nessa perspectiva, o cotidiano é abordado, neste estudo, como um “espaço tempo

de saber e criação”, em que circulam uma multiplicidade de saberes e de sentidos, sendo

dada à prática “a dignidade de fatos culturais e de espaço de criação de conhecimentos, que

não são ‘tecidos’ na teoria e que são tão importantes, para os homens, como os

conhecimentos que nesta são construídos.” (ALVES, 1999, p.115).

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CAPÍTULO 5 - OS PLANOS GERAIS DE ENSINO ELABORADOS NOS ANOS DE

1980.

Este capítulo apresenta a análise dos Planos Gerais de Ensino (PGE), documentos

em que se encontram descritas as diretrizes gerais do trabalho pedagógico do primeiro

segmento do Ensino Fundamental do Colégio Pedro II. Busca-se rastrear os objetivos e os

conteúdos propostos para a área de Ciências, tendo vista as mudanças na concepção de

ensino de Ciências. No período estudado, foram produzidos documentos nos anos de 1984,

1985, 1986 e 1988.

As reflexões relatadas nesta seção resultaram do cruzamento dos dados coletados

nos PGEs com as informações obtidas nas entrevistas. Durante o processo de análise dos

documentos, foi possível verificar que, com o auxílio dos dados das entrevistas, a

reconstrução do processo investigado ganhava “uma luz especial” através da qual era

possível associar os efeitos do processo de formação continuada vivenciada pelos docentes

com a produção do texto institucional por eles produzido.

5.1 O ensino de Ciências no primeiro Plano Geral de Ensino (PGE)

O primeiro PGE, produzido em 1984, contempla exclusivamente as duas séries

iniciais do primeiro segmento do EF. É um documento no qual constam dados que revelam

a fundamentação pedagógica, a estrutura organizacional e administrativa sobre as quais o

primeiro segmento foi implantado. Nas páginas iniciais, há a citação nominal de, desde o

ministro de educação, até a relação do corpo de funcionários técnico-administrativos

responsáveis pelo serviço de apoio à atividade docente. Elaborado pela equipe de

professores selecionada através de concurso público para atuar no primeiro segmento do

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Ensino Fundamental, o PGE/1984 é produto do trabalho coletivo desses docentes,

realizado no pequeno período entre a admissão e o início das atividades letivas daquele

ano.

Trata-se de um documento de noventa e oito páginas, nas quais se encontra, entre

outras informações, a relação das vinte e oito primeiras turmas, divididas em dois turnos e

em duas séries44. Essas turmas aparecem enumeradas, sendo citados também os respectivos

docentes por elas responsáveis. Há a apresentação de umas breves palavras do diretor

geral, nas quais este evidencia o orgulho pela implementação do projeto, afirmando que a

iniciativa de implantação do primeiro segmento no Colégio Pedro II representava um

esforço por meio do qual a instituição demonstrava estar preparada para contribuir com a

“vitória dos ideais que norteiam a Política Educacional do Governo João Figueiredo”.

Outro ponto relevante a ser destacado nas palavras do diretor diz respeito ao tratamento

dispensado às professoras recém-contratadas que integravam o primeiro quadro de

docentes do primeiro segmento da instituição: “o Colégio Pedro II reuniu esforços

administrativos a inteligência e capacidade dessas jovens professoras, autoras deste

Plano...” (Colégio Pedro II, PGE/1984).

Ainda na parte introdutória do documento, constam: a portaria nº 51 de fevereiro de

1984, que cria “em caráter experimental as séries iniciais do 1º grau”, publicada no DOU

de 29/02/1984; as tabelas de vencimentos e salários do Magistério de 1º e 2º graus,

conforme decreto-lei nº 2079, de 20/12/1983, o organograma da instituição; palavras do

secretário de ensino sob o título “Escola e realidade”; a grade curricular das duas séries

iniciais; a diretriz de ensino nº 1 do primeiro segmento do 1º grau – que trata da avaliação

e da recuperação do processo ensino-aprendizagem; os objetivos educacionais do primeiro

segmento do 1º grau; a metodologia do trabalho a ser desenvolvida no 1º segmento; e,

44 Foram criadas inicialmente turmas de 1ª e 2ª séries, sendo 16 de 1ª série e 12 de 2ª série.

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finalmente, os planos de curso das áreas de Comunicação e Expressão, Teatro, Música,

Educação Física, Artes plásticas, Integração Social, Iniciação às Ciências e Matemática.

Convém destacar que a grade curricular (PGE/1984, p. 25) não define carga horária

específica para a disciplina de Ciências, nem para os demais componentes curriculares do

núcleo comum. É citada a carga horária semanal total de 22h e 30 min., e são definidos os

tempos destinados às atividades específicas desenvolvidas por professores que não

pertencem ao departamento do primeiro segmento – professores de Teatro, de Música, de

Educação Física e de Artes plásticas. Excluindo a carga horária semanal dessas atividades

específicas, o professor de núcleo comum conta com 20h semanais para desenvolver as

atividades do núcleo comum, entre elas a de Iniciação às Ciências.

A seção intitulada “Objetivos educacionais no 1º segmento do 1º grau” destaca que:

O objetivo da área de ciências é o desenvolvimento do pensamento lógico e a vivência do método científico, levando a criança a: � vivenciar experiências concretas em relação aos fenômenos que

ocorrem à sua volta, classificando-os procurando relações, avaliando e adquirindo conceitos que a ajudem a interpretar e integra-se ao meio ambiente.

� desenvolver a habilidade de pensar e de raciocinar para investigar, resolver problemas e realizar experiências criativamente, desenvolvendo atitude científica.

� desenvolver o interesse, apreço e respeito pela natureza, bem como sentimentos de responsabilidade por ela e de sua preservação contínua.

O plano de curso da área de Iniciação às Ciências, a exemplo do das demais áreas,

encontra-se dividido em três partes assim divididas: Unidade Didática, Conteúdo

Programático e Objetivos Específicos.

Ao final do plano, são apresentadas listas de sugestões de atividades, contemplando

cada uma das unidades didáticas: cinco, tanto para a 1ª série quanto para a 2ª série do EF.

A tabela abaixo exibe a sequência dessas unidades:

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Tabela 2 – Unidades didáticas – Ciências 1ª série 2ª série

O Homem Hábitos Higiênicos

Seres Vivos e Não Vivos Alimentação / vacinas e soros

Vegetais Seres Vivos

Animais Água / Ar

Tempo Corpo Humano

Fonte: Plano Geral de Ensino do Colégio Pedro II, 1984, p.52-58 e 82-89.

O capítulo do documento destinado à metodologia do trabalho justifica inicialmente

a apresentação dos conteúdos sob a forma de áreas de estudo, esclarecendo que o

“desenvolvimento operacional” seria feito através de atividades que englobassem os

conteúdos das várias áreas. O documento refere-se à LDB em vigor, a Lei 5692/71, na qual

o currículo de 1º segmento do 1º grau é organizado por atividades.

O plano recomenda que as atividades sejam propostas, respeitando a vivência dos

alunos, destacando a preocupação de tornar o aluno o sujeito do processo ensino-

aprendizagem. Para tanto, são recomendadas atividades diversificadas, oferecendo ao

aluno a oportunidade de vivenciar experiências variadas que possam desenvolvê-lo no

sentido global, incluindo-se nessas experiências as atividades de artes, música, teatro,

biblioteca e educação física. De acordo com o documento, o objetivo da diversificação das

atividades também seria o de individualizar o ensino, pois o professor poderia atender a

cada aluno, em suas características específicas, respeitando as diferenças individuais, o

ritmo e as habilidades da criança. Há a indicação de que os conteúdos sejam trabalhados de

forma lúdica, utilizando jogos pedagógicos, e que, além das aulas com a utilização de

material de apoio como livros didáticos, cadernos e exercícios mimeografados, sejam

também desenvolvidas atividades ao ar livre. O documento a esse respeito destaca: “Essa

variedade de recursos gera a utilização menos intensa de recursos tradicionais, tornando a

Escola mais prazerosa, o que, consequentemente, leva a um maior rendimento dos alunos.”

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Em contraste com a formalidade da lista de conteúdos apresentada, o conjunto de

atividades pedagógicas propostas já evidencia um esforço em traduzir esse conteúdo de

modo que o aluno possa vivenciar, de forma ativa, situações simples, a maioria delas

ligadas a situações do cotidiano do aluno. Há inclusive algumas atividades classificadas

como experimentais (PGE/1984, p.54).

O documento, entretanto, revela certa ambiguidade, pois apresenta um volume

expressivo de conteúdos, o que inviabiliza a metodologia sugerida. Percebe-se que o PGE

de 1984 contém uma relação de conteúdos descritos de forma pormenorizada, sem

preocupação com a devida contextualização. O conteúdo sugerido parece apresentar um

fim em si mesmo.

5.2 O PGE de 1985

A parte introdutória do documento segue organização similar à do PGE/1984, que o

antecede. Neste PGE há a inclusão da portaria nº443, de 19 de dezembro de 1984, que cria

a Unidade Escolar Humaitá II, bem como a inclusão do quadro de docentes e funcionários

técnico-administrativos que compunham a nova unidade escolar criada. A exemplo do que

ocorreu no processo de implantação do primeiro segmento em São Cristóvão, também

foram criadas, inicialmente, somente turmas de 1ª e 2ª séries.

Há, a implementação de uma nova estrutura curricular nesse ano letivo, isto porque,

tendo experimentado inicialmente a realidade de receber, para uma mesma série, alunos

que se encontravam em diferentes estágios do processo de alfabetização, a equipe entendeu

ser necessária a implantação da classe de alfabetização, passando a ser admitidos alunos

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com idade inferior aos sete anos45. Dessa forma, verifica-se que o ensino fundamental

desde à época passou a ter nove anos, o que veio a se configurar como realidade nacional

somente em 2007.

O PGE/1985 expõe o plano de Iniciação às Ciências, distribuído em quatro séries:

1ª série não alfabetizada46, 1ª série alfabetizada, 2ª e 3ª séries47. O documento também

apresenta reformulação na diretriz de ensino que institui a utilização de médias ponderadas

ao longo dos bimestres letivos e estabelece um peso maior para a média anual do aluno no

cálculo da nota da recuperação final. A carga horária recebe um acréscimo de 30 minutos

semanais a serem distribuídos pelas atividades de núcleo comum.

Mais uma vez destacam-se, nas palavras iniciais do diretor geral, a confiança

depositada e a valorização do trabalho da equipe de docentes que compõe o primeiro

segmento:

Aos que confiaram na plêiade de jovens professoras recrutadas especialmente para esse bom combate, desejo ajuntar os meus aplausos e só poderei lamentar o desapontamento dos céticos que, ontem, desdenhavam, mas agora creem no trabalho que elas vêm realizando, com inteligência e amor em prol da Educação Nacional. [...] É um trabalho48 que honra e dignifica suas competentes autoras, que nele conciliaram os complicadores pedagógicos oriundos da oposição criança x currículo, do indivíduo e a cultura social. (PGE, 1985).

Em outro ponto do documento, há manifestação explícita semelhante, desta vez na

conclusão do breve histórico institucional, na parte inicial do PGE: “A história do

COLÉGIO PEDRO II é um livro aberto a você, prezado professor, a quem cabe a honra de

escrever, no presente, o futuro desta monumental tradição (PGE/1985)”.

45 A lei 5692/71 estabelecia a idade de 7 anos para o ingresso na primeira série do 1º grau. 46 Embora tenha sido esta a denominação adotada no documento, observa-se já, nesse segundo ano de implantação, a necessidade de se estender o ensino fundamental para 9 anos. O edital de convocação de alunos baixou a idade mínima de ingresso para cinco anos e meio, permitindo que o candidato pudesse completar 6 anos até julho do ano letivo de seu ingresso na instituição. 47 Série que acolheu os discentes que concluíram a 2ª série no ano anterior e, por este motivo, só existia na unidade São Cristóvão. 48 Refere-se ao PGE/1985.

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Os objetivos elencados para a área de Ciências são mantidos, mesmo com a

ampliação do número de séries. O exame dos planos de curso de Iniciação às Ciências, por

série, permite inferir que, com a criação da 1ª série não alfabetizada, houve a diminuição

do conteúdo da área de Ciências para os alunos da classe de alfabetização, além da

retomada do conteúdo da unidade intitulada “Seres Vivos e Não Vivos” integralmente na

primeira série alfabetizada. Dessa forma, é possível observar que houve uma redistribuição

dos conteúdos da área, inicialmente previstos para a 1ª série no ano anterior. Essa

distribuição garantiu a diminuição de conteúdo na alfabetização, conforme pode ser

observado no quadro a seguir:

Tabela 3 – Unidades didáticas – Ciências 1ª série (alfabetização) 1ª série

O Homem O Homem

Seres Vivos e Não Vivos Seres Vivos e Não Vivos

Tempo Vegetais

Animais

Fonte: Plano Geral de Ensino do Colégio Pedro II, 1985, p.31-33; 53-58.

O quadro que segue ilustra as unidades pedagógicas de trabalho na área de

Iniciação às Ciências nas demais séries:

Tabela 4 – Unidades didáticas –Ciências 2ª série 3ª série Animais O Solo Vegetais A Água

Órgãos dos Sentidos O Ar Água O Nosso Corpo

Modificações da natureza Animais e Vegetais - Adaptabilidade Fonte: Plano Geral de Ensino do Colégio Pedro II, 1985, p. 80-85; 112-119

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Não é possível afirmar se em função ou não da criação da 3ª série, mas o que se

verifica é que houve alteração substancial no plano de curso da área de Iniciação às

Ciências na 2ª série, não só em relação às unidades de conteúdo, como nos próprios

objetivos específicos da única unidade que permaneceu na série: Água.

O plano de Ciências de uma maneira geral, nesse PGE, apresenta descritores de

conteúdo mais amplos e é possível verificar que algumas sugestões de abordagem de

conteúdo já evidenciam a preocupação em desenvolver no aluno a necessidade de

preservação da natureza, o que representaria a fase embrionária da educação ambiental,

introduzida posteriormente como tema transversal pelos PCN.

Percebe-se, ainda nesse plano, na descrição de propostas de atividades, a inclusão

de visitas a espaços não formais de ensino de Ciências, como a ida ao Centro Agrícola, ao

Horto Florestal e ao Jardim Zoológico como atividades curriculares, a partir das quais

seriam produzidas novas atividades pedagógicas. Há a previsão de atividades

interdisciplinares, principalmente com Artes e Integração Social. São sugeridas atividades

práticas experimentais dirigidas e atividades livres para a coleta de materiais como plantas,

pequenos animais e seres não vivos.

O exame desse documento possibilita depreender que, com a criação da 3ª série,

houve também uma melhor distribuição do programa de Ciências ao longo das séries,

sendo possível notar uma preocupação maior em redistribuir o conteúdo inicialmente

selecionado para a 1ª e a 2ª séries do que a inserção de novos conteúdos. Contudo, verifica-

se que não ocorreu à ruptura quanto ao tipo tradicional de abordagem desse conteúdo,

sendo ainda possível observar a continuidade da contradição entre a quantidade de

conteúdo e a metodologia sugerida.

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5.3 O PGE de 1986

Este Plano Geral começou a ser esboçado ao final do ano de 1985, ocasião em que,

criado o Departamento do Primeiro Segmento, há um esforço institucional em promover a

construção de um trabalho pedagógico único nas unidades escolares, que, na ocasião, já

encontravam-se em véspera de se tornarem três, com a inauguração do Pedrinho Engenho

Novo, prevista para o ano de 1986. A esse respeito, a entrevistada D destaca que:

[...] houve eleição para os diversos departamentos e ele49 então criou o departamento do primeiro segmento porque, se nós tínhamos duas unidades, nós também precisávamos de uma pessoa que olhasse o Pedrinho na parte pedagógica e desse o mesmo andamento, porque ele dizia: O Colégio Pedro II é uno e indivisível, então o que acontecer em uma unidade tem que acontecer nas outras unidades.

Com esse objetivo, o departamento elaborou um projeto de capacitação docente que

teve início com os professores que atuavam nas classes de alfabetização ao final do ano de

1985. A partir do início ano letivo seguinte, o programa se estendeu para todos os

docentes, por meio da implantação de cursos de fundamentação teórica construtivista. Um

destes focalizou, em especial, a teoria do desenvolvimento de Piaget.

Para além da fundamentação teórica, o programa implantado previa o

acompanhamento da prática docente em todas as séries e áreas do núcleo comum50. Esse

programa de formação continuada se estendeu até o final do ano de 1987. Como parte do

projeto, foram previstas reuniões quinzenais de acompanhamento da prática docente,

quando as propostas de trabalho desenvolvidas em sala de aula eram analisadas e

discutidas entre professores, coordenadores e assessores.

49 A entrevistada refere-se ao Diretor Geral. 50 Língua Portuguesa, Matemática, Integração Social e Ciências.

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A respeito dessa proposta de formação continuada implementada, a entrevistada D

relata:

Aquele investimento era mesmo maciço do professor. Então o primeiro momento era assim, dar oportunidade de todo mundo ouvir de quem tinha condições de propor aquilo com fundamentação para tirar as dúvidas. E aí como a gente fazia? Quando vinham as assessoras, elas faziam os cursos, o coordenador e esse assessor vinham quinzenalmente em turno contrário ao do professor para que o professor tivesse contato com eles. O coordenador estava sempre junto porque depois quem iria destrinchar aquele trabalho era o coordenador nas unidades. Então semanalmente o professor estava ali disponível com os colegas para construir um trabalho coletivo sobre a orientação do coordenador, que era uma pessoa que em principio ele era formado naquela área, então ele tinha mais base para poder destrinchar ali alguma dúvida e eles todos bebiam da fonte dos professores do laboratório de currículos. (Entrevistada D)

A proposta curricular que integra o PGE/1986 foi elaborada pela equipe pedagógica

que construiu o projeto de formação continuada e que integrava o Laboratório de

Currículos51. A esse mesmo grupo coube a responsabilidade de acompanhar a implantação

da proposta. Segundo a Entrevistada A:

O plano de 1985 era um plano mais tradicional... [...] Quando entrou 1986 nós tivemos várias mudanças nesse plano. [...] Ele tinha objetivos e estratégias, mas as estratégias eram todas bastante inovadoras em relação ao que se tinha... Vale a pena ressaltar que a professora M.A. veio do Laboratório de Currículos do Estado. Esse material do Laboratório de Currículos do Estado era um material que trazia uma série de sugestões práticas que a gente tentava botar em prática.

Apesar de ter contado com algumas reflexões de professores e da contribuição de

alguns coordenadores, com quem tais assessores mantiveram contato ainda no final do ano

de 1985, o texto final ainda parecia “estranho” para os coordenadores que tinham a

incumbência de implementá-lo. O desenvolvimento das atividades previstas no PGE/1986

demandou estudo e dedicação por parte de toda equipe de professores, mas principalmente

51 Há, na parte introdutória do plano de Ciências, a seguinte observação: “O presente trabalho acha-se alicerçado na sequência de Ensino de Iniciação às Ciências, constantes dos Guias de Organização Curricular de 1ª à 4ª série, elaborado pela equipe do Laboratório de Currículos da SEEC/RJ.”

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dos coordenadores, para que pudessem se apropriar da metodologia proposta no

documento.

A esse respeito, destacamos duas falas que ilustram esses diferentes sentimentos.

Primeiro, um trecho da parte inicial do PGE/1986 intitulada “Palavras Iniciais”, que

veicula a fala da chefe de departamento à época:

Neste ano que se inicia, não poderia deixar de registrar a grata satisfação que sinto ao ver este trabalho realizado52.Após dois anos de convivência53[...] foi graças a nossa prática e muita discussão que conseguimos chegar a um denominador comum sobre Educação. Baseados nesses valores, começamos a buscar novas metodologias que ajudassem a desenvolver o aluno [...] Tais metodologias devem garantir uma autonomia ao aluno [...] No limiar de 1986, quando efetivamente iniciaremos essa mudança na nossa prática pedagógica, é com orgulho que vejo este Plano Geral de Ensino tendo como diretriz toda essa metodologia, que está sendo orientada pelas professoras M. H.O. V. B.S., D. M. B. N., T. P., M. A., e Z.A. Plano Geral de Ensino do Colégio Pedro II, 1986, p. PALAVRAS DA CHEFE DE DEPARTAMENTO.

Depois, o depoimento da entrevistada A, coordenadora pedagógica naquela

ocasião:

“[...] eu já tinha esse plano na mão antes do ano de 1986 começar. A gente não tinha o PGE ainda, mas eu tinha o rascunho, porque eu já estava tendo contato com a professora M.A.. Eu recebi esse rascunho e, como era um plano importado, não foi feito por nós, eu tinha que entender porque eu que ia gerenciar esse plano na escola. Aí eu passei minhas férias estudando esse plano para entender a situação[...]eu passei minhas férias de 86 entendendo o plano que a assessora tinha escrito.” (Entrevistada A)

Se de uma forma geral, o ano letivo de 1986 apontava para renovações

metodológicas, em relação à área de Ciências, essas mudanças se fizeram sentir de forma

mais contundente, isso porque, com a alteração de regime de trabalho dos docentes, foi

possibilitada a criação do espaço do Laboratório de Ciências.

52 Refere-se ao PGE/1986. 53 A entrevistada refere-se ao tempo de criação dos Pedrinhos.

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90

Em 1985, quando todos os professores ainda trabalhavam com 20h, o professor extrapolava a carga horária, para dar todas as matérias54. Aí foi necessário que as turmas tivessem dois professores, um de português e matemática e outro de estudos sociais e ciências, aí eu logo me prontifiquei: - Quero dar estudos sociais e ciências...[...] Nessa época a gente não tinha laboratório e eu fazia aulas práticas na sala de aula e fazia com as crianças. Quando chegou em agosto desse mesmo ano de 1985, houve uma outra virada estrutural na escola, todo mundo passou a ter 40h [...] E aí sobrou professor...[...] então está sobrando professor, vamos fazer um laboratório de ciências... Eu me interessei pelo laboratório porque fiquei sobrando. Na época não tínhamos espaço para o laboratório e aí existia um buraco, onde ficava o ar condicionado central da FAHUPE. E foi para lá que nós fomos, pedimos para colocar dois tanques... Já tinha uma bancada no meio e nós pedimos para botar mais uma bancada na parede e, ali, começamos o laboratório...” (Entrevistada A)

A conquista para o salto de qualidade no ensino de Ciências, na opinião dos

professores envolvidos na pesquisa, estava dado. Além da destinação do espaço físico, a

grande conquista se configurou pela garantia institucional de destinação de docentes que

passariam a se dedicar exclusivamente à elaboração de atividades práticas para as aulas de

laboratório de ciências, em conjunto com a coordenação de área da disciplina e os

professores de núcleo comum.

No bojo da reestruturação do trabalho de ciências, outra conquista relatada pelos

sujeitos envolvidos na pesquisa foi a garantia da dupla docência, que possibilitou a atuação

de dois professores durante a aula de laboratório: o docente de Ciências, do núcleo comum,

e aquele responsável pela atividade prática (professor de laboratório). A dupla regência

tanto contribuía para uma melhor assistência e orientação aos alunos durante as aulas

práticas, quanto possibilitava que o professor de núcleo comum explorasse, em sala de

aula, de forma mais contextualizada, as situações vivenciadas pelos alunos no laboratório.

A esse respeito, a entrevistada A declara:

54 O professor de 1ª à 4ª séries para lecionar as atividades do núcleo comum precisaria dar no mínimo 24h de aula, como o contrato era de 20h, a solução encontrada para o problema foi dividir as atividades de núcleo comum entre dois docentes, até que o diretor geral pudesse ter autorização do MEC alterar o regime de trabalho docente dentro do Colégio Pedro II.

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91

[...] nós temos uma dupla regência no laboratório de ciências, isso é muito importante. [...] leva a gente a ter um bom resultado e não só resultado em termos de nota, a gente percebe o grande interesse das crianças pela área de Ciências (Entrevistada A).

É curioso verificar que o plano de Ciências, no PGE/1986, apresenta nova proposta

de trabalho, com abordagem de conteúdo e estratégias de ensino bastante inovadoras,

incluindo quantidade significativa de atividades práticas. Entretanto, nenhuma seção do

plano de Ciências menciona as aulas de laboratório, cuja existência e importância é ponto

de unanimidade entre os entrevistados. O exame do PGE/1986, se tomado sem o

cruzamento de dados produzidos nas entrevistas, não permitiria que o examinador inferisse

a dinâmica adotada em seu desenvolvimento.

A organização seriada dos planos anteriores é mantida. Em relação às

considerações gerais sobre o ensino de Ciências, para as turmas de 1ª série não

alfabetizada, o plano determina que:

Considerando que o desenvolvimento da inteligência se acha diretamente relacionado à organização e à estruturação do Eu e o Mundo e que isto ocorre interligado ao desenvolvimento afetivo e psicomotor, utilizou-se como núcleo gerador do trabalho de iniciação às Ciências nas classes de 1ª série não alfabetizadas, o desenvolvimento da psicomotricidade (PGE/1986, p.211).

Desse modo, o documento esclarece que, sob esse enfoque, não era preconizada a

motricidade como ação pura, mas como ação intelectualizada em que, por meio do

movimento, a criança teria oportunidade de:

- descobrir os contrastes, adquirindo, assim, um vocabulário específico, que lhe permitirá expressar uma situação vivenciada; - organizar e ampliar o espaço a partir da organização do seu próprio corpo, chegando à estruturação do seu esquema corporal; - organizar e ampliar o seu pensamento lógico, permitindo-lhe a construção de seu próprio conhecimento (PGE/1986, p.211).

Dentro dessa perspectiva, dois grandes objetivos foram formulados para o ensino de

Ciências nas classes de 1ª série não alfabetizadas: enfatizar o trabalho pedagógico em

Page 92: Dissertação míriam moreira duque

92

atividades sensório-motoras e perceptivas, e valorizar a utilização dos contrastes como

forma de descobrimento do eu e do mundo. Assim, o plano de Ciências recomendava que a

atividade docente proporcionasse à criança meios para que ela pudesse vivenciar situações

concretas de aprendizagem, principalmente aquelas em que o instrumento primordial fosse

o seu próprio corpo, pois dessa forma seria possível assegurar a interiorização das noções

fundamentais necessárias à aquisição da leitura e da escrita.

Nas demais séries do 1º grau, era recomendado que o ensino de Ciências

concorresse para que o aluno assumisse uma atitude progressivamente científica. Dessa

forma, era sugerido ao professor “proporcionar à criança meios para satisfazer a sua

curiosidade natural, para manifestar seu potencial criativo e vivenciar as etapas do método

científico, compatíveis com o seu desenvolvimento mental” (PGE/1986, p.217). De acordo

com o documento, a orientação consciente do professor é condição essencial para que o

aluno supere medos e superstições, o que o conduziria à compreensão dos fatos e

fenômenos naturais.

Os objetivos da área são distintos, por série:

1ª série: Vivenciar situações concretas para que possa perceber os fatos e fenômenos que ocorrem no meio ambiente. 2ª série: Vivenciar situações que concorram para a sobrevivência do homem e dos seres vivos na superfície da Terra. 3ª série: Desenvolver atitudes e valores que propiciem a manutenção da vida, a preservação da saúde e do ambiente. 4ª: Reconhecer as relações dos seres vivos com a natureza e as transformações que nela ocorrem. (CP II, PGE/1986, p.217)

O trabalho foi proposto para ser desenvolvido em cinco unidades básicas. Estas

seriam trabalhadas durante as quatro séries, tendo uma gradação, em cada tema, do assunto

a ser enfocado, “com o objetivo de facilitar a aprendizagem de princípios da Ciência, que

são subjacentes aos fatos comuns da vida, mas que, na escola, precisam ser trabalhados e

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93

organizados em uma sequência que atenda aos estágios do desenvolvimento mental do

aluno (op. cit. p. 218). Segundo a Entrevistada C:

Foi muito interessante porque, quando a professora M.A. apresentou o programa, assim os eixos principais de ciências, eu me encantei, porque era a ciência concreta para a criança, a criança vivia a ciência e aí eu entendi que não precisava ter um conhecimento de Ciências, mas como despertar um sentimento na criança...[...] Nó tivemos que estudar muito, mas não especificamente ciências, mas sim a construção do conhecimento na criança.. Como é que a criança construía o conhecimento científico dela, então esse foi o nosso desafio...[...] Como é que a gente ia colocar isso para o primeiro ano, que antigamente era o CA, alfabetização? Como é que a gente ia fazer com que a criança construísse mesmo esses saberes sem dar pronto? Porque o que mais me encantou no programa foi que a gente não dava para a criança pronto.

São os seguintes os temas básicos e suas distribuições nas séries:

Tabela 5 – Plano de unidades didáticas – 1o segmento do EF. TEMAS 1ª SÉRIE 2ª SÉRIE 3ª SÉRIE 4ª SÉRIE

I – O Homem

O nosso corpo: a relação com o outro e com o

mundo

O homem, os alimentos e a sobrevivência

O homem e a manutenção da vida

O homem e suas relações com o

ambiente -A locomoção do

homem -A comunicação com o

ambiente II- Os

seres vivos Os seres e a

natureza Os seres vivos e a sobrevivência do

homem

Os seres vivos e a alimentação do

homem.Como se alimentam: os

animais e vegetais.Hábitos

alimentares

Os seres vivos e as relações de

dependência: .como respiram os animais e vegetais; . como circulam os

alimentos nos vegetais e animais;

. a reprodução e o desenvolvimento dos animais e vegetais.

III Higiene e Saúde

A nossa saúde A importância dos hábitos higiênicos para

a sobrevivência do homem

A higiene e a preservação da saúde

A higiene - a saúde e a sobrevivência do

homem

IV A Terra O solo: habitat dos animais e

plantas

-O solo e sua utilização pelo homem

-A formação dos dias e das noites e as estações do ano dependem dos movimentos da Terra

-O solo e os seres vivos

-A Terra, seus movimentos e a

influência sobre os animais e vegetais

-O solo: agentes modificadores

- A Terra, o Sol e a Lua

V- Matéria e energia

A luz e o calor O calor (sua ação como agente natural) e a

eletricidade

A energia e o trabalho do homem

A energia e as máquinas

Fonte: Plano Geral de Ensino, 1986, p.218.

Page 94: Dissertação míriam moreira duque

94

De forma geral, é possível perceber o esforço empreendido na distribuição de

conteúdos pelas séries, de modo a ajustar o trabalho proposto ao que era anteriormente

desenvolvido. Em relação ao plano de ensino da 4ª série, há uma observação no documento

que evidencia preocupação em relação à terminalidade da série:

Dentro da nova metodologia de trabalho de 1ª à 4ª série, que será desenvolvida, observa-se que o plano de curso da área de ciências de 4ª série estava fora da realidade das experiências que haviam sido trabalhadas com a clientela que a comporá. Com apoio do trabalho proposto pela professora MA, mediante a análise dos PGE de 1984 e 1985, e depoimentos de supervisores e professores, foi montado, pela Coordenação Pedagógica de Ciências, um plano de curso da 4ª série para esta área, de forma que tentará resgatar alguns objetivos não trabalhados nas séries anteriores e propiciar o máximo de novas experiências, sugeridas pelo presente trabalho, a serem desenvolvidas na 4ª série. Desta forma, cabe aos professores, supervisores e ao coordenador de área uma análise contínua do processo ensino-aprendizagem para esta série, no sentido de, havendo maiores possibilidades, ampliarmos o trabalho proposto [...] propiciando sempre ao aluno, como sujeito do processo, a adaptação às condições ambientais pela compreensão dos fatos e fenômenos naturais (CP II, PGE/1986, p. 265).

O PGE/1986 trouxe, em sua edição, uma nova diretriz de ensino, a Diretriz de

Ensino Nº 03 do 1º segmento do 1º Grau, a terceira tentativa de ajustar o processo de

avaliação em um segmento cuja especificidade tornava frágil a estrutura quase

sesquicentenária da instituição.

[...] mas tinha várias contradições que aconteciam. Por exemplo, no Colégio Pedro II a gente tinha [...] a prova única, quando se trabalha uma metodologia que envolve a construção dos conhecimentos, que a gente sabe que cada criança tem o seu tempo, a dinâmica de cada turma. O próprio professor precisava do seu tempo para se assenhorar daquilo dali, então depois mete a camisa de força para poder fazer a prova, não podíamos fazer a prova com o conteúdo do bimestre. Nós tínhamos que fazer uma prova pelo menos com os conteúdos que todos tivessem trabalhado. Então havia aquela discussão: puxa vida, mas eu trabalhei tanto, prova única é muito mais fácil que a minha prova, onde já se viu isso! (Entrevistada D)

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95

Apesar do esforço empreendido nessa reformulação, os avanços foram pequenos, as

provas únicas55 deixaram de ser bimestrais e passaram a ser semestrais, mas a média anual

de 70 (setenta) para aprovação, com resultados parciais ponderados, persistia. Outro

avanço que é possível verificar no sistema de avaliação foi alcançado em relação à classe

de alfabetização, que passou utilizar conceitos, ao invés de “graus representados por

números inteiros numa escala de 0 a 100” ( PGE/1986, p.18), como nas demais séries.

O exame do PGE/1986 permite verificar que a proposta pedagógica para o ensino

de Ciências nele inserida reformulou de forma substancial os PGEs anteriores, trazendo

para a área uma reflexão mais ampliada, que remete à necessidade de investimento na

perspectiva da educação científica.

Ele apresenta estrutura menos conteudística, abolindo do plano o enfoque

tradicional que remete à memorização de nomenclaturas. Em substituição, propõe a

abordagem de conteúdos contextualizada, buscando atribuir-lhes significado ao relacioná-

los com situações da vida cotidiana. É possível considerar que o PGE/1986, na área de

Ciências, além de evidenciar preocupação em propor atividades de ensino dentro de uma

metodologia que respeita o estágio de desenvolvimento do pensamento do aluno, pelo tipo

de abordagem de conteúdo, também parece prenunciar o enfoque CTS. Pelo tipo de

trabalho pedagógico sugerido, acredita-se que os formuladores da proposta também

acreditavam ser difícil, ou quase impossível, compreender o mundo atual sem que fossem

oferecidos aos alunos conhecimentos básicos acerca da ciência, da tecnologia e da

sociedade.

Ainda na análise dos conteúdos elencados no plano, é possível constatar que a

seleção de conteúdos e as sugestões de atividades seguiram critérios objetivos, oferecendo

55 Prova elaborada pela coordenação para aferir o conhecimento dos alunos em relação aos conteúdos programáticos desenvolvidos pelos docentes. N Naquele ano de 1986, as provas únicas eram semestrais, previstas para os meses de julho e dezembro.

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96

subsídios para a formação do raciocínio crítico, essencial para a aquisição da postura

cidadã, que habilita para a participação da vida em sociedade. A preocupação expressa nos

documentos era com a aprendizagem efetiva do aluno. Para tanto, com base nas teorias do

desenvolvimento de Piaget, a proposta enfatizava a aprendizagem através de atividades

concretas. A tônica do trabalho docente, nessa perspectiva, deveria estar calcada no

questionamento que deve ser proposto ao aluno, a fim de promover a reflexão acerca das

situações cotidianas, que são utilizadas como estratégia de ensino na sala de aula.

Dessa forma, é possível considerar que, no PGE/1986, o ensino Ciências é proposto

por meio do uso de estratégias que possibilitem formar no discente conceitos básicos para a

leitura e a compreensão da ciência e do mundo em conformidade com a compreensão de

que, principalmente nas séries iniciais do primeiro segmento, na perspectiva da educação

científica, o ensino de Ciências deve promover a alfabetização científica.

5.4. O PGE de 1988

A exemplo dos PGEs anteriores, no documento de 1988, constam os planos de

curso de todas as áreas do primeiro segmento e mais, o das atividades complementares:

Artes Plásticas, Educação Musical, Educação Física e Literatura. À época da elaboração do

PGE/1988, já eram quatro as unidades do primeiro segmento, todas recebiam orientações

emanadas do mesmo departamento, cujo objetivo era também o de promover uma unidade

de trabalho.

Na parte introdutória do documento, como de praxe, há pequenos discursos, que

permitem inferir alguns elementos do contexto institucional no qual o documento foi

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97

elaborado. Para tanto, destaca-se o discurso do diretor geral, que ressalta a importância do

processo de implantação de uma nova metodologia de trabalho pedagógico:

No conceito de Bernardo de Vasconcelos, o nome tutelar desta Casa, as inovações hão de conter a sanção do uso. Por isso, a máxima de “conservar, melhorando” é a geratriz de todas as orientações metodológicas adotadas, no decurso desse lustro de existência do segmento básico de ensino do primeiro grau do Colégio Pedro II. Sem alardes, mas com decisão, a equipe de jovens e competentes professores dos quatro “Pedrinhos” vem aplicando seu talento e sua dedicação ao magistério a serviço da grande tarefa de mostrar ao Brasil que uma Casa sesquicentenária é capaz de amoldar-se aos problemas da modernidade em matéria de Educação do povo brasileiro ( PGE/ 1988, p. 3).

Ainda nas páginas iniciais, há um trecho no qual a chefe de departamento do

primeiro segmento agradece a colaboração das professoras que elaboraram a proposta

curricular do primeiro segmento e a dedicação durante o processo de assessoramento

pedagógico: “[...] Não poderia deixar de fazer aqui um agradecimento ao competente

grupo de professoras, autoras da proposta que estamos aplicando e que, nesses três anos,

tem aperfeiçoado nossos professores [...] (PGE/ 1988, p. 5)”.

Faz-se importante destacar que, desde o segundo semestre de 1985 até o mês de

fevereiro de 1988, a equipe de assessores orientou o trabalho de implantação da nova

proposta metodológica. De março em diante, a própria equipe de coordenadores cumpriria

essa função.

Ilustrando esse momento, destaca-se o trecho das palavras da chefia de

departamento, em que é entregue, à equipe de coordenadoras, a continuidade do trabalho

iniciado pelas assessoras do Laboratório de Currículos:

[...] é com muita satisfação que vejo, dentro do nosso corpo docente, um grupo de multiplicadores se formar de acordo com essa proposta metodológica e que, em 88, fará o aperfeiçoamento dos professores, competente grupo de professoras, autoras da proposta que estamos aplicando e que nesses três anos tem aperfeiçoado nossos mais novos . Como era de se esperar, em função da expansão do nosso segmento, o número de professores que ingressa a cada ano é muito grande e, somente em 89, é que conseguiremos completar o nosso quadro. Daí a importância desse treinamento intensivo. Espero que, no futuro, com a dedicação de

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98

todos, tenhamos uma equipe de profissionais trabalhando em uníssono para que o nosso aluno possa ter a melhor formação possível (PGE/ 1988, p.5).

Em relação à área de Ciências, praticamente não há novidades na redação do

documento. A diferença mais significativa foi a diminuição da carga horária de Ciências na

2ª série – de 4horas/aula para 3 horas/aula por semana. Outra mudança foi a reformulação

na redação de alguns poucos objetivos no plano de ensino. Do ponto de vista didático e

metodológico, não foi veiculada nenhuma modificação.

Reiterando a tese de continuidade em relação ao PGE/ 1986, também permanece

inalterada a diretriz de ensino, sendo mantidos os critérios de avaliação.

Cabe ressaltar que, se o processo de análise documental conduz ao entendimento de

que os anos que se sucederam à implantação do programa elaborado pela equipe de

assessores pedagógicos foram marcados pela continuidade e manutenção do que foi

proposto inicialmente, na prática, as entrevistas apontam para o contrário. No dizer das

professoras, a prática evidenciou experiências diversas de recontextualização da proposta,

desde o início do processo:

Esse material de laboratório de currículos do Estado ele era um material que trazia uma série de sugestões práticas metodológicas e isso foi incorporado em nosso plano. Então ele vinha com uma série de sugestões práticas que a gente tentava botar em prática, algumas davam certo e outras não. Paralelamente a isso todo corpo de professores, os coordenadores e os supervisores de área se envolviam nessa questão e aí também começou a acontecer uma produção que era coletiva, ou seja, de a gente enxergar coisas novas naquele plano. O que a M. A. ficava felicíssima, ela adorava quando a gente dizia: - Olha, fizemos isso em cima daquele objetivo, deu certo, foi bom! E ela achava aquilo muito legal porque de certa forma a gente também estava enriquecendo um trabalho que ela havia trazido e sugerido para nós. E aí foi uma produção coletiva as pessoas que estavam no laboratório, dos professores que estavam em sala de aula, de nós que estávamos na coordenação, dos supervisores de série, todo mundo trabalhava junto, era um trabalho que é difícil você saber ..., era um trabalho todo coletivo em cima do plano, mas modificando também esse plano que foi importado, então tomou toda uma transformação (Entrevistada A).

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A assessora e autora da proposta revela a sua surpresa com a apropriação e

recontextualizaçao por parte da equipe de docentes:

Houve um momento até que as meninas me surpreenderam quando nós trabalhávamos com alfabetização e elas montaram o laboratório que elas chamavam de labquadra56. O que que era? Como a criança trabalhava com o próprio corpo, o laboratório não era uma sala fechada, o laboratório era a quadra da escola, quer dizer, foi assim maravilhoso, cada dia que você chegava e olhava, às vezes eu chegava antes ficava olhando o trabalho do pessoal [...] ficava maravilhada, não é ? É isso que é educação, é isso que eu quero, é isso que é uma construção do futuro para elas (Entrevistada E).

É possível perceber que as mudanças metodológicas na área de Ciências ocorriam

na prática de forma marcadamente dinâmica, evidenciando um distanciamento entre a

experiência vivida e a prescrita.

O exame dos planos de ensino da disciplina de Ciências permite compreender que,

entre o primeiro PGE, elaborado em 1984, e o de 1988, houve mudança na concepção de

atividades práticas, alteração na abordagem dos conteúdos e a introdução de novas

temáticas. Assim, ressalta-se que tais modificações podem ser consideradas como produto

das inquietações que cercaram a equipe docente na busca por novos referenciais teóricos,

sobretudo motivadas pelo processo de formação continuada, vivenciado pela equipe de

professores entre 1985 e 1987.

O zelo em garantir o espaço para acompanhamento do trabalho desenvolvido e a

disposição em ajustar o plano, adequando-o, conforme avaliação da equipe docente,

demonstram o esforço empreendido para perseguir melhores resultados na ação

pedagógica. Entende-se, também, que a produção de novos documentos curriculares

representava a oportunidade de reformulação, servindo para minimizar o descontentamento

de alguns professores com a quantidade de conteúdo contida nos PGEs.

56 Projeto ainda desenvolvido na Unidade Humaitá I.

Page 100: Dissertação míriam moreira duque

100

O PGE produzido em 1988 reuniu elementos que permitiram que ele vigorasse até

1996. Em 2002, conforme determinação da LDB no 9394/96, foi elaborado o Projeto

Político Pedagógico (PPP) e um plano de Ciências, em conformidade com os PCN.

Como pode ser observado, dos seis documentos produzidos ao longo dos vinte e

cinco anos de história do primeiro segmento no Colégio Pedro II, quatro foram produzidos

no período estudado, o que demonstra se tratar de um momento de efervescência

institucional em torno da formulação de uma proposta pedagógica para o primeiro

segmento.

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101

CAPÍTULO 6 – REVIVENDO O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DO

CURRÍCULO DE CIÊNCIAS

Neste capítulo são analisadas as entrevistas realizadas com alguns dos participantes

do processo estudado. Na formulação do roteiro das entrevistas, buscou-se detectar, na

percepção dos entrevistados, os fatores que contribuíram para a consolidação da área de

ciências, evidenciada pelos resultados alcançados pelos alunos na disciplina. A análise das

respostas apontou para a importância do processo de formação continuada, implementado

nos anos de 1980, que possibilitou a adoção de uma nova concepção de ensino de Ciências

na instituição, além de valorizar a reflexão cotidiana acerca da prática.

As questões propostas nas entrevistas possibilitaram, também, traçar, de forma

sucinta, o perfil acadêmico e profissional dos entrevistados. O delineamento desse perfil

trouxe elementos de análise que, em conjunto com as demais questões formuladas,

permitiu localizar os fatores que promoveram a criação do espaço do Laboratório de

Ciências, que simboliza um divisor de águas entre o trabalho dos dois anos iniciais de

implantação e o resto da trajetória do ensino de Ciências no primeiro segmento da

instituição.

Conforme citado anteriormente, foram realizadas seis entrevistas. Os roteiros

utilizados diversificaram-se em função do cargo exercido pelo entrevistado no período

estudado. Contudo, todos têm o mesmo objetivo: colher impressões dos sujeitos acerca dos

fatores que contribuíram para a consolidação da área de Ciências, enfatizando-se o

processo de implantação do currículo de Ciências no primeiro segmento do EF. Os roteiros

encontram-se nos anexos I, II, e III.

As categorias de análise das entrevistas foram formuladas em função dos objetivos

da pesquisa. É importante destacar que não foram registradas as frequências numéricas dos

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102

elementos categorizados, por se pretender ilustrar a riqueza das interpretações que o

resgate do processo vivido suscitou nos sujeitos da pesquisa. Nesse sentido, as

reincidências das falas foram registradas nas respectivas categorias de análise como forma

de ratificar o quanto a percepção individual humana “particulariza uma experiência

coletiva” e, ao mesmo tempo, demonstrar a singularidade inerente ao processo de

comunicação verbal – há formas muito pitorescas de o professor relatar suas experiências

cotidianas. Assim sendo, procurou-se preservar as características da linguagem falada,

reproduzindo de forma quase integral57 as expressões adotadas pelos docentes durante a

narração dos fatos. A seguir apresentamos as categorias que identificamos na transcrição

das entrevistas com os respectivos elementos e análises.

Tabela 6 – Formação Docente

CATEGORIAS: FORMAÇÃO INICIAL / CURSOS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES

ELEMENTOS

Eu acho que a formação inicial58 ela deixa muito a desejar. Eu tive dois anos de didática de ciências na Escola Normal. Então eu não posso esquecer, eu tive uma didática de ciências que trazia todo o método experimental e eu não tive isso na formação, na graduação. Minha professora de sexta e de sétima séries que é uma pessoa que hoje está no meio universitário. Então, ela levava para sala de aula de sexta e de sétima série experimentos que, naquela época, era novidade, experimentação na sala de aula e aquilo me marcou profundamente. Eu acho que a Escola Normal supera a Faculdade de Educação. Eu considero que a escola normal foi mais importante nesse aspecto de procedimentos e de entender o que é uma sala de aula. A minha formação do Normal me permitiu chegar à prova do Pedro II e passar. A gente sai do Curso Normal e da universidade, mesmo com os estágios, a gente sai sem saber dar aula. O trabalho em educação começou a partir da Escola Normal e dos colégios de aplicação. O professor tinha dificuldade em orientar a normalista. A grande dificuldade era entender o trabalho de 1ª à 4ª série. A escola normal realmente foi para mim um fundamento maravilhoso.

57 Na transcrição das falas dos professores, foram excluídas algumas repetições que caracterizam a linguagem oral. 58 Refere-se ao curso de Licenciatura em Ciências Biológicas em uma universidade federal do RJ.

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103

É importante ressaltar que, ao se inserir a categoria formação inicial

separadamente, pretendeu-se trazer para o debate as reflexões dos docentes acerca do

processo de formação profissional vivenciado nos cursos de formação de professores. O

exame das falas permite observar que, nas narrativas sobre formação acadêmica, os

professores citam experiências que influenciaram sua formação profissional, que

antecedem o ingresso nos cursos de formação. É possível inferir que os docentes têm dado

à experiência o reconhecimento devido no processo de aquisição do saber profissional,

ratificando de diferentes maneiras as considerações de Moita (2000), que afirma que

ninguém se forma no vazio, que formar-se supõe troca, experiências, interações sociais,

aprendizagens, um sem fim de relações.

Nessa perspectiva, o modo como cada pessoa se forma está relacionada “à

singularidade da sua história e, sobretudo, ao modo singular como age, reage e interage

com os seus contextos”. Portanto, para entender como cada pessoa se formou, é preciso

estabelecer relações entre as “pluralidades que atravessam a vida”, compreendendo que a

vida é por si mesma um percurso de formação, um processo de formação. (op. cit., 2000, p.

115)

Sobressaem, também, nas falas das entrevistadas, as críticas aos cursos de

formação, sobretudo os de licenciatura. Apesar de tudo, há indiscutivelmente, um

diferencial atribuído ao Curso Normal e ao seu papel de destaque na formação docente. É

curioso verificar que também as assessoras do Laboratório de Currículos relatam que a

experiência adquirida para lidar com alunos do curso fundamental, que possibilitou a

elaboração de uma proposta curricular para ser implantada oficialmente em todo Estado do

Rio de Janeiro, teve origem, igualmente, na experiência com a Escola Normal. Esses

depoimentos remetem à reflexão acerca do que se tem oferecido no lugar desse curso,

questionando se a universidade terá a humildade de resgatar e inserir os elementos

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104

curriculares cujo tempo e experiência reconhecem como importantes na antiga formação

docente de nível médio, no currículo do curso de pedagogia, ao qual coube a

responsabilidade de formar professores que atuarão na base do sistema de ensino.

Tabela 7 – Formação Continuada : Assessoria

CATEGORIAS: FORMAÇÃO CONTINUADA / ASSESSORIA EXTERNA

ELEMENTOS

*Agora consigo ver a importância da formação continuada do Pedro II na forma como eu estou no ensino de Ciências. Trouxeram uma assessoria do Estado para cá, que mostrou novos horizontes para nós. *Esse material de laboratório de currículos do Estado ele era um material que trazia uma série de sugestões práticas metodológicas. *Então essas questões59, elas foram determinantes em minha vida profissional, porque acendeu o meu gosto pelo ensino de Ciências. *Com as assessorias vindas do laboratório de currículo, havia possibilidade de a gente fazer um trabalho diferente. * Porque a gente estava sedento de conhecimentos e apaixonados também, porque nós nos apaixonamos, eu acho que isso aí foi fundamental. *Era um olhar diferente sobre a criança, era um trabalho encantador para mim. *Todo mundo caiu de cabeça mesmo. Todo mundo foi contaminado por aquela onda, até porque essas professoras de laboratório eram pessoas muito experientes e elas traziam as coisas com tanto idealismo, com tanta seriedade, com tanto compromisso... *Porque você estava ali com o professor de 15 em 15 dias. Então ele ia até a sala de aula, ele fazia as suas atividades e trazia o retorno para nós. Então a gente tinha a oportunidade de dizer ao professor: - E se você fizesse mais isso, não seria melhor? E se você questionasse mais essa criança? |E se você desse mais tempo para essa criança descobrir, não seria melhor? Então, daí, ele voltava na semana seguinte, a gente via que o resultado tinha realmente sido válido. *A gente Achava assim: se o coordenador didático vai ter acesso e depois vai ter que passar para o supervisor e o supervisor pro professor de turma, é um pote que vira para o outro pote e acaba que, quando chega ao professor, está um pontinho de nada de saber. Então a gente tem que colocar o pessoal mais perto, todo mundo faz o curso...

59 Refere-se às inovações trazidas pelas assessoras do Laboratório de Currículos.

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Tabela 8 – Formação Continuada: planejamento coletivo

CATEGORIAS: FORMAÇÃO CONTINUADA / PLANEJAMENTO COLETIVO

ELEMENTOS

*Então eu acabava tendo aqui dentro essa efervescência da troca com os colegas de trabalho, muitos com muita experiência. *O planejamento das aulas, a troca de idéias na hora do recreio, nos corredores, porque aqui é assim, quer dizer é difícil você parar de pensar naquilo, a gente troca ideia praticamente o tempo todo. * Com os professores, nós tínhamos um tempo de mais ou menos 60 minutos em que a gente então discutia aquilo que era para a próxima, execução do planejamento para a próxima semana, que era no miudinho. * Porque depois cada um em sua sala tem sua prática, tem a sua experiência, sua vivência que vai colocar aquilo da sua própria forma. Porém tendo o conhecimento, tendo a fundamentação teórica, as pessoas mais ou menos se aproximam de uma linha condutora, de uma proposta metodológica,

Tabela 9 – Formação Continuada: reflexão sobre a prática

CATEGORIAS: FORMAÇÃO CONTINUADA / REFLEXAO SOBRE A PRÁTICA

ELEMENTOS

*Então em primeiro lugar aprender um pouco sobre como as crianças pensam que isso a gente sai da universidade, a gente sai do Curso Normal, mesmo tendo feito estágio, a gente sai sem saber, isso a gente só adquire na prática. *De você parar ouvir a criança, como ela está raciocinando e aí tentar reformular a sua pergunta. Você vai para casa e repensa o que ela disse para você e aí a segunda aula de laboratório nunca é como a primeira aula *Porque o concreto muitas vezes faz com que você não tenha noção da resposta, então você tem que refazer. Isso foi fantástico que cada turma era uma turma e a gente via o quanto a gente tinha que ficar reformulando

Na categoria formação continuada foram elencados elementos dividos em três

subcategorias. Ao selecionar os elementos de análise, pretendeu-se recuperar a dinâmica

do processo vivenciado, assim como resgatar as impressões dos sujeitos entrevistados

acerca da relevância desse processo para a sua formação profissional. Os professores

entrevistados destacaram aspectos da experiência institucional que contribuíram para o

enriquecimento da formação profissional, construída ao longo do processo de implantação

do programa de Ciências no primeiro segmento do EF. Para efeito de análise, o conteúdo

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106

das narrativas foi assim agrupado: assessoria externa, planejamento coletivo e atividades

cotidianas.

Quanto à subcategoria assessoria externa, destaca-se a singularidade do programa

desenvolvido, em função tanto do tempo de duração, como da metodologia adotada para o

acompanhamento do trabalho pedagógico dos professores.

O programa de formação continuada teve a duração de aproximadamente três anos,

com encontros institucionais regulares entre professores, assessores e coordenadores

pedagógicos. Havia controle rígido de frequência dos encontros, pois tais momentos

estavam inseridos na carga horária de todos os docentes nele envolvidos.

Fugindo à lógica dos cursos de formação continuada promovidos na maioria dos

programas elaborados para esse fim, o Programa de Assessoria proporcionou aos docentes

um apoio durante o processo de implantação da proposta pedagógica, dando-lhes voz e

espaço para discutir sobre as mudanças pedagógicas que lhes eram propostas. A esse

respeito relata a entrevistada D:

Eu acho assim que quando a gente tem um cursinho no inicio do ano, você refresca, todo mundo fica animado, mas você vai para a sua prática, você começa a ousar, mas a coisa não funciona como você espera. Você sente medo porque o que você fazia antes, de uma certa forma, mesmo que não fosse o melhor, você conhecia, sabia como que você dava conta daquilo, mas o novo, você não faz o que você não sabe. E se você não sabe continuar com o novo, você para. Então eu achava importante não era só o início. Era o sacudiu, arejou, que beleza! Mas e agora, no vamos ver? Como é que eu vou lá? [...] o trabalho era muito diferente de tudo que a gente já tinha feito. Então só com o atendimento mesmo é que dava conta. (Entrevistada D)

As atividades de assessoramento pedagógico se constituíram em espaços de

discussão de base teórica e análise de atividades desenvolvidas à luz da teoria estudada. O

espaço para troca e reflexão da prática acontecia entre professores das diferentes unidades

escolares que, ao final do período de Assessoria Externa, já eram três: São Cristóvão

(criada em 1984), Humaitá (1985) e Engenho Novo (1986). Os encontros eram semanais e

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107

ocorreram a partir do segundo semestre de 1985 e durante o ano letivo de 1986 e 1987.

Nessas reuniões, organizadas pelo Departamento de Primeiro Segmento do Ensino

Fundamental e por representantes do Laboratório de Currículo, eram debatidos textos de

fundamentação teórica, em geral de autores interacionistas, como também eram analisadas

e comentadas as atividades desenvolvidas pelos professores em sala de aula. As discussões

favoreciam a reflexão sobre as práticas docentes, propiciando novas aprendizagens sobre o

processo de ensino e gerando, também, em muitas professoras, a preocupação em não dar a

lição pronta. Havia uma atitude de vigilância quanto à exploração de idéias, como no dizer

de Hodson (1998, p.15): “é na exploração de idéias que se constitui o processo de

aprendizagem; o experimento apenas favorece a evidência concreta, para explorações

conceituais posteriores”.

Além disso, havia ainda o auxílio das coordenações pedagógicas, que suscitavam a

adoção, por parte dos professores, de novas práticas avaliativas. A formação “tradicional”,

já sedimentada, era, dessa forma, confrontada com teorias novas para o grupo. O grupo

experimentava o que Nóvoa denomina “efeito rigidez” (1995 p. 17):

Há aqui um efeito rigidez que torna os professores indisponíveis para a mudança. É verdade que os profissionais do ensino são por vezes muito rígidos, manifestando uma grande dificuldade em abandonar certas práticas, nomeadamente quando foram empregues com sucesso em momentos difíceis da sua vida profissional.

A riqueza de experiência que o Programa de Assessoria promoveu encorajou a

criação do espaço do Laboratório de Ciências nas demais Unidades Escolares. O espaço

deixou de ser um projeto isolado da unidade São Cristóvão, na qual fora gestado, para

constituir-se em espaço institucionalizado para a realização das aulas de Ciências,

pressupondo, para tanto, a inclusão das atividades práticas no horário de planejamento

pedagógico semanal institucionalizado.

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O contato com a literatura pedagógica evoca a reflexão sobre a importância dos

espaços de trocas de experiência, internos à escola. Nessa direção, retoma-se Candau, que

aponta para a importância da escola como “lócus” privilegiado da formação continuada de

professores. A autora critica os modelos clássicos de formação continuada que valorizam a

universidade como “lócus” da formação continuada, questionando se:

Por trás da visão considerada “clássica” não está presente a concepção dicotômica entre teoria e prática, entre os que produzem conhecimento e o estão continuamente atualizando, e os agentes sociais responsáveis pela socialização destes conhecimentos? (CANDAU, 1997, p.55).

Adotando perspectiva semelhante, Nóvoa (1991, p. 30) destaca que “a formação

continuada deve estar articulada com o desempenho profissional dos professores, tornando

as escolas lugares de referência”.

Na opinião dos atores envolvidos na pesquisa, o processo de formação continuada

deflagrado a partir dessa iniciativa institucional constituiu um fator fundamental para a

ruptura com a abordagem tradicional que impregnava o programa de ensino de Ciências

nos anos iniciais do primeiro segmento no Colégio Pedro II.

Como decorrência da dinâmica implementada por ocasião do acompanhamento

pedagógico, durante o período de Assessoria, a reflexão e a avaliação da prática, a troca e a

discussão de atividades elaboradas pelos docentes e o ajuste semanal do plano de

atividades se constituíram uma rotina de trabalho na Unidade Escolar São Cristóvão I. A

perpetuação de tal rotina, ao longo de mais de vinte anos, nos planejamentos coletivos de

série, constituiu-se, no dizer dos sujeitos envolvidos na pesquisa, numa fonte de

crescimento profissional. O reconhecimento da importância desse momento institucional,

como experiência enriquecedora em sua formação profissional, resgata a contribuição de

Candau (1997, p.57), para quem “é na experiência, (...) no cotidiano, que o professor

aprende, desaprende, reestrutura o aprendido, faz descobertas”. Assim, destaca-se que, em

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109

consonância com a perspectiva de formação adotada neste estudo, no qual a formação é

entendida como um “continuum”, como processo que se desenvolve ao longo da vida, os

momentos de planejamento pedagógico coletivos têm proporcionado aos docentes uma

reflexão coletiva sobre a prática, o que remete à recomendação de Lima (2004), que

aponta a reflexão como elemento indispensável na promoção de nexos na prática

pedagógica.

Durante as entrevistas, foi possível depreender que os docentes dão à experiência o

reconhecimento devido no processo de aquisição de conhecimentos. Considerando que,

como afirma Tardif (2000, p.10), a epistemologia da prática é o “estudo dos saberes

utilizados realmente pelos profissionais em seu espaço de trabalho cotidiano para

desempenhar todas as suas tarefas”, verifica-se que a dinâmica adotada como rotina na

Unidade Escolar se constituiu num recurso de relevante importância na formação

continuada dos professores.

A terceira subcategoria destacada dentro do processo de formação continuada,

nomeada como “nas atividades cotidianas”, foi utilizada com o objetivo de registrar que os

docentes reconhecem que, na relação professor-professor, professor-aluno, entre tantas

outras, há processo formativo. A esse respeito, a entrevistada B comenta: “planejamento,

das aulas, a troca de ideias na hora do recreio, os corredores, porque aqui é assim, quer

dizer, é difícil você parar de pensar naquilo, a gente troca ideia praticamente o tempo todo,

então isso contribui bastante”.

Outro depoimento de professor que destaca a importância das três subcategorias

elencadas nesta seção:

Então essa mudança do currículo, a troca de ideias, a abertura para que nós possamos nos encontrar, fazer encontros, a discussão, a existência de coordenadores para as áreas de matemática, ciências, estudos sociais, língua portuguesa. Isso ajuda no nosso trabalho, até no aprofundamento e até para que a gente traga coisas novas de fora que tem sido feitas lá fora

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para cá para dentro, isso também nos auxilia bastante, eu acho que essas coisas todas contribuem para nossa formação. (Entrevistada B)

Conforme assinalado no capítulo três, a prática pedagógica, na qual estão presentes

dimensões sociais, histórico-culturais e políticas, é um espaço importante para o

crescimento profissional, pois não é possível determinar aplicação de regras para as

situações inusitadas que surgem no cotidiano da sala de aula. A atividade docente envolve

a elaboração de respostas a dilemas e conflitos de valores em situações marcadas pela

imprevisibilidade. Dessa forma, o docente, em seu cotidiano profissional, depara-se com

situações em que há um número significativo de casos em que as regras técnicas não são

eficientes para resolver os problemas, sendo necessárias habilidades que o capacitem à

reflexão e à tomada de decisão, e tais habilidades são adquiridas na prática.

Tabela 10 – Objetivos do ensino de Ciências

CATEGORIA: OBJETIVOS DO ENSINO DE CIÊNCIAS

ELEMENTOS

*Há uma preocupação maior com a aprendizagem do que com a quantidade de conteúdo que vai ser trabalhado. *Uma outra característica de 84 para cá, a quantidade de conteúdo teórico que tem que ser trabalhado, claro que o conteúdo não perdeu a qualidade, mas a gente vem buscando trabalhar os conteúdos necessários com uma maior qualidade. *A gente já se conscientizou de que, para ter uma maior qualidade, a gente precisa de atividades diferentes,aquelas que a gente trabalhava lá em 84. *Outra coisa, hoje em dia, em 89 ou 87, já se tinha essa noção de que a decoreba, o conteúdo memorizado, não é o mais importante. O aprender a utilizar esse conteúdo, sim, é importante, é o mais importante. *Precisa memorizar uma coisa ou outra, mas você não vai dedicar seu tempo à memorização, você vai dedicar um trabalho em que aquilo comece a fazer parte dos teus conhecimentos de forma natural. *Porque aqui o mais importante era exatamente essa coisa deles quererem experimentar coisas, a gente desenvolver essa coisa de eles quererem observar a natureza, deles, enfim... e o mais importante era eles (referindo-se aos alunos). *A gente pensava como que a criança ia construir aquele conhecimento e o que eu mais achei interessante é que eles queriam um laboratório especifico para que as crianças pudessem observar e experimentar tudo isso.

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111

*Eu acho que a grande diferença do estudo de primeira a quarta é que o aluno tem que saber ler a realidade que está próxima. Ele aprende aquilo, se ele vivencia.

O Programa de Assessoria Pedagógica contribuiu para a mudança dos objetivos no

ensino de Ciências. É possível depreender que o processo teve início com a incorporação

de teorias da aprendizagem, com base nas ideias piagetianas, mas, ao longo dos anos,

continuou incorporando outras importantes contribuições de teóricos da área. Dentre as

mudanças promovidas, segundo as entrevistadas, ressaltam-se a introdução das atividades

práticas em aulas de laboratório e a ressignificação das estratégias de ensino na própria

condução dessas atividades aos longo dos anos.

Nesse contexto, podem ser percebidas mudanças que apontam para o processo de

ruptura com o ensino de memorização vocabular, que tem caracterizado o ensino de

Ciências ao longo da história. Para tanto, destaca-se a fala da entrevistada B:

[...] isso vem mudando muito, a quantidade de conteúdo teórico que tem que ser trabalhado, claro que o conteúdo não perdeu a qualidade, mas a gente vem buscando trabalhar os conteúdos necessários com uma maior qualidade e então a gente já se conscientizou de que, para ter uma maior qualidade, a gente precisa de atividades diferentes. (Entrevistada B)

Tabela 11 – Concepção do Ensino de Ciências

CATEGORIA: CONCEPÇÃO DO ENSINO DE CIÊNCIAS

ELEMENTOS

*Um outro ponto que é importante no trabalho de Ciências: o conhecimento acumulado não vale de nada se você não consegue usá-lo na sua prática, se você não consegue melhorar a tua vida, se você não consegue explicar coisas que acontecem em tua vida. *Outra coisa que eu tenho visto que ajuda muito para tentar trazer essa ciência que eles acham que só tem naqueles laboratórios sofisticados para cá, para esse lugar assim bem empoeirado, para esse lugar assim bem escolarizado, mas mostrar para eles que aquilo que eles acham que tem lá naqueles laboratórios sofisticados, muitas coisas podem ser trabalhadas, podem ser discutidas, podem ser explicadas, podem ser analisadas aqui em um laboratório simples com poucos materiais com poucos recursos porque muitas coisas que são feitas naqueles laboratórios sofisticados são coisas da própria vida. *A ciência é coisa que pode ser aprendida no cotidiano, num trabalho mais simples como esse que nós fazemos aqui com as crianças e elas ficam fascinadas.

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112

*O que acontece lá nos laboratórios sofisticados e parecem verdadeiras mágicas para as crianças, a gente consegue que ela compreenda que não são mágicas, elas acontecem na natureza e tem uma causa ou algumas causas. E essas causas a gente pode discutir. Nem todas as causas a gente pode aprender, porque eles são muito novinhos, mas eles percebem que, mesmo eles sendo novinhos, tendo poucos conteúdos, eles conseguem pensar a respeito. *Fazer com que as crianças percebam que elas são capazes de pensar. Elas têm capacidade mesmo, elas têm competência, o que a gente quer é mostrar que elas têm essa competência. *Uma coisa é complicada se você mostrar para ela60 que é complicada. Tem certas coisas que ela não pode analisar toda. Ela vai olhar e não vai fazer todas as análises que uma pessoa, um cientista, um biólogo com uma profundidade nos estudos em biologia ia conseguir fazer, mas ela consegue fazer a analise em relação a esse material. Ela consegue fazer análises importantes e obter dados, informações importantes através da observação, através do questionamento, através da discussão entre eles, e a gente mostra isso para ela, que ela é competente. *Acho que essas coisas, mais do que você ter um laboratório, são os pontos altos para você mostrar para a criança: que ela tem competência, que ela tem capacidade, que ela traz informação importante, que a interação é importante, que a troca de ideias é importante, e mostrar que ela está aprendendo. *Acho que essas coisas ajudam muito a criança a aprender, ajudam muito a criança a dar o próximo passo, ter coragem e ousadia de dar o próximo passo. *Eu acho que a coisa do concreto, da experiência é uma coisa muito importante para o ensino de qualquer coisa e principalmente de Ciências. Eu acho que eu fiquei muito feliz de ter participado disso porque eu vejo até hoje essa coisa, como que fica claro para a criança o conhecimento de Ciências. Ela não precisa ter horas de estudo em cima de Ciências, porque ela tem a vivência de Ciências. Então ela carrega dentro dela o que ela construiu do conhecimento dela. * O ensino de Ciências não se faz individualmente, o ensino de Ciências se dá na troca, na observação e na troca, então vocês vão ver que aqui está tudo montado em grupo, nada no laboratório de Ciências é individual, é uma troca mesmo de experiência entre eles, entre os grupos. * É porque a criança só aprende quando interage com o meio, então ela correndo, ela pulando, ela medindo distância, medindo entre aspas, mas ela ia praticamente redescobrindo o conhecimento e isso foi assim maravilhoso. *Olha, é tudo porque Ciências é uma disciplina rigorosamente prática. A criança tem que experimentar, tem que partir do concreto, não adianta você dizer para a criança que o gelo derrete fora da geladeira, ele tem que vivenciar isso. * Você tem que fazer com que a criança goste de descobrir as coisas e que existe história dentro do que ele está vivendo. * A construção parte do aluno e esse é o pressuposto que a professora tem que entender. A professora orienta para ter uma direção. *Eu me sentia despreparada para ser uma coordenadora de Ciências, então a pessoa que vinha dar suporte pedagógico pra gente me convenceu de que eu não precisava disso, porque o mais importante era realmente despertar na criança o gosto pelo estudo científico mesmo.

Nos depoimentos dos docentes, há o reconhecimento de que o ensino de Ciências

precisa promover a educação científica, como processo em que a ciência se constitua num

60 Refere-se à criança.

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113

instrumento para a construção de sentidos que habilitem os indivíduos para a leitura de

mundo, comprometendo-o com a democratização do saber científico e com o acesso aos

bens por esse conhecimento produzidos.

Percebe-se que há uma quantidade significativa de expressões utilizadas de forma

muito rica pelas entrevistadas para retratar as mudanças vivenciadas na concepção do

ensino de Ciências. Destacam-se as ênfases na: contextualização dos conteúdos;

articulação entre o conhecimento científico e sua utilização prática; transferência do saber

científico do lugar do inatingível para o território das reflexões possíveis acerca dos

acontecimentos cotidianos; crença de que o ensino de Ciências não demanda aparatos

sofisticados para promover a vivência de situações de aprendizagem significativa;

necessidade de investimento na capacidade de raciocínio e nas habilidades básicas para o

desenvolvimento do espírito científico do aluno; criação de estratégias que instigam o

aluno a descobrir a alegria de questionar as causas dos fenômenos científicos, encorajando-

o a ir além; importância das atividades em grupo como forma mais apropriada e rica de

promover discussões que geram a construção de conhecimento significativo para os

alunos; predominância de atividades concretas; importância do aluno como centro do

processo ensino-aprendizagem.

Tabela 12 – Laboratório de Ciências

CATEGORIA: LABORATÓRIO DE CIÊNCIAS

ELEMENTOS

Na época nós não tínhamos um espaço de laboratório e aí existia um buraco onde ficava o ar condicionado central da FAHUPE. E foi para lá que nós fomos. Pedimos para colocar dois tanques, nós colocamos mais uma bancada na parede, dois tanques e ali nós começamos o laboratório. Foi assim, muito interessante, o nosso primeiro laboratório foi onde é hoje o nosso almoxarifado, que é um lugar com uma porta sem nenhuma janela, mas era o único lugar que havia bancadas no meio da sala, e um lugar atrás em que a gente poderia guardar o material e aí foi aquele espaço que eu recebi para montar o laboratório.

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114

Isso era para a gente na época uma grande coisa, a gente teria um espaço reservado lá atrás para guardar materiais. Não era um lugar ideal, mas tinha um espaço um pouco mais apropriado para experiências. Naquele espaço você não precisaria estar a todo o momento mudando mesas de lugar. Você já teria a bancada e os bancos. Então, a professora desceria com os seus alunos e eles se organizariam ali para ter as aulas práticas. Nós tínhamos um professor que era específico do Laboratório de Ciências em que a gente orientava e que estava junto com ele fazendo a experiência. A turma chegava e a experiência já estava montada. Porque Ciências, ela precisa de material e na sala de aula o professor não tem condições de trazer, de fazer aquelas coisas todas. Isso (o laboratório) foi uma coisa muito boa que também aconteceu no primeiro segmento. O bom é você criar assim, do nada, não tem nada pronto. Então você vai vendo o que precisa para melhorar. E tudo podia, tudo aparecia. Aqui no laboratório é tudo muito vivenciado, as crianças têm a bancada, você faz as experiências, as crianças veem as coisas acontecendo, você passa filme, tem milhões de recursos. A gente não admite muito o ensino de Ciências sem o laboratório. Às vezes você não precisa ter uma sala especifica, mas você precisa proporcionar experiência para a criança.

A criação do Laboratório de Ciências (LC) promoveu a reestruturação do trabalho

de Ciências, que passou a ter, como eixo condutor, as atividades práticas.

A implantação do LC, em 1985, aconteceu de forma inesperada. Por ocasião da

concessão do regime de trabalho de quarenta horas para todos os docentes, que até então

trabalhavam em regime de vinte horas, surgiu a possibilidade de implantar o projeto do

Laboratório de Ciências. Dessa forma, é possível verificar que, a partir de uma questão

administrativa (alteração de regime de trabalho dos docentes), criou-se a oportunidade para

que a equipe de professores que atuava na área de Ciências pudesse apresentar o projeto de

criação do LC, espaço privilegiado para o trabalho na área de Ciências. Tal projeto fora

acalentado semanalmente, nas reuniões de planejamento, por um grupo de professores que

entendia que a alfabetização científica pressupunha o desenvolvimento da capacidade de

observação e o refinamento da percepção do aluno. Os docentes acreditavam que tais

habilidades determinariam o nível de apreensão da realidade, assim como poderiam servir

Page 115: Dissertação míriam moreira duque

115

de instrumento para o questionamento e a reflexão dos alunos acerca dos fenômenos da

natureza. Nessa perspectiva, Hodson afirma:

O objetivo dos experimentos nas ciências escolares (...) não é ajudar o concreto a se tornar abstrato (...). Na verdade, o objetivo é dar ilustração e representação concretas a abstrações prévias. Assim, o trabalho em laboratório na escola deveria ser usado para ajudar na exploração e manipulação de conceitos, e torná-los explícitos, compreensíveis e úteis. (1988, p.15)

Inicialmente em um espaço improvisado e, posteriormente, em espaço

modestamente organizado, o LC tornou-se um lugar de descobertas, onde os alunos

aguardam, a cada semana, com ansiedade e alegria, o momento de conhecer a proposta de

trabalho.

Em consonância com Cunningham, Duffy e Knuth, (1993), Jonassen, (1994),

Savery e Duffy, (1996), Valadares, (2001), apud Mattos e Valladares, (2001), os

professores acreditavam que:

(...) uma boa aprendizagem exige também, a criação de um ambiente de aprendizagem em que os alunos “manipulem” objetos e idéias e “negociem” significados entre si e com os professores, aquilo a que diversos autores chamam um ambiente construtivista de aprendizagem (MATTOS e VALLADARES, 2001, p.1).

Talvez por esse motivo, a criação do LC tenha sido, no relato dos professores, uma

aquisição significativa para a área de Ciências, constituindo uma das citações mais

recorrentes durante as entrevistas. Por se tratar do lugar por excelência para a realização

das atividades práticas de Ciências, a criação desse espaço marcou uma nova forma de

conceber o trabalho da área. É importante destacar que os relatos dos professores narram a

satisfação com que foi acolhida a ideia de criação do laboratório e a simplicidade do

espaço a ele destinado. Tais relatos remetem à reflexão, também presente na discussão

acerca das concepções do ensino de Ciências, que remetem à supremacia da ação docente

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116

sobre a existência de aparatos sofisticados para a obtenção de bons resultados na ação

pedagógica.

Para além da novidade, o trabalho ganhou corpo, gerando mudança metodológica.

As atividades de sala de aula passavam a fazer referência à prática vivida no espaço do

Laboratório de Ciências. As mudanças pretendidas tinham como base uma nova forma de

olhar o ambiente da sala de aula. O pressuposto era uma psicologia da aprendizagem e uma

prática educativa construtivista que admitia:

(...) o conhecimento científico não como um fato, mas como um processo em construção, sempre inacabado, fruto da interação dos sujeitos com os objectos do conhecimento e da partilha e negociação de representações pessoais, em que tanto a experiência como a razão desempenham um papel decisivo, não sendo de privilegiar nem uma nem outra, isto é, nem as visões empiristas nem as racionalistas da origem do conhecimento. Numa perspectiva psicológica, não encara a mente do aluno como uma tábua rasa, pelo contrário, valoriza os seus saberes mais ou menos espontaneamente adquiridos, ou, se se preferir, os modelos mentais mais ou menos confusos com que os alunos interpretam, à sua maneira, a realidade que os cerca. (MATTOS e VALLADARES, 2004, p.2)

Com base nisso, os docentes acreditam que poderiam ser dispensados os espaços

específicos para a realização de atividades práticas, mas o que é imprescindível é

proporcionar ao aluno a possibilidade de fazer experimentações.

Outro elemento destacado pelos docentes, com relação ao trabalho realizado no

laboratório de ciências, é a existência de dois professores, atuando em conjunto durante as

aulas práticas. Para além da dupla docência, as entrevistadas destacaram como elemento

importante a discussão das atividades práticas nos espaços de planejamento. Elas defendem

que a professora de Ciências do núcleo comum, mesmo não encarregada de realizar a

atividade prática, tendo participado de sua elaboração, pode aproveitar de forma mais

contextualizada os conteúdos decorrentes da atividade vivenciada no laboratório para dar

continuidade ao programa em sala de aula. A esse respeito, a entrevistada A comenta:

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117

E aí o professor também entra nisso. Ele também se surpreende com as atividades, ele participa, ele quer aprender mais, ele vai para casa e lê. Quantas vezes o professor chega aqui e diz: olha, aquilo que os alunos viram, eu fui para casa, li, aprendi isso aqui. É legal, as crianças me trouxeram um monte de coisas. Então eu acho que o Laboratório de Ciências tem toda essa mobilização, que é a mobilização da curiosidade científica, do querer aprender, no buscar. (Entrevistada A)

Tabela 13 – Construção coletiva do trabalho

CATEGORIA: CONSTRUÇÃO COLETIVA DO TRABALHO

ELEMENTOS

*Todo o corpo de professores e os coordenadores e os supervisores de área se envolviam nessa questão e aí também começou a acontecer uma produção que era coletiva, ou seja, de a gente enxergar coisas novas naquele plano. *Todo mundo trabalhava junto, era um trabalho que é difícil você saber ..., era um trabalho todo coletivo em cima do plano, mas modificando também esse plano que foi importado, então tomou toda uma transformação. *E aí foi uma produção coletiva, as pessoas que estavam no laboratório, dos professores que estavam em sala de aula, de nós que estávamos na coordenação, dos supervisores de série. *A gente estava construindo uma coisa nova, que a gente tinha potencial para mudar muita coisa e construir uma coisa que a gente sonhava, todo mundo muito jovem. *A gente era movido por isso, pela construção de um ensino melhor, isso era muito forte dentro da escola. *Nós construímos muitas aulas diferenciadas daquelas que a Assessora de Ciências trouxe inicialmente dentro da proposta do PGE. * A gente se reunia fora das assessorias para traçar, trocar os trabalhos, eram trocadas as atividades produzidas nas unidades com os professores, na reunião de planejamento. *E a gente também ia construir junto, já que era uma construção que a gente estaria construindo junto e aí eu topei e fui eleita como coordenadora de Ciências pelos meus pares e foi uma experiência fantástica que eu tive. * A gente conseguiu um trabalho de tal forma unificad ... Tem muita gente contribuindo, mas eu tenho um dedinho ali na parte disso daí. * Então semanalmente o professor estava ali disponível com os colegas para construir um trabalho coletivo sobre a orientação do coordenador, que era uma pessoa que em principio era formada naquela área. Então ele tinha mais base para poder destrinchar ali alguma dúvida. E eles todos bebiam da fonte dos professores do laboratório de currículos. * Semanalmente todos os professores de uma série tinham um espaço comum para se encontrar (...). E tinha esse planejamento que era o encontro para conseguir construir o trabalho daquela semana, destrinchar aquele plano.

Durante as entrevistas, os relatos dos sujeitos remetiam recorrentemente ao caráter

coletivo do trabalho realizado, enfatizando o papel deste na elaboração do currículo de

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118

Ciências. Até mesmo as assessoras, autoras da proposta pedagógica implantada no ano de

1986, reconhecem a releitura produzida pelos professores na proposta inicial e afirmam

que o processo formação continuada produziu resultados bastante diferentes dos que elas

conheciam na experiência do Laboratório de Currículos. Segundo as assessoras:

No estado nós tivemos assim a gente ia e mandava os volumes daquela reformulação de currículo, o professor pegava, fazia aquelas atividades que estavam ali e daí a um mês, ele telefonava para a gente e dizia assim: acabei o programa. Eles só fizeram aquelas atividades, está entendendo. E (...) não foi isso que aconteceu no Pedro II. Inclusive nesses livros que eu e uma outra amiga escrevemos, (...), nós tínhamos muita contribuição de atividades de professores do Pedro II (Entrevistada F).

Mas no Pedro II a gente tinha tudo para dar certo, houve um momento até que as meninas me surpreenderam quando nós trabalhávamos com alfabetização e elas montaram o laboratório que elas chamavam de labquadra. O que que era? Como a criança trabalhava com o próprio corpo, o laboratório não era uma sala fechada, o laboratório era a quadra da escola, quer dizer, foi assim maravilhoso, cada dia que você chegava e olhava. Às vezes, eu chegava antes ficava olhando o trabalho do pessoal. Nós olhávamos o trabalho do pessoal e pensava estão entendendo [...] você ficava maravilhada não é, é isso que é educação, é isso que eu quero, é isso que é uma construção do futuro para elas (Entrevistada E).

Nas narrativas dos docentes, sobressai um senso de pertencimento. Observa-se que

as professoras relatam o processo vivido utilizando frases na primeira pessoa do plural.

Não falam de experiências pessoais, mas sim coletivas, que impactaram a sua trajetória.

É evocada, também, a importância do engajamento dos gestores no processo de

implantação do primeiro segmento, sobretudo pela necessidade de alocação de recursos

para prover o ensino de qualidade que era pretendido.

* Ele61 olhava o Pedrinho como um filho. Ele tinha um cuidado, um carinho, tudo que a gente dizia que era necessário, que era para melhor, de uma forma ou de outra, ele corria e conseguia arranjar. Porque a gente não consegue fazer as coisas apenas pela vontade, pelo ideal, isso aí envolve recursos.

61 Refere-se ao diretor geral.

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119

É possível depreender certa “perplexidade” dos docentes ao se depararem com a

possibilidade de construir a proposta pedagógica de acordo com os princípios em que

acreditavam. Esse sentimento dos docentes parece ter duas razões: a primeira, em função

da tradição do Colégio Pedro II e, depois, pela infra-estrutura com que puderam contar.

Segundo uma entrevistada:

[...] peculiar mesmo, eu acho que é esse fato de a gente entrar em um colégio de 150 anos e poder imprimir um trabalho diferenciado. Eu esperava entrar no Pedro II e receber as ordens, como tinha que ser e a gente cumprir planejamento rígido e o Pedro II é aquele colégio que a gente conhecia e tremia [...] (Entrevistada D).

Há indícios que evidenciam que o trabalho parece ter sido construído a muitas

mãos, pois os resultados apurados apontam para a configuração de uma proposta de ensino

de Ciências bastante singular, representando a síntese de um processo bastante dinâmico de

incorporação de contribuições dos diversos atores da comunidade escolar.

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CAPÍTULO 7 - APRESENTAÇÃO DO DOCUMENTÁRIO

Como produto final desta pesquisa, apresenta-se um vídeo que recupera o processo

de implantação do currículo de Ciências do primeiro segmento do Ensino Fundamental do

Colégio Pedro II. São veiculados relatos dos docentes sobre a formação continuada

desenvolvida no âmbito do Programa de Assessoria Pedagógica. Tal programa contribui

para a disseminação de uma nova concepção de ensino de Ciências, que tem como eixo o

desenvolvimento de atividades práticas. O objetivo foi enfatizar a importância da formação

continuada, nas suas diferentes modalidades, para a consolidação desse processo.

No decorrer da investigação, constatou-se que o formato de um documentário seria o

mais indicado para socializar esta experiência de construção de proposta curricular.

O documentário apresenta depoimentos de docentes que participaram do processo de

implantação da proposta curricular nos anos 80 e trechos de aulas desenvolvidas no

Laboratório de Ciências durante o ano letivo de 2009. As atividades exibidas integraram o

plano de ensino do 4º ano do EF e ilustram algumas possibilidades de atividades práticas

que podem ser desenvolvidas na área de Ciências nesse segmento de ensino.

Ao longo do vídeo, é possível depreender as relações estabelecidas entre a concepção

do ensino de Ciências e o processo de formação continuada vivenciado pelos docentes,

associando-os à consolidação da proposta.

É necessário esclarecer que, intencionalmente, foram mantidos os depoimentos de

docentes que ilustram as transformações na concepção de ensino de Ciências e a

abordagem da atividade prática no ensino de Ciências, mesmo aqueles cuja ocorrência

ultrapassa o período estudado. Essa opção remete ao princípio de que as mudanças no

campo da educação não ocorrem de forma linear e definitiva, mas, ao contrário, são fruto

de conflitos e embates inerentes ao agir humano num processo dialético de transformações.

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Dessa forma, entende-se que o hoje nada mais é do que a síntese de tudo quanto se

experimentou anteriormente.

Ainda que entre os objetivos da pesquisa não esteja previsto um olhar específico

para a trajetória da concepção de atividade prática no ensino de Ciências ao longo do

período estudado, durante os depoimentos ficou bastante evidente o percurso trilhado para

que, na atualidade, sejam realizadas atividades práticas nas aulas de laboratório, como as

exibidas no vídeo. Nessa direção, ao longo do documentário, pretendeu-se dar ao

espectador a possibilidade de também acompanhar esse percurso.

A gravação das aulas de laboratório foi realizada pela própria pesquisadora.

Justificam-se, assim, os possíveis defeitos de natureza técnica existentes no documentário.

Entretanto, se, do ponto de vista da técnica, o trabalho poderia estar melhor elaborado, sob

o aspecto teórico, entende-se que o trabalho ganhou com a sensibilidade da pesquisadora,

que buscou registrar os aspectos elencados como relevantes na pesquisa. A captura de

imagens aconteceu durante os meses de agosto, setembro e outubro de 2009. O período de

filmagem se estendeu em função do adiamento do início das aulas do segundo semestre62 e

do grande número de feriados ocorridos. Foi focalizada uma turma do quarto ano do

Ensino Fundamental, selecionada aleatoriamente para participar da pesquisa. A classe era

composta de 25 alunos, na faixa etária entre 9 e 10 anos de idade.

À guisa de conclusão, cabe ressaltar que a produção de um documentário remete a

duas questões, uma de natureza ética e outra de natureza epistemológica. A primeira se

reporta ao fato de que as pessoas filmadas para um documentário continuarão a viver suas

vidas. A dimensão epistemológica, tão importante quanto a ética, remete ao

reconhecimento essencial de que o documentário “é uma representação do mundo, e que

toda representação precisa justificar seus fundamentos” (DA RIN, 2006, p. 36).

62 Houve surto de influenza H1N1, popularmente conhecida como “gripe suína”.

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122

Para o autor, “não existe método ou técnica que possa garantir acesso privilegiado

ao real”. O fundamental é perceber que, bem mais do que os conteúdos ou estratégias

narrativas, o que faz um filme ser um documentário é a maneira como olhamos para ele;

em princípio, tudo pode ser ou não um documentário, dependendo do ponto de vista do

espectador. O documentário é uma representação da realidade e, nessa perspectiva, pode

ser contestada pela forma de representação utilizada.

Convém alertar aos espectadores que, para apreciar um documentário, conforme

recomenda Salles, apud Da Rin (2006), é preciso promover “o abandono de certa

ingenuidade” que ilusoriamente atribui a esse tipo de cinema não ficcional status de exibir

“evidência irrefutável do mundo”.

Possibilidades de utilização do documentário

O documentário trata da reconstrução do processo de implantação do programa de

Ciências no Colégio Pedro II, por ocasião da criação das Unidades Escolares do primeiro

segmento do EF. O fato de o resgate ter sido feito a partir de entrevista realizada com os

atores envolvidos diretamente no processo deu ao documentário um tom bastante

envolvente pela força emotiva dos depoimentos. O fato de se poderem ver professores

relatarem com entusiasmo uma experiência bem sucedida traz aos espectadores a

esperança de que ainda é possível ter uma escola pública de qualidade. Sob essa ótica, é

possível admitir que o documentário poderá ser inserido em mostras de vídeos cuja

temática seja educação. Isso porque, ainda que o trabalho trate do ensino de Ciências, há

conteúdos inseridos na narrativa que remetem a questões gerais. E, nestas, destaca-se o

campo da formação docente, mais especificamente o da formação continuada. Em se

tratando de formação continuada, o vídeo demonstra um modelo de formação bastante

peculiar, para o qual não há demanda de investimentos extraordinários.

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Assim, o documentário pode ser utilizado em estratégias de formação continuada, tais

como cursos, reuniões pedagógicas para promover debates e reflexões sobre o ensino de

Ciências, a importância das atividades práticas e suas respectivas concepções.

O vídeo pode sugerir, também, um debate em torno da utilização do espaço do

laboratório no ensino de Ciências, estabelecendo relação entre os resultados das atividades

desenvolvidas nesse espaço, as práticas docentes e o processo de construção do

conhecimento dos alunos. Nessa direção, o vídeo dissemina uma experiência curricular

fundamentada em concepções sócio-interacionistas, que valoriza a atividade prática como

núcleo central.

Assinala-se, entretanto, que, de todas as mensagens possíveis que o vídeo poderia

transmitir, nenhuma é mais eloquente nessa experiência do que a importância do

investimento na formação do professor.

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124

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com o findar deste estudo, encerra-se uma trajetória de pesquisa, mas são deixados

subsídios e questionamentos que poderão colaborar para a construção de outras trajetórias

de estudo. Nestas páginas, apresentam-se considerações finais, a partir da retomada dos

objetivos desta pesquisa, a fim de evidenciar, de forma concisa, como eles foram atendidos

e que análises foram realizadas.

Para alcançar o objetivo de analisar a implantação da proposta de ensino de

Ciências, foi necessário recuperar o processo vivenciado nos anos de 1980, apoiado na

contribuição de dois campos de estudos: formação docente e ensino de ciências.

A diversificação de instrumentos de produção de dados propiciou a aproximação do

objeto de estudo de forma gradual, pois a análise dos documentos da instituição foi

complementada e enriquecida com as entrevistas, que reconstruíram o processo vivido. Os

documentos curriculares (Planos Gerais de Ensino) não retratavam a importância atribuída

ao trabalho prático na disciplina de Ciências, nem o processo de formação continuada. Era

difícil para o pesquisador se valer unicamente dessa fonte de dados para compreender a

efervescência pela qual o ensino de ciências passou nos anos 80. Em contrapartida, as

entrevistas ilustraram, de forma eloquente, a trajetória de implantação do programa de

Ciências, possibilitando a identificação da importância das atividades práticas, como

também a compreensão dos próprios PGE.

Ao investigar os fatores que contribuíram para a consolidação da proposta, o relato

dos docentes trouxe para o debate a reflexão sobre as limitações dos cursos de formação de

professores e a importância da manutenção de espaços institucionais que promovam a

prática docente reflexiva.

Desse modo, os dados gerados a partir das entrevistas permitiram inferir que o

Curso Normal se constituiu num grande laboratório de prática pedagógica. Isso porque

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125

tantos os professores quanto os assessores apontaram a Escola Normal como espaço

formativo privilegiado para compreender o que é uma “sala de aula”.

Em relação à formação docente, foram apontados, pelos professores envolvidos na

pesquisa, três fatores que contribuíram para sua melhoria profissional: a participação em

curso de capacitação, desenvolvido por profissionais que conheciam a dinâmica do

trabalho com alunos da faixa etária do primeiro segmento do EF, vinculados à Escola

Normal e à Rede Pública do Estado; a manutenção de espaços institucionais para

elaboração de atividades pedagógicas coletivas, numa perspectiva que evoca a reflexão

sobre a importância dos espaços de trocas de experiência, internos à escola; e, finalmente,

a prática reflexiva cotidiana, vivenciada pelo docente ao longo de sua trajetória de vida,

como espaço de construção de saberes.

Como fator importante que contribui para a consolidação da área de Ciências, é

destacada nas entrevistas a utilização do Laboratório de Ciências. Nota-se que, conforme

mencionado anteriormente, não é a existência desse espaço que garante a qualidade do

trabalho, mas a sua utilização. O relato dos docentes aponta para o desenvolvimento de

atividades práticas que mobilizam a curiosidade científica, o querer aprender, além de

reservaram espaço para que o aluno tenha voz e coragem de expor suas teorias acerca dos

fenômenos vivenciados e/ou apresentados pelos professores de Ciências.

Ao inferir que o fazer pedagógico rigidamente apegado ao “método” pode ser

responsável pela consolidação da ideia deformada do que é fazer ciência, Moreira,

Caballero e Neves (2006) afirmam que essa postura ratifica subliminarmente a ideia de que

a ciência é estática e acabada. Verifica-se que a experiência relatada nesta pesquisa parece

determinar outra direção para a ideia de ciência:

Uma vez eu cheguei ao Pedro II e as crianças estavam alvoroçadas porque a professora disse que ia chover na turma, então eles levavam capa, eles levavam guarda-chuva porque ia chover no laboratório e ela fez uma experiência junto com as crianças, ela montou uma experiência

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de vaporização e as crianças ficaram maravilhadas com tudo aquilo. Então eu acho que o envolvimento do professor contribuía para o envolvimento do aluno (Entrevistada E).

Em consonância com a contribuição de Hodson (1988), a pesquisa aponta que

qualquer atividade proposta que requeira que o discente seja ativo e convidado a refletir,

está de acordo com a crença de que os alunos aprendem melhor pela experiência direta.

Sendo assim, o trabalho prático não necessariamente precisa ser uma experimentação. Em

conformidade com esse pensamento, sob a designação de atividades práticas, os

professores entrevistados incluem atividades variadas, desde que se propicie a mobilização

da curiosidade para o desenvolvimento do espírito científico.

Além dessas atividades práticas, desenvolvidas no Laboratório de Ciências, foi

assinalado, como fator relevante, o envolvimento dos docentes com a área de Ciências.

Segundo os entrevistados, frequentemente, os professores que atuam no LC permanecem

um tempo expressivo na atividade, embora esta requeira dedicação e empenho. Os

docentes mencionaram, ainda, uma espécie de “contágio” que acomete os professores que

não atuam no LC, mas que buscam saber mais sobre as temáticas abordadas nas aulas

práticas.

[...] o professor de sala de aula, quando ele não é muito ligado no ensino de Ciências, ele aprende aqui dentro do laboratório também, e ele leva para sala de aula esse gosto. E esse gosto é passado para as crianças. (Entrevistada A).

Um destaque dado ao processo de recontextualização da proposta apresentada

inicialmente e, sobretudo, para as mudanças verificadas no enfoque dado à concepção

sobre o ensino de Ciências, aponta também para o investimento na formação continuada

dos professores que ingressaram nos cursos de pós-graduação stricto sensu. Apesar de se

constituir um percurso clássico de formação continuada, uma vez que a maioria dos

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127

docentes permanece no colégio após o curso, tornava-se relevante apontar que,

indiscutivelmente, esses cursos vêm auxiliando o professor em sua atuação profissional na

educação básica, bem como vêm contribuindo para a formulação de novas concepções de

práticas de ensino e para a reformulação das propostas de trabalho no Colégio Pedro II. A

esse respeito, evoca-se a contribuição de Portella (2008, p.298) sobre a formação dos

professores na instituição pesquisada:

[...] dados de 2005 mostram que, nesse ano, 75% de seu corpo docente já possuía especialização, mestrado e/ou doutorado. Hoje — dados de 2007 —, o colégio possui 89063 professores efetivos: dois que possuem apenas o curso normal (0,2%), 189 com licenciatura plena (21%), 344 com especialização (38,7%), 306 (34,4%) com mestrado e 49 (5,5%) com doutorado. A porcentagem de pós-graduados gira, hoje em dia, em torno de 78%, e observa-se, no intervalo dos últimos dois anos, uma migração significativa de professores que vêm passando de especialistas a mestres. Dentre os professores hoje licenciados ou especialistas, há uma parcela significativa com mestrado ou doutorado em curso. (PORTELLA, 2008, p.298).

Conforme os dados fornecidos pela autora, o número significativo de professores

egressos dos cursos de pós-graduação certamente pode estar contribuindo para uma

aproximação entre a academia e a escola básica, na direção de uma renovação na forma de

entender o que deveria ser proposto para o ensino de Ciências na atualidade.

Dentre as contribuições acima elencadas, talvez não seja encontrada nenhuma cuja

relevância supere o quanto a investigação pôde fornecer elementos para que os docentes

descubram o quanto produzem de conhecimento no cotidiano da sala de aula, e

redimensionem o seu papel na formulação e execução de um programa de ensino.

A reflexão acerca dos fatores que contribuíram para consolidação da área de

Ciências apontou para a importância da construção coletiva do trabalho pedagógico como

prática regularmente prevista no planejamento institucional. Entende-se que, nessas 63 Esse número é sempre dinâmico devido às entradas por concursos e saídas por aposentadoria, falecimento ou exoneração. Além dos professores efetivos, há hoje na instituição uma parcela de professores contratados que permanecem no Colégio por, no máximo, dois anos consecutivos.

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reuniões, o debate entre os docentes era oportunizado, promovendo a adequação e a

renovação das atividades pedagógicas cotidianas, com ênfase na construção de novas

propostas de práticas para a aula de laboratório, o que só foi possível a partir da troca de

experiências entre os professores envolvidos com o ensino de Ciências.

O resgate do processo de construção do programa de Ciências do primeiro

segmento do EF revelou a importância das atividades práticas para o ensino de Ciências,

além de evidenciar o quanto e em que medida as atividades de formação continuada podem

contribuir para garantir o interesse e o bom desempenho dos alunos na disciplina de

Ciências.

Não há como deixar de reconhecer que o trabalho ganhou “cara” nova, desenhada a

muitas mãos e ressignificada por gerações de novos professores, mas indiscutivelmente,

ainda podem ser identificadas bases teóricas lançadas naquela experiência inicial a

sustentar a proposta de ensino de Ciências que garante aos alunos, mesmo aqueles cuja

dificuldade compromete o rendimento em todos os outros componentes curriculares, um

bom desempenho.

Colocadas essas últimas considerações, seria possível entender que a trajetória

desta pesquisa estaria encerrada, mas, na verdade, ainda é necessário que se complete uma

etapa. A etapa a que toda pesquisa está submetida: a de dar o retorno dos resultados dessa

pesquisa à instituição a partir da qual foi desenvolvida, divulgando as considerações aqui

produzidas ao Colégio Pedro II, em especial, à unidade São Cristóvão I.

A construção de novos caminhos se dá a partir deste ponto. Tendo a clareza das

limitações deste estudo, é possível apontar alguns caminhos que poderão ser construídos, a

citar: o que pensam os alunos a respeito do ensino de Ciências? Que motivos são

apontados pelos alunos para justificar o bom rendimento nesse componente curricular? As

atividades práticas realizadas em grupo também constituem fator determinante na obtenção

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dos bons resultados? Ter formação na área de Ciências é fator relevante para a elaboração

e o desenvolvimento de atividades práticas do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental? Que

parcela de docentes envolvidos no ensino de Ciências possui curso de especialização

stricto sensu? Que contribuição os cursos de especialização stricto sensu têm dado para a

reformulação das concepções sobre o ensino de Ciências? Os cursos de especialização

stricto sensu aproximam a universidade da escola básica? Essas questões poderão se

constituir em novos caminhos de pesquisa que possibilitem compreender o processo de

construção do ensino de Ciências na educação básica em nosso país.

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Page 137: Dissertação míriam moreira duque

137

ANEXO I – ROTEIRO DE ENTREVISTA - DOCENTES

I – Perfil dos entrevistados

Formação acadêmica

Trajetória profissional (anterior ao início do trabalho no Pedrinho):

II- Experiência na Instituição (Colégio Pedro II /Unidade São Cristóvão I) no

período de 1984 a 1989.

Função desempenhada no Pedrinho no período estudado

Aspectos que considera relevantes para a formação docente a partir da experiência

vivida no primeiro segmento do Ensino Fundamental do Colégio Pedro II.

Aponte que fatores, em sua opinião, contribuem para o interesse e o bom desempenho

dos alunos na disciplina de Ciências no Colégio Pedro II, Unidade São Cristóvão I.

Comente o papel das atividades práticas para o ensino de Ciências.

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ANEXO II – ROTEIRO DE ENTREVISTA - ASSESSORES

1. Comente sua trajetória acadêmica.

2. Considerando sua trajetória profissional, sua participação na elaboração e

implantação de políticas curriculares em diferentes redes, o que você destacaria como

peculiar na experiência do CP II?

3. Com relação à proposta implantada, quais os objetivos pretendidos por vocês?

4. Quais os pressupostos que embasaram o trabalho desenvolvido?

5. Por que a ênfase na formação continuada do professor?

6. O projeto contou com um acompanhamento longo e sistemático, fundamentado em

um referencial teórico. Qual a sua opinião sobre a pertinência desse tipo de processo

para a implantação de novas propostas curriculares?

7. Como você avalia o envolvimento da equipe do Colégio Pedro II no trabalho

desenvolvido? Quais as dificuldades detectadas durante o processo?

8. Estabeleça uma relação entre o envolvimento e o sucesso da proposta.

9. O que chamou mais sua atenção durante a implantação do projeto?

10. Os relatórios da escola evidenciam um bom desempenho dos alunos na disciplina de

Ciências no primeiro segmento. A que você atribuiria esses resultados?

11. Comente a importância das atividades práticas na disciplina Ciências.

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ANEXO III – ROTEIRO DE ENTREVISTA - CHEFE DE DEPARTAMENTO

I – Perfil do entrevistado

Formação acadêmica:

Trajetória profissional (anterior ao início do trabalho no Colégio Pedro II):

II- Experiência na Instituição (Colégio Pedro II /Unidade São Cristóvão I) no período de

1984 a 1989.

1. Função desempenhada no Colégio Pedro II no período estudado

2. Considerando sua trajetória profissional e sua participação na elaboração e

implantação de política curricular no 1º segmento do EF no CP II, o que você destacaria

como peculiar nessa experiência?

3. Com relação à proposta implantada, quais os objetivos pretendidos ?

4. Quais os pressupostos que embasaram o trabalho desenvolvido?

5. Por que a ênfase na formação continuada do professor?

6. O projeto contou com um acompanhamento longo e sistemático, fundamentado em

um referencial teórico. Qual a sua opinião sobre a pertinência desse tipo de processo

para a implantação de novas propostas curriculares?

7. Como você avalia o envolvimento da equipe do Colégio Pedro II no trabalho

desenvolvido? Quais as dificuldades detectadas durante o processo?

8. Estabeleça uma relação entre o envolvimento e o sucesso da proposta.

9. O que chamou mais sua atenção durante a implantação do projeto?

10. Os relatórios da escola evidenciam um bom desempenho dos alunos na disciplina de

ciências no primeiro segmento. A que você atribuiria esses resultados?

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11. Comente a importância das atividades práticas na disciplina Ciências.

12. Quais os aspectos que considera relevantes para a formação docente a partir da

experiência vivida no primeiro segmento do Ensino Fundamental do Colégio Pedro II ?

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ANEXO IV – CESSÃO DE DIREITOS SOBRE DEPOIMENTO ORAL

1. Pelo presente

documento.........................................................................................(nome),

...........................(nacionalidade),..........................(estado

civil),...........................(profissão),

carteira de identidade

nº...........................................................................................................

emitida por........................................, CPF nº................................................. , residente e

domiciliado..........................................................................................................................

....

..............................................................................................................................................

..............................................................................................................................................

........

cede e transfere, neste ato, gratuitamente, em caráter universal e definitivo, à pesquisadora Míriam Moreira Duque, a totalidade dos seus direitos patrimoniais de autor sobre o depoimento feito perante a mesma.

2. Na forma preconizada pela legislação nacional e pelas convenções internacionais de que o Brasil é signatário, o depoente proprietário originário do depoimento de que trata este termo, terá, indefinidamente, o direito de exercício pleno de seus direitos morais sobre o referido depoimento, de sorte que sempre terá seu nome citado por ocasião de qualquer utilização.

3. Fica, pois, a pesquisadora Míriam Moreira Duque plenamente autorizada a utilizar o referido depoimento, no todo ou em partes, editado ou integral.

Sendo esta a forma legítima e eficaz que representa legalmente os nossos interesses, assinam o presente documento em duas vias de igual teor e para um só efeito.

Rio de Janeiro,..................................................................

___________________________________

Assinatura da pesquisadora

___________________________________

Assinatura do cedente

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ANEXO V – AUTORIZAÇÃO DE USO DE IMAGEM, VOZ E TEXTO

Pelo presente termo particular de autorização de uso de imagem, voz e texto,

Nome: ___________________________________________________________________

Nacionalidade: ________________________ Estado civil: _________________________

Profissão: ____________________________ RG nº. ______________________________

autorizo ao INSTITUTO FEDERAL EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DO RIO DE JANEIRO, instituição pública de ensino e pesquisa, a gravar e registrar as atividades pertinentes a pesquisa “ Laboratório, um Espaço de Descobertas”.

O presente instrumento particular de autorização é celebrado a título gratuito, podendo a referida participação ser utilizada com a finalidade de divulgação da pesquisa sob o formato de artigo científico, comunicação em congressos ou similares, livros, relatórios de pesquisa e/ou outros instrumentos de divulgação científica.

A minha imagem, voz e/ou texto podem ser reproduzidos em qualquer veículo (rádio, TV, impresso, internet com todas suas ferramentas e tecnologia existentes e que venham a existir) por todo território nacional e internacional, no todo ou em parte, de forma “ao vivo” ou gravada, podendo ser reexibidos a qualquer tempo conforme necessidade da autorizada.

O INSTITUTO FEDERAL EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DO RIO DE JANEIRO está autorizado, gratuita e exclusivamente, a fixar todo ou parte, o conteúdo de minha participação e sua conexa interpretação e execução, em CDs, DVDs, CDs-ROM, MDs e quaisquer outras modalidades de utilização, existentes ou que venham a ser inventadas, podendo a autorizada divulgar, distribuir e comercializar tais fixações.

O presente instrumento particular de autorização é celebrado em caráter definitivo, irretratável e irrevogável, obrigando as partes por si e por seus sucessores a qualquer título, a respeitarem integralmente os termos e condições estipuladas no presente instrumento.

Rio de Janeiro, ____ de _________ de 2009.

___________________________________________

( )

Participante voluntário da pesquisa

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ANEXO VI – AUTORIZAÇÃO DE USO DE IMAGEM, VOZ E TEXTO DE

MENOR

Pelo presente termo particular de autorização de uso de imagem, voz e texto,

Nome: ___________________________________________________________________

Nacionalidade: ________________________ Estado civil: __________________________

Profissão: ____________________________ RG nº. ______________________________

Responsável por____________________________________________________________

autorizo ao INSTITUTO FEDERAL EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DO RIO DE JANEIRO, instituição pública de ensino e pesquisa, a gravar e registrar as atividades do (a) menor acima citado (a) pertinentes a pesquisa “ Laboratório um Espaço de Descobertas”.

O presente instrumento particular de autorização é celebrado a título gratuito, podendo a referida participação ser utilizada com a finalidade de divulgação da pesquisa sob o formato de artigo científico, comunicação em congressos ou similares, livros, relatórios de pesquisa e/ou outros instrumentos de divulgação científica.

A minha imagem, voz e/ou texto do (a) menor podem ser reproduzidos em qualquer veículo (rádio, TV, impresso, internet com todas suas ferramentas e tecnologia existentes e que venham a existir) por todo território nacional e internacional, no todo ou em parte, de forma “ao vivo” ou gravada, podendo ser reexibidos a qualquer tempo conforme necessidade da autorizada.

O INSTITUTO FEDERAL EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DO RIO DE JANEIRO está autorizado, gratuita e exclusivamente, a fixar todo ou parte, o conteúdo da participação do (a) menor e sua conexa interpretação e execução, em CDs, DVDs, CDs-ROM, MDs e quaisquer outras modalidades de utilização, existentes ou que venham a ser inventadas, podendo a autorizada divulgar, distribuir e comercializar tais fixações.

O presente instrumento particular de autorização é celebrado em caráter definitivo, irretratável e irrevogável, obrigando as partes por si e por seus sucessores a qualquer título, a respeitarem integralmente os termos e condições estipuladas no presente instrumento.

Rio de Janeiro, ____ de _________ de 2009.

___________________________________________

( )

Responsável pelo participante voluntário da pesquisa

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ANEXO VII – BILHETE AOS PAIS DOS ALUNOS QUE PARTICIPARAM DA

PESQUISA

Senhor Responsável,

Estou convidando seu filho a participar da minha pesquisa intitulada: “Laboratório de Ciências: um espaço de descobertas”, sobre as atividades práticas desenvolvidas no Laboratório de Ciências do colégio, e necessito de sua autorização.

Estou enviando, no envelope, os termos para serem assinados pelo responsável que autorizar a participação da criança.

Coloco-me à disposição para maiores informações. Tel.: 2619- 4549. Muito obrigada,

Míriam Duque