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Ano II - junho - Nº 15 www.oduque.com.br Distribuição gratuita

O Duque #15

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O jornal de cultura do Paraná

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Ano II - junho - Nº 15www.oduque.com.br

Distribuição gratuita

CONSELHO EDITORIALEdição nº 15 / Ano II

O jornal da cultura de Maringá e região18.427.739/0001-40

DIRETORMiguel Fernando

JORNALISMOGustavo Hermsdor� Mtb 9966

CO-EDITORALuana Bernardes

REVISORZé Flauzino

COLABORADORESElton Telles - #Confraria (página 07)Miguel Fernando - Especial (páginas 12 a 15)Paula Mariá - #Confraria (página 17)Lorene Camargo - Relato (páginas 18 e 19)Victor Simião - Resenha (página 20) Rodrigo Corrêa - Psicologia (página 21)Michel Queiroz - #Sarau (página 23)Yuria Santamaria - #Sarau (página 23)Lennon Rosa - #Sarau (página 23)

Departamento Comercial44 9959-8472

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As colocações expostas por convidados ou entrevistados é de responsabilidade exclusiva dos mesmos.

DESIGN EDITORIAL E REPORTAGENS

ARTISTA DO MÊS

FILIADO

Marcelo MonteiroPeças em madeira

Impressão: Gra� norteTiragem: 3.000 exemplares24 Páginas / Tablóide Americano

QUE BATERMUITO MAIS

PANELAS"O que falta na abordagem sobre a Ética é

justamente o que nos levaria a ser éticos. Falta refl exão, falta pensamento crítico, falta entender 'o que é' agir e 'como' se deve agir. Com tais perguntas é que a Ética inicia". Esse trecho, que encontrei em um artigo da fi lósofa Márcia Tiburi, resume bem a importância dessa edição. Não adianta nada falar sobre Ética em tom de clamor por salvação se não sabemos conversar sobre ela. É exatamente por essa falta de um diálogo maior sobre o assunto que perdemos de vista a possibilidade de uma realização da própria Ética.

Afi nal o que é ser ético? Bater panela na varanda ou compartilhar Aristóteles no facebook só saciam nossa vontade passageira de fazer alguma coisa, mas continua sendo inútil na prática. Também não adianta esperar que os "cultos", os "intelectuais", as autoridades e até mesmo os jornalistas tragam essa discussão à tona. Muitas vezes eles mesmos ignoram ou evitam a profundidade do assunto. É preciso sair da simples expressão emocional indignada da vontade de ética e partir para uma sensibilidade pessoal que possa sustentar uma ação boa e justa, que é o pricípio da ação Ética, como diria Tiburi.

Ninguém é ético só porque quer parecer ético. Ninguém é ético só porque conhece e concorda com as atitudes éticas. Só é ético aquele que age e se senbiliza afi m de uma conviviência boa e justa no universo público, mas que também garanta a felicidade na vida privada - essa última, alvo de uma crescente e absurda ignorância nos últimos anos. Por isso tudo - e pela distância que estamos disso tudo - é que se explica a urgência em promover um diálogo inclusivo e detalhado sobre Ética, estudando o passado, analisando o presente e projetando um futuro em que o bem comum esteja realmente entre os objetivos. Se quiser acompanhar nossa proposta de diálogo, é só ir até a página 12.

Nessa edição, também tivemos a alegria de preparar para vocês uma entrevista com a rapper curitibana Karol Conká, que esteve na cidade em maio. Conká falou sobre início de carreira, prêmios e inspirações para a nova cena do rapp brasileiro da qual ela é um dos principais nomes. Quem falou com ela foi a nossa repórter Paula Mariá e você pode conferir a entrevista nas próximas páginas.

Na #Confraria dessa nossa décima quinta edição,

Elton Telles nos apresenta os desbravadores artísticos do Coletivo Passarinha, criado em Maringá, mas que pertence ao mundo. Por meio de teatro e intervenções poético-musicais, os seis jovens tripulantes da kombi "Passarinha" disseminam aprendizados e "indisciplinas", uma história que vale a pena ser contada. Na mesma página, um pouco sobre a Revista Farpa, que vai reunir produções femininas para um lançamento alternativo, e dos amantes de um bolachão que fazem o sucesso do Clube do Vinil de Maringá.

A dura batalha entre quadrinistas locais e o monstro do mercado editorial também é tema de matéria, que explica as principais difi culdades - e tentativas - desses artistas do traço. Logo a seguir, mostramos uma outra realidade (não menos difícil), a dos produtores musicais que apostam nos home-studios para desenvolver um trabalho autoral de forma livre. É fundamental ver como o trabalho deles ajudam a mudar o repértorio dos shows em nossa região.

Na página 16, um convite. Na verdade vários, já que em maio foram publicados os editais para concursos que vão compor as atrações dos tradicionais Convites de Maringá (Música, Dança, Teatro e Artes Visuais) em 2015 e 2016. Na matéria estão detalhados os valores, critérios de avaliação, formas de participar e até os contatos caso surjam mais dúvidas. Ao lado, duas belas notícias: em junho Maringá vai receber pela quarta vez o Festival Varilux de Cinema Francês, no Cinefl ix, e também vai ganhar a malemolência do Melodia Preto Bendi , que está gravando o primeiro CD e logo deve fazer parte das noites da nossa cidade.

Abrindo nossa ala opinativa, Lorene Camargo nos traz um relato carregado de emoção sobre as mulheres presentes no massacre de 29 de abril em Curitiba, em que professores, estudantes e servidores foram atacados de forma covarde enquanto defendiam seus direitos em praça pública. Quem estava sentindo falta das resenhas literárias vai gostar de ver a dupla homenagem que Victor Simião faz ao primeiro livro da história de nossa cidade, Terra Crua, e à sua reedição, lançada esse ano. Além disso, nosso colunista de Psicologia, Rodrigo Corrêa também traz um olhar clínico sobre o sentido das emoções, que defi nem como interpretamos e interagimos com o mundo.

Boa leitura!Gustavo Hermsdorff , editor.

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Entrevista //

KAROLCONKÁ

entrevista com

“Música é pra ser feita, curtida, da forma que aparecer sabe, joga pra fora!”

PaulaMariá

Fotos:Álvaro Sasaki

A curitibana Karol Conká é um dos principaisnomes da cena atual do rap brasileiro

Com o álbum Batuk Freak, lançado em 2013 e a explosão do clipe Tombei, a rapper paranaense tem mostrado que veio mesmo para, nas suas próprias palavras, “causar na sociedade”. Não havia mesmo como ser diferente, quebrando paradigmas do estilo musical e das próprias convenções sociais, dentro e fora da música, Conká tem tido seu trabalho reconhecido pelo mundo todo, inclusive por Maringá, que a recebeu no mês passado, em show produzido pelo NYL (New York Lounge Bar). Por telefone ela conversou com O Duque sobre seu atual trabalho, os novos projetos e as antigas questões da arte, da música e da poesia.

Pois é, por enquanto só tenho lançado o Batuk Freak e alguns clipes. Eu fi quei em torno de um ano e meio trabalhando nesse álbum e foi o que me rendeu o prêmio. Na época as condições eram difíceis, tanto fi nanceiras quanto psicológicas mesmo, mas eu tenho muito foco nas coisas que quero fazer e o meu foco era esse: lançar meu primeiro disco. Para isso eu aprendi que eu tinha que ter uma produção, multimaker, enfi m, criar uma estrutura pra que isso acontecesse. E aí eu fui fazendo com o que eu tinha, juntando dinheiro, fazendo show… Eu mesma paguei meu disco, cuidei de tudo, não tive um apoio empresarial, o Batuk Freak é todo produzido por um cara aqui de Curitiba que é o Nave (Nave Beats), mas agora a produção mudou, como eu já realizei esse sonho, que era ter um disco todo feito por um produtor daqui, foi muito bom, mas eu tenho dado como missão cumprida.

Foi muito legal. A intenção era mesmo causar um impacto, causar algum tipo de sentimento em quem visse o trabalho. Tanto em quem já me conhecia quanto em quem ainda não conhecia. O Tombei é a entrada para o prato principal, que é o álbum que ainda está por vir. É um clipe com muitos elementos, você não sabe bem se é rap, o que é ou de onde são aquelas pessoas ali.

Eu acho que o visual é tão importante quanto o áudio. Por exemplo, a partir do momento que uma música tem um clipe, você já tem uma outra visão do que a música em si pode representar, isso é muito importante para mim. Nessa música [Tombei], para as pessoas entenderem melhor o conceito, nada melhor do que ter um clipe, dirigido pelo Konrad [Dantas], com roteiro meu e do Felipe Sassi. Foi uma coisa bem bacana, a gente trabalhou juntos, foi uma novidade tanto para o KondZilla, que sempre faz clipes de funk ostentação, totalmente diferente dessa minha proposta.

O seu primeiro álbum, Batuk Freak, já te levou a ser premiada como artista revelação pelo Prêmio Multishow. Como foi essa primeira produção?

Além desse primeiro álbum, o clipe “Tombei”, lançado recentemente também foi um estouro. Como foi para você a recepção desse material?

Esse clipe tem muito apelo visual, como outras produções suas também. Como você vê a integração entre o som e imagem?

Entrevista //

A ostentação no meu clipe é da autoestima, eu estou ostentando a diversidade. Tem muita mulher, gay, travesti, hétero, enfim, o que existe no mundo mesmo hoje. Na verdade ainda faltou né, se eu fosse colocar deveria ter muito mais pessoas. Mas eu consegui colocar muita gente, principalmente as pessoas que sofrem bullying. A ideia é que todo mundo ali é poderoso, eu também claro, mas todo mundo ali tem poder, tem potencial. Não seria um clipe tão divertido se não fossem os integrantes ali presentes, se não fosse todo mundo que compôs aquele espaço.

E qual é a sua proposta?

Eu acho que está surgindo agora uma cena mais livre dentro do rap. No sentido de a gente poder escrever o que quer, criar música da maneira que quer, sem precisar sair da base do rap. Hoje eu sou considerada em alguns lugares uma artista pop e também não vejo problema algum nisso, mas a minha base é o rap. É um estilo que tem bombado mesmo, na gringa o que mais tem rolado é isso, a nova música da Rihanna por exemplo é um rap puro, nada cantada. Então acho difícil a gente ficar se prendendo, isso em qualquer estilo musical. A música é pra ser feita, curtida, da forma que aparecer sabe, joga pra fora! Não adianta a gente ficar guardando.

Esse seu estilo é diferente do que se tem conhecido como rap até então. Você vê uma cena diferente dentro do rap brasileiro atualmente?

Eu procuro fugir dessa “zona de conforto” que o rap vive há anos, sem deixar de fazer rap. Eu gosto de sair da mesmice mesmo, sinto um prazer enorme em buscar coisas novas, naquilo que nem eu, nem ninguém fez ainda. Procuro misturar as batidas, rápidas, pesadas, com uma forma de cantar mais fácil, mais leve, pra um público novo se identificar. É uma música para ser ouvida, não só para jogar um monte de palavras. Uma coisa que eu acho que ainda rola é uma cobrança poética grande e, às vezes, a poesia está justamente nas palavras mais simples, porque o que conta é o sentimento que você passa com aquela palavra. Eu gosto muito de fugir dos sistemas padrões, até mesmo da escrita padrão. Se eu for fazer alguma música reclamando de algo que acontece na sociedade ela vai vir com uma linguagem diferente. Por exemplo, a música “Gandaia”, eu falo que eu tô na balada, que tô ficando louca, mas ali tem coisinhas escondidas, críticas, tesourinhos mesmo. Sempre coloco isso na minha música

Por fazer parte dessa cena mais “livre”, você busca trazer novos estilos para dentro da sua música, trabalhando com uma poética diferente?

Eu acho que a música está em todos os lugares, até na pedra rolando na rua. Acho que a troca é muito construtiva, por isso trabalho muito com parcerias. Já tive até o prazer de gravar com o Luiz Melodia, a música “Até Amanhecer”, que surgiu de uma parceria da Ray Ban com a Vice. Me chamaram para cantar com ele e eu fiquei muito feliz, ia até entrar no meu disco. Nossa, ele é um mito e a música que a gente cantou é toda de minha autoria.  Foi muito legal esse encontro, confesso que eu até chorei (risos).

E como você busca influências para fazer essas novas misturas?

Sim, quero muito fazer surpresa! Eu sou uma pessoa ansiosa, mas gosto dessa sensação de ser pega repentinamente e quero passar isso para os meus fãs também, quero que eles sintam a novidade. Acho esse clima super gostoso, parece que tudo fica mais colorido, mais dourado!

Tem, mas eu não posso falar o nome ainda (risos).

Ah, você gosta muito de fazer surpresa, né?

Já tem nome?

Entrevista //

Vamos realizar juntos.Qual o seu sonho?

Fones: 44 3220-5454 ou 44 3033-0654

www.coopercard.com.br

Acho que esse é o primeiro passo para incluir as pessoas no rap e ele já foi dado. Com certeza espaço tem para todo mundo e muito. Se tem show da Karol Conká pessoas já sabem o que esperar, sabem que o público é diverso mesmo, é isso que nós queremos.

E como você vê que essa representatividade interfere no público?

Sim, é por que de fato, a vida que eu levo, as pessoas que me rodeiam são assim mesmo. Nós trazemos essa alegria constante, nós cantamos o dia inteiro (risos). É isso que eu quero passar para as pessoas, porque pra mim uma das piores doenças é a falta de autoestima. Quando a pessoa não acredita nela mesma fica triste, fica amarga e passa essa amargura para os outros. Então eu quero que a minha música funcione como remédio para isso, para esses momentos de ódio, quando os problemas nos pegam, as chateações. Sempre procuro ver o lado bom de tudo.

Eu mudei tudo (risos). A minha intenção agora é explorar outros estilos sem fugir da minha personalidade, sem fugir da base, que é o rap, mas descobrir outras roupagens. Porque eu não gosto de mesmice mesmo, acho que se eu fizesse outro disco igual ao Batuk Freak seria como se eu não tivesse evoluído nada. Hoje eu tô trabalhando com o TropKillaz, vai ter outros multimakers internacionais nesse novo álbum, muitas novidades.

Agora já estou preparando outro material, que vai sair em junho ou julho desse ano ainda.

Essa parece ser uma das principais características da sua música, a diversidade e a alegria também. Mesmo que crítica, a música parece ter uma energia mais positiva. É intencional?

Nesse trabalho você segue a mesma linha do primeiro ou mudou bastante coisa?

E como está sua produção agora?

Sim, eu acho que consegui uma aceitação, um respeito bacana a partir do momento em que eu assumi minha posição de realmente representar as mulheres, representar aquelas pessoas que muitas vezes se sentem menores por conta de opiniões bobas, preconceituosas. A gente já sabe que a televisão brasileira não nos representa de fato, não sabe quem somos. Então a nossa chance está aparecendo muito na música e nos videoclipes. Isso de ter uma mulher representando o rap nacional é uma das nossas conquistas. É muito importante as mulheres se darem as mãos, existe muita competitividade entre nós e isso se deve mesmo ao machismo da nossa sociedade. Então acontece que as mulheres sofrem com o machismo e reproduzem isso entre elas, numa tentativa talvez de serem “únicas”, mas “únicas” para quem? Para agradar a quem? Aos homens? Eu acho que um dos nossos papéis principais é quebrar isso, reconhecer novos talentos e mostrar para as pessoas que nós já somos únicas e que existem coisas muito mais legais que a gente pode fazer juntas. Ninguém chega a lugar nenhum sozinho, a minha mãe sempre falava pra mim ‘uma mão lava a outra e as duas lavam a cara’. Então, eu acho que a gente não pode perder tempo tentando agradar ao outro, a gente tem que se agradar primeiro, se sentir bem, se sentir mulher e trabalhar juntas.

Você acha que essa diversidade que aparece na música pode ser, justamente, reflexo de que novas pessoas, mulheres e gays, por exemplo, estão fazendo rap?

De um grupo fechado no Facebook, onde colecionadores locais de vinis trocavam figurinhas e referências, foi que surgiu a ideia de agendar um encontro para expor os bolachões ao público. A primeira experiência foi em outubro do ano passado e dada a boa repercussão, a segunda reunião foi marcada na sequência. Hoje, em sua oitava edição, rumo à nona, a feira do Clube do Vinil é um evento mensal aguardado na cidade pelos amantes da música.

Quem faz o corre é o jornalista Andye Iore, que é colecionador há décadas e, à frente do Projeto Zombilly, se junta aos outros 20 expositores de Maringá, Londrina e Cianorte para dar volume à exposição. A ideia, segundo ele, é fazer a feira mensalmente e itinerante, cada edição em um lugar

diferente e que abra espaço para atividades culturais. Junto à feira, sempre rola no espaço o som de algum músico da cidade, tendo já se apresentado anteriormente DJ Estêvão, Michel Gomes e Dedo na Quina (ex-Copacabana Pé Vermelho).

Com enfoque no lado cultural, a feira do Clube do Vinil atrai visitantes de diferentes faixas etárias, de adolescentes da geração MP3 até idosos que ainda guardam a vitrola com a agulha bamba. “Um aspecto que colabora para o sucesso da feira é que primamos por um acervo com bons discos. Já participei de feiras que anunciavam milhares de discos, mas com muita ‘tranqueira’. Preferimos o outro lado: ter discos raros e em bom estado de conservação”, diz Iore.

Amantes de um bolachão

#Confraria

Do desejo de viajar, o Coletivo Passarinha voa pelo Nordeste brasileiro e pousa em cidades e povoados para fazer intervenções artísticas e compartilhar conhecimento.

A vontade de pegar estrada, explorar novos horizontes e trocar percepções

culturais sempre foi o combustível que moveu um grupo de amigos adiante. Quando um deles realizou o sonho da Kombi própria, convidaram alguns artistas grafiteiros para dar um tapa no visual do simpático veículo. A perua, então, recebeu o nome de outra ave: Passarinha, e saiu voando rumo ao Nordeste brasileiro com seis jovens viajantes a bordo. A partida se deu no dia 21 de janeiro e, quase cinco

meses rodando e conhecendo paraísos naturais (e borracharias) Brasil afora, a única certeza do grupo é que o pouso final não tem data para acontecer.

E assim segue o Coletivo Passarinha, iniciativa que visa disseminar aprendizados de forma global junto à comunidade, seja por meio do teatro, intervenções poético-musicais, reflexões, oficinas artísticas, registro de causos locais ou mesmo as velhas e boas palhaçadas. No geral, atividades que buscam expandir e compartilhar conhecimento, vivenciando experiências únicas. “Procuramos nos inserir no contexto de cada região e vamos encontrando possíveis trocas culturais que podem ser estabelecidas em cada espaço”, comentam os integrantes diretamente de Aracaju em entrevista para O Duque.

Antes de pousarem no Sergipe, a Passarinha passou por diversas regiões da Bahia, onde cada local tem a sua própria história para contar. Cumuruxatiba, Caraíva e arredores foram onde as caravelas portuguesas aportaram, palco para o primeiro massacre de tribos nativas pelos europeus. “Ali, pudemos conhecer pescadores, indígenas, portugueses e vimos paisagens de arrepiar os cabelos mais íntimos. Foi apaixonante”, relatam.

Itacaré, Barra Grande, Cabuçu e Cachoeira (cidade com maior população negra fora da África) foram alguns dos outros destinos. “Pudemos realizar muitas trocas artísticas e culturais. Entramos em contato com a universidade local, o que proporcionou uma pequena turnê da nossa peça ‘Helena Vadia’ por outros campos do Recôncavo Baiano.” Fora isso, o samba de roda, o reggae, o Candomblé, a culinária, regionalismos, praias naturistas... um universo de experimentações.”

O Coletivo Passarinha segue a filosofia do indisciplinar, cuja proposta é aprender ensinando, quebrar paradigmas e ressignificar o conceito de indisciplinado, hoje visto como sinônimo de mal educado. “A indisciplinaridade questiona a lógica de separação em especialidades e formações, que se esquece de que elas só fazem sentido dentro de um todo”, afirmam. O manifesto do grupo defende que viver na Passarinha exige que essa indisciplinaridade seja colocada em prática todos os dias: morar, trabalhar, consumir, alimentar-se e educar-se, tudo fora dos padrões normativos.

Para conhecer mais sobre as atividades do Coletivo Passarinha – e colaborar com o pessoal no Catarse – acesse:

www.coletivopassarinha.com.br

#Partiu Indisciplinar

“Nossa prática é indisciplinar porque realizamos tarefas que são avessas à separação do conhecimento em disciplinas que moldam e hierarquizam o saber.

Em relações horizontais, procuramos respeitar nosso mandamento #1: Eu não sou obrigada”.

Londrina já soa como substantivo feminino. De fato, a cidade que hoje tanto representa politicamente as mulheres (sendo a principal da Paraná em termos de coletivos feministas), tem histórico na área. Na década de 1970, quando o jornalismo brasileiro ainda brincava com as mulheres que lutavam por seus direitos - sim, senhoras e senhores, mesmo no alternativo O Pasquim, os adjetivos dados às feministas ainda eram os piores possíveis, incluindo o famoso “mal-amadas” - a cidade se adiantou e lançou, em 1975, o jornal Brasil Mulher.

A publicação, de cunho feminista e revolucionário, surgiu para quebrar a supremacia masculina no jornalismo e dar voz às mulheres que, já na época se preocupavam em ter mais espaço dentro dos meios de comunicação.

Atualmente, partindo do mesmo pressuposto, oito mulheres se uniram e convidaram todas as outras para participarem do projeto Revista Farpa - Uma Revista Feita Por Mulheres, Para Todo Mundo. “Recebemos mais de 500 trabalhos, muitas

meninas ficaram empolgadas com a ideia, com o fato de ser uma publicação feita só por mulheres”, conta Lorena Balbino, londrinense responsável pela parte textual da revista.

Ilustradoras, quadrinistas, fotógrafas e escritoras foram acolhidas pela proposta, que visa contribuir com a visibilidade dessas artistas e desmitificar a ideia de que são poucas as mulheres que se dedicam a isso. “Com a revista a gente conseguiu confirmar a suspeita de que as mulheres estão produzindo, e muito! Mas isso não é tão visível quanto a produção masculina”, defende Lorena.

A Revista funcionará pelo sistema de crowdfounding, uma arrecadação que começa a ser feita agora, depois do projeto elaborado e dos trabalhos selecionados, e consiste basicamente em agregar de diversas formas os recursos necessários para desenvolver o projeto na prática. A promessa é de que tudo esteja rodando no início do segundo semestre, antes do Festival Internacional de Quadrinhos, que acontece em novembro, para que a publicação oficial possa ser apresentada no evento.

Produção feminina ganha espaço na Revista Farpa

HQs //

RepórterEltonTelles

Em 2007, Halisson integrava com mais quatro amigos o Grupo Neófitos. A ideia, a princípio, era produzir fanzines de poesias, mas acabou originando a HQ “Equilíbrio”. Na época, o quadrinho conseguiu ser viabilizado com patrocínio de empresas e da Prefeitura de Sarandi, fruto de suor, sangue, lágrimas e, claro, sorte. “Para fazer um quadrinho bom requer muito tempo e esforço. E em termos de Maringá, infelizmente, o custo/benefício não compensa”, reconhece.

O escritor Hernani dos Guimarães, 31, mora atualmente no Rio de Janeiro, onde produz indiecomics, quadrinhos fora do eixo das grandes editoras e que sofrem menos controle criativo. Prestes a publicar duas HQs nos Estados Unidos – “Aegis, Advent War II” e “Daughter” – ele opina que o mercado nacional nunca foi muito receptivo com os artistas nativos, pois já está rendido ao mainstream estrangeiro. Com a atual modinha da cultura geek – algo repudiado anos atrás – e o bombardeio de adaptações da DC Comics e Marvel para o cinema, a realidade tem mudado aos poucos, mas ainda há pouca abertura para as produções autorais.

Quanto a Maringá, onde Hernani morou por 12 anos, ele afirma que fazer arte na cidade sempre foi um ato de resistência. “Não há mercado, nem incentivo. Eu nunca conheci outro quadrinista na cidade, para você ter ideia. Só ouvia que eles existiam” A mesma observação faz o tatuador e quadrinista Adriano Alves, 25. Ele diz que os ilustradores em Maringá, de forma geral, não são tão unidos e que a inexistência de encontros para trocar ideias é por preguiça ou mesmo falta de interesse. “Por um lado, é compreensível, porque todos trabalham e o tempo fica realmente escasso. Mas quem tem vontade, mesmo chegando esgotado em casa depois do expediente, vai para a prancheta desenhar.”

No ano passado, Adriano foi a São Paulo participar do Comic Com Experience, considerada a maior vitrine de novidades da cultura pop. Com a pasta debaixo do braço, foi apresentar o portfólio aos avaliadores do evento. “Pensei que fossem me massacrar, mas tive um feedback positivo, me deram várias dicas”, diz o tatuador, que promete voltar neste ano para mostrar a versão finalizada de sua nova HQ, “Desolação” (foto). O mesmo corre vão fazer os ilustradores Alan Bariani, 35, e Rogério Curiel, 37, que administram há seis anos o site de tiras Cotidiano Contínuo. Em novembro, a dupla marca presença no FIQ (Festival Internacional

de Quadrinhos) em Belo Horizonte, para apresentar e vender exemplares de um quadrinho que ainda está em desenvolvimento. “Vai ser uma ficção científica mesclado com terror”, resume Bariani.

Sem precisar ir para fora, um caso de sucesso em Maringá é o projeto Mulher de Trinta, idealizado pela cartunista e ilustradora Cibele Santos. Ela cita as complicações do mercado editorial no Brasil, que envolvem burocracia, divulgação, logística e o vício em desvalorizarem os artistas a todo momento. “O início da minha carreira foi um verdadeiro teste de paciência e perseverança. Não foi uma jornada fácil, mas a sensação de conquista é muito maior quando ela não vem fácil”, recorda. “O negócio é não entregar os pontos, estar sempre atento às oportunidades e arregaçar as mangas, porque o mercado é concorrido e tem muita gente na batalha.”

A heroica jornada do quadrinista

contra o temível mercado editorial

O processo de criação de uma história em quadrinhos atravessa várias etapas criativas e não é tão simples quanto aparenta. A primeira delas é escrever o roteiro e estruturar como a narrativa vai ser distribuída, pensando quantos quadros serão necessários para contar a história. Aí é hora de acionar o botão criativo e colocar – literalmente – a ideia no papel. Desenhar, apagar, corrigir,apagar e desenhar de novo. Feito o rascunho, refazer o desenho final a lápis e sublinhar os traços com tinta. Se a intenção do quadrinista não é produzir edição única e nem refazer tudo a mão, o jeito é digitalizar todas as páginas. A próxima fase é enviar o arquivo para um colorista, profissional responsável por acrescentar a paleta de cor ideal para as ilustrações. Por fim, o material passa pelas mãos do letrista, que monta os balões e inclui as falas em cada quadrinho.

Pronto, material finalizado. Quem é contratado por uma editora, basta enviar a HQ para revisão e está tudo certo. Agora, se você é um quadrinista independente e sem aporte financeiro de alguma instituição, aí o trampo é mais ingrato. É preciso disposição para: bater de porta em porta para vender a produção, enviar centenas de e-mails torcendo para que ao menos um editor leia, participar de feiras e eventos para apresentar o resultado, criar um blog/tumblr para expor o conteúdo, inscrever-se em sites de crowdfunding (vaquinha virtual). Enfim, uma série de alternativas em busca da visibilidade e reconhecimento, que muitas vezes não vem, o que desestimula muitos artistas a continuarem nessa odisseia contra a opressão do mercado editorial.

Em último caso, o quadrinista pode bancar a impressão e vender o produto por um valor que, geralmente, está muito aquém do que de fato merecia. Para lançar o quadrinho “Américo”, por exemplo, o autor Halisson Júnior, 28, financioudo próprio bolso e vende a unidade por R$ 10,00. O lançamento do quadrinho, com tiragem de 200 exemplares, aconteceu no mês passado. “Não existe mercado editorial em Maringá. Por um lado é compreensível, porque não há produção suficiente na cidade, mas também é preciso observar que o mercado de HQs é dominado pelas grandes distribuidoras”, comenta.

Página de "Desolação", quadrinho ainda em fase de desenvolvimento assinado pelo maringaense Adriano Alves

Música //

bandas que são mais reflexivas e têm conceitos mais complexos, com elas costumamos trabalhar meses a fim de obter como resultado o aprimoramento do conjunto musical e dos laços entre os participantes", detalha Drago. Seja como empreendimento pessoal ou alternativa para viver de música entre as idas e vindas da carreira artística, é certo que o registro já fica como legado para a música maringaense - ou crônica do seu tempo, como diz o manifesto do Trama.

Trama maringaenseHome-studios dão liberdade para criação autoral, além da sensação de convidar os amigos pra fazer um som em casa

"Ele ia começar a gravar e pediu pra eu diminuir a luz do estúdio quando saísse. Eu diminuí, voltei e entrei na surdina embaixo do piano. Fiquei a gravação inteira lá, curtindo aqueles graves incríveis". Quem conta é Stone Ferrari e o "ele" da história é ninguém menos que César Camargo Mariano, um dos maiores pianistas brasileiros, que no momento estava gravando sua participação em um CD de Fernanda Porto. "Eu poderia ter sido demitido, mas depois que percebeu ele caiu na risada", conta Ferrari, lembrando de uma das muitas histórias que reuniu nos quatro anos em que trabalhou no Studio Trama, em São Paulo.

Célebre propulsor da música brasileira desde o início dos anos 2000, o Trama se consagrou pela busca de uma originalidade possível entre os vários estilos de músicos e bandas que passaram pelo selo. Nomes como César Camargo Mariano e Ed Motta dividiam espaço com Sabotagem e Sepultura, atraídos pelos valores que hoje estão descritos no manifesto do estúdio: a música é uma crônica de sua época / Os interesses comerciais não podem definir a música / A música é definida pelas pessoas e pelo seu tempo. "Lá eu posso dizer que aprendi tudo sobre música. Trabalhar com os melhores equipamentos, entre os melhores artistas, aquela experiência toda foi animal, cara", relembra Stone, que hoje busca repetir a fórmula no estúdio que montou em casa. "Já faz tempo que eu tenho a sombra do Pedemanga. É meu universo particular. Não tem um botão que não foi pago com algum trabalho relacionado à música", completa.

Talvez o principal expoente dessa veia autoral da nossa região seja o estúdio comandado por André Drago, responsável pela gravação de grande parte das bandas que hoje circulam por festivais e casas daqui. "Dr. Zoid, Anônimos Aduzidos, Conservantes, Mestre Ouriço, Awesome News, Melodia Preto Bend, Erasmo Five, Black Tones, Rafael Morais, Drago, que é a minha banda autoral (...)", elenca o que bem poderia ser o line-up de um festival de música autoral dessa nossa cidade-canção. "(...) A minha parada não é só a captação, mas a experiência que se vive ao fazer isso. Existem

Há três anos nesse rolê triplo de compor, gravar e produzir, Drago faz questão de destacar a força que teve no início de tudo. "No início, no momento que abri o estúdio, eu não tinha muita experiência na parte técnica e pude aprender muito com meus amigos, que por sua vez conheciam mais e mais músicos que também precisavam ser lapidados e gravados. A parceria é mútua, sem esse apoio das bandas da cidade o trabalho não seria viável". Esperto para o potencial de alcance do som gravado aqui, o estúdio/produtora também toma partido na inscrição das bandas em festivais, concursos e pretende em breve inseri-las nos planos de incentivo proporcionados pelo poder público.

Caçula entre os home-studios dessa trama pé-vermelha, o Mojo é autoral da parede ao teto. Seu interior de madeira bruta e aconchegante só acrescenta ao ideal artesanal do som que é feito dentro. "Madeiras, serra e suor. Fizemos com as mesmas mãos que fazem nosso som", conta o músico Rafael Morais, um dos responsáveis pela ideia junto de Gabriel Moraes, também músico. Criado para gravar música gospel, o estúdio e os equipamentos logo ficaram para a dupla quando a igreja, em que o pai de Gabriel era pastor, se mudou para São Paulo. "Nesse processo de transição ele fez uma proposta de nos ajudar com a parte mais bruta da construção do estúdio junto a casa. Nós ficamos responsáveis por todo o acabamento e tratamento acústico, assumimos a bronca já que tínhamos certeza do que queríamos da vida: fazer música", completa Rafa. Rebatizado e remodelado, nasceu o Mojo.

Seu aspecto de lounge também funciona como cenário para a gravação de clipes e até ganhou um álbum próprio, batizado de "Ao Vivo no Mojo", em que o trio composto por Rafael Morais, Gabriel Moraes e André Lauer recebeu convidados e interpretou canções de artistas como Céu e Nação Zumbi. Todos os vídeos estão disponíveis no Youtube. Para Rafael, a criação do Mojo foi fundamental para uma experiência de liberdade que ele, enquanto músico, precisa para gravar e lapidar seu som sem a interferência de uma visão estritamente comercial. Ou como diria Drago, arrematando, "Foi como me libertar do sistema e ao mesmo tempo dar condições para compositores que não têm tanta grana para se desenvolverem".

Repórter

GustavoHermsdorff

"Músico é tudo doido. Teve uma vez que o Sabotagem chegou lá no Trama de manhãzinha.

- Você trampa aqui?- Sim- Prazer, Sabotagem, vim gravar um som aí.

Fiz a técnica pra ele, ficamos trocando uma ideia a manhã toda aí ele foi tirar um cochilo. Quando acordou...

- E ai, beleza? Você trampa aqui na técnica?- Sim cara.- Prazer, Sabotagem, vim fazer um som aí com vocês.

Deu hora do almoço, o cara saiu pra comer. Quando voltou...

- E ai, prazer, Sabotagem. Você trampa aqui no estúdio?"

Nota do repórter:Na entrevista, o Stone também contou essa história três vezes.

Causos do Stone

Foto: Bulla Jr.

Especial

quando a ética obstrui

a vidaÉ indiscutível que a ética é a palavra mais difundida

nos últimos meses, mesmo que de forma indireta. Em geral, seu uso tem se proposto a encontrar uma justificativa para o caos brasileiro, seja ele político ou econômico.

Na entrada desse tema tão complexo, vale ressaltar que nem é de hoje o caos, tão pouco as maracutaias políticas são práticas deste ou daquele partido. O conteúdo aqui exposto se propõe a questionar até onde a Ética – parte da filosofia que estuda os fundamentos da moral, conjunto de regras de conduta – obstrui nossas vidas.

Alguns leitores devem ter sentido algum desconforto com a questão acima. Ora, como a Ética vai obstruir a vida de alguém? Pois então, vamos descontruir alguns pré-conceitos que talvez, com as tarefas diárias e a mídia massificadora, você não tenha tido tempo para avaliar a situação como um todo.

Para sua desconstrução, primeiro precisamos resgatar nossas fundações. Neste caso, beber da fonte inicial da Ética. Assim, é necessário dar um pulo lá na Grécia Antiga para dialogar com alguns dos baluartes do tema. Para o doutorando em Filosofia pela PUC-SP e pesquisador sobre Ética, Antônio Wardison Canabrava da Silva, “Desde a Grécia Antiga até a Contemporaneidade, a Ética foi discutida, elaborada e referenciada por muitos filósofos. Sócrates racionaliza a Ética e preconiza uma concepção do bem e do mal e da areté (da virtude). Em Platão, a Ética ganha fôlego na política a partir de uma concepção metafísica e da sua doutrina da alma. Assim como Platão, Aristóteles fala do homem político, social, condenado

Voltaire

Artigo

MiguelFernando

IDENTIDADEPeça do artista plástico maringaense Marcelo Monteiro, que faz parte da coleção exposta no Teatro Calil Haddad e durante a Festa Literária de Maringá. As próximas páginas da matéria especial serão ilustradas por obras seguidas de comentários de Marcelo sobre seu trabalho.

Especial

dos pequenosgrupos

A ÉticaÉ evidente que o diálogo avançou nos últimos cem anos, mas ainda há muitos desafios e a ética precisa se moldar para uma adaptação da sociedade moderna

a viver na pólis. [...], o homem deve cultivar a “justa medida”, que é o compêndio das virtudes Éticas, pela qual são administrados os impulsos e as paixões. A justa medida se traduz em um habitus e, portanto, constitui a personalidade moral do indivíduo. Aristóteles teoriza deste modo a máxima dos gregos: ‘Nada em demasia’”.

Compreende-se deste modo que a Ética pode ser transmutada do conceito teórico filosófico para os princípios morais que cercam a sociedade contemporânea. O filósofo e professor universitário Mário Sergio Cortella também defende esta posição e simplifica o discurso: “Ética é um conjunto de valores e princípios que você e eu usamos para decidir as três grandes questões da vida, que são quero, devo, posso? [...] Tem coisa que eu quero, mas não devo; tem coisa que eu devo, mas não posso; tem coisa que posso, mas não quero.”.

Numa linha temporal dos fatos históricos, se na Idade Média a Ética foi desenvolvida por um conceito mais teológico – inclusive, sendo o marco da primeira reflexão filosófica cristã, por meio de Agostinho - onde se defendeu a ordem como elemento condutor do homem à plena realização ou a vida eterna; na Modernidade o racionalismo entra em pauta, trazendo o homem para o centro das reflexões. O filósofo Antônio Wardison Canabrava da Silva aponta que “Descartes (1596-1650) foi o primeiro filósofo moderno a escrever sobre a Ética. Na Ética antiga, o ethos é autônomo frente às aspirações do indivíduo, ao passo que na Ética cartesiana, o ethos é racionalizado por um sujeito pensante.” Por isso, vale refletir que a Ética deve ser entendida a partir de um ambiente social que estabelece, ao longo das gerações, um conjunto de normas e valores entendidos como corretos ou aceitáveis de uma sociedade. Nem sempre, esse conjunto de limites está oficializado ou escrito, mas se faz perene pelos costumes geracionais. E Wardison continua, “Com efeito, a Ética contemporânea, [...] institui novas correntes que irão fundamentar o tratado ético-moral no mundo atual. Para Kierkegaard, o pai do Existencialismo, a Ética ocupa um estágio inferior e o homem perde a sua subjetividade. Em Sartre o homem é totalmente livre, mas as escolhas não acontecem de forma arbitrária, pois uma decisão remete a um contexto social. Nos Estados Unidos, o Pragmatismo [...] toma força e se difunde como filosofia do êxito e do útil. Freud (o fundador da Psicanálise) torna possível fazer um juízo moral de uma ação, ao avaliar o nível de consciência do indivíduo. No Marxismo, as teorias filosóficas da Ética esboçada até aqui são colocadas em xeque. E na Filosofia Analítica, Moore destrói a concepção metafísica da Ética em busca de uma linguagem moral.”.

Sob diferentes escolas, os intelectuais de diversos períodos da história tentaram compreender a Ética e suas influências no desenvolvimento socioeconômico das comunidades. Antagonicamente, chegamos a uma encruzilhada complexa e que gera um paradoxo: como estabelecer, a partir da Ética, os limites entre o certo e o errado?

Ora, se a Ética pode se moldar a partir dos anseios do homem moderno - que passou há muito para o centro das reflexões - como uma sociedade pode ter justificativa teórica para questionar os atos de outra, que vão contra os seus princípios?

Ainda não existem respostas definitivas para a questão, e a filosofia busca compreender o comportamento humano por meio de seus estudos há milênios. Contudo, se por um lado ainda seguimos procurando descobrir o que está por trás de nosso modo de agir e de ser, por outro, também, buscamos as maneiras mais convenientes de sermos e de agirmos. Assim, a Ética se propõe ao difícil desafio de estabelecer um elo mediador para cada sociedade.

Mas não há linearidade neste processo. A Ética, assim como o homem, se molda às tendências. Mas, apresenta maiores riscos quando abre lastro para ajustes a partir dos interesses de agentes externos. Para exemplificar, basta retornarmos a Idade Média, onde a Igreja Católica era dominante nos cleros e reinados. Para aqueles que não recolhiam tributos, dízimos ou mesmo iam contra seus dogmas, o ritual de excomunhão era inevitável. Nossa Ética se modernizou e se a igreja católica fizesse algo semelhante, certamente, abriria precedentes para grandes problemas jurídicos e choques institucionais.

Saindo do contexto religioso, ainda podemos estabelecer um paralelo de que pequenos grupos, se comparado às massas, sempre tendem a perder na queda de braço com a Ética estabelecida pela maioria. Vejamos os LGBTs - Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros. Existentes desde o início dos tempos, citados inclusive em passagens bíblicas, sem dúvidas, são o maior exemplo dessa dinâmica de que o “certo” da maioria se sobressaem ao “errado” das minorias. É evidente que o diálogo avançou nos últimos cem anos com relação aos LGBTs, mas ainda há muitos desafios e a Ética precisa se moldar para uma adaptação da sociedade moderna.

"Muito mais do que questionar, penso que a arte deve provocar questionamentos. Devo assumir que tenho, sim, muitas implicações de cunho social e sócio educacional. Por isso, me preocupo muito com a técnica e com o tipo de material que me aproprio para conceber o objeto artístico. Quando você fala em “manipulação de elementos para transformá-los em ideias".Marcelo Monteiro

Especial

Deste aspecto, a história diz que a Ética também age como os movimentos cardíacos de sístole e diástole, que infl am e murcham o músculo com o objetivo de circular a corrente sanguínea. Vejamos. Na Roma Antiga, a homossexualidade era algo aceito pela sociedade e em alguns casos era até ato nobre. Na Idade Média também existem relatos de situações homossexuais, já tendo a Igreja como sua maior perseguidora. Na primeira metade do século XX, além dos homossexuais, a Alemanha nazista perseguiu judeus e outras etnias.

Então, percebe-se que no início da formação das sociedades modernas a ética aproximou-se das diversidades. Alguns fatos eram corriqueiros, portanto, comuns e aceitos, como a homossexualidade, por exemplo. Mais tarde, a situação se inverteu, fazendo o diálogo se distanciar devido a interesses difusos e novos costumes impostos pela Igreja. Mais recentemente, há uma ruptura que busca unir as minorias.

Fica a dúvida: como ponderar um mediador deste confl ito Ético sem causar atrito entre os elos envolvidos? Neste caso, muitas vezes as perguntas podem ser melhores do que as próprias respostas. Tratando-se de Ética, a proposta é manter acesa a chama da discussão, do estudo e do aprofundamento. Contudo, veja que novamente voltamos ao cerne da discussão, propositalmente: o que é certo e o que é errado? E como avaliar este contexto Ético sob a ótica da corrupção na política brasileira?

Tratando-se de ser ético, pouco importa se você é de esquerda, direita, liberal ou conservador. Ou mesmo, se é deste ou daquele partido. O problema é o que seu grupo estabeleceu como Ética e se ela se moldou perante os interesses de poucos. Não sou preponente e nem pragmático para isso, mas neste caso poderia iniciar a discussão apontando essas primeiras linhas como a base da crise política nacional.

Antes de entrar no tema, como pesquisador, não posso deixar de apontar uma pequena ressalva: casos de corrupções no país tem sua base ainda no Brasil Colônia, mas foram amplamente difundidos com o programa “50 anos em 5” de Juscelino Kubistchek, onde milhares de benfeitorias foram desenvolvidas. Ali nasciam mais de uma dezena de empreiteiras que, com o passar das décadas – especialmente durante a Ditadura Militar - se transformaram nas maiores fi nanciadoras de campanhas eleitorais e, consequentemente, se benefi ciaram dos contratos públicos. Se quer saber mais sobre o tema, indico ler o recente livro “Estranhas Catedrais – as

empreiteiras brasileiras e a Ditadura Civil-Militar” (2014), de Pedro Henrique Pedreira Campos.

No entendimento da palavra política temos duas possibilidades. A meu ver, uma delas traduz muito melhor sua efetividade. A primeira propõe que política é a ciência da governança de um Estado ou Nação. A segunda, reparem, traz a política como uma arte de negociação para compatibilizar interesses. Por outro lado, a palavra é de origem grega, que é uma derivação de polis, ou seja, aquilo que é público. Logo, fi ca a dúvida: por que o representante político, eleito nem sempre pela maioria dos votos (em alguns casos, a composição partidária estabelece prioridades – talvez, outro fato a ser discutido), cria uma engenharia para, por meio da corrupção, se benefi ciar do dinheiro público?

Em complemento ao questionamento, vale destacar a colocação dos professores de Direito Público Menelick de Carvalho Netto e Argemiro Cardoso Moreira Martins, ambos da Universidade de Brasília, que diz “[...] distintamente das sociedades tradicionais, não mais há castas,

da errada políticaa correta éticaTratando-se de ser ético, pouco importa se você é de esquerda, direita,liberal ou conservador. Ou mesmo, se é deste ou daquele partido

"Quando me surgem as ideias, logo penso na concepção do objeto. Devo assumir, também, que penso na recepção de tal obra pelo público sim. Aliás, não estamos criando arte só para nós (artistas) devemos pensar mais no público. Cada expressão artística possui sua linguagem (maneira de se comunicar) específi ca, e a escultura é apenas uma delas. Sei muito bem do papel do hibridismo na arte contemporânea, porém, fi co muito triste quando percebo que algum objeto de arte se mostra incapaz de se comunicar com um público mais amplo".

Marcelo Monteiro

"Como sabemos, o objeto de arte resulta de uma matéria que, ao ser transformada por meio de uma determinada técnica, recebe vários símbolos e signifi cações. Sendo assim, posso afi rmar que o papel do artista é utilizar elementos que despertem sensações, que estimulem os sentidos e que possibilite a ação de pensar e experenciar relações. É importante ressaltar, ainda, que o conteúdo está mais no observador ativo, que no objeto de arte."

Marcelo Monteiro

Especial

É diretor do Duque, diretor executivo do Instituto Cultural Ingá e, apesar de turismólogo e especialista em história e sociedade do Brasil, foi na história local que encontrou uma paixão ainda não resolvida, em constante (re)descobrimento. Idealizador do Projeto Maringá Histórica, é autor de diversas publicações, entre elas “Sala dos suplícios: o dossiê do caso Clodimar Pedrosa Lô’ e “Maringá: urbanização e arborização”. Procurando pensar a Cultura como um mecanismo vivo, em desenvolvimento, busca propor soluções para este segmento, que adotou como sua principal atividade profi ssional há algum tempo.

portanto, não há aristocracia que por nascimento deveria governar. Ora, aqui a correção é um suposto moral básico para o exercício de qualquer atividade pública, do qual, a princípio, até prova em contrário, observado o devido processo legal, todos devem gozar. [...] Santo Tomás de Aquino, por exemplo, admite com relutância a hipótese de derrubada de um monarca dinasticamente legítimo, no exercício do direito de resistência, sob a condição de que se esteja alerta para os riscos de se por em xeque toda a hierarquização naturalizada da sociedade. A modernidade, por sua vez, procura superar esta questão ao afi rmar mecanismos objetivos capazes de possibilitar o controle constitucional do governo a despeito das características subjetivas de seus governantes”.

De toda sorte, como colocado anteriormente, o homem está no centro da (re) construção da Ética na contemporaneidade. Sob este aspecto, infelizmente, tratando-se do cenário político pós Constituição de 1988, aportamos sob mais um paradoxo: como estabelecer normas Éticas para aqueles que criam suas próprias Leis?

Os mesmos professores Netto e Martins nos propõem um quadro mais amplo a ser apreciado a partir do aspecto do bordão amplamente disseminado “Ética na política”. Eles apontam que este bordão tem um problema central, que é o que ele efetivamente não explicita, não declara, não diz a grande massa seu signifi cado. Netto e Martins adentram mais num solo pouco comentado pelos críticos e jornalistas políticos de plantão, que pondera o comportamento historicamente estabelecidos por uma comunidade e, que, com o passar do tempo passam a ser refl exivas. Segundo suas palavras, “[...] Todos os dias antigas práticas, costumes ou tradições passam a ser vistas como abusivas. Não mais cabe a ideia de uma tradição que se legitima simplesmente por sua antiguidade, pelo contrário, desde a concepção do direito natural moderno se requer a ruptura com hierarquizações sociais ainda que milenares. Agora é o presente, mediante o direito, que busca regular o futuro”.

Esta ruptura se faz necessária para a desconstrução da Ética como sinônimo de correto, certo. O conjunto de costumes e tradições, consideradas válidas ou aceitáveis, é um resultado de acordos (in) formais entre agentes que integram uma determinada sociedade. Um paralelo interessante sob este aspecto é tentarmos espelhar nossa Ética a dos extremistas, como o Estado Islâmico. Para eles, o suicídio e o assassinato são uma forma de elevar o nome de suas tradições religiosas. O grupo aceitou e estabeleceu isso como uma espécie de Ética interna que, consequentemente, não é considerada como válida externamente. Pelo contrário, ela é combatida. Podemos citar ainda as tradições gastronômicas, onde algumas regiões da Ásia consideram aceitável o consumo de carne de gatos ou cães, diferente do Brasil, onde julgam esta prática “eticamente incorreta”. Indo além, ainda podemos citar o ritual de clitoridectomia (retirada do clitóris) que é praticado em alguns países africanos há mais de dois mil anos e tem o objetivo de evitar o prazer sexual feminino.

Alguns de vocês leitores podem estar questionando que se trata de tradição e não Ética. Vale retomar que o papel da Ética é regular o que é certo e errado a partir de costumes de uma sociedade. Logo, passamos a etapa mais complexa deste processo: quando a Ética obstrui a vida.

Vejam que vários exemplos, de diferentes regiões do globo, foram citados estrategicamente para o leitor ponderar sobre os três princípios da Ética moderna, ressaltadas aqui a partir do fi lósofo Mário Sérgio Cortella: dever, poder e querer. Essa tríade precisa interagir com o externo, a sociedade ao seu redor. Por conta disso, retomamos o paradigma “Ética na política”.

Primeiro, vale ressaltar que boa parte dos brasileiros já passou a associar as duas palavras: Ética e política. Ou seja, está se tornando um processo padrão – pouco estudado – a demonização da política nacional em face da falta de Ética. Nessa percepção, quase que com razão completa, informações infundadas ganham força, seja nas redes sociais ou mesmo nas conversas informais.

Em fevereiro de 2014, o Datafolha ouviu mais de 2.600 pessoas. 68% delas respondeu que o Brasil era menos corrupto durante a Ditadura Militar (1964-1985). Alguns historiadores discordam. Boris Fausto diz, “Desconfi o que na época da ditadura não tinha o nível de corrupção que tem hoje”; Marcelo Ridenti tem outro olhar, “É uma percepção equivocada. É só lembrar daqueles casos da ponte Rio-Niterói, da Transamazônica, uma lista enorme. É que o tempo passa e as pessoas vão esquecendo”. No entanto, quando o assunto passou para questões sobre o que tange a sociedade como um todo, como liberdade de expressão, cultura, situação dos direitos humanos, situação econômica, social e educação, a maioria ainda defende que o atual Regime está à frente dos Militares.

Infelizmente, batemos em outro ponto, que inclusive foi ressaltado recentemente por uma das pessoas acusadas no caso de corrupção da Petrobrás. Noelma Kodama, doleira condenada a 18 anos de prisão, disse a CPI da Petrobrás que o “Brasil é movido a corrupção”, fazendo alusão à atual situação fi nanceira enfrentada por todas as cadeiras econômicas em recessão ou estagnadas até que a situação de desvios e escândalos sejam amenizados.

Aproximando a lupa à nossa realidade, o Paraná também entra na inconsistência de defi nição da “Ética política”. O esquema de corrupção na Receita Estadual já soma 62 pessoas denunciadas, onde milhões de reais foram desviados. Fora os casos de corrupção, o Paraná também desafi ou os princípios da Ética quando em uma operação falha, tanto da Polícia Militar quando da Secretaria Estadual de Segurança Pública, o Paraná entrou em confronto com professores e manifestantes contrários a aprovação do Projeto de Lei que reviu o plano de custeio do Regime Próprio de Previdência Social do Estado do Paraná. Resultado: mais de 200 feridos e um projeto aprovado pelos Deputados Estaduais.

Percebe-se, portanto, que a Ética está diretamente relacionada ao nosso cotidiano, gerando refl exos positivos e negativos. Apesar de ser uma expressão das massas, é conduzida por uma minoria.

Entretanto, a corrupção também está arraigada na vida de muitos brasileiros. Não é só na política que a Ética é moldada aos interesses de pequenos grupos. Você conhece quantas pessoas que tem TV a cabo clandestina, usa a internet Wi-Fi sem autorização do vizinho, come algumas uvas no supermercado enquanto faz as compras ou mesmo não paga suas contas em dia? Certamente, a lista não será pequena. Este é um problema que se arrasta há milênios com uma estrutura que se renova sob os novos anseios da sociedade: momentos que transitam com maior evidência pela religião, em outros pela política e economia.

Mesmo assim, mais do que um conjunto de normas estabelecidas formal e informalmente, temos que respeitar, acima das normas, as culturas e pensamentos alheios. Não há fórmula para tal, mas o melhor caminho talvez seja a frase que Cortella mais repete na maioria de suas palestras: “Tem coisa que quero, mas não devo; tem coisa que devo, mas não posso; tem coisa que posso, mas não quero”. Veja que, tratando-se de Ética, o “não” torna-se um mediador entre o certo e o errado, trazendo à tona a velha máxima: “não faça aos outros o que não quer que seja feito a você”.

MiguelFernando

Vida de artista

Um convite à sua arte

Quem acompanhou a edição passada desse nosso ilustre tabloide pode ver, já na matéria de abertura, um exame detalhado sobre as formas de produção e viabilização do fazer artístico disponíveis atualmente. Entre os três principais canais de financiamento (próprio, público e privado), destacamos a importância dos projetos criados pelo poder público para a fruição e circulação do trabalho desenvolvido pelos artistas locais. Nesse contexto, o lançamento dos editais da Secretaria de Cultura de Maringá (Semuc), no mês passado, funcionam como verdadeiros convites a um 2015 repleto de atividades para grupos de teatro, música, dança e artistas plásticos daqui.

Criado em 2005, o Convite à Música foi o precursor dessa modalidade de fomento implantada pela Semuc, sendo base para a criação do Convite à Dança em 2006 e do Convite ao Teatro em 2008. Três anos depois, em 2011, as Artes Visuais também ganhavam um Convite próprio e em 2015 foi a vez do Cinema também fazer parte da programação - esse último sem edital aberto até o momento. Juntos, os projetos vão oferecer atrações às quartas, quintas, sextas e domingos, com exceção do Convite às Artes Visuais em que a exposição fica aberta ao público todos os dias da semana. Todas as atividades têm entrada gratuita.

Os editais para composição do calendário 2015/2016 foram lançados na aba da Secretaria de Cultura no site da Prefeitura e apresentam algumas mudanças em relação aos anos anteriores. Segundo o responsável pelo Convite ao Teatro e pelo Convite à Dança, Marcos Lauer, as novidades vêm para garantir o espaço de grupos maringaenses e demandar uma maior profissionalização destes. "(...) trata-se de uma oportunidade única de garantir aos artistas locais a mostra de seus trabalhos sem concorrência externa, ou seja, de grupos ou companhias de maior envergadura. Outra mudança é a contratação apenas de pessoa jurídica, mais uma medida para valorizar os artistas devidamente organizados". Ainda segundo Lauer, as companhias e grupos de outras cidades serão contemplados nas contratações por inexigibilidade. Estão previstos 38 espetáculos neste período que

abrange o edital, sendo 24 por concurso e 14 por inexigibilidade (dispensa de licitação).

Fora a agenda cultural oferecida ao público, o projeto também funciona como alternativa para que grupos e artistas locais apresentem suas criações dentro de um orçamento previsto. Contemplado com o Grupo Meu Clown nos anos anteriores, o ator Alexandre Muniz conta que as apresentações do Convite ao Teatro ajudaram a formar um público que agora os acompanha em outros espetáculos. "Como trabalhamos muito com a linguagem do Clown Palhaço de teatro o público tem uma cumplicidade com a gente, uma identificação e isso é muito bom. E eles participam tanto, que na última apresentação nem havia terminado a peça e tinha criança na frente do palco. Teve até dois meninos que sentaram na ponta do palco e assistiram de lá", lembra.

Além dos Convites, esse ano também foi lançado concurso para músicos que queiram tocar no Palco Alternativo da Virada Cultural, que normalmente acontece em novembro. Serão contempladas sete apresentações de 30 minutos, no valor de R$ 2.500 cada. "Decidimos aproveitar a criação dos editais dos Convites e já preparar também esse da Virada, antecipando o que será feito em outras cidades do Estado", explica o assistente da Semuc, Edilson Rosa. A inscrição deverá ser feita através de um CD com no mínimo dez faixas, além de todo detalhamento técnico dos integrantes e equipamentos utilizados. Para Rosa, essas exigências nos editais da Virada e dos Convites funcionam, também, para a profissionalização dos próprios artistas que estão dispostos a participar dos concursos. "Dentro dessa perspectiva da economia criativa, é fundamental que os artistas e grupos tenham esse tipo de material para participar não só desse tipo de processo como também de outros fora da cidade", completa.

As inscrições para todos os concursos poderão ser feitas até 45 dias a contar da publicação do edital - o que vai dar em 02 de julho - e devem respeitar algumas exigências técnicas de acordo com cada área. A banca de avaliação dos projetos será composta por técnicos e especialistas de outras cidades e os critérios de avaliação, bem como o peso de cada ponto, estão descritos nos editais.

Artistas do teatro, da dança, da música e das artes plásticas podem participar dos concursos abertos em maio

RepórterGustavo

Hermsdorff

Convite ao Teatro:8 espetáculos para 3 apresentações no valor de R$ 2 mil cada. As apresentações serão realizadas no Teatro Barracão.

Convite à Música:12 espetáculos para 2 apresentações cada. Os valores variam conforme a formação da equipe. Serão 8 espetáculos de solo, duplas ou trio no valor de R$ 1,5 mil cada apresentação, e 4 espetáculos de grupos com mais de três integrantes, no valor de R$ 2 mil cada apresentação. As apresentações serão realizadas no Auditório Luzamor.

Convite à Dança:8 espetáculos para 3 apresentações no valor de R$ 2 mil cada. As apresentações serão realizadas no Teatro Reviver.

Convite às Artes Visuais:10 exposições no valor de R$ 8 mil cada, que ficarão expostas durante 25 dias no Teatro Calil Haddad.

Dúvidas?Marcos [email protected](44) 3218-6133

Vani [email protected](44) 3218-6138

Stefânia [email protected](44) 3218-6131

Como vai funcionar?

#Confraria

Pela quarta vez, Maringá entra no radar da cinematografia francesa e será uma das 50 cidades no Brasil a exibir os 16 filmes que compõem a programação do Festival Varilux de Cinema Francês. As exibições acontecem entre os dias 10 e 17 de junho no Cineflix Cinemas do Maringá Park Shopping.

O filme de abertura desta edição é a comédia “Samba” (foto), dirigida pela dupla Olivier Nakache e Eric Toledano, responsáveis pelo fenômeno “Intocáveis” (2011), que bateu recorde de bilheterias na França, arrastando mais de 23 milhões de espectadores aos cinemas. Os cineastas estarão no Brasil para apresentar seu mais novo trabalho, que conta com os atores Omar Sy, Charlotte Gainsbourg e Tahar Rahim no elenco.

Direto do recém-finalizado Festival de Cannes, também integra a programação do Varilux o elogiado “De Cabeça Erguida”,

“Acho que um consenso aqui é que nenhum de nós acredita em um deus que não dança”, defende Claudio Caldeira, um dos integrantes da Melodia Preto Bendi. A banda, composta também por Lirian Lopes, Caio Emílio, Rafael Melodia, Thiago Faria, André Drago e Vini Maccarini, está gravando seu primeiro álbum no Estúdio Drago, em Maringá.

Partindo de um princípio desses não havia como ser diferente, o ensaio é um ritual e a sintonia entre os músicos dita quando a música está pronta. A resposta está nos olhares trocados.

Quem sentiu, sentiu e se alguém não sentiu é porque ainda não deu assim tão certo. Bora tentar fazer de novo, afinal, só assim é possível compor um som tão incomparável, que se dedica mais a representar o espírito dos envolvidos do que a se encaixar nos estilos musicais pré-determinados.

estrelado por Catherine Deneuve e Benoît Magimel. O filme, dirigido por Emmanuelle Bercot, relata os esforços de uma juíza e um educador para absolver um jovem delinqüente.

Entre os destaques, estão “Gemma Bovery – A Vida Imita a Arte”, uma releitura moderna do clássico da literatura inglesa “Madame Bovary”; o drama “O Diário de uma Camareira”, que disputou o Urso de Ouro no último Festival de Berlim e animação em 3D “Asterix e o Domínio dos Deuses”.

No ano passado, o Varilux exibiu o clássico da Nouvelle Vague “Os Incompreendidos” (1959) de François Truffaut. Neste ano, o festival homenageia a Cidade Maravilhosa e seus 450 anos com “O Homem do Rio” (1964) de Philippe de Broca, protagonizado por um jovem Jean-Paul Belmondo, ator-fetiche de Godard.

Rafael Melodia foi quem trouxe o rap do berço para o papel. Chamou um amigo, que trouxe outro que trouxe uma gaita e mais alguém que achou que a viola caipira ficava muito bem acompanhada do berimbau. Assim por diante. Muita gente, muito talento, muita mistura marcam o som desenquadrado do grupo, saindo da caixinha para abranger o Brasil todo. O fundamento é o povo, a cultura afro-brasileira em suas mais variadas origens. Como resultado fica a prova de que avançar pode ser, justamente, retornar às tradições.

Envolvidas pela malemolência dos ritmos, as letras dançam, mas não se perdem. Seguem um princípio de resistência falando sobre orgulho, respeito, raízes, tradições e enfrentamentos ainda hoje necessários, são retratos dos músicos, suas vivências e das histórias que os cercam. “Eu me sinto muito contemplada em poder cantar sobre as mulheres, em falar do caboclo e da cabocla, no sentido de encontrar os dois em cada um de nós”, conta Lirian Lopes, abrindo a possibilidade de revelar, na poesia, esse equilíbrio yin e yang. “No fim das contas,

todos somos ambos, caboclo e cabocla”, completa.

O primeiro álbum está sendo finalizado nesse mês e a promessa do grande lançamento da banda é para o segundo semestre desse ano. Por enquanto, o mistério tem sido grande - não, nem um videozinho no youtube para matar a expectativa - mas o que é a espera se não o tempero do espetáculo? Melodia Preto Bendi é nome pra ser guardado junto à ansiedade por agora, e acompanhado de perto quando chegar a hora.

Cinema francêsem Maringá

"Acho que um consenso aqui é que nenhum de nós acredita em um

deus que não dança"

Une admission, s’il vous plaît.

Melodia éMandingaem Poesia

Relato //

Relato

O cenário estava permeado por todas as formas de olhares, que sorriam ao avistar tantos milhares de pessoas reunidas em uma mesma fúria. Caminhando por entre as pessoas, logo que cheguei à frente da Assembleia Legislativa do Paraná, tentei entender aquele espaço que estava sendo preenchido por tantos pés, braços e corações afl itos. Parei imediatamente em que avistei uma policial militar mulher. Ali fi quei minutos a fi o, quase que paralisada. Eu gritava por dentro. Talvez também ela. Mirei em seus olhos de, provavelmente, mãe, companheira, amiga de alguém(s) que não a tinham como tal naquele instante. Até o momento em que fui correspondida neste olhar. O que chegou até mim não durou tanto. Um misto de incredulidade, medo e vergonha estavam estampados naquela expressão corpórea de tamanha rigidez e controle. Única mulher fardada (e do lado errado das grades de segurança) que avistei. Não sei dizer se havia outras, ou se esta foi uma das ofi ciais que se recusaram a agredir os manifestantes. Torço para que sim.

Muitas mulheres, ao encontrá-la, tiveram

a coragem sem fi m que não tive: olhavam-na e verbalizavam expressões como “provavelmente eu dou aula para os seus fi lhos. Vai me bater ou vai vir para o lado de cá lutar também?”. Eu mal pude me movimentar dali, que dirá conseguir pôr em palavras o que sentia. Fui chamada por uma amiga a continuar caminhando. Até que, horas mais tarde, o massacre teve início e nosso Outono gelado ganhou tons de vermelho ao cinza da capital. Grades caíram e a primeira bomba de gás mostrou a que estavam ali os diversos setores da polícia do Estado (e seu contingente exorbitante, em números).

Lágrimas. Gritos desesperados confundiam-se ao barulho tenebroso das bombas que chegavam sem piedade. Tiros de borracha atordoavam àqueles que gritavam por nada além de seus direitos mínimos de sobrevivência. Notadamente reconheci, em meio à correria e desespero, gritos femininos que me punham em total alerta e preocupação. O microfone fazia aumentar nossa tensão quando, em pouquíssimo tempo desde o início das saraivadas de agressões, anunciava feridos e pedia passagem e ajuda para conseguir

resgatá-los. Duas horas. Esta foi a duração aproximada

de todo o tormento que parecia não ter fi m. Aos marcados primeiros minutos eu, que corri sem parar até conseguir respirar (e inundada por irrefutável impotência), desabei em lágrimas e desespero. Percebi que algo dentro de mim morria em minutos. Assim como percebi que o mesmo acontecia com tantos outros seres humanos que ali estavam, compartilhando de tanta dor. Olhares descrentes de tudo o que viam e nos quais desesperadamente eu procurava consolo e fuga. Mulheres que jamais eu havia visto em minha história, paravam constantemente a toda e qualquer pessoa que se afastava da parte mais densa de gás, perguntando se estavam bem. Respostas foram poucas neste sentido. Elas, em meio a este vale de lágrimas, construíam forças para ajudar da forma que podiam.

Muitas (e aí então chorei com toda força que me continha) tiveram a digníssima função de auxiliar no resgate de pessoas que estavam à beira de um quadro de loucura instantânea. Esta parte de nosso ser que nos mantém minimamente sóbrios

CENTO E VINTEMINUTOS E CORAÇÕESDESESPERADOS

Colaboração

LoreneCamargo

Lágrimas. Gritos desesperados confundiam-se ao barulho tenebroso das bombas que chegavam sem piedade. Tiros de borracha atordoavam àqueles que gritavam por nada além de seus direitos mínimos de sobrevivência. Notadamente reconheci, em meio à correria e desespero, gritos femininos que me punham em total alerta e preocupação.

Relato //

(do ponto de vista psicológico) foi, por minutos, rompido em algumas pessoas (geralmente jovens), em meio a tanta insanidade. Dados de realidade, acolhimento por meio de mãos, braços, batidas de corações tão generosos, foram distribuídos às pencas. Enquanto havia possibilidades e movimentos sem fim de avanços na linha de frente, reação ali era reintegrar seres humanos que foram (inocentes que somos) surpreendidos com tamanha truculência e arrebentados em seu orgulho, dignidade, integridade.

Quando houve, após estes cento e vinte minutos de tortura coletiva, um “cessar-fogo”, voltei a caminhar entre as pessoas, sem muito objetivo para além de movimentar minha angústia de forma física. Avistei uma jovem, coragem sem igual, aproximando-se, em meio a lágrimas, de um conjunto de policiais que estavam em posição, em área externa à praça. Ela afasta o escudo que estava à frente do tronco do policial que estava na ponta do “cordão” e fala (grita): “Você não precisa disso (referindo-se ao escudo)!! Conversa comigo e fala que que é isso tudo?! Explica pra mim!” Permanece, então, ao lado dele e encara-o, incrédula à apatia e indiferença que este rosto expressava.

O que vivemos e vimos naquele espaço, datado em 29 de Abril (abril, minúsculo) de 2015, não pode ser contido em um texto apenas. Ou em qualquer forma de expressão de racionalidade de que dispomos. Mas é fato. E fatos devem ser relatados, chorados, lembrados. Vi mulheres de extrema fibra improvisando escudos de madeira, enfrentando policiais que ofendiam, cuspiam, riam sarcasticamente, e também aos estouros de borracha e à invasão impiedosa de gases de

pimenta e lacrimogêneo. Vi mulheres desoladas, em busca de seus alunos, em meio ao caos. Vi, sobretudo, mulheres que foram marcadas por mais esta dor, por mais esta humilhação. Avistei cassetetes atingindo pernas femininas sem qualquer pudor ou moderação. Senhoras professoras, já de idade avançada (e muito tempo em salas de aula), sendo impedidas por policiais de serem socorridas. Mães, irmãs, filhas, companheiras, alunas, professoras. Duronas em qualquer queda. Também nesta. E é a todas estas preciosidades que lá estavam e choraram tanto quanto eu, ou mais, que dedico estas linhas.

"Quando chegar o momentoEsse meu sofrimentoVou cobrar com juros, juro.Todo esse amor reprimidoEsse grito contidoEste samba no escuro"Apesar de você – Chico Buarque, 1970.

Foto: Joka Madruga

Resenha //

O começo da história de Maringá foi registrado por um Duque. Literalmente. Jorge Ferreira Duque Estrada (1916-1983), advogado e vereador da primeira legislatura do município, que viveu durante muitos anos na cidade, debruçou-se sobre documentos, fatos vividos e ouvidos para compor “Terra Crua”, livro escrito em 1957, publicado em 1961 e relançado no final de 2014 - para a sorte dos leitores de Maringá e região.

Na obra, que pode ser lida como uma grande crônica, um livro de memórias ou de análises dos fatos – com pitadas de ciência política e sociologia – o leitor estará diante da Maringá do final da década de 1940 e da do começo de 1950. Tempo em que, segundo o autor, “a falta de luz tornava obrigatório o uso de uma lanterna na mão esquerda, enquanto os mais precavidos levavam, na direita, um revólver”.

Em pouco mais de 160 páginas, a obra, dividida em 13 capítulos, mostra, logo no prefácio, que Duque Estrada foi um homem das letras: a descrição sobre o que há de vir foi feita em forma de poesia. Humilde, na introdução escreveu que não queria fazer literatura, e sim contar histórias.

Logo na introdução/poema, resumiu bem a história que iria contar. Na primeira estrofe, como se indicasse o começo do livro, uma Maringá que ainda nascia. Ele escreveu: “maringá tôco na rua./ terra crua/ da poeira/ e barracão./ da chuva/ bota/ e da fama./ da lama/ e do escorregão...”. Na última, indicando uma cidade que já havia mudado: “adeus maringá maria/ daqueles tempos atrás./ que a menina tão catita/ cabloca sim.../ mas bonita!/ não volta mais./ nunca mais...”.

Brindando o leitor com ironia, fatos e farto material histórico, Duque Estrada referiu-se ao município emancipado de Mandaguari como cabocla. Cidade que ele via crescer graças ao empenho dos pioneiros que aqui chegavam com novas ideias e projetos. “Ninguém era filho da terra, nem havia tradições a zelar. A aventura era o traço de união entre todos”, escreveu.

Na Maringá de “Terra Crua”, a justiça era feita pelos homens, os negócios por meio da política e a política por meio das grandes empresas. Logo na primeira legislatura municipal, brigas e pedidos pela cassação do mandato do prefeito eram comuns. Tudo isso foi registrado por Duque Estrada. Um homem do tempo e à frente do tempo em que viveu.

O autor não se distanciou dos fatos para escrever sobre o que aconteceu. Duque Estrada os vivenciou. Como um

repórter em um front de guerra, descreveu as batalhas travadas na terra crua pelo poder político. Maringá era “virgem” e, por isso, Jorge Ferreira diz que “todos os ‘chefes políticos’ queriam ter a honra de possuí-la pela “vez primeira”. De amigos que tinham sido até então, os ‘chefes’ já mal se cumprimentavam. Abriam, sim, largos sorrisos aos possíveis eleitores”.

A política – um espetáculo à parteDuque Estrada foi eleito vereador pelo PTB (Partido

Trabalhista Brasileiro) em 1952. Por isso, nas análises que faz não há imparcialidade. Entre muitas situações e “causos”, ele conta como foi a primeira eleição na cidade: cheia de mentiras, falsas promessas, exageros e traição. Isso, claro, na visão dele.

Destaque-se na obra a descrição do que acontecia na Cidade Canção durante a primeira eleição municipal. De certa forma, houve uma representação daquilo que acontecia no cenário nacional, guardadas as devidas proporções.

Enquanto Carlos Lacerda (1914-1977) atormentava Getúlio Vargas (1882-1954) e ambos representavam a polarização UDN x PTB, o mesmo acontecia em Maringá. O candidato pelo PTB e, posteriormente, primeiro prefeito eleito foi Inocente Villanova Júnior. O candidato da União Democrática Nacional foi Waldemar Gomes da Cunha, que, segundo o autor, ele e o grupo da UDN espalharam panfletos e mentiras que associavam Villanova ao ateísmo e ao comunismo.

Num dos panfletos, faziam um trocadilho com o nome do candidato pelo PBT. Dizia o seguinte: “Que inocente é o Villanova?”. Em outro, publicaram uma fala atribuída ao futuro prefeito: “[...] os Petebistas votam até num poste, quanto mais em mim”. A campanha política era, como o autor chamou, um palco de belzebu.

O capítulo sete, chamado de “Palco do Belzebu”, é uma das passagens mais intrigantes do livro, tanto do ponto de vista crítico do autor, quanto pelo momento histórico da cidade. Confrontando com o atual momento histórico-social-político brasileiro, vemos que muita coisa não mudou. Nesse capítulo, Jorge Ferreira Duque Estrada critica a forma utilizada pelos políticos para realizar a eleição: promessas de emprego e salários, por exemplo. E ainda dá um “puxão” de orelha no eleitor/leitor.

“Daí se conclui o quanto os brasileiros têm que aprender no sentido de que o cidadão eleitor adquira

personalidade e pratique o civismo. Um homem que sabe o que quer não se deixa influenciar pelas ‘conversas’ de ‘cabos’ e garrulice dos ‘cabalas’.”

***Ler “Terra Crua” é olhar para o passado, entender

as relações sociais construídas para compreender muito do que vivemos hoje – além de descobrir quem foram algumas das pessoas que hoje dão nomes para muitas ruas da cidade. Mais do que isso, lê-lo é andar pelas ruas sem asfalto, sentar no bar Central e ouvir as conversas, ver as brigas e os assassinatos comuns à época e, quem sabe, observar um vereador dizendo a outro parlamentar que o mesmo não fora nascido, e sim defecado.

Tudo na visão do autor, claro, que – não nos esqueçamos! – foi um Duque na terra crua.

A reediçãoA obra foi relançada graças ao trabalho de muitas

pessoas e à Lei Rouanet. Nessa nova edição, “Terra Crua” recebeu roupagem nova: a capa é dura. Por outro lado, a obra é fac-símile, possibilitando o encontro da nova geração com aquilo que marcou a época, levando os saudosistas a se lembrarem do livro como fora concebido originalmente.

Há, ainda, um ensaio muito explicativo sobre a vida e obra de Duque Estrada, escrito pelos professores do Departamento de História da Universidade Estadual de Maringá Reginaldo Benedito Dias e José Henrique Rollo Gonçalves, um posfácio produzido pelo filho do autor, Fernando Bonfim Duque Estrada, além de muitas imagens da Maringá do passado.

O projeto da reimpressão do livro “Terra Crua – edição especial comentada” foi organizado por Reginaldo Benedito Dias, professor do Departamento de História da Universidade Estadual de Maringá, Sergio Gini, cientista social e Miguel Fernando Perez Silva, diretor executivo do Instituto Cultura Ingá e conselheiro editorial do Jornal O Duque. No final do livro, o filho do autor, Fernando Bonfin Duque Estrada participa com um posfácio, abrindo o capítulo denominado “Comentários sobre autor e obra”. Em seguida, juntamente com o professor Reginaldo, José Henrique Rollo Gonçalves, também professor de História da UEM, escreve um ensaio muito explicativo sobre a vida e obra de Duque Estrada. Todo o livro é recheado de fotos, recortes de jornais e cópias de documentos da época.

Colunista

VictorSimião

Mais do que umlivro, “Terra Crua”é a crônica doinício da vida deMaringá

Psicologia //

Emocionar-se é transformar o sentido do mundo.Essa transformação, se atentarmos a ela, será

reveladora de nossas intenções em um grau muito específi co e frequentemente ignorado.

Mas tal como a fé, as emoções são um fenômeno de crença, e da força dessa crença se extrai toda a sua realidade.

Vejamos como essas premissas podem nos ajudar a atribuir signifi cado àquilo que sentimos.

Quando nos emocionamos, nossa consciência se modifi ca e passa a captar as coisas do mundo através de um novo sentido. Mas, normalmente, não refl etimos sobre esse estado emocional no mesmo momento em que o experienciamos. Se nos estressamos em uma situação de trabalho, por exemplo, o que percebemos é a difi culdade de realizar uma tarefa ou a convivência com alguém excessivamente desagradável. Qualquer que seja a situação diante da qual nos estressamos, temos a nítida impressão de que nosso estresse foi causado por essa situação. Passamos a enxergar na tarefa a ser realizada ou na pessoa com quem teremos que realizá-la, o poder mágico de degradar nosso estado afetivo. Da mesma forma, quando nos alegramos diante de alguém, temos a intuição de que essa pessoa concentra em seu íntimo a nossa felicidade, contida ainda em estado de potência, e que a sua ausência nos privaria da própria possibilidade de ser feliz.

Porém, vejamos com cuidado, admitir que essa seja a natureza das emoções nos obrigaria a consentir que nossos estados afetivos se encontrariam retidos fora de nós no momento mesmo em que os experienciamos, preenchendo-nos todo o corpo. Dessa forma, nos colocaríamos passivamente diante de nossa própria afetividade, como se as emoções fossem de natureza involuntária e não nos restasse nada a fazer, senãosofrê-las.

Eis o momento em que nos preparamos para encarar o ponto mais denso da questão que viemos tratar e, por isso mesmo, seja pela complexidade do assunto ou pela inabilidade de quem escreve, é recomendado ao leitor reforçar a atenção, pois, quanto mais concentrado, mais contundente tende a ser o impacto.

É inegável que as emoções são desencadeadas pela percepção. Isso signifi ca que é pelos sentidos que somos afetados pelo mundo. É diante dos objetos, situações e pessoas que as emoções nascem e se nutrem em nós. Porém, convém reintegrar aqui o que foi dito a princípio: as emoções são uma forma de transformar o sentido do mundo. Essa transformação é intencional e alimentada pela crença de sua realidade.

Assim, a forma como apreendemos as situações, objetos e pessoas a nossa volta é orientada pela própria intenção com a qual nos lançamos sobre

essas situações, objetos e pessoas. Eis o meio como estamos implicados na forma como o mundo nos afeta: se me entristeço profundamente diante de uma grande decepção, todo o meu corpo parece reduzido de forças. Incapacitado de qualquer ato. Utilizo o que me resta da vontade num esforço de isolamentoautofágico, consumido pela mesma decepção que nutre o meu estado. Minha tristeza é legítima. Por ela o mundo se transforma e passa a ser percebido por mim através de uma máscara de tédio. Passo a agir como se nada valesse à pena e a negar o valor de todas as minhas importâncias. Meu corpo esvaziado de ânimo me convence da veracidade dessa crença: nada vale. A intenção e o sentido de minha tristeza estão revelados: ao negar o valor do mundo, tento negar a importância do golpe que sofri na decepção que desencadeou essa tristeza. Inefi caz, pois assim, toda minha conduta me une à decepção que viso negar.

As emoções são sofridas e disso não há dúvida. Porém, também, carregam um sentido que não se esgota em uma causa que as antecede e explica.

As emoções são signifi cativas e signifi car é indicar uma outra coisa.

No signifi cado encontramos a intenção.A intenção nos revela o sentido.

SOBRE O SENTIDODAS EMOÇÕES

Colunista

Rodrigo Rocky

É inegável que as emoções sãodesencadeadas pela percepção.Isso significa que é pelos sentidos que somos afetadospelo mundo. É diante dos objetos,situações e pessoas que as emoções nascem e se nutremem nós.

Terça-feira, 7:43am, Av. Brasil: "aí eu peguei e liguei na hora...", "parei de fumar semana passada e...", "acredita que engordei outra vez...", "alí ninguém presta, mesmo...", "comprei na liquidação, mas não conta...", "isso! na gaveta de baixo, abre ela...".

As pessoas passavam por ele como se não existisse. Usavam roupas coloridas, uniformes, casacos, decotes. Era como se não estivessem na mesma estação, na mesma cidade, na mesma época. Ele seguia em linha reta, com um olhar altivo. Passou pela faixa de pedestres, banca de jornal, Banco Itaú, Mercantil e Bradesco. A cada minuto batia a mão no peito conferindo se a carta estava no bolso. Havia tomado banho decente e se barbeado após semanas. No pescoço, uma pequena cicatriz: culpa da navalha e da falta de prática. Os sapatos estavam engraxados e combinavam com a camisa de linho. Dobrou à direita na Getúlio Vargas e quase pisou nuns pombos que bicavam a calçada. Parou por um momento e olhou pra cima. O céu, já azul, era invadido por algumas nuvens. Ao redor, alguns prédios e letreiros de publicidade. À frente, a catedral. Era bem alta, pena não ter janelas. Andou mais alguns passos e entrou no Edifício Três Marias. Disse ao porteiro que iria à radio e entrou no elevador. Avaliou que 8 andares eram suficientes. Conferiu a carta no bolso da camisa e apertou o botão do 8º. O elevador era barulhento. O Edifício, um dos mais antigos de Maringá, década de 1960. Saltou no andar escolhido assoviando as notas de Lady Writer, o andar vazio. Verificou as janelas, todas fechadas. Olhou a cidade de cima e a achou antipática. Tomou impulso no corredor e pulou contra a vidraça, depois contra o vento e caiu em cima dos pombos.

Quarta-feira, 7:44am, Av. Brasil: "não soube? foi ali pertinho, na Getúlio...", "rapaz novo, nem 40 anos...", "é verdade! o vidro do carro quebrou com o impacto...", "deve ser mais um desses drogados...", "parece que era escritor, mas ninguém conhece...", "tinha uma carta no bolso, mas ninguém entendeu a letra...".

#Sarau

edifíciotrês marias

MichelQueiroz

YuriaSantamaria

LennonRosa

Os golpesEnsurdecemCegandoOs gritos.

FumaçaEnrubesceSangrandoAs vozes

As armasDilaceramSem cessarO giz.

amando a vida assim como amando a poesiacaos guerras doenças misteriosamente entesporcarias doces amargas selvageria mesmiceimplorando por virtuais convenções humanasentusiasmos oráculos organismo caramujosbesteirol gordura refrigerantes cervejas paupássaros levantam cedo para ir trabalharcachorros adoram cheirar rabos sedososfrios geladeiras objetos sólidos espíritos inteirosnascimento em tragédia de existência puracerta vez fitei um bode macabro olhos azuisanéis travejando trovões relâmpagos capitão

Impacto

luz que alumia olhos cristalinos