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Simpósio - Pós-Graduação lato sensu 20/9/11 Instituto de Letras da UFF Uma abordagem discursiva do humor e suas contribuições para o ensino de língua portuguesa Por Helio de Sant’Anna dos Santos Colégio Pedro II Orientação da Professora Doutora Terezinha Bittencourt

Humor e ensino: Helio Sant'Anna - Professor do Colégio Pedro II

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Simpósio - Pós-Graduação lato sensu 20/9/11Instituto de Letras da UFF

Uma abordagem discursiva do humor e suas contribuições para o ensino de língua portuguesa

Por Helio de Sant’Anna dos SantosColégio Pedro II

Orientação da Professora DoutoraTerezinha Bittencourt

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Se é certo que todos os textos têm sentido, os literários são aqueles textos que se apresentam como construção de sentido. O que indagamos na análise, na interpretação de uma obra, é uma indagação pelo sentido; não pelo significado nem pela designação, mas, sim, por este nível superior de conteúdo que só se dá nos textos.

Do sentido do ensino da língua literária. Confluência – Revista do Instituto de Língua Portuguesa do Liceu Literário Português. Rio de Janeiro: 1.º semestre de 1993, n. 5, p. 38.

Por universo de discurso entendemos o sistema universal de significações a que pertence o discurso (ou um enunciado) e que determina sua validade e seu sentido.

Teoria da linguagem e linguística geral, Rio de Janeiro: Presença; São Paulo: EDUSP, 1979, p. 234.

Eugenio CoseriuEugenio Coseriu

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http://www.uni-tuebingen.de/kabatek/coseriu/indexesp.htmhttp://www.uni-tuebingen.de/kabatek/coseriu/indexesp.htm

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Comédias da Vida Privada – Edição Especial para Escolas

Texto 1: O Homem Trocado (p. 77- 78)

O homem acorda da anestesia e olha em volta. Ainda está na sala de recuperação. Há uma enfermeira do seu lado. Ele pergunta se foi tudo bem.

– Tudo perfeito – diz a enfermeira, sorrindo.

– Eu estava com medo desta operação...

– Por quê? Não havia risco nenhum.

– Comigo, sempre há risco. Minha vida tem sido uma série de enganos...

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E conta que os enganos começaram com seu nascimento. Houve uma troca de bebês no berçário e ele foi criado até os dez anos por um casal de orientais, que nunca entenderam o fato de terem um filho claro com olhos redondos. Descoberto o erro, ele fora viver com seus verdadeiros pais. Ou com sua verdadeira mãe, pois o pai abandonara a mulher, desde que esta não soubera explicar o nascimento de um bebê chinês.

– E o meu nome? Outro engano.

– Seu nome não é Lírio?

– Era para ser Lauro. Se enganaram no cartório e...

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[...]

Fora preso por engano. Várias vezes. Recebia intimações para pagar dívidas que não fazia. Até tivera uma breve, louca alegria quando ouvira o médico dizer:

– O senhor está desenganado.

Mas também fora um engano médico. Não era tão grave assim. Uma simples apendicite.

– E se você disse que a operação foi bem...

A enfermeira parou de sorrir

– Apendicite? – perguntou, hesitante.

– É. A operação era para tirar o apêndice.

– Não era para trocar de sexo?

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Texto 2: A Mesa (p. 101- 102)

  Eram cinco. Reuniam-se todos os dias depois

do trabalho para o chope. Há anos faziam a mesma coisa. E cada vez ficavam mais tempo na mesa do bar. Sempre o mesmo bar e sempre a mesma coisa. No começo eram dois, três chopes cada um, no máximo um tira-gosto, depois pra casa, jantar. Todos tinham mulher, família, essas coisas. Mas um dia o Gordo anunciou: “Vou jantar aqui mesmo”. E pediu um filé.

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Os outros, aos poucos, foram aderindo. Era um sacrifício deixar a roda logo quando o papo estava ficando bom. Passaram a jantar no bar também. Depois mais dois, três chopes cada um e para casa, dormir. Até que um dia o Gordo – de novo o pioneiro – bateu na mesa e declarou:

– Pois não vou pra casa.

– Como, não vai pra casa?

– Não vou. Vou passar a noite aqui.

– Mas na hora de fecharem o bar, te botam na rua.

– Quero ver fecharem o bar comigo aqui dentro.

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[...]– E em caso de guerra atômica? – perguntou

um, previdente.– Morremos aqui mesmo.– Combinado!E estão lá até hoje. No mesmo bar e na mesma

mesa, há meses. As mulheres tentam carregá-los para casa, sem sucesso. Os filhos foram implorar, parentes e amigos tentam dissuadi-los. Sem sucesso. Dormem ali mesmo, comem ali mesmo, se precisam de alguma coisa, cigarros ou outra camisa – mandam buscar. O dono do bar não sabe o que fazer. Como os cinco abandonaram seus empregos, provavelmente não terão dinheiro para pagar a conta. Mas é pouco provável que peçam a conta num futuro próximo. O papo está cada vez mais animado.

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Texto 3: A verdade (p. 113- 114)

Uma donzela estava um dia sentada à beira de um riacho deixando a água do riacho passar por entre seus dedos muito brancos, quando sentiu seu anel de diamantes ser levado pelas águas. Temendo o castigo do pai, a donzela contou em casa que fora assaltada por um homem no bosque e que ele arrancara o anel de diamante do seu dedo e a deixara desfalecida sobre um canteiro de margarida. O pai e os irmãos da donzela foram atrás do assaltante e encontraram um homem dormindo no bosque, e o mataram, mas não encontraram o anel de diamante. E a donzela disse:

– Agora me lembro, não era um homem, eram dois.[...]

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O homem contou que estava sentado à beira do riacho, pescando, quando a donzela se aproximou e pediu um beijo. Ele deu o beijo. Depois a donzela tirara a roupa e pedira que ele a possuísse, pois queria saber o que era o amor. Mas como ele era um homem honrado, ele resistira e dissera que a donzela devia ter paciência, pois conheceria o amor do marido no seu leito de núpcias. Então a donzela lhe oferecera o anel, dizendo “Já que meus encantos não o seduzem, este anel comprará o seu amor”. E ele sucumbira, pois era pobre, e a necessidade é o algoz da honra.

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Todos se viraram contra a donzela e gritaram: “Rameira! Impura! Diaba!” e exigiram seu sacrifício. E o próprio pai da donzela passou a forca para o seu pescoço.

Antes de morrer a donzela disse para o pescador:

– A sua mentira era maior que a minha. Eles mataram pela minha mentira e vão matar pela sua. Onde está, afinal, a verdade?

O pescador deu de ombros e disse:

– A verdade é que eu achei o anel na barriga de um peixe. Mas quem acreditaria nisso? O pessoal quer violência e sexo, e não histórias de pescador.

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O humor é uma forma criativa de analisar

criticamente, descobrir e revelar o homem e a vida. É uma forma de desmontar, através da imaginação, um falso equilíbrio anteriormente criado pela própria imaginação. Seu compromisso com o riso está na alegria que ele provoca pela descoberta inesperada da verdade. Não é a verdade que é engraçada. Engraçada é a maneira com que o humor nos faz chegar a ela. O Humor é um caminho.

Ziraldo Alves Pinto (A revista Pererê. Jornal do

Comércio, Rio de Janeiro, 26 out. 1969. Suplemento Dominical, p. 3)