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Apelação Cível n. 2011.006036-1, de Lages Relator: Des. Jaime Ramos CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO FORNECIMENTO DE FRALDAS GERIÁTRICAS – AÇÃO CIVIL PÚBLICA PROPOSTA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO EM DEFESA DE DIREITO INDIVIDUAL INDISPONÍVEL DE IDOSO – EXTINÇÃO DO PROCESSO POR CONSIDERAR MERA EXECUÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER – NULIDADE DA SENTENÇA – JULGAMENTO DO MÉRITO PELO TRIBUNAL – APLICAÇÃO DO ART. 515, § 3º DO CPC – POSSIBILIDADE – LEGITIMIDADE ATIVA – PRELIMINAR AFASTADA DIREITO À SAÚDE – EXEGESE DOS ARTS. 6º E 196, DA CF/88, E 153, DA CE/89 E DA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL – OBRIGAÇÃO DO PODER PÚBLICO DE FORNECER – IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO GENÉRICA – NECESSIDADE DE IDENTIFICAÇÃO DO PACIENTE – AUSÊNCIA DE DOTAÇÃO ORÇAMENTÁRIA – POSSIBILIDADE DE DISPENSA DE LICITAÇÃO DADA A URGÊNCIA (ART. 24 DA LEI N. /93) – OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES ALEGAÇÕES IMPROCEDENTES – CONTRACAUTELA – NECESSIDADE – CUSTAS – ISENÇÃO – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – IMPOSSIBILIDADE. Conforme o art. 515, § 3º, do CPC, há possibilidade de, em segundo grau, enfrentar-se o mérito da demanda, por se tratar de causa madura sujeita a julgamento imediato. Possui legitimidade ativa o Ministério Público para ajuizar ação civil pública em defesa do direito indisponível, ainda que em benefício individual. De fato, “certos direitos individuais homogêneos podem ser classificados como interesses ou direitos coletivos, ou identificar-se com interesses sociais e individuais indisponíveis. Nesses casos, a ação civil pública presta-se à defesa dos mesmos, legitimando o Ministério Público para a causa. C.F., art. 127, caput, e art. 129, III” (STF, RE n. 195.056, Min. Carlos Velloso). Mormente quando o titular do direito é idoso e necessitado que, pode ser representado em Juízo pelo Ministério Público. É inegável que a garantia do tratamento da saúde, que é direito de todos e dever dos entes públicos, pela ação comum da União, dos Estados e dos Municípios, segundo a Constituição, inclui o fornecimento gratuito de meios necessários à preservação

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Apelação Cível n. 2011.006036-1, de LagesRelator: Des. Jaime Ramos

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO –FORNECIMENTO DE FRALDAS GERIÁTRICAS – AÇÃO CIVILPÚBLICA PROPOSTA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO EMDEFESA DE DIREITO INDIVIDUAL INDISPONÍVEL DE IDOSO –EXTINÇÃO DO PROCESSO POR CONSIDERAR MERAEXECUÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER – NULIDADE DASENTENÇA – JULGAMENTO DO MÉRITO PELO TRIBUNAL– APLICAÇÃO DO ART. 515, § 3º DO CPC – POSSIBILIDADE– LEGITIMIDADE ATIVA – PRELIMINAR AFASTADA –DIREITO À SAÚDE – EXEGESE DOS ARTS. 6º E 196, DACF/88, E 153, DA CE/89 E DA LEGISLAÇÃOINFRACONSTITUCIONAL – OBRIGAÇÃO DO PODER PÚBLICODE FORNECER – IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃOGENÉRICA – NECESSIDADE DE IDENTIFICAÇÃO DOPACIENTE – AUSÊNCIA DE DOTAÇÃO ORÇAMENTÁRIA –POSSIBILIDADE DE DISPENSA DE LICITAÇÃO DADA AURGÊNCIA (ART. 24 DA LEI N. /93) – OFENSA AO PRINCÍPIODA SEPARAÇÃO DOS PODERES – ALEGAÇÕESIMPROCEDENTES – CONTRACAUTELA – NECESSIDADE– CUSTAS – ISENÇÃO – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS– IMPOSSIBILIDADE.

Conforme o art. 515, § 3º, do CPC, há possibilidade de, emsegundo grau, enfrentar-se o mérito da demanda, por se tratar decausa madura sujeita a julgamento imediato.

Possui legitimidade ativa o Ministério Público para ajuizaração civil pública em defesa do direito indisponível, ainda que embenefício individual. De fato, “certos direitos individuaishomogêneos podem ser classificados como interesses ou direitoscoletivos, ou identificar-se com interesses sociais e individuaisindisponíveis. Nesses casos, a ação civil pública presta-se àdefesa dos mesmos, legitimando o Ministério Público para acausa. C.F., art. 127, caput, e art. 129, III” (STF, RE n. 195.056,Min. Carlos Velloso). Mormente quando o titular do direito é idosoe necessitado que, pode ser representado em Juízo peloMinistério Público.

É inegável que a garantia do tratamento da saúde, que édireito de todos e dever dos entes públicos, pela ação comum daUnião, dos Estados e dos Municípios, segundo a Constituição,inclui o fornecimento gratuito de meios necessários à preservação

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a saúde a quem não tiver condições de adquiri-los.A concessão genérica e indeterminada de medicamentos,

materiais, equipamentos ou tratamento médicos a todos oscidadãos de determinada região, afasta do Estado o direito deverificar cada situação concreta, o que suprime o direito dedefesa do Poder Público em eventual caso de abuso ou depedido formulado desnecessariamente.

A falta de dotação orçamentária específica não pode servir deobstáculo ao fornecimento de tratamento médico ao doentenecessitado, sobretudo quando a vida é o bem maior a serprotegido pelo Estado, genericamente falando.

Nos termos do artigo 24 da Lei 8.666/93, em caso decomprovada urgência, é possível a dispensa de processo delicitação para a aquisição, pelos entes públicos, de tratamentonecessário à manutenção da saúde de pessoa carente derecursos para adquiri-lo.

Não há como falar em violação ao Princípio da Separaçãodos Poderes, nem em indevida interferência de um Poder nasfunções de outro, se o Judiciário intervém a requerimento dointeressado titular do direito de ação, para obrigar o PoderPúblico a cumprir os seus deveres constitucionais deproporcionar saúde às pessoas, que não foram espontaneamentecumpridos.

O fornecimento de recursos médicos deve ser condicionado àdemonstração, pelo paciente, da permanência da necessidade eda adequação deles, durante todo o curso do tratamento,podendo o Juiz determinar a realização de perícias ou exigir aapresentação periódica de atestados médicos circunstanciados eatualizados.

Com fundamento no art. 128, § 5º, inciso II, alínea "a", daConstituição Federal, não são devidos honorários advocatíciosem favor do Ministério Público quando for vencedor na ação civilpública.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n.

Gabinete Des. Jaime Ramos

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2011.006036-1, da Comarca de Lages (Vara da Fazenda Ac. Trabalho e Reg.Públicos), em que é apelante Estado de Santa Catarina, e apelado Ministério Públicodo Estado de Santa Catarina:

A Quarta Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, darprovimento parcial ao recurso e à remessa oficial, para anular o processo desde asentença, inclusive; e, aplicando o art. 515, § 3º, do CPC, julgar parcialmenteprocedente o pedido inicial. Custas na forma da lei.

Do julgamento realizado em 31.05.2012, presidido por este Relator,participaram os Exmos. Srs. Desembargadores Sônia Maria Schmitz e RodrigoCollaço.

Florianópolis, 31 de maio de 2012.

Jaime RamosRELATOR

Gabinete Des. Jaime Ramos

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RELATÓRIO

Na Comarca de Lages, o Ministério Público Estadual promoveu "AçãoCivil Pública com Obrigação de Fazer cumulada com pedido de liminar" contra oEstado de Santa de Catarina e o Município de Lages sustentando que o pacienteLucas Beckhauser, idoso, necessita de tratamento contínuo com o uso de fraldasgeriátricas descartáveis; que o enfermo não possui condições financeiras de arcarcom o custo sem prejuízo do seu próprio sustento e de sua família; que os pedidosrealizados na via administrativa para o fornecimento dos materiais de higienepleiteados foram indeferidos pelo Poder Público; que ante a presença dos requisitosdeve ser deferida a liminar para que se determine aos réus o fornecimento das fraldasgeriátricas, com a final procedência do pedido com efeitos "erga omnes".

Intimado para apresentar manifestação, o Estado alegou,preliminarmente, a carência de ação, porquanto o Ministério Público é parte ilegítimapara defender o interesse individual homogêneo; que a União deve ser chamada aoprocesso e os autos encaminhados à Justiça Federal; que a obrigação de garantir odireito à saúde está condicionada a políticas sociais e econômicas, o que faz crer quequalquer atuação nesse sentido deva ser de forma global e atender aos planosorçamentários traçados na Constituição Federal; que é necessária a realização deperícia médica.

Em seguida, o MM. Juiz determinou a remessa dos autos à JustiçaFederal para apreciação do pedido de chamamento da União ao processo.

O Juízo Federal reconheceu a ilegitimidade da União para figurar nopolo passivo do feito e determinou o retorno dos autos à Justiça Estadual parajulgamento. Da decisão, o Município interpôs agravo de instrumento perante oTribunal Regional Federal da 4ª Região, o qual foi desprovido.

Com o retorno dos autos ao Juízo Estadual, a MMª. Juíza proferiu aseguinte decisão:

"Proceda-se à conversão do presente procedimento em "Execução deobrigação de fazer", nos termos do art. 632 e ss do CPC, fazendo as devidasalterações no SAJ/PG.

"Determino ao Município de Lages e o Estado de Santa Catarinaforneçam, no prazo de 15 [quinze] dias a contar da intimação, a Lucas Beckauser,com a devida apresentação do receituário médico, fraudas geriatricas descartáveis[120 unidades mensais] de uso contínuo, na medida das necessidades da requerente,conforme art. 461 do CPC, a qual será devida a partir da intimação da presentedecisão."

Após, o Município de Lages apresentou exceção de pré-executividadealegando que é ineficaz o efeito "erga omnes" da decisão, porquanto o título executivoé nulo; que deveria ter sido realizada a produção de prova pericial.

Impugnados os argumentos da exceção de pré-executividade,posteriormente, o Estado de Santa Catarina apresentou contestação repisando ostermos apresentados na manifestação anterior.

Gabinete Des. Jaime Ramos

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Rejeitada a exceção de pré-executividade, a MMª. Juíza proferiu aseguinte sentença:

"Ante o cumprimento da obrigação, julgo extinta a presente Execução deObrigação de Fazer, nos termos do art. 794, I do CPC.

"Oficie-se as Secretarias de Saúde informando que a entrega dosfármacos: fraldas geriatricas descartáveis [120 unidades mensais] tam. G, será naCIMJU - Central Integrada de Medicamentos Judiciais, sob a gestão do ConsórcioIntermunicipal de Saúde, mediante a apresentação de receita médica com validade deno mínimo 01 mês.

"Deixo de condenar os réus ao pagamento de honorários advocatícios,em face da proibição da órgão autor em recebê-los, conforme dispõe o art. 44, I daLei nº 8.625/93 [Lei Orgânica Nacional do Ministério Público].

"Expeça-se Carta de Obrigação de Fornecimento de Medicamentos,conforme dicção da Portaria nº 10-A/2009. Sentença não sujeita ao reexamenecessário, nos termos do § 2º do art. 475 CPC. Isento de custas finais, LeiComplementar Estadual n 156/97."

Inconformado, o Estado de Santa Catarina interpôs recurso de apelaçãoalegando que o Ministério Público é parte ilegítima para propor ação de interesseparticular e individualizado; que a ação civil pública ajuizada em favor de LucasBeckhauser foi convertida em execução de obrigação de fazer com fundamento nelaprópria e, portanto, a sentença deve ser anulada; que a decisão é nula diante docerceamento de defesa, porquanto o Estado não foi intimado da decisão que rejeitouo chamamento ao processo da União; que a obrigação de garantir o direito à saúdeestá condicionada a políticas sociais e econômicas. Por fim, prequestionou artigos.

Apresentadas as contrarrazões pelo Ministério Público do Estado deSanta Catarina, os autos ascenderam a esta Superior Instância, perante a qual, adouta Procuradoria Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Dr. JacsonCorrea, opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso.

VOTO

Cabível destacar, por oportuno, que a sentença está sujeita ao reexameobrigatório, porquanto incorre na hipótese do art. 475, inciso I c/c § 2º, do Código deProcesso Civil, com a redação dada pela Lei n. 10.352/01, pois a condenação/direitocontrovertido, cujo valor não é aferível de plano, dado que a obrigação imposta aoEstado e ao Município de Lages é periódica, pode ultrapassar o valor de 60(sessenta) salários mínimos ao longo do tempo.

O recurso interposto pelo Estado de Santa Catarina e a remessa oficialserão analisados conjuntamente por abrangerem toda a matéria debatida nos autos epor convergirem sobre aspectos comuns.

1. Da nulidade da sentença e do julgamento da causa pelo TribunalTrata-se de recurso de apelação interposto pelo Estado de Santa

Catarina contra a sentença que, nos autos da ação civil pública ajuizada peloMinistério Público, julgou extinto o processo em face do cumprimento da obrigação.

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A MMª. Juíza ao proferir sentença adotou o entendimento do SupremoTribunal Federal exposto no Recurso Extraordinário 393.175, relatado pelo MinistroCelso de Mello, de que o direito à saúde é assegurado constitucionalmente aocidadão. Com este posicionamento, extinguiu o processo sob a seguintefundamentação:

"Na presente execução de sentença de demanda coletiva, já houve asatisfação da obrigação com a entrega do fármaco, portanto, em relação a estesinteressados, a execução deverá ser extinta nos termos do art. 794, I do CPC.

"[...]"Desta forma , como houve a satisfação da obrigação, tem-se como

consequência a extinção da execução."Isto posto,"Ante o cumprimento da obrigação, julgo extinta a presente Execução de

Obrigação de Fazer, nos termos do art. 794, I do CPC." (fls. 108-109).O posicionamento adotado pela Digna Magistrada conflita com o

entendimento deste Tribunal.A MMª. Juíza converteu a presente ação civil pública em execução de

obrigação de fazer sob o fundamento que, "o objeto da presente ação [fornecimentode fraldas geriátricas descartáveis] já teve decisão com eficácia erga omnes [autos n.039.09.003587-7]." (fl. 70).

Por sua vez, o Estado alega que "a ação civil pública ajuizada em favorde Lucas Beckhauser foi convertida em execução de obrigação de fazer comfundamento nela própria! O embasamento para a concessão de efeitos erga omnesao feito utilizou como parâmetro a ação em si, que ainda está tramitando, como sepode facilmente aferir por este recurso de apelação." (fl. 119).

Razão assiste ao Estado.Compulsando os autos, observa-se que a digna Togada Singular utiliza

o processo nr. 039.09.003587-7 como base para fundamentar a conversão do rito napresente ação. Todavia, esse número indicado pela digna Magistrada corresponde àação ora ajuizada.

Muito embora o Ministério Público do Estado de Santa Catarina tenhaapresentado numeração diversa ao que foi exposto pela MMª. Juíza, porquantoindicou às fls. 84 que a ação civil pública capaz de ensejar a conversão da ação emexecução de obrigação de fazer corresponde ao processo n. 039.08.019813-7,observa-se que a ação indicada pelo "parquet" trata-se de ação civil públicapromovida pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina contra o Estado a fimde compelir o ente público a fornecer o medicamento "Rituximab (Mabthera) 750 mgEV" para o enfermo Marcio Irineu Godinho, o que, por sua vez, também nãocorresponde à matéria ora debatida nos autos.

Diante dos inúmeros equívocos cometidos nos autos acerca daindicação da numeração de processos, necessário esclarecer que a ação em que sepoderia eventualmente fundamentar a conversão do rito efetuada pela digna TogadaSingular corresponde aos autos n. 039.08007218-4, que trata de Ação Civil Públicaem que o Ministério Público pleiteia a condenação do Estado e do Município de Lages

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ao fornecimento de fraldas geriátricas e diversos pacientes idosos, bem como requera atribuição de eficácia "erga omnes". O detalhe é que tal processo ainda está emfase recursal, daí porque não transitou em julgado a decisão proferida naquelesautos.

Assim, a conversão da ação civil pública em execução de obrigação defazer, com base na decisão de eficácia "erga omnes" do processo 039.09.003587-7determinada pela MMª. Juíza, contraria os ditames do Código de Processo Civil.

No presente caso, não se verifica a existência de título executivo capazde ensejar a conversão do rito originário da presente ação civil pública, porquanto nãohá sentença transitada em julgado com efeito "erga omnes" a tratar da matériadebatida nos autos (fornecimento de fraldas geriátricas).

Dessa forma, necessário se torna a anulação da sentença tendo emvista a necessidade primordial de análise do mérito na presente ação civil pública,pois somente a decisão pode verificar a viabilidade da concessão ou não de fraldasgeriátricas ao enfermo Lucas Beckhauser, com o julgamento de procedência ouimprocedência da ação.

Nesse sentido a jurisprudência deste Tribunal:"AÇÃO CIVIL PÚBLICA. FORNECIMENTO DE FRALDAS

GERIÁTRICAS DESCARTÁVEIS. MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE ATIVAINCONTESTE. CHAMAMENTO DA UNIÃO AO PROCESSO. MATÉRIAINOPORTUNA PARA EXAME NESTA FASE PROCESSUAL. SENTENÇA QUEOUTORGA EFEITO ERGA OMNES EM RAZÃO DE JULGADO DA SUPREMACORTE, DETERMINA A CONVERSÃO DO RITO ORDINÁRIO PARA EXECUÇÃODE OBRIGAÇÃO DE FAZER E EXTINGUE O FEITO POR SATISFATIVIDADE DAMEDIDA LIMINAR. DESCABIMENTO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO PARAANULAR O PROCESSO DESDE A SENTENÇA. CAUSA "MADURA". JULGAMENTODE MÉRITO, POR ESTA CORTE, NOS TERMOS DO ART. 515, § 3º, DO CÓDIGODE PROCESSO CIVIL. IDOSO VITIMADO POR ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL(AVC). HEMIPLEGIA E INCONTINÊNCIA URINÁRIA. PROVA INSOFISMÁVEL DANECESSIDADE DO MATERIAL VINDICADO (FRALDA DESCARTÁVEL).PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.

"I. "Possui legitimidade ativa o Ministério Público para ajuizar ação civilpública em defesa de direito indisponível, ainda que em benefício individual"(Apelação Cível n. 2008.023041-8, rel. Des. Jaime Ramos).

"II. "O julgado utilizado para fundamentar a decisão proferida emprimeiro grau não constitui título executivo judicial a todo o cidadão que pretendersocorrer-se da Justiça para obter medicamentos necessário à sua saúde. Se assimfosse, estar-se-ia cerceando o próprio direito de defesa do Estado, uma vez que cadacaso tem sua particularidade, que depende da produção de provas específicas eanálise de questões exclusivamente de fato, propiciando, em consequência,entendimentos diferenciados" (Apelação Cível n. 2010.084634-2, rel. Des. RicardoRoesler). Logo, "[...] os efeitos do 'decisum' em questão não podem ser direcionados,de maneira genérica, a todos os cidadãos que demonstrarem necessitar dos fármacospleiteados, pois como os seres humanos são diferentes entre si, não é difícil presumir

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as peculiaridades de cada caso, bem como a reação singular que cada um possa ter,em relação à doença e aos fármacos objeto da pretensão inicial" (Apelação Cível n.2008.017563-1, rel. Des. José Volpato de Souza).

"III. A admissibilidade, em feito alusivo ao fornecimento de fármaco, dochamamento da União ao processo, é matéria pacificada nesta Corte (Súmula 23),todavia, na fase recursal já não mais se justifica a adoção dessa modalidade deintervenção de terceiro, porque implicaria em procrastinação, quando, como éconsabido, o seu escopo é o de agilizar a prestação jurisdicional. (TJSC – AC. n.2011.009025-4, de Lages, Rel. Des. João Henrique Blasi, j. em 28.06.2011).

Diante do exposto, evidenciada está a nulidade da decisão monocráticaproferida no processo no tocante à conversão da ação civil pública em execução deobrigação de fazer, bem como à extinção do processo pelo cumprimento daobrigação.

Analisada essa questão preliminar, frise-se que o processo foiregularmente instruído e, diante dessa circunstância, encontrando-se madura acausa, plenamente hábil para julgamento, impõe-se a aplicação do artigo 515, § 3º doCódigo de Processo Civil, pelo que se passa ao exame do mérito.

A esse respeito, CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO leciona:"[...] o julgamento de meritis que o tribunal fizer nessa oportunidade

será o mesmo que faria se houvesse mandado o processo de volta ao primeiro grau,lá ele recebesse sentença, o autor apelasse contra esta e ele, tribunal, afinal voltassea julgar o mérito. A novidade apresentada pelo § 3º do art. 515 do Código deProcesso Civil nada mais é do que um atalho, legitimado pela aptidão a acelerar osresultados do processo e desejável sempre que isso for feito sem prejuízo a qualquerdas partes; ela constitui mais um lance da luta do legislador contra os males do tempoe representa a ruptura de um velho dogma, o do duplo grau de jurisdição, que por suavez só se legitima quando for capaz de trazer benefícios, não demorasdesnecessárias." (DINAMARCO, Cândido Rangel. Nova era do processo civil. 1ª ed.São Paulo: Malheiros editores, 2004. p. 171).

Por tais fundamentos, e desconstituída a sentença, passa-se à análisedos demais pontos, com amparo no art. 515, § 3º, do CPC, já que o feito encontra-seem condições de imediato julgamento.

2. Das preliminares2.1 O Estado de Santa Catarina arguiu, preliminarmente, a ilegitimidade

ativa do Ministério Público para defender em juízo direitos e interesses individuais pormeio de ação civil pública.

É verdade que o artigo 129, inciso III, da Constituição Federal nãoexplicitou a legitimidade do Ministério Público para defesa de interesses individuaisindisponíveis, quando o autorizou a “promover o inquérito civil e a ação civil pública,para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outrosinteresses difusos e coletivos”.

Contudo, o art. 127 da CF/88 é claro ao dizer que “o Ministério Público éinstituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe adefesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e

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individuais indisponíveis”.Assim, as disposições dos artigos 127 e 129 da CF/88 se

compatibilizam, uma vez que as normas constitucionais devem ser aplicadas damaneira que se lhes atribuam a maior efetividade possível e em concordância práticaentre elas, ou seja, uma não deve suprimir a outra.

Destarte, cabe ao Ministério Público a tutela dos direitos individuaisindisponíveis, pois passaram a integrar, implicitamente, o rol do art. 129 daConstituição Federal.

É certo que a Lei n. 7.347/85, que regula o procedimento da Ação CivilPública também nada menciona sobre essa atribuição, "in verbis":

“Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da açãopopular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados:

“l - ao meio-ambiente;“ll - ao consumidor;"III - à ordem urbanística;“IV - a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e

paisagístico;“V - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo.“VI - por infração da ordem econômica.”Porém, a Lei Orgânica do Ministério Público, Lei n. 8.625/93, portanto

mais recente que o diploma supra referido, encontra-se em perfeita sintonia com aordem constitucional que recepcionou a Lei da Ação Civil Pública, ao consagrar que:

“Art. 25. Além das funções previstas nas Constituições Federal eEstadual, na Lei Orgânica e em outras leis, incumbe, ainda, ao Ministério Público:

“[...]“IV - promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei:“a) para a proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao

meio ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico, estético,histórico, turístico e paisagístico, e a outros interesses difusos, coletivos e individuaisindisponíveis e homogêneos;”.

Desta feita, a Lei n. 7.347/85 também foi implicitamente complementadapela Lei Orgânica do Ministério Público, que alargou as hipóteses do Órgão Ministerialpara deflagrar a Ação Civil Pública.

Nesse mesmo norte, outras leis já foram editadas preconizando essanova legitimidade conferida ao Ministério Público, como por exemplo as Leis n.8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente) e 10.741/03 (Estatuto do Idoso).

Prevê o Estatuto da Criança e do Adolescente, nos arts. 201, incisos V eVIII, 208, V e VII e 210, I:

“Art. 201. Compete ao Ministério Público:“(...)“V – promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção dos

interesses individuais, difusos ou coletivos relativos à infância e à adolescência,inclusive os definidos no art. 220, § 3º, inciso II, da Constituição Federal.

“(...)

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“VIII – zelar pelo efetivo respeito aos direitos e garantias legaisassegurados às crianças e adolescentes, promovendo as medidas judiciais eextrajudiciais cabíveis;

“(...)“Art. 208. Regem-se pelas disposições desta Lei as ações de

responsabilidade por ofensa aos direitos assegurados à criança e ao adolescente,referentes ao não-oferecimento ou oferta irregular:

“V – de programas suplementares de oferta de material didático-escolar,transporte e assistência à saúde do educando do ensino fundamental;

“(...)“VII – de acesso às ações e serviços de saúde;“(...).“Art. 210. Para as ações cíveis fundadas em interesses coletivos ou

difusos, consideram-se legitimados concorrentemente:“I – o Ministério Público;“(...)".Por sua vez, o Estatuto do Idoso, nos arts. 81 e 82:“Art. 81. Para as ações cíveis fundadas em interesses difusos, coletivos,

individuais indisponíveis ou homogêneos, consideram-se legitimados,concorrentemente:

“I – o Ministério Público;“[...] Art. 82. Para defesa dos interesses e direitos protegidos por esta

Lei, são admissíveis todas as espécies de ação pertinentes.”Portanto, a Lei sinaliza de forma muito evidente que o Ministério Público

é legitimado na defesa de interesses individuais indisponíveis, especialmente os decrianças, adolescentes e idosos, sendo nesse sentido, inclusive, o entendimentosedimentado na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

“RECURSO ESPECIAL – PROCESSO CIVIL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA –FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO – CRIANÇA QUE PADECE DE NEFROPATIADO REFLUXO – DIREITO À VIDA E À SAÚDE – DIREITO INDIVIDUALINDISPONÍVEL – LEGITIMAÇÃO EXTRAORDINÁRIA DO PARQUET – ART. 127 DACF/88 – PRECEDENTES DA PRIMEIRA TURMA.

“O tema objeto do presente recurso já foi enfrentado pela colendaPrimeira Turma deste Tribunal e o entendimento esposado é de que o MinistérioPúblico tem legitimidade para defesa dos direitos individuais indisponíveis, mesmoquando a ação vise à tutela de pessoa individualmente considerada (art. 127, CF/88).

“Nessa esteira de entendimento, na hipótese dos autos, em que a açãovisa a garantir o fornecimento de medicamento necessário e de forma contínua acriança para o tratamento de nefropatia do refluxo, há de ser reconhecida alegitimação do Ministério Público, a fim de garantir a tutela dos direitos individuaisindisponíveis à saúde e à vida.

“Recurso especial provido, para reconhecer a legitimidade do MinistérioPúblico, determinando-se que a ação prossiga para, após instrução regular, ser omérito julgado.” (STJ, REsp n. 688.052/RS, Rel. Min. Humberto Martins, j. em

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03.09.2006).E desta Corte de Justiça:“AGRAVO (art. 557, § 1º, do CPC) EM AGRAVO DE INSTRUMENTO –

DECISÃO IMPUGNADA EM DISSONÂNCIA COM JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE– ACOLHIMENTO DE ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM – EXTINÇÃO DO FEITOSEM JULGAMENTO DO MÉRITO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – DIREITO INDIVIDUALINDISPONÍVEL – ART. 127 DA CF – LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO –MEDICAMENTO – FORNECIMENTO – OBRIGAÇÃO DO ESTADO – DECISÃOREFORMADA – RECURSO PROVIDO.

“[...] Ante a inércia do Estado, o Ministério Público tem legitimidade ativapara desencadear ação civil pública com a finalidade de resguardar direito à vida e àsaúde, mesmo que se trate de pessoa identificada, a teor do art. 127 da ConstituiçãoFederal.” (TJSC, Agravo em Agravo de Instrumento n. 2005.041707-3/0001.00 [art.557, § 1º, do CPC], de Lages, Relatora Des. Marli Mosimann Vargas, j. em20.04.2006).

“AÇÃO CIVIL PÚBLICA – DIREITO INDIVIDUAL INDISPONÍVEL – VIDAE SAÚDE – CF, ART. 127 – LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO –MEDICAMENTO DE ALTO CUSTO – FORNECIMENTO – OBRIGAÇÃO DOMUNICÍPIO.

“1. O Ministério Público tem legitimidade ativa para desencadear açãocivil pública com a finalidade de resguardar direito à vida e à saúde, mesmo que afetoa uma ou mais pessoas identificadas. Pleito dessa magnitude tem inegável reflexosocial e deve se sobrepor às questões meramente processuais.” (TJSC, AC n.2005.031544-9, de Blumenau, Relator Des. Luiz Cézar Medeiros, j. em 18.04.2006).

Desse modo, o Ministério Público pode utilizar-se da Ação Civil Públicana defesa de interesses individuais indisponíveis, desde que estes estejam vinculadosà tutela de algum interesse transcendental de toda a sociedade, sendo no caso dosautos o acesso à saúde e a proteção do direito à vida, especialmente de pessoascarentes, crianças, adolescentes e idosos.

Vale a pena transcrever como razão de decidir, ainda, substanciosotrecho do voto exarado pelo Desembargador Luiz Cézar Medeiros na Apelação Cíveln. 2004.032505-2, de Curitibanos, que em ação civil pública ajuizada pelo MinistérioPúblico tratou da questão:

“1. Da legitimidade ativa do Ministério Público.“A pretensão do apelado, mesmo se restringindo a um grupo de

pessoas, assume outra proporção em face da extrema relevância do direito pleiteado.“A prerrogativa de todos ao exercício integral do direito à vida é garantia

constitucional e essencial ao Estado Democrático de Direito. ‘Portanto, na defesa dedireitos individuais, ainda que homogêneos, têm o Ministério Público legitimidadeativa, quando se tratar de direitos, de tal ordem, de tal relevância, que integrem opatrimônio social’ (MILARÉ. Édis. Ação Civil Pública. São Paulo: Revista dosTribunais, 2002. p. 533).

“O citado autor, em outra obra, assinala que ‘a ação civil pública objetivasempre a tutela do interesse público, entendido, aqui, como aquele pertinente aos

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valores transcendentais de toda a sociedade, e não do Estado, enquanto estruturapolítico-administrativa’ (MILARÉ. Édis. A Ação Civil Pública na Nova OrdemConstitucional. São Paulo: Saraiva, 1990. p. 9-10).

“Prossegue citando Renato Alessi, que divide o conceito de interessepúblico em primário e secundário. Dentro do grupo dos interesses primários, que édescrito como ‘a afirmação daquilo que é básico, fundamental, persistente,permanente, superior, indispensável na ordem jurídica’, estão presentes os interessesindividuais indisponíveis, ao lado dos interesses coletivos, difusos e gerais.

“Retira-se da doutrina de José Luiz Quadros de Magalhães o excertoabaixo transcrito:

“‘O mesmo raciocínio desenvolvido pode ser utilizado com relação aodireito à vida, como um direito individual que, para se concretizar, depende dosdireitos sociais à saúde, ao lazer, ao trabalho, amparados por uma política econômicaque possibilite trabalho remunerado de forma justa, saúde gratuita e lazer a todos.

“‘Acreditamos, no entanto, que o direito à vida vai além da simplesexistência física. Acreditamos que no direito à vida se expressa a síntese dos gruposde direitos que formam os Direitos Humanos. Todos os direitos existem em funçãodeste, sendo que o exercício dos direitos Individuais, o oferecimento dos direitossociais, a política econômica e os institutos de Direito Econômico, e a própriademocracia, existem no sentido de oferecimento de dignidade à vida da pessoahumana. O direito à vida que se busca através dos Direitos Humanos é a vida comdignidade, e não apenas sobrevivência. Por esse motivo, o direito à vida se projeta deum plano individual para ganhar a dimensão maior de direito síntese dos grupos dedireitos individuais, sociais, econômicos e Políticos, sendo, portanto, a própria razãode ser dos Direitos Humanos’ (Direito Constitucional. Belo Horizonte: LivrariaMandamentos, 2000. t. 1. p. 189).

“A defesa do direito à vida, sem qualquer óbice ou limitação, está nocerne dos demais direitos e garantias fundamentais, porquanto a proteção conferidapelo Estado à integridade física e moral de seus cidadãos, ainda que concretizada emum caso individual e específico, apresenta reflexo em toda a coletividade. Ainviolabilidade da vida não se trata de um direito meramente individual, mas deexigência para que o Estado cumpra uma de suas funções constitucionais, qual seja,a dignidade da pessoa humana (CF, art. 1, inc. III), devendo o Ente Público trabalharpermanentemente para a consecução deste fim.

“O tema adquire relevância ainda maior no caso em tela: H. K. S. éportador de tumor prostático, o que pode ocasionar seu óbito. Não podendo ele, oEstado ou o Município dispor do direito à vida, deve o Poder Público assumir acontinuidade do tratamento.

“Destarte, presentes as prerrogativas institucionais do Ministério Públicoque autorizam e determinam a defesa dos interesses sociais e individuaisindisponíveis (CF, art. 127), já que se tratam de pessoas economicamentehipossuficientes e que têm sua integridade física ameaçada, está legitimado o parquetà execução de medidas concretas para efetivação desse direito. Assim, não poderiaessa nobre Instituição manter-se alheia ao mal sofrido pelos enfermos, já que estes

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poderiam morrer pela inércia do Estado ou do Município e, sendo pessoas humildes,provavelmente desconhecem seus direitos.

“Acerca do tema, leciona Rodolfo de Camargo Mancuso:“‘No ponto, escreve Luíza Cristina Fonseca Frischeisen: 'Nesse sentido,

a margem de discricionariedade da administração no cumprimento da ordemconstitucional social é bastante limitada, o que ocasiona a possibilidade de maiorjudicialização dos conflitos, pois que as políticas públicas podem ser questionadasjudicialmente'. Isso implica, prossegue, em que a atuação do MP 'não é somente deatuar para corrigir os atos comissivos da administração que porventura desrespeitemos direitos constitucionais do cidadão, mas também deve atuar na correção dos atoomissivos, ou seja, para a implantação efetiva de políticas públicas visando aefetividade da ordem social prevista na Constituição Federal de 1988’.

“Mais adiante complementa:“"Cremos que o ponto de equilíbrio nessa controvérsia depende de que

seja devidamente valorizado o disposto no caput do art. 127 da CF, onde se diz queao Parquet compete a defesa dos 'interesses sociais e individuais indisponíveis'. Ouseja, quando for individual o interesse, ele há de vir qualificado pela nota daindisponibilidade, vale dizer, da prevalência do caráter de ordem pública em face dobem de vida direto e imediato perseguido pelo interessado’ (MANCUSO, Rodolfo deCamargo. Ação Civil Pública: em Defesa do Meio Ambiente, do Patrimônio Cultural edos Consumidores. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 41-42,118).

“No mesmo sentido, os precedentes do Superior Tribunal de Justiça:“‘RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITOS

INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. LEGITIMIDADE.“‘1. Consoante entendimento preconizado por esta Corte, o Ministério

Público tem legitimidade para propor ação civil pública, com vistas à defesa da ordemjurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, naespécie a proteção do direito ao salário-mínimo dos servidores municipais.Precedentes.

‘‘2. Recurso conhecido e provido’ (REsp n. 296905, Min. FernandoGonçalves).

“‘PROCESSUAL CIVIL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – LEGITIMIDADE –MINISTÉRIO PÚBLICO – DIREITOS INDIVIDUAIS – AQUISIÇÃO DE LOTES –FINANCIAMENTO PERANTE A COHAB – LD. O direito individual há que serindisponível, a fim de dar ensejo à sua defesa pela via da ação civil pública’ (REsp n.171283, José Delgado).

“E do Supremo Tribunal Federal, colhe-se o seguinte excerto:“‘[...] II. - Certos direitos individuais homogêneos podem ser classificados

como interesses ou direitos coletivos, ou identificar-se com interesses sociais eindividuais indisponíveis. Nesses casos, a ação civil pública presta-se a defesa dosmesmos, legitimado o Ministério Público para a causa. C.F., art. 127, caput, e art. 129,III. III. [...]’ (RE n. 195.056, Min. Carlos Velloso).

“Nesse caso, face à imperatividade do direito à vida, percebida em seureflexo social, e sua superioridade em contraste a questões meramente processuais,

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deve-se aceitar o procedimento adotado pelo parquet como adequado a alcançar opleito pretendido, pois ‘o que interessa ao direito processual de hoje é uma resoluçãojusta e imparcial; a utilização das normas de procedimento não deve ser um obstáculono caminho da pronta realização do verdadeiro direito (in Derecho Processual Civil,1950, p. 21)’, (AI n. 96.005930-0, Des. Pedro Manoel Abreu)”.

Portanto, é afastada a preliminar de ilegitimidade ativa do MinistérioPúblico.

2.2 Arguiu o apelante a existência de cerceamento de defesa expondoque não foi intimado da decisão proferida pelo Juízo Federal que rejeitou a preliminarde chamamento ao processo e determinou o retorno dos autos à Justiça Estadual.Postulou, a anulação da sentença com o retorno dos autos à Justiça Federal a partirdo momento em que deveria ter sido cientificado da rejeição da preliminar apontada.

Afasta-se a argumentação recursal.Inicialmente convém esclarecer que o Estado de Santa Catarina foi

devidamente intimado da decisão proferida pelo Juízo Federal (documento de fl. 60)e, portanto, não merece guarida a argumentação do ente público.

Ademais, de outro norte, observa-se que a decisão de fls. 53/55, queversa sobre a inexistência de interesse da União no feito, foi proferida pelo JuízoFederal, o que tornou a Justiça Estadual incompetente para analisar eventualirresignação das partes quanto à decisão proferida pela Justiça Federal.

Portanto, se o Estado sentiu-se lesado por não ter sido intimado daqueladecisão, a insurgência deveria ser encaminhada ao juízo competente para analisar aquestão, que, no caso, corresponde à Justiça Federal, nada impedindo que a parteinterpusesse o recurso adequado perante o Tribunal Regional Federal competente,dentro do prazo legal contado da data em que tomou conhecimento, pela primeiravez, da decisão que pretende impugnar.

Sobre a questão, este egrégio Tribunal de Justiça já se manifestou:"Destaca-se que a argumentação de cerceamento de defesa não pode

prosperar, uma vez que o inconformismo do Estado de Santa Catarina não comportaanálise na justiça estadual, tendo em vista que a decisão que determinou o retornodos autos à esfera comum foi proferida pelo Juízo, devendo qualquer insurgência serdirecionada ao Tribunal competente" (TJSC - AC n. 2010.067783-3, Rel. Des. JoséVolpato de Souza, julgado em 17/12/2010).

Não obstante, é importante salientar que da decisão da Justiça Federalque rejeitou o chamamento da União ao processo o próprio Estado de Santa Catarinainterpôs recurso de agravo de instrumento, ao qual foi negado provimento peloegrégio Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Não fora isso, a rejeição do chamamento da União ao processoencontra-se pacificada neste Tribunal.

O Grupo de Câmaras de Direito Público acolhia o chamamento da Uniãoao processo e deslocava a competência para a Justiça Federal, cujo entendimentodeu origem à Súmula n. 23 deste Tribunal. Entretanto, na sessão de 09.11.2011, oGrupo de Câmaras de Direito Público, à unanimidade dos presentes, revogou aSúmula n. 23, por proposta deste Relator, no Agravo de Instrumento n.

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2011.043760-3.Ademais, o Supremo Tribunal Federal, em 31 de maio de 2011, no

julgamento do Recurso Extraordinário 607381, relatado pelo Ministro Luiz Fux,entendeu como medida protelatória o chamamento da União ao processo, cujoacórdão restou assim ementado:

"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO.CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. DIREITO À SAÚDE (ART. 196, CF).FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. SOLIDARIEDADE PASSIVA ENTRE OSENTES FEDERATIVOS. CHAMAMENTO AO PROCESSO. DESLOCAMENTO DOFEITO PARA JUSTIÇA FEDERAL. MEDIDA PROTELATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE.1. O artigo 196 da CF impõe o dever estatal de implementação das políticas públicas,no sentido de conferir efetividade ao acesso da população à redução dos riscos dedoenças e às medidas necessárias para proteção e recuperação dos cidadãos. 2. OEstado deve criar meios para prover serviços médico-hospitalares e fornecimento demedicamentos, além da implementação de políticas públicas preventivas, mercê deos entes federativos garantirem recursos em seus orçamentos para implementaçãodas mesmas. (arts. 23, II, e 198, § 1º, da CF). 3. O recebimento de medicamentospelo Estado é direito fundamental, podendo o requerente pleiteá-los de qualquer umdos entes federativos, desde que demonstrada sua necessidade e a impossibilidadede custeá-los com recursos próprios. Isto por que, uma vez satisfeitos tais requisitos,o ente federativo deve se pautar no espírito de solidariedade para conferir efetividadeao direito garantido pela Constituição, e não criar entraves jurídicos para postergar adevida prestação jurisdicional. 4. In casu, o chamamento ao processo da União peloEstado de Santa Catarina revela-se medida meramente protelatória que não traznenhuma utilidade ao processo, além de atrasar a resolução do feito, revelando-semeio inconstitucional para evitar o acesso aos remédios necessários para orestabelecimento da saúde da recorrida. 5. Agravo regimental no recursoextraordinário desprovido. (STF, RE 607381, Ag. Reg. no Recurso Extraordinário, SC– Santa Catarina - Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 31.05.2011).

Assim, pelos fundamentos apresentados, afasta-se a preliminarapresentada.

3. Do mérito3.1 Primeiramente, esclareça-se que o Poder Judiciário pode interferir

em tarefa típica do Poder Executivo, no caso dos autos, haja vista a destinação derecursos para tratamento médico.

Não está havendo uma interferência do Poder Judiciário na competênciado Poder Executivo. O que faz o poder jurisdicional, no uso de suas prerrogativasconstitucionais e legais, é aplicar a lei a um caso concreto.

Efetivamente, o Município e o Estado têm o dever solidário deproporcionar saúde a todos os indivíduos, segundo o disposto em normasautoaplicáveis das Constituições Federal e Estadual. Mas não cumpre essaobrigação. Cabe ao interessado, titular do direito de ação tambémconstitucionalmente resguardado (art. 5º, inciso XXXV, da CF/88: "a lei não excluiráda apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito"), segundo o Princípio

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Dispositivo, pleitear em Juízo que se obrigue o ente público a cumprir suasobrigações. O Poder Judiciário, cujos agentes têm a função de exercer a funçãojurisdicional, não pode furtar-se de determinar a atuação do Direito no caso concreto.

Além de não haver indevida interferência do Poder Judiciário nasfunções do Poder Executivo, também não se pode falar em violação do Princípio daSeparação dos Poderes adotado no art. 2º da Constituição Federal. Não se exerceumais do que a função do Poder Judiciário.

3.2. A Constituição Federal, em seu art. 6º, dispõe ser a saúde direitosocial de todo e qualquer cidadão brasileiro, sem distinção de cor, sexo, raça, religião,classe social etc., dispondo incisivamente no art. 196 do mesmo diploma, reproduzidopela Carta Magna Estadual em seu art. 153, que:

"A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediantepolíticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outrosagravos e ao acesso universal e igualitário e às ações e serviços para sua promoção,proteção e recuperação".

A legislação infraconstitucional (Lei n. 8.080/90, que trata do SistemaÚnico de Saúde) prevê a obrigação solidária de todos os entes da federação (União,Estados, Distrito Federal e Municípios), de proporcionar saúde aos enfermos,fornecendo-lhe o medicamento e tratamento de que necessitam para minimizar osefeitos de sua moléstia.

O direito à saúde, ao contrário do que tem sustentado o Poder Público,não está amparado apenas em meras normas programáticas, mas sim em normasconstitucionais que podem, devem e têm aplicação imediata.

Em precedente da Primeira Turma Superior Tribunal de Justiça, da lavrado eminente Ministro José Delgado, no ROMS n. 11183/PR, foi decidido em22.08.2000, com muita propriedade (DJU de 04.09.2000, p. 121, RSTJ 138/52):

"CONSTITUCIONAL. RECURSO ORDINÁRIO. MANDADO DESEGURANÇA OBJETIVANDO O FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO(RILUZOL/RILUTEK) POR ENTE PÚBLICO À PESSOA PORTADORA DE DOENÇAGRAVE: ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA – ELA. PROTEÇÃO DE DIREITOSFUNDAMENTAIS. DIREITO À VIDA (ART. 5º, CAPUT, CF/88) E DIREITO À SAÚDE(ARTS. 6º E 196, CF/88). ILEGALIDADE DA AUTORIDADE COATORA NAEXIGÊNCIA DE CUMPRIMENTO DE FORMALIDADE BUROCRÁTICA.

"1 – A existência, a validade, a eficácia e a efetividade da Democraciaestá na prática dos atos administrativos do Estado voltados para o homem. A eventualausência de cumprimento de uma formalidade burocrática exigida não pode ser óbicesuficiente para impedir a concessão da medida porque não retira, de forma alguma, agravidade e a urgência da situação da recorrente: a busca para garantia do maior detodos os bens, que é a própria vida.

"2 – É dever do Estado assegurar a todos os cidadãos, indistintamente,o direito à saúde, que é fundamental e está consagrado na Constituição da Repúblicanos artigos 6º e 196.

"3 – Diante da negativa/omissão do Estado em prestar atendimento àpopulação carente, que não possui meios para a compra de medicamentos

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necessários à sua sobrevivência, a jurisprudência vem se fortalecendo no sentido deemitir preceitos pelos quais os necessitados podem alcançar o benefício almejado(STF, AG nº 238.328/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 11/05/99; STJ, REsp nº249.026/PR, Rel. Min. José Delgado, DJ 26/06/2000).

"4 - Despiciente de quaisquer comentários a discussão a respeito de serou não a regra dos arts. 6º e 196, da CF/88, normas programáticas ou de eficáciaimediata. Nenhuma regra hermenêutica pode sobrepor-se ao princípio maiorestabelecido, em 1988, na Constituição Brasileira, de que 'a saúde é direito de todose dever do Estado' (art. 196).

"5 – Tendo em vista as particularidades do caso concreto, faz-seimprescindível interpretar a lei de forma mais humana, teleológica, em que princípiosde ordem ético-jurídica conduzam ao único desfecho justo: decidir pela preservaçãoda vida.

"6 – Não se pode apegar, de forma rígida, à letra fria da lei, e sim,considerá-la com temperamentos, tendo-se em vista a intenção do legislador,mormente perante preceitos maiores insculpidos na Carta Magna garantidores dodireito à saúde, à vida e à dignidade humana, devendo-se ressaltar o atendimento dasnecessidades básicas dos cidadãos.

"7 – Recurso ordinário provido para o fim de compelir o ente público(Estado do Paraná) a fornecer o medicamento Riluzol (Rilutek) indicado para otratamento da enfermidade da recorrente."

Este Tribunal de Justiça tem decidido reiteradamente:"MANDADO DE SEGURANÇA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO

NÃO PADRONIZADO. SÍNDROME DE HIPERCOAGUBILIDADE SECUNDÁRIA ÀSÍNDROME ANTIFOSFOLEPÍDEO. ORDEM CONCEDIDA.

"A saúde, conforme o disposto no art. 196 da Constituição Federal,repetido pelo art. 153 da Constituição Estadual, é direito de todos e dever do Estado,garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco dedoença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviçospara sua promoção, proteção e recuperação. A respeito deste preceito, a melhororientação doutrinária é aquela que, a partir do século XX, considera que as normaspertinentes à saúde, por ser ela o mais típico dos direitos sociais, têm aplicabilidadeimediata, independendo de norma regulamentadora (Apelação cível n.2003.011879-9, Rel. Des. Luiz Cézar Medeiros)" (MS n. 2003.011289-8, da Capital.Relator Des. Cesar Abreu).

Então o Poder Público tem a obrigação de fornecer o tratamento médicoadequado às pessoas que deles necessitam, sobretudo porque as normas insertasnos arts. 196 da Constituição Federal e 153 da Constituição Estadual não sãomeramente programáticas, vale dizer, possuem eficácia e aplicação imediatas.

3.3 A prova acostada demonstra que o paciente idoso LucasBeckhauser é portador de doença grave, porquanto sofreu Acidente VascularCerebral e, por esse motivo, necessita de utilização de fraldas geriátricas paramelhorar suas condições de higiene e evitar problema de saúde, conforme atestadopor especialista.

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Ao responder aos questionamentos formulados pelo Ministério Públicodo Estado de Santa Catarina, a médica especialista, Dra. Camila Duarte Froehnerinformou que, "em virtude de sua idade avançada, das precárias condições de saúdee da impossibilidade total de locomoção, o paciente necessita usar fraldasdescartáveis para manter o mínimo de asseio e higiene, lembrando que um possívelquadro infeccioso advindo de más condições de higiene exporia o paciente a piora deseu quadro clínico, ressaltando que uma possível infecção de trato geniturináriopoderia acarretar complicações renais que certamente seriam fatais nas atuaiscondições do paciente." (fl. 34). E a especialista arremata dizendo que, "a falta de usodas fraldas descartáveis poderá ocasionar um agravamento do quadro clínico, devidoao fato da impossibilidade de comunicação, perda do controle esfincteriano eimpossibilidade de locomoção, torna-se indispensável o uso das mesmas para o bemestar do paciente." (fl. 34).

Portanto, está comprovada a necessidade de utilização das fraldasgeriátricas pelo paciente idoso.

Ademais, a renda mensal do paciente é insuficiente para adquirir otratamento necessário à manutenção da saúde sem prejuízo do seu próprio sustentoe de sua família.

Não há dúvida de que o atendimento à saúde, direito social de todos eobrigação solidária do Estado (União, Estados-membros, Distrito Federal eMunicípios), deverá ser prestado indistintamente àqueles que dele necessitarem, umavez que a Constituição Federal, em seu art. 6º, dispõe ser a saúde direito social detodo e qualquer cidadão brasileiro, sem distinção de cor, sexo, raça, religião, classesocial etc., dispondo incisivamente no art. 196 do mesmo diploma, reproduzido pelaCarta Magna Estadual em seu art. 153, que: "A saúde é direito de todos e dever doEstado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução dorisco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário e às ações eserviços para sua promoção, proteção e recuperação". Contudo, sabe-se que dianteda limitação financeira/orçamentária do Poder Público deve ser priorizado oatendimento à saúde daqueles pacientes comprovadamente carentes(hipossuficientes) e/ou crianças, adolescentes e idosos.

O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ajuizou a ação paraver concretizado o direito à saúde do paciente de receber as fraldas geriátricasnecessárias ao tratamento e à higiene pessoal, bem como buscar o cumprimento dodever do Estado e do Município de fornecê-las, independentemente de estar ou não omaterial padronizado pelos protocolos e programas do Poder Público.

3.4 Não prosperam as alegações sempre correntes de que não havendofonte de custeio para o fornecimento do tratamento médico pleiteado, não há como oPoder Público conceder tal benefício, em decorrência no disposto no § 5º do art. 195da Constituição Federal, sendo que a despesa pública deve estar adstrita aos ditamesda lei orçamentária (artigos 165 e 167 da CF).

Isso porque não se pode falar em ausência de previsão orçamentária efonte de custeio para arcar com as despesas relativas ao fornecimento do tratamentomédico pretendido ou ainda prejuízo do orçamento público em detrimento de

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interesses particularizados, mormente porque “o Judiciário não desconhece origorismo da Constituição ao vedar a realização de despesas pelos órgãos públicos,além daquelas em que há previsão orçamentária (o orçamento do Estado, no item daSecretaria da Saúde contém previsão para compra de remédios...); este Poder,todavia, sempre consciente de sua importância como integrante de um dos Poderesdo Estado, como pacificador dos conflitos sociais e defensor da Justiça e do bemcomum, tem agido com maior justeza optando pela defesa do bem maior,veementemente defendido pela Constituição — A VIDA — interpretando a lei deacordo com as necessidades sociais imediatas que ela se propõe a satisfazer” (TJSC,AC n. 2002.011265-3, de Sombrio, Rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j. em 18.11.2002).

É evidente que o Município e o Estado têm previsão orçamentária paradespesas com a saúde da população, até mesmo apropriadas ao Sistema Único deSaúde. Com frequência é licitada a aquisição de medicamentos e outros produtosfarmacêuticos, médicos e hospitalares.

Não fora isso, o fato de se estar colocando em risco um bem maior queé a vida, que a qualquer momento poderá sucumbir em razão da suspensão ouinterrupção do fornecimento dos recursos indispensáveis ao controle da doença, émotivo mais do que suficiente para justificar a dispensa de prévia autorizaçãoorçamentária e até de procedimento licitatório.

É o que se tem decidido:“’Entre proteger a inviolabilidade do direito à vida, que se qualifica como

direito subjetivo inalienável assegurado pela própria Constituição da República (art.5º, caput), ou fazer prevalecer, contra essa prerrogativa fundamental, um interessefinanceiro e secundário do Estado, entendo – uma vez configurado esse dilema – querazões de ordem ético-jurídica impõem ao julgador uma só e possível opção: orespeito indeclinável à vida’ (31.1.97, in DJU 13.2.97,Min. Celso de Melo negando, naespécie, o pedido de suspensão de medida liminar)” (TJSC, AC n. 04.002977-2, deCanoinhas, Rel. Des. Francisco Oliveira Filho, j. em 04.05.2004).

Portanto, não há qualquer ofensa ao § 5º do art. 195, bem como aosartigos 165 e 167, da Constituição Federal de 1988, que tratam da lei de diretrizesorçamentárias com orçamentos anuais e planos plurianuais, bem como da vedaçãode início de programas ou projetos não incluídos na lei orçamentária anual (art. 167,inciso I), da realização de despesas ou a assunção de obrigações diretas queexcedam os créditos orçamentários ou adicionais (inciso II), da abertura de créditossuplementares ou especiais sem prévia autorização legislativa e sem indicação dosrecursos correspondentes (inciso V), da transposição, do remanejamento e datransferência de recursos de uma categoria de programação para outra ou de umórgão para outro, sem prévia autorização legislativa (inciso VI); e da concessão ouutilização de créditos ilimitados (inciso VII).

Para a aquisição dos medicamentos, equipamentos médicos etratamentos de urgência é desnecessário o prévio processo licitatório, haja vista que oPoder Público não está impedido ou impossibilitado de adquirir medicamento oupromover tratamento de saúde sem licitação. Isto porque a própria Lei de Licitações(n. 8.666, de 21 de julho de 1993), autoriza a aquisição de determinados

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bens/produtos sem a realização de licitação, desde que preenchidos algunspressupostos.

Referida norma disciplina que:“Art. 24. É dispensável a licitação:“(...) IV - nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando

caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo oucomprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens,públicos ou particulares, e somente para os bens necessários ao atendimento dasituação emergencial ou calamitosa e para as parcelas de obras e serviços quepossam ser concluídas no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias consecutivos eininterruptos, contados da ocorrência da emergência ou calamidade, vedada aprorrogação dos respectivos contratos”.

Acerca da dispensa de licitação para aquisição emergencial demedicamentos e tratamento, ensina Marçal Justen Filho:

“Demonstração concreta e efetiva da potencialidade de dano: a urgênciadeve ser concreta e efetiva. Não se trata de urgência simplesmente teórica. Deve serevidenciada a situação concreta existente, indicando-se os dados que evidenciam aurgência. Suponha-se, por exemplo, uma aquisição de medicamentos a ser efetivadapela Administração Pública. Colocada a questão em termos gerais, nunca caberia alicitação. Sempre seria possível argumentar que a demora na aquisição demedicamentos traria prejuízos à saúde pública. Como decorrência, a aquisição demedicamentos nunca se sujeitaria a prévia licitação. A solução é claramenteequivocada, eis que o fundamental reside na relação entre a necessidade a seratendida e a solução concreta adequada. Em muitos casos, a Administração dispõede tempo suficiente para realizar a licitação e promover o contrato que atenderá ànecessidade. O problema reside na impossibilidade de aguardar o tempo necessárioà licitação para adquirir os remédios. A demonstração da necessidade concretasignifica que a Administração deve indicar as quantidades necessárias demedicamentos para atender aos doentes e as quantidades de que dispõe emestoque. A expressão 'prejuízo' deve ser interpretada com cautela, por comportarsignificações muito amplas. Não é qualquer “prejuízo” que autoriza a dispensa delicitação. O prejuízo deverá ser irreparável. Cabe comprovar se a contrataçãoimediata evitará prejuízos que não possam ser recompostos posteriormente. Ocomprometimento à segurança significa o risco de destruição ou de seqüelas àintegridade física ou mental de pessoas ou, quanto a bens, o risco de seuperecimento ou deterioração” ("in" Comentários à Lei de Licitações e ContratosAdministrativos, 9. ed. São Paulo: Dialética, 2002, p. 240).

No mesmo sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:“CONSTITUCIONAL – RECURSO ORDINÁRIO – MANDADO DE

SEGURANÇA – FORNECIMENTO DE MEDICAÇÃO (INTERFERON BETA) –PORTADORES DE ESCLEROSE MÚLTIPLA – DEVER DO ESTADO – DIREITOFUNDAMENTAL À VIDA E À SAÚDE (CF, ARTS. 6º E 189). PRECEDENTES DOSTJ E STF.

“1. É dever do Estado assegurar a todos os cidadãos o direito

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fundamental à saúde constitucionalmente previsto.“2. Eventual ausência do cumprimento de formalidade burocrática não

pode obstaculizar o fornecimento de medicação indispensável à cura e/ou a minorar osofrimento de portadores de moléstia grave que, além disso, não dispõem dos meiosnecessários ao custeio do tratamento.

“3. Entendimento consagrado nesta Corte na esteira de orientação doEgrégio STF.

“4. Recurso Ordinário conhecido e provido” (STJ, ROMS 11129/PR. Rel.Min. Francisco Peçanha Martins. j. em 02.10.2001).

Do exposto, dada a urgência da situação ante a gravidade da doença, oprejuízo que poderia sofrer o paciente caso tivesse que aguardar o procedimentolicitatório para a aquisição das fraldas geriátricas pleiteadas, entende-se configurada ahipótese de dispensa de licitação, em conformidade com o disposto no texto legalretro citado e no dispositivo constitucional, além de não atentar contra o princípio dalegalidade (art. 37, "caput", da Carta Magna).

3.5 Não merece guarida também o contumaz argumento de que oatendimento de uns (situações individualizadas), prejudicaria o direito de outros, eimportaria em risco à saúde de toda a população, pois o tratamento médico gratuito aum caso específico, como o ora pleiteado pelo Ministério Público em favor de idoso,acarretaria severos prejuízos ao programa global de assistência à saúde.

Acontece que o atendimento à saúde, direito social de todos e obrigaçãosolidária do Estado (União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios), deveráser prestado indistintamente àqueles que dele necessitarem, vale dizer, tivessem osentes públicos cumprido sua obrigação constitucional, não haveria necessidade de oscidadãos buscarem a tutela jurisdicional para ver satisfeito o seu direito.

Logo, o fato de o membro do Ministério Público estadual ter ingressadoem juízo para obter as fraldas geriátricas ao tratamento do idoso e necessitado, emnada prejudica o direito daqueles que também necessitarem de cuidados médicose/ou medicamentos e, por conseguinte, não viola o art. 5º, "caput", da CF/88,sobretudo porque a todos, indistintamente, continua assegurado o direitoconstitucional à saúde que, como frisado, deverá ser prestada solidariamente pelaUnião, Estados, Distrito Federal e Municípios.

Não é demasiado transcrever, de outro lado, excerto do judicioso votoproferido pelo eminente Des. Luiz Cézar Medeiros, na Apelação Cível n.2003.015378-0, da Capital, julgado em 27.10.2003, que também serve de fundamentopara rechaçar essa alegação:

“A saúde, conforme o disposto no art. 196 da Constituição Federal,repetido pelo art. 153 da Constituição Estadual, ‘é direito de todos e dever do Estado,garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco dedoença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviçospara sua promoção, proteção e recuperação’. A respeito desse preceito, a melhororientação doutrinária é aquela que, a partir do século XX, considera que as normaspertinentes à saúde, por ser ela o mais típico dos direitos sociais, têm aplicabilidadeimediata, independendo de norma regulamentadora.

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“Mais adiante, a Constituição Federal, no seu art. 198, consigna que ‘asações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizadae constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes: [...]II – atendimento integral, com prioridade para atividades preventivas, sem prejuízodos serviços assistenciais; [...] § 1º - O sistema único de saúde será financiado, nostermos do art. 195, com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dosEstados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes’.

“Diante dessas disposições, observa-se que o sistema único de saúdegarante o fornecimento de cobertura integral aos seus usuários – não importando sede forma coletiva ou individualizada, como no caso em apreço –, e por todos os entesestatais da Administração Direta: União, Estados, Distrito Federal e Municípios, doque decorre a impossibilidade do reconhecimento da irresponsabilidade do Estado,como queria fazer crer o réu ao afirmar sua ilegitimidade passiva.

“Sobre a universalidade da cobertura, no âmbito infraconstitucional, a Lein. 8.080, de 19 de setembro de 1990, ao regular o Sistema Único de Saúde – SUS edispor sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, bemcomo sobre a organização e funcionamento dos serviços a ela correspondentes,estabelece no art. 6º que ‘estão incluídas ainda no campo de atuação do SistemaÚnico de Saúde (SUS): I – a execução de ações: [...] d) de assistência terapêuticaintegral, inclusive farmacêutica;

“Nesse sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:“’CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE

SEGURANÇA. OBJETIVO: RECONHECIMENTO DO DIREITO DE OBTENÇÃO DEMEDICAMENTOS INDISPENSÁVEIS AO TRATAMENTO DE RETARDO MENTAL,HEMIATROPIA, EPILEPSIA, TRICOTILOMANIA E TRANSTORNO ORGÂNICO DAPERSONALIDADE. DENEGAÇÃO DA ORDEM. RECURSO ORDINÁRIO. DIREITO ÀSAÚDE ASSEGURADO NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL (ART. 6º E 196 DA CF).PROVIMENTO DO RECURSO E CONCESSÃO DA SEGURANÇA.

“’I – É direito de todos e dever do Estado assegurar aos cidadãos asaúde, adotando políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco dedoença e de outros agravos e permitindo o acesso universal igualitário às ações eserviços para sua promoção, proteção e recuperação (arts. 6º e 196 da CF).

“’II – Em obediência a tais princípios constitucionais, cumpre ao Estado,através do seu órgão competente, fornecer medicamentos indispensáveis aotratamento de pessoa portadora de retardo mental, hemiatropia, epilepsia,tricotilomania e transtorno orgânico da personalidade.

“’III – Recurso provido’ (ROMS n. 13452/MG, Min. Garcia Vieira)“’RECURSO ESPECIAL. MANDADO DE SEGURANÇA.

FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS. SUS. LEI N. 8.080/90.“’O v. acórdão proferido pelo egrégio Tribunal a quo decidiu a questão

no âmbito infraconstitucional, notadamente à luz da Lei n. 8.080, de 19 de setembrode 1990.

“’O Sistema Único de Saúde pressupõe a integralidade da assistência,de forma individual ou coletiva, para atender cada caso em todos os níveis de

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complexidade, razão pela qual, comprovada a necessidade do medicamento para agarantia da vida de paciente, deverá ser ele fornecido.

“’Recurso especial provido. Decisão unânime’ (REsp n. 212346/RJ, Min.Franciulli Netto).

“’Do corpo do venerando acórdão se extrai a seguinte lição:“’Observa-se que o Sistema Único de Saúde pressupõe a integralidade

da assistência, de forma individual ou coletiva, para atender cada caso em todos osníveis de complexidade, razão pela qual, comprovada a necessidade do medicamentopara a garantia da vida da paciente, deverá ele ser fornecido. Tem, portanto, arecorrente, visivelmente, direito líquido e certo ao recebimento do remédio.

“’As normas que promovem a garantia de direitos fundamentais nãopodem ser consideradas como programáticas, porque ‘possuem um conteúdo quepode ser definido na própria tradição da civilização ocidental-cristã’ e ‘a suaregulamentação legislativa, quando houver, nada acrescentará de essencial: apenaspode ser útil (ou, porventura necessária) pela certeza e segurança que criar quanto àscondições de exercício dos direitos ou quanto à delimitação frente a outros direitos’(cf. José Luiz Bolzan, ‘Constituição ou Barbárie: perspectivas constitucionais’, in ‘AConstituição Concretizada – construindo pontes com o público e o privado’, IngoWolfgang Sarlet (org), Livraria do Advogado Editora, Porto Alegre, 2000, p. 34).

“Destarte, defronte de um direito fundamental, cai por terra qualqueroutra justificativa de natureza técnica ou burocrática do Poder Público, uma vez que,segundo os ensinamentos de Ives Gandra da Silva Martins, ‘o ser humano é a únicarazão do Estado. O Estado está conformado pra servi-lo, como instrumento por elecriado com tal finalidade. Nenhuma construção artificial, todavia, pode prevalecersobre os seus inalienáveis direitos e liberdades, posto que o Estado é um meio derealização do ser humano e não um fim em si mesmo’ (in ‘Caderno de Direito Natural– Lei Positiva e Lei Natural’, n. 1, 1ª edição, Centro de Estudos Jurídicos do Pará,1985, p. 27).

“Deveras, como já foi ressaltado pelo ilustre Ministro José Delgado, aojulgar caso semelhante ao dos autos, em que se discutia o fornecimento demedicamentos a portadores do vírus HIV, o REsp n. 325.337/RJ, DJU de 3.9.2001, a‘busca pela entrega da prestação jurisdicional deve ser prestigiada pelo magistrado,de modo que o cidadão tenha, cada vez mais facilidade, com a contribuição do PoderJudiciário, a sua atuação em sociedade, quer nas relações jurídicas de direito privado,quer nas de direito público’.

“Nesse sentido, também já se posicionou o Supremo Tribunal Federal,verbis:

“’Entre proteger a inviolabilidade do direito à vida, que se qualifica comodireito subjetivo inalienável assegurado pela própria Constituição da República (art. 5,caput), ou fazer prevalecer, contra essa prerrogativa fundamental, um interessefinanceiro e secundário do Estado, entendo – uma vez configurado esse dilema, querazões de ordem ético-jurídica impõem ao julgador uma só é possível opção: orespeito indeclinável à vida’ (PETMC 1246/SC, rel. Min. Celso de Mello, em31.1.1997)’.

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“Assim, o fato de os medicamentos solicitados não estarem dentre osnormalmente fornecidos pelo Estado não tem o condão de impedir a deferimento dopedido, bem assim o fato de a ação ter sido intentada contra o Estado de SantaCatarina e não contra a União, eis que, como visto, o sistema de saúde implicacobertura integral, inclusive quanto aos medicamentos, e deve ser implementado nãoapenas pela União, mas também pelos Estados, Distrito Federal e Municípios.

“Além disso, como já ressaltei na Apelação Cível n. 2003.011879-9, deCriciúma, que tratava de idêntica matéria, diante do quadro que se apresenta, ummínimo de bom senso e de sensibilidade, a par da plausibilidade jurídica, indica que omelhor caminho a escolher é obrigar o Estado a fornecer a medicação mais indicadapara, da maneira menos sofrível, controlar a degeneração cerebral e os demaisefeitos da doença”.

Como se vê, a orientação jurisprudencial desta Corte de Justiça é todavoltada para a proteção gratuita à saúde da população, pelo Poder Público da União,do Estado e do Município, ainda que para atendimento individual, quando o pacientese encontra em risco, como é a hipótese dos autos em que é portador de doençagrave e necessita de tratamento médico. A respeito, alinha-se outro julgado desteTribunal:

“Saúde pública. Sistema Único de Saúde – SUS. Concessão demedicamentos. Legitimidade passiva ad causam.

“Consoante a sistemática adotada pela Constituição Federal de 1988, aresponsabilidade pela tutela do direito à saúde pública deve ser partilhadaindistintamente entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios, do que decorrea legitimidade passiva tanto do Secretário de Estado da Saúde como do SecretárioMunicipal da Saúde.

“Carência da ação. Falta de interesse de agir.“O insucesso na obtenção de medicamentos junto aos órgãos

vinculados a quaisquer das pessoas jurídicas de direito público interno é suficientepara se concluir pela necessidade do uso da via mandamental.

“Tratamento médico. Hipertensão arterial sistêmica e diabetes mellitus.Enfermidades e insuficiência de recursos devidamente comprovadas. Fornecimentogratuito de medicamentos. Direito fundamental à saúde.

“Estando suficientemente demonstradas as moléstias e aimpossibilidade de a impetrante arcar com o custo dos medicamentos, referentes aorespectivo tratamento, nada obstante de pequena monta, surge para o Poder Públicoo inafastável dever de fornecê-los gratuitamente, assegurando-lhe o direitofundamental à saúde, tal como previsto pela Constituição Federal de 1988” (MS n.2003.018003-6, da Capital, Rel. Des. Sônia Maria Schmitz, julgado em 11.03.2003).

Dessa forma, determina-se que o Estado e o Município de Lagesforneçam ao paciente Lucas Beckhauser, as fraldas geriátricas descartáveis, duranteo período em que o seu uso for necessário ao tratamento de saúde e higiene pessoal,no modelo e nas quantidades recomendadas pelo médico nas receitas, bem comosejam fornecidas tantas quantas necessárias para o atendimento contínuo das suasnecessidades.

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3.6 Não obstante, revela-se inviável o pleito exordial para que sejamconcedidas as fraldas geriátricas para todos os enfermos "que se encontrem ouvierem a se encontrar em situação semelhante." (fl. 06).

Não se desconhece o teor do art. 16 da Lei n. 7.347/85, no sentido dapossibilidade de o Juiz estender "erga omnes" os efeitos da sentença proferida emação civil pública, nos limites territoriais de sua atuação jurisdicional.

Todavia, a condenação genérica afasta do ente Público o direito deverificar cada situação concreta, o que suprime o direito de defesa do Poder Públicoem eventual caso de abuso ou de pedido formulado desnecessariamente.

Muito embora exista posicionamento divergente nesta Corte de Justiçano sentido de que é devida a extensão "erga omnes" à decisão (AC. n.2010.037510-4, de Lages, Rel. Des. Luiz César Medeiros, j. 30.09.2010), entende-seque essa não é a solução adequada para tratar da matéria.

As necessidades de medicamentos, tratamentos, materiais ouequipamentos de cada paciente devem ser apresentadas ao Poder Público para queeste verifique previamente a viabilidade de fornecimento do tratamento médiconecessário e dos fármacos ou materiais pleiteados, oportunidade em que o Estado(genericamente falando) poderá apurar a necessidade de concessão do tratamento,material e/ou medicamento, com base no art. 196 da Constituição Federal. Caso oEstado não atenda ao pedido, ou seja, resista à pretensão, nasce para o paciente oupara o Ministério Público que os representa e protege, o direito de ação.

Dessa forma, não se pode estender a favor de pessoas incertas e nãoconhecidas a titularidade de tal direito, até em face da necessidade de identificaçãodos pacientes necessitados e comprovação, caso a caso, da moléstia, da indicaçãodo medicamento adequado, do tratamento ou material necessário e daobrigatoriedade de seu fornecimento.

Sobre a questão, destaca a doutrina:"Quando a lei autoriza que na Ação Civil Pública o objeto possa ser,

como regra, condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou nãofazer, não se pode pretender, a nosso ver, que seja a ação o remédio para todos osmales encontrados na coletividade. Certamente que há, algumas vezes, dificuldadeem demarcar o limite dentro do qual o pedido é possível juridicamente, quando visa àproteção dos direitos coletivos e difusos. É que, levada ao extremo a possibilidade deinvocar, em qualquer caso, a tutela judicial em face do Poder Público, chegaria o juiza extrapolar sua função jurisdicional, invadindo, de modo indevido, a funçãoadministrativa, com ofensa, por conseguinte, ao princípio da separação de Poderes,insculpido no art. 2º da Carta em vigor.

"[...]"Apesar da inegável dificuldade na demarcação, temos entendido que o

pedido, principalmente no caso de se tratar de cumprimento de obrigação de fazer ounão fazer, é juridicamente possível quando estiver preordenado a determinadasituação concreta, comissiva ou omissiva, causada pelo Estado, da qual se origine aviolação aos interesses coletivos ou difusos. Em contraposição, não se podeconsiderar possível juridicamente o objeto da ação se o autor postula que a decisão

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judicial, acolhendo sua pretensão, condene o Poder Público ao cumprimento, deforma genérica, abstrata, inespecífica e indiscriminada, de obrigação de fazer ou nãofazer.

"Em outras palavras, não pode o Judiciário impor a implementação depolíticas públicas de caráter geral, ainda que sejam necessárias – e geralmente osão – para atender a interesses de ordem social. Tais atividades competem aosórgãos administrativos incumbidos da gestão dos interesses coletivos, não sendolícito a órgão que não disponham de tal competência investir sobre suas atribuições.Infelizmente, pedidos dessa natureza têm sido formulados em ações civis públicas,mas o Judiciário, salvo uma ou outra exceção tem agido com isenção e dentro deseus poderes constitucionais, repudiando esses tipos de pretensões que, na verdade,são despidos de suporte jurídico.

"Assim, é possível juridicamente que o autor da Ação Civil Públicapleiteie seja o Município obrigado a efetuar reparos em certa sala de aula, em virtudede situação degenerativa que venha provocando ameaça à integridade física oumesmo à vida dos alunos que diuturnamente nela permaneçam. Já não teriapossibilidade jurídica o objeto que pretendesse que um Estado fosse condenado acumprir, genérica e indiscriminadamente, a obrigação de dar segurança pública atodos os cidadãos. Na primeira hipótese, o objeto é concreto e o interesse sob tutela éplenamente definido, ainda que não se possa identificar com precisão todos os seustitulares. Na última, ao contrário, a sentença, se acolhesse o pedido, estariaobviamente invadindo o poder de gestão da Administração, sabido que os serviçospúblicos coletivos reclamam vários requisitos, como recursos orçamentários,atendimento a planos de prioridade administrativa, criação de cargos públicos,realização de concursos etc. A decisão, nesse caso, estaria enveredando nas linhasde gestão próprias dos órgãos administrativos." (Ação Civil Pública, JOSÉ DOSSANTOS CARVALHO FILHO, 7. Ed. Rio de Janeiro: Lúmen & Júris, 2009, p. 85/86).

Este Tribunal, em caso análogo, assim se pronunciou:"AÇÃO CIVIL PÚBLICA. FORNECIMENTO GRATUITO DE FRALDAS

DESCARTÁVEIS. EM PROVEITO DE PESSOA DETERMINADA. LEGITIMIDADE DOMINISTÉRIO PÚBLICO. ACOLHIMENTO DO PEDIDO. ATRIBUIÇÃO DE EFICÁCIAERGA OMNES À SENTENÇA. SITUAÇÃO ESPECÍFICA. DESPESA ADICIONALPARA OS COFRES PÚBLICOS COM A PUBLICAÇÃO DA DECISÃO (ART. 94,CDC). RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

"1. "Decorre da Constituição Federal (art. 196) e da Lei 8.060/90 o deverdo Estado de prestar assistência médica àquele que sofre de paralisia cerebral,estando nele compreendida a obrigação de fornecer cadeira de rodas ajustável efraldas, se indispensáveis" (TJSC-AI n. 2004.002463-0).

"2. Não se afigura razoável impor ao Estado e aos Municípios suportaros custos de publicação da sentença (art. 94, CDC) para atribuir-lhe eficácia ergaomnes, nos casos em que a ação civil pública foi ajuizada para tratar daespecificidade do caso concreto de uma determinada pessoa, cuja situação sequerpoderá reproduzir-se no futuro ou poderá estar superada pela dinâmica de novostratamentos e medicamentos. (AC. n. 2010.034193-8, de Lages, Des. Rel. Newton

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Janke, j. em 11.04.2011).Devido à relevância e à pertinência, extrai-se o seguinte trecho do

acórdão, que fica fazendo parte da fundamentação do presente voto:"Por fim, assiste razão ao Município-recorrente no ponto em que se

insurge contra os efeitos ampliativos da decisão tendentes a beneficiar outrospacientes que se encontrem em idêntica situação.

"Não escapa à percepção de ninguém que as ações coletivasrepresentam um dos mais significativos avanços processuais. Através delas, épossível irradiar os efeitos ou benefícios de uma decisão judicial para indeterminadaspessoas, sem que elas necessitem individualmente recorrer ao Judiciário e obrigá-lo,com dispêndio de recursos e absorção do precioso e limitado tempo dos magistrados,a repetir solução já ministrada em caso semelhante.

"Sob essa visão prospectiva, os efeitos ultra partes da decisão antesdevem ser enaltecidos do que restringidos.

"Em caso semelhante, oriundo da mesma Comarca, esta Corte mantevea eficácia erga omnes, mas ordenou que a sentença fosse publicada às expensas dosréus. Leia-se no que pertinente:

""De início, é de se observar que o art. 16 da Lei n. 7.347/85 prescreveque a sentença exarada em ação civil pública faz coisa julgada erga omnes, noslimites da competência territorial do órgão julgador.

""Art. 16. A sentença civil fará coisa julgada 'erga omnes', nos limites dacompetência territorial do órgão prolator, exceto se o pedido for julgado improcedentepor insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outraação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova".

""Propriamente em atenção ao dispositivo em comendo, a MeritíssimaJuíza sentenciante consignou na parte dispositiva do decisum: "Concedo eficácia ergaomnes à presente decisão, a fim de proceder a extensão dos efeitos da sentença paratodos os enfermos que se encontram em situação semelhante, residentes naComarca de Lages, conforme o disposto no art. 16 da Lei n. 7.347/85" (fl. 180).

""Mais adiante, a suso mencionada Lei da Ação Civil Pública estabeleceem seu art. 21 a possibilidade de aplicação dos dispositivos do Diploma Consumeristaà defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e individuais, maisespecificamente os constantes do Título III, naquilo que houver compatibilidade.

""Assim, ao regular o procedimento a ser adotado nas ações coletivaspara a defesa de interesses individuais homogêneos, consagra o Código de Defesado Consumidor - Lei n. 8.078/90:

""Art. 94. Proposta a ação, será publicado edital no órgão oficial, a fim deque os interessados possam intervir no processo como litisconsortes, sem prejuízo deampla divulgação pelos meios de comunicação social por parte dos órgãos de defesado consumidor".

""É entendimento corrente nesta Corte de Justiça que, uma vez nãotendo sido publicado no órgão oficial o edital comunicando a propositura da açãocoletiva - art. 94, Lei n. 8.078/90, é de bom alvitre que a publicação do trânsito emjulgado da demanda não se restrinja ao Diário de Justiça, mas que se proceda à

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divulgação também em jornal de grande circulação local.""Em harmonia com esse posicionamento estão os julgados: AC n.

2007.045610-5, Des. Francisco de Oliveira Filho; AC n. 2007.028143-6; Des. JoséVolpato de Souza; e RN n. 2007.039084-5, Des. Cesar Abreu.

""Entretanto, não merece prosperar a tese levantada pelo Município réu.Há que se esclarecer que essa interpretação analógica e extensiva do CódigoConsumerista - art. 26, do Código de Processo Civil, não tem por objetivo estabeleceruma condição sine qua non para a eficácia erga omnes da decisão, masverdadeiramente tornar o direito efetivo, facilitando o acesso de cidadãos locais quese encontrem em situação semelhante ao conhecimento do teor da decisão.

""Desse modo, visto ser essencial para a satisfação completa daprestação jurisdicional, faz-se necessário que o réus procedam à publicação doreferido edital informando o trânsito em julgado da decisão em jornal que tenhaexpressiva circulação na comarca em que o decisum foi prolatado" (AC n.2010.037510-4, de Lages, julg. em 30/09/2010).

"Com a devida venia, penso não se tratar de solução acertada."No caso vertente, a ação civil pública foi manejada no interesse

precípuo de uma única pessoa para atender uma situação patológica muito peculiar."A prática mostra que o Ministério Público tem ajuizado, continuamente,

ao longo do tempo, inúmeros ações do gênero, direcionadas contra o Estado eMunicípios.

"Notoriamente, o custo de publicação de uma sentença em um jornal degrande circulação não é desprezível e poderá ocorrer que essa publicação não venhaa ter nenhum proveito útil em razão das especificidade do caso concretamentejulgado.

"Ora, não me parece sensato compelir o Estado e o Município, que játanto reclamam do pesado encargo de adquirir e fornecer osmedicamentos-tratamentos, a bancar mais esta despesa, de resultados - repita-se -duvidosos ou improváveis.

"Poderá até haver casos em que a publicação terá custo superior ao daaquisição dos medicamentos ou do material de higiene.

"De resto, em qualquer caso, futuros beneficiários também não poderiamsubtrair-se à demonstração da sua hipossuficiência econômica para que lhes fosselícito reclamar o direito ao mesmo tratamento."

Portanto, diante dos fundamentos ora apresentados, não há comoconceder efeito "erga omnes" à decisão proferida, porquanto demonstrada ainexistência de obrigatoriedade ao fornecimento das fraldas geriátricas ao pacienteque não esteja descrito e apresentado na presente Ação Civil Pública.

3.7 Por derradeiro, como não é possível prever de antemão até quandoo paciente deverá utilizar as fraldas geriátricas, determina-se, como contracautela,que a continuação do cumprimento da condenação seja condicionada à comprovaçãoperiódica (a cada três meses) da necessidade do uso das fraldas geriátricas aotratamento de saúde do paciente. É evidente que o documento comprobatório deveráregistrar o estado do paciente, a doença apresentada, a gravidade ou não, a evolução

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do tratamento, a necessidade ou não do uso da fralda geriátrica, se continuaadequada ou não, bem como se é possível a substituição da fralda por outrapadronizada pelo SUS, que deverão ser indicados (e receitados), caso em que talsubstituição deverá ser determinada de imediato, com vistas sempre à adequadamanutenção da saúde do paciente com o menor custo possível para o Poder Público.A critério do Magistrado "a quo", o atestado médico poderá ser substituído por períciamédica periódica.

3.8 O Estado e o Município estão isentos do pagamento de custasprocessuais, na forma do disposto na Lei Complementar Estadual n. 156/1997, comas alterações promovidas pela Lei Complementar n. 161/1997.

3.9 Por fim, não são devidos honorários advocatícios ao MinistérioPúblico quando for vencedor na ação. Isso ocorre em virtude da isonomia detratamento concedida ao "parquet", porquanto este não pode ser condenado aopagamento de honorários advocatícios se vencido, salvo quando comprovada a suainequívoca má-fé, conforme prevê o artigo 18, da Lei Federal n. 7.347/85:

"Art. 18. Nas ações de que trata esta lei, não haverá adiantamento decustas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nemcondenação da associação autora, salvo comprovada má-fé, em honorários deadvogado, custas e despesas processuais."

Por sua vez, o Ministério Público também não está autorizado a receberhonorários advocatícios, conforme prevê o artigo 128, § 5º, inciso II, alínea "a", daConstituição Federal:

"Art. 128. O Ministério Público abrange:"(...)"§ 5º - Leis complementares da União e dos Estados, cuja iniciativa é

facultada aos respectivos Procuradores-Gerais, estabelecerão a organização, asatribuições e o estatuto de cada Ministério Público, observadas, relativamente a seusmembros:

"(...)"II - as seguintes vedações:"a) receber, a qualquer título e sob qualquer pretexto, honorários,

percentagens ou custas processuais;"Desta forma, tendo em vista que se trata de ação civil pública ajuizada

pelo Ministério Público e julgada parcialmente procedente, não se pode cogitar empagamento de honorários advocatícios.

O Superior Tribunal de Justiça sobre a questão assim se pronunciou:"EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA - PROCESSO CIVIL - AÇÃO CIVIL

PÚBLICA - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - MINISTÉRIO PÚBLICO AUTOR EVENCEDOR. 1. Na ação civil pública movida pelo Ministério Público, a questão daverba honorária foge inteiramente das regras do CPC, sendo disciplinada pelasnormas próprias da Lei 7.347/85. 2. Posiciona-se o STJ no sentido de que, em sedede ação civil pública, a condenação do Ministério Público ao pagamento de honoráriosadvocatícios somente é cabível na hipótese de comprovada e inequívoca má-fé doParquet. 3. Dentro de absoluta simetria de tratamento e à luz da interpretação

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sistemática do ordenamento, não pode o parquet beneficiar-se de honorários, quandofor vencedor na ação civil pública. Precedentes. 4. Embargos de divergência providos.(STJ - ERESP Nº 895.530-PR, Ministra Eliana Calmon, publicado em 18.12.09)."

"PROCESSO CIVIL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – HONORÁRIOSADVOCATÍCIOS – MINISTÉRIO PÚBLICO AUTOR E VENCEDOR.

"Na ação civil pública, a questão da verba honorária foge inteiramentedas regras do CPC, sendo disciplinada pelas normas próprias da Lei 7.347/85, com aredação dada ao art. 17 pela Lei 8.078/90.

"Somente há condenação em honorários, na ação civil pública, quando oautor for considerado litigante de má-fé, posicionando-se o STJ no sentido de nãoimpor ao Ministério Público condenação em honorários.

"Dentro de absoluta simetria de tratamento, não pode o parquetbeneficiar-se de honorários, quando for vencedor na ação civil pública.

"Recurso especial improvido. (STJ - REsp 493823/DF, Rel. MinistraEliana Calmon, julgado em 09.12.2003).

Destarte, não há como condenar os réus ao pagamento de honoráriosadvocatícios.

4. Como se apanha de toda a fundamentação deste acórdão, asdecisões tomadas nos autos não maltratam, de forma alguma, qualquer normaconstitucional ou infraconstitucional, ou sejam, os arts. 2º; 5º e incisos I e LV; 23, II;30, VII; 37, 60, § 4º; 93, inc IX, 100; 109; 129, inc. III; 133; 134; 165; 166; 167 e incisoII; 168; 169; 194, parágrafo único, inciso III; 195, §§ 1º e 5º; 196; e 198, todos daConstituição Federal de 1988; ou o arts. 2º, 43, 77, III, 267, inc. IX, 460 e 580 doCódigo de Processo Civil; ou os arts. 2º, §§ 1º e 2º; 4º, § 2º; 5º; 7º; 8º; 14, da Lei n.8.080/90; ou os arts. 81, 94, 103 da Lei n. 8.078/90; ou os arts. 3º, 4º, 11, 12, 16, 21,81,127,129 da Lei n. 7.347/85.

Pelo exposto, dá-se provimento parcial ao recurso de apelaçãointerposto pelo Estado de Santa Catarina e à remessa oficial, para anular o processodesde a sentença; e, aplicando o art. 515, § 3º, do CPC, julgar parcialmenteprocedente o pedido inicial, para condenar o Estado de Santa Catarina e o Municípiode Lages a entregar periodicamente ao paciente, Sr. Lucas Beckhauser, as fraldasgeriátricas descartáveis, nos termos da fundamentação do acórdão.

Cabe esclarecer que as fraldas deverão ser fornecidas pelo ente públicosomente ao curador ou a familiar do paciente autorizado, ou ao representante daentidade onde se encontra, sendo necessária a comprovação do vínculo entre eles eo paciente, em consonância com o ofício circular n. 99, de 24.10.2008, entregue peloEstado de Santa Catarina a esta Corte de Justiça, com o fim de evitar fraudes contrao Sistema Único de Saúde.

Gabinete Des. Jaime Ramos