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151 R. Fórum de Dir. Tributário – RFDT | Belo Horizonte, ano 14, n. 82, p. 151-178, jul./ago. 2016 A restrição ao aproveitamento do ágio de rentabilidade futura nas operações entre partes dependentes Ramon Tomazela Santos Mestre em Direito Tributário pela Universidade de São Paulo – USP (“Summa Cum Laude”). Master of Laws (LL.M.) em Tributação Internacional na Universidade de Viena (Wirtschaftsuniversität Wien – WU), Áustria (“Passed with Honours”). Pós-Graduado em Direito Tributário pela Uni- versidade de São Paulo – USP. Membro do Comitê Acadêmico do Curso de Especialização em Direito Tributário Internacional do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT). Professor convidado em cursos de pós-graduação. Advogado em São Paulo. Resumo: O presente artigo analisa a restrição inserida na Lei nº 12.973/2014 ao aproveitamento fiscal do ágio de rentabilidade futura nas reorganizações societárias realizadas entre pessoas jurídicas integrantes do mesmo grupo econômico. Palavras-chave: Ágio de rentabilidade futura – Combinação de negócios – Partes dependentes – Validade – Ausência de caráter interpretativo. Sumário: 1 Introdução – 2 O ágio de rentabilidade futura na Lei nº 12.973/2014 – 3 As operações de combinação de negócios – 4 O “ágio interno” na jurisprudência administrativa – 5 A invalidade da restrição completa ao aproveitamento do ágio em operações entre partes dependentes – 6 A ausência de caráter interpretativo na alteração legislativa – 7 Conclusões – Referências bibliográficas 1 Introdução O presente artigo pretende examinar a restrição inserida na Lei nº 12.973/2014 ao aproveitamento fiscal do ágio de rentabilidade futura nas reorganizações societá- rias realizadas entre pessoas jurídicas integrantes do mesmo grupo econômico. Para a adequada exposição do tema, será feita uma breve introdução sobre o ágio de rentabilidade futura na Lei nº 12.973/2014, com o objetivo de destacar as principais inovações trazidas pelo legislador em relação ao regime anterior, baseado nas redações originais do artigo 20, Decreto-Lei nº 1.598/1977 e do artigo 7º, da Lei nº 9.532/1997. Em seguida, passa-se a analisar as regras contábeis do Pronunciamento Técnico CPC nº 15, que exigem a alteração do poder de controle para o reconhecimento de ágio de rentabilidade futura nas operações de combinação de negócio. RFDT_82_MIOLO.indd 151 24/08/2016 17:21:20

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A restrição ao aproveitamento do ágio de rentabilidade futura nas operações entre partes dependentes

Ramon Tomazela SantosMestre em Direito Tributário pela Universidade de São Paulo – USP (“Summa Cum Laude”). Master of Laws (LL.M.) em Tributação Internacional na Universidade de Viena (Wirtschaftsuniversität Wien – WU), Áustria (“Passed with Honours”). Pós-Graduado em Direito Tributário pela Uni-ver sidade de São Paulo – USP. Membro do Comitê Acadêmico do Curso de Especialização em Direito Tributário Internacional do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT). Professor convidado em cursos de pós-graduação. Advogado em São Paulo.

Resumo: O presente artigo analisa a restrição inserida na Lei nº 12.973/2014 ao aproveitamento fiscal do ágio de rentabilidade futura nas reorganizações societárias realizadas entre pessoas jurídicas integrantes do mesmo grupo econômico.

Palavras-chave: Ágio de rentabilidade futura – Combinação de negócios – Partes dependentes – Validade – Ausência de caráter interpretativo.

Sumário: 1 Introdução – 2 O ágio de rentabilidade futura na Lei nº 12.973/2014 – 3 As operações de combinação de negócios – 4 O “ágio interno” na jurisprudência administrativa – 5 A invalidade da restrição completa ao aproveitamento do ágio em operações entre partes dependentes – 6 A ausência de caráter interpretativo na alteração legislativa – 7 Conclusões – Referências bibliográficas

1 Introdução

O presente artigo pretende examinar a restrição inserida na Lei nº 12.973/2014

ao aproveitamento fiscal do ágio de rentabilidade futura nas reorganizações societá-

rias realizadas entre pessoas jurídicas integrantes do mesmo grupo econômico.

Para a adequada exposição do tema, será feita uma breve introdução sobre o

ágio de rentabilidade futura na Lei nº 12.973/2014, com o objetivo de destacar as

principais inovações trazidas pelo legislador em relação ao regime anterior, baseado

nas redações originais do artigo 20, Decreto-Lei nº 1.598/1977 e do artigo 7º, da Lei

nº 9.532/1997.

Em seguida, passa-se a analisar as regras contábeis do Pronunciamento Técnico

CPC nº 15, que exigem a alteração do poder de controle para o reconhecimento de

ágio de rentabilidade futura nas operações de combinação de negócio.

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Após essa breve incursão nos aspectos contábeis, será possível examinar, com

maior vagar, a restrição prevista no artigo 22 da Lei nº 12.973/2014 ao aproveita-

mento fiscal do ágio gerado em operações entre partes dependentes, com especial

ênfase na sua validade perante o ordenamento jurídico brasileiro, bem como na au-

sência de caráter interpretativo.

2 O ágio de rentabilidade futura na Lei nº 12.973/2014

No regime jurídico da Lei nº 12.973/2014, o contribuinte que avaliar investi-

mento com base no método da equivalência patrimonial (“MEP”) deverá, por ocasião

da aquisição da participação societária, desdobrar o custo de aquisição em:

(i) valor de patrimônio líquido na época da aquisição, apurado segundo o

procedimento estabelecido na legislação em vigor;

(ii) mais ou menos-valia, que corresponde à diferença entre o valor justo

dos ativos líquidos da sociedade investida, na proporção da porcentagem da

participação societária adquirida, e o valor de que trata o item (i) acima; e

(iii) ágio por rentabilidade futura (goodwill) ou ganho proveniente de compra

vantajosa, que corresponde à diferença entre o custo de aquisição do inves-

timento e o somatório dos valores de que tratam os itens (i) e (ii) acima.

Como se vê, após a edição da Lei nº 12.973/2014, a mensuração e a alocação

do ágio por rentabilidade futura passou a seguir, em caráter geral, a sistemática do

Pronunciamento Técnico CPC nº 15 (“Combinação de Negócios”), por meio do qual a

sociedade investidora deve realizar a alocação do preço de aquisição (purchase price

allocation) ao valor justo1 líquido dos ativos identificáveis adquiridos e dos passivos

assumidos. Consequentemente, apenas o valor residual poderá ser tratado como

ágio por rentabilidade futura.

Note-se que o parágrafo 5º do artigo 20 do Decreto-Lei nº 1.598/1977, incluído

pela Lei nº 12.973/2014, passou a prever expressamente que o contribuinte deve,

primeiramente, reconhecer e mensurar a valor justo os ativos identificáveis adquiridos

e os passivos assumidos, para, somente então, reconhecer o ágio de rentabilidade

futura ou o ganho proveniente de compra vantajosa. Trata-se, assim, de alocação do

preço de aquisição que segue a sistemática prevista no item 32 do Pronunciamento

Técnico CPC nº 15.

É importante registrar que essa ordem de alocação é uma inovação trazida pela Lei

nº 12.973/2014, tendo em vista que, no regime anterior, o critério central para a aloca-

ção do ágio era o motivo, a razão ou fundamento do negócio jurídico, que determinou o

1 De acordo com as normas contábeis, o valor justo corresponde ao “valor pelo qual um ativo pode ser negociado entre partes interessadas conhecedoras do negócio e independentes entre si, com ausência de fatores que pressionem para a liquidação da transação ou que caracterizem uma transação compulsória”.

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pagamento do sobrepreço.2 O ágio poderia ser integralmente atribuído à perspectiva

de rentabilidade futura da sociedade na hipótese em que o foco do adquirente estava

nos resultados futuros do empreendimento. Em tais casos, o pagamento do ágio

justificava-se na expectativa de lucros que a utilização conjunta dos ativos propor-

ciona para a sociedade adquirida, mediante o aproveitamento da sua sinergia para

a atividade econômica. Em outras palavras, o pagamento do ágio justificava-se pela

aquisição do conjunto organizado de fatores de produção da sociedade, que seriam

utilizados para a obtenção de resultados futuros.3

Retornando para o regime atual, deve-se pontuar que, no contexto das opera-

ções de combinação de negócios, o adquirente pode reconhecer ativos e passivos

que não estavam registrados nas demonstrações contábeis da sociedade adquirida

(off-balance sheet), como, por exemplo, os ativos e os passivos contingentes,4 bem

como os ativos intangíveis desenvolvidos internamente (v.g., a marca desenvolvida

internamente não é reconhecida como ativo nas demonstrações contábeis da socie-

dade adquirida, em razão do registro dos dispêndios relacionados a sua criação e

divulgação como despesas).

Assim, o conceito de ativo identificável alcança não apenas os ativos registrados

na contabilidade da sociedade investida, mas também os ativos não contabilizados,

como prevê o item 13 do Pronunciamento Técnico CPC nº 15.5 Os ativos identificáveis

adquiridos e os passivos assumidos devem atender, na data da aquisição, às defi-

nições de ativo e de passivo dispostas no Pronunciamento Conceitual Básico. Além

disso, o adquirente deve mensurar os ativos identificáveis adquiridos e os passivos

assumidos a valor justo.

Sob o ponto de vista contábil, o ágio de rentabilidade futura corresponde à

parcela do custo de aquisição que excede o valor justo dos ativos líquidos tangíveis e

intangíveis identificáveis. Assim, no âmbito da ciência contábil, o ágio de rentabilida-

de futura corresponde à capacidade de geração de lucros que não pode ser atribuída

2 BIANCO, João Francisco; FAJERSZTAJN, Bruno. “Determinação e Fundamentação Econômica do Ágio Apurado na Aquisição de Investimentos: Regimes Fiscal e Contábil”. Direito Tributário, Societário e a Reforma da Lei das S/A: Desafios da Neutralidade Tributária e do Direito Societário. Volume III. Coord. Sergio André Rocha. São Paulo: Quartier Latin, 2012, pp. 347-348.

3 SCHOUERI, Luís Eduardo. Ágio em Reorganizações Societárias (Aspectos Tributários). São Paulo: Dialética, 2012, pp. 20-22.

4 ANDRADE FILHO, Edmar Oliveira. “O Regime Jurídico Tributário da Mais-Valia sobre Investimentos e do Ágio por Rentabilidade Futura na Vigência da Lei nº 12.973/2014”. Direito Tributário, Societário e a Reforma da Lei das S/A – Vol. IV. Coord. Sergio André Rocha. São Paulo: Quartier Latin, 2015, p. 141.

5 Veja-se: “A aplicação do princípio e as condições de reconhecimento pelo adquirente podem resultar no re-conhecimento de alguns ativos e passivos que não tenham sido anteriormente reconhecidos como tais nas demonstrações contábeis da adquirida. Por exemplo, o adquirente reconhece os ativos intangíveis identificá-veis adquiridos como uma marca ou uma patente ou um relacionamento com clientes, os quais podem não ter sido reconhecidos como ativos nas demonstrações contábeis da adquirida por terem sido desenvolvidos internamente e os respectivos custos terem sido registrados como despesa”.

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a um item patrimonial específico, passível de negociação individual. É o que ensinam

Eliseu Martins e Sérgio de Iudícibus, na passagem a seguir transcrita:

Ágio por rentabilidade futura é um ativo que representa benefícios econô-micos futuros resultados dos ativos adquiridos em combinação de negó-cios, os quais não são individualmente identificados ou separadamente reconhecidos.6

Logo, o ágio por rentabilidade futura corresponde à parcela do preço de aqui-

sição que não pode ser alocada a ativos passíveis de identificação individual e de

reconhecimento segregado nas demonstrações financeiras. Daí se dizer que a noção

de ágio está relacionada à sinergia obtida com a exploração dos bens que compõem

o patrimônio empresarial, tendo em vista que os ativos da empresa adquirida, explo-

rados em conjunto, proporcionam um valor superior ao que seria obtido com cada

bem individualmente.

Dessa forma, o ágio por rentabilidade futura pode estar relacionado a inúmeros

fatores, como a localização, a fidelidade dos clientes, a reputação comercial, a fatia

de mercado (market share), a qualidade da administração, o treinamento dos profis-

sionais, o conhecimento tecnológico, a capacidade mercadológica, entre outros efei-

tos sinergéticos oriundos dos ativos da sociedade adquirida.7 Diante do seu caráter

residual, pode-se afirmar que o ágio de rentabilidade futura representa uma aptidão

adicional para a geração de lucros, que não pode ser atribuída a ativos específicos.

Com relação ao tratamento tributário, o artigo 22 da Lei nº 12.973/2014 dispõe

que a pessoa jurídica que absorver patrimônio de outra, em virtude de incorporação,

fusão ou cisão, na qual detinha participação societária adquirida com ágio por ren-

tabilidade futura, decorrente de operação realizada entre “partes não dependentes”,

poderá excluir, para fins de determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL,

o saldo do referido ágio existente na contabilidade na data da aquisição da participa-

ção societária, à razão de 1/60 (um sessenta avos), no máximo, para cada mês do

período de apuração.

No caso de incorporação, fusão ou cisão, a mais-valia oriunda de ativos líquidos

recebidos da sociedade investida poderá ser considerada como parte integrante do

custo do bem ou direito que lhe deu causa, para efeito de determinação do ganho ou

6 MARTINS, Eliseu; IUDÍCIBUS, Sérgio de. “Intangível – sua Relação Contabilidade/Direito – Teoria, Estruturas Conceituais e Normas – Problemas Fiscais de Hoje”. Controvérsias Jurídico-Contábeis (Aproximações e Distan-ciamentos). 2º Volume. Coord. Roberto Quiroga Mosquera e Alexsandro Broedel Lopes. São Paulo: Dialética, 2011, p. 79.

7 LOPES, Alexsandro Broedel; MARTINS, Eliseu. “Do Ágio Baseado em Expectativa de Rentabilidade Futura – Algumas Considerações Contábeis”. Controvérsias Jurídico-Contábeis (Aproximações e Distanciamentos). 3º Volume. Coord. Roberto Quiroga Mosquera e Alexsandro Broedel Lopes. São Paulo: Dialética, 2012, p. 37.

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perda de capital, bem como para o cômputo da depreciação, amortização ou exaus-

tão, conforme prevê o artigo 20 da Lei nº 12.973/2014. Assim, a mais-valia de ativos

poderá ser reconhecida pelo contribuinte, para fins de determinação do lucro real e da

base de cálculo da CLL, nas seguintes hipóteses: (a) apuração do ganho ou perda de

capital, em caso de alienação ou baixa do investimento; (b) depreciação, amortização

ou exaustão do ativo que lhe deu causa, após o evento de incorporação, fusão ou

cisão; ou (c) determinação do ganho ou perda de capital, quando da alienação do

ativo subjacente, após o evento de incorporação, fusão ou cisão.

Entretanto, para a aplicação do tratamento tributário comentado acima, é ne-

cessário o atendimento aos seguintes requisitos: (i) a aquisição da participação so-

cietária deve ter sido realizada entre partes não dependentes; (ii) o laudo técnico que

fundamenta a mais-valia deve ser registrado tempestivamente; (iii) o bem ou direito

deve estar intrinsecamente relacionado com produção ou comercialização de bens ou

serviços; e (iv) o saldo da mais-valia deve ser objeto de controle em subconta contábil.

O presente estudo pretende examinar especificamente o item (i) acima, que

exige que a aquisição da participação societária tenha sido realizada entre “partes

não dependentes”, para que o tratamento tributário ora exposto seja aplicável.

3 As operações de combinação de negócios

De acordo com o Pronunciamento Técnico CPC nº 15, o conceito de combinação

de negócios abrange a “operação ou outro evento por meio do qual um adquirente

obtém o controle de um ou mais negócios, independentemente da forma jurídica da

operação”. Assim, a regra contábil alcança quaisquer operações que impliquem a

transferência do controle de um negócio, assim entendido o conjunto integrado de ati-

vidades e de ativos capaz de ser conduzido e gerenciado para a obtenção de benefícios

econômicos futuros, sob a forma de dividendos, redução de custos e outros proventos

similares, para investidores, proprietários, membros ou participantes.8 Em suma, o

conceito de combinação de negócios assemelha-se à aquisição de uma empresa,

de um fundo de comércio ou de um estabelecimento fabril, não sendo necessária a

aquisição de uma pessoa jurídica ou a realização de uma reorganização societária.9

8 Registre-se que a Interpretação Técnica ICPC nº 09 dispôs que a sociedade que adquirir participação societária em sociedade coligada ou controlada em conjunto deve utilizar a metodologia do Pronunciamento Técnico CPC nº 15, identificando os ativos e passivos transferidos a valor justo e reconhecendo apenas a diferença como ágio de rentabilidade futura ou como ganho por compra vantajosa, conforme o caso (cf. HADDAD, Gustavo Lian; PAES, Gustavo Duarte. “O Ágio por Expectativa de Rentabilidade Futura na Lei 12.973 e o Goodwill na Com-binação de Negócios – Aproximações e Distanciamentos”. Controvérsias Jurídico-Contábeis (Aproximações e Distanciamentos). 6º Volume. Coord. Roberto Quiroga Mosquera e Alexsandro Broedel Lopes. São Paulo: Dialética, 2015, p. 255).

9 BLOK, Marcella. Reorganizações Societárias, Fusões, Incorporações, Cisões e Outros Eventos Societários – Aspectos Legais, Negociais e Práticos. São Paulo: Quartier Latin, 2014, pp. 30-31.

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Diversamente, para fins fiscais, o artigo 20 do Decreto-Lei nº 1.598/1977,

mesmo após a edição da Lei nº 12.973/2014, sempre determinou o desdobramento

do custo de aquisição em qualquer aquisição de participação societária avaliada pelo

MEP, o que torna o âmbito de aplicação do regime tributário do ágio de rentabilidade

futura distinto da sistemática geral do ágio reconhecido em operações de combinação

de negócios.

Ainda segundo as novas regras contábeis, o ágio baseado em expectativa

de rentabilidade futura não deve ser reconhecido como um ativo na contabilidade

da sociedade adquirente, no caso de operação realizada dentro do mesmo grupo

societário.10

Neste sentido, o Pronunciamento Técnico CPC nº 15, ao tratar dos critérios de

avaliação de ativos e passivos assumidos em operações de combinação de negócios,

estabelece a sua inaplicabilidade às operações societárias realizadas entre partes

relacionadas, inseridas no contexto de grupos econômicos, sob o argumento de que

essas operações não se revestem de substância econômica e de independência

entre as partes envolvidas. Assim, para a aplicação do conceito de combinação de

negócios, exige-se a alteração de controle societário pela transação, o que impede a

sua aplicação às operações entre partes relacionadas.

O ágio gerado entre pessoas de um mesmo grupo econômico é questionável

sob o ponto de vista econômico-contábil, em razão da inexistência de valoração eco-

nômica. Isso porque a ciência contábil parte do pressuposto de que o ágio corres-

ponde ao resultado econômico oriundo da aquisição de determinado investimento

por meio de um processo de negociação entre partes independentes. Nesta visão, o

ágio decorre de um processo de barganha negocial não viciado, que concorre para a

formação de um preço justo. Assim, o registro de ágio somente seria concebível em

operações realizadas entre partes independentes, conhecedoras do negócio e livres

de pressões ou outros interesses.11

10 Veja-se: “O ágio derivado de expectativa de rentabilidade futura (goodwill) gerado internamente não deve ser reconhecido como ativo. (...) porque não é um recurso identificável (ou seja, não é separável nem advém de direitos contratuais ou outros direitos legais) controlado pela entidade que pode ser mensurado com segurança ao custo” (trecho dos itens 47 e 48 do CPC 4).

11 Sobre o tema, conferir a análise da Comissão de Valores Mobiliários no item 20.1.7 do Ofício Circular CVM/SNC/SEP nº 1/2007: “A CVM tem observado que determinadas operações de reestruturação societária de grupos econômicos (incorporação de empresas ou incorporação de ações) resultam na geração artificial de ‘ágio’. (...). Em nosso entendimento, ainda que essas operações atendam integralmente os requisitos societários, do ponto de vista econômico-contábil é preciso esclarecer que o ágio surge, única e exclusivamente, quando o preço (custo) pago pela aquisição ou subscrição de um investimento a ser avaliado pelo método da equivalência patrimonial, supera o valor patrimonial desse investimento. E mais, preço ou custo de aquisição somente surge quando há o dispêndio para se obter algo de terceiros. Assim, não há, do ponto de vista econômico, geração de riqueza decorrente de transação consigo mesmo. Qualquer argumento que não se fundamente nessas assertivas econômicas configura sofisma formal e, portanto, inadmissível. Não é concebível, econômica e contabilmente, o reconhecimento de acréscimo de riqueza em decorrência de uma transação dos acionistas com eles próprios. Ainda que, do ponto de vista formal, os atos societários tenham atendido à legislação aplicável (não se questiona aqui esse aspecto), do ponto de vista econômico, o registro

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A despeito do Pronunciamento Técnico CPC nº 15, é importante ressaltar que a

Lei nº 6404/1976 sempre permitiu, nos balanços individuais, o reconhecimento do

lucro gerado em operações realizadas entre partes relacionadas. O artigo 250 da cita-

da lei apenas prevê que, nas demonstrações financeiras consolidadas, é obrigatória

a eliminação dos resultados ainda não realizados, em operações formalizadas entre

as sociedades.12 Ora, se é obrigatório eliminar tais valores do balanço consolidado,

é forçoso reconhecer que esses valores estão registrados nas demonstrações finan-

ceiras individuais.13

Antes da edição da Lei nº 12.973/2014, não havia regra jurídica restringindo o

reconhecimento do ágio em operações internas.14 Ao contrário, sob o ponto de vista

tributário, prevalecia a ideia de que as operações realizadas entre partes relacionadas

deveriam seguir o mesmo tratamento tributário aplicável às operações entre partes

independentes, como ocorre em relação às regras de distribuição disfarçada de lu-

cros e às regras de preços de transferência. Dessa forma, ainda que a contabilidade,

em certas circunstâncias, não admitisse o ágio gerado internamente,15 as normas

jurídicas exigiam que as transações realizadas entre partes relacionadas recebessem

o mesmo tratamento daquelas praticadas por partes independentes.

4 O “ágio interno” na jurisprudência administrativa

Nos últimos anos, a jurisprudência administrativa formada no âmbito do Con-

selho Administrativo de Recursos Fiscais (“CARF”) vem sendo bastante rigorosa em

relação à possibilidade de amortização fiscal do ágio de rentabilidade futura gerado

em operações realizadas dentro do mesmo grupo econômico, salvo em situações

excepcionais, nas quais há verdadeiro fluxo econômico ou pagamento de preço, bem

como acionistas minoritários ou terceiros envolvidos no quadro societário do grupo

econômico.

de ágio, em transações como essas, somente seria concebível se realizada entre partes independentes, conhecedoras do negócio, livres de pressões ou outros interesses que não a essência da transação, condições essas denominadas na literatura internacional como ‘arm’s length’. Portanto, é nosso entendimento que essas transações não se revestem de substância econômica e da indispensável independência entre as partes, para que seja passível de registro, mensuração e evidenciação pela contabilidade”.

12 Confira-se: “Art. 250. Das demonstrações financeiras consolidadas serão excluídas: (...) III – as parcelas dos resultados do exercício, dos lucros ou prejuízos acumulados e do custo de estoques ou do ativo não circulante que corresponderem a resultados, ainda não realizados, de negócios entre as sociedades. (Redação dada pela Lei nº 11.941, de 2009)”.

13 Neste sentido, conferir: MARTINS, Eliseu; IUDÍCIBUS, Sérgio de. “Ágio Interno – É um mito?” Controvérsias Jurídico-Contábeis (Aproximações e Distanciamentos). 4º Volume. Coord. Roberto Quiroga Mosquera e Alexsandro Broedel Lopes. São Paulo: Dialética, 2013, pp. 95-96.

14 SCHOUERI, Luís Eduardo. Ágio em Reorganizações Societárias (Aspectos Tributários). São Paulo: Dialética, 2012, p. 112.

15 Segundo Edison Carlos Fernandes: “De maneira geral, a norma contábil também prevê essa restrição, porém, não de modo absoluto, como faz a lei tributária (...)” (FERNANDES, Edison Carlos. Impacto da Lei nº 11.638/07 sobre os Tributos e a Contabilidade. 3ª edição. São Paulo: Atlas, 2015, p. 154).

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No acórdão nº 1101-000.968, de 9.10.2013 (“Caso Mann+Hummel”), o CARF

não admitiu a amortização do ágio formado em operação realizada dentro de grupo

econômico, sem a intervenção de partes independentes e o pagamento de preço a

terceiros.

ÁGIO INTERNO. AMORTIZAçÃO. IMPOSSIBILIDADE. Inadmissível a forma-ção de ágio por meio de operações internas, sem a intervenção de partes independentes e sem o pagamento de preço a terceiros.

Em sentido semelhante, no acórdão nº 1301-00058, de 13.5.2009 (“Caso

Aché”), o CARF considerou artificial o ágio gerado em operação realizada entre partes

relacionadas, sem pagamento de preço ou desembolso financeiro efetivo.16

No acórdão nº 1103-00501, de 30.06.2011 (“Caso Center Automóveis”), o

CARF reputou inválida a amortização fiscal de ágio gerado dentro do mesmo grupo

econômico, sem a alteração do controle das sociedades envolvidas, sem qualquer

desembolso de recursos e com a utilização de empresa inativa ou de curta duração

(“empresa-veículo”) pertencente aos mesmos sócios. Veja-se:

OPERAçÕES SOCIETÁRIAS. ENCARGO DE AMORTIZAçÃO DE ÁGIO GERA-DO COM UTILIZAçÃO DE SOCIEDADE VEÍCULO. ÁGIO DE SI MESMO. ABU-SO DE DIREITO. O ágio gerado em operações societárias, para ser eficaz perante o Fisco, deve decorrer de atos econômicos efetivamente existen-tes. A geração de ágio de forma interna, ou seja, dentro do mesmo grupo econômico, sem a alteração do controle das sociedades envolvidas, sem qualquer desembolso e com a utilização de empresa inativa ou de curta duração (sociedade veículo) constitui prova da artificialidade do ágio e torna inválida sua amortização. A utilização dos formalismos inerentes ao registro público de comércio engendrando afeiçoar a legitimidade destes atos caracteriza abuso de direito. (destaques do autor)

Por igual forma, no acórdão nº 1101-00913, de 09.07.2013 (“Caso Planova”),

cuja ementa é idêntica à transcrita acima, o CARF manteve glosa da amortização

fiscal de ágio, em virtude de sua formação ter ocorrido em operações internas, dentro

do mesmo grupo econômico, sem a intervenção de partes independentes e sem o

pagamento de preço17.

16 Confira-se o seguinte trecho do voto do relator: “O planejamento tributário engendrado pela Recorrente, que ao menos no que tange aos seus efeitos fiscais revela o lado perverso das práticas adotadas sob esse manto, representou, em síntese, a criação de uma despesa que tem por base a própria mais valia do seu patrimônio, isto é, a contribuinte, a partir de uma avaliação encomendada por ela própria, fez refletir no seu ativo os resultados de uma suposta rentabilidade futura e, por meio de uma reorganização societária, sem despender um único centavo, transformou essa mais valia em uma despesa” (acórdão n. 1301-00058, de 13.5.2009).

17 No mesmo sentido, é possível colacionar, entre tantos outros, os seguintes julgados: acórdão n. 1301-001350, de 4.12.2013 (“Caso MDF Molduras”); acórdão n. 1402-001.211, de 3.10.2012 (“Caso Viação Campos”); acórdão n. 1402-001.278, de 4.12.2012 (“Caso Natura”); acórdão n. 1402-001.338, de 6.3.2013 (“Caso Mime Distribuidora”).

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A RESTRIçÃO AO APROVEITAMENTO DO ÁGIO DE RENTABILIDADE FUTURA NAS OPERAçÕES...

No acórdão nº 101-96724, 28.5.2008 (“Caso Libra”), a 1ª câmara do antigo

Primeiro Conselho de Contribuintes analisou situação em que participação societária

foi utilizada para a realização de aporte de capital, por valor superior ao respectivo

valor contábil, seguido de incorporação da sociedade que recebeu o investimento

(investidora) pela sociedade investida, sem que tivesse ocorrido qualquer mutação

patrimonial nas empresas antes e após os atos realizados. Confira-se a ementa da

decisão:

INCORPORAçÃO DE SOCIEDADE. AMORTIZAçÃO DE ÁGIO NA AQUISIçÃO DE AçÕES. SIMULAçÃO. A reorganização societária, para ser legítima, deve decorrer de atos efetivamente existentes, e não apenas artificial e formalmente revelados em documentação ou na escrituração mercantil ou fiscal. A caracterização dos atos como simulados, e não reais, autoriza a glosa da amortização do ágio contabilizado.

Na mesma linha, a 5ª Câmara do Primeiro Conselho de Contribuintes, no acórdão

nº 105-17219, de 17.9.2008 (“Caso Ficap”), analisou a aquisição de participação so-

cietária na FICAP ocorrida em 1997, sem o pagamento de ágio. Em 2001, a sociedade

adquirente constituiu a FCP e integralizou o respectivo capital com as ações da FICAP,

com o registro de ágio na FCP baseado na expectativa de rentabilidade futura. Ainda

em 2001, a FCP foi incorporada pela FICAP, que passou a amortizar o ágio.

Assunto: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA - IRPJ ANO- CALENDÁRIO: 2001, 2002, 2003, 2004, 2005 Ementa: ÁGIO NA INCOR-PORAçÃO – Não demonstrado o pagamento de ágio, não há de se falar em aproveitamento do mesmo pela incorporadora.

Para maior clareza, cabe transcrever os seguintes trechos do voto proferido pelo

conselheiro relator Marcos Rodrigues de Mello:

Admitir-se a dedução deste suposto ágio seria admitir que qualquer em-presa que tivesse adquirido ações de outra em período anterior à Lei 9.532, poderia, a qualquer tempo, reavaliar a empresa investida, consti-tuir nova empresa e, ato contínuo, incorporá-la, aproveitando o ágio dela mesmo.

Verificando a situação fática da recorrente antes e depois da incorpora-ção, verificamos que continua submetida ao mesmo controle acionário, tendo apenas feito uma reavaliação com base em rentabilidade futura dela mesmo e, se aceita a operação, usufruindo de benefício fiscal previs-to apenas quando se, efetivamente, houvesse pagamento em operação de aquisição ou equivalente.

Como se vê, o voto evidencia a preocupação do relator com a subscrição de

capital com participação societária reavaliada, dentro do mesmo grupo econômico,

sem que tenha ocorrido o pagamento de ágio em etapa anterior.

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Por outro lado, é de se destacar que, em outros julgados, o CARF considerou

que o exame da validade da operação deve ser baseado nas circunstâncias da origem

e da formação do ágio, sendo considerado irrelevante se a participação societária

adquirida foi posteriormente transferida para uma sociedade relacionada à adquirente

após a aquisição.

Com efeito, no acórdão nº 1202-000.884, de 3.10.2012 (“Caso Johnson

Controls”), o CARF considerou relevante o fato de a aquisição original da participa-

ção societária ter ocorrido entre partes não relacionadas, com efetivo dispêndio de

recursos. A posterior utilização da participação societária para aumento de capital,

ainda que dentro do mesmo grupo econômico, proporciona o registro de um novo ágio

na sociedade adquirente, mas que é mero reflexo da aquisição anterior entre partes

independentes. Veja-se:

ÁGIO INTERNO. EFETIVO DISPÊNDIO E FALTA DE PROPÓSITO NEGOCIAL. DESCARACTERIZAçÃO. Verificado que as negociações de reorganização societária ocorreram com empresas de diferentes grupos econômicos e que houve o efetivo desembolso financeiro na operação de aquisição da empresa incorporada, é de se afastar os fundamentos utilizados pelo agente fiscal quanto à falta de propósito negocial e do efetivo dispêndio de recursos nas operações de aquisição/reestruturação societária. ÁGIO. SURGIMENTO. TRANSFERÊNCIA. AMORTIZAçÃO. O ágio nasce quando uma empresa adquire participação relevante em outra sociedade e so-mente se transfere por incorporação reversa, cisão ou fusão (art. 386 do RIR/99). A transferência de quotas na integralização de capital não implica em transferência do ágio, mas em extinção do ágio que havia na alienante e surgimento de um novo ágio na adquirente. O ágio gerado no aumento de capital da fiscalizada mediante conferência de quotas da investida, com atendimento dos requisitos do art. 385 do RIR/99, é um ágio novo e pode ser amortizado a partir da incorporação dessa última, nos termos do art. 386 do RIR/99.

Na mesma linha, no acórdão n. 1302-001145, de 10.10.2013 (“Caso Sul

América”), o CARF considerou que a lei tributária não impede a aproveitamento do

ágio gerado em operações internas. No voto do conselheiro designado para redigir o

voto vencedor, consta que o contribuinte comprovou a existência de motivação eco-

nômica para a operação, a independência entre as partes na formação do preço pago

pela participação societária, a existência de efetivo pagamento do ágio (baseado em

laudo de avaliação de empresa especializada) e a modificação do percentual de par-

ticipação no controle da empresa operacional após a reorganização, com a redução

da participação acionária dos antigos controladores. Veja-se a ementa da decisão:

ÁGIO INTERNO. INCORPORAçÃO REVERSA. AMORTIZAçÃO. Para fins fis-cais, o ágio decorrente de operações com empresas do mesmo grupo (dito ágio interno), não difere em nada do ágio que surge em operações

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A RESTRIçÃO AO APROVEITAMENTO DO ÁGIO DE RENTABILIDADE FUTURA NAS OPERAçÕES...

entre empresas sem vínculo. Não há dispositivo legal que vede ou anule tal ato devendo os atos da administração pública seguir o princípio da le-galidade. Ocorrendo a incorporação reversa, o ágio poderá ser amortizado nos termos previstos nos arts. 7º e 8º da Lei nº 9.532, de 1997.

No acórdão nº 1301-001224, de 11.6.2013 (“Caso Banco GMAC”), que envolve

ágio gerado na aquisição de participação societária dentro do mesmo grupo econô-

mico, o CARF considerou que a efetivação da reorganização societária, mediante a

utilização de empresa veículo, não configura simulação, pois não há descompasso

preordenado e consciente entre a declaração e a vontade, a fim de enganar terceiros.

Veja-se:

INCORPORAçÃO DE SOCIEDADE. AMORTIZAçÃO DE ÁGIO. ARTIGOS 7º E 8º DA LEI Nº 9.532/97. PLANEJAMENTO FISCAL INOPONÍVEL AO FISCO. INOCORRÊNCIA. A efetivação da reorganização societária, mediante a uti-lização de empresa veículo, não resulta economia de tributos diferente da que seria obtida sem a utilização da empresa veículo e, por conseguinte, não pode ser qualificada de planejamento fiscal inoponível ao fisco. O ‘abuso de direito’ pressupõe que o exercício do direito tenha se dado em prejuízo do direito de terceiros, não podendo ser invocada se a utilização da empresa veículo, exposta e aprovada pelo órgão regulador, teve por objetivo proteger direitos (os acionistas minoritários), e não violá-los. Não se materializando excesso frente ao direito tributário, pois o resultado tri-butário alcançado seria o mesmo se não houvesse sido utilizada a empre-sa veículo, nem frente ao direito societário, pois a utilização da empresa veículo deu-se, exatamente, para a proteção dos acionistas minoritários, descabe considerar os atos praticados e glosar as amortizações do ágio.

É importante mencionar, ainda, o conhecido acórdão nº 1101-00708, de

11.4.2012 (“Caso Gerdau”), no qual o CARF considerou ser irrelevante, para fins

fiscais, se o ágio surgiu em operações realizadas dentro do mesmo grupo econômico.

Confira-se:

ÁGIO. ÁGIO INTERNO. É a legislação tributária que define os efeitos fiscais. As distinções de natureza contábil (feitas apenas para fins contábeis) não produzem efeitos fiscais. O fato de não ser considerado adequada a con-tabilização de ágio, surgido em operação com empresas do mesmo grupo, não afeta o registro do ágio para fins fiscais.

Na situação examinada no acórdão nº 1402-001310, de 5.12.2012 (“Caso

Biosintética Farmacêutica”), a Aché Laboratórios adquiriu participação societária na

Biosintética, com o pagamento de ágio baseado na rentabilidade futura. Essa parti-

cipação societária foi transferida para a Delta Participações, mediante aumento de

capital. Em seguida, a Delta foi incorporada pela Biosintética, que passou a amortizar

o ágio.

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Ao examinar o caso, o CARF considerou atendidas as premissas básicas para

amortização do ágio, registrando, ainda, que a utilização da Delta Participações foi

justificada por questões operacionais, dentre as quais se destaca a necessidade de

aprovação da operação de concentração pelo CADE (caso a Ache tivesse incorporado

a Biosintética). Veja-se:

AMORTIZAçÃO DO ÁGIO PREMISSAS. As premissas básicas para amorti-zação de ágio, com fulcro nos art. 7o., inciso III, e 8o. da Lei 9.532 de 1997, são: i) o efetivo pagamento do custo total de aquisição, inclusive o ágio; ii) a realização das operações originais entre partes não ligadas; iii) seja demonstrada a lisura na avaliação da empresa adquirida, bem como a expectativa de rentabilidade futura. Cumprida essas premissas, cancela-se a glosa. INCORPORAçÃO DE SOCIEDADE - AMORTIZAçÃO DE ÁGIO - ARTIGOS 7º E 8º DA LEI Nº 9.532/97. PLANEJAMENTO FISCAL REGULAR. UTILIZAçÃO DE EMPRESA VEÍCULO. É regular o planejamento, sob amparo dos artigos 7º e 8º da Lei nº 9.532/97, mediante a utiliza-ção de empresa veículo, desde que não tenha resulte em aparecimento de novo ágio, tampouco em economia de tributos diferente da que seria obtida sem a utilização da empresa veículo. Recurso Voluntário Provido.

De acordo com os julgados acima, para a caracterização do ágio, a operação de

aquisição da participação societária deve ser realizada entre partes independentes,

que, de comum acordo, estabelecem um preço que reflete o valor real do inves-

timento, baseado em fundamentos econômicos que demonstrem a expectativa de

rentabilidade futura.

Em resumo, pode-se dizer que o problema enfrentado na maior parte dos acór-

dãos examinados pelo CARF está na simulação e na falta de substância das ope-

rações, e não propriamente na existência de vínculo societário entre as partes.18 A

irregularidade está na inexistência de mudança na situação jurídica e na estrutura

patrimonial das partes envolvidas, independentemente do vínculo societário entre as

entidades.

5 A invalidade da restrição completa ao aproveitamento do ágio em operações entre partes dependentes

Como visto acima, o artigo 22 da Lei nº 12.973/2014 passou a vedar o aprovei-

tamento do ágio de rentabilidade futura nas transações entre partes dependentes.19

18 Para uma análise mais detida: TAKATA, Marcos Shigueo. “Ágio Interno sem Causa ou ‘Artificial’ e Ágio Interno com Causa ou Real – Distinções Necessárias”. Controvérsias Jurídico-Contábeis (Aproximações e Distancia-mentos). 3º Volume. Coord. Roberto Quiroga Mosquera e Alexsandro Broedel Lopes. São Paulo: Dialética, 2012, pp. 194-214.

19 SILVEIRA, Ricardo Maito; SILVEIRA, Rodrigo Maito. “Evolução Histórica do Benefício Fiscal de Amortização do Ágio na Aquisição de Participações Societárias e a Nova Regulação Introduzida pela Lei nº 12.973/2014”.

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A RESTRIçÃO AO APROVEITAMENTO DO ÁGIO DE RENTABILIDADE FUTURA NAS OPERAçÕES...

Art. 22. A pessoa jurídica que absorver patrimônio de outra, em virtude de incorporação, fusão ou cisão, na qual detinha participação societária adquirida com ágio por rentabilidade futura (goodwill) decorrente da aqui-sição de participação societária entre partes não dependentes, apurado segundo o disposto no inciso III do caput do art. 20 do Decreto-Lei nº 1.598, de 26 de dezembro de 1977, poderá excluir para fins de apuração do lucro real dos períodos de apuração subsequentes o saldo do referido ágio existente na contabilidade na data da aquisição da participação so-cietária, à razão de 1/60 (um sessenta avos), no máximo, para cada mês do período de apuração.

Como se vê, o legislador proibiu a amortização fiscal do ágio de rentabilidade

futura decorrente da aquisição de participação societária entre “partes dependen-

tes”. Com isso, o legislador proibiu todo e qualquer ágio gerado dentro do próprio

grupo econômico, independentemente da existência, ou não, de substância efetiva,

mutação patrimonial, pagamento de preço, mudança na composição societária etc.

A alteração legislativa foi criticada por Humberto Ávila, pois a lei não pode pre-

sumir, em caráter absoluto, a existência de vício nas reorganizações societárias rea-

lizadas entre entidades do mesmo grupo econômico, sem que as partes possam

comprovar a existência de fundamentos jurídicos e econômicos que possam justificar

tais operações.20 A Constituição Federal admite restrições à liberdade individual, des-

de que isso seja feito com a observância de fundamentos de interesse público e dos

procedimentos formais previstos para tanto. Assim, o direito de liberdade e de livre

iniciativa pode ser restringido para atender a razões de interesse público, mediante

edição de lei formal.21 O problema surge justamente quando a restrição é realizada

de forma excessiva, arbitrária e sem fundamento constitucional, anulando, assim, o

princípio da liberdade e da livre iniciativa, como ocorre com a Lei nº 12.973/2014.

Elidie Palma Bifano acrescenta que a restrição ao aproveitamento do ágio e

da mais-valia de ativos nas transações entre partes dependentes não se sustenta

diante do princípio da isonomia, por impor a contribuintes em situações idênticas

encargos tributários distintos. A autora ainda adverte que as operações entre partes

dependentes, por vezes, são realizadas de forma adequada e com base nos valores

de mercado, em razão de regras de governança corporativa e da necessidade de

auditoria em suas demonstrações financeiras.22

Direito Tributário, Societário e a Reforma da Lei das S/A – Vol. IV. Coord. Sergio André Rocha. São Paulo: Quartier Latin, 2015, p. 464.

20 ÁVILA, Humberto. “Notas sobre o Novo Regime Jurídico do Ágio”. Controvérsias Jurídico-Contábeis (Aproxi-mações e Distanciamentos). 5º Volume. Coord. Roberto Quiroga Mosquera e Alexsandro Broedel Lopes. São Paulo: Dialética, 2014, pp. 156-157.

21 FOLLONI, André. “Planejamento Tributário e Norma Antielisiva no Direito Brasileiro”. Planejamento Tributário. Coord. Hugo de Brito Machado. São Paulo: Malheiros/ICT, 2016, pp. 70-71.

22 BIFANO, Elidie Palma. “Reflexões sobre Alguns Aspectos da Lei nº 12.973/2014”. Tributação Atual da Renda – Estudo da Lei n. 12.973/14: da harmonização jurídico-contábil à tributação de lucros do exterior. Coord. Daniele Souto Rodrigues e Natanael Martins. São Paulo: Noeses, 2015, pp. 99-100.

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De fato, as pessoas ou situações são iguais ou desiguais em função de um

critério diferenciador, que apenas adquire relevo material na medida em que se lhe

agrega uma finalidade,23 a qual deve estar respaldada em outros objetivos da ordem

constitucional. Assim, cabe ao intérprete investigar a validade da justificativa utilizada

para distinguir os contribuintes (i.e., “partes independentes” e “partes dependen-

tes”), bem como a sua relação de pertinência com a finalidade que a distinção busca

alcançar.

No caso vertente, a restrição inserida na Lei nº 12.973/2014 está baseada na

premissa apriorística e enviesada de que as operações societárias realizadas dentro

de um grupo econômico, em razão da mera existência de um interesse comum e

centralizado, são desprovidas de substancia efetiva, sendo realizadas apenas para o

aproveitamento fiscal do ágio. Nesta linha, supõe-se que o legislador poderia editar

uma lei para considerar tais operações ineficazes perante o Fisco, afastando, com

isso, ônus da fiscalização federal de comprovar, em cada caso concreto, a existência

de patologia (i.e., a subsistência de vício relativo à existência ou a validade do ato ou

negócio jurídico praticado pelo contribuinte).

Todavia, é de se reconhecer que a premissa é absolutamente equivocada, pois

ignora um universo de possibilidades e diversas circunstâncias que podem justificar o

reconhecimento do ágio em operações realizadas entre pessoas jurídicas integrantes

do mesmo grupo econômico. A título de exemplo, é possível mencionar as seguintes

situações: aumento de capital subscrito por um único sócio, em que o registro do

ágio evita a diluição injustificada do outro sócio ou acionista; aumento de capital para

ingresso de novo sócio na sociedade; aquisição de participação societária em que há

sócios ou acionistas minoritários envolvidos; aumento de capital em pessoa jurídica

com patrimônio negativo, com pagamento em dinheiro.

Por isso, o legislador deveria ter estabelecido, na introdução da regra antielisiva

específica,24 critérios para separar o “ágio interno artificial” do “ágio interno legíti-

mo”. As reorganizações societárias envolvem operações complexas e que abrangem

diversas variáveis, de modo que o legislador deveria, no mínimo, ter estabelecido

critérios para identificar eventuais irregularidades nas operações realizadas pelos

contribuintes.

23 ÁVILA, Humberto. Conceito de Renda e Compensação de Prejuízos Fiscais. São Paulo: Malheiros, 2011, pp. 21-22.

24 No presente estudo, optou-se por utilizar a expressão “regra antielisiva específica”, em vez de “regra antielu-siva específica”, porque, a todo rigor, o artigo 22 da Lei nº 12.973/2014 não alcança apenas atos ou negócios jurídicos desprovidos de causa ou formalmente atípicos, realizados com o intuito exclusivo de economia fiscal e mediante violação indireta da lei. Ao contrário, qualquer ato ou negócio jurídico realizado entre “partes de-pendentes” foi alcançado pela restrição, de modo que se está, tecnicamente, no campo da elisão fiscal, isto é, do planejamento tributário que deveria ser considerado juridicamente válido.

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A RESTRIçÃO AO APROVEITAMENTO DO ÁGIO DE RENTABILIDADE FUTURA NAS OPERAçÕES...

Além de perquirir as razões que justificam o tratamento jurídico-tributário dife-

renciado, como feito acima, cabe ao intérprete investigar se a medida escolhida pelo

legislador para atingir a finalidade passa pelo postulado da proporcionalidade.25

Como se sabe, a proporcionalidade representa um postulado normativo

aplicativo,26 que serve para o controle da validade de uma norma infraconstitucional

que interfere no escopo de uma norma constitucional de direito fundamental. Assim,

o exame da proporcionalidade requer a presença de três elementos: (i) a norma cons-

titucional de direito fundamental (o direito de liberdade e a livre iniciativa); (ii) uma

norma infraconstitucional (o artigo 22 da Lei nº 12.973/14); e (iii) uma interferência

(a restrição ao aproveitamento fiscal do ágio de rentabilidade futura gerado em ope-

rações entre “partes dependentes”).27

O postulado da proporcionalidade requer três exames: adequação, necessidade

e proporcionalidade em sentido estrito.28

A adequação determina que a medida empregada na norma jurídica deve ser

hábil, capaz e eficaz para a produção de efeitos que promovam a realização gradual

da finalidade almejada pelo legislador. Assim, a medida deve produzir efeitos que

claramente contribuam para a realização do fim pretendido pelo legislador. Em suma,

a adequação investiga a compatibilidade e harmonia entre os fins desejados pelo

Estado e os meios efetivamente utilizados para alcançá-los.

A seu turno, a necessidade apregoa que a medida deve ser a menos restritiva

aos direitos fundamentais ou aos princípios constitucionais atingidos. Além de con-

tribuir para a gradual promoção da finalidade visada pela norma jurídica, a medida

adotada deve ser a menos restritiva dentre todas aquelas disponíveis e igualmente

adequadas para atingir o fim pretendido pelo legislador naquela situação.

Por último, a proporcionalidade em sentido estrito indica que a medida adotada

pelo legislador deverá provocar mais efeitos positivos em relação à gradual promo-

ção do fim colimado pelo preceito normativo, em comparação aos efeitos negativos

gerados pelas restrições causadas aos direitos fundamentais ou aos princípios cons-

titucionais atingidos.

Com inteira razão, Humberto Ávila sustenta que a restrição introduzida pela Lei

nº 12.973/2014 padece de desproporcionalidade, pois a eventual existência de vício

no ágio gerado em atos ou negócios jurídicos realizados entre sociedades do mesmo

grupo societário deveria ser objeto de comprovação mediante devido processo legal

25 ÁVILA, Humberto. “Notas sobre o Novo Regime Jurídico do Ágio”. Controvérsias Jurídico-Contábeis (Aproxi-mações e Distanciamentos). 5º Volume. Coord. Roberto Quiroga Mosquera e Alexsandro Broedel Lopes. São Paulo: Dialética, 2014, pp. 156-157.

26 ÁVILA, Humberto. Teoria do Princípios – Da Definição à Aplicação dos Princípios Jurídicos. 16ª edição. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 205.

27 BARAK, Aharon. “Proportionality”. Constitutional rights and their limitations. Cambridge: Cambridge University, 2012, p. 131-145.

28 ÁVILA, Humberto. Conceito de Renda e Compensação de Prejuízos Fiscais. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 74.

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(inadequação). Além disso, há meios igualmente adequados e menos restritivos para atingir a finalidade de impedir o aproveitamento de ágios em reorganizações socie-tárias eivadas de patologia, como é o caso do procedimento regular de fiscalização com a imposição de multas punitivas (desnecessidade). Por fim, os efeitos negativos produzidos pela proibição legal superam os seus efeitos positivos, pois, para punir contribuintes desonestos, adotou-se uma medida dirigida a todos os contribuintes (desproporcionalidade em sentido estrito).29 30

Na mesma linha, Luís Eduardo Schoueri e Roberto Codorniz Leite Pereira apon-tam que o critério de discriminação excessivamente amplo utilizado pelo legislador, que alcança qualquer aquisição de participação societária entre “partes não depen-dentes”, acaba por gerar efeitos indutores positivos, ao coibir o ágio interno artificial, mas também efeitos indutores negativos, ao restringir o ágio interno real e efetivo. Assim, caso o critério eleito pelo legislador fosse mais bem calibrado, seria possível prestigiar apenas os seus efeitos indutores positivos, sem prejudicar operações reais e efetivas praticadas pelos contribuintes.31

Os autores também chamam a atenção para a inconsistência e o nítido propósi-to arrecadatório da alteração legislativa, uma vez que o ganho de capital eventualmen-te auferido pelo alienante, na mesma operação societária que gerou o ágio interno, continuará sendo submetido à tributação pelo imposto de renda.32 Esse aspecto ape-nas confirma a ausência de cuidado do legislador na disciplina jurídica do tema, que deveria ter adotado um critério para atingir apenas o ágio gerado artificialmente, em operações desprovidas de substância.

Ainda que se considere a vedação ao aproveitamento do ágio como uma “regra antielisiva específica”,33 ou como uma “regra de prevenção”,34 que tipifica atos e

29 ÁVILA, Humberto. “Notas sobre o Novo Regime Jurídico do Ágio”. Controvérsias Jurídico-Contábeis (Aproxi-mações e Distanciamentos). 5º Volume. Coord. Roberto Quiroga Mosquera e Alexsandro Broedel Lopes. São Paulo: Dialética, 2014, pp. 156-157.

30 Em sentido semelhante, veja-se a lição de Edmar Oliveira Andrade Filho: “A possibilidade de existência, em tese, de simulação não pode servir de razão para que sejam condenadas as operações realizadas por pessoas ligadas e que gerem ágio amortizável. Cada caso deve ser analisado de acordo com as circunstâncias fáticas e jurídicas pertinentes” (ANDRADE FILHO, Edmar Oliveira. Estudos e Pareceres sobre Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas. São Paulo: MP Editora, 2007, p. 54).

31 SCHOUERI, Luís Eduardo; PEREIRA, Roberto Codorniz Leite. “O Ágio Interno na Jurisprudência do CARF e a (Des)proporcionalidade do Artigo 22 da Lei nº 12.973/2014”. Análise de casos sobre aproveitamento de ágio: IRPJ e CSLL – à luz da jurisprudência do CARF – Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. Coord. Marcelo Magalhães Peixoto e Maurício Pereira Faro. São Paulo: MP Editora, 2016, p. 377.

32 SCHOUERI, Luís Eduardo; PEREIRA, Roberto Codorniz Leite. “O Ágio Interno na Jurisprudência do CARF e a (Des)proporcionalidade do Artigo 22 da Lei nº 12.973/2014”. Análise de casos sobre aproveitamento de ágio: IRPJ e CSLL – à luz da jurisprudência do CARF – Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. Coord. Marcelo Magalhães Peixoto e Maurício Pereira Faro. São Paulo: MP Editora, 2016, pp. 377-378.

33 Segundo André Martins de Andrade: “A par da cláusula geral antielisiva, valem-se inúmeras jurisdições de regras especiais com a finalidade específica de coarctar determinados procedimentos que envolvem a utilização de institutos jurídicos que por sua natureza ou configuração, dariam azo à manipulação por parte das empresas que se encontram presentes em múltiplas jurisdições” (ANDRADE, André Martins de. A tributação universal da renda universal: uma proposta de sistematização e uma alternativa inovadora. Belo Horizonte: Fórum, 2008, p. 141).

34 Nas palavras de Heleno Torres: “(...) as chamadas normas de prevenção, ou de correção, (...) são formas de tipificação dos atos ou negócios jurídicos sujeitos a efeitos elusivos, que visam a alcançar o respectivo controle

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A RESTRIçÃO AO APROVEITAMENTO DO ÁGIO DE RENTABILIDADE FUTURA NAS OPERAçÕES...

negócios jurídicos comumente praticados pelos contribuintes para reduzir a carga

tributária, a verdade é que o legislador, na fixação de regras gerais e abstratas, não

pode se afastar de princípios constitucionais que orientam o sistema tributário brasi-

leiro, como as regras de discriminação de competências impositivas e o princípio da

capacidade contributiva. Assim, para a sua validade no ordenamento jurídico, a “regra

antielisiva” em questão deveria distinguir os contribuintes que realizam operações

efetivas, com a ocorrência de mutações patrimoniais efetivas e o sacrifício de ativos

(substância jurídica e econômica35), daqueles contribuintes que realizam operações

artificiais e sem substancia, apenas para a obtenção de economia fiscal (atos ou

negócios jurídicos com vício nos planos de existência ou de validade).

Tanto é assim que o Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do Recurso

Especial nº 1107518-SC, relatado pela Ministra Eliana Calmon, no qual o contribuinte

pleiteou a declaração de invalidade do artigo 33 do Decreto-lei nº 2341/1987, que

proíbe a transferência de prejuízos fiscais nas incorporações, considerou esse enun-

ciado normativo como uma norma particular (específica) de combate à elisão tributá-

ria. Neste julgamento, o STJ assentou que o fisco pode providenciar o preenchimento

dos espaços de elisão que estejam em aberto na legislação, mas que isso deve ser

feito por meio de alteração legislativa e com a observância dos limites constitucio-

nais, uma vez que o fisco não tem poder geral amplo para a desconsideração dos

atos e negócios jurídicos praticados pelo contribuinte. Veja-se:

A limitação à compensação na sucessão de pessoas jurídicas visa evitar a elisão tributária e configura regular exercício da competência tributária quando realizado por norma jurídica pertinente. (...)

Também se levou em conta que tais reorganizações societárias servem como planejamento tributário e que o Fisco tem a faculdade de preencher os vazios legais para otimizar a arrecadação (...).

A norma de compensação é norma de exercício da competência tributária do ente federativo e são fixadas segundo as balizas do CTN, mas com amplo espectro de liberdade pelos titulares do poder tributário. Nesse sentido, os entes federativos são livres para editar as normas que melhor lhe convierem, respeitados tão somente as balizas constitucionais.

sob a égide do princípio da legalidade, preventivamente, vendado o uso de benefícios fiscais, ampliando o alcance do conceito da materialidade tributável ou limitando o uso de créditos, etc. (...) normas preventivas, antecipando-se às condutas elusivas, são instituídas para fechar os espaços de elusão” (TORRES, Heleno Taveira. “Medidas contra a evasão e elusão fiscal internacional no direito brasileiro”. Impuestos sobre el comercio internacional. Coord. Alejandro C. Tôrres Altamirano e Victor Uckmar. Buenos Aires: Ábaco, 2003, p. 924).

35 Vale registrar, aqui, a lição de Humberto Ávila: “(...) não há substância econômica fora do direito que regula o patrimônio. Não existe riqueza, se ela não gera nenhum poder de disponibilização, de troca, de compra. Que riqueza seria esta que não poderia ser cobrada, trocada, segundo o Direito Civil? A forma e a substância, nesse sentido, são dadas pelo Direito Civil” (ÁVILA, Humberto. Contribuições e Imposto sobre a Renda – Estu-dos e Pareceres. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 269).

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A regra do art. 33 do Decreto-lei n. 2.341/87 foi editada nesse diapasão: para vedar a compensação de prejuízos fiscais nas operações de transfor-mações da pessoa jurídica. Depreende-se de tal modo de proceder que o objetivo foi impedir a elisão tributária, pois muitas empresas viram a reor-ganização societária como instrumento de planejamento tributário e pas-saram a se reorganizar com o único intuito da economia de tributos. (...).

O titular da competência tributária pode através de normatização adequa-da excluir as zonas de não incidência para impedir a utilização da elisão tributária.

As regras antielisivas específicas, particulares ou especiais oferecem maior so-

lidez no fechamento das lacunas que servem de espaço para a elisão fiscal, além

de contribuírem para a redução das inseguranças que acometem as normas gerais

antielusivas.

Com efeito, sabe-se que o planejamento tributário, além de pressupor o manejo

inteligente do direito positivo e das estruturas de negócio,36 também pode atuar na

seara da ausência ou incompletude do texto legislativo, explorando possibilidades

jurídicas que surgem em razão de lacunas nas regras de incidência tributária, para

evitar ou reduzir a carga fiscal.37 O direito positivo e o próprio sistema tributário são

menores do que a realidade econômica e social subjacente, na qual os contribuintes

realizam os seus atos e negócios jurídicos.38 Assim, com edição de regras antielisi-

vas específicas, o legislador pode tipificar as condutas utilizadas pelos contribuintes

apenas para contornar a norma jurídica de incidência (v.g., inserindo o ato ou negócio

jurídico no campo da incidência; restringindo a dedução de despesas; vedando o

uso de benefícios fiscais; ampliando a materialidade tributável; limitando o uso de

créditos fiscais etc.).

Neste contexto, Ricardo Lobo Torres pondera que as cláusulas gerais antielisão,

por serem ambíguas e analógicas, devem ser complementadas por cláusulas especí-

ficas que ofereçam maior consistência na redução das oportunidades de elisão fiscal,

ainda que o fechamento do ordenamento jurídico por meio de cláusulas especiais

seja um ideal inalcançável39 e que, ao longo do tempo, pode acarretar no fenômeno

da inflação legislativa.

De qualquer modo, é evidente que, assim como em qualquer caso de exercício

da competência tributária, a criação de regras antielisivas específicas deve observar

36 ANDRADE FILHO, Edmar Oliveira. Planejamento Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 9. 37 Nas palavras de Sacha Calmon Navarro Coêlho: “Tem-se elisão por lacuna quando a lei deixa buracos nas

malhas da imposição (loopholes), devidamente aproveitados pelos contribuintes” (COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. “Considerações acerca do Planejamento Tributário no Brasil”. Planejamento Tributário. Coord. Hugo de Brito Machado. São Paulo: Malheiros/ICT, 2016, p. 642).

38 SABBAG, Eduardo de Moraes. “Planejamento Tributário: Relevância do Tema e Conceitos Jurídicos Envolvidos”. Planejamento Tributário. Coord. Hugo de Brito Machado. São Paulo: Malheiros/ICT, 2016, p. 175.

39 TORRES, Ricardo Lobo. Planejamento Tributário: elisão abusiva e evasão fiscal. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012, pp. 57-58.

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os limites constitucionais que orientam o sistema tributário brasileiro, sob pena de

inconstitucionalidade. As regras antielisivas específicas devem ser utilizadas para col-

matar lacunas, corrigir imperfeições e fechar brechas exploradas por meio da prática

de atos ou negócios jurídicos, mas sempre com a observância dos limites impostos

pelo ordenamento jurídico.40 Portanto, a regra antielisiva específica jamais pode con-

ferir autorização para o exercício do poder de tributar fora dos limites da competência

tributária.

A rigor, o valor relativo ao ágio de rentabilidade futura não representa um be-

nefício fiscal, que pode ser livremente restringido pelo legislador. Ao revés, trata-se

de pagamento ou sacrifício de ativo suportado pelo adquirente para a aquisição de

participação societária, bem como para a obtenção de lucro futuro com o empreendi-

mento. Logo, a dedução da despesa relativa à amortização do ágio, longe de repre-

sentar um incentivo fiscal, configura um pressuposto indispensável para a tributação

da renda líquida do contribuinte.41

Neste aspecto, a restrição à dedução fiscal do ágio de rentabilidade futura

acarreta a tributação de renda superior ao acréscimo patrimonial experimentado pelo

contribuinte, na medida em que proíbe a dedução de um custo efetivo, que represen-

ta uma redução patrimonial (i.e., fato-decréscimo). Ocorre que a Constituição Federal

somente atribui ao legislador a competência para instituir o imposto sobre a renda

e os proventos de qualquer natureza, de modo que a exação fiscal não pode recair

sobre patrimônio, capital, faturamento ou qualquer outra materialidade que não cons-

titua renda.42 43 Assim, considerando os limites extraídos das regras de discrimina-

ção de competência, que delimitam a hipótese material de incidência do imposto de

renda, é certo que a excessiva amplitude da restrição à dedução do ágio acarreta a

inconstitucionalidade do dispositivo legal ora examinado.

Na mesma direção, Sergio Bento aponta que o ágio representa um custo de

aquisição efetivo, que deve ser considerado na apuração da renda auferida pelo con-

tribuinte. Assim, eventual restrição à dedução do ágio, por meio de “regra antielusiva”,

apenas poderia atuar no campo das anomalias que distorcem o sistema tributário,

40 GUTIERREZ, Miguel Delgado. Planejamento Tributário – Elisão e Evasão Fiscal. São Paulo: Quartier Latin, 2006, pp. 223-232.

41 RIBEIRO, Ricardo Lodi; SANTOS, Flávio Mattos dos. “Natureza Jurídica da Amortização Fiscal do Ágio: despesa necessária, benefício fiscal ou norma antielisiva”. O Ágio no Direito Tributário e Societário. Coord. Eduardo Maneira e Igor Mauler Santiago. São Paulo: Quartier Latin, 2015, pp. 40-41.

42 Para o enfoque do presente estudo, não é necessário entrar na discussão a respeito da existência, ou não, de um conceito constitucional de renda. Isso porque, mesmo que se considere que o Poder Constituinte trabalhou com tipos na discriminação das competências impositivas, o fato é que, ainda assim, os limites mencionados acima devem ser observados pelo legislador infraconstitucional. Para uma análise do tema, conferir: MACHADO, Raquel Cavalcanti Ramos. Competência tributária: entre a rigidez do sistema e a atualização interpretativa. São Paulo: Malheiros, 2014.

43 ÁVILA, Humberto. Contribuições e Imposto sobre a Renda – Estudos e Pareceres. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 271.

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sem alcançar transações em que não houve qualquer manipulação do custo pago na

aquisição do investimento.44 Vale repisar que há situações em que se justifica a exis-

tência de ágio de rentabilidade futura dentro do mesmo grupo societário, como ocorre

nas hipóteses em que as pessoas jurídicas envolvidas têm acionistas minoritários

distintos, o que é comum nos casos de companhias abertas.45

É bem verdade que Marco Aurélio Greco, um dos principais autores invocados

pela Administração Tributária, aponta que as operações entre partes relacionadas

“recomendam especial atenção”, em razão: (i) da existência de interesse comum

no relacionamento entre seus membros; (ii) da possibilidade de realização de ato ou

negócio jurídico em proveito do grupo societário, mas contra o interesse da pessoa

jurídica; (iii) da facilidade para manipulação de preços ou condições dos atos ou ne-

gócios jurídicos, em comparação com o padrão de mercado.46 Porém, o próprio autor

reconhece que “uma conclusão só pode ser emitida à vista de cada caso concreto e

diante das múltiplas circunstâncias que o cercam, não apenas no plano da formula-

ção abstrata”.47

Seguindo posição semelhante, Fábio Piovesan Bozza pontua que, como a carac-

terização da simulação exige o conluio entre as partes do negócio jurídico e o intuito

de enganar terceiros, é natural supor que essa patologia ocorre, com maior frequên-

cia, nas operações realizadas entre partes pertencentes ao mesmo grupo econômico,

a despeito das personalidades jurídicas distintas e do princípio da autonomia patri-

monial. Porém, o fato de se tratar de operação realizada entre empresas do mesmo

grupo societário pode ser tomado apenas como um elemento circunstancial que,

associado a outros, pode dar densidade à comprovação da simulação. Isoladamente,

o vínculo entre as pessoas jurídicas não pode funcionar como prova suficiente da

simulação,48 assim como não pode ser utilizado pelo legislador para, em caráter geral

e abstrato, proibir o aproveitamento do ágio.

Por fim, cabe mencionar que o artigo 25 da Lei nº 12.973/2014 também exage-

rou ao estabelecer o conceito de “partes dependentes”, o que confere uma amplitude

excessiva à vedação ao aproveitamento do chamado “ágio interno”.49

44 Veja-se: “(...) uma norma antielisiva deve atuar em anomalias que distorcem o sistema instituído. Não em vícios individuais, posto que o próprio sistema tributário já os excluem da respectiva validade (....) Isto posto, a indedutibilidade causada por transações entre partes dependentes deveria ser vista restritivamente e somente em operações que possam macular a formação de custo naturalmente dedutível” (BENTO, Sergio. “Tratamento Tributário do Ágio”. Lei 12.973/14 – Novo Marco Tributário: Padrões Internacionais de Contabilidade. Coord. Marcelo Lima Vieira et al. São Paulo: Quartier Latin, 2015, p. 131).

45 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. “Questões Atuais sobre o Ágio – Ágio Interno – Rentabilidade Futura e Intangível – Dedutibilidade das Amortizações – As Inter-relações entre a Contabilidade e o Direito”. Controvérsias Jurídico-Contábeis (Aproximações e Distanciamentos). 2º Volume. São Paulo: Quartier Latin, 2011, p. 232.

46 GRECO, Marco Aurélio. Planejamento Tributário. 3ª edição. São Paulo: Dialética, 2011, pp. 466-468. 47 GRECO, Marco Aurélio. Planejamento Tributário. 3ª edição. São Paulo: Dialética, 2011, p. 460.48 BOZZA, Fábio Piovesan. Planejamento Tributário e Autonomia Privada. São Paulo: Quartier Latin/IBDT, 2015,

pp. 240-241. 49 FERNANDES, Edison Carlos. Impacto da Lei nº 11.638/07 sobre os Tributos e a Contabilidade. 3ª edição. São

Paulo: Atlas, 2015, p. 154.

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De fato, o artigo 25 da Lei nº 12.973/2014 considera que haverá relação de

dependência quando: (i) o adquirente e o alienante são controlados, direta ou indire-

tamente, pela mesma parte ou partes; (ii) existir relação de controle entre o adqui-

rente e o alienante; (iii) o alienante for sócio, titular, conselheiro ou administrador da

pessoa jurídica adquirente; (iv) o alienante for parente ou afim até o terceiro grau,

cônjuge ou companheiro das pessoas relacionadas no item (iii); ou (v) em decorrência

de outras relações não descritas nos itens (i) a (iv) acima, em que fique comprovada

a dependência societária.

Como se pode ver, ao contrário do que ocorre com outras operações entre par-

tes relacionadas sujeitas a controle fiscal, como as regras de preços de transferência

e de subcapitalização, o legislador optou por adotar um rol exemplificativo para as

hipóteses de caracterização de “partes dependentes”, o que torna a lei ainda mais

ampla e indefinida. O legislador deveria ter exaurido, no texto legal, todos os elemen-

tos necessários para a definição de “partes dependentes”, sem adotar, no item (v)

acima, uma cláusula residual aberta.

Não se quer, com isso, dizer que o legislador deve utilizar termos precisos e

fechados, que possam ser aplicados por meio de simples subsunção lógica, sem

qualquer espécie de valoração ou de recurso a elementos estranhos à própria lei.

Tampouco se pretende engessar a carga construtiva e valorativa do processo de inter-

pretação. Na verdade, o que se pretende enfatizar, nesta passagem, é a importância

do princípio da estrita legalidade para elevar o grau de certeza e de segurança jurídica

no âmbito do direito tributário, conferindo substância ao princípio democrático e eli-

minando a discricionariedade da Administração Tributária na aplicação das normas

que definem as exações fiscais.50 Por isso, entende-se que o legislador poderia ter

introduzido no texto legal referências mais claras e concretas sobre os critérios que

poderão ser utilizados para a caracterização da chamada “dependência societária”.

Observe-se que a clareza e a determinação da lei tributária são exigências do

princípio da legalidade, bem como do princípio da segurança jurídica, que emanam

do Estado Democrático de Direito e da própria Separação dos Poderes, tendo em

vista que, quanto maior for o grau de indeterminação no conteúdo da lei, tanto maior

será a margem de atuação e de discricionariedade conferida ao Poder Executivo e à

Administração Tributária.51

O princípio da segurança jurídica, fundado na concepção do Estado Democrático

de Direito, também concretiza a clareza e a determinação da lei tributária, ao consa-

grar valores como a inteligibilidade, a confiabilidade e a previsibilidade.52

50 GODOI, Marciano Seabra de. “Planejamento Tributário”. Planejamento Tributário. Coord. Hugo de Brito Machado. São Paulo: Malheiros/ICT, 2016, p. 489.

51 TIPKE, Klaus; LANG, Joachim. Direito Tributário (Steuerrecht). Volume I. Tradução de Luiz Dória Furquim. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2008, p. 245.

52 YAMASHITA, Douglas. Direito Tributário – Uma Visão Sistemática. São Paulo: Atlas, 2014, p. 53.

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Da mesma forma, o princípio da estrita legalidade tributária surge justamente na concretização do princípio da segurança jurídica, pois a obrigatoriedade de edição de lei para disciplinar a relação jurídico-tributária não é uma exigência apenas formal, representando, na verdade, um instrumento para a promoção da inteligibilidade, da confiabilidade e da previsibilidade. Isso é assim porque, na seara tributária, o con-tribuinte apenas consegue antever os efeitos tributários dos seus atos ou negócios jurídicos se as leis tributárias forem editadas de forma clara e objetiva, preservando a segurança jurídica.53

Portanto, a obscuridade e a indeterminação do artigo 25 da Lei nº 12.973/2014 maculam diversos fundamentos estruturais do ordenamento jurídico brasileiro.

6 A ausência de caráter interpretativo na alteração legislativa

A redação da Exposição de Motivos EM nº 00187/2013 MF, que acompanhou a Medida Provisória nº 627/2013, convertida na Lei nº 12.973/2014, aparentemente pretende impingir um caráter interpretativo à vedação ao aproveitamento do ágio de rentabilidade futura nas operações realizadas entre partes dependentes. Veja-se:

32. O art. 21 estabelece prazos e condições para a dedução do novo ágio por rentabilidade futura (goodwill) na hipótese de a empresa absorver patrimônio de outra, em virtude de incorporação, fusão ou cisão, na qual detinha participação societária adquirida com goodwill, apurado segundo o disposto no inciso III do art. 20 do Decreto-Lei nº 1.598, de 1977. Es-clarece que a dedutibilidade do goodwill só é admitida nos casos em que a aquisição ocorrer entre empresas independentes.

Como se pode notar, a utilização do verbo “esclarecer” parece pretender atribuir ao dispositivo legal ora examinado um caráter interpretativo.

Antes de qualquer consideração sobre a relevância da Exposição de Motivos, deve-se pontuar, com base na lição de Karl Larenz, que o texto normativo representa, a um só tempo, o ponto de partida e o limite para a atividade de interpretação.54

Assim, o aplicador do direito não pode, na atividade de interpretação, criar ou atribuir significados subjetivos e arbitrários aos enunciados normativos, assim como não pode ir além do seu sentido linguisticamente possível. A interpretação jurídica não pode extrapolar a estrutura objetiva resultante da significação unitária e congruente dos veículos legislativos, o que constitui um limite objetivo do processo

hermenêutico.55

53 FREGONESI JÚNIOR, Maucir. Sistema Tributário Nacional – Doutrina, Prática e Reforma. São Paulo: Quartier Latin, 2010, pp. 50-53.

54 LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito. 6ª edição. Tradução de José Lamengo. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2012, pp. 282-285/450-469.

55 COELHO, Inocêncio Mártires Coelho. Interpretação Constitucional. 4ª edição. São Paulo: Saraiva, 2011, pp. 89; 103.

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Além disso, não se pode perder de vista que a lei vale pelo que ela diz, e não pelo que o seu legislador quis dizer, pois, uma vez promulgada, a lei desprende-se do legislador e da sua vontade (“intentio legislatoris”), para adquirir vida própria e “mens legis” autônoma. É o que ensina, com a habitual clareza, Karl Larenz ao afir-mar que “(...) uma lei, logo que seja aplicada, irradia uma acção que lhe é peculiar, que transcende aquilo que o legislador tinha intentado. A lei intervém em relações da vida diversas e em mutação, cujo conjunto o legislador não poderia ter abrangido e dá resposta a questões que o legislador ainda não tinha colocado a si próprio. Adquire, com o decurso do tempo, cada vez mais como que uma vida própria e afasta-se, deste modo, das ideais de seus autores”.56

Na mesma direção, Carlos Maximiliano ensina que a lei, após a sua promulga-ção, desvincula-se da vontade do legislador. Veja-se:

Com a promulgação, a lei adquire vida própria, autonomia relativa; separa-se do legislador; contrapõe-se a ele como um produto novo; dilata-se e até subs-titui o conteúdo respectivo sem tocar nas palavras; mostra-se, na prática, mais previdente que o seu autor.57

Não fosse assim, ficaria ao sabor do intérprete aceitar os termos da lei, dimi-nuí--los ou alargá-los ao seu talante e ao sabor das conveniências de cada situação concreta, o que geraria enorme confusão e insegurança jurídica ainda maior.

As considerações acima são importantes porque, no caso ora examinado, o texto da Lei nº 12.973/2014 não atribui, expressamente, caráter interpretativo à vedação ao aproveitamento fiscal do ágio de rentabilidade futura apurado entre “partes depen-dentes”. Ao contrário, a Exposição de Motivos, de autoria do Ministério da Fazenda, limita-se a sugerir que a nova lei possui, neste particular, caráter interpretativo.

Não se ignora que a hermenêutica histórica, que vasculha a Exposição de Motivos, os debates parlamentares e os trabalhos de elaboração envolvidos na ela-boração da lei, pode fornecer elementos e recursos importantes para a interpreta-ção jurídica. Os trabalhos preparatórios, que deixam a sua marca na Exposição de Motivos, auxiliam na reconstrução das razões que levaram à promulgação de uma lei, dentro do momento histórico de sua edição.58 Porém, o que não se pode admitir é a exacerbação do seu valor interpretativo, para suplantar os limites oriundos da estru-tura objetiva resultante da significação unitária e congruente dos veículos legislativos,

o que constitui um limite objetivo do processo hermenêutico.59

56 LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito. 6ª edição. Tradução de José Lamengo. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2012, p. 446.

57 MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito. 15ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 1995, pp. 30-31.58 BARRETO, Paulo Ayres. “O Tratamento Transnacional nos Preços de Transferência e seus Limites Constitu-

cionais”. Tributos e Preços de Transferência. 3º Volume. Coord. Luís Eduardo Schoueri. São Paulo: Dialética, 2009, p.139.

59 COELHO, Inocêncio Mártires. Interpretação Constitucional. 4ª edição. São Paulo: Saraiva, 2011, pp. 89; 103.

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RAMON TOMAZELA SANTOS

A bem de ver, se a intenção do legislador, evidenciada na Exposição de Motivos,

eventualmente diverge do que a lei exprime, deve-se reconhecer que caberia ao pró-

prio Poder Legislativo ter manifestado a sua intenção de maneira diferente e com

a necessária precisão, sendo que qualquer deficiência ou omissão no texto legal

editado, em relação à intenção subjacente do legislador, somente pode ser corri-

gida por meio do processo legislativo adequado, com a observância dos requisitos

constitucionais.

No caso ora examinado, o legislador se confunde com o Ministro da Fazenda,

por se tratar de vedação que constava do texto da Medida Provisória nº 627/2013 e

que foi posteriormente confirmada pelo Congresso Nacional. De todo modo, não se

pode atribuir a essa Exposição de Motivos do Ministro da Fazenda o caráter interpre-

tativo expresso que exige o artigo 106 do Código Tributário Nacional (“CTN”) para as

leis interpretativas.60

Como se não bastassem as considerações acima, cabe frisar que a atribuição

de caráter interpretativo à vedação ao “ágio interno” não faz qualquer sentido, pois

o artigo 20 do Decreto-Lei nº 1.598/1977 sempre determinou o desdobramento do

custo de aquisição em qualquer aquisição de participação societária avaliada pelo

MEP. Logo, o âmbito de aplicação do regime tributário do ágio de rentabilidade futura

sempre foi distinto da sistemática geral do ágio reconhecido em operações de com-

binação de negócios.

De fato, o Pronunciamento Técnico CPC nº 15 exige a transferência de controle

de um negócio, assim entendido o conjunto integrado de atividades e de ativos capaz

de ser conduzido e gerenciado para a obtenção de benefícios econômicos futuros,

sob a forma de dividendos, redução de custos e outros proventos similares, para in-

vestidores, proprietários, membros ou participantes. A Interpretação Técnica ICPC nº

09 dispôs que a sociedade que adquirir participação societária em sociedade coliga-

da ou controlada em conjunto deve utilizar a metodologia do Pronunciamento Técnico

CPC nº 15, identificando os ativos e passivos transferidos a valor justo e reconhecen-

do apenas a diferença como ágio de rentabilidade futura ou como ganho por compra

vantajosa, conforme o caso.61 Dessa forma, pode-se dizer que a norma contábil não

se vincula a qualquer forma jurídica específica, podendo alcançar a alienação de um

estabelecimento, de uma unidade operacional ou de um fundo de comércio, sem a

necessidade de aquisição da pessoa jurídica detentora dos respectivos ativos.

60 TROIANELLI, Gabriel Lacerda. “Repercussões Intertemporais das Novas Regras de Ágio Previstas na Lei nº 12.973/2014”. Grandes Questões Atuais do Direito Tributário. 18º Volume. São Paulo: Dialética, 2014, pp. 123-128.

61 HADDAD, Gustavo Lian; PAES, Gustavo Duarte. “O Ágio por Expectativa de Rentabilidade Futura na Lei 12.973 e o Goodwill na Combinação de Negócios – Aproximações e Distanciamentos”. Controvérsias Jurídico-Contábeis (Aproximações e Distanciamentos). 6º Volume. Coord. Roberto Quiroga Mosquera e Alexsandro Broedel Lopes. São Paulo: Dialética, 2015, p. 255.

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Por outro lado, a lei tributária sempre exigiu o desdobramento do ágio em qual-

quer aquisição de participação societária avaliada pelo MEP. Assim, a tentativa de

atribuir caráter interpretativo à vedação ao “ágio interno” não se sustenta diante

da interpretação histórica e sistemática da legislação tributária brasileira, especifi-

camente no que tange ao regime jurídico do ágio de rentabilidade futura, conforme

examinado acima.

7 Conclusões

As principais ideias expostas no presente trabalho podem ser assim resumidas:

– após a edição da Lei nº 12.973/2014, a mensuração e a alocação do ágio por

rentabilidade futura passou a seguir a sistemática do Pronunciamento Técnico CPC

nº 15, por meio do qual a sociedade investidora deve realizar a alocação do preço de

aquisição ao valor justo líquido dos ativos identificáveis adquiridos e dos passivos

assumidos, de modo que apenas o valor residual poderá ser tratado como ágio por

rentabilidade futura;

– a lei tributária permite o desdobramento do ágio em qualquer aquisição de

participação societária avaliada pelo MEP, ao passo que o Pronunciamento Técnico

CPC nº 15 exige a transferência do controle de um negócio. Assim, os âmbitos de

aplicação do Decreto-Lei nº 1.598/1977 e do Pronunciamento Técnico CPC nº 15 são

distintos;

– a Lei nº 12.973/2014, afastando-se do regime anterior, passou a vedar o

aproveitamento do ágio e da mais-valia de ativos nas transações entre partes de-

pendentes. Essa alteração legislativa é criticável, pois a lei não pode presumir, em

caráter absoluto, a existência de vício nas reorganizações societárias realizadas

entre sociedades do mesmo grupo societário, sem que as partes possam compro-

var a existência de fundamentos jurídicos e econômicos que possam justificar tais

particularidades;

– a restrição ao aproveitamento do ágio e da mais-valia de ativos nas transa-

ções entre partes dependentes não se sustenta diante do princípio da isonomia, por

impor a contribuintes em situações idênticas encargos tributários distintos;

– a restrição introduzida pela Lei nº 12.973/2014 padece de desproporcionali-

dade, sendo inadequada, desnecessária e desproporcional em sentido estrito;

– o legislador deveria ter estabelecido, na introdução da regra antielisiva espe-

cífica, critérios para separar o “ágio interno artificial” do “ágio interno legítimo”. Caso

o critério eleito pelo legislador fosse mais bem calibrado, seria possível prestigiar

apenas os seus efeitos indutores positivos, sem prejudicar operações reais e efetivas

praticadas pelos contribuintes;

– a atribuição de caráter interpretativo à vedação ao “ágio interno”, feita pela

Exposição de Motivos que acompanhou a Medida Provisória nº 627/2013, não se

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sustenta juridicamente, pois o artigo 20 Decreto-Lei nº 1.598/1977 sempre determi-

nou o desdobramento do custo de aquisição em qualquer aquisição de participação

societária avaliada pelo MEP. Logo, o âmbito de aplicação do regime tributário do ágio

de rentabilidade futura sempre foi distinto da sistemática geral do ágio reconhecido

em operações de combinação de negócios.

Abstract: This paper analyzes the restriction inserted in Law No. 12,973/2014 to tax amortization of the premium for future profitability generated in corporate reorganizations carried out between entities belonging to the same economic group.

Keywords: Premium for Future Profitability – Business Combinations – Related Parties –Validity – Absence of Interpretation Character of Absence.

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Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT):

SANTOS, Ramon Tomazela. A restrição ao aproveitamento do ágio de rentabilidade futura nas operações entre partes dependentes. Revista Fórum de Direito Tributário – RFDT, Belo Horizonte, ano 14, n. 82, p. 151-178, jul./ago. 2016.

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