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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO 2ª VARA CÍVEL - COMARCA DE XANXERÊ O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, pelo Promotor de Justiça titular da 2ª Promotoria de Justiça de Xanxerê, com fundamento nos arts. 127 e 129, III da Constituição da República, bem como no art. 17 da Lei n. 8.429/92 e no art. 5º da Lei nº 7.347/85, e nas informações colhidas no Procedimento nº 06.2013.00013236- 1, propõe AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA COM PEDIDO DE DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE ATO ADMINISTRATIVO em face de: ADEMIR JOSÉ GASPARINI, brasileiro, casado, Prefeito Municipal, nascido em 20 de novembro de 1958, em Xaxim, filho de Isidoro Gasparini e de Elide Trentin Ebertz, RG nº 1.015.291-SC, com domicílio funcional na rua José de Miranda Ramos, 455, Xanxerê;

Ação de improbidade prefeito - adriano dill - cessão de uso - sem licitação [06.2014.00000019-8]

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Ação de improbidade por cessão de uso de imóvel público sem licitação.

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA

EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO 2ª VARA CÍVEL - COMARCA DE XANXERÊ

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA

CATARINA, pelo Promotor de Justiça titular da 2ª Promotoria de Justiça de

Xanxerê, com fundamento nos arts. 127 e 129, III da Constituição da

República, bem como no art. 17 da Lei n. 8.429/92 e no art. 5º da Lei nº

7.347/85, e nas informações colhidas no Procedimento nº 06.2013.00013236-

1, propõe AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA COM PEDIDO DE

DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE ATO ADMINISTRATIVO em face de:

ADEMIR JOSÉ GASPARINI, brasileiro, casado, Prefeito

Municipal, nascido em 20 de novembro de 1958, em Xaxim, filho de Isidoro

Gasparini e de Elide Trentin Ebertz, RG nº 1.015.291-SC, com domicílio

funcional na rua José de Miranda Ramos, 455, Xanxerê;

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ADRIANO MARCOS DILL & CIA LTDA, pessoa jurídica de

direito privado, inscrita no CNPJ sob o nº 97.541.812/001-86, representada

pelo senhor Adriano Marcos Dill, CPF nº 017.598.309-76, residente na rua

Deolindo Ferronato, 506, Bairro Monte Castelo, Xanxerê;

MUNICÍPIO DE XANXERÊ, pessoa jurídica de direito público,

inscrita no CNPJ sob o nº 83.009.860/0001-13, representada pelo Prefeito

Municipal Ademir José Gasparini, com domicílio funcional na rua José de

Miranda Ramos, 455, Xanxerê.

1. Objetivo da ação

Esta ação de improbidade administrativa tem por objetivo obter

provimento jurisdicional que declare a ocorrência de ato de improbidade

administrativa que, ao ceder irregularmente o uso de imóvel público para

particular, sem licitação, causou prejuízo ao erário e contrariou os princípios da

administração pública praticado por Ademir José Gasparini em favor de Adriano

Marcos Dill & Cia Ltda. em agosto de 2013, aplicando as sanções

correspondentes ao agente.

Requer-se também seja decretada a nulidade do ato

administrativo (Contrato de Cessão de Uso nº 5/2013), determinando aos

responsáveis as providências necessárias para que a situação fática retorne ao

status quo.

2. Atos de improbidade administrativa

Em outubro de 2013 a 2ª Promotoria de Justiça recebeu inusitado

comunicado da Agência de Xanxerê da Casan (fl. 4), apresentando dúvida

sobre a legalidade da ligação de água num imóvel urbano de propriedade do

Município de Xanxerê e que estava sendo utilizado, mediante contrato de

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cessão de uso, por particular (fl. 5).

Diante da peculiaridade da situação, já que imóveis públicos não

podem ser cedidos a particular sem prévia licitação, muito menos quando se

tratar de área destinada a praça pública, como no caso dos autos, a 2ª

Promotoria de Justiça iniciou a realização das diligências necessárias a apurar

integralmente os fatos.

Identificou-se, então, que em agosto de 2013 o Município de

Xanxerê, pelo Prefeito Municipal Ademir José Gasparini, entabulou com Adriano

Marcos Dill & Cia Ltda. o Contrato de Cessão de Uso nº 5/2013, pelo qual cede

o uso do terreno urbano registrado sob o nº 26.006 no Cartório de Registro de

Imóveis de Xanxerê.

Este imóvel, conforme consta da cópia da Matrícula nº 26.006,

pertence de fato ao Município de Xanxerê e é destinado a servir de "praça

pública" (fl. 37).

Tal cessão foi autorizada pela Câmara de Vereadores, pela Lei nº

3.545/2013. Todavia, evidentemente, a autorização da Câmara não dispensa a

necessidade de licitação, tal como previsto no art. 17 da Lei de Licitações, nem

tampouco o cumprimento dos demais requisitos legais.

Diante desta constatação, o Ministério Público requisitou ao

Prefeito Municipal que informasse se houve licitação para a cessão de uso do

imóvel (fl. 32) e que realizasse vistoria para identificar se o imóvel cedido é que

estava de fato ocupado por Adriano Marcos Dill Ltda.

A resposta apresentada pelo Prefeito Municipal foi

propositalmente omissa em relação à existência ou não de prévia licitação.

Como poderá constatar Vossa Excelência da leitura daquele documento (fl. 48),

limitou-se o Administrador Municipal a informar que em vistoria realizada pelo

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departamento competente não se constatou a ocupação de imóvel diverso do

cedido, sem contudo informar se houve ou não licitação.

Neste ponto é preciso observar que, estivesse de boa-fé o senhor

Prefeito Municipal, certamente teria de pronto revisto seu ato e determinado a

anulação do contrato de cessão de uso. Era o mínimo que se poderia esperar.

Não foi o que ocorreu.

Na sequência, para deixar absolutamente clara a ilicitude em que

vinha incorrendo o prefeito, o Ministério Público recomendou expressamente,

por meio de ofício (fl. 44) a revogação da concessão de uso. No documento,

foram expressamente citados a legislação aplicável e o entendimento do

Tribunal de Contas do Estado.

Em resposta à recomendação, novamente, de forma evasiva, o

senhor Prefeito Municipal se limitou a afirmar que "a cessão de uso, em forma

de comodato, foi precedida de autorização legislativa, por meio da Lei nº AJG

nº 3545/13, a fim de se amparar o empresário e este continuar gerando

empregos e receita para o Município, em virtude de que o proprietário de

imóvel particular que a empresa vinha utilizando, por meio de locação, ter

solicitado a desocupação do mesmo. Isso motivou a cessão do terreno em

questão, com a exclusiva destinação de depósito dos bens e materiais da

empresa, o que vem ocorrendo" (fl. 49).

Em outras palavras, pela segunda vez, e desta feita depois de

receber recomendação expressa do Ministério Público, citando inclusive o

Prejulgado nº 1344 do TCE/SC, o Excelentíssimo Senhor Prefeito Municipal

simplesmente ignorou a Lei de Licitações e preferiu manter vigente contrato de

cessão de uso de imóvel destinado a praça pública, para que uma empresa

depositasse artefatos de cimento, telhas e pedras, o que até os dias atuais

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perdura.

3. Direito

3.1. Necessidade de prévia licitação para a cessão de direito de uso

A Lei nº 8.666/93 é clara em exigir também das concessões de

direito real de uso a prévia licitação:

Art. 17. A alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e obedecerá às seguintes normas:I - quando imóveis, dependerá de autorização legislativa para órgãos da administração direta e entidades autárquicas e fundacionais, e, para todos, inclusive as entidades paraestatais, dependerá de avaliação prévia e de licitação na modalidade de concorrência, dispensada esta nos seguintes casos: [...]".

Marçal Justen Filho analisa o dispositivo e ensina que "deve

reputar-se que as regras acerca de alienações abrangem amplamente

outras modalidades de relacionamento entre Administração e

particulares, versando sobre bens e potestades públicas. A Lei alude, na al. 'f'

do inc. I, à concessão de direito real de uso de bens imóveis. Há

expressa referência à permissão e à locação de bens imóveis. Rigorosamente,

essas figuras não se enquadram no conceito de 'alienação', mas estão

abrangidas nas regras correspondentes eis que envolvem a

transferência pela Administração da posse e de faculdades de uso e

fruição quanto a bens públicos. As locações e as permissões de uso, tanto

quanto as concessões de uso, são disciplinadas pelas regras desta Seção. Os

interesses em jogo são similares e há uma equivalência quanto ao tipo de

relacionamento entre a Administração e os particulares"1.

1 JUSTEN Fº, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 10ª ed. São Paulo : Dialética, 2004, p. 172

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O Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina também é

absolutamente claro a respeito, orientando, por meio do Prejulgado nº 1344, o

seguinte: "quando os incentivos para instalações de empreendimentos no

Município envolverem a disponibilização de bens imóveis públicos (terrenos) a

particulares (pessoas físicas ou jurídicas), deve-se privilegiar o emprego do

instituto da concessão do direito real de uso, para melhor resguardar o

interesse e o patrimônio públicos, mediante licitação (art. 17, §2º, da Lei

Federal nº 8.666/93) e prévia autorização legislativa onde também disponha

sobre as condições da concessão, inclusive sobre o vínculo às atividades para

as quais houve a concessão, prevendo a reversão do bem para o Município

após o transcurso do prazo da concessão ou quando não mais sejam atendidas

às condições da concessão, devendo estar demonstrado o interesse público" (fl.

24).

3.2. Improbidade administrativa

A conduta praticada configura o ato de improbidade do art. 10 da

Lei nº 8.429/92: “Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que

causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje

perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos

bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:

[...] II - permitir ou concorrer para que pessoa física ou jurídica privada

utilize bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das

entidades mencionadas no art. 1º desta lei, sem a observância das

formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie; [...] VIII -

frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente".

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Note-se que a improbidade do art. 10 também se configura com o

mero "desvio", com o "malbaratamento"2, não sendo necessário o efetivo

prejuízo ao patrimônio público, ou seja, uma perda mensurável em dinheiro.

De qualquer forma, a improbidade constatada nos autos também

configura infração ao disposto no art. 11 da Lei de Improbidade Administrativa:

“Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da

administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de

honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições”.

A licitação tem justamente por objetivo conferir imparcialidade

(ou impessoalidade às escolhas do administrador público). No caso dos autos o

que ficou evidente é que um empresário residente no município teve o contrato

de locação do imóvel que ocupava para depositar seu produto e, como se isso

dissesse respeito ao interesse público, o Município resolveu "ampará-lo" sob o

vago argumento de "gerar empregos e receita", que nem ao menos foram

mensurados. Não se realizou a necessária concorrência, para identificar quem,

dentre tantos interessados certamente existentes no Município, geraria maior

receita ou empregos; não se identificou nem ao menos o valor de mercado do

imóvel; não se deu publicidade à oportunidade, para que os demais, novos e

antigos empresários, pudessem se estabelecer no local. A imparcialidade e a

legalidade, como se vê, foram completamente abandonadas.

E isso tudo, ficou evidente nos autos, com nítido dolo. Estivesse

de boa-fé o Administrador Municipal, teria prontamente anulado a cessão, já

quando da primeira requisição do Ministério Público. Mas não, mesmo diante de

um segundo alerta, mais explícito ainda, por meio de recomendação, preferiu-

se manter a nulidade vigente, contrariando a Lei de Licitações, o Tribunal de

2 De acordo com o Dicionário Aurélio: "1. Vender abaixo do custo; vender com prejuízo. 2. Empregar ou gastar de forma inconveniente; dissipar; desperdiçar, desbaratar. 3. Empregar ou aplicar indevidamente".

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Contas e o Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

4. Sanções

As condutas ensejam a aplicação das sanções previstas no inciso

II e III do art. 12 da Lei nº 8.429/92. Eis as sanções aplicáveis ao caso: perda

da função pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos,

pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano, se houver, ou de

até 100 vezes o valor da remuneração do agente, proibição de contratar com o

Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta

ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja

sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos.

5. Pedidos

Ante o exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE

SANTA CATARINA requer:

a) a autuação da inicial, nos termos do procedimento previsto na

Lei de Improbidade Administrativa;

b) a notificação dos demandados, para a defesa preliminar, nos

termos do artigo 17, § 7º, da Lei nº 8.429/92, devendo o Município de Xanxerê

apresentar cópia do contracheque do Prefeito Municipal relativo ao mês de

agosto de 2013;

c) o recebimento da inicial e a citação dos requeridos para,

querendo, contestarem o feito, observado o procedimento previsto na Lei nº

8.429/92;

d) a produção de prova testemunhal, pericial e documental que

porventura for necessária;

e) a condenação do requerido Ademir José Gasparini às seguintes

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sanções: e1) pagamento de multa no valor de até 100 vezes a sua

remuneração de agosto de 2013; e2) suspensão dos direitos políticos por cinco

a oito anos; e3) proibição de contratar com o Poder Público ou receber

benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda

que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo

de cinco anos;

f) decretação da nulidade do Contrato de Cessão de Uso nº

5/2013, determinando-se aos requeridos, solidariamente, sob pena de multa

diária, no prazo de 30 dias, a desocupação do local e a restauração do local,

inclusive do gramado;

g) a condenação dos requeridos em custas, despesas processuais

e honorários advocatícios (estes conforme art. 4º do Decreto Estadual nº

2.666/04, em favor do Fundo de Recuperação de Bens Lesados do Estado de

Santa Catarina).

Dá-se à causa o valor de R$ 50.000,00.

Xanxerê, 4 de fevereiro de 2014

Eduardo Sens dos SantosPromotor de Justiça

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