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21º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental ABES – Trabalhos Técnicos 1 II-185 - OTIMIZAÇÃO DE UM REATOR UASB COMPARTIMENTADO APLICADO AO TRATAMENTO DE ESGOTOS TIPICAMENTE DOMÉSTICOS Leonardo H. Novy de C. Brito Engenheiro Civil pela Universidade Federal de Minas Gerais. Mestrando em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos pela UFMG. Carlos Augusto de Lemos Chernicharo (1) Engenheiro Civil e Sanitarista. Doutor em Engenharia Ambiental pela Universidade de Newcastle upon Tyne – UK. Professor Adjunto do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFMG. Marcos von Sperling Engenheiro Civil e Sanitarista. Doutor em Engenharia Civil pelo Imperial College – UK. Professor Adjunto do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFMG. Fernanda Narciso M. Barcellos Graduanda em Engenharia Civil pela UFMG, Bolsista de Iniciação Científica - CNPq. Endereço (1) : Av. Contorno, 842/701 – Centro - 30110-060 - Belo Horizonte – MG - Tel.: (31) 3238-1020, Fax: (31) 3238-1879 - E-mail:[email protected]. RESUMO O presente trabalho teve como objetivo a otimização de um reator UASB compartimentado, aplicado ao tratamento de esgotos domésticos. O reator UASB compartimentado, com volume útil de 9 m 3 , foi implantado junto à ETE-Nova Vista, em Itabira/MG. O sistema foi operado e monitorado por um período de aproximadamente 300 dias, com tempos de detenção hidráulica de 5,0 e 7,5 horas, em regimes hidráulico permanente e transiente. As melhores qualidades do efluente final foram conseguidas quando o reator UASB foi operado em regime hidráulico permanente, com TDH de 7,5 h. Nessa fase, foram obtidas concentrações de DBO, DQO e SST da ordem de 85 mgDBO.L -1 , 115 mgDQO.L -1 e 80 mgSST.L -1 . O trabalho discorre sobre uma série de mudanças que foram realizadas no sistema, que levaram à melhoria da qualidade do efluente do reator. O trabalho de otimização do reator deverá conduzir, possivelmente, ao aumento da profundidade câmara de digestão, a fim de minimizar a ocorrência de arraste de sólidos devido a picos de vazão afluente. PALAVRAS-CHAVE: Reator UASB compartimentado, automação, tratamento de esgotos. INTRODUÇÃO O tratamento anaeróbio de águas residuárias tem recebido atenção especial nas pesquisas desenvolvidas no Brasil, principalmente os reatores anaeróbios de alta taxa, uma vez que estes apresentam-se como unidades compactas e com elevada eficiência de tratamento. Esta eficiência, conjugada ao pequeno porte destes reatores, decorre da possibilidade de retenção no sistema de uma biomassa ativa, com boas características estruturais e biológicas. O presente trabalho de pesquisa busca alcançar as melhores condições de operação de um reator UASB compartimentado, através da implantação de um sistema automatizado de alimentação escalonada de vazões. O reator é dotado de três câmaras de digestão, três dispositivos de coleta de gás e um compartimento único de decantação. A fundamentação conceitual desse novo reator baseia-se no fato de que as grandes variações de vazão afluentes aos reatores convencionais, sejam devidas a hidrogramas típicos horários ou a sistemas de bombeamento a montante das estações, levam à ocorrência de velocidades ascensionais bastante elevadas no interior dos reatores, particularmente nas aberturas (passagens) para os compartimentos de decantação. Tais velocidades provocam o arraste indevido de lodo do sistema, com a conseqüente perda de eficiência devido à presença de material particulado no efluente. FOTO NÃO DISPONÍVEL

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21º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental

ABES – Trabalhos Técnicos 1

II-185 - OTIMIZAÇÃO DE UM REATOR UASB COMPARTIMENTADOAPLICADO AO TRATAMENTO DE ESGOTOS TIPICAMENTE DOMÉSTICOS

Leonardo H. Novy de C. BritoEngenheiro Civil pela Universidade Federal de Minas Gerais. Mestrando em Saneamento,Meio Ambiente e Recursos Hídricos pela UFMG.Carlos Augusto de Lemos Chernicharo (1)

Engenheiro Civil e Sanitarista. Doutor em Engenharia Ambiental pela Universidade deNewcastle upon Tyne – UK. Professor Adjunto do Departamento de Engenharia Sanitária eAmbiental da UFMG.Marcos von SperlingEngenheiro Civil e Sanitarista. Doutor em Engenharia Civil pelo Imperial College – UK.Professor Adjunto do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFMG.Fernanda Narciso M. BarcellosGraduanda em Engenharia Civil pela UFMG, Bolsista de Iniciação Científica - CNPq.

Endereço(1): Av. Contorno, 842/701 – Centro - 30110-060 - Belo Horizonte – MG - Tel.: (31) 3238-1020,Fax: (31) 3238-1879 - E-mail:[email protected].

RESUMO

O presente trabalho teve como objetivo a otimização de um reator UASB compartimentado, aplicado aotratamento de esgotos domésticos. O reator UASB compartimentado, com volume útil de 9 m3, foi implantadojunto à ETE-Nova Vista, em Itabira/MG. O sistema foi operado e monitorado por um período deaproximadamente 300 dias, com tempos de detenção hidráulica de 5,0 e 7,5 horas, em regimes hidráulicopermanente e transiente.As melhores qualidades do efluente final foram conseguidas quando o reator UASB foi operado em regimehidráulico permanente, com TDH de 7,5 h. Nessa fase, foram obtidas concentrações de DBO, DQO e SST daordem de 85 mgDBO.L-1, 115 mgDQO.L-1 e 80 mgSST.L-1.O trabalho discorre sobre uma série de mudanças que foram realizadas no sistema, que levaram à melhoria daqualidade do efluente do reator. O trabalho de otimização do reator deverá conduzir, possivelmente, aoaumento da profundidade câmara de digestão, a fim de minimizar a ocorrência de arraste de sólidos devido apicos de vazão afluente.

PALAVRAS-CHAVE: Reator UASB compartimentado, automação, tratamento de esgotos.

INTRODUÇÃO

O tratamento anaeróbio de águas residuárias tem recebido atenção especial nas pesquisas desenvolvidas noBrasil, principalmente os reatores anaeróbios de alta taxa, uma vez que estes apresentam-se como unidadescompactas e com elevada eficiência de tratamento. Esta eficiência, conjugada ao pequeno porte destesreatores, decorre da possibilidade de retenção no sistema de uma biomassa ativa, com boas característicasestruturais e biológicas.

O presente trabalho de pesquisa busca alcançar as melhores condições de operação de um reator UASBcompartimentado, através da implantação de um sistema automatizado de alimentação escalonada de vazões.O reator é dotado de três câmaras de digestão, três dispositivos de coleta de gás e um compartimento único dedecantação. A fundamentação conceitual desse novo reator baseia-se no fato de que as grandes variações devazão afluentes aos reatores convencionais, sejam devidas a hidrogramas típicos horários ou a sistemas debombeamento a montante das estações, levam à ocorrência de velocidades ascensionais bastante elevadas nointerior dos reatores, particularmente nas aberturas (passagens) para os compartimentos de decantação. Taisvelocidades provocam o arraste indevido de lodo do sistema, com a conseqüente perda de eficiência devido àpresença de material particulado no efluente.

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No reator UASB compartimentado, as variações de vazão são acomodadas em uma, duas ou três câmaras dedigestão, fazendo com que as variações de velocidade ascensional em cada câmara sejam muito menores, fatoque, além de possibilitar a manutenção de condições otimizadas de mistura no interior das mesmas, tambémdiminui o arraste de sólidos para o compartimento de decantação. Tendo em vista estes aspectos, buscou-seuma melhoria na eficiência do sistema (devido à otimização da mistura) e a produção de um efluente maisclarificado (devido ao melhor funcionamento do compartimento de decantação).

Em pesquisa anterior, voltada para o desenvolvimento do reator UASB compartimentado, CHERNICHARO &CARDOSO (1999) obtiveram ótimos resultados com o reator operando com tempos de detenção hidráulica de9,0 e 7,5 horas. Na presente pesquisa, buscou-se a verificação do comportamento do reator com a redução dotempo de detenção hidráulica e com a imposição da alimentação escalonada em regime hidráulico transiente.Esta foi conseguida com a implementação de um sistema automatizado de alimentação de vazões.

MATERIAL E MÉTODOS

CARACTERÍSTICAS DO SISTEMA

O reator UASB compartimentado, com volume útil de 9 m3, apresenta três câmaras de digestão que operamem paralelo, três separadores trifásicos e um compartimento único de decantação. As principais característicasdimensionais e construtivas do reator são apresentadas na Tabela 1. Na Figura 1 é apresentado um corteesquemático do reator e na Figura 2 uma vista da unidade construída.

Tabela 1 - Características gerais do Reator UASB CompartimentadoDescrição No. de

unidadesLargura útil

(m)Comprimento

útil (m)Altura

(m)Material

EmpregadoEstrutura do

Tanque1 1,00 3,00 3,00 concreto

armadoSeparadorTrifásico

3 Base = 0,90Topo = 0,20

base = 0,90topo = 0,20

0,52 chapa metálica

Câmaras deDigestão

3 1,00 1,00 1,60 chapa metálica

Figura 1 – Corte esquemático do reator UASB compartimentado

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Figura 2 – Vista da casa de controle e do reatorUASB compartimentado

CONDIÇÕES OPERACIONAIS E FASES DA PESQUISA

As condições operacionais durante as diferentes fases de funcionamento do reator são apresentadas na Tabela2. As fases I e II correspondem ao período de desenvolvimento e teste do reator, enquanto a fase III e IVcorrespondem ao período de operação do reator com alimentação escalonada automatizada.

Tabela 2 - Condições operacionais do reator Fase Operacional I II III IV

Tempo de detenção hidráulica (h) 9,0 7,5 5,0 7,5 Vazão mínima - Qmín. (m³/h) 0,50 0,60 0,90 0,60 Vazão média - Qméd. (m³/h) 1,00 1,20 1,80 1,20 Vazão máxima - Qmáx. (m³/h) 2,00 2,40 3,24 2,40 Velocidade superficial mínima (m/h) 0,50 0,60 0,90 0,60 Velocidade superficial média (m/h) 0,50 0,60 0,90 0,60 Velocidade superficial máxima (m/h) 0,67 0,80 1,08 0,80 Regime Hidráulico Permanente Permanente Transiente Transiente

No decorrer da pesquisa, as fases III e IV foram subdivididas por motivos de alterações e problemasoperacionais no reator, conforme a seguir:§ fase IIIa: operação do reator sem pré-filtro na tubulação de chegada§ fase IIIb: operação do reator com pré-filtro na tubulação de chegada e freqüência quinzenal de limpeza do

mesmo;§ fase IIIc: operação do reator com pré-filtro na tubulação de chegada e freqüência de limpeza do mesmo de

duas vezes por semana§ fase IVa: operação do reator em regime hidráulico transiente§ fase IVb: operação do reator em regime hidráulico permanente, tendo em vista a queima de duas placas

responsáveis pelo funcionamento do sistema de automação

MONITORAMENTO DO SISTEMA

O monitoramento do sistema, durante as quatro fases operacionais, envolveu a avaliação dos seguintesparâmetros físico-químicos principais: temperatura, pH, alcalinidade, DQO (total e filtrada), DBO (total efiltrada), SST e SSV. As freqüências de realização das análises variaram de diárias a quinzenais.Adicionalmente, com uma freqüência mensal foram realizadas análises das concentrações de ST e STV aolongo da altura do reator (perfil de sólidos). Todas as análises seguiram os procedimentos estabelecidos noStandard Methods for the Examination of Water and Wastewater (AWWA/APHA/WEF, 1998).

Reator UASB compartimentado

Casa de controle

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DESENVOLVIMENTO DA AUTOMAÇÃO DA ESTAÇÃO

Para se alcançar os objetivos de alimentação escalonada em regime hidráulico transiente foi necessária aimplementação de um sistema automatizado de controle de vazões. O sistema de automação era dotado deválvulas medidoras/transmissoras de vazão e válvulas atuadoras. O sistema era gerenciado por um software decontrole criado especificamente para esta finalidade, sendo constituído dos seguintes componentes principais(ver Figuras 3 e 4):

§ 1 válvula medidora e transmissora de vazão, eletromagnética – sinal de corrente de 4 a 20 mA – precisãona leitura de vazão de 99,9%;

§ 3 válvulas atuadoras - marca Hass – modelo ECV 500 316SS 4X – orifício de ½” – potência do motor de3,5 cv;

§ 1 placa de aquisição de dados com 18 canais analógicos (16 de entrada e 2 de saída) e 32 canais digitais(16 de entrada e 16 de saída) - marca Advanthec - modelo PCL 812PG;

§ 1 placa de emissão de dados - marca Strawberry Tree - modelo QuickLog PC;§ 1 microcomputador PC 486.

A lógica do sistema desenvolvido é a seguinte:

§ a válvula medidora/transmissora foi instalada na tubulação de alimentação do reator (ver Fig. 3). A vazãoafluente que passa pela válvula é captada por sensores eletromagnéticos que envia sinais;

§ os sinais (de 4 a 20 mA) enviados pela válvula passam em uma placa que os converte em sinais de tensão(5 a 14 V);

§ os sinais de tensão são encaminhados até a CPU, onde são inseridos no sistema através da placa deaquisição de dados. Toda a transmissão de sinais das válvulas instaladas junto ao reator, até a CPU, érealizada através de cabos do tipo "par trançado blindado".

§ os sinais enviados pelas válvulas chegam ao microcomputador na forma de tensão e são convertidos emvazão através de uma curva de calibração, que pode ser representada por uma equação do tipo ax + b = 0,sendo que os parâmetros (a e b) são definidos pelo usuário do sistema, através de dados obtidos emcampo;

§ na CPU, a partir da interface entre a placa de aquisição e o software de gerenciamento do sistema, osdados de leitura das válvulas são confrontados com aqueles previamente gravados no banco de dados domicrocomputador (vazão Q no tempo T – hidrograma de vazão afluente ao reator UASBcompartimentado). O software compara os dados e realiza a função de diminuir o erro entre a vazãodesejada e a vazão medida pela válvula eletromagnética. Para tal, a placa de emissão de sinais envia àsválvulas atuadoras (Fig. 4) comandos para abertura ou fechamento da seção das tubulações de alimentaçãodas câmaras do reator, dependendo da necessidade de se aumentar ou diminuir a vazão Q afluente aosistema no instante T.

Figura 3 – Válvula eletromagnética Figura 4 – Válvula atuadora Hass – ECV500

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Figura 5 Disposição geral das válvulas Figura 6 –Tela do software gerenciador do sistema

PROBLEMAS DECORRENTES DA AUTOMAÇÃO DE SISTEMA

Devido à má operação das unidades de tratamento preliminar da ETE Nova Vista, e ao grande aporte desólidos grosseiros ao reator, observou-se a ocorrência constante de entupimentos na válvula de medição e nasválvulas atuadoras, o que levou, em primeira instância, à substituição da válvula de medição, que naconcepção inicial do projeto era uma válvula que funcionava com o princípio de turbina. Uma grandequantidade de sólidos prendia-se ao eixo da turbina, fazendo com que a mesma fosse diminuindo a sua rotaçãoreal até parar. Essa válvula medidora foi substituída por outra de funcionamento eletromagnético, de seçãolivre, munida de sensores instalados externamente à seção de medição, sem contato com o liquido. Com estamedida, houve uma sensível redução no número diário de interrupções para manutenção do sistema.

As válvulas atuadoras, no entanto, continuaram a ser o motivo de paralisações do sistema, comprometendosignificativamente os objetivos da pesquisa. Para solucionar o problema, foi instalado um pré-filtro (ver Fig. 7)na tubulação de recalque que encaminhava o esgoto para o reator, com a função de complementar a remoçãode sólidos não retidos no tratamento preliminar da ETE Nova Vista, tendo em vista o funcionamento deficientedo mesmo. O pré-filtro foi instalado com uma malha de ½ polegada, tendo solucionado em grande parte osproblemas de entupimento das válvulas atuadoras. Na rotina de operação do reator foi inserida a atividade delimpeza do filtro, com freqüência de duas vezes por semana.

Figura 7 – Pré Filtro do reator UASB

A ocorrência de entupimento constitui um grande problema para esse tipo de sistema automatizado, tendo emvista que quando uma válvula fica obstruída, ainda que parcialmente, isso ocasiona uma menor vazão afluenteà câmara de digestão correspondente. Para compensar essa redução de vazão, o sistema operacional abre a

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seção das válvulas em operação, impondo uma maior vazão às outras válvulas e sobrecarregando as demaiscâmaras. Com isso, são verificadas altas velocidades ascensionais no interior das mesmas e uma grande perdade sólidos no efluente final, deteriorando a qualidade do mesmo.

Devido à grande intensidade de descargas elétricas ocorridas na região, ocorreram vários problemas de queimade equipamentos e placas de computador o que dificultou muito o desenvolvimento do trabalho. Vale salientarque as queimas de circuitos não eram, normalmente, por descargas elétricas diretas ao sistema e sim pordescargas elétricas induzidas. Descargas elétricas ocorridas na região criam campos eletromagnéticos queinduzem a formação de correntes internas ao sistema. Quando estas correntes eram elevadas, provocavam aqueima de equipamentos mais sensíveis, mesmo estes estando desligados. As placas de aquisição de dados(PCL 812PG) foram as mais penalizadas, pois eram as primeiras a receberem correntes externas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os resultados obtidos durante as fases operacionais III e IV encontram-se apresentados nas Figuras 8, 9 e 10,sendo que as Tabelas 3, 4 e 5 mostram os valores médios de cada fase. Devido à grande variabilidade dosdados, foi utilizada a média móvel quinzenal para facilitar as discussão dos resultados. Os resultados obtidosdurante as fases I e II foram discutidos por CHERNICHARO & CARDOSO (1999).

Tabela 3 – Resultados médios DBO totalFase Numero de

DadosDBOt (mg.L-1)

AfluenteDBOt (mg.L-1)

EfluenteEficiência (%)

IIIa 15 399,8 180,0 55,0IIIb 14 334,7 204,1 39,0IIIc 7 376,9 216,9 42,5IVa 5 303,0 162,4 46,4IVb 14 303,1 151,6 50,0

Tabela 4 – Resultados médios DQO totalFase Número de

DadosDQOt (mg.L-1)

AfluenteDQOt (mg.L-1)

EfluenteEficiência (%)

IIIa 18 638,2 334,6 47,6IIIb 20 542,1 325,7 39,9IIIc 9 518,8 316,8 38,9IVa 4 434,3 275,8 36,5IVb 16 434,4 183,1 57,9

Tabela 5 – Resultados médios Sólidos Suspensos TotaisFase Número de Dados SST(mg.L-1)

Afluente

SST(mg.L-1) Efluente

IIIa 16 420,1 131,8IIIb 19 273,6 118,5IIIc 8 224,8 118,5IVa 6 347,7 128,2IVb 16 348,4 78,3

Observa-se pelas Fig. 8 e 9 que o reator UASB foi capaz de produzir um efluente de boa qualidade já nosprimeiros dias de sua operação, quando foram observadas concentrações de DBO e DQO da ordem de 150mgDBO.L-1 e 200 mgDQO.L-1, respectivamente. Provavelmente, isso se deve ao fato de que o reator passoupor um longo período operando com vazões muito reduzidas (TDH da ordem de 15 horas), até que fossemconcluídos os trabalhos de automação do sistema, sendo o mesmo capaz de absorver as maiores cargasorgânicas afluentes no início da fase operacional IIIa.

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Com a retomada da operação do reator e a conseqüente imposição de um TDH mais reduzido (5,0 horas),ocorreu uma deterioração progressiva da qualidade do efluente, com a elevação das concentrações de DBO eDQO até aproximadamente o dia 125 (metade da fase IIIb) (ver Fig. 8). Isso foi observado apesar da colocaçãodo filtro de retenção de sólidos grosseiros (malha de ½”), que parece não ter influenciado em relação àqualidade do efluente produzido pelo reator UASB. Entretanto, tal procedimento mostrou-se bastante eficazna equalização das concentrações de SST, DBO e DQO no esgoto afluente, particularmente quandoimplementou-se a rotina de limpeza do pré-filtro duas vezes por semana, a partir do início da fase IIIc (verFiguras 8, 9 e 10).

Além do aspecto de melhor equalização das concentrações de matéria orgânica e sólidos suspensos no esgotobruto, a colocação do pré-filtro e a rotina de limpeza mais freqüente repercutiram positivamente em relação àautomação do sistema, uma vez que a diminuição de entupimentos nas válvulas atuadoras permitiu um melhorcontrole das vazões, a observância do hidrograma diário estabelecido para a alimentação do reator, bem comouma menor perda de sólidos com efluente (BRITO & CHERNICHARO, 2000). No entanto, tais melhorias nãorepercutiram, como se esperava, na qualidade do efluente do reator, cujas concentrações permaneceram ainda,relativamente, elevadas, da ordem de 200 mgDBO.L-1, 280DQO mg.L-1 e 100 mgSTV.L-1 , ao término da faseIIIc.

Na fase IVa, com o aumento do tempo de detenção hidráulica (5,0 para 7,5 horas) houve uma melhoria naqualidade do efluente do reator em termos de DBO, que se apresentou, ao final dessa fase, da ordem de 150mgDBO.L-1. Em relação aos parâmetros DQO e SST, foram observados valores semelhantes ao da fase IIIc,discutidos no parágrafo anterior. Apesar da melhoria observada no decorrer da fase IVa, esta etapa foiinterrompida com apenas 35 dias, tendo em vista a ocorrência de problemas de descargas elétricas e queima deplacas de controle. Com isso, os limitados resultados não permitem tirar conclusões mais aprofundadas. Aexpectativa era que a continuidade dessa fase levaria a uma melhor qualidade do efluente final, como pode-seobservar pela tendência dos resultados de DBO e de SST (ver Figuras 8 e 10).

Com a queima da placa de controle, deu-se início a Fase IVb e a retomada da aplicação do regime hidráulicopermanente, todavia com a manutenção do TDH de 7,5 horas. O reator voltou a operar com elevada eficiênciade remoção de poluentes orgânicos e baixos teores de sólidos no efluente final. Isso é um indicativo de queimpactos negativos que causam as grandes variações de vazões afluentes no desempenho de reatores UASB eda grande necessidade de minimizar estas variações. Ao término da fase IVb as concentrações de DBO, DQOe SST do reator UASB foram significativamente inferiores às das fases anteriores, tendo sido observadasconcentrações efluentes da ordem de 85 mgDBO.L-1, 115 mgDQO.L-1 e 80 mgSST.L-1 (ver Fig. 8, 9, e 10),valores estes bem próximos aos estabelecidos pelo padrão de lançamento da legislação ambiental do estado deMinas Gerais: 60 mgDBO.L-1, 90 mgDQO.L-1 e 60 mgSST.L-1 (Deliberação Normativa COPAM 10/86).

Ao longo do monitoramento do reator foram determinados os perfis de sólidos totais ao longo das alturas decada uma das três câmaras do reator, objetivando-se avaliar a quantidade de biomassa presente no reator,conforme apresentado na Figura 11. A biomassa encontrada em cada monitoramento foi plotada juntamentecom as concentrações de sólidos suspensos totais no efluente final, para que possibilitar uma melhor avaliaçãoe visualização dos resultados. Nesta Figura são destacadas as massas de sólidos medidas na fase III (TDH de5,0 h) e na fase IV (TDH de 7,5 h). As reduções nos valores de biomassa dentro do reator se devem aosdescartes realizados.

O reator começou a operar com uma biomassa da ordem de 180 kgSTV, mas com o tempo essa quantidade foi,propositadamente, sendo reduzida, com o objetivo de se avaliar a quantidade de biomassa ideal para operaçãodo reator (em alguns períodos chegou-se a operar o reator com uma biomassa de 80 kgSTV). Pode-se notarque apartir do dia 120 começou-se a ter uma melhoria progressiva da qualidade do efluente do reator. Estefato, possivelmente, se deve ao descarte realizado na mesma época como mostra a Figura 11, quando abiomassa existente no reator foi reduzida, de valores próximos a 200 kgSTV para valores próximos a 120kgSTV.

Na fase III, pode se notar que a biomassa presente no reator correlaciona-se muito bem com a qualidade doefluente final, em termos de sólidos suspensos totais. Para valores de biomassa no reator acima de 150 kgSTV(dias 18 a 125) foram obtidos resultados de SST no efluente da ordem de 150 mg.L-1, enquanto para valores debiomassa da ordem de 120 kgSTV (dia 125 a 184) foram observados resultados da ordem de 110 mgSST.L-1

(ver Fig. 11).

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Na fase IV não foram praticados descartes do lodo, podendo-se verificar a manutenção dos baixos teores deSST no efluente final durante praticamente todo o período. Nota-se apenas uma pequena deterioração doefluente nos dias finais dessa fase, quando a quantidade de biomassa no reator ultrapassou o valor de150kgSTV (ver Fig. 11).

Figura 8 – Resultados de DBO

Figura 9 – Resultados de DQO

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200

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350

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Tempo de Operação

DB

O (m

g.L

-1)

Média Móvel 4 (Af. UASB) Média Móvel 4 (Ef. UASB)

F. IIIa F. IIIb F. IIIc F. IVa F. IVb

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Tempo de operação

DQ

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g.L

-1)

Média Móvel 4 (Af. UASB) Média Móvel 4 (Ef. UASB)

F IIIa F. IIIb F. IIIc F. IVa F. IVb

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Figura 10 – Resultados de SST

Figura 11 – Resultados de SST e Biomassa

CONCLUSÕES

O sistema de automação da estação piloto constituiu-se em uma ferramenta importante para odesenvolvimento de trabalhos de pesquisa similares, tendo em vista que o controle mais preciso das vazõesgarantem maior confiabilidade aos dados reais observados na estação experimental.

Com a automação do sistema, tornou-se possível a aquisição on line de dados que relacionam a vazão desejadacom a vazão real, possibilitando a produção de gráficos diários que fornecem informações importantes acercade ocorrências na estação, principalmente durante períodos em que o sistema de tratamento não éacompanhado pelo operador. Com base nos gráficos gerados (BRITO & CHERNICHARO, 2000), é possível aidentificação de horários de queda de energia e de entupimentos na rede, além, obviamente, da vazãoefetivamente afluente ao reator.

Para se minimizar a ocorrência de problemas com o funcionamento do sistema de alimentação automatizado,torna-se necessário a observância de alguns aspectos, notadamente em sistemas em escala piloto:

§ a implantação de um eficiente sistema de remoção de sólidos finos e grosseiros, a fim de reduzir aomínimo o aporte desses, ao sistema, e os problemas de entupimento das válvulas;

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g)

Fase III Fase IV

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§ a utilização de medidores de vazão de seção livre, a exemplo dos eletromagnéticos;§ a implantação de uma rotina adequada de manutenção e limpeza dos equipamentos instalados.

A biomassa presente no reator correlacionou-se muito bem com a qualidade do efluente final, em termos desólidos suspensos totais. Para valores de biomassa no reator acima de 150 kgSTV foram obtidos resultados deSST no efluente da ordem de 150 mg.L-1, enquanto para valores de biomassa da ordem de 120 kgSTV foramobservados resultados da ordem de 110 mgSST.L-1. Isso provavelmente se deve ao arraste de sólidos para forada câmara de digestão, que devido à sua pequena altura (1,5 m) não possui capacidade para reter grandesquantidades de biomassa. A manutenção de uma quantidade de biomassa no reator da ordem de 120 kgSTVresultou na obtenção de menores concentrações de SST, DBO e DQO no efluente final.

As melhores qualidades do efluente final foram conseguidas durante a Fase IVb, quando o reator UASB foioperado em regime hidráulico permanente com TDH de 7,5 h. Nessa fase, foram obtidas concentrações deDBO, DQO e SST da ordem de 85 mgDBO.L-1, 115 mgDQO.L-1 e 80 mgSST.L-1.

As mudanças realizadas no sistema levaram à melhoria da qualidade do efluente do reator. O trabalho deotimização do reator deverá conduzir, possivelmente, ao aumento da profundidade câmara de digestão, a fimde minimizar a ocorrência de arraste de sólidos devido a picos de vazão afluente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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5. CHERNICHARO, C.A.L. & CARDOSO, M.R. (1999). “Development and evaluation of a partitionedUASB (upflow anaerobic sludge blanket) reactor for the treatment of domestic sewage from smallvillages”. Water Science and Technology, 40, 8, pp. 107 – 113.