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2 a edição | Nead - UPE 2009

2a edição | Nead - UPE 2009ww1.ead.upe.br/nead20161/theme/2016/letras/2_periodo/fonetica/... · 5 Fonética e Fonologia da língua Portuguesa Prof.a maria Perpétua Teles monteiro

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2a edição | Nead - UPE 2009

Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)Núcleo de Educação à Distância - Universidade de Pernambuco - Recife

Monteiro, Maria Perpétua TelesFonética e fonologia da língua portuguesa / Maria Perpétua Teles

Monteiro. – Recife: UPE/NEAD, 2009. 63 p.: il. – (Letras).

ISBN 978-85-7856-024-9 Conteúdo: fasc. 1 – Aspectos introdutórios da fonética e da fonologia; fasc.

2 – Fonologia e processos fonológicos da língua portuguesa; fasc. 3 - Proces sos morfofonológicos e estilísticos; fasc. 4 - Variação Linguística: sincronia e diacronia.

1. Fonética - língua portuguesa 2. Fonologia - língua portuguesa 3. Edu

cação a distância I. Universidade de Pernambuco, Núcleo de Educação a Dis- tância II. Título CDU 801.4806.90

M775f

Impresso no Brasil - Tiragem 150 exemplaresAv. Agamenon Magalhães, s/n - Santo AmaroRecife - Pernambuco - CEP: 50103-010Fone: (81) 3183.3691 - Fax: (81) 3183.3664

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EDIção 2009

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Adonis DutraAfonso BioneProf. Jáuvaro Carneiro Leão

NEAD - NÚCLEo DE EDUCAção A DISTÂNCIA

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Fonética e Fonologia da língua

PortuguesaProf.a maria Perpétua Teles monteiro

Carga Horária | 60 horas

ementa

Objeto da Fonética e da Fonologia. Aspectos descritivos da Fonética e da Fonologia da Língua Portuguesa. Análise Fonológica. Traços Distintivos. Processos morfofonológicos e estilísticos. Variação linguística: sincronia e diacronia.

objetivo geral

Introduzir, numa postura reflexiva, aspectos gerais dos parâmetros teóricos sobre a estruturação dos sistemas fonético e fonológico da Língua Portuguesa.

aPresentação da disciPlina

Prezado aluno

Nos fascículos desta disciplina, pretendemos promover uma reflexão acerca do sistema de caracterização e distinção dos segmentos sonoros da Língua Portu-guesa a partir de parâmetros teóricos pertinentes ao estabelecimento de regras e processos fonológicos. Inicialmente apresentaremos o objeto da fonética e da fonologia e aspectos fonéticos do Português do ponto de vista da fonética articu-latória. Em seguida, apresentaremos estudos referentes aos processos fonológi-cos, morfofonológicos e estilísticos e encerraremos com estudos sobre a descrição linguística em seu caráter sincrônico e diacrônico. Esperamos contribuir, mesmo que de forma introdutória, para o seu processo de aquisição de conhecimentos, compreensão e análise da fonética e fonologia do Português.

7 Fascículo 1

asPectos introdutórios

da Fonética objetivos esPecíFicos

Apontar conceitos e fundamentos, identificando hipóteses explicativas, relacionais e distintivas para os processos descritivos da fonética. Realizar transcrições fonéticas do Português.

1. introdução

1.1. objeto da Fonética e da Fonologia. o Que é isso?

Prof.a maria Perpétua Teles monteiro Carga Horária | 15 horas

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Tirinha do Hagar.

Tirinha da Mônica.

8 Fascículo 1

Todos nós, como falantes de uma língua, fazemos reflexões sobre o uso e a forma da linguagem que utilizamos. Qualquer indivíduo pode “falar sobre” a linguagem e discutir aspectos relacionados à lín-gua que conhece usando parâmetros lingüísticos e epilinguisticos. Essa atividade faz parte do “conhe-cimento comum” das pessoas. No entanto, espe-ramos também que você realize, sobre a língua e a linguagem, atividades metalinguísticas, pois há um ramo da ciência cuja preocupação e objeto de estu-do é a linguagem, o que nos oferece elementos pró-prios e apropriados para falarmos sobre a língua.

Essa ciência é a Linguística. Ela está voltada para a explicação de como a linguagem humana funciona e como são as línguas em particular, quer fazendo o trabalho descritivo previsto pelas teorias, quer usando os conhecimentos adquiridos para bene-ficiar outras ciências e artes que usam, de algum modo, a linguagem falada ou escrita.

Nas próximas páginas, trataremos de duas áre-as dentro da tradição linguística que necessitam, como as demais, de conhecimentos linguísticos específicos para a realização de reflexões sobre a língua: a Fonética e a Fonologia. Esses temas serão tratados em tópicos separados, porque, apesar de as duas áreas lidarem com os sons usados na fala e pertencerem ao nível biológico do falar condi-cionado psicofisicamente, diferem na perspectiva com que estudam esses sons. Enquanto a fonética tem como unidade o som da fala ou fone (substân-cia da expressão), trabalhando com os sons pro-priamente ditos, como eles são produzidos, perce-bidos e que aspectos físicos estão envolvidos em sua produção, a fonologia opera com a função e organização desses sons em sistemas: o fonema (for-ma da expressão).

1.2. Áreas de interesse da Fonética

A Fonética é a ciência que apresenta os métodos para descrição, classificação e transcrição dos sons da fala. As principais áreas de interesse da fonética são:

• Fonética articulatória: é aquela que leva em conta o que se passa no aparelho fonador, du-rante a produção de sons. Compreende estu-dos fisiológicos e articulatórios.

• Fonética auditiva: é aquela que considera a percepção do ouvinte.

• Fonética acústica: centra-se nas propriedades

físicas da onda sonora que é produzida pelo ar ao passar pelo aparelho articulador. Com-preende o estudo das propriedades físicas dos sons da fala a partir de sua transmissão do fa-lante ao ouvinte.

• Fonética instrumental: compreende o estudo das propriedades físicas da fala, levando em con-sideração o apoio de instrumentos laboratoriais.

Nossos estudos estarão concentrados nos aspectos fisiológicos da produção do som. Estudos que con-siderem as demais dimensões são objeto de outras disciplinas (fonética experimental, fonética para-métrica, entre outras).

atividade | Ao realizar a leitura das tirinhas, fale sobre a importância da fonética e da fo-nologia.

2. descrição Fonética 2.1. aParelho articulador O ser humano é capaz de produzir uma quantida-de variada de sons vocais. Para entendermos a pro-dução desses sons, faz-se necessário analisarmos as partes do corpo humano que estão envolvidas nessa produção:

• Pulmões: embora haja outras fontes de ar utilizadas na fala, os pulmões são a principal fonte, estando conectados à traqueia por dois tubos bronquiais.

• Traqueia: vai dos tubos bronquiais até a la-ringe, sendo responsável pela maior fonte de energia para a produção dos sons da fala. É formado por anéis cartilaginosos, que se man-têm unidos por uma membrana.

• Laringe: trata-se de uma válvula, cuja função principal é a de controlar o ar que sai e entra

SAIBA MAIS!

A fonética pode ser:

• Descritiva;

• Histórica;

• Sintática.

A Sociedade Brasileira de Fonética Membro

da International Phonetic Association foi fun-

dada em 8 de junho, de 1983. Acesse:

http://sbfonetica.vilabol.uol.com.br/apres.htm

9Fascículo 1

nos pulmões, além de impedir que alimentos entrem nos pulmões. É formada por várias cartilagens. Algumas delas se movimentam, entre elas, as cartilagens que se ligam às cordas vocais.

• Cordas vocais: na verdade, não são cordas, mas, sim, ligamentos de tecido elástico que es-tão unidos às cartilagens aritenoides (na parte de trás, chamada de posterior, da laringe) e à tireoide (localizada na parte da frente, chama-da de anterior, da laringe) na laringe. Desse modo, as cordas vocais são fixas na tireoide, e seu movimento de abertura se dá pelo movi-mento das cartilagens aritenoides. A abertura ou fechamento dessas cartilagens faz com que as cordas vocais se abram ou fechem em dife-rentes graus, provocando alterações na corren-te de ar que vem do pulmão, o que provoca diferentes modos de fonação.

• Glote: corresponde à abertura, ao espaço en-tre as cordas vocais, que pode assumir diferen-tes formas, a depender da posição das cordas vocais.

• Epiglote: cartilagem em forma de colher, cuja função é a de fechar a laringe, de modo que o alimento não entre na laringe e, portanto, nos pulmões.

• Faringe: é um tubo muscular com forma de um cone invertido, que vai da glote à base do crânio. Através dele, ocorre a passagem do ar para a respiração e para a fonação (via traqueia) e do alimento ingerido (via esôfago). Ela se di-vide em oro-faringe (que vai da glote até o véu palatino) e naso-faringe (do véu palatino até as fossas nasais).

• Véu palatino: refere-se à continuação do céu da boca. Quando o véu palatino está abaixado, a passagem velo-faringal encontra-se aberta, e o ar pode passar pela cavidade nasal. É tam-bém conhecido como palato mole (escorregue a língua pelo céu da boca que é possível sentir quando não há mais osso, o que deixa o tecido muscular mole).

• Úvula: trata-se de um prolongamento do véu pa-latino. É também conhecida como campainha.

• Cavidade nasal: espaço entre a passagem velo-faringal e as fossas nasais, separado da cavidade oral pelo palato duro. Quando o véu palatino está abaixado, o ar transita por essa passagem.

• Palato duro: parte superior da cavidade bucal, fica localizada à frente do véu palatino, logo após a arcada alveolar. É fixa e óssea.

• Cavidade oral: formada pelos lábios, dentes,

mandíbula e língua. Em sua parte interna, encontram-se os alvéolos.

• Arcada alveolar: parte óssea localizada atrás dos dentes superiores, antes do palato duro.

• Dentes: influem na fonação, porque podem im-pedir, total ou parcialmente, a passagem de ar.

• Lábios: duas pregas que marcam o final da ca-vidade oral e do trato vocal. Sua constituição muscular permite grande plasticidade e mobi-lidade, alterando a forma da cavidade oral.

• Mandíbula: maxilar inferior. Graças a sua mo-bilidade, permite, também, alterações na cavi-dade oral.

• Língua: trata-se de um grande músculo dota-do de alto grau de mobilidade voluntária. É responsável pelas maiores modificações do vo-lume e da geometria da cavidade oral. Possui diferentes partes, a saber:

1. ponta ou ápice (localizada na borda lateral frontal da língua);

2. lâmina (localizada na borda superior fron-tal da língua);

3. centro; 4. dorso; 5. raiz; 6. sublâmina.

2.2. articuladores ativos e Passivos

Os articuladores ativos têm a propriedade de mo-vimentar-se em direção ao articulador passivo, mo-dificando a configuração do trato vocal. Eles são

Font

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(200

7. p

.15)

Partes da língua

10 Fascículo 1

assim denominados devido ao seu papel ativo na articulação consonantal. Os articuladores ativos são: o lábio inferior, a língua, o véu palatino, as cordas vocais.

Os articuladores passivos localizam-se na mandíbu-la superior, exceto o véu palatino, que está localiza-do na parte posterior do palato. Os articuladores passivos são o lábio superior, os dentes superiores e o céu da boca, que se divide em: alvéolos, palato duro, palato mole e úvula. Perceba que o véu pa-latino (palato mole) pode atuar como articulador ativo (na produção de segmentos nasais) ou como articulador passivo (na articulação de segmentos velares). A posição do articulador ativo em relação ao passivo define o lugar de articulação dos seg-mentos consonantais.

Aparelho Fonador

1. Cavidade oral 2. Cavidade nasal 3. Cavidade nasofaringal 4. Cavidade faringal 5. Lábio superior 6. Dentes superiores 7. Alvéolos 8. Palato duro 9. Palato mole(véu palatino)

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(200

8.p.

30)

Aparelho fonador

(articuladores, cavidades e glote)

Atividades linguísticas - quando o falante

faz sobre a língua uma reflexão automática,

utilizando-se de sua gramática internalizada.

São aquelas que o usuário da língua (falante,

escritor/ouvinte, leitor) faz ao buscar estabele-

cer uma interação comunicativa por meio da

língua, o que lhe permite ir construindo o seu

texto de modo adequado à situação, aos seus

objetivos comunicacionais.

Atividades epilinguísticas - quando o usuário

constrói e reconstrói para se comunicar. São

aquelas que suspendem o desenvolvimento do

tópico discursivo (ou do tema ou do assunto)

ou aspectos da interação, para, no curso da

interação comunicativa, tratar dos próprios re-

cursos linguísticos que estão sendo utilizados.

As atividades epilinguísticas estão presentes

nas hesitações, correções, pausas longas, re-

petições, antecipações, lapsos, etc. ou, por

exemplo, quando um interlocutor questiona

a atuação interativa de outrem ou controla a

tomada da palavra numa conversação, indi-

cando quem deve ou não falar por meio de

recursos diversos (perguntas, respostas, solici-

tações, etc.).

Atividades metalinguísticas - quando a língua

se torna o conteúdo, o assunto, o tema, o tó-

pico discursivo da situação de interação, cons-

truindo-se um conhecimento sobre a própria

língua. São aquelas em que se usa a língua

para analisar a própria língua.

SAIBA MAIS!

10. Úvula 11. Lábio inferior 12. Dentes inferiores 13. Ápice da língua 14. Lâmina da língua 15. Parte anterior da língua 16. Parte média da língua 17. Parte posterior da língua 18. Epiglote 19. Laringe 20. Esôfago 21. Glote(cordas vocais)

11Fascículo 1

3.1. mecanismos Para a Produção de correntes de ar

Para produção dos sons, a corrente de ar pode to-mar duas direções: egressiva e ingressiva. A direção egressiva é aquela em que o ar vai para fora dos pulmões e é expelido por meio da pressão exercida pelos músculos do diafragma, enquanto a direção ingressiva é aquela em que o ar vai para dentro dos pulmões. No caso dos sons do português, o meca-nismo de produção é egressivo (sons plosivos).

As correntes de ar podem ser pulmonares, glotais e velares. A corrente pulmonar é aquela que se ini-cia nos pulmões e é responsável, além da fonação, pelo ciclo respiratório. A corrente de ar egressiva é usada em todas as línguas. Não há línguas que utilizem a corrente pulmonar ingressiva para a pro-dução de sons distintivos. A corrente de ar glotal ou faringal usa o ar que está acima da glote fechada e inicia a corrente de ar atra-vés do movimento da laringe para cima e para bai-xo. Os sons produzidos pela corrente glotal ocor-rem quando são produzidos pelo movimento dos músculos da laringe para cima e são normalmente conhecidos como ejetivos. Os sons produzidos pela corrente de ar glotal ingressiva são realizados pelo movimento dos músculos da laringe para bai-xo, conhecidos como implosivos. O mecanismo de corrente de ar glotálico não ocorre em português.

A corrente de ar velar ou oral é produzida dentro da cavidade oral por meio do levantamento da par-te posterior da língua, que entra em contato com o véu palatino, fechando a parte posterior da cavida-de e, na parte anterior, pelo fechamento dos lábios ou pelo contato da língua com o céu da boca. A corrente de ar ingressiva é conhecida como clique. Deve-se ter em mente que o ar tem duas possibi-lidades de saída: pela boca (sons orais [b], [s], por exemplo), pelo nariz (sons nasais [n], [m], por exem-plo) ou por ambos ao mesmo tempo (sons nasaliza-dos [ã], [õ], por exemplo).

3. a Produção dos sons na linguagem humana

Imagine uma situação comunicativa em que você fi-casse examinando o seu modo de falar e o do seu ou-vinte. Observe a cena proposta por Auguste Renoir.

O que aconteceria com a comunicação?

introdução

Tão natural quanto o olfato, a visão e o paladar é o ato de falar para o ser humano. Esse ato é tão natural que só paramos para observar seu funcio-namento nos casos de deficiência ou de falta. No entanto, é essa capacidade de falar do modo como o fazemos que distingue o ser humano de todos os outros animais. Quando um ser humano em condições “normais” tem algo a expressar a ou-trem, entra em funcionamento seu sistema nervo-so, impulsionando o aparelho fonador que opera sobre a informação a ser transmitida e a codifi-ca em determinados padrões de ondas sonoras (a linguagem, o código, a mensagem). Esta operação recebe o nome de codificação. Quando as ondas sonoras, emitidas pelo falante, são conduzidas pelo ar atmosférico circundante, indo atingir o apare-lho auditivo do ouvinte, que capta os sons conver-tendo as ondas sonoras em atividade nervosa, que é levada ao cérebro, a operação recebe o nome de decodificação. Está, assim, fechado o circuito e o processo que pode se repetir passando o ouvinte a falante.

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Auguste Renoir.

Língua, linguagem e comunicação:

http://www.filologia.org.br/anais/anais%20iv/civ12_5.

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texto comPlementar

12 Fascículo 1

estriados, que podem obstruir a passagem da corrente de ar) e a glote (espaço decorrente da não obstrução destes músculos laríngeos). A função primária da laringe é a de atuar como uma válvula que obstrui a entrada de comida nos pulmões por meio do abaixamento da epi-glote. O ato de engasgar envolve o fato de que a epiglote não obstruiu a entrada de alimento no sistema respiratório. Então o ar dos pul-mões sai, visando impedir a entrada do corpo estranho (alimento) no aparelho respiratório.

• O sistema articulatório é constituído da farin-ge, da língua, do nariz, dos dentes e dos lábios, estruturas que se encontram na parte superior à glote. Várias são as funções primárias desses órgãos, dentre elas, comer, morder, mastigar, sentir o paladar, cheirar, sugar, engolir.

atividade 1. A partir da observação da obra de Renoir,

dos conhecimentos empíricos e científicos apreendidos, discuta: É possível afirmar que a produção da fala é apenas uma ques-tão biológica?

2. Identifique as partes do aparelho fonador e complete o diagrama.

3.2. o aParelho Fonador e os mecanismos de Produção dos sons

Os sons utilizados no exercício da linguagem hu-mana são vibrações com frequências, intensidades e durações características, produzidas por uma

coluna de ar em movimento, que, tendo início nos pulmões, na fase expiratória do processo de respiração, percorre o chamado aparelho fonador. As partes do corpo humano que compõem o apa-relho fonador não têm como função primária a produção de sons, mas outras funções, como ali-mentação e respiração, compondo-se de três sis-temas que, em função secundária, caracterizam o aparelho fonador e são fisiologicamente responsá-veis pela produção dos sons da fala.

• O sistema respiratório é constituído dos pul-mões, dos músculos pulmonares, dos tubos brônquios e da traqueia. O sistema respira-tório encontra-se na parte inferior à glote, que é denominada cavidade infraglotal. A função primária do sistema respiratório é obviamente a respiração.

• O sistema fonatório é constituído da laringe. Nesta, localizam-se as cordas vocais (músculos

Aparelho fonador

Os sistemas respiratórios, fonatório e articulatório

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Aparelho fonador:

http://www.geocities.com/sandrafelix.geo/aparelho.htm

texto comPlementar

13Fascículo 1

4.1. a Fonação É na laringe que se encontra o órgão que desem-penha papel bastante complexo na produção dos sons da linguagem humana, as cordas vocais, que, de acordo com sua tensão e abertura, determinam os modos de fonação também conhecidos como qualificadores de voz.

Na respiração em repouso e na produção dos chamados sons surdos ou desvozeados, as cordas vocais estão separadas, e a glote está aberta. O ar originado nos pulmões pode passar livremente, sem que haja vibrações. Estando a glote fechada, e as cordas vocais unidas, o ar tem que forçar pas-sagem, fazendo-as vibrar. Os sons resultantes são chamados sonoros ou vozeados. As cordas vocais podem assumir outras posições e, consequentemente, outros modos de fonação. Nos sons sonoros, as cordas vocais estão juntas em toda a sua extensão, e a glote está igualmente fechada. Se, porém, devido ao afastamento das aritenoides houver uma pequena abertura na glote, o som re-sultante não é mais sonoro e, sim, sussurrado. Em português, ocorrem vogais sussurradas em varia-ção com vogais sonoras. Numa palavra como ‘lin-guística’, o i e o a após a sílaba tônica podem ser pronunciados com sonoridade ou com sussurro. Sendo a corrente de ar bruscamente interrompida na glote pelo fechamento, por um período mais prolongado das cordas vocais, o som resultante é denominado oclusão ou oclusiva, glotal.

Nos sons aspirados, as cordas vocais continuam abertas, e não há vibração por um período mais prolongado após a soltura da articulação da conso-ante, quando os órgãos já estão posicionados para a produção do segmento seguinte. Assim, sons as-pirados são vogais surdas produzidas com a mesma protrusão labial e altura da língua da vogal que se segue a uma consoante. Em inglês, ocorrem oclu-sivas aspiradas, que são variantes posicionais das oclusivas surdas.

Havendo uma vibração das cordas vocais e as par-tes das aritenoides permanecendo separadas, pode ocorrer um escape extra de ar. Os sons produzidos sob estas condições são chamados murmurados. São denominados tremulados os sons produzidos pela vibração lenta dos ligamentos das cordas vo-cais, permanecendo as aritenoides separadas. Tre-

4. Processo Fonatório

introdução

Neste tópico, trataremos do processo fonatório ou fonação que corresponde aos diversos estados da glote e da consequente excitação acústica da cor-rente de ar ao passar pelas cordas vocais.

SAIBA MAIS!

Vídeos respiração: http://www.youtube.com/watch?v=Qujt9YKGzAY&featu

re=related

http://www.youtube.com/watch?v=sQU4LVJr7TI&featur

e=related

As diferenças que se notam entre vozes diver-

sas dos sexos, das idades e das pessoas ba-

seiam-se, em geral, nas dimensões da laringe.

Línguas africanas, como hotentote, zulu e o

bosquísmano, têm cliques como unidades dis-

tintivas. Em português, os cliques têm um uso

paralinguístico, por exemplo, o som do beijo

que se lança a distância, o muxoxo ou o esta-

lar da língua para atiçar cavalos.

recordando um Pouco a história do

homem

Discute-se que a linguagem humana pode ter

surgido há cerca de 100 mil anos, mas pen-

semos numa época mais recente - há cerca

de 40 mil anos. Nesta altura, e devido a re-

construções tendo por base o registo arqueo-

lógico, sabe-se que o aparelho fonador dos

Neandertais tinha algumas diferenças mar-

cantes do Homem moderno, nomeadamente,

a laringe encontrava-se mais elevada. Isso

significa que a língua tinha uma mobilidade

menor, limitando a possibilidade da produção

de sons.

Posições das cordas vocais

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14 Fascículo 1

4.2. a nasalização

Leia o poema de Carlos Drummond de Andrade

a um ausente

Tenho razão de sentir saudade,tenho razão de te acusar.Houve um pacto implícito que rompestee sem te despedires foste embora.Detonaste o pacto.

Detonaste a vida geral, a comum aquiescênciade viver e explorar os rumos de obscuridadesem prazo sem consulta sem provocaçãoaté o limite das folhas caídas na hora de cair.

Antecipaste a hora.Teu ponteiro enlouqueceu, enlouquecendo nossas horas.Que poderias ter feito de mais gravedo que o ato sem continuação, o ato em si,o ato que não ousamos nem sabemos ousarporque depois dele não há nada?

Tenho razão para sentir saudade de ti,de nossa convivência em falas camaradas,simples apertar de mãos, nem isso, vozmodulando sílabas conhecidas e banaisque eram sempre certeza e segurança.

Sim, tenho saudades.Sim, acuso-te porque fizesteo não previsto nas leis da amizade e da naturezanem nos deixaste sequer o direito de indagarporque o fizeste, porque te foste. Fonte: http://www.jornaldepoesia.jor.br/drumm.html#aumausente

Como podemos perceber, a nasalização é uma ca-racterística bastante comum; ela ocorre obrigato-riamente em qualquer dialeto do português.

mulação e murmúrio podem ser usados com valor distintivo em algumas línguas.

atividade | Coloque a sua mão contra a par-te central anterior do pescoço (onde, nos ho-mens, temos o “pomo de Adão”). Pronuncie, então, o som inicial da palavra “vá” de manei-ra contínua (verifique que apenas a consoante esteja sendo pronunciada). Depois pronuncie, da mesma maneira, o som inicial da palavra “fé”. Faça alternância entre V e F algumas ve-zes, pronunciando, apenas, a consoante. O que você observou? Que conclusão se pode tirar em relação à produção dos dois sons?

Na gravura abaixo, identifique e comente os estados da glote e os segmentos sonoros pro-duzidos em cada um deles.

SAIBA MAIS!

Vídeo laringe:http://www.youtube.com/watch?v=FA58skByS28&featu

re=related

Cuidados especiais com o uso da voz:

http://www.fonoaudiologia.com/trabalhos/estudantes/

estudante-005.htm.

Modos de fonação

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21)

Posições das cordas vocais no processo fonatório

Laringe: http://www.colegiosaofrancisco.com.br/alfa/corpo-

humano-sistema-respiratorio/laringe

texto comPlementar

15Fascículo 1

essa diferença ocorre pela não articulação da vo-gal nasal, em final de palavra em posição tônica ou postônica ou no meio da palavra em posição tônica ou pretônica.Tais casos são denominados nasalização. Note a diferença de significado em: “la, lã; mito, minto; cadeia, candeia”. A nasaliza-ção da vogal, nesses casos, é obrigatória. Dá-se o nome de Nasalação ao metaplasmo, que consiste na permuta de um fonema oral para nasal (morta-dela > “mortandela”).

atividade 1. A partir da leitura do poema de Drum-

mond, reflita sobre a importância da na-salização na expressividade do português.

2. Faça a transcrição dos segmentos vocálicos

das palavras: a. sim b. tonta c. janta d. mundo e. vento

3. Coloque os dedos, fechando a cavidade nasal e pronuncie b, p, f. Agora pronuncie m, n, ã. O que aconteceu com a corrente de ar, com a cavidade bucal e com a resso-nância no momento em que você pronun-ciou os diferentes segmentos sonoros?

A nasalização é um mecanismo que, como o pro-cesso fonatório, envolve aberturas e fechamentos de uma passagem que conduz à outra. Os sons orais são originados no momento em que, ao passar pela glote, a corrente de ar encontra a pas-sagem nasofaríngea fechada pelo levantamento do véu palatino, escoando, assim, pela cavidade bucal. Estando o véu palatino abaixado e a passagem na-sofaríngea aberta, parte do fluxo de ar se desvia para cavidade nasal, dando origem aos sons nasais. (Figura anterior)

Na prática, distinguem-se os sons nasais dos sons nasalizados. Nos nasais, há, além do abaixamen-to do véu palatino, uma obstrução na cavidade bucal causada pela aproximação dos dois articula-dores. É o que acontece com as consoantes m[m], n[n] e nh[ñ]. Para a pronúncia do [m], o obstáculo é formado na cavidade bucal pelo fechamento dos lábios; em [n] pela junção da ponta da língua com a parte posterior dos dentes e em [ñ] pela ar-ticulação da lâmina da língua com o palato duro. Não havendo obstrução total na cavidade bucal, o ar escoa também pela boca, e o som é chamado nasalizado (caso das vogais). Neste caso, o abaixa-mento do véu palatino altera a configuração da cavidade bucal e, portanto, a qualidade vocálica das vogais nasais torna-se diferente da qualidade vocálica das vogais orais correspondentes. Um til colocado acima da vogal marca a nasalidade. Veja os quadros nesta página. A nasalidade ocorre quando uma vogal tipicamente oral é seguida de uma das consoantes nasais (m, n, ñ). É o caso das palavras cama, tema, time, dono, rumo e sonho. A nasali-dade é mais perceptível auditivamente com a vogal a. Com as vogais médias e, o e as vogais altas i, u, às vezes, fica difícil identificar se a nasalidade ocorre ou não. A nasalidade não causa diferença de significado entre as palavras (janela, j[ã] nela);

Sons orais e nasais

Font

e: [a

dapt

ado

de]

Callo

u (2

005.

p.22

)

Font

e: [a

dapt

ado

de] S

ilva

(200

8. p

.91)

anteriorarred não

arred

centralarred não

arred

Posteriorarred não

arred

Alta

média

Baixa

e õ

u

VOGAIS NASAIS DO PORTUGUêS BRASILEIRO

Font

e: [a

dapt

ado

de] S

ilva

(200

8. p

.91)

VOGAIS TÔNICAS NASAIS NO FINAL E NO MEIO DA PALAVRA

vogais tônicas nasaisFinal de Palavra meio de Palavra

vim

não hÁ

tom

jejum

[ã] [lã]

[ ]

[ ]

u[ ]

[õ] [‘tõ]

u[ʒe’ʒum]

[‘v ] cinto

cento

santo

conto

assunto u[a’suto]

[‘s tʊ]

ee [‘setʊ]

[‘sãtʊ]

[‘kõtʊ]

16 Fascículo 1

4. Retire do poema: a. Cinco palavras com apenas sons orais. b. Cinco palavras com sons consonantais

nasais. c. Cinco casos de nasalização.

5. mecanismos de Produção de segmentos consonantais e vocÁlicos

introdução

Talvez agora seja uma boa hora para levantar, abrir a boca em toda sua amplitude e deixar o “a” bem forte sair e ainda deixá-lo continuar saindo por alguns segundos...Agora abra a boca do mesmo modo e pronuncie “b”. O que aconteceu?

A voz humana se compõe de tons (sons musicais) e ruídos. Caracterizam-se os tons quanto às con-dições acústicas, por suas vibrações periódicas. Uma primeira distinção que se faz desses tons e que podem ser utilizados nas línguas é entre conso-antes (=ruídos), vogais (=tons) e os glides. Quanto às condições fisiológicas de produção, a diferença entre consoantes e vogais é que, para a produção dos segmentos consonantais, a cavidade bucal está total ou parcialmente fechada, podendo ou não ha-ver fricção, enquanto que, para a dos vocálicos, a passagem do ar, na cavidade bucal, se acha comple-tamente livre, não é interrompida na linha central, não havendo, portanto, obstrução ou fricção.

5.1. os segmentos vocÁlicos Os sons vocálicos são sons produzidos por uma corrente de ar pulmonar egressiva, que faz vibrar, normalmente, as cordas vocais. Os sons vocálicos se opõem aos consonantais por serem acusticamen-te sons periódicos complexos, constituírem núcleo de sílaba e sobre eles poder incidir acento de tom e/ou intensidade. O que varia nos sons vocálicos é a forma e o tamanho do trato vocal.

A Nomenclatura Gramatical Brasileira classifica as vogais de acordo com quatro critérios:

1. quanto à zona de articulação: as vogais podem ser média: /a/; posteriores: /ó/, /ô/, /u/ e ante-riores: /é/, /ê/, /i/;

2. quanto à intensidade: as vogais podem ser tô-nicas (em que recai o acento tônico) e átonas (inacentuadas). Podem estar antes da tônica (pretônicas) ou depois (postônicas);

3. quanto ao timbre: o timbre é o efeito acústico resultante da distância entre o dorso da língua e o véu do paladar, funcionando a cavidade bucal como caixa de ressonância. O timbre é o traço distintivo das vogais. Quanto ao timbre, as vogais podem ser abertas: /a/, /á/, /ó/; fecha-das: /ê/, /ô/, /i/, /u/ e reduzidas: /a/, /i/, /u/. A reduzida é proferida com menos nitidez, como em casa, em que se comparando os segmentos vocálicos, têm-se o primeiro aberto e o segun-do reduzido ;

4. quanto ao papel das cavidades bucal e nasal, as vogais podem ser orais (/á/, /é/, /ê/, /i/, /ó/, /ô/, /u/) e nasais (/ã/, / e /, / i /, /õ/, / u /).

Destaca-se, também, o fator altura do corpo da língua, referindo-se à altura que a língua ocupa no trato vocal durante a produção de um som. São quatro os graus de altura da língua: alto em /i/ e /u/ (chita e chuva), médio-alto e médio baixo em /é/, /ó/, /ê/, /ô/ e baixo em /a/ (casa).

Metaplasmos: http://pt.wikipedia.org/wiki/Metaplasmo

texto comPlementar

SAIBA MAIS!

A nasalidade não se restringe a um único

segmento no contínuo sonoro. O abaixamen-

to do véu palatino e a abertura da passagem

nasofaríngea, mecanismos próprios aos sons

nasais e nasalizados, não se dão em perfeita

sincronia com o levantamento do véu palatino

e fechamento da passagem nasofaríngea dos

sons adjacentes. Assim é comum que a na-

salidade se estenda, ao menos, pela sílaba.

~ ~ ~

17Fascículo 1

5.2. os glides

Segmentos com características fonéticas não tão precisas, sejam de consoante ou de vogal. Fone-ticamente, são fonemas que se caracterizam por permitirem a passagem do ar sem obstrução e sem fricção, com ressonância no centro do trato vocal e por terem um espaço vertical para a passagem do ar mais estreito do que as vogais a que são asso-ciados. Na ortografia, são descritos em português como a segunda vogal em cai e mau (conhecidas como glides, semicontoides ou semivogais). Fono-logicamente, essas aproximantes se comportam como consoantes, isto é, não preenchem posições de núcleo da sílaba (assilábicas) e jamais são acen-tuadas. Representamos as semivogais i (e) por /y/ u (o) por /w/.

Observe que, em certos casos, em lugar de i ou u, pode-se grafar a semivogal e ou o, respectivamente, em observância às convenções do nosso sistema ortográfico vigente, segundo as quais a semivogal dos ditongos orais é representada pelo grafema i, e a dos ditongos nasais, pelo grafema e: pai/mãe, distrai/distraem. Os encontros vocálicos dão ori-gem aos ditongos, tritongos e hiatos. Os ditongos, como os demais encontros vocálicos, podem ocor-rer no interior da palavra (dizem-se intraverbais: pai, vaidade) ou por aproximação, por fonética sintática, de duas ou mais palavras (dizem-se inter-verbais: certa idade, inculta e bela).

Nos encontros vocálicos, costumam ocorrer dois fenômenos: a diérese (hiatismo) e a sinérese (di-tonguismo). Chama-se diérese a passagem de semivogal a vogal, transformando o ditongo em um hiato: trai-ção= tra-i-ção; vai-da-de= va-i-da-de; cai= ca-i.

Chama-se sinérese a passagem de duas vogais de um hiato a um ditongo crescente: su-a-ve = sua-ve; pi-e-do-so = pie-do-so; lu-ar = luar.

atividade 1. Pronuncie em sequências as vogais i e a.

Durante a posição de qual vogal, a posição da língua se encontra mais alta? Classifi-que umas dessas vogais como alta e outra

Posição das vogais /a/, /u/, /i/

a u i

Font

e: B

echa

ra (2

001.

p.6

3)

QUADRO DE CLASSIFICAçãO DAS VOGAIS

1. Quanto à zona de articulação

2. Quanto ao timbre

3. Quanto ao PaPel das cavidades bucal e nasal

4. Quanto à intensidade

5. Quanto à elevação da língua

anteriores: /é/, /ê/, /i/média: /a/Posteriores: /ó/, /ô/, /u/

abertas: /a/, /é/, /ó/Fechadas: /ê/, /ô/, /i/, /u/reduzidas: /a/, /i/, /u/

tônicas

Átonas

baixa: /a/médias: /é/, /ó/, /ê/, /ô/altas: /i/, /u/

orais: /a/, /é/, /ê/, /i/, /ó/, /ô/, /u/

nasais: /ã/, / /, / /, /õ/, / /e uVO

GA

IS

Fonte: [adaptado de] Bechara (2001.p.65)

Classificação das vogais:

http://www.brazilianportugues.com/index.php?idcanal

=318

texto comPlementar

SAIBA MAIS!

o Que é uma vogal ePentética?

A epêntese é um fenômeno caracterizado

pela emissão de uma vogal entre duas conso-

antes não líquidas, não representadas na es-

crita, como, por exemplo, na palavra “pneu”.

A inserção desta vogal transforma estruturas

silábicas do tipo CC em estrutura do tipo CVC.

Cada língua possui uma vogal epentética. No

português brasileiro, a vogal emitida entre as

duas consoantes não líquidas é a vogal /i/.

As vogais epentéticas vêm despertando inte-

resses dos estudiosos, porém ainda existem

poucos estudos sobre a vogal epentética no

português brasileiro.

18 Fascículo 1

como baixa. Repita o exercício, observan-do a posição da língua durante a articula-ção das vogais i e u. Classifique uma como anterior e a outra como posterior.

2. Classifique os segmentos vocálicos i, ê (ipê), a, ó (avó), ô (avô), u nas seguintes catego-rias: alta, média alta, média baixa e baixa.

6. mecanismos de Produção de segmentos consonantais

introdução Todas as línguas naturais possuem consoantes e vogais. A cavidade orofaríngea é a câmara de resso-nância onde o fluxo de ar é modificado pela ação dos chamados articuladores. Os diferentes modos por que o fluxo de ar é modificado permitem o estabelecimento de duas grandes classes de sons: vogais e consoantes.

Observando a gravura abaixo, que observações você faz sobre esta última classe?

6.1. as consoantes

As consoantes podem ser classificadas pelo lugar, ponto ou modo da obstrução do ar e pela vibração das cordas vocais. Os pontos de articulação são de-nominados de acordo com os articuladores passi-

vos, sendo estes os lugares em que os articuladores ativos obstruem a passagem de ar. Deve-se lembrar que o trato vocal é um continuum que está sendo dividido nos lugares de produção. Desse modo, não há pontos fixos para a produção de sons. Por exemplo, o som [t] é produzido com a ponta da língua contra os alvéolos. Alguns falantes podem produzir esse som, colocando a ponta da língua um pouco mais à frente, de modo a encostar tam-bém nos dentes superiores. São dezenove os fone-mas consonantais do português: /p/, /b/, /t/, /d/, /k/ (cá), /g/, /f/, /v/, /s/, /z/, /x/ (chá), /j/ (já), /rr/ (carro, rei), /r/ (cara), /m/, /n/, /nh/ (banha), /l/, /lh/ (malha) De acordo com a Nomenclatura Gramatical Brasi-leira, classificam-se as consoantes quanto ao modo de articulação, à zona de articulação, ao papel das cordas vocais e ao papel das cavidade bucal e nasal.

6.1.1. grau da estritura emodo de articulação

A posição assumida pelo articulador ativo em re-lação ao passivo, indicando como e em que grau a passagem da corrente de ar, através do aparelho fo-nador, limita-se neste ponto. A partir da natureza da estritura, classificam-se os segmentos consonan-tais quanto à maneira ou ao modo de articulação. Assim as consoantes podem ser oclusivas e cons-tritivas. A oclusão ocorre quando os articuladores estão dispostos de tal forma que impedem comple-tamente a saída do ar. O véu palatino está levanta-do, e o ar que vem dos pulmões encaminha-se para a cavidade oral. Oclusivas são, portanto, consoan-tes orais. As consoantes oclusivas que ocorrem em português são: /p/, /b/, /d/, /k/, /g/.

A constrição (pressão) ocorre quando os articula-dores estão dispostos de maneira a permitirem a saída parcial da corrente de ar. As consoantes cons-tritivas que ocorrem em português são: /f/, /v/, /s/, /z/, /x/, /j/, /r/, /rr/, /l/, /lh/, /m/, /n/, /nh/.

Nasal: nos sons nasais, os articuladores da cavida-de oral estão fechados, impedindo a passagem do ar. No entanto, o véu palatino encontra-se abaixa-do, e o ar que vem dos pulmões escapa pelas ca-vidades oral e nasal. Nasais são consoantes idên-ticas às oclusivas, diferenciando-se apenas quanto ao abaixamento do véu palatino para as nasais. As consoantes nasais que ocorrem em português são: /m/ (má), /n/ (nua), /nh/ (banho).

[b]

a

[m]

b

Segmentos consonantais (oral e nasal)

Font

e: [a

dapt

ado

de] C

allo

u (2

005.

p.2

2)

Classificação das consoantes: h t t p : / / w w w. b r a z i l i a n p o r t u g u e s . c o m / i n d e x .

php?idcanal=317

texto comPlementar

19Fascículo 1

Fricativa: os sons são produzidos por uma aproxi-mação dos articuladores, estreitando o trato vo-cal de modo que o ar sai produzindo fricção (esfre-gaço, atrito). A aproximação dos articuladores não chega a causar obstrução completa e, sim, parcial causando a fricção. As consoantes fricativas que ocorrem em português são: fé, vá, sapo, zapata, chave, já, rato (são exemplos do uso do r fricativo - o português de Belo Horizonte e Rio de Janeiro). Africada: é formada por uma oclusiva e uma frica-tiva que devem ter o mesmo lugar de articulação, ou seja, serem homorgânicas. Na fase inicial da produção de uma africada, os articuladores pro-duzem uma obstrução completa na passagem da corrente de ar através da boca, e o véu palatino encontra-se levantado (como nas oclusivas). Na fase final dessa obstrução (quando se dá a soltura da oclusão), ocorre, então, uma fricção decorren-te da passagem central da corrente de ar (como nas fricativas). O véu palatino continua levantado durante a produção de uma africada. As africadas são, portanto, consoantes orais. As consoantes africadas que ocorrem em algumas variedades do português são tia, dia. Para estes exemplos, ima-gine as pronúncias “tchia” e “djia”. Para alguns falantes de Cuiabá, ocorrem consoantes africadas em palavras como chá e já (quando pronunciadas, respectivamente, tchá e djá. Na maioria dos diale-tos do português brasileiro, temos uma consoante fricativa nas palavras chá e já.

Vibrante: som produzido quando o articulador ati-vo bate várias e rápidas vezes no articulador passivo, causando vibração. Em alguns dialetos do portu-guês, ocorre esta variante em expressões, como “orra meu!” ou em palavras, como marra. Certas varian-tes do estado de São Paulo e do português europeu apresentam uma consoante vibrante nestes casos. Tepe: som produzido pela batida rápida e única do articulador ativo no articulador passivo, ocorrendo uma rápida obstrução da passagem da corrente de ar através da boca. O tepe ocorre em português nos exemplos: cara, fraca.

Retroflexa: a produção de uma retroflexa geral-mente se dá com o levantamento e encurvamento da ponta da língua (articulador ativo) em direção ao palato duro (articulador passivo). Ocorre no dia-leto “caipira” e no sotaque de norte-americanos, falando português, como nas palavras: mar, carta.

Laterais: o articulador ativo (ponta da língua) toca

o articulador passivo (arcada alveolar), e a corrente de ar é obstruída na linha central do trato vocal. O ar, então, é expelido por ambos os lados desta obstrução tendo, portanto, saída lateral. As late-rais ocorrem em português, em: lá, palha, sal (da maneira como é pronunciada no Sul do Brasil ou em Portugal). 6.1.2. Quanto ao lugar ou

zona de articulação

Temos: a. Bilabial: os sons bilabiais são produzidos pelo

fechamento ou estreitamento do espaço entre os lábios (/p/, /b/, /m/). O articulador ativo é o lábio inferior, e o passivo é o lábio superior.

b. Labiodental: são os sons produzidos pela obs-trução parcial da corrente de ar entre o lábio inferior (articulador ativo) e os dentes incisivos superiores (articulador passivo) (/f/,/v/).

c. Dental: são os sons produzidos com a ponta da língua (articulador ativo) contra a parte de trás dos dentes incisivos superiores (articula-dor passivo) ou com a ponta da língua entre os dentes. É o caso do the em inglês.

d. Alveolar: os sons são produzidos com a pon-ta da língua ou lâmina da língua (articulador ativo) contra a arcada alveolar (articulador pas-sivo). Consoantes alveolares diferem de con-soantes dentais apenas quanto ao articulador passivo.

e. Alveopalatal (palato-alveolar ou pós-alveola-res): são sons produzidos com a lâmina da lín-gua (articulador ativo) contra a parte anterior do palato duro (articulador passivo), logo após os alvéolos.

f. Palatal: são os sons produzidos com o centro da língua (articulador ativo) contra o palato duro (articulador passivo).

g. Velar: são os sons produzidos pelo dorso da língua (articulador ativo) contra o véu palatino ou palato mole (articulador passivo).

h. Uvular: os sons uvulares são produzidos pelo dorso da língua contra o véu palatino e a úvu-la. Por exemplo, o orra(de orra, meu) produzi-do por alguns dialetos paulistas.

i. Glotal: são os sons produzidos pelas cordas vocais. Ocorre quando os músculos liga-mentais da glote se comportam como ar-ticuladores. Por exemplo, em rata (na pro-núncia típica do dialeto de Belo Horizonte)

j. Faringal: são os sons produzidos pela raiz da

20 Fascículo 1

língua contra a parede posterior. Um exemplo de som faringal é aquele som grave, produzi-do quando limpamos a garganta. Os sons fa-ringais não são tão comuns nas línguas. Um exemplo de língua que se utiliza dos sons farin-gais é a árabe.

6.1.3. Quanto ao PaPel das cordas vocais

Podem ser sonoras (vozeadas) e surdas (desvozeadas): • Sonoras: /b/, /v/, /d/, /z/, /j/, /g/, /m/, /n/, /nh/,

/l/, /lh/, /r/, /rr/ • Surdas: /p/, /f/, /t/, /s/, /x/, /k/.

6.1.4. Quanto ao PaPel das cavidades bucal e nasal

Podem ser:

• Nasais: /m/, /n/, /nh/ • Orais: (todas as outras) 6.2. diacríticos

Símbolo adicional utilizado junto à consoante para marcar uma propriedade articulatória secun-dária. As articulações secundárias dos segmentos consonantais são:

• Labialização: geralmente ocorre quando a con-soante é seguida de vogais arredondadas (orais ou nasais). Utiliza-se o w colocado acima ou à direita do segmento para marcar a labialização. Exemplo: [dʷ], [tʷ]

• Palatização: a palatização geralmente ocorre quando uma consoante é seguida de vogais anteriores (orais ou nasais). Utiliza-se o símbo-lo j colocado acima à direita do segmento para marcar a palatização. Exemplo: [tʲ], [dʲ]

• Velarização: ocorre quando a lateral encontra-se em final de sílaba. O símbolo utilizado para transcrever a lateral velarizada é [tˠ], [dˠ]

• Dentalização: ocorre quando a ponta da lín-gua toca os dentes. Algumas consoantes em português podem ser articuladas como dentais ou alveolares. Por exemplo, a pronúncia do t em “tapa” pode se dar com a ponta da língua tocando os dentes sendo, portanto, dental. Exemplo: [ t̪ ], [ ɖ̪ ]

Aparelho fonador/lugar de articulação

Font

e: [a

dapt

ado

de] C

aglia

ri (1

997.

p.5

5)

Diacríticos: http://pt.wikipedia.org/wiki/Diacr%C3%ADtico#Tipos_

de_diacr.C3.ADticos

texto comPlementar

SAIBA MAIS!

A letra h não é considerada

vogal nem semivogal nem

consoante, pois não é um

fonema. Somente adquire

importância, juntando-se

a outras letras para formar

dígrafos e em início de pa-

lavras por motivos etimoló-

gicos. Junta às letras r, s, c,

ç, u (para os dígrafos con-

sonantais) e m e n (para os

dígrafos vocálicos), formam

o conjunto das letras diacrí-

ticas (aquelas que se juntam

à outra para lhe dar valor fo-

nético especial).

21Fascículo 1

atividade 1. Indique os articuladores ativos e passivos na produção de cada lugar de articulação:

a. bilabial b. labiodental c. dental d. alveolar e. alveopalatal f. palatal g. velar

2. Observe o exemplo e complete os diagramas, classificando cada consoante quanto ao modo de articulação e caracterizando-os da seguinte forma: • Vozeamento: desenhe uma linha reta cruzando a glote para os segmentos desvozeados. Para os

segmentos vozeados, desenhe uma linha em zig-zag, cruzando a glote. • Posição do véu palatino: complete o desenho com o véu palatino levantado, se o segmento for

oral. Se o segmento for nasal, complete o desenho com o véu palatino abaixado.

QUADRO MODOS DE ARTICULAçãO E FONAçãO

modos de articulação e Fonação

retroFlexas sonoras

oclusivas surdas

oclusivas sonoras

nasais sonoras

laterais sonoras

Fricativas surdas

Fricativas sonoras

vibrantes sonoras

lugares de articulação

2. Labiodentais

1. bilabiais

3. dentais

4. alveolares

5. Palato-Alveolares

6. Palatais

7. velares

8. Glotais

ɹ

ɹ

p

t

k

ɂ

ʧ

g

ʤ

b

d

ŋ

ɲ

m

n

y

l

x

h

f

s

ʃ

Ɣ

ɦ

v

z

Ʒ

ɾ

r

Fonte: [adaptado de] Cagliari (1997. p.55)

[z] [ ʃ ]

[k] [n]

22 Fascículo 1

• Articuladores: desenhe uma seta, sain-do do articulador ativo para o passivo.

3. Categorize os segmentos consonantais do português quanto ao modo de articulação:

a. /p/, /b/, /t/, /d/, /k/, /g/ b. /f/, /v/, /s/, /z/, /x/, /j/, /r/, /rr/, /l/, /lh/,

/m/, /n/, /nh/

7. alFabeto Fonético

Por que precisamos usar, para representar os sons nos estudos de fonética, um alfabeto diferente do que usamos para escrever?

Vamos responder a esta questão a partir das razões apresentadas por Fiorin (2007), ao considerar que a fonética lida com a substância da expressão e, portanto, deve-se tentar registrá-la o mais fielmen-te possível. Em primeiro lugar, qualquer pessoa pode ter se deparado com problemas ortográficos do tipo: emprego do x ou ch, g ou j, l ou lh. Isso ocorre porque, na ortografia, um som não neces-sariamente corresponde a uma letra. Por outro lado, assim como temos uma letra que correspon-de a mais de um som, um som pode corresponder a mais de uma letra. Há muitos casos em que se usa uma combinação de letras para indicar um determinado som (por exemplo, nh, lh.ch), em que uma letra representa mais de um som (x para sexo) e em que se utilizam letras que não têm correspondente sonoro algum (h em hospital).

Uma outra razão para a utilização do alfabeto fo-nético é que o alfabeto ortográfico já é uma abs-tração. Ninguém escreve como fala. A palavra porta é igualmente grafada por cariocas, piraci-cabanos e gaúchos; no entanto, cada um pronun-cia esse r de maneira diferente. Essa abstração é importante para a uniformização e o entendi-mento (preocupação com o conteúdo), porém, sendo a preocupação com o plano da expres-são, deve-se tentar explicar cada som diferente.

Mesmo com toda essa preocupação com a des-crição de cada som, não há uma generalização desses sons. Por exemplo, usa-se o [t] para no-tar o primeiro som da palavra tacape e [ʧ] para grafar o primeiro som de tia. No entanto, pode ocorrer de certas pessoas produzirem o [t], colo-cando-se a ponta da língua entre os dentes e os alvéolos, como o fazem os gaúchos. Neste caso,

acrescenta-se um diacrítico para marcar a posição, se o intuito for uma transcrição mais detalhada. Para cumprir este papel, tem-se a tabela fonética in-ternacional (IPA - Internacional Phonetic Alphabet). Esta tabela foi organizada de acordo com os traços envolvidos na produção dos sons. A finalidade do alfabeto fonético e de uma transcrição fonética é a de possibilitar a transcrição e a leitura de qualquer som em qualquer língua por uma pessoa treinada. Assim, o que se quer é que as convenções usadas sejam inequívocas e estejam explicitadas. Uma comparação entre as várias propostas de alfabetos fonéticos mostra que há uma base comum advin-da do alfabeto fonético internacional. E, na práti-ca, qualquer que seja o alfabeto adotado, ocorrem sempre adaptações determinadas por conveniências ocasionais, tais como facilidade de datilografia, tipo-gráficas, maior legibilidade etc. Nos estudos sobre o português, é bastante difundido o alfabeto de LA-CERDA & HAMMARSTRÖM (1952) (CALLOU, 2005). Em Silva (2008), encontramos uma tabela que lista os segmentos consonantais relevantes para a transcrição do português brasileiro. Veja abaixo. Logo após, a autora apresenta a transcrição fonéti-ca, observações e exemplos de palavras que ilustram cada um dos segmentos da tabela apresentada.

Em Cagliari (1997), encontramos uma tabela que apresenta os símbolos do IPA, seguidos das letras usa-das para se escrever ortograficamente o português e de exemplos para facilitar a compreensão. Confira.

articulaçãomaneira lugar

desv

voz

desv

voz

desv

voz

voz

voz

voz

voz

voz

bila

bia

l

labi

od

enta

l

alv

eoPa

lata

l

Pala

tal

den

tal

ou

alv

eola

r

Oclusiva

AFricada

Fricativa

nasal

TePe

Vibrante

retroFlexa

Lateral

SíMBOLOS FONéTICOS CONSONANTAIS RELEVANTES PARA TRANSCRIçãO DO PORTUGUêS

p t

f s

b d

v z

m n

r

lj

ʧ

ʤ

ɾ

ʃ

Ʒ

glo

tal

vel

ar

k

h

g

X

Ɣ ɦ

ř

l l y

Fonte: [adaptado de] Silva (2008.p.37)

23Fascículo 1

Font

e: C

aglia

ri (1

997.

p.5

4)

24 Fascículo 1

Em “olhos” e “óleos”, temos também palavras ge-ralmente consideradas homófonas no português. Contudo estes não são necessariamente sempre os casos envolvendo palavras homófonas. Elas podem ter registro ortográfico idêntico. Veja por exemplo: “manga (fruta)” e “manga (de camisa)”. Salienta-se aqui a natureza distinta entre pronúncia e repre-sentação fonética. A pronúncia reflete como algo foi pronunciado, e a transcrição fonética reflete a maneira mais adequada de se registrar aquela pro-núncia. Sobre as palavras “cela” e “sela” e ‘olhos” e “óleos”, podemos dizer que as palavras “cela” e “sela” são homófonas e apresentam transcrições fonéticas idênticas: [‘sɛlə]. Note que em [‘sɛlə], os segmentos consonantais e vocálicos podem ser inferidos a partir dos parâmetros articulatórios en-volvidos em sua produção. Em “óleos” e “olhos” temos duas palavras que podem apresentar pro-núncias distintas para alguns falantes. Quando homófonas, têm na última sílaba uma consoante lateral alveolar ou dental seguida de uma de uma sequência de glide anterior+ vogal(GV) e tendo como último segmento uma fricativa sibilante desvozeada([s] ou [ʃ ] dependendo do dialeto). A questão que se coloca nesse tipo de transcrição é quanto à escolha dos símbolos fonéticos a serem utilizados. Destacamos, assim, as seguintes alterna-tivas: [‘ɔli̪̯̯ʊs](VCVVC) e [‘ɔlʲʊs](VCVC). Portanto, uma transcrição fonética reflete não apenas os aspectos fonético-articulatórios de uma sequência sonora mas também a interpretação ou análise do componente sonoro da língua. (SILVA 2008. p.106 a 108.)

Assim, quando se pretender representar a maior parte dos matizes fônicos (transcrição detalhada, estrita- campo da fonética), mesmo os que não têm função linguística, a transcrição deverá ser apresen-tada entre colchetes [ ]; quando se pretender repre-sentar apenas os traços fônicos (transcrição ampla-campo da fonologia) de uma função linguística, a transcrição se fará entre barras oblíquas, / / (di-ferencia fonema de letra). Não existe, na verdade, transcrição fonética perfeita, a não ser a que é reali-zada com o registro do fato acústico bruto por meio de aparelhos de análise do som, tais como os osciló-grafos, porque não é possível representar todos os matizes fônicos de cada realização de um fonema.

Perceba que a notação fonológica é mais simples que a fonética, visto que ela não se preocupa com as diversas variantes de um mesmo fonema, utili-zando um só sinal nos casos em que a transcrição fonética deve recorrer a vários signos diferentes,

atividade | Identifique símbolos do Alfabeto Fonético Internacional que diferem dos conven-cionados no Alfabeto fonético do português.

8. transcrições Fonéticas

introdução

Este tópico tem por objetivo discutir o uso de símbolos fonéticos para o registro de dados da transcrição da fala, considerando, especialmente, a transcrição de dados do português, de forma a requerer do estudante a realização desta atividade.

Transcrição fonética e pronúncia são a mesma coisa?

As línguas naturais apresentam palavras que têm sequências sonoras idênticas com significados di-ferentes. Duas palavras pronunciadas da mesma maneira que apresentam significados diferentes são chamadas de homófonas. O par de palavras homófonas em português “cela” e “sela” tem o registro ortográfico diferente para as duas palavras.

Alfabeto Fonético Internacional:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Alfabeto_fon%C3%A9tico_

internaciona

texto comPlementar

SAIBA MAIS!

Transcrição fonética e filologia românica:

http://www.google.com.br/search?client=firefox

-a&rls=org.mozilla%3Apt-BR%3Aofficial&channel=s&

hl=pt-BR&q=alfabeto+fon%C3%A9tico+reflex%C3%B5

es&meta=&btnG=Pesquisa+Google

Pronúncia e transcrição fonética

Font

e: h

ttp:

//im

ages

.goo

gle.

com

.br/

im

gres

?im

gurl=

http

://w

ww

.eng

lish

expe

rts.c

om.b

r

25Fascículo 1

para assinalar as principais variações (combinatórias, sociais ou individuais) de uma mesma unidade distintiva. A consoante inicial da palavra rato será representada /r/ numa transcrição fonológica, mas, de acordo com o sotaque regional do falante, ela poderá ser representada foneticamente [r], [R], [ ʁ ].

atividade 1. Indique a forma ortográfica de cada uma das palavras a seguir:

2. Transcreva foneticamente as palavras: a. elegante b. carregamento c. ajudante d. congelados e. amplitude f. embrulhadinho g. refrigerante h. casamento i. exílio j. meiguice 3. Escolha um verso do poema de Drummond e faça a transcrição fonética. Considere seu idioleto.

ausência

Por muito tempo achei que a ausência é falta.E lastimava, ignorante, a falta.

Hoje não a lastimo.Não há falta na ausência.

A ausência é um estar em mim.E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,

que rio e danço e invento exclamações alegres,porque a ausência assimilada,

ninguém a rouba mais de mim.

(Disponível em: http://www.fabiorocha.com.br/drummond.htm)

26 Fascículo 1

GLOSSárIO

aritenoides – um par de pequenas pirâmides de cartilagem que fazem parte da laringe. Nestas cartilagens, as cordas vocais são anexadas.

clique – som produzido com a língua ou os lábios sem a ajuda dos pulmões. Tecnicamente, os cliques são obstruti-

rESUMO

A Fonética possui áreas de interesse. Estuda a produção dos sons da linguagem humana e os órgãos envolvidos na produção da fala.

O falar humano é um ato natural. Para atender às necessidades de expressão e comuni-cação, o ser humano codifica e decodifica a informação, utilizando-se da atividade de vários órgãos produtores da fala.

A fonação refere-se ao processo de produção de sons por meio das cordas vocais, quando estas vibram devido a uma explosão expiratória de ar, podendo produzir diferentes sons.Na produção dos sons, há a distinção destes quanto ao papel das cavidades bucal e nasal. Assim, os sons são classificados em orais e nasais. A nasalização ocorre quando fonemas orais se opõem aos nasais.

As vogais são caracterizadas pela passagem livre do ar através da cavidade bucal, não podendo haver para estas a classificação por ponto e modo de articulação. Classificam-se, assim, as vogais quanto à zona de articulação, intensidade, timbre e papel das cavi-dades bucal e nasal. As vogais se opõem às consoantes por serem acusticamente sons periódicos complexos, por constituírem núcleo da sílaba e sobre elas poder incidir acento de tom e/ou intensidade. Os sons que não se identificam como vogais ou consoantes são chamados semivogais ou glides que, por fonologicamente se comportarem como conso-antes, não assumem núcleo de sílaba e jamais são acentuados.

Consoantes são vibrações aperiódicas ou ruídos ocasionados pela obstrução parcial ou total da corrente de ar devido à ação de dois articuladores. São fonemas assilábicos, clas-sificados de acordo com a Nomenclatura Gramatical Brasileira a partir de quatro critérios:

1. quanto ao modo de articulação; 2. quanto à zona de articulação; 3. quanto ao papel das cordas vocais; 4. quanto ao papel das cavidades bucal e nasal.

Alfabético fonético é uma convenção usada para possibilitar a transcrição e a leitura de qualquer som em qualquer língua, por uma pessoa treinada. O alfabeto proposto pela Associação Internacional de fonética é um dos mais conhecidos e adotados, mesmo exis-tindo várias propostas de alfabetos fonéticos com suas adaptações.

Transcrição fonética e pronúncia diferem, pois enquanto a pronúncia reflete a maneira como algo é pronunciado, a transcrição fonética reflete a maneira mais adequada de se registrar aquela pronúncia.

vos articulados com duas cláusuras (pontos de contacto) na boca, uma à frente, e outra atrás. A bolsa de ar no meio é rarefeita por ação sugadora da língua, ou seja, os cliques acontecem devido ao mecanismo aéreo, ingressivo velárico/lingual.

27Fascículo 1

fonema – designa o som que, dentro de um sistema fônico determinado, tem um valor diferenciador entre vocábu-los. Corresponde aos sons elementares e distintivos que o homem produz quando, pela voz, exprime seus pensamen-tos e emoções.

idioleto – é uma variação de uma língua única a um indi-víduo. É manifestada por padrões de escolha de palavras e gramática, ou palavras, frases ou metáforas que são únicas desse indivíduo. Cada indivíduo tem um idioleto; o arranjo de palavras e frases é único, não significando que o indi-víduo utiliza palavras específicas que ninguém mais usa. Um idioleto pode evoluir facilmente para um ecoleto - uma variação de dialeto específica a uma família de indivíduos.

letra – sinal gráfico que, na escrita, representa o fonema. Pode-se dizer ainda que a letra é uma realidade visual grá-fica, e o fonema é uma realidade acústica.

língua – é a linguagem que utiliza a palavra como sinal de comunicação. Trata-se de um sistema de natureza gramati-cal, pertencente a um grupo de indivíduos, formado por um conjunto de sinais e de regras para combinação destes. É uma instituição social de caráter abstrato, exterior aos in-divíduos que a utilizam, que somente se concretiza através da fala, que é um ato individual de vontade e inteligência.

linguagem – todo sistema de sinais que nos permite reali-zar atos de comunicação.

protrusão – estado de um órgão que, em virtude do crescimento, se acha colocado na frente de outros órgãos que ele normalmente não ultrapassa.

som – movimento vibratório de um corpo sonoro.

rEFErÊNCIAS

BECHARA, Evanildo. Moderna gramática por-tuguesa. 37 ed. Ver. e ampl. Rio de Janeiro: Lucerna, 2001.

(Esta obra, revista e ampliada, oferece ao leitor o extraordinário universo que é a Língua Portu-guesa em suas múltiplas manifestações e reúne a maior coletânea de assuntos gramaticais. Atua-lizada no plano teórico da descrição do idioma, e enriquecida por trazer à discussão e à orien-tação normativa a maior soma possível de fatos gramaticais levantados pelos melhores estudio-sos da Língua Portuguesa, dentro e fora do país).

CALLOU, Dinah. Iniciação à Fonética e Fonolo-gia. 10 ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005.

(O livro apresenta os principais fundamentos da Linguística, tratando sobre: Língua Portu-guesa. Fonética. Fonologia. Estudos e Pesqui-

sas. Fonética: Produção de Sons na Linguagem Humana. Aparelho Fonador. Alfabeto Fonético. Fonologia: Fonema. Traços Distintivos. Arqui-fonema. Sistema Consonantal. Interpretação da Vibrante. Sistema Vocálico. Vogais Nasais. Vogais Assilábicas. Variação Fonológica. Estilís-tica Fônica. Alfabetização. Inclui nota sobre as autoras, bibliografia geral e comentada e índi-ce de figuras, onomástico e remissivo).

CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetização e Linguís-tica. São Paulo: Scipione, 1997.

(Este livro apresenta uma reflexão sobre o pa-pel que a escola desempenha na sociedade, possibilitando ao educador compreender a natureza da escrita, suas funções e usos. É in-dispensável para quem se propõe à tarefa da alfabetização. Nele se encontram fundamentos sobre conhecimentos linguísticos úteis na busca de soluções para problemas técnicos relativos à fala, à escrita e à leitura infantil).

FIORIN, José Luiz(org). Introdução à Linguística II. Princípios de análise. 4 ed. 1ª reimpressão. São Paulo: Contexto, 2007.

(Este livro expõe os princípios de análise dos fenômenos da linguagem. Começa pelo estudo dos sons (fonética e fonologia), passa pelo exa-me da palavra e dos seus componentes (morfo-logia), pela análise da sentença e chega até a investigação dos sentidos (semântica), das ca-tegorias da enunciação (pragmática) e da or-ganização do discurso. Na análise semântica, apresenta dois pontos de vista diferentes, para que o leitor perceba que, no fazer científico, princípios teóricos distintos levam ao exame de fatos diferentes ou a explicações diversas para o mesmo fenômeno. É o segundo volume de Introdução à Linguística.

SILVA, Thaïs Cristófaro. Fonética e Fonologia do português: roteiro de estudos e guia de exercí-cios. 9 ed. 1ª reimpressão. São Paulo: Contex-to, 2008.

(Este livro representa uma valiosa contribuição aos estudos fonológicos brasileiros, por pro-porcionar o conhecimento dos pressupostos te-órico-metodológicos fundamentais de fonética, fonêmica e fonologia, de maneira clara e numa linguagem coerente e acessível. Além de expor

28 Fascículo 1

objetivamente aspectos teóricos da fonética e fonologia, contém uma série de exercícios que permite ao estudante praticar os conhecimen-tos adquiridos.

______. Exercícios de fonética e fonologia. São Paulo: Contexto, 2003. (Este livro contém exercícios distribuídos em cinco partes - fonética, fonêmica, fonologia gerativa, fonologia autossegmental e teoria da otimidade. Aponta o percurso necessário a pro-fessores e estudantes de Fonética e Fonologia, fazendo uma junção com eficiência entre a te-oria e a prática).

TERRA, Ernani. Linguagem, língua e fala. São Paulo: Scipione, 1997. p.12-17

(Este livro apresenta a língua como um bem da humanidade. Conceitua e discute de forma simples e clara: língua, linguagem e fala; gra-maticabilidade e agramaticabilidade; signos, índices, ícone, símbolos; norma culta, emprésti-mos e transferência; o português do Brasil e de Portugal; gramática, níveis de fala, gíria e con-ceito de erro em língua. Em um último tópico, apresenta a Linguística: Ciência da linguagem. É, portanto, um livro importante para a com-preensão dos conceitos básicos e fundamentais da Linguística.

TRAVAGLIA, Luiz Carlos. Gramática e interação: uma proposta para o ensino de gramática nos 1º e 2º graus. 8 ed. São Paulo: Cortez, 2002.

(Este livro contém uma proposta para o ensino de gramática nas aulas de Português do 1º e 2º graus, com fundamentos teóricos e farta exem-plificação, respondendo a perguntas como:- Para que ensinar gramática?- O que ensinar nas aulas de gramática?- Como ensinar gra-mática?- Como integrar o ensino de gramática ao ensino de produção/compreensão de textos e ao ensino de vocabulário? Para responder a tais perguntas, propõem-se e inter-relacionam-se concepções de linguagem e gramática e tipos de gramática e tipos de atividades no ensino de gramática, integrando-se de modo capaz de de-senvolver a competência comunicativa do aluno e outras habilidades, tais como raciocínio cientí-fico, preparando-o efetivamente para a vida.

objetivos esPecíFicos

Identificar os principais conceitos e fundamentos da Fonologia.Aplicar princípios da teoria fonológica na pesquisa, na análise e no ensino da Língua Portuguesa.

noções bÁsicas de Fonologia Neste tópico, apresentaremos alguns conceitos básicos adotados pela teoria fo-nêmica, visando apontar, de forma introdutória, como o fonólogo vê o sistema sonoro de uma língua. Os termos fonologia ou fonêmica empregados referem-se a tendências estruturalistas que tratam do estudo da cadeia sonora da fala. Um dos objetivos da fonologia do tipo fonêmica é o de fornecer aos usuários o instru-mental para a conversão da linguagem oral em código escrito.

1. Fonema Segundo Callou (2005), a distinção feita tradicionalmente entre fonética e fonologia na linguística é a base do conceito original de fonema desenvolvido por volta de 1920. Desde o aparecimento do termo, através dos tempos, o fonema tem sido visto de diversas maneiras: de início, igualado a som da linguagem; depois conhe-cido sob um prisma essencialmente psíquico; como intenção de significado; mais tarde, sob o prisma físico, funcional e abstrato.

Nesse processo, a autora destaca momentos históricos e contribuições, apontando que, no século XIX, o termo fonema já era usado, referindo-se à unidade de som, isto é, a uma unidade fonética (fone) e não, a uma noção abstrata, que envolve oposição. Já no final do século, nos trabalhos de Baudouin de Courtenay, surge, ao lado da noção de som da fala, a noção de fonema, a partir de uma conceituação psicológica. Courtenay via o fonema como um som ideal que o falante almejava alcançar no exer-cício da fala, na qual realizava sons próximos a esse protótipo idealizado. Segundo ele, o fonema era o equivalente psíquico do som da fala.

Contudo, somente a partir de 1930, nos trabalhos do Círculo Linguístico de Praga, o conceito de fonema foi formulado com maior precisão. A noção, tal como usada hoje, já estava implícita em Saussure, em sua dicotomia langue-

2929Fascículo 2

Prof.ª maria Perpétua Teles monteiro Carga Horária | 15 horas

Fonologia e Processos

Fonológicos da língua Portuguesa

30 Fascículo 2

parole(língua-fala) bem como a ideia do contraste fonêmico presente nos trabalhos iniciais de E. Sa-pir. O primeiro passo foi dado quando Saussure es-tabelece distinção entre estudo sincrônico e estudo diacrônico das línguas. Antes à fonética competia a descrição dos sons da língua e à fonologia, o es-tudo histórico da mudança. Saussure não chegou a formular sua conceituação, mas já tinha uma ideia bastante clara de que os fonemas são, antes de tudo, entidades opositivas, relativas e negativas.

Para Trubetzkoy, o fonema passou a ter uma con-ceituação funcional abstrata, a unidade mínima distintiva do sistema de som, e é como unidade funcional que deve ser definido. O fonema é, então, a menor unidade fonológica da língua. Bloomfield definiu o fonema como uma unidade mínima de traço fônico distintivo, indivisível.

Foi esse conceito de fonema como elemento míni-mo do sistema da língua, que permitiu à linguística moderna um enorme avanço metodológico, pois lhe forneceu uma unidade discreta, isto é, segmen-tável de análise.

O russo Romam Jakobson veio a ter um papel deci-sivo dentro dos estudos fonológicos, contribuindo para formular o conceito de unidade mínima, in-divisível do fonema como unidade mais suscetível de dissociar-se em unidades inferiores ou mais sim-ples – os traços fônicos. Jakobson definiu o fone-ma como um feixe de traços distintivos, chamando a atenção para o fato de o fonema corresponder a um ato de atribuição de significado e jamais um ato de plenitude de significação. O fonema é as-sim: uma subunidade carente de significado.

O fonema é um som que, dentro de um sistema fônico determinado, tem um valor diferenciador entre os vocábulos. A realização fônica em si vai in-teressar à fonética, à fonologia interessa a oposição dos sons dentro do contexto de uma dada língua. Ela se ocupa dos aspectos interpretativos dos sons, de sua estrutura funcional nas línguas.

Quando um falante diz, por exemplo, potxi, txia, tudu, tapa até, etc., a Fonética constata as pronún-cias diferentes tx e t, e a fonologia interpreta essa diferença, atribuindo um valor único a esses dois sons, uma vez que tx ocorre somente diante da vogal i, e o t diante de outro som que não seja i. Fato semelhante ocorre quando um falante diz ora iscada, ora escada. A ocorrência de i ou de e não

muda o significado e, segundo a fonologia, o i e o e, neste caso, têm o mesmo valor. Porém, num ou-tro contexto, como em sílabas tônicas, a ocorrên-cia de i ou de e tem valor distintivo de palavras. Por exemplo, numa palavra como vi, se houver a troca de i por e, surgirá uma palavra nova, vê, com sig-nificado diferente. Esse som usado para distinguir palavras, como no caso de i e do e das palavras vi e vê, é chamado de fonema da língua. Além da fun-ção opositiva que diferencia as palavras, o fonema assume uma outra função dentro da cadeia fônica: delimitativa ou demarcativa , a partir dos traços prosódicos ou supra-segmentais, a expressiva.

atividade | Amplie suas leituras sobre o que significa ser estruturalista.

2. aloFones

Como sabemos, pode acontecer de dois sons per-tencerem ou serem realizações do mesmo fonema. As diferentes realizações de um determinado fo-nema são denominadas seus alofones. O fonema /a/, por exemplo, tem pelo menos três realizações diferentes em português. Em sílabas tônicas, ele é pronunciado como [a], ou seja, com a cavidade oral apresentando seu grau máximo de abertura. É o que ocorre em pá, caso e ávido. Em sílabas áto-nas finais, o mesmo fonema /a/ se apresenta com um grau um pouco menor de abertura, o que é transcrito como [ɐ]. Preste atenção na pronúncia de fala e casa; a vogal da sílaba tônica apresenta um grau de abertura maior do que o da sílaba átona. Uma outra realização do fonema /a/ é a que encon-tramos quando ele é nasalizado.Tanto em palavras como lã como em palavras como cama, o /a/ tôni-

Alôfone

Font

e: h

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e_sp

.gif.

Fonema: http://www.radames.manosso.nom.br/gramatica/fonema.htm.

texto comPlementar

31Fascículo 2

que ocorre em admirar, que é pronunciada como se houvesse um [i] entre o [d] e o [m], provocando a aplicação da regra de palatização do [d], que passa [dʒ]. O resultado é, portanto, a forma [adʒimi’rar]. A principal conclusão a que devemos chegar é a de que onde ocorre [d], não ocorre [dʒ], e vice-versa. Podemos dizer que esses dois fones ocorrem em distribuição complementar.

atividade | Observe as realizações dos fone-mas na figura anterior. Apresente conclusões.

2.3. Par susPeito, Par mínimo e Par anÁlogo

Para que se entenda o funcionamento do sistema fonológico de uma língua, precisa-se fazer um le-vantamento de todos os sons que ocorrem nela e depois passar a examiná-los para verificar quais são distintivos ou não nessa língua. Como os sons podem ser modificados de acordo com o contexto em que ocorrem, pode ser que dois sons diferentes sejam apenas versões ligeiramente modificadas de um mesmo elemento. Precisa-se, então, fazer um levantamento dos sons que são semelhantes na lín-gua em estudo. Por exemplo, sons como [p] e [b] ou [t] e [d] são bastante semelhantes, pois diferem um do outro apenas pelo fato de serem surdos e sono-ros. Sons foneticamente semelhantes são aqueles que compartilham de uma ou mais propriedade fo-nética. Um par de sons foneticamente semelhantes constitui um par suspeito.

O procedimento habitual de identificação de fo-nemas é buscar duas palavras com significados di-ferentes cuja cadeia sonora seja idêntica. As duas palavras constituem um par mínimo. Assim, em

co é realizado com um grau de abertura menor do que o do [a] tônico oral. Essa realização do fonema /a/, embora se encontrem outras notações, pode ser transcrita como [ã]. Uma transcrição feita como [ɐ] [’kamɐ], com [a] oral e com abertura máxima em sílaba tônica, precedendo uma consoante nasal, no máximo produziria realizações estranhas, não utilizadas pelos falantes. Perceba que se fez referên-cia a três alofones distintos do fonema /a/. Se não conseguirmos caracterizar dois segmentos suspei-tos como fonemas distintos, mas o caracterizamos como realizações distintas de um mesmo fonema, devemos buscar evidências para caracterizá-los como alofones. Dois sons diferentes podem funcionar sempre dis-tintamente, num sistema linguístico. Nesse caso, não há dúvida, eles são realizações de fonemas di-ferentes, mas mesmo que eles sejam realizações de um único fonema, a relação entre essas variantes pode ser de tipos diferentes:

2.1. variação livre

Em português, várias consoantes produzidas com a ponta da língua como articulador podem ser reali-zadas de duas maneiras distintas, como alveolares ou como dentais. Você pode verificar, pronuncian-do as palavras tom, dar, não e lá com a ponta da língua encostada nos dentes superiores ou na ar-cada alveolar, ao produzir os sons iniciais de cada uma dessas palavras. Se você disser que tem um [‘gatʊ], e eu disser que tenho um [‘gat̪ʊ], com cer-teza temos o mesmo tipo de animal doméstico, embora a pronúncia utilizada seja diferente. Não há qualquer possibilidade de distinguir significa-do em português através dessa posição. Podemos dizer, então, que entre o [t] alveolar e o [t] dental, existe variação livre sociolinguisticamente falando.

2.2. distribuição comPlementar

Chama-se distribuição complementar a relação entre alofones, quando um fone ocorre em deter-minados ambientes, e outro fone ocorre nos de-mais ambientes. Por exemplo, nos falares do por-tuguês do Brasil em que a palatização diante de [i], o [d] pode ser realizado de duas maneiras: como [d] diante de tepe e diante de qualquer vogal que não seja o [i]; ou como [dʒ] diante de [i]. Diante de qualquer consoante que não o tepe, ocorre a forma [dʒ], mas, nesse caso, ocorre epêntese ou inserção de um [i] entre o d e a consoante seguinte. É o

SAIBA MAIS!

Os alofones estilísticos – são produzidos com

intenção expressiva, como o alongamento de

[e] em eeeeeu???!!! e a vibração alongada de

em burrrrro!!!

Alofone: http://books.google.com.br/books?id=ivoQ6Q2xu0oC&

pg=PA#PPA41,M1]

texto comPlementar

32 Fascículo 2

Em posição átona, os dois fonemas correlativos tornam-se intercambiáveis, sem que isso altere o significado da forma. Por exemplo, em final de pa-lavra como em bolo/bolu, não há oposição entre os fonemas o e u. Assim, essa forma passa a ser escrita como /bolU/. O arquifonema passa a ser re-presentado por um símbolo, geralmente uma letra maiúscula, que indica a perda do contraste entre os dois fonemas, causada por uma neutralização. O conceito de neutralização e o de arquifonema (realização não-marcada resultante da neutraliza-ção) foi criado por Nicolai Trubertzkoy, fonólogo da escola de Praga (1890-1939). Algumas correntes não aceitam a noção de neutralização e preferem tratar o fenômeno dentro da morfofonologia ou morfofonêmica. 3.1. o arQuiFonema /S/ Em português, temos a oposição fonêmica entre /s,z,ʃ,ʒ/. Os pares mínimos “assa, asa, acha, haja” caracterizam o contraste fonêmico dos fonemas /s,z,ʃ,ʒ/ em posição intervocálica. Os pares mínimos “(ele) seca, Zeca, (ele) checa, Zeca caracterizam o contraste fonêmico dos fonemas /s,z,ʃ,ʒ/ em início de palavra. Perceba que, caso haja a troca de um fonema pelo outro, haverá mudança de significado de palavra. Note, contudo, que em oposição final de sílaba, o contraste fonêmico dos fonemas /s,z,ʃ,ʒ/ desaparece. Pretende-se dizer com isso que, em po-sição final de sílaba qualquer, um dos segmentos /s,z,ʃ,ʒ/ pode ocorrer sem prejuízo de significado. Observe a realização fonética que ocorre com a consoante no final de sílaba, na palavra “mês”: [‘mes] ou [‘meʃ ]; [mezbu’nitʊ] ou [me ʒ bu’nitʊ] “ mês bonito”. Em todos esses exemplos, podemos de-preender o significado da palavra. Note, contudo, que a consoante final da palavra mês ocorre como qualquer um dos segmentos /s,z,ʃ,ʒ/. Este fato per-mite a conclusão de que houve uma neutralização dos fonemas /s,z,ʃ,ʒ/ em posição, em final de sílaba, em português. Para neutralização, utiliza-se a no-ção de arquifonema. O símbolo /S/ representará os segmentos /s,z,ʃ,ʒ/ que ocorrem em final de sílaba, contexto em que a neutralização ocorre. 3.2. os arQuiFonemas /R/, /L/ e /N/ Em português, temos o “r” fraco e o “R” forte. Atesta-se contraste fonêmico (pares mínimos) en-tre estes dois tipos de “R” somente em posição in-tervocálica: “caro/carro; carreta/careta; sarar/sar-rar. O ‘r” fraco, que ocorre em palavra como “caro,

português, define-se /f/ e /v/ como fonemas dis-tintos, uma vez que o par mínimo “faca” e “vaca” demonstra a oposição fonêmica. Assim o par mí-nimo “faca/vaca” caracteriza os fonemas /f,v/ por contraste em ambiente idêntico. Um par de pa-lavras é suficiente para caracterizar dois fonemas. Esse tipo de procedimento é chamado de teste de comutação: altera-se o significante em um único ponto e verifica-se se há alteração de significado.

Quando se confirma que há distinção sistemática de significado entre pares desse tipo, tem-se que, nessa língua, os pares suspeitos formam pares mí-nimos. Basta encontrar pares mínimos para sons foneticamente semelhantes. Quando pares míni-mos não são encontrados para um grupo de sons em uma determinada língua, pode-se se caracteri-zar os dois segmentos em questão como fonemas distintos pelo contraste em ambiente análogo. Assim, duas palavras que ocorram em ambientes similares podem caracterizar o contraste em am-biente análogo, desde que a diferença entre os sons não seja atribuída aos sons vizinhos, por exemplo, devido a processos de assimilação. Um exemplo para demonstrar o contraste fonêmico em ambien-te análogo pode ser em [s] e [z], em posição inicial, no par de palavras “sumir/zunir”. Note que em “sumir/zunir” além da diferença segmental de [s] e [z], temos a diferença entre [m] e [n], precedendo a vogal tônica. Não há razão para se supor que as consoantes nasais [m] e [n] possam influenciar as ocorrências de [s] e [z] (por assimilação, por exem-plo). Portanto, o par de palavras ‘sumir/zunir” de-monstra o contraste em ambiente análogo entre [s] e [z], em posição inicial.

3. a neutralização e o arQuiFonema

O conceito de neutralização não deve ser confun-dido com o de variação. Existe neutralização, quan-do há uma supressão das oposições entre dois ou mais fonemas em determinados contextos, isto é, quando uma oposição é anulada ou neutralizada. No sistema fonológico do português, em posição pretônica, há uma neutralização entre [e] e [ɛ] e [o] e [ɔ], cuja posição é funcional em posição tônica.

Neutralização e arquifonema:

http://books.google.com.br/books?id=ivoQ6Q2xu0oC&

pg=PA#PPA66,M1( página 66)

texto comPlementar

33Fascículo 2

4. traços ou ProPriedades distintivas Cagliari (2002. p. 85) inicia este assunto pontuan-do que a fala é um contínuo, que pode ser inter-pretado em função de segmentos, devido às carac-terísticas articulatórias, acústicas e auditivas e em função de unidades (segmentos) que se sucedem no tempo. Com base na saliência auditiva, a de-composição da fala mais comum gera os segmentos representados por letras dos alfabetos fonéticos. É uma segmentação por blocos e linear. Todavia, cada um desses blocos pode ser decomposto nas ca-madas que os compõem. Procedendo assim, tem-se uma segmentação não das unidades que se suce-dem no tempo, mas dos elementos que coexistem num determinado bloco ou segmento, num deter-minado tempo da corrente da fala. Essas camadas que compõem os segmentos são as propriedades fonéticas dos sons da fala e são usadas pela fono-logia como propriedades distintivas ou não com relação ao valor de informação fonológica.

Assim em fonologia, propriedades ou traços distin-tivos, ainda chamados funcionais, pertinentes ou relevantes, referem-se a unidades mínimas, contras-tivas e são aquelas que irão distinguir, entre si, os elementos lexicais. O caráter infinito das possibili-dades humanas de articulação e o fato admitido de que um mesmo indivíduo não realiza nunca, duas vezes seguidas, o mesmo som de maneira idêntica não impedem que se identifiquem sempre deter-minado som de uma língua, cada vez que é ouvido, como sendo o mesmo som e não outro. Para os linguistas de Praga, o que torna essa identificação possível é o chamado traço distintivo que pode ser definido por seus componentes articulatórios e/ou acústicos. São traços articulatórios ou acústicos pertinentes aqueles que servem para caracterizar um fonema em face de outros que têm com ele traços comuns. São esses traços que interessam ao linguista. Ele irá, a partir deles, organizar o siste-ma fonológico das línguas. Uma diferença mínima entre duas unidades da língua constitui um traço distintivo. (CALLOU, 2005. p. 38 e 39).

Historicamente, foram propostos vários tipos de inventários de traços distintivos com o objetivo de sistematização das unidades fonológicas e com vistas a uma maior ou menor correlação com a re-alidade fonética. Não nos deteremos neste espaço a essa discussão teórica dos diferentes modelos

careta, manifesta-se como um tepe ou vibrante sim-ples em qualquer dialeto do português: [ɾ]. O ‘R” forte ocorre em início de sílaba (carro, rua, Israel). Observe, agora, algumas ocorrências de ‘R” posvo-cálico. Considerando a palavra “par”, temos [‘pah] (Belo Horizonte), [‘paɾ] (São Paulo); /’paR/(fonêmi-ca); em parto, temos: [‘pahtʊ] em (Belo Horizonte), [‘paɾtʊ] (São Paulo). Perceba que, em Belo Horizon-te, ocorre o segmento [h], e o segmento [ɾ], em São Paulo. A perda de contraste fonêmico em o ‘r” fraco e o “R” forte é neutralizada no português em posi-ção de final de sílaba. Nesse contexto - de posição final de sílaba - utilizamos o arquifonema /R/ para representar fonemicamente o “R” posvocálico.

Além do arquifonema /S/ e do /R/, o fonema /l/ que também pode ocorrer em posição posvocálica em “cal” /’kaL/ (forma fonêmica), aponta-se o ar-quifonema /N/ posvocálico nasal em “um” /’uN/(forma fonêmica), em que se tem a sílaba travada pelo arquifonema /N/.

atividade 1. Faça a transcrição fonética e fonológica

dos dados apresentados abaixo. Não es-queça que as transcrições fonéticas são feitas entre colchetes, e as fonológicas (fo-nêmicas), entre barras transversais:

a. fugaz b. arroz c. atroz d. luz e. susto f. vespa g. lesma h. vesga i. mês j. mês passado l. mês bonito m. mês alegre

2. Considerando a atividade anterior, res-ponda: Que fonemas perderam a sua proprie-dade contrastiva em posição final de sílaba?

Introdução aos estudos de fonologia do portu-

guês brasileiro (página 209):

http://books.google.com.br/books?id=TFzWAq-

S7I0C&pg=PA

texto comPlementar

34 Fascículo 2

zidos com aponta da língua como articu-lador ativo, o que se move em direção ao articulador passivo. São coronais, portanto, sons como [s, t, l]. Algumas análises também consideram as vogais anteriores como coro-nais. Todos os demais são não-coronais.

• [+ labial]: são labiais os sons produzidos com o lábio inferior como articulador ativo. Essa classe abrange os sons bilabiais e labiodentais.

• [+ dorsal]: são dorsais os sons produzidos com a parte posterior da língua como arti-culadores ativo. Inclui as consoantes uvu-lares e velares, além das vogais posteriores. Algumas análises, no entanto, incluem todas as vogais entre os sons dorsais.

• Traços de modo de articulação: [+ sonoro], [+ nasal], [+ lateral].

• Outrostraços:[+ anterior], [+ posterior], [+ ar-redondado], [+ alto], [+ baixo].

• Traçosnãorelevantesparaoportuguês:[+ aspi-rado], [+ glotalizado].

Os traços com sinal (+) são marcados, e os com sinal (-) não são marcados. Em uma notação como [+ sonoro], não se lê a valência (o sinal +), mas se diz apenas sonoro. Na notação [- sonoro], por exemplo, diz-se não-sonoro ou surdo, não sendo costume dizer menos sonoro.

atividade | Pesquise e selecione dados do idio-leto de um falante de São Paulo e um gaúcho e transcreva foneticamente esses dados, apresen-tando observações sobre possíveis variantes.

5. asPectos suPrassegmentais ou Prosódicos

Podemos distinguir os sons uns dos outros por pro-priedades que detectamos em cada um deles ou por propriedades que só podemos detectar sintagmati-camente. Dentre as propriedades que detectamos em cada um dos sons, encontra-se o modo de ar-

quanto ao caráter dos traços distintivos.

4.1. traços distintivos • Osdenominadosindependentesdosarticulado-

res (não estão associados a um único articulador)

• [+ consonantal]: corresponde intuitivamen-te à divisão entre vogais e consoantes. Têm o traço [+ consonantal] os sons que apresentam um grande obstáculo à passagem do ar pela parte central da cavidade oral, isto é, se há neles um fechamento total (como nas oclusi-vas, nas nasais, laterais e vibrantes) ou quase total (como fricativas). Dessa forma, as semi-vogais ou glides ficam classificadas com o traço [- consonantal]

• [+ vocálico]: são vocálicos os sons produzidos sem impedimento à passagem de ar. Assim, como os sons [l, ʎ, r, ɾ] são produzidos com rela-tiva desobstrução do ar, eles são considerados como tendo o traço [+ vocálico]. Por outro lado, como os glides caracterizam-se por terem o espaço da passagem do ar mais reduzido do que nas outras vogais, eles são caracterizados como [- vocálico].

• [+ soante] ou [+ sonorante]: uma das for-mas de caracterizar essa oposição é dizer que têm o traço [+ soante] os sons que não dificultam a produção das cordas vocais. É atributo o traço [- soante] aos sons que apresentam uma obstrução grande à pas-sagem do ar, dificultando, dessa maneira, essa vibração. Têm o traço [- soante], por-tanto, as oclusivas, fricativas e fricadas. Os demais sons (vogais, semivogais, nasais, laterais e vibrantes) têm o traço [- soante]

• [+ contínuo]: os sons que têm o traço [+ contínuo] são produzidos sem que haja uma interrupção do fluxo de ar. Se houver essa interrupção, considera-se que o som tem o traço [- contínuo], o que abrange as oclusivas, africadas e vibrantes.

• [+ tenso]: são os sons produzidos com con-siderável esforço muscular. A oposição entre os chamados r fraco (o de era) e o r forte (o de erra) pode ser caracterizada por esse traço, tendo eles os traços [- tenso] e [+ tenso], respectivamente.

• Osdependentesdeumarticulador

• [+ coronal]: são coronais os sons produ-

Uma breve reflexão sobre o sistema de traços

distintivos: http://www.unicamp.br/iel/site/alunos/publicacoes/

textos/b00007.pdf.

texto comPlementar

35Fascículo 2

ticulação, os articuladores que os produzem(ativos e passivos). Essas propriedades são chamadas de segmentais. Dentre as propriedades que só pode-mos identificar sintagmaticamente, temos o fato de um som ser prolongado ou não, ser agudo ou grave. Essas propriedades são chamadas de supras-segmentais ou prosódicas.

Dentre as propriedades suprassegmentais, en-contramos o acento e os tons. O acento, familiar a nós, falantes de português, pode ser manifes-tado por qualquer um dos tipos de propriedade acústico (altura, intensidade e duração), ou por uma combinação de mais de um tipo dessas pro-priedades. Os tons se relacionam basicamente à altura do som (no sentido de ser um tom relati-vamente agudo ou relativamente grave: acento musical). Esses tipos de propriedades suprasseg-mentais (acentos e tons) podem ter importante função de distinguir itens lexicais. O português e as demais línguas românicas, o inglês, o alemão, são línguas de acento de intensidade; o latim e o grego, por outro lado, possuem acento musical. Numa língua como o português, o acento pode ter uma função distintiva. Assim, em palavras como sábia, sabia e sabiá, a acentuação distin-gue o significado delas. Em algumas línguas, são os tons que distinguem o significado e não, a acentuação. Como exemplo de língua que usa os tons distintivamente, temos o japonês em que pares de palavras como háshì e hàshí, em que o primeiro significa “palitinho usado para comer”, e o segundo, “ponte”.

Portanto, traços prosódicos ou suprassegmen-tais têm função expressiva e devem ser consi-derados em conta numa descrição fonológica. O acento de intensidade deve ser marcado na representação fonológica em que o símbolo [’] (símbolo de minuto) precede a sílaba tônica. Exemplo: para fabrica e fábrica, temos [fa’bɾika] e [’fabɾika] respectivamente.

atividade | Transcreva foneticamente os da-dos abaixo. Marque a sílaba tônica colocando o símbolo [’] antes da sílaba acentuada:

a. sílabab. dissílabac. silabard. silabadoe. óperaf. opera

g. operadoh. operadori. médicaj. medical. medicadom. medicamento

6. Processos Fonológicos Como já vimos, os sons não são realizados da mes-ma maneira. Dependendo do contexto em que ocorrem, os sons podem sofrer modificações. A sistematização e organização desses sons, segundo sua estrutura e funcionamento, é objeto de estudo da fonologia que elabora conceitos, procedimen-tos e processos para classificá-los. Vejamos alguns desses processos fonológicos mais comuns.

6.1. Processos Que acrescentam traços ou

mudam a esPeciFicação dos traços

a. Assimilação: refere-se a qualquer processo em que um som adquire características ou traços dos sons que o rodeiam;

b. Nasalização: é um tipo de processo fonológico bastante comum em português. Quase toda vogal tônica que precede consoante nasal se

SAIBA MAIS!

Acento de insistência ou emocional: o por-

tuguês também faz emprego do acento de

intensidade para obter, com o chamado

acento de insistência, notáveis efeitos.Quan-

do se quer enfatizar uma palavra, insiste-se

mais demoradamente na sílaba tônica. Os

escritores costumam indicar, na grafia, este

alongamento enfático, repetindo a vogal da

sílaba tônica. O acento de insistência também

pode cair em outra sílaba, diferente da tôni-

ca. A causa essencial do fenômeno do recuo

do acento pode ser a falta de sincronia entre

emoção e expressão, através da linguagem. A

emoção se adianta à palavra e reforça a voz.

Dicionário de Linguística:

http://books.google.com.br/books?id=ivoQ6Q2xu0oC&

pg=PA#PPA5,M1.

O acento em português-abordagens fonológicas:

http://www.parabolaeditorial.com.br/releaseacento.htm.

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36 Fascículo 2

7. anÁlise Fonológica O domínio e aprofundamento dos conceitos e pro-cedimentos apresentados nos tópicos anteriores são necessários para uma análise fonológica (fonê-mica) de uma língua. Para que essa atividade possa ser efetivada, Cagliari (2002. p. 55) apresenta os seguintes passos:

• O corpus: como a análise fonológica baseia-se em dados fonéticos da fala, a primeira pro-vidência é coletar esses dados através de uma transcrição fonética detalhada e cuidadosa. Esse conjunto de dados, ou corpus, pode ser constituído de palavras (cerca de 50), frases e textos. Posteriormente, haverá necessidade de ampliação do corpus com mais exemplos e com outros tipos de ocorrência, como pequenos tex-tos espontâneos, textos lidos, falas informais e discursos formais, conversas, diálogos etc.

• A tabela fonética: feitas as transcrições foné-ticas e obtido um corpus, o passo seguinte é fazer o levantamento de todos os sons que aparecem no corpus e colocá-lo em forma de tabela fonética. Essa tabela segue o padrão tra-dicional de classificação fonética dos sons.

• Os pares suspeitos: verificando os sons da ta-bela fonética, fazem-se os balões ao redor dos pares de sons foneticamente semelhantes para posterior investigação. Em geral, sobram alguns sons que, por serem muito diferente dos de-mais, precisam ser investigados separadamen-te, para ver, por exemplo, se não estão em dis-tribuição complementar ou em variação livre.

• Os pares mínimos: em seguida, procuram-se para cada par suspeito os pares mínimos en-contráveis no corpus. Todo par mínimo esta-belece o valor de dois fonemas, os quais come-çam a formar uma outra tabela: a tabela dos fonemas nos moldes da tabela fonética.

• Os ambientes análogos: para os casos de pares suspeitos não resolvidos através de pares míni-mos, recorre-se aos ambientes análogos, para verificar se são fonemas ou não.

• A distribuição complementar: a verificação de que houve ou não distribuição complementar obtém-se através de tabelas especiais de ocor-rências dos sons foneticamente semelhantes. Faz-se necessário partir de uma análise mais abrangente dos contextos em que esses sons ocorrem e, depois, verificar qual é a distribui-ção real que eles têm na língua.

• Os sons restantes: o passo seguinte consiste em

nasaliza; c. Palatização: faz com que uma consoante se

realize como palatal, quando diante de vogal anterior palatal (tira, diabo);

d. Harmonização vocálica: ocorre uma ação as-similatória da vogal tônica sobre a pretônica (m[i]nimo], f[i]liz);

e Metafonia: ocorre uma ação assimilatória da vogal átona sobre a tônica. A metafonia é um processo diacrônico, que irá explicar a pas-sagem de metu a m[e]du. Sincronicamente, plurais, como form[o]sos, comp[o]stos que a norma culta rejeita, explicam-se por extensão da regra de metafonia.

6.2. Processos Que inserem segmentos

a. Ditongação: mudança fônica resultante de alter-nância sincrônica ou de evolução diacrônica. Essa mudança se deve à redução de um hiato ou a uma segmentação de uma vogal em duas partes, for-mando uma única sílaba.

b. Epêntese: fenômeno que consiste em interca-lar, numa palavra ou grupo de palavras, um fo-nema não etimológico por motivos de eufonia, de comodidade articulatória, por analogia. Na palavra italiana e portuguesa inverno, houve epêntese em relação à palavra latina hibernum.

6.3. Processos Que aPagam segmentos

a. Tradicionalmente denominados síncope, afére-se, apócope, a depender da posição em que se encontre a vogal.

b. Outros processos fonológicos que podem ocor-rer nas línguas naturais podem ser determina-dos não só por certos traços distintivos mas também pela prosódia e pela morfologia. (Es-tes serão estudados um pouco mais à frente).

atividade | Pesquise e aponte:

a. Sons foneticamente semelhante do portu-guês;

b. Exemplos dos processos fonéticos estuda-dos.

Geração Automática de Variantes de Léxicos

do Português Brasileiro para Sistemas de reco-

nhecimento de Fala: http://www.linse.ufsc.br/~fernando/DocWeb/Seara-

2003Variantes.pdf.

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37Fascículo 2

verificar o status fonológico dos sons que fica-ram isolados na tabela e que não participaram da discussão fonológica com outros sons. Não havendo dúvida, em princípio, esses sons são fonemas independentes. Havendo dúvidas, es-ses sons deverão ser investigados, comparados com outros sons e analisados para se saber se são alofones em variação ou apresentam um valor de fonema.

• O inventário dos fonemas: neste momento, o inventário de fonemas na tabela de fonemas deve estar completo, e os processos fonológi-cos de distribuição dos fonemas e da ocorrên-cia de seus alofones já devem ser do conheci-mento do pesquisador.

• Os processos fonológicos: um aspecto impor-tante da análise fonológica é a formulação de regras de distribuição dos fonemas e da reali-zação de seus alofones. Todas as modificações que os fonemas sofrem devem ser descritas e formuladas de acordo com a tradição da fono-logia. Para que uma análise fonológica fique mais completa, é necessário considerar não apenas os aspectos segmentais mas também os fenômenos suprassegmentais, morfofonológi-cos, sociolinguísticos, pragmáticos etc.

• A transcrição fonológica: uma análise fono-lógica completa costuma apresentar o corpus transcrito com os fonemas. Desta forma, os dados aparecerão documentados com a trans-crição dos fonemas dos itens lexicais e com seus respectivos alofones. Com isto, a análise fonológica está concluída.

atividade | Identifique, em sua comunidade, um falante de quem você possa gravar uma conversa e retirar algumas palavras que julgue interessantes para análise. Faça a análise dos dados selecionados.

8. modelos Fonológicos Neste tópico, à luz de Silva (2008), teremos uma breve visão da trajetória pós-estruturalista da análi-se do componente sonoro das línguas naturais. O

modelo fonológico do tipo fonêmico, apresentado durante este fascículo, ilustra uma tentativa estru-turalista de formalização do componente sonoro. Correntes teóricas pós-estruturalistas, que tratam do componente sonoro, são conhecidas como mo-delos fonológicos aqui apresentados da fonologia gerativa padrão à interface fonologia-sintaxe.

o estruturalismo Como já foi dito, o modelo fonêmico expressa uma tentativa de formalização do componente sonoro. Em correntes estruturalistas, a investi-gação do componente sonoro prevalecia sobre a análise de outras áreas (como a morfologia e a sintaxe, por exemplo). Na verdade, os proce-dimentos teóricos e metodológicos postulados para a análise do componente sonoro dentro de uma ótica estruturalista foram estendidos a outras áreas da análise lingüística, contribuindo para o seu progresso como ciência. Dentre as tantas discussões, temos que em uma análise fo-nêmica, deve-se ter um inventário fonético (que lista os fonemas, alofones e informações sobre a estrutura silábica ou suprassegmental). A uni-dade mínima de análise é o fonema. Pares míni-mos caracterizam a oposição entre os fonemas; Alofones caracterizam a variação expressa pela distribuição complementar e o fonema constitui uma unidade mínima de análise, que tem um papel contrastivo e concreto na investigação lin-guística. É fato que os procedimentos teóricos e metodológicos postulados para a análise do componente sonoro dentro de uma ótica estru-turalista foram estendidos a outras áreas da aná-lise linguística, contribuindo para o progresso desta. À linguística cabe analisar e formalizar o supra-sistema que Saussure denominou língua. A fonte de dados para a análise linguística é a fala que consiste da linguagem enquanto evento físico (em termo de pronunciarem-se sequências de sons). Posteriormente, a proposta de inter-pretar-se o fonema como unidade mínima de análise será questionada e implicará mudanças significativas para a teoria linguística.

Além da corrente fonêmica, outras propostas tive-ram um caráter importante na elaboração e no desenvolvimento da proposta estruturalista: a cor-rente do Círculo linguístico de Praga (Trubetzkoy (1939) Jakobson (1967), as contribuições de Saus-surre (1916); Sapir(1925); Boloofield (1933); Mar-tinet (1968); Matto Câmara (1970).

Modelos teóricos (página 13):

http://books.google.com.br/books?id=TFzWAq-

S7I0C&pg=PA#PPA13,M1

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38 Fascículo 2

a Fonologia gerativa Padrão Em 1965, Chomsky publica Aspects of the theory of syntax, apresentando uma proposta convincente de interpretação e análise da estrutura linguística. Este trabalho revoluciona a relação interna dos estu-dos linguísticos. O componente sonoro, que tinha um papel preponderante na análise linguística, pas-sa a ser visto apenas como parte integrante do me-canismo linguístico. A proposta de análise gerativa assume a noção de processos. A fala é gerada a partir de transformações impostas a representações subja-centes. As representações subjacentes pretendem es-pelhar o componente linguístico internalizado que o falante tem de sua língua. As representações sub-jacentes relacionam-se à competência linguística. A competência linguística opõe-se ao desempenho. O desempenho é formalizado pelas representações de superfície, que pretendem refletir o comportamen-to empírico da língua a ser analisada. Comparando-se a proposta gerativa ao modelo estruturalista, po-de-se dizer que a competência relaciona-se à língua e que o desempenho relaciona-se à fala. A inovação do modelo gerativo do ponto de vista teórico e me-todológico refere-se à noção transformacional de ge-ração de estruturas gramaticais e ao relacionamento explícito que passa a ser definido entre a linguagem e o mecanismo psicológico que o gera. o modelo natural • Fonologia gerativa natural: tem como postu-

ladores Vennemann(1972) e Hooper (1972, 1976). Estes autores defendem que o compo-nente fonológico deve ocupar-se com transpa-rências e com a motivação fonética regular. To-das as outras regularidades devem ser tratadas com informações do componente morfológico, buscando-se evitar soluções abstratas. A fonolo-gia gerativa natural busca definir os princípios que regulam as regras foneticamente motivas das não-produtivas. Além de investigar como o léxico é estruturado, investiga se as restrições sequenciais devem ser definidas em termos de morfemas.Vennemann e Hooper propõem que a sílaba seja incorporada à teoria fonológica.

• Fonologia natural: uma corrente alternativa denominada fonologia natural surge com a proposta de Stampe(1980). A diferença entre a fonologia gerativa natural e a fonologia natu-ral é que a primeira busca investigar a naturali-dade das regras fonológicas enquanto a segun-da tem por objetivo caracterizar a naturalidade

das representações e processos fonológicos.

Fonologia não-linear

• Fonologia CV: Na fonologia gerativa padrão, a proposta de formalização da silaba é repre-sentada por Kahn (1976).Nesta proposta, o nódulo que representa a sílaba domina ime-diatamente seus constituintes, que são seg-mentos. De acordo com tal proposta, os tra-ços distintivos{consonantal] e [silábico] são excluídos das representações segmental. Isso dá lugar à presença das categorias C (para as consoantes) e V para as vogais. Os elementos CV formam um conjunto de unidades tempo-rais. Tais unidades possuem um status teórico semelhante a C e V em perspectivas estrutura-listas, uma vez que se permite categorizar síla-bas em termos de suas sequências segmentais.

• Fonologia autossegmental: surge como uma proposta teórica de interpretação da sílaba que se iniciou com o estudo de aspectos su-prassegmentais da fala, como tons acentos. Ar-gumentos gerais e motivação da teoria podem ser encontrados em Goldsmith (1990).

Fonologia de dePendência

As teses que geraram a formulação da fonologia de dependência surgiram na década de 1970. A relevância da teoria de dependência para as re-presentações fonológicas e morfológicas pauta-se na proposta da analogia estrutural. Esta proposta distingue a fonologia de dependência de outros modelos teóricos, uma vez que a representação fo-nológica relaciona-se a aspectos de representação morfológico e sintático.

Fonologia de governo

A fonologia de governo assume que as relações de governo estabelecidas no processo de silabifi-cação são universais. As relações de governo são derivadas de princípios da gramática universal e juntamente com parâmetros específicos das lín-guas naturais definem os sistemas fonológicos. A fonologia de governo propõe um formalismo de si-labificação, representação, segmentação, interação entre a fonologia e outros componentes da gramá-tica e de organização do léxico. A proposta teórica dessa teoria é de Kaye e Lowenstamm (1981-1985).

39Fascículo 2

Fonologia lexical

Na fonologia lexical, a interação entre os compo-nentes fonológico e morfológico dá-se por meio da inter-relação das regras de diferentes domínios (fonológico e morfológico). A fonologia lexical propõe três níveis de representação: subjacente, le-xical e fonética. Dentre os títulos mais importantes da fonologia lexical cita-se Kiparssky (1982), Mo-hanan (1982), Booij e Rubach (1984), Pulleybank (19860), Inkelas (1989), Hargus e Kaisse (1993).

teoria da otimização

A teoria da otimização propõe um programa que ex-plicita um modelo de análise gramatical. A fonolo-gia tem sido foco de pesquisa nessa linha. Têm-se re-ferência no trabalho de Prince e Smolensky (1991). Um aspecto importante da teoria da otimização diz respeito ao formalismo assumido. Assume-se que a forma superficial de uma forma lexical é escolhida com base na condição de satisfazer restrições gerais sobre as representações de saída (output). Regras fonológicas são ausentes no formalismo deste mo-delo. A teoria da otimização consiste de um pro-grama de pesquisa de cunho gerativo que propõe metas para a linguística geral. Estas metas devem ser alcançadas para todos os níveis da gramática.

interFace Fonologia-sintaxe

A descrição e formalização dos sistemas sonoros tinham posição de destaque até meados da década de 1960 nos estudos linguísticos. Após a proposta de Chomsky (1965), o foco da análise linguística passa a ser a organização do componente sintáti-co. A descrição dos sistemas sonoros passa a fazer parte do componente fonológico que atua após os mecanismos sintáticos terem sido concluídos. A interface fonologia-sintaxe pode ser pesquisada nos trabalhos de Selkirk (1980), Pullum e Wicky (1984), Nespor e Vogel (1986) Scarpa (1999).

Fonologia de uso

A fonologia de uso oferece uma proposta alternati-va de análise do componente sonoro, expressando a relação entre fonética-fonologia e fonologia-mor-fologia. Esta proposta de análise pode ser relacio-nada à proposta de Langacker (2000), que trata da transcrição gramatical abordando o uso da lingua-gem. A fonologia de uso oferece uma proposta de relacionar aspectos sincrônicos e diacrônicos na

análise do componente sonoro. Trabalhos do por-tuguês que adotam a fonologia de uso são os de Cristófaro-Silva e Oliveira (2202)].

atividade | Amplie suas leituras sobre a teo-ria apresentada por Chomsky. Reflita sobre o conceito de competência linguística e discorra sobre a contribuição dessa teoria para o ensi-no de Língua Portuguesa na atualidade.

Pela incorporação de informação fonética aos

modelos fonológicos: http://www.letras.ufpr.br/documentos/pdf_revistas/

hpsilva.pdf]

texto comPlementar

texto comPlementar

Estruturalismo:http://www.vestibular1.com.br/revisoes/filosofia/estrutu

ralismo.htm;

http://www2.fcsh.unl.pt/edtl/verbetes/E/estruturalismo_

checo.htm)

Fonologia métrica (página 68):

http://books.google.com.br/books?id=TFzWAq-

S7I0C&pg=PA#PPA68,M1

Fonologia métrica e prosódica:

http://www.unincor.br/revista/Fonologia5.html

40 Fascículo 2

rESUMO

Há uma discussão histórica sobre a compreensão do objeto de estudo da fonética e da fonologia que vai encontrar maior precisão nas contribuições de Saussure, Trubetzkoy e Jakobson, quando o fonema passa a ser entendido como um som que, dentro de um sistema fônico determinado, tem um valor diferenciador entre os vocábulos.

Alofone: cada realização de um fonema. A relação entre as variantes pode ser: variação livre e por distribuição complementar.

Para descrição de uma língua, precisa-se fazer, inicialmente, um levantamento de todos os sons dessa língua. Definem-se quais sons têm valor distintivo (são fonemas); quais sons são foneticamente semelhantes (formam par suspeito); dos pares suspeitos, formam-se os pares mínimos; passa-se ao agrupamento realizado a partir da estrutura e do funciona-mento desses sons; criam-se regras que caracterizam os processos fonológicos. Os pro-cessos fonológicos consistem, então, numa sequência de regras para esse agrupamento e explicação dos sons.

O arquifonema corresponde ao resultado de uma neutralização.

Traços distintivos são propriedades mínimas, de caráter acústico ou articulatório, que, de forma co-ocorrente, constituem os sons das línguas.Pode-se definir um conjunto de traços distintivos como um conjunto específico de propriedades que constituem os fonemas.

Pode-se distinguir os sons uns dos outros por propriedades presentes em cada um deles. Essas propriedades podem ser segmentais ou suprassegmentais.

Uma análise fonológica exige o domínio de conceitos e o desenvolvimento de alguns passos que vão desde a coleta dos dados à transcrição fonológica.

Os principais modelos fonológicos que buscam a formalização do componente sonoro das línguas naturais são: o estruturalismo, a fonologia gerativa padrão, o modelo natural, fonologia gerativa natural, modelo natural, fonologia não-linear, fonologia de dependên-cia, fonologia de governo, fonologia lexical, teoria da otimização, interface fonologia-sintaxe e fonologia de uso.

GLOSSárIO

acentuação – modo de proferir um som ou grupo de sons com mais relevo que os outros. Esse relevo denomina-se acento.

Diz-se que o acento é de intensidade (acento de força, acento dinâmico, acento expiratório ou icto), quando o relevo consiste no maior esforço expiratório. Diz-se que o acento é musical (acento de altura ou tom), quando o rele-vo consiste em elevação ou maior altura da voz.

estruturalismo – corrente de pensamento nas ciências humanas, que se inspirou no modelo da linguística e que apreende a realidade social como um conjunto formal de relações.

rEFErÊNCIAS

BECHARA, Evanildo. Moderna gramática por-tuguesa. 37. ed. Ver. e ampl. Rio de Janeiro: Lucerna, 2001.

CALLOU, Dinah. Iniciação à Fonética e Fonolo-gia. 10 ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005.

CAGLIARI, Luiz Carlos. Análise fonológica: introdução à teoria e à prática com especial destaque para o modelo fonêmico. São Paulo: Mercado das letras, 2002.

41Fascículo 2

FIORIN, José Luiz(org). Introdução à Linguística II. Princípios de análise. 4. ed. 1ª reimpressão. São Paulo: Contexto, 2007.

SILVA, Thaís Cristófaro. Fonética e Fonologia do português: roteiro de estudos e guia de exercí-cios. 9. ed. 1ª reimpressão. São Paulo: Con-texto, 2008.

4343

Processos morFoFonológicos

e estilísticos Prof.ª maria Perpétua Teles monteiro

Carga Horária | 15 horas

objetivos esPecíFicos

Apontar os principais conceitos relacionados aos processos morfofonológi-cos e estilísticos da Língua Portuguesa.

1. morFoFonologia

introdução

Neste fascículo, apresentaremos, de forma introdutória, alguns conceitos neces-sários ao estudo dos processos morfofonólogicos e estilísticos, uma vez que, du-rante o curso, morfologia e estilística serão conteúdos de ensino em disciplinas específicas. Vale ressaltar, inicialmente, que a morfofonologia ou morfofonêmi-ca, em linguística estrutural, correspondem à fonética e à fonologia, quando os itens léxicos inseridos no lugar dos símbolos recebem uma interpretação fonéti-ca. Trata-se de um nível intermediário entre fonologia e morfologia, visando ao estudo das diferentes formas fonéticas apresentadas por um mesmo morfema. Que não pareça óbvio dizer que a morfologia, tratando de formas, ocupa-se das condições de estruturas da parte significante dos signos e das regras que determinam as possíveis variações dos significantes, uma vez que esse enfoque enfatiza o caráter fônico da morfologia, quando da combinatória fônica, é que resultam os padrões morfológicos.

1.1. morFologia Podemos conceituar morfologia como o estudo da forma, da configuração, da aparência externa da matéria. O termo morfologia foi inicialmente empregado nas ciências da natureza, botânica e geologia. Na linguística, começou a ser utilizado no século XIX. Nessa época, sob a influência do modelo evolucionis-ta de Darwin, acreditava-se que o estudo da “evolução” das ‘quatrocentas ou quinhentas’ raízes básicas do indo-europeu poderia levar à solução do velho enigma da origem da linguagem. Hoje, essa questão está praticamente fora do âmbito da pesquisa linguística, e o estudo da forma das palavras assume outra abrangência e complexidade. Considerar o morfema ou a palavra como a uni-dade central do estudo morfológico resulta em modos diferentes de se abordar a morfologia. Pode-se dizer que a noção de morfema está relacionada com o estruturalismo, que tinha como problema central a identificação dos morfemas nas diferentes línguas do mundo.

Fascículo 3

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O estudo da morfologia se subdivide em dois campos: 1. um, dedicado ao estudo dos mecanismos mor-

fológicos por meio do qual se formam palavras novas – domínio da morfologia lexical;

2. outro, voltado à análise dos mecanismos mor-fológicos que apresentam informações grama-ticais – domínio da morfologia flexional.

1.2. morFologia lexical Derivação e composição são os processos mais ge-rais de formação de palavras. O processo de deri-vação é o mais utilizado para formar novos itens lexicais. A derivação é o mecanismo básico da mor-fologia lexical. • Derivação: nesta, acrescenta-se um afixo (su-

fixo ou prefixo) a uma base. A base de uma forma derivada é geralmente uma forma livre, isto é, uma forma mínima que pode constituir sozinha um enunciado, como um verbo, um adjetivo ou um advérbio. Podemos, também, ter derivados a partir de formas presas, isto é, formas que não podem ocorrer sozinhas, como na palavra morfológico, em que se jun-tou o sufixo – ico, formador de adjetivos à base morfolog, composta de morfo + log, que é, ao mesmo tempo, composta (dois radicais gre-gos) e presa. Em português, raízes e radicais servem de base para a adjunção de afixos. A raiz é o elemento irredutível e comum às palavras derivadas. O radical inclui a raiz e os elementos afixais, que servem de suporte para outros afixos, crian-do novas palavras. Os processos derivacionais são bastante produ-tivos. Tal fato pode ser explicado não só pela possibilidade elevada de combinação de raízes e afixos, mas porque, em muitos casos, mu-dam a classe da nova palavra formada, como a nominalização de verbos, processo altamen-te produtivo que forma substantivos a partir de verbos, como pesar > pesagem e envolvem noções bastante comuns e de grande genera-lidade, como a ideia de negação (ilegal), grau (gatinho), designação de indivíduos (pianista), nomes abstratos (bondade).

• Composição: esta consiste na associação de duas bases para formar uma palavra nova. Te-remos palavras compostas a partir de formas li-vres, como guarda-livros (guarda-livros), como

também a partir de formas presas, como na palavra geologia (geo-logia). O processo de composição junta uma base à outra, com ou sem modificação de sua estru-tura fônica, aglutinando-se, em aguardente, ou justapondo-se, em pentacampeão. Os ele-mentos do composto apresentam uma relação entre um núcleo e um modificador (ou especi-ficador), entre um determinado e um determi-nante. Em português, o primeiro elemento do composto funciona como núcleo nas estrutu-ras formadas por:

• Substantivo + Substantivo. Ex: sofá-cama, peixe-espada, mestre-sala.

• Substantivo + adjetivo. Ex: caixa-alta, obra-prima, amor-perfeito.

• Verbo + Substantivo. Ex: guarda-roupa, beija-flor.

Nas estruturas com adjetivo, esse é sempre o espe-cificador, independente de sua posição: belas-artes, livre-arbítrio.

A composição distingue-se da derivação por seu próprio mecanismo de estruturação: enquanto pela derivação se expressam noções comuns e ge-rais, o processo de composição permite categoriza-ções mais particulares.

• Outros mecanismos de formação de palavras

• Derivação regressiva: diferentemente dos processos de derivação e de composição, em que há adição de morfemas, existe, em português, um mecanismo de criação lexi-cal em que se observa a redução de morfe-mas, conhecido como derivação regressiva. Podemos observá-lo em derivados do tipo: busca, de buscar; implante, de implantar; manejo, de manejar. Os derivados são, na maioria, substantivos deverbais, isto é, construídos a partir de verbos.

• Derivação parassintética: consiste na adição simultânea de um prefixo e um sufixo a uma base. É um processo mais produtivo na forma-ção de verbos (en+feitiço+ar=enfeitiçar) do que na de adjetivos (des+alma+ado=desalmado). A função semântica é atribuída ao prefixo, enquanto a função sintática cabe ao sufixo, que muda a classe da palavra a que pertence a base.

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1.3. morFologia Flexional A morfologia flexional trata, principalmente, dos morfemas que indicam relações gramaticais e pro-piciam os mecanismos de concordância, estando mais diretamente relacionada à sintaxe. Nas dife-rentes línguas do mundo, as categorias gramaticais frequentemente manifestadas pelos morfemas fle-xionais são: para os nomes, as categorias de gêne-ro, número e caso; para os verbos, as categorias de aspecto, tempo, modo e pessoa. A evidência desses universais não significa que todas as línguas mani-festarão todas essas categorias nem que todas elas se-rão representadas pelos mesmos tipos de morfema.

atividade | Selecione 10 palavras do por-tuguês em que você possa explicar os estudos apresentados sobre morfologia.

2. o morFema Vimos que os fonemas constituem a primeira uni-dade mínima da Linguística. Observamos, tam-bém, que os fonemas estão destituídos de qualquer significado, funcionando nas línguas apenas como discriminadores de significados em potencial. Ago-ra, veremos que, através dos fonemas, podemos lo-calizar a segunda das unidades básicas da Linguís-tica, aquela que compõe a primeira articulação das línguas naturais, o morfema. Sendo o morfema um signo mínimo, quer dizer, uma entidade compos-

ta de significante e significado indissoluvelmente unidos, corresponde aos menores elementos indi-vidualmente significativos nos enunciados de uma língua. Um morfema consta habitualmente de cur-tas sequências de fonemas, sequências essas que se repetem. Porém nem todas as sequências de fone-mas que se repetem são morfemas. Daí resulta a definição de morfema: a menor unidade que é gra-maticalmente pertinente. Uma unidade que não possa ser dividida sem que se destrua ou se altere drasticamente o seu significado. Em pata, temos duas formas mínimas portadoras de significação:

1. ”pat- 2. -”a”

Em 1, temos uma cadeia de significantes dotada de um plano de conteúdo próprio (membros de animais); em 2, temos um plano de conteúdo (gê-nero feminino). Assim, 1 e 2 possuem significado, significado esse que seria destruído, se eu tentasse subdividi-los ainda mais, construindo, digamos:

3. pa- 4. -t-

A forma 4 não possui sentido algum, e a forma 3 só pode nos evocar sentidos (instrumento para ca-var, por exemplo) que nada tem a ver com o sentido original de “pata”. Compreendemos, então, que a palavra “pata” possui a propriedade de poder ser fragmentada em apenas dois segmentos: morfemas.

2.1. lexemas e gramemas Um critério para isolar morfemas consiste em ob-servar, com base nas definições propostas no tó-pico 1, quantos elementos do plano de expressão de uma palavra se correspondem com diferentes significados.Veja: I. Pata II. Patas III. Patada IV. Patadas Nas formas apresentadas, temos as que mantêm inalterável uma sequência de significantes {pat-} assim como mantêm inalterável um plano de con-teúdo “extremidade”, “relativa aos membros infe-riores”, “dos animais”; “-a” de I significa “gênero feminino”, comparando I e II, vemos uma modi-ficação introduzida no plano da expressão de I (re-

texto comPlementar

http://www.google.com.br/search?client=firefox

- a & r l s = o r g . m o z i l l a % 3 A p t- B R % 3 A o f f i c i a l &

channel=s&hl=pt-BR&q=Tipos+de+morfema+na+estru

tura+das+palavras&meta=&btnG=Pesquisa+Google

http://www.colegiosaofrancisco.com.br/alfa/morfologia/

estrutura-das-palavras.php

http://www.geocities.com/CapeCanaveral/Cockpit/3167/

morfologia.htm

SAIBA MAIS!

Como a estrutura fonológica ajuda no reco-

nhecimento da relação morfológica entre as

palavras? http://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo.php?script=sci_

arttext&pid=S1676-73142007000200003&lng=pt&nrm

=iso

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sas palavras continuariam a possuir gênero femini-no, o número plural, a “designar golpe desferido com”. Se, contudo, quiséssemos efetuar mudanças nas partes relativas à significação gramatical, não poderíamos efetuar senão um número muito res-trito de alterações: na parte 3, por exemplo, a do gênero, não possuímos em português mais do que feminino/masculino; na parte 4, a do número, não temos mais que singular/ plural; na parte 2, a do gramema, que indica o aspecto verbal, temos um número maior de possibilidades de variação, mas poucas. Podemos, daí, concluir que os lexe-mas pertencem a inventários ilimitados e, como membros de uma lista aberta, eles se sujeitam a comutações teoricamente infinitas; os gramemas, ao contrário, pertencem a inventários limitados e, como membros de uma lista fechada, se sujeitam a um número restrito de comutações.

Os morfemas são convencionalmente transcritos entre pequenas chaves: {-a} lê-se morfema “a”.

atividade | Identifique, nas palavras abaixo, os morfemas (lexemas e gramemas); isole-os e aponte seus significados:

presentada pelo acréscimo de “-s”) correspondente a uma modificação introduzida no plano do con-teúdo de I.(representada pelo acréscimo da noção de plural). Por seu lado III. (“patada”) que pode ser entendido como possuindo o mesmo plano de ex-pressão de I. (“pat-) mais o sufixo “ada” conserva o mesmo plano de conteúdo de I. (relativa aos mem-bros inferiores dos animais). Assim localizamos os morfemas:

I. pat ___ ___ a ___ II. pat ___ ___ a ___ s III. pat ___ ad ___ a ___ IV. pat ___ ad ___ a ___ s

Percebe-se que, para cada segmento isolado, temos uma significação:

1. “extremidade dos membros inferiores dos ani-mais”

2. “modificador” 3. “gênero feminino” 4. “número plural”

Num primeiro exame, pode-se dizer que tais signi-ficações podem ser assim classificadas:

a. 1. (pat-) possui uma significação lexical, que diz respeito ao vocabulário da língua, ao dicionário;

b. 2, 3 e 4 (-ad, -a, -s) possuem uma significação gramatical , que diz respeito não ao dicionário, mas, à gramática da língua.

A parte 1 responsável pela significação lexical de-nomina-se lexema; as partes 2, 3 e 4, responsáveis pela significação gramatical, denominam-se grame-mas. Ambos, lexemas e gramemas são morfemas. Quando não nos importar fazer menção explícita do particular sentido de cada um deles, poderemos nos referir a um e outro, indiferentemente, sob o título genérico de morfemas.

O fragmento {pat-}, que engloba a significação le-xical, pode ser substituído, em outros contextos, por uma extraordinária quantidade de outros frag-mentos retirados do dicionário: pedr-, punhal-, pul-, cabeç-, joelh-, que produziriam, juntamente com os fragmentos 2, 3 e 4, pedradas, punhaladas, pauladas, cabeçadas, joelhadas, etc. Todas essas co-mutações e substituições alteram, evidentemente, o plano do conteúdo lexical, mas não alteram o plano do conteúdo gramatical, ou seja, todas es-

texto comPlementar

Do Lexema e termos afins na terminologia

gramatical:

http://www.filologia.org.br/revista/artigo/10(28)06.htm

Léxico:

http://www2.fcsh.unl.pt/edtl/verbetes/L/lexico.htm

Lexemas: http://www.radames.manosso.nom.br/gramatica/lexema.

htm

SAIBA MAIS!

O lexema corresponde, aproximadamente , ao

que Vendryés chamava de semantema; os gra-

máticos norte-americanos chamam de raiz e

Hjelmslev chamou de plerema; já o gramema

corresponde ao morfema de Vendryés e Hjel-

mslev e à não-raiz da tradição norte-america-

na. Para Mertinet, lexemas e gramemas são,

indiferentemente, monemas (formas signifi-

cantes mínimas dotadas de significado. Neste

trabalho, a partir de Lopes (1995), adotaram-

se as denominações propostas por Pottier.

1 2 3 4

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a. casamentob. marinheiroc. gatinho

3. alomorFes Apontamos, nos fascículos anteriores, que os fo-nemas admitem diferentes realizações chamadas alofones. Neste, vamos destacar que a realização concreta de um morfema (unidade mínima signifi-cativa) também pode engendrar o aparecimento de variantes contextualmente condicionadas. É o que se chama alomorfe. O estudo dos alomorfes é feito através da disciplina que os norte-americanos cha-mam de morfofonêmica. A morfofonêmica exa-mina as diferentes formas fonéticas apresentadas por um mesmo morfema, tendo a tarefa de des-cobrir os morfemas e indicar os alomorfes que o expressam em contextos determinados. Tomando as realidades fonológicas e morfológicas, a morfo-fonologia ou morfofonêmica estuda os processos que influenciam mutuamente forma e som. Para melhor compreensão, observe as séries:

a. Feliz, crível, grato, real, mortal, legal, adequa-do, hábil, natural.

b. Infeliz, incrível, ingrato, irreal, imortal, ilegal, inadequado, inábil, inatural.

Comparando-se as duas séries, nota-se que, em “b”, o segmento inicial tem sempre um valor nega-tivo, mesmo que sob forma fonética diversa [ ], [i], [in]. A diferença fonética é, no entanto, previsível: teremos [i] antes de vogal; [i] antes de [l, r, m, n] e [ ] antes de qualquer outra consoante. Essas for-mas são variantes de um mesmo morfema, o que permite compreeender que o morfema é, na verda-de, resultado de uma abstração ou generalização: ele pode apresentar várias configurações fonéticas, cada uma delas é um morfe do mesmo morfema. O conjunto de morfes, que representam o mesmo morfema, são seus alomorfes. Nenhum alomorfe pode ocorrer no mesmo contexto que o outro, o que significa dizer que os alomorfes de um mor-fema devem estar em distribuição complementar.

Se a escolha entre dois ou mais alomorfes depen-der do contexto sonoro em que ele se encontra, diz-se que houve um condicionamento fonológi-co (ou fonético). A alomorfia fonologicamente condicionada reflete, geralmente, as restrições de combinação de fonemas que ocorrem em cada

língua. Assim, em português, nenhuma sílaba pode terminar em /rs/, então /bars/ não é uma sequência permitida; já em inglês ou francês, essa sequência é possível.

Não sendo possível explicar a alomorfia pelo contexto fonético, diz-se que houve um condi-cionamento morfológico. O condicionamento fonológico é interpretado por muitos linguistas como sendo assunto para a fonologia e não, para a morfologia. Como é flagrante a relação entre o nível fonológico e o morfológico, alguns autores (principalmente do Círculo de Praga) propuseram a existência de um nível intermediário, objeto de estudo da morfo(fo)nologia, ou morfofonêmica, que trataria da estrutura fonológica dos morfemas, de suas modificações combinatórias, das mudan-ças fônicas que adquirem função morfológica.

atividade | Baseado (a) nos exemplos “a” e “b” apresentados no corpo deste texto, apresente duas séries de palavras e explique suas variantes.

4. Processos morFológicos Em Fiorin (2007), percebemos que a associação de dois elementos mórficos, produzindo um novo signo linguístico, obedece a certos princípios ou mecanis-mos que variam em sua possibilidade de combinação nas diferentes línguas, donde destacamos que esses modos de combinação são processos morfológicos, que se manifestam de diferentes formas, a saber: 4.1. adição

Quando um ou mais fonema é acrescentado à base, que pode ser uma raiz ou radical primário, isto é, o elemento mínimo de significado lexi-cal. Em aprofundar, temos os sequintes morfe-mas a- profund- ar, onde a- e –ar são morfemas aditivos, que se acrescentaram à raiz profund. Aprofund-é a base de aprofundar. São chamados

texto comPlementar

rOSA, Maria Carlota. Introdução à morfolo-

gia. Contexto. p. 59. Disponível em:

http://books.google.com.br/books?id=ejRbuFLRyi0C

&pg]

48 Fascículo 3

afixos os morfemas que se adicionam à raiz; afi-xação é o processo. Dependendo da posição dos afixos em relação à base, podemos ter cinco tipos:

1. Sufixação: depois da base. Ex: livro > li-vro-s; casa > cas-eiro;

2. Prefixação: antes da base. Ex: ler > re-ler; certo > in-certo;

3. Infixação: dentro da base. Ex: em Kmu (Laos): /rkeŋ/ “esticado” > /rmkeŋ/ “esti-car” (infixo /-m-/);

4. Circunfixos: afixos descontínuos que enquadram a base, como em Georgiano (Cáucaso);

5. Transfixos: são descontínuos e atuam nu-ma base descontínua, como no Hebraico.

4.2. reduPlicação É um tipo especial de afixação, que repete fonemas da base, com ou sem modificações. Nas línguas clássicas – latim, grego e sânscrito – está associado à flexão verbal.

4.3. alternância

Quando alguns segmentos da base são substituídos por outros, de forma não arbitrária, porque são al-guns traços que se alternam com os outros, como em português: pus/pôs; fiz/fez; fui/. A Linguís-tica histórica trata esses processos de alternância de vogais no interior da raiz como apofonia ou metafonia.

4.4. subtração

Quando alguns segmentos da base são eliminados para expressar um valor gramatical como no por-tuguês em que alguns femininos são formados por subtração de morfemas do masculino. Ex: órfão/órfã; anão/anã; campeão/campeã.

Os processos morfológicos que afetam traços su-prassegmentais, como o acento e tom, podem ser aditivos ou substitutivos. Algumas vezes, os proces-sos podem aparecer combinados, como, em portu-guês, no plural da palavra OVO, em que há uma alternância de o /ɔ e uma sufixação {-s}, /ɔvos/.

atividade | Identifique os elementos mórfi-cos presentes nas palavras sublinhadas no po-ema e crie novas palavras a partir das palavras em itálico.

mãos dadas Carlos Drummond de Andrade

Não serei o poeta de um mundo caduco.Também não cantarei o mundo futuro.Estou preso à vida e olho meus companheiros.Estão taciturnos, mas nutrem grandes esperanças.Entre eles, considero a enorme realidade.O presente é tão grande, não nos afastemos.Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas. Não serei o cantor de uma mulher, de uma história,não direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela, não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida,não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins. O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes,a vida presente.

5. noções elementares de estilística

introdução

Estilística é a parte dos estudos da linguagem que se preocupa com o estilo. Estuda a expressividade da língua. Entende-se por estilo o conjunto de pro-cessos que fazem da língua representativa um meio de exteriorização psíquica. 5.1. estilística e gramÁtica O que caracteriza o estilo não é a oposição entre o individual e o coletivo, mas o contraste entre o emocional e o intelectivo. É neste sentido que dife-re Estilística (que estuda a língua afetiva) e Gramá-tica (que trabalha no campo da língua intelectiva). Misturá-las de modo que a Estilística se “dissolva” na Gramática é pôr em perigo duas importantes disciplinas por confundir os seus objetos de estudo.

Uma não é a negação da outra, nem uma tem por missão destruir o que a outra, com orientação cien-tífica, tem podido construir. Ambas se completam no estudo dos processos do material de que o gênero humano se utiliza na exteriorização das ideias e senti-mentos ou do conteúdo do pensamento designado.

texto comPlementar

Usos morfológicos:http://www.letras.ufrj.br/posverna/docentes/72520-1.pdf

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6. traços estilísticos O conjunto de particularidades do sistema expres-sivo para eficácia estética recebe o nome de traços estilísticos. São numerosos os traços estilísticos - e há um avultado número deles cujo valor ainda está para ser analisado - em todos os compartimentos de um idioma. Cabe-nos agora indagar quando uma particularidade linguística se nos apresenta como traço estilístico. Sabe-se que o traço estilísti-co não se trata de uma maneira de dizer necessaria-mente pessoal, nem pelo fato de ser pessoal se tem necessariamente um traço estilístico. Daí o erro dos que, pensando escrever bem, enxameiam suas páginas das chamadas figuras de linguagem (ple-onasmos, hipérboles, anacolutos, metáforas, etc.) Essas figuras não se impõem às circunstâncias, es-tas é que favorecem o aparecimento daquelas para fins estéticos. Terá falhado na pesquisa estilística quem se contentar em dizer que há anacoluto no derradeiro terceto desta conhecida jóia de Macha-do de Assis, que é o soneto à Carolina: “que eu, se tenho nos olhos mal-feridos pensamentos de vida formulados, são pensamentos idos e vividos”.

O anacoluto ultrapassa os limites de uma simples figura, para ser um eficaz recurso estético que põe diante de nossos olhos a profunda dor do esposo que, pensando na companheira que se foi não tem a paz interior necessária para estruturar racional-mente, intelectivamente, todo o tumulto de ideias que lhe vai à alma.

Em suma, a Estilística é o passo mais decisivo, no es-tudo de uma língua, para a educação do sentimento estético e manifestação da competência expressiva. Traço estilístico e erro gramatical: não se há de en-tender que o estilo seja sempre uma deformação da norma linguística. Isso nos leva à distinção entre traço estilístico e erro gramatical. O traço estilís-tico pode ser um desvio ocasional de uma norma gramatical vigente, mas se impõe pela sua intenção estético-expressiva. O erro gramatical é o desvio sem intenção estética.

5.2. estilística e a retórica

tem-se apresentado a Estilística também como a ne-gação da Antiga Retórica, que predomina, ainda, na crítica tradicional do estilo com suas múltiplas indagações literárias, históricas, sociais, filosóficas e tantos outros domínios que na obra se espalham através do temperamento e atitude do escritor. Por exemplo, sempre se estudaram as fontes de um autor ou de uma obra, ou - o que vale o mesmo - a origem das ideias dominantes em um período literário. Porém isso se realizou por interesse his-tórico, para fixar procedências. Este é o ponto de chegada da crítica tradicional. Para a estilística, é o ponto de partida, ao se perguntar:

Que fez meu autor ou minha época com estas fontes?

Usando a comparação: estudando o mel, a crítica tradicional estabelece em que flores e de que cam-pos extraiu a abelha; a estilística se pergunta:

como resultou este produto heterogêneo com todas as suas procedências, qual é a alquimia,

que originais e triunfantes intenções lhe insuflaram vida nova?

Ou à luz da comparação da estátua: a crítica tradi-cional estuda as canteiras donde procede o mármo-re; a estilística, o que é que o artista fez com ele”.

5.3. anÁlise literÁria e anÁlise estilística

não se há de confundir análise literária com aná-lise estilística, pois que, trabalhando num mesmo trecho, tem preocupações diferentes e utilizam fer-ramentas também diversas. Para a estilística, inte-ressa tanto a depreensão dos traços estilísticos da língua oral como da escrita, do falante comum e do literato (BECHARA, 2001).

atividade | Releia o poema de Drummond posto no tópico anterior e atribua significados às palavras em negrito. Apresente sua conclu-são sobre o poema.

texto comPlementar

A estilística e o ensino de português:

http://www.filologia.org.br/viiicnlf/anais/caderno12-02.html

Estilística: http://www.soportugues.com.br/secoes/estil/

texto comPlementar

Traços estilísticos de Ferreira Gullar em Poema

sujo, 1976: http://www.mafua.ufsc.br/diogo.html

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atividade | Na busca do seu estilo próprio, deve o autor violar a norma culta do idioma? Argumente.

7. camPo da estilística O estudo da Estilística abarca, semelhante à Gramá-tica, todos os domínios do idioma. Todos os fenô-menos linguísticos, desde os sons até as combinações sintáticas mais complexas, podem revelar algum cará-ter fundamental da língua estudada. Todos os fatos linguísticos, sejam quais forem, podem manifestar al-guma parcela da ida do espírito e algum movimento da sensibilidade. A estilística não é o estudo de uma parte da linguagem, mas o é da linguagem inteira, ob-servada de um ângulo particular. Assim sendo, estuda a linguagem afetiva e a linguagem intelectual em suas relações recíprocas e examina em que proporção se aliam para compor este ou aquele tipo de expressão. Teremos, assim, os seguintes campos da Estilística: 1. fônica; 2. morfológica; 3. sintática; 4. semântica. 7.1. a estilística Fônica Procura indagar o emprego do valor expressivo dos sons: a harmonia imitativa, no amplo sentido do termo. Também chamada fonética expressiva, a es-tilística fônica implica a utilização de traços que es-capam à sistematização das oposições e correlações dos fonemas e grupos fônicos: acento vocabular, quantidade, altura, etc. 7.2. a estilística morFológica Sonda o uso expressivo das formas gramaticais. En-tre os usos expressivos deste campo, lembraremos: a. o plural de convite: põe-se o verbo no plural

como que se quisesse incentivar uma pessoa a praticar uma ação trabalhosa ou desagradável. É o caso da mãe que diz à filha que insiste em não tomar o remédio: “Olha, filhinha, vamos tomar o remedinho”.

b. o plural de modéstia: o autor, falando de si mesmo, poderá dizer: “Nós, ao escrevermos este livro, tivemos em mira

dar novos horizontes ao ensino do idioma”.c. o emprego expressivo dos sufixos (mormente

os de gradação): paizinho, mãezinha, poetas-tro, padreco, politicalha.

d. o emprego de tempos e modos verbais, como, por exemplo:

1. o presente pelo futuro para indicar desejo firme, fato categórico: “Amanhã eu vou ao cinema”.

2. o imperfeito para traduzir pedido: “Eu queria um quilo de queijo” (em vez do categórico e, às vezes, ameaçador quero).

3. o presente pelo pretérito para emprestar à narração o ar de novidade e poder co-mover o ouvinte: “Aí César invade a Gália”.

e. a mudança de tratamento de um período para outro: para indicar mudança da situação psicológica entre falante e ouvinte, ou entre escritor e leitor. No soneto Última Folha, Ca-simiro de Abreu chama a Deus por Meu Pai e ora o trata por tu, ora por vós.

7.3. a estilística sintÁtica Procura explicar o valor expressivo das construções: 1. na regência, como, por exemplo, o emprego

do posvérbio; 2. na concordância, como, por exemplo, na atra-

ção, na silepse, no infinitivo flexionado para realce da pessoa sobre a ação mesma;

3. na colocação dos termos na oração, na coloca-ção de pronomes, etc.

4. no emprego expressivo das chamadas figuras de sintaxe.

7.4. a estilística semântica

Pesquisa: 1. A significação ocasional e expressiva de certas

palavras: “Você é um abacaxi”. “Aquele aluno é um monstro”. “Ele tem uns bons sessenta anos”.

2. No emprego expressivo das chamadas figuras de palavras ou tropos (metáfora, metonímia, etc.) e figuras de pensamento e sentimento (antítese, eufemismo, hipérbole, etc.).

atividade | Leia o poema abaixo e faça uma análise, considerando um ou mais campo de

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noção espiritual, sentimental, do lugar onde se vive a família. A primeira representação pode repartir-se em várias imagens subsidiárias: a construção da casa, a sua situação, a paisagem em redor, a luz ou sombra de que é banhada, etc; a segunda represen-tação levar-nos-á a considerar: nosso nascimento, os afetos, ou desafetos da infância, a nossa educa-ção, a harmonia ou desarmonia entre os membros da família, etc. E estas representações familiares poderão ainda suscitar, por associação, sentimen-tos de caráter social: o desabrigo das pessoas que vivem em barracas, a miséria, etc. É nesse sentido que se diz que numa palavra se podem conter to-dos os fenômenos da vida. O seu poder evocador não conhece limites. 8.1. a signiFicação das Palavras A significação das palavras parte do sentido origi-nal de onde surgem as várias significações. Pode-se afirmar que há tantas palavras quantas as significa-ções. À variedade de significação das palavras dá-se o nome de polissemia, que é estudada numa disciplina filológica, a semântica.

8.2. valor sentimental e valor intelectual das Palavras Em presença das coisas, o nosso espírito reage da seguinte maneira: ou as percebe ou as sente. Quase sempre essas duas operações, a percepção e o sen-timento, andam ligadas, mas, por via de regra, em proposições diferentes. Tomemos como exemplo os significados dos elementos destacados na série:

a. O lutador erqueu-se belo com uma estátua. b. Eram duas raparigas, qual delas a mais formosa. c. Simples e linda, a noiva saía da igreja. d. Laura trazia um bonito vestido de seda azul. No primeiro exemplo, belo sugere-nos a ideia de perfeição e de harmonia de formas e também uma certa confiança serena da própria força. No segun-do exemplo, formosa evoca apenas a perfeição da forma física. No terceiro exemplo, linda já se car-rega de um certo forte matriz sentimental; não é só beleza física, é também mimo, ternura, delica-deza da alma. Enfim, bonito representa a ideia de beleza, descida ao plano das coisas familiares. É, também, um termo afetivo.

Quanto ao uso dos vocábulos, nota-se que belo é vagamente literário; formosa é vocábulo que só se

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A estilística através dos textos:

http://www.filologia.org.br/revista/artigo/7(19)01.htm

estudo da estilística.

valsinha Vinícius – Chico Buarque

Um dia ele chegou tão diferente do seu jeito de sempre chegar Olhou-a de um jeito muito mais quente do que sempre costumava olhar E não maldisse a vida tanto quanto era seu jeito de sempre falar E nem deixou-a só num canto, pra seu grande es-panto convidou-a pra rodar Então ela se fez bonita como há muito tempo não queria ousar Com seu vestido decotado, cheirando a guardado de tanto esperar. Depois os dois deram-se os braços como há muito tempo não se ousava dar E cheios de ternura e graça foram para a praça e começaram a se abraçar E ali dançaram tanta dança que a vizinhança toda despertou E foi tanta felicidade que toda cidade se iluminou E foram tantos beijos loucos, tantos gritos roucos como não se ouviam mais. Que o mundo compreendeu E o dia amanheceu Em paz

8. a Fantasia das Palavras Lapa (1998) pontua que as palavras reais distin-guem-se pela força expressiva. Despertam a imagi-nação das coisas mais energicamente, e essa viagem viva ilumina o pensamento, dispensando outros acessórios de que se serve a frase logicamente cons-truída. E como elas podem revestir vários aspectos, cada um de nós apreende na palavra o seu aspecto pessoal, aquele que particularmente nos interessa. Já se tem afirmado que, numa simples palavra, se pode resumir todo o universo. Quer isso dizer que um vocábulo pode suscitar uma infinidade de ima-gens e ideias que abrangem todos os domínios do pensamento e da vida. Vejamos a palavra lar. Po-derá apresentar-nos a imagem concreta da casa, do seu conforto ou desconforto material, ou ainda, a

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emprega em literatura; lindo pertence à língua cor-rente e bonito, à linguagem familiar.

atividade | Produza significações a partir das palavras:

a. chaveb. chuvac. aviãod. gásf. veludog. serpenteh. limão

rESUMO

A Morfologia é o estudo da palavra dentro da nossa língua. Os estudos da morfologia se subdividem em dois: morfologia lexical e morfologia flexional.

Lexema - são morfemas de significação lexical externa, ou seja, o significado está ligado ao mundo objetivo, indicando o significado da palavra. Gramema - são morfemas que não constituem, por si só, palavras. São comumente di-vididos em prefixos, infixos e sufixos, conforme se coloquem, respectivamente, antes do lexema, no lexema ou depois do lexema ao qual se prendem.

Alomorfes são variantes de um mesmo morfema.

São formas de manifestação dos processos morfológicos: adição, reduplicação, alternân-cia e subtração.

A estilística consiste no inventário das possibilidades expressivas ou artísticas da lingua-gem e no uso consciente de tais possibilidades por parte do escritor. Estuda inúmeros recursos que a língua coloca à disposição dos falantes para expressarem seus estados afetivos, sua sensibilidade e imaginação. Não se confunde com gramática, retórica ou análise literária, contudo, com estas se completa.

A expressão traço estilístico refere-se ao conjunto de particularidades do sistema expres-sivo para eficácia estética. Isso representa a marca de cada autor, o somatório de tudo o que ele produz em termos de ideal estético, de belo, em seu trabalho, projetando-se em todos os setores da língua.

Para estudar a expressividade duma língua, a estilística possui campos de investigação, abrangendo todos os limites da gramática.

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Semântica e estilística

http://www.micropic.com.br/noronha/grama_sem.htm

Estilística da palavrahttp://www.filologia.org.br/vcnlf/anais%20v/civ2_04.htm;

http://www.filologia.org.br/soletras/5e6/01.htm;

53Fascículo 3

GLOSSárIO

morfe - é um segmento de enunciado; uma sequência fônica a que se pode atribuir significado e que será classifi-cado posteriormente como morfema. Um morfema é uma classe de morfes, isto é, cada morfe ou alternante mor-fêmica é um elemento de um conjunto formador de uma unidade estrutural, que é o morfema. Qualquer enunciado é completamente composto de morfes.

rEFErÊNCIAS

BECHARA, Evanildo. Moderna gramática por-tuguesa. 37. ed. Ver. e ampl. Rio de Janeiro: Lucerna, 2001.

BUARQUE, Chico. Valsinha. Disponível em: http://letras.terra.com.br/chico-buarque/45186/

FIORIN, José Luiz(org). Introdução à linguística II: princípios de análise. 4 ed. 1ª reimpressão. São Paulo: Contexto, 2007.

LAPA, Manuel Rodrigues. Estilística da língua portuguesa. 4 ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

LOPES, Edward. Fundamentos da linguística contemporânea. São Paulo. Editora Cultrix, 1995.

(A obra apresenta uma fundamentação in-trodutória acerca da ciência do signo verbal. Dividido em seis partes, o livro começa com a definição do campo disciplinar e com o exame da contribuição capital de Ferdinand de Sau-ssure, para, em seguida, aprofundar-se no estudo da Fonética e da Fonologia, da Mor-fologia, das modalidades de Gramática e da Semântica).

objetivos esPecíFicos

Destacar a importância dos enfoques sincrônicos e diacrônicos no estudo dos fatos da língua.Refletir as relações entre variações linguísticas, língua, sociedade, preconceito linguístico e ensino de língua portuguesa.

1. variação linguística, sociedade e Preconceito Você deve ter percebido no fascículo 01, sobre Fonética e Fonologia, quando apontamos a capacidade que todo usuário de uma língua possui de realizar dife-rentes modos de falar. Isso acontece, porque as línguas se transformam ao longo do tempo e, em função do uso próprio por comunidades específicas, adquirem peculiaridades características de grupos sociais diferentes. Neste fascículo, falare-mos sobre estas transformações e usos.

ai! se sêsse!... Zé da Luz

Se um dia nós se gostasse;Se um dia nós se queresse;Se nós dos se impariásse,

Se juntinho nós dois vivesse!Se juntinho nós dois morasse

Se juntinho nós dois drumisse;Se juntinho nós dois morresse!

Se pro céu nós assubisse?Mas porém, se acontecessequi São Pêdo não abrisseas portas do céu e fosse,te dizê quarqué toulíce?E se eu me arriminasse

e tu cum insistisse,prá qui eu me arrezorvesse

e a minha faca puxasse,e o buxo do céu furasse?...Tarvez qui nós dois ficassetarvez qui nós dois caíssee o céu furado arriasse

e as virge tôdas fugisse!!!

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variação linguística:

sincronia e diacronia

Prof.ª maria Perpétua Teles monteiro Carga Horária | 15 horas

Fascículo 4

56 Fascículo 4

Todos sabem que existe um grande número de variedades linguísticas, mas, ao mesmo tempo em que se reconhece a variação como um fato, se ob-serva que a sociedade tem uma longa tradição em considerar a variação numa escala valorativa, às vezes até moral, que leva a tachar os usos caracte-rísticos de cada variedade como certos ou errados, aceitáveis ou inaceitáveis, pitoresco, cômicos, etc.

A esse respeito, como você se sentiu ao ler o poema de Zé da Luz?

Considere como se Zé da Luz não fosse um poeta!

O latim vulgar foi, numa certa época, considerado dialeto das classes pobres, e por isso se despresti-giava quem o falava. Ao longo da história, transfor-mou-se nas línguas românicas, e a sociedade trocou o latim clássico por essas línguas. Então as línguas românicas (dentre elas, o português), vindas do la-tim vulgar, passaram a exercer a função de línguas de prestígio na nova sociedade estabelecida.

Essa breve consideração aponta que as línguas, quando se transformam com o passar do tempo, não se degeneram, não se tornam imperfeitas, es-tragadas, mas adquirem novos valores sociolinguís-ticos, ligados às novas perspectivas da sociedade, que também muda. Nessas transformações, não aparece o certo e o errado linguístico, mas o dife-rente. Certo e errado são conceitos pouco hones-tos que a sociedade usa para marcar os indivíduos e classes sociais pelos modos de falar e para revelar em que consideração os tem, se são pessoas que gozam de influência ou ocupam posição de prestí-gio ou não, se exercem o poder instituído ou não. Essa atitude da sociedade revela seus preconceitos, pois marca as diferenças linguísticas com marcas de prestígio ou estigmas. Isto nos mostra que, se linguisticamente não existe o certo e o errado, mas o diferente, socialmente as coisas não caminham desse modo. Consideremos o “s” falado pelo ci-dadão nascido no Rio de Janeiro, no “s” chiante do carioca, o adjetivo não é depreciativo ao modo de falar e, sim, um termo usado na fonologia – ou fonética – que representa um som cujo ponto de articulação é pré-palatal, como ocorre nas palavras “chá” e “já”. É assim que o carioca pronuncia o “s”. Mas, essa maneira de falar (variação), como já vimos, não é única. Destacamos aqui o “r” re-troflexo do londrinense quando pronuncia pala-vras como “porta, carne, certo” e do piracicabano quando pronuncia as mesmas palavras do londri-

nense e também as que têm “r” entre vogais: “cara, cera, tora”. Também o “l” (ele), na região de Pato Branco, PR, que é alveolar, mesmo antes de conso-ante e no final da palavra. Na região de Pato Bran-co, pronuncia-se o “l” de “alto” da mesma forma que o “l” de “alô,”. Falar o r caipira também não mostra nada de bom ou de ruim do ponto de vista da estrutura fonológica da língua, porém considere este falar fora de sua região.

O que pode, socialmente, ocorrer ao seu falante?

Embora desde princípios deste século, linguistas, como Antoine Meillet e Ferdinand Saussure, te-nham chegado a configurar a língua como um fato social, rigorosamente enquadrado na definição dada por Émile Durkhein, só nos últimos vinte anos, com o desenvolvimento da Sociolinguística, as relações entre língua e sociedade passaram a ser caracterizadas com maior precisão.

A Sociolinguística, ramo da linguística que estu-da a língua como fenômeno social e cultural, veio mostrar que estas inter-relações são muito comple-xas e podem assumir diferentes formas. Na maioria das vezes, comprova-se uma covariação do fenôme-no linguístico e social. Em alguns casos, no entan-to, faz mais sentido admitir a relação direcional: a influência da sociedade na língua ou da língua na sociedade.

É, pois, recente a concepção de língua como ins-trumento de comunicação social, maleável e di-versificado em todos os seus aspectos, meio de expressão de indivíduos que vivem em sociedades também diversificadas social, cultural e geografica-mente. Nesse sentido, uma língua histórica não é um sistema linguístico unitário, mas um conjunto de sistemas linguísticos, isto é, um diassistema no qual se inter-relacionam diversos sistemas e subsis-temas. Daí o estudo de uma língua se revestir de extrema complexidade, não podendo prescindir de uma delimitação precisa dos fatos analisados para controle das variáveis que atuam, em todos os níveis, nos diversos eixos de diferenciação. A varia-ção sistemática está hoje incorporada à teoria e à descrição da língua (CUNHA, 1985. p.2-3).

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Variação linguística:http://www.dilsoncatarino.blogspot.com/2008/02/variao-

lingstica.html

Preconceito linguístico:http://www.lendo.org/preconceito-linguistico/

57Fascículo 4

2. tiPos de variedades linguísticas Segundo Travaglia(2002.p.42), podemos ter basi-camente dois tipos de variedades linguísticas: os dialetos e os registros. Os dialetos são variedades que ocorrem em função das pessoas que usam a língua (emissores). Os registros correspondem às variedades que ocorrem em função do uso que se faz da língua, ou seja, dependem do recebedor, da mensagem ou da situação. 2.1. variação dialetal Os estudos sobre variação linguística registram, pelo menos, seis dimensões da variação dialetal (variações internas): a territorial, a social, a de ida-de, sexo, geração e função. 2.1.1. dialetos na dimensão territorial,

geogrÁFica ou regional (variações diatóPicas)

Representam a variação que acontece entre pesso-as de diferentes regiões em que se fala a mesma língua. Essa variação normalmente acontece

a. pelas influências que cada região sofreu duran-te sua formação;

b. porque os falantes de uma dada região consti-tuem uma comunidade linguística geografica-mente limitada em função de estarem polariza-dos em termos políticos e/ou econômicos e/ou culturais e desenvolverem então um comporta-mento linguístico comum que os identifica e dis-tingue. É o caso da diferença entre o português do Brasil e o português de Portugal e dos países africanos de Língua Portuguesa. Aqui se incluem também diferentes falares que encontramos no Brasi, como os falares gaúcho, nordestino, cario-ca, o chamado dialeto caipira, etc.

As diferenças entre a língua em uma região e outra normalmente são, em sua grande maioria, diferen-ças no plano fonético e no plano léxico. As diferen-ças sintáticas, quando existem, normalmente não são grandes. 2.1.2. dialetos na dimensão social

(variações diastrÁticas)

Representam as variações que ocorrem de acordo com a classe social a que pertence os usuários da

língua, isso porque há uma “tendência” para maior semelhança entre os atos verbais dos membros de um mesmo setor sócio-cultural da comunidade, geralmente com relações bastante estreitas e inte-resses comuns. É por isso que se consideram como variedades dialetais de natureza social os jargões profissionais ou de determinadas classes sociais bem definidas como grupos.

Na variação de natureza social, há inúmeras super-posições e matizes, o que torna os dialetos sociais mais difíceis de definir e classificar que os dialetos regionais. Aqui atuam fatores, como idade, sexo, raça, profissão, posição social, grau de escolarida-de, local em que reside na comunidade etc.

2.1.3. dialetos na dimensão contextual (variações diaFÁsicas)

Constam de tudo aquilo que pode determinar di-ferenças na linguagem do locutor, por influências alheias a ele, como, por exemplo, o assunto, o tipo de ouvinte, o lugar em que o diálogo ocorre e as relações que unem os interlocutores. Os chamados fatores contextuais dizem respeito às circunstân-cias criadas pela própria ocasião, lugar e tempo em que os atos de fala se realizam e também às relações que une falante e ouvinte no momento do diálogo. 2.2. variações de registro As variações de registro são classificadas em três tipos diferentes: grau de formalismo, modo e sin-tonia. O grau de formalismo representa uma escala de formalidade como um maior cuidado e apuro. Por variação de modo, entende-se a língua falada em contraposição à língua escrita. A sintonia pode ser descrita como o ajustamento na estruturação de seus textos feita pelo falante com base nas infor-mações que se tem sobre o ouvinte.

Todas as variedades linguísticas são estruturadas e correspondem a sistemas e subsistemas adequados às necessidades dos usuários. Mas o fato de estar a língua fortemente ligada à estrutura social e aos sistemas de valores da sociedade conduz a uma ava-liação distinta das características das suas diversas modalidades diatópicas, diastráticas e diafásicas. A língua-padrão, por exemplo, embora seja uma entre as várias modalidades de um idioma, é sem-pre a mais prestigiosa, porque atua como modelo, como norma, como ideal linguístico de uma comu-nidade. Do valor normativo decorre a sua função

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coercitiva sobre as outras variedades, com o que se torna uma ponderável força contrária à variação.

Numa língua existe, pois, ao lado da força centrífuga da inovação, a força centrípeta da conservação, que contrarregrando a primeira, garante a superior uni-dade de um idioma como o português, falado por povos que se distribuem pelos cinco continentes.

Nos campos de estudo da variação linguística, con-sidera-se, pois, a variação diacrônica (do grego dia + kronos = ao longo de, através de + tempo): as diversas manifestações de uma língua através dos tempos e a variação sincrônica (do grego sy’n = simultaneida-de): as variações num mesmo período de tempo.

atividade | Leia o Poema de Patativa do Assa-ré. Como o poeta se sente em relação aos seus versos e à sua linguagem? o Poeta da roça

Sou fio das mata, canto da mão grossa,Trabáio na roça, de inverno e de estio.A minha chupana é tapada de barro,Só fumo cigarro de paia de mío.Sou poeta das brenha, não faço o papéDe argun menestré, ou errante cantôQue veve vagando, com sua viola,Cantando, pachola, à percura de amô.Não tenho sabença, pois nunca estudei,Apenas eu sei o meu nome assiná.Meu pai, coitadinho! Vivia sem cobre,E o fio do pobre não pode estudá.

Meu verso rastero, singelo e sem graça,Não entra na praça, no rico salão,Meu verso só entra no campo e na roçaNas pobre paioça, da serra ao sertão.(...)

3. estudo dos Fatos linguísticos: PersPectivas de enFoQue

Borba (1986) destaca que os fatos linguísticos po-dem ser encarados ou estruturados sob três pontos de vista: quanto ao seu modo de ser geral, quanto ao seu funcionamento num determinado momen-to e lugar e quanto às suas transformações e ou à evolução. No primeiro caso, são considerados em si mesmos, independentemente de seu funciona-mento real, porque o interesse está no exame de suas possibilidades de funcionar; no segundo, observam-se fatos ou dados concretos em funcio-namento, e, no terceiro, procura-se detectar as al-terações dos fatos com o decorrer do tempo. São três atitudes que colocam o eixo do tempo como ponto de partida para a análise. O primeiro enfo-que é chamado acrônico, porque faz abstração do tempo: descrevem-se ou explicam-se fatos quanto à sua natureza e função; o segundo enfoque chama-se sincrônico, porque se preocupa em descrever o funcionamento concreto da língua em dado mo-mento e lugar, isto é, procura conhecer um estado da língua; o terceiro enfoque é diacrônico, porque observa as mudanças que a língua sofre com o de-correr do tempo. O estudo acrônico, atendo-se ao modo de ser dos fatos e sendo atemporal, pode referir-se ao passado, ao presente ou mesmo prever (ou predizer) o que acontecerá. Diz-se, então, que este ponto de vista examina o mecanismo linguísti-co como potencial, como conjunto de possibilida-des ou como uma máquina lógica.

O Postulado básico do enfoque sincrônico é a simultaneidade dos fatos observados. Por isso, prende-se a um estado de língua, isto é, a um determinado momento, considerado em si mes-mo, como se fosse um corte na evolução natural do sistema. Por estar a língua em movimento constante, um estado absoluto, é praticamente impossível conseguir. Daí que um estado da lín-gua não é um ponto fixo, mas espaço de tempo em que as alterações são mínimas ou irrelevan-tes. Os diferentes componentes do sistema se desenvolvem de maneira desigual quer quanto ao ritmo quer quanto à qualidade. Dessa for-ma, o espaço de tempo compreendido por um estado de língua varia de acordo com o estrato considerado.

A tarefa básica da linguística diacrônica ou histórica é explicar estados anteriores não sim-

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Variação linguística:http://acd.ufrj.br/~pead/tema01/variacao.html

SAIBA MAIS!

O modo de falar do brasileiro:

http://educacao.uol.com.br/portugues/ult1693u60.jhtm

59Fascículo 4

plesmente para apreender ou recolher infor-mações de ordem cultura, mas principalmente para melhor compreender as relações, ou seja, a estruturação do sistema atual. Não se trata propriamente de descobrir como a língua fun-ciona através dos tempos, mas descrever esta-dos sucessivos, compará-los e verificar como a língua chegou a ser o que é e qual a sua deriva ou traços básicos de sua evolução. Os enfoques sincrônicos e diacrônicos, embora tenham traços específicos, não devem ser consi-derados como coisas separadas. Na verdade, esses enfoques se completam.

atividade | Considerando os estudos realiza-dos, que mensagem Luiz Gonzaga transmite em sua canção? abc do sertão Luiz Gonzaga

Lá no meu sertão pros caboclo lêTêm que aprender um outro ABCO jota é ji, o éle é lêO ésse é si, mas o érreTem nome de rêAté o ypsilon lá é pissiloneO eme é mê, O ene é nêO efe é fê, o gê chama-se guêNa escola é engraçado ouvir-se tanto “ê”A, bê, cê, dê,Fê, guê, lê, mê,Nê, pê, quê, rê,Tê, vê e zê.

4. a contribuição de Ferdinand de saussure

Apresentaremos este tópico à luz de Lopes (1995. p. 72-75), em seu trabalho Fundamentos da Lin-guística contemporânea.

Ferdinand de Saussure nasceu em Genebra, em 26 de novembro de 1857. Em 1880, estabeleceu-se em Paris, onde frequentou cursos sobre Sânscrito e Filologia latina. Em 1881, aos vinte e quatro anos, tornou-se mestre na França. Em 1891, transferiu-se para onde leciona até a sua morte ocorrida em 1916.

Por muitos anos, Saussure estudou os Nibelungen e a versificação indo-europeia arcaica, para a com-preensão da qual elaborou uma hipótese extrema-mente original - a dos anagramas -, que deve ser contada entre as contribuições pioneiras para o moderno estudo estrutural da poesia. Mas, apesar de se haver devotado uma extensa série de interes-ses no campo da Literatura, Saussure deixou uma persistente imagem de campeão da separação entre linguística interna (fora do contexto sócio-históri-co) e a linguística externa (a que considera os fato-res exteriores que condicionam os fenômenos lin-guísticos). Essa imagem é, no entanto, verdadeira, apenas parcialmente. Do mesmo modo, é impro-cedente o sentimento que perdura, ainda hoje, de que a linguística estrutural em geral e a saussuriana em particular sejam linguísticas antifilológicas.

É claro que, postas em cotejo as suas contribuições para os diferentes campos das línguas e das letras, o que marcará a sua imagem para posteridade serão as ideias acerca do valor relacional dos elementos linguísticos, da autossuficiência do sistema, da ne-cessidade de se dissociar uma linguística dos esta-dos (sincrônica) do âmbito da linguística evolutiva (diacrônica), da natureza do signo e da distinção langue/parole (língua/fala). Essas ideias deram origem à linguística estrutural clássica e, ao mesmo tempo, à fase contemporânea dessa ciência.

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Curso de linguística geral:

http://books.google.com/books?hl=pt-BR&lr=&id=Nsd

0kiUfrlgC&oi=fnd&pg=

SAIBA MAIS!

Linguística: http://www.brasilescola.com/portugues/linguistica.htm;

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A contribuição de Saussure:

http://www.cezar.azevedo.nom.br/texto.php?tipo=misce

lania&id=443

http://www.jackbran.pro.br/linguistica/curso_de_linguisti

ca_geral.htm

Saussure e a língua portuguesa:

http://www.filologia.org.br/viisenefil/09.htm

60 Fascículo 4

atividade | Amplie suas leituras sobre a contribuição de Saussure para os estudos da fonética e da fonologia e apresente em um texto argumentativo.

5. linguística sincrônica: generalidades

O objeto da linguística sincrônica geral é estabe-lecer os princípios fundamentais de todo sistema idiossincrônico, os fatores constitutivos de todo sistema da língua. À sincronia pertence tudo o que se chama gramática geral, pois é somente pelos es-tados de língua que se estabelecem as diferentes relações que incumbem à gramática.

Na prática, um estado de língua não é um ponto, mas um espaço de tempo mais ou menos longo, durante o qual a soma de modificações ocorridas é mínima. Pode ser de 10 anos, uma geração, um século e até mais. Uma língua mudará pouco, du-rante um longo intervalo, para sofrer, em seguida, transformações consideráveis em alguns anos. De duas línguas coexistentes num mesmo período, uma pode evoluir muito e outra quase nada; neste último caso, o estudo será necessariamente sincrô-nico; no outro, diacrônico. Um estado absoluto se define pela ausência de transformações e como, apesar de tudo, a língua se transforma, por pouco que seja estudar um estado de língua vem a ser, praticamente, desdenhar as transformações pouco importantes, do mesmo modo que os matemáticos desprezam as quantidades infinitesimais em certas operações, tal como no cálculo de logaritmos.

Na história política, distingue-se a época que é um ponto de tempo, e o período que abarca certa du-ração. No entanto, o historiador fala da época dos antônimos, da época das cruzadas, quando con-sidera um conjunto de caracteres que permane-ceram constantes durante esse tempo. Poder-se-ia dizer também que a linguística estática se ocupa de épocas; mas estado é preferível; o começo e o fim de uma época são geralmente marcados por uma revolução mais ou menos brusca, que tende a mo-dificar o estado de coisas estabelecido. A palavra estado evita fazer crer que ocorra algo semelhan-te na língua. Ademais, o termo época, justamente por ser tomado à História, faz pensar menos na língua em si que nas circunstâncias que a rodeiam e condicionam; numa palavra, evoca antes a ideia

do que temos chamado de linguística externa.

Além disso, a limitação no tempo não é a única dificuldade que encontramos na definição de um estado de língua; o mesmo problema se coloca a propósito do espaço. Em suma, a noção de estado de língua não pode ser senão aproximativa. Em lin-guística estática, como na maior parte das ciências, nenhuma demonstração é possível sem uma sim-plificação convencional dos dados.

De um modo geral, é muito mais difícil fazer lin-guística estática que histórica. Os fatos de evolução são mais concretos; falam mais à imaginação; as relações que neles se observam se estabelecem em termos sucessivos que são percebidos sem dificul-dade. Mas a linguística, que se ocupa de valores e relações coexistentes, apresenta dificuldades bem maiores (Saussure apud Bally, 1995).

atividade | Defina linguística sincrônica e apresente seus objetivos.

6. o valor linguístico: a língua como Pensamento organizado na matéria Fônica

Para compreender por que a língua não pode ser senão um sistema de valores puros, basta conside-rar os dois elementos que entram em jogo no seu funcionamento: as ideias e os sons. Psicologica-mente, nosso pensamento não passa de uma massa amorfa e indistinta. Filósofos e linguistas sempre concordaram em reconhecer que, sem o recurso dos signos, seríamos incapazes de distinguir duas ideias de modo claro e constante. Tomado em si, o pensamento é como uma nebulosa em que nada está necessariamente delimitado. Não existem ideias preestabelecidas, e nada é distinto antes da língua. A substância fônica não é mais fixa nem mais rígida; não é um molde a cujas formas o pen-samento deve necessariamente acomodar-se, mas, uma matéria plástica que se divide, por sua vez, em partes distintas, para fornecer os significantes dos

texto comPlementar

http://www.scribd.com/doc/2063971/ESTRUTURALISMO-

LINGUISTICO

61Fascículo 4

quais o pensamento tem necessidade. Podemos, então, representar o fato linguístico em seu con-junto, isto é, a língua como uma série de subdi-visões contíguas marcadas simultaneamente sobre o plano indefinido das ideias confusas e sobre o plano não menos indeterminado dos sons. O pa-pel característico da língua frente ao pensamento não é o de criar um meio fônico material para a expressão das ideias, mas o de servir de interme-diário entre o pensamento e o som, em condições tais que uma união conduza necessariamente a de-limitações recíprocas de unidades. O pensamento, caótico por natureza, é forçado a precisar-se ao se decompor. Não há, pois, nem materialização de pensamento nem espiritualização de sons; trata-se de o “pensamento-som” implicar divisões e de a língua elaborar suas unidades, constituindo-se entre duas massas amorfas. Imaginemos o ar em contato com uma capa de água: se muda a pres-são atmosférica, a superfície da água se decompõe numa série de vagas divisões; são estas ondulações que darão uma ideia da união e, por assim dizer, do acoplamento do pensamento com a matéria fô-nica. A língua é comparável a uma folha de papel: o pensamento é o anverso, e o som o verso; não se pode cortar um sem, ao mesmo tempo, cortar o outro; assim, tampouco na língua se poderia isolar o som do pensamento, ou o pensamento do som; só se chegaria a isso por uma abstração cujo resulta-do seria fazer Psicologia pura ou Fonologia pura. A linguística trabalha, pois, no terreno limítrofe em que os elementos das duas ordens se combinam; esta combinação produz uma forma, não, uma substância. Não só os dois domínios ligados pelo fato linguístico são confusos e amorfos como a es-colha que se decide por tal porção acústica para tal ideia é perfeitamente arbitrária. Se esse não fosse o caso, a noção de valor perderia algo de seu caráter, pois conteria um elemento imposto de fora. Mas, de fato, os valores continuam a ser inteiramente relativos, e eis porque o vínculo entre a ideia e o som é radicalmente arbitrário.

A ideia de valor assim determinada nos mostra que é uma grande ilusão considerar um termo simples-mente como a união de certo som com um certo conceito. Não podendo captar diretamente as enti-dades concretas ou unidades da língua, trabalha-se sobre as palavras. Estas, sem recobrir exatamente a definição da unidade linguística, dão dela uma ideia, pelo menos, aproximada, que tem a vanta-gem de ser concreta sendo tomadas, pois, como es-pécies equivalentes aos termos reais de um sistema

sincrônico, e os princípios obtidos a propósito das palavras serão válidos para as entidades em geral (Saussure in Bally, 1995. p. 130-134).

atividade | Explique a arbitrariedade do sig-no linguístico.

7. linguística diacrônica: generalidades

A linguística diacrônica estuda não mais as rela-ções entre os termos coexistentes de um estado de língua, mas entre termos sucessivos que se subs-tituem uns aos outros. Toda a fonética constitui o primeiro objeto da linguística diacrônica; com efeito, a evolução dos sons é incompatível com a noção e o estado; comparar fonemas ou grupo de fonemas com o que foram anteriormente equivale a estabelecer uma diacronia. A época anteceden-te pode ser mais ou menos próxima; mas, quando uma e outra se confundem, a fonética deixa de in-tervir; só resta a descrição dos sons de um estado de língua, e compete à fonologia levá-la a cabo.

O caráter diacrônico da Fonética concorda muito bem com o princípio de que nada do que seja fo-nético é significativo ou gramatical no sentido lato do termo. Para fazer a história dos sons de uma pa-lavra, pode-se ignorar-lhe o sentido, considerando-lhe apenas o invólucro material, e cortar frações fônicas sem perguntar se elas têm significação (SAUSSURE).

No entanto, a língua altera-se no tempo, mas não por causa dele. Na verdade, há fatores intrínsecos (fatores ligados às próprias condições de funciona-mento da língua: pressões internas, existências de lacunas estruturais ou de unidades mal integradas que possibilitam a passagem gradual de um esta-do a outro) e extrínsecos (fatores ligados ao uso: as

texto comPlementar

Linguagem – Atividade Constitutiva:

http://www.letras.ufpr.br/documentos/pdf_revistas/ilari.

pdf

http://www2.fcsh.unl.pt/edtl/verbetes/A/arbitrariedade_

signo.htm

http://www.partes.com.br/ed39/teoriasignosreflexaoed

39.htm

62 Fascículo 4

vinculações estruturais, o modo como os falantes falam, o ambiente, os contactos culturais com ou-tras línguas, o isolamento).

A tarefa básica da linguística diacrônica é explicar estados anteriores para melhor compreender a es-truturação do sistema atual. A descrição de estados anteriores é viável, embora mais difícil. Os estudos diacrônicos começam pela descrição de estados an-teriores, ou seja, pela sincronia. Primeiro se faz a descrição sincrônica e depois se determina a evolu-ção pela comparação dos estágios.

Para se descobrir por que as línguas mudam atra-vés do tempo, é importante estabelecer uma suces-são cronológica de fatos capaz de colocá-los numa verdadeira perspectiva histórica. Isto tudo leva a concluir que não interessa ao historiador da língua a consideração de fatos isolados ou as alterações ocasionais causadas pela própria instabilidade da fala. Portanto, a linguística histórica pode ser feita em duas direções: partir dos estudos dos fatos atu-ais e ir recuando no tempo até a reconstrução dos estados mais antigos ou começar pela observação de dados bem recuados no tempo até chegar aos estágios mais recentes (BORBA, 1986).

atividade | Defina linguística diacrônica e apresente seus objetivos.

8. Fonologia na escola Cagliari(1997) propõe esta reflexão, consideran-do que o que se ensina de fonologia na escola é desastroso, tanto nos livros didáticos e gramáti-cas quanto nas incompreensões sobre a realida-de da língua. Se o objetivo da escola é o de ensi-nar como o português funciona, ampliando esse ensino aos usos linguísticos, ela deve ensinar ao aluno fonética e fonologia também. As noções bá-sicas de fonética, fonologia e variação linguística, apresentadas durante a disciplina, são de elevada importância para o educador que, empregando-as, poderá realizar atividades que motivem o aluno, além de ensinar como certos fatos da língua fun-cionam, por exemplo, a noção de oposição, de va-riação, de sistema, os testes de mutação, a noção de valor linguístico, podem ser úteis na tarefa de ensino da língua ao seu falante. Um professor ou professora, de posse de conhecimentos fonológi-cos, pode propor aos seus alunos atividades para mostrar como funciona o sistema de escrita do

português e sua relação com a ortografia. As téc-nicas de análise fonológica, aliadas a uma boa des-crição fonética permitem, também, ao educador entender de fato o que acontece com os proble-mas de fala e escrita, como permitem ainda a ela-boração de atividades que facilitem o processo de aprendizagem por parte dos alunos, que passarão a receber uma melhor explicação de como a fala, a escrita, a leitura e a língua funcionam.

atividade | Realizar entrevista com profes-sores da Educação Fundamental sobre a im-portância da fonologia para o ensino de língua portuguesa e para o aprendizado dos alunos.

texto comPlementar

Avaliação da consciência fonológica em

crianças: http://www.cefac.br/revista/revista53/Artigo%201.pdf

Da relevância de se perceberem fatos lin-

guísticos em textos literários:

http://www.filologia.org.br/revista/34/04.htm

SAIBA MAIS!

A importância da fonologia sincrônica

no estudo da diacronia:

http://www.filologia.org.br/viiicnlf/anais/caderno10-01.

html

Sociolinguística é a ciência, que estuda a lín-

gua a partir da perspectiva de sua estreita li-

gação com a sociedade onde se origina. Para

a sociolinguística, a língua existe enquanto in-

teração social, criando-se e transformando-se

em função do contexto sócio-histórico.

http://www.filologia.org.br/abf/volume2/numero1/02.

htm

http://books.google.com.br/books?id=ejRbuFLRyi0C&p

g=PA62&lpg=PA62&dq=o+que+%C3%A9+morfofon%

C3%AAmica%3F&source=bl&ots=ZwFvrRvRhk&sig=npc

zaLIs8GcprjQ6moNbvPHsqFc&hl=pt-BR&ei=I1AsStn0Fa

TwMsGmvMkJ&sa=X&oi=book_result&ct=result&resnu

m=4#PPA62,M1

63Fascículo 4

rESUMO

Toda língua possui um grande número de variedades. Essas variedades ocorrem devido às transformações que as línguas sofrem, não significando para estas imperfeição ou degeneração.

Pode-se apresentar basicamente dois tipos de variedades linguísticas: os dialetos(variações diatópicas, diastráticas e diafásicas) e os registros (graus de formalismo, modo e sintonia).

Os fatos linguísticos podem ser estruturados sob três pontos de vista: acrônico , sincrônico e diacrônico.

A linguística estrutural clássica tem sua origem nas ideias de Saussure, que se mantêm na fase contemporânea desta.

A linguística diacrônica estuda as relações entre os termos sucessivos que se substituem uns aos outros ao longo do tempo.

A linguística sincrônica estuda as relações entre os termos coexistentes de um estado de língua.

As noções básicas de fonética e fonologia permitem ao educador e ao educando com-preender como certos fatos da língua funcionam, instrumentalizando-os na conquista da participação, no processo de transformação social.

rEFErÊNCIAS

BALLY, Charles&SECHEHAYE, Albert(org). Ferdi-nand de Saussure - Curso de Linguística geral. Tradução de Antônio Chelini, Paulo Paes e Iz-idoro Blikstein. São Paulo: Ed. Cultrix, 1995.

BORBA, Francisco da Silva. Introdução aos es-tudos linguísticos. 9 ed. São Pulo: Editora Na-cional, 1986.

CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetização e Lin-guística. São Paulo: Scipione, 1997.

CUNHA, Celso; CINTRA, Lindley. Nova Gramática do Português Contemporâneo. Rio de Janeiro. Editora Nova Fronteira, 1985.

DINO, Pretti. Sociolinguística. Os níveis da fala. Ed. Nacional, 1987.

LOPES, Edward. Fundamentos da linguística contemporânea. São Paulo: Ed. Cultrix, 1995.

TRAVAGLIA, Luiz Carlos. Gramática e Interação:

uma proposta para o ensino de gramática no 1º e 2º graus. 8 ed. São Paulo: Cortez, 2002.