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A Invenção do Intelectual: vida e obra do sociólogo brasileiro Sergio Miceli

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Autoria: Brian Henrique de Assis Fuentes RequenaContato: http://www.facebook.com/brian.henriquedeassisfuentesrequena

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“E por isso mesmo os intelectuais de hoje devemos muitas de nossas cara

terísticas às transformações institucionais em que estiveram envolvidos ess

precursores, ampliando o espaço de autonomia em que operamos, forjan

as imagens conflitantes que temos a respeito de nossa condição social

fazendo ver os limites que constrangem nossa contribuição”.

Os Intelectuais e a Classe Dirigente no Brasil, Sergio Mic

Alunos: Brian Requena

Ana Carolina dos Santos

Fotografia: Magda

Orientação: Cibele Maria Buoro

Coordenador: Nivaldo Ferraz

Diagramação: Maxdesign

Grande reportagem apresentada à Universidade Anhembi Morum

como critério parcial para obtenção do título de graduação no curs

de Comunicação Social com habilitação em Jornalismo.

São Paulo

2011

EXPEDIENTE

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A INVENÇÃO

DO INTELECTUALResponsável pela introdução das premissas teóricas do intelectual francês Pierre Bourdieu

ao Brasil, o sociólogo Sergio Miceli enfrentou sua própria categoria e inaugurou uma nova

forma de encarar a vida intelectual brasileira

POR BRIAN ASSIS

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Em 1969, o jovem aluno da Univer-sidade de São Paulo, Sergio MiceliPessôa de Barros escreveu uma cor-

respondência para o recém-diretor deestudos da École des Hautes Études  enSciences Sociales . A carta, além de umabreve apresentação, trazia alguns comen-tários acerca das leituras de artigos e livrosproduzidos pelo antropólogo, sociólogoe filósofo francês. A correspondência foirespondida, com uma promessa de en-vio de textos que foram publicados emrevistas francesas para que ele pudesse

ler. Durante os próximos anos, eles conti-nuaram trocando outras cartas. À medidaque o contato se tornava mais constante,propunha coisas para que Sergio pudes-se fazer. Ele fez. Em 1971 publicara pelaeditora Perspectiva uma coletânea dosartigos traduzidos em português do inte-lectual francês.

O diálogo estabelecido entre mestree aprendiz por meio dessas cartas cer-tamente poderia passar despercebidopara qualquer leitor da época. Umestudante da pós-graduação em so-ciologia de uma universidade públicabrasileira e um homem de apenas qua-renta anos, de origem camponesa que

acabara de ser nomeado para coorde-nar um centro de estudos de uma insti-tuição pública francesa. No entanto, asquatro décadas que nos separam destadata, ao mesmo tempo nos aproximamda representatividade desses primeiroscontatos. O mestre que Sergio elegeupara orientar suas discussões nuncaestivera no Brasil e pouco sabia sobreos trópicos. Mas, o brasileiro já sabiao que todos souberam mais tarde. Asideais daquele homem abririam umanova discussão na sociologia ao privi-legiar estudos sobre a cultura e a domi-nação simbólica. Posteriormente, Ser-

gio foi à França desenvolver sua tesede doutorado e buscar respostas às suasindagações. Além de encontrar respos-tas, Sergio encontrou Pierre Bourdieu.

“Eu estava cursando Ciências So-ciais na PUC do Rio de Janeiro quan-do li um número da revista Les TempsModernes , sobre os problemas doestruturalismo e tinha um artigo cha-mado Campo Intelectual   e o ProjetoInovador  de um autor chamado PierreBourdieu. Fiquei alvoraçado. Eu tinhaum grupo de estudos na época com

o Sergio Azul e o Antônio Calmon echeguei dizendo que tinha acabado deler um artigo bárbaro e era aquilo queeu queria para minha vida. Não sabiacomo, mas iria fazer um negócio pare-cido com aquele. Todos artigos e livrosexistentes na época de autoria do Bour-dieu eu importei”.

Da varanda do seu confortável apar-tamento de 190m², na avenidaHigienópolis, (famoso bairro de

classe média alta por concentrar in-telectuais e políticos brasileiros), e napresença do gravador, Sergio Micelise sente em casa. A vontade se recor-

da como era difícil achar trabalhos doBourdieu no Brasil. Ele importava pelalivraria francesa os títulos que encon-trava, entre eles sobre fotografia. Nãoexistia nada em português no final dadécada de 1960.

“Em 1970, Miceli tinha 25 anose estava cursando o mestrado den-tro da Universidade de São Paulo.Naquele momento ele travava umaleitura de um sociólogo francês, porvolta dos seus quarenta anos, que vi-ria a se tornar o maior sociólogo doséculo XX. Ele teve essa perspicáciade perceber que aquele sociólogo ti-

nha feito importantes análises de se-leção social na França e que deveriaser lido com cuidado”.

O Doutor em sociologia José CarlosDurand foi um dos que se beneficiaramdas traduções e organizações dos textos dePierre Bourdieu pelas mãos de Sergio Mi-celi. Durand adquiriu renome na décadade 80 por suas análises do campo intelec-tual, em especial das artes plásticas. Assimcomo Miceli, não teve um orientadorsubstantivo: não havia dentro da univer-sidade brasileira professor habilitado para

analisar problemas intelectuais. Durandé de uma mesma geração que Sergio Mi-celi e trabalhou ao seu lado na FundaçãoGetúlio Vargas. Inclusive, Sergio indicouseu nome a Bourdieu para um estágio noCentro de Sociologia Europeia.

O intelectual Sergio Miceli recebeudesde cedo um capital cultural multi-disciplinar. Com uma educação privi-legiada pôde aprender francês e inglêsdesde os cinco anos de idade, apreciarartes visuais e ópera. Estudou nos tradi-cionais colégios São Bento e Andrews ,localizado na praia do Botafogo e fre-quentado por alunos da elite do Riode Janeiro. Como o próprio afirma “só

estudei em colégio de bacana”.Do lado paterno, a família era tra-

dicional e detentora de grande quan-tidade de terras, fazendas e terrenosurbanos nas regiões de Mendes eRezende no Rio de Janeiro. Para Ser-gio, filho único, pouca coisa restou.

 A famíl ia tratou antes de dilapidar opatrimônio. Sobrou apenas uma casaque tomava o quarteirão inteiro emSanta Teresa, onde a avó paterna fa-leceu. A mãe era funcionária públicae o ajudou a custear os estudos. Mas,uma figura especial marcaria suaadolescência e posteriormente sua

vida profissional: Armando Micelitio materno.

“O tio Armando foi redator-chdo jornal Correio da Manhã  e Prorador do Estado e da República. Ecasou um pouco tarde e foi morar Ipanema. Ficava o dia todo com meprimos na casa dele. Passava frequtemente pessoas como Nelson Rodgues, Antônio Calado e CarpeaEsse universo que debatia livros e lítica me estimulou muito. Eu só oue pouco falava”.

 A opção por Ciências Sociais nãoincentivada, nem repreendida. Na nte de 24 de dezembro de 1963, Micaproveitou o clima de paz natalina pcontar que havia feito matrícula (utanto clandestina) na Pontifícia Uversidade Católica no referido curNinguém fez clima. Mas, certamenuma carreira política e diplomática ria facilitada pelos contatos influende Armando. Quem financiou a gradação foi a mãe. Porém, tempo depoa mudança para cursar o mestrado Universidade de São Paulo foi patronada por Armando.

“Se alguém me perguntar se eu sa

o que estava fazendo estaria mentinFui fazer Ciências Sociais porque nqueria cursar Direito, que era uchatice. Profissionalmente, fui faporque achava mais atraente, mas npodia esperar nada. Eu também fizcurso do Itamaraty e estava super bedominava três idiomas e passaria cemente. Mas achava super chato, pera uma quantidade de coisa irrelevte para saber. Queria estudar algo qfosse interessante”.Dentro da PUC Sergio logo se entmou. Fez teatro, foi à praia e pouestudou. Ao final do segundo ano p

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cebeu função intelectual nas CiênciasSociais. Nesse período, iniciaram asprimeiras leituras de Pierre Bourdieu.

 Ao terminar sua graduação, SergioMiceli decidiu abrir novos horizontese cursar mestrado em sociologia. Ape-nas a Universidade de São Paulo ofe-recia um sistema de pós-graduação,em 1968 no Brasil. Antes da mudançaMiceli deveria alguma coisa ao clien-telismo brasileiro.

“Na rua da minha casa morava um

sociólogo chamado José Arthur e mi-nha família o conhecia. Certo dia, mi-nha mãe que era muito saída, encon-trou a esposa dele e disse que eu estavaquerendo estudar em São Paulo. Nodia seguinte, o procurei, dizendo quegostaria de ir à USP, mas precisava dabolsa. Ele disse para eu não me preo-cupar com isso. Ganhei a bolsa da CA-PES assim”.

No início de 1968, o carioca, aos 23anos se mudaria para São Paulo.Um treme-treme entre as ruas

 Amaral Gurgel e Marques de Itu. Ago-ra, o tio custeava toda estadia. Sergiogosta de se recordar dessa época. Des-de então, ele nunca mais saiu da regiãocentral de São Paulo. Antes, a desculpaera por estar próximo ao antigo prédioda USP na rua Maria Antônia. Hoje, elese diz plenamente adaptado ao bairro.

“Eu o conheci nesse período. Eraum momento muito convulso, por-que naquele mesmo ano houve umrecrudescimento do Regime Militar.Ele se sociabilizou rapidamente aoclima da universidade. Não pareciaincomodado por vir de uma univer-sidade privada e carioca. Era mui-to comum pessoas de todo o Brasil

procurarem à USP por ser o únicolugar que oferecia cursos de pós-gra-duação. Nós tínhamos um grupo deestudos junto com a Sônia Novisnky(depois se casou com Miceli) e Ma-ria Olivaugusto. Ele não comenta-va sobre Bourdieu, não pelo menosdentro do grupo”.

Irene Cardoso ingressou no mes-trado juntamente com Miceli. Comoela preferiu denominar, esse períododentro da USP era “convulso”, poiscomeçaram as aposentadorias compul-sórias. O prédio na rua Maria Antôniafoi desativado e todos os alunos forampara cidade universitária, em meio aos

barracões. As aulas eram dadas com ospoliciais dentro da sala. Mas, a ementado curso em nada se alteraria. Sergio,não ficou de fora do clima da época.

“Nós desenvolvemos rapidamente acoisa política. Existia a comissão paritá-ria e eu e a Vânia Santana fomos elei-tos representantes da pós-graduaçãoparitária. Eu tive uma adesão políticaimediata. Participávamos de passeatase assembleias, não tinha muito comonão aderir. A faculdade vivia o climapolítico da época”.

Mesmo sob o AI-5, ainda em 1968,Florestan Fernandes e Octávio Ianni

(responsáveis pelas Ciências Sociaisna USP) permaneceram no coman-do (fato que mudaria em 1969 com asaposentadorias compulsórias). O jo-vem recém-chegado do Rio de Janeiro,certo de seu tema de mestrado, foi per-cebendo que a coisa não iria ser fácil.Na hora de decidir o tema da tese tinhaque falar com o Florestan. Sergio che-gou à sala e ele perguntou qual temairia apresentar:

 

-Professor Florestan, gostaria de fa-zer um negócio do Caetano e Tropi-calismo. O grupo está aí e todo mundoestá interessado.

-Nem pensar, disse Florestan. Issonão tem distanciamento.

 Apontando para lousa, retrucou:-São esses os temas que estão faltan-

do, você pode escolher um!Sergio olhou os temas e viu pensa-

mento ISEB. Achou todos realmentedesinteressantes. Como ele mesmo dis-se “eu saí com o rabinho no meio daspernas e tive que aceitar”.

Mas a sorte favoreceu Sergio. Sor-te no desastre. Em 1969, Flores-tan e Ianni foram aposentados

pelo AI-5. Os alunos ficaram soltos eos orientadores mais desorientadosdo que os estudantes. Os professorespediam que os alunos entregassem omais rápido possível as teses. A pes-quisa do ISEB tinha avançado pou-co. Sergio aproveitou a deixa e pro-curou a responsável na época pelapós-graduação Marialice Foracchi.Ele havia começado um artigo sobreo programa de auditório da HebeCamargo e, já que eles queriam queas teses fossem entregues rapidamen-

te, o mestrando argumentou que estapesquisa estava mais adiantada doque a do ISEB. Televisão não estavana lista feita por Florestan, mas Fo-racchi não tinha muito o que fazer eaceitou.

“Ele foi meu primeiro orientando.Nós não sabíamos direito como orga-nizar a pós-graduação. Tudo era pre-cário, pouca gente trabalhando. Cadaorientador recebia 10 orientados porano, até o total de 30. Um número ab-surdo e as teses demoravam mais queo curso. A coisa era tão frágil e inex-periente que Octávio Ianni foi o pri-meiro orientador de Miceli, assim que

ele se mudou para São Paulo. Depoispor alguma razão, que não sei, ele mu-dou, se inscreveu comigo, assim comoa esposa dele. Eu orientei os dois aomesmo tempo. A minha especiali-zação era sociologia do trabalho, e oSergio estava desenvolvendo uma tesede indústria cultural”.

 A Noite da Madrinha tinha como ob-jeto de estudo as facetas utilizadas pelaapresentadora Hebe Camargo parareproduzir e firmar para o público,valores culturais e comportamentaisda classe média brasileira. Para tanto,dentro do seu programa de auditório,

Hebe Camargo assumia diferentes pa-péis sociais que garantissem uma inter-pretação correta dos diferentes códigossimbólicos. A esposa, mulher, mãe e amadrinha. A televisão seria uma propa-gadora desses valores.

 

“Bourdieu denomina ‘arte mé-dia’ aquela modalidade pro-dutora de bens simbólicos

empenhada na busca do efeito de ‘alo-doxia cultural’, ou seja, ‘provocar os

erros de identificação bem-feitos paradar aos que deles são vítimas a ilusãode ortodoxia cultural’. Tendo em vistaa posição subordinada e indigna da in-dústria cultural em face da cultura eru-dita. A ‘arte média’ recorre a uma sériede técnicas, efeitos e procedimentos,pelas quais, dilui e vulgariza os temas,as disposições dos agentes e os objetosde discurso da produção erudita”, diriaMiceli em  A Noite da Madrinha,  napágina 75 e publicado pela Compa-nhia das Letras.

 Falar em alodoxia cultural dentro

da USP era só coisa de Sergio. Leôn-cio Martins Rodrigues apenas o acom-panhou simbolicamente. Seguindo atradição da cadeira de sociologia deFlorestan Fernandes, o filósofo ale-mão do século XIX Karl Marx e suasteorias em torno da dialética materia-lista histórica conduziam os rumosdas pesquisas. Quando Sergio pediupara que ele o orientasse, com muitahonestidade disse que não entendianada sobre indústria cultural, muitomenos do programa de auditório daHebe Camargo.

“Mas ele insistiu tanto, no fundo nãotive nenhum papel, apenas dei pitacos.

Na produção da Noite da Madrinhaele já começou a ler Pierre Bourdieu, eeu, para ser sincero, não tinha interessealgum no autor. O Marx nessa épocaera uma febre na USP, nunca se leu ese debateu tanto O Capital ”.

O professor Leôncio acredita queSergio estava afastado de todasas discussões políticas que en-

volviam a USP com a Ditadura Mi-litar, assim como de autores comoMarx, Gramsci e Althussier.

“O Sergio nunca foi de esquerda, atéfiquei surpreso, quando li esses dias,em uma pesquisa da Folha de S. Paulo

ele dizendo que votava no Lula parafortalecer a esquerda. Sergio me esco-lheu naquele momento por eu não serde esquerda. Além disso, ele vinha deoutra faculdade e eu era uma figuraascendente com prestígio por perten-cer à cadeira do Florestan. Dei totalliberdade como seu orientador. Mas,ele sempre foi um aluno brilhante einovador, capaz de criar um novo ni-cho no qual se tornou uma autorida-de. Acredito que com o Octávio Ianni,Sergio previu que não ia muito longe”.

 A psicanalista, socióloga e colegade mestrado de Miceli na época, Ire-

ne Cardoso avalia que a temática uda por Sergio era altamente inovadra. Hoje em dia, dentro da sociologhá um espaço privilegiado acerca indústria cultural, televisão e dos pgramas de auditório “mas naquele ríodo não existia nada. Sergio andafora do padrão Marx e Althussier. Gbriel Cohn era o único que falava cultura de massa e indústria cultubrasileira. Por todo esse contextolivro recebeu duros ataques den

da academia. Eles não sabiam ler otra coisa senão esses autores clássic A partir de 1971, com a re formulaçda pós-graduação, novos núcleos sociologia foram inaugurados. O Lôncio foi uma daquelas figuras época, na qual o orientador era apnas formal para cumprir o curso”.

O contexto político instável, umpós-graduação incipiente e a falta uma orientação efetiva não intimiram o jovem carioca. Pelo contrárSergio sentia-se à vontade para guos rumos do seu próprio trabalhPosteriormente, ele não daria menfoque às análises de televisapresentadores ou programas de ditório. Contudo,  A Noite de Madnha selou a personalidade inovadoe visionária de Sergio.

“Eu tinha uma relação muito bcom o Leôncio, saíamos para tomcerveja com as alunas (risos) e vimos amigos. Ele não entendia minproposta, nunca tinha estudado aqlo. Como ele ia orientar, não tinjeito. Fui entrevistando as pessofazendo sozinho mesmo. E o dourado também. Claro, quando eu tminei os capítulos, ele lia e fazia gumas sugestões. Mas, quando le

a tese já estava pronta. Leôncio lcomo um leitor comum”.José Durand acredita que  A No

da Madrinha foi uma fina análise uma apresentadora de TV que abcaminho para se pensar na socioloda cultura brasileira. Marx, durasua trajetória, permeou suas análiacerca das relações de lutas de clase da dominação pelos detentores dmeios de produção capitalista. O lósofo alemão não teve tempo de pduzir estudos significativos sobre pdução cultural e simbólica. Duranassim como Sergio, se sentiu cercapelo marxismo, faltando espaço p

outras escolas de pensamento.“A Universidade de São Paulo v

de uma tradição de filosofia franceEu diria que as Ciências Sociais neperíodo eram subjugadas à filosofacatando certa subserviência. O mxismo era tão absolutista na USP qqualquer teórico que se propuseanalisar qualquer processo social qnão se levasse em conta o horizote socialista não tinha espaço. Edependência do Marx fazia parte imaturidade das Ciências Sociais bsileiras e pela radicalização políticaépoca”, desabafa Durand.

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A recepção de A Noite da Madrinha foi heterogênea. A crítica foi me-lhor dentro da mídia do que pela

universidade. Ao apontar para umavisão não catastrofista da mídia, comoera moda da época, Sergio demonstravaoutra vertente, menos massacrada, re-chaçada e pessimista do que a feita pelaEscola de Teoria Crítica de Frankfurt,em especial pelo alemão Theodor Ador-no (os adornianos como ficaram conhe-cidos posteriormente tinham uma visão

negativa da cultura de massa produzidapela indústria cultural).“ A Noite da Madrinha  foi um mo-

mento de mudanças, porque eu nãosabia direito para onde ir. Não sabia seficava só na sociologia, na semiótica ouse deveria tentar uma análise da teci-tura dramática do programa da Hebe.Minha tese de mestrado teve essa am-biguidade. Quando foi reeditada (em2005 pela Companhia das Letras) eutentei mudar algumas coisas. Mas nãodá muito para mudar porque o interes-sante do trabalho é a ambiguidade. Ti-rar isso é matar a tese”.

Maria Arminda do Nascimento Ar-ruda, atual Pró-Reitora de Cultura eExtensão da USP, escreveu na épocauma resenha na revista do CEBRAPcom duros ataques ao livro, não o con-siderando adorniano. Maria se tornouposteriormente amiga de Sergio e mu-dou de ideia.

“Eu comecei minha vida intelec-tual criticando  A Noite da Madrinha.

 Anos mais t arde, Sergio Miceli estavapresente no exame da minha titula-tura dentro da USP e me perguntoupor que eu tinha escrito aquilo. Comoresposta disse que se fosse hoje não te-ria feito aquela resenha contra ele. Eu

acreditava que o livro não era adornia- no. Mas, ele nunca quis reproduzir o Adorno. Eu é que estava errada”.

Em 1972, Sergio já havia alcançadodestaque dentro da universidade e dasociologia. Detinha uma tese de mes-trado polêmica e uma coletânea pelaeditora Perspectiva dos artigos do soció-logo francês Pierre Bourdieu. O moçooriginário de uma universidade priva-da que chegara acanhando na sociolo-gia paulista começa a ganhar notorie-dade, prestígio e reconhecimento. “Omelhor aluno na pós-graduação” comoele mesmo se define. Um ano depois jáfazia a inscrição para o doutorado na

Universidade de São Paulo. A pesquisasobre os intelectuais brasileiros foi le-vantada durante dois anos. No ano de1974, depois das trocas de cartas entreele e Bourdieu, e com uma longa edensa pesquisa nas mãos, finalmenteSergio viajou à França. Nesse tempo,ele havia passado no concurso da Fun-dação Getúlio Vargas e além da docên-cia, Sergio se beneficiou largamente dainstituição para uma pesquisa inédita.

“A minha tese de doutorado era caraporque tinha muito levantamento. Eutinha cinco assistentes, você pode ima-ginar? Tive condições excepcionais,

que provavelmente hoje em dia nin-guém mais terá. Dois anos no exterior,mais um ano fechando o texto, ondemais iria conseguir isso? Difícil viu. Eutinha a bolsa e meu salário (salário queganhava mesmo sem dar aulas). Issonão acontece mais”.

Sergio lecionou sociologia no cursode Administração da FGV duran-te quinze anos. Nesse tempo, ele

esteve envolvido em meio às disputas

políticas constantes. As divergênciasem nada se referem às questões inte-lectuais e de pesquisa. Era briga polí-tica por poder e controle do Núcleo dePesquisas e Publicações  que tinha umorçamento alto. O jogo era duro. Ser-gio fazia política mesmo.

“Na Fundação Getúlio Vargas eudirigi a Revista Administração de Em- 

 presas  de lá que também tinha muitodinheiro e você fazia o que queria. Eufui eleito duas vezes contra toda direitada escola. Fazia política diuturnamen-te. Não vou dizer que tenho saudadeda FGV, mas tenho boas lembrançasde lá, foi bom para minha carreira”.

Durante a década de 1970 PierreBourdieu começou a ganhar destaquena sociologia brasileira. No entanto,não foram pelos portões da cidade uni-versidade que o filósofo entrara. Naépoca que a Fundação Getúlio Vargaspermitiu a ida de Sergio à França parabuscar a orientação do diretor de es-tudos da Escola de Altos Estudos emCiências Sociais, a FGV tinha um pro-grama que concedia bolsas para que osprofessores procurassem centros euro-peus ou americanos de pesquisa. Horacerta para Sergio buscar Pierre Bour-dieu. Em 1974, quando chegara ao

Centro de Sociologia Europeia, apesarda boa recepção, ele era o único latino--americano.

“O círculo de amigos brasileiros queeu tinha lá era formado por pessoasda faculdade que estavam exiladas noexterior como Cláudio Voguel. Mas,logo fiz contato com os assistentes efrequentava a casa deles, almoçava ejantava. Era uma espécie de chacri-nha. Eu era o único latino-americanono momento dentro do Centro. Tan-to é que não por menos era Centrode Sociologia Europeia, pois só tinhaeuropeu. O Bourdieu era o chefão eos demais eram ligados a ele. Eu tive

uma experiência na França, que não éa experiência de gente que vai estudarno exterior e só tem amigo brasileiro,comigo não foi assim”.

Pierre era um jovem patrão. Aindanessa época todos os alunos e orien-tandos estrangeiros ou não, que oprocurassem podiam contar com suaparticipação. No entanto, com a re-percussão que o trabalho de PierreBourdieu adquiria durante aquela dé-cada, transformariam sua vida em uminferno. Bourdieu se tornaria um inte-lectual renomado e requisitado. Mas,Sergio teve sorte novamente. Além da

sociabilização com seus assistentes,Pierre acompanhava de perto sua pro-dução. No ano de 1975, Sergio decideque era o momento de voltar ao Brasilpara terminar a tese de doutorado. Umano estagiando no Centro de Sociolo-gia Europeia e dois anos envolvidos emuma longa pesquisa da vida intelectualbrasileira já estava de bom tamanhopara começar a escrever. Mas, parasua surpresa, seu mestre francês lheincumbiu de um teste que ele deveria

cumprir antes de seu regresso ao Brasil.Sergio se recorda bem do “recado”.“Vamos fazer um exercício, um teste,

com esse material e ao invés de pegaresse grupo grande que você esta sele-cionando dos intelectuais dos anos 30e 40, que é o objeto que você quer es-tudar, escolha um grupo menor de ummomento, que possa testar essas hipó-teses suas”.

O ensaio dos autores pré-modernis-tas denominados anatolianos (publi-cado no Brasil como Poder, Sexo eLetras na República Velha) foi umaintimação que funcionou. Os assis-tentes todos foram contra a iniciativado Bourdieu, por acreditarem que otexto de Sergio, inclusive seu francês,não estavam aptos para publicação emuma revista do país. Mas, Bourdieudava créditos e apostava na capacidadedele. Sergio escutou um “você só vaivoltar ao Brasil quando me entregar otexto”. Ele acatou.

 

“Não havendo, na República Ve-lha, posições intelectuais au-tônomas em relação ao poder

político, o recrutamento, as trajetóriaspossíveis, os mecanismos de consagra-ção, bem como as demais condições ne-

cessárias à produção intelectual sob suasdiferentes modalidades, vão dependerquase que por completo das instituiçõese dos grupos que exercem o trabalho dedominação”, sustentaria Sergio em In- telectuais à brasileira, in Poder, Sexo eLetras na República Velha na página 17.Companhia das Letras, 2001.

Quando Luc Boltanski e Moniquede Saint Martin leram o estudoantes de Bourdieu o espanto foi

geral. Disseram: “isso é um absurdo,como alguém fala de feminilizaçãodentro da profissão literária”. Na opi-nião dos jovens assistentes, Bourdieu

não reagiria bem. Sergio queria apenasvoltar ao Brasil o mais rápido possível emostrou o estudo assim mesmo. Bour-dieu revelou extremo interesse. Indi-cou uma melhora de alguns capítulose financiou a publicação do texto narevista francesa  Acts de la Rechercheen Sciences Sociales , número 5-6 quepertencia ao Centro de Sociologia Eu-ropeia. Em 1978, Sérgio acertou algunspontos, fez o acabamento e ilustraçõese voltou ao Brasil.

“Eu sabia apenas que queria traba-lhar com assuntos culturais. A socio-logia brasileira tinha uma dificuldade

e má vontade de lidar com isso.O marxismo tratava a cultura deforma reducionista. O trabalho doBourdieu estava em outro patamar,outro nível de complexidade. Eu es-tava fascinado pelo trabalho dele.”

O estudo dos anatolianos (nomeproveniente do escritor francês Ana-tole France que foi assumido pelosprimeiros grupos de letrados brasi-leiros que tinham como referênciaa literatura francesa) foi publicado

pela editora Perspectiva, em 1977.Durante dois anos de pesquisa omaterial para a tese de doutoradoera numeroso. Este ensaio, curtoe denso, proporcionou uma visãodo que seria depois Os Intelectu- ais e a Classe Dirigente no Brasil .Sergio selecionou um grupo me-nor de intelectuais de um períododenominado pré-modernismo quese caracterizou pelo aparecimentodos primeiros escritores profissio-nais atuantes na República Velha(1889-1930). Para que essas trajetó-rias fossem recontadas, Miceli usoubiografias e memórias dos letradosdesta fase como Manuel Bandeira,Lima Barreto e Humberto de Cam-pos. No entanto, o mercado edito-rial brasileiro não estava totalmenteestabelecido. Uma parcela repre-sentativa dos anatolianos era prove-niente de setores empobrecidos daoligarquia. A literatura era uma daspoucas opções que esses persona-gens encontravam como forma deaproximação das elites dirigentes eassim evitar o rebaixamento social.

 Além de resgatar as trajetórias eorigens sociais dos anatolianos, Ser-gio expõe as fragilidades que estes

letrados enfrentavam, em especial,a dependência política. Outro pon-to inovador de Poder, Sexo e Letrasna República Velha era o meio ex-plicado por Sergio para que essesparentes pobres da oligarquia pu-dessem mobilizar seu capital sociale assim se aproximarem dos setoresdirigentes. Esse contato acontecia,por exemplo, através trabalhos fe-mininos (como costuras e rendas)que permitiam aproximação defamiliares pertencentes aos setoresprivilegiados dentro da PrimeiraRepública, principalmente a políti-ca. Com a expansão de novos pos-

tos culturais ligadas às condiçõesconsolidadas pelas oligarquias, aliteratura (socialmente definidacomo uma carreira feminina emoposição às masculinas como po-lítica ou militar) representava na-quele momento para os parentespobres a única forma de reconver-são social (uma forma de não re-baixamento desses escritores, umavez que a maioria não podia seguircarreiras masculinas como as mili-tares ou políticas, por problemas desaúde, dilapidação do patrimônioou morte do pai).

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Se o tema já espantava os france-ses, foi uma amostra do que seriaa tese de doutorado de Miceli em

terras brasileiras. Esse estudo impul-sionou Sergio a voltar ao Brasil, con-fiante no direcionamento do trabalho.Ele estava no caminho certo.

“O estudo dos anatolianos, achei in-teressante, porque Bourdieu disse queeu não poderia voltar ao Brasil comas mãos abanando e foi firme dizendo‘vai testar esse caminho que você está

traçando’. Aquela força dele foi muitoimportante para mim naquele momen-to. Foi ele que insistiu. No início acei-tei apenas para não contrariá-lo. Ele meensinou que não bastava apenas fazeranálise, tinha que tentar fazer uma arti-culação final mais genérica”.

Poucos meses antes da sua morte,ainda em 2001, Pierre Bourdieu minis-trava um curso no Collège de Fran- ce   quando fez relatos íntimos sobresua origem, os confrontos sociais queenfrentou chegando à Paris e seus es-tudos de casos na Argélia. Esboço deauto-análise , título em português, foipublicado posteriormente pela Com-panhia das Letras. Sergio o traduziu.

“Ele não era propriamente humil-de. Mas, uma pessoa muito direta,muito viva e intensa e não era nadaarrogante. Só que ele era de ideias fir-mes e danado. Quando eu cheguei naÉcole , Bourdieu era jovem e fazia su-cesso com as mulheres. Um homembonito e discreto que sempre usavao mesmo terno, a mesma calça, umaroupa já batida. Ele não fazia o estiloburguês”.

Se Bourdieu era um homem inten-so, direto e firme, a personalidade deSergio Miceli também não fica para

trás. Maria Arminda do Nascimento Arruda (aquela mesmo que logo noinício da carreira rechaçou A Noite daMadrinha) o conhece desde os anos80. Maria Arminda foi a favor da vindadefinitiva de Sergio para Universidadede São Paulo, em 1989. AtualmentePró-Reitora de Cultura e Extensão daUSP, participou de alguns projetos te-máticos organizados por Miceli. ‘Min-dinha’ como é chamada pelos amigosconhece bem o temperamento italia-no do amigo.

“Ele não provoca sentimentos neu-tros e não sente sentimentos neutrospor ninguém. A acidez e a forma

como ele crítica, às vezes gera mal-es-tar. Hoje em dia ele está mais brandoe doce. Mas, no passado, tinha genteque não aguentava a crítica demolido-ra de Sergio. Há casos de pessoas cho-rarem depois das aulas”.

Os alunos e orientandos sentiramna pele a pouca neutralidade domestre. Ana Paula Cavalcanti foi

aluna e orientanda de Sergio duranteo mestrado e doutorado. Atualmente édocente do Instituto de Estudos Brasi-leiros (IEB) pela Universidade de SãoPaulo. Por influência do mestre fez

estágio no Centro de Sociologia Eupeia e desenvolveu pesquisas em torda vida artística do país e as relaçõesmecenato na cultura brasileira.

“Conheci o professor Sergio ainna graduação, em 1991. Ele era uprofessor assustador, nós o temíammuito por sua exigência, mas o mirávamos muito pelo brilhantismpela didática e pelo modo com qnos obrigava a realmente refletir bre os temas apresentados. Eu fiqu

particularmente interessada em tralhar com ele quando fiz sua optatiintitulada Sociologia Contemporânem que abordava Becker, Bourdiautores que até hoje gosto muito. Fali que percebi as potencialidades sociologia da cultura, que me atram diretamente”.

Fernando Pinheiro é professor sociologia da Universidade de SPaulo. Sergio Miceli foi seu oriendor durante a tese de doutorado. Malguns anos antes, o encontro eneles não foi fácil.

“Meu primeiro contato com o Sgio foi no mestrado. Participávamosum seminário de projeto logo que tramos no mestrado e os alunos leeos projetos uns dos outros e discuteNa época, era o Sergio o coordenaddo seminário. A primeira impressbem...ele destruiu meu projeto eabominou pois era um trabalho trico que não era sociologia e mupretensioso. Sergio tem uma manemuito peculiar de fazer crítica, tgente que sai chorando. Você presa aprender a ser criticado no munintelectual. Hoje em dia ele mudmuito, mas tinha uma época que mais agressivo no modo de discu

Eu experimentei isso”.

Dentro do departamento de soclogia da USP não existiam mtos nomes que entendessem

sociologia da arte. Na verdade, hauma crítica muito firme contra Serpor obras desenvolvidas durante a faFFLCH, como Imagens Negociae Nacional Estrangeiro. Na primeMiceli usa o caso do pintor Portinpara demonstrar a negociação entrartista e o seu retratado. O segundoautor expunha as relações de meceto entre os artistas modernistas comelites culturais paulistas. Mesmo n

se primeiro encontro pouco amistoFernando Pinheiro o procurou porientá-lo na tese que envolvia LaSegall. Na realidade, ele só o champois sabia que Sergio já havia feito alises sobre pintura e conhecia musobre história da arte.

“Quando fui procurá-lo para orienminha tese de doutorado eu imagique, lembrando disso, ele recusasMas, para minha surpresa o profesSergio acolheu bem o trabalho, e dique gostava do modo como eu tralhava. Ele tinha uma concepção mumarcada do que é sociologia, muito

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pecífica e o que está fora disso não ointeressa. Mas tinha visto que mesmoeu estando fora dessa concepção, acei-tou bem. Se Miceli era intolerante eratambém aberto para ver as boas carac-terísticas do pesquisador. Enfim, a rela-ção funcionou e depois nos tornamosamigos. Trabalhamos juntos”.

No auditório do prédio de pesqui-sa e pós-graduação da Faculdadede Filosofia Ciências e Letras da

Universidade de São Paulo, Lilian Al-ves Sampaio apresentaria à banca deavaliação sua tese de doutorado: Vai- dade e ressentimento dos músicos po- 

 pulares e o universo musical do Rio de Janeiro no início do século XX .

No horário marcado para arguição,às 14 horas e 30 minutos do mês de

 Agosto, está presente na sala apenasseu marido, mãe e irmã. O orientadoravisou alguém por telefone que estavapreso em um engarrafamento, típico,para uma sexta-feira na cidade de SãoPaulo. Lilian demonstrava ansiedade eresolve verificar se a sala esta apropria-da. A plateia é pequena com apenas 30assentos. O auditório é simples, todobranco e sem ventiladores.

Por volta das 14 horas e 45 minutos, Ser-gio Miceli, o orientador de Lilian, chega.Um homem de estatura mediana e quasecalvo. Com barba para fazer e semblantede cansaço entra na sala, beija sua orien-tada e desliga o celular. Os demais julga-dores da banca que estavam no corredoracompanham Sergio até a mesa. Antesde apresentar, como de praxe, o tema dotrabalho e os participantes da banca, elepediu desculpas a todos pelo atraso. A vozera de uma rouquidão singular devido àtosse que o acompanhou durante toda

a defesa do doutorado. Rouca, porémsegura. Os professores começaram comsuas análises e arguições. Durante todo otempo, o orientador de Lilian demonstra-va atenção absoluta nos argumentos doscolegas de profissão e na sua orientanda.

 Às vezes, confirmava com a cabeça emum sinal positivo quando alguém oolhava.

Uma funcionária da instituição ser-viu café aos presentes da banca, Ser-gio recusou, ou melhor, não aceitounenhuma vez. Inclusive, não bebeua água que estava na mesa. Defesade tese de doutorado é longa. Afinal,além das 500 páginas aparentes de

texto são quatro anos de pesquisa etudo deve ser avaliado na banca. Oorientador não precisa arguir; ape-nas fornece um parecer genérico aofim do trabalho. Cada examinadortem 30 minutos para discursar e oaluno tem direito a réplica. Sergioacompanha tudo com atenção abso-luta. Apenas fricciona os dentes noslábios, algo que faz o tempo todo.Uma das professoras convidadas dei-xa o telefone tocar. Seu rosto perma-nece concentrado. Ela tenta pedirdesculpas e Sergio gentilmente fazsinal com a cabeça, mas o rosto não

demonstra aprovação.Por volta das 16h20 eles fazem um

pequeno intervalo. Enquanto a pla-teia - que já somava 11 pessoas – vaiao banheiro ou fumar, o orientadorfica com Lilian no corredor. Vaga-mente, pode-se ouvir da boca delealgo como “cabeça dura”. De voltaao exame, Sergio tenta controlar ohorário, coisa que não funciona mui-to bem, pois pelo menos dois profes-sores extrapolaram o tempo. Nessa

segunda fase, o homem de 66 anosvem à tona. A postura já não é maisa mesma. Encurvado, ele fechava osolhos e se apoiava com os cotovelos.Chega mesmo a abrir a boca.

 Às 18h15 ele final iza o tr abalho. Háuma tosse seca que o acompanha du-rante os minutos de agradecimento.Neste momento, ele recobre a pos-tura e impõe uma voz firme e segu-ra. Sendo breve e categórico, Sergioafirma não ter gostado do título daobra, que faltava diálogo na tese echama Lilian de topetuda.

“Não vou deixar você rebater, masse quiser fazer um comentário...”

 

L ilian se calou. Todos saíram dasala para que os jurados pudes-sem conversar. Foram 30 mi-

nutos de espera. A plateia foi todaembora, permanecendo uma amigae a família. Depois de quatro horasde avaliações, elogios e críticas, elaé chamada para ouvir a resposta dabanca examinadora.

 “Devido ao caráter inovador do

tema abordado, Lilian Alves Sam-paio foi aprovada”.

  A recém-doutora em sociologia sor-riu discretamente e agradeceu. O seuorientador de quatro anos (na verda-de, seis, pois fora o mesmo no mestra-do) apenas a beijou e desejou boa sor-te. No corredor Lilian comemora coma família. Sem alardes, Sergio acenouagradecendo a todos e foi embora.

A livre-docente em antropologia so-cial e professora de antropologiada UNICAMP (Universidade Es-

tadual de Campinas), Heloísa Pontes,vive com Sergio há 22 anos. Eles se co-nheceram durante a produção do pro-

jeto organizado por Miceli enquantopresidente do IDESP (Instituto de Es-tudos Econômicas, Sociais e Políticosde São Paulo), A História das CiênciasSociais . Eles não tiveram filhos, mas aconvivência pessoal e profissional sem-pre foi intensa. No dia-a-dia do casal,trabalho e vida familiar se misturam,interesses em comum. Isso não querdizer que os conduzem a pensaremda mesma forma. Ela antropóloga, elesociólogo. Diversidade de métodos notrabalho, divergências no cotidiano.Sobre a fama de bravo, Heloísa acredi-ta que seja mais fama mesmo.

“Uma vez me lembro que os alunosdo primeiro ano de Ciências Sociaisestavam com medo da prova do Ser-gio e inventaram um boato que ia teruma bomba na faculdade para que aprova não acontecesse. Sergio reuniuos alunos do lado de fora, os fez sen-tarem na grama e aplicou a prova alimesmo (risos). Ele é muito polêmicoe intenso, às vezes as pessoas achamque ele vai detonar com o trabalho,mas isso faz parte do encanto, pois tra-

balho intelectual não se faz de formatão apaziguada assim”.Todo professor de universidade pú-

blica brasileira, de cinco em cincoanos, pode tirar uma licença de trêsmeses e se afastar da docência. Nessesemestre, por conta disso, Sergio nãoestá lecionando. É um leitor viciadoem ensaios não-ficcionais, ópera e ci-nema. Segundo Heloísa, Sergio “gos-ta das boas coisas vida”. No espaçosoapartamento do casal, a divisão dotrabalho parece um tanto invertida.Heloísa faz a arrumação e o maridocozinha. Inclusive, segundo a esposa,ele tem se mostrado um ótimo cozi-nheiro. Aprendeu a cozinhar e apre-ciar vinhos com o amigo e crítico pes-soal Davi Arrigucci.

 A quatro anos de se aposentar (apartir do setenta anos, os professoresde universidade pública são afastadoscompulsoriamente) não acredita quemudou tanto assim.

“Minha acidez e crítica nada muda-ram. Cada um tem seu jeito, não sei seé um charme como dizem. Cada casoexige uma postura diferente não dápara me rotular. Você tem um orien-tando que já falou uma vez, falou duase três vezes e a coisa não saí do lugar

tem uma hora que perde a paciência.Mas depois, com a idade você vai sedando conta de que não adianta isso,que as pessoas só conseguem fazeraquilo que elas podem fazer. Eu pos-so ter uma grande esperança no carae não dar em nada e não adianta pres-sioná-lo. E tem ao contrário, eu já tiveorientando de origem muito modesta,de formação simples, que cresceu nacarreira e fez teses interessantes”.

Mesmo aposentado diz que não con-seguirá ficar quieto. Recentemente fezum livro sobre os intelectuais argenti-nos chamado Ensaios Portenhos  (a serpublicado pela Companhia das Le-

tras). Sobre o futuro ele prefere guardarsilêncio. Thyago Nogueira trabalha naCompanhia das Letras há dez anos ehá pelo menos cinco se tornou editorde Sergio. Pela Companhia das Letraso sociólogo já publicou estudos pesso-ais seus ( A elite eclesiástica brasileira,Imagens negociadas, Intelectuais à bra- sileira, Nacional Estrangeiro e A Noiteda Madrinha) e como organizador ( Acaixa de pandora, O modelo italiano, A

 pintura da vida moderna, O projeto deRembrandt ). Assim como a traduçãofeita por ele de Esboço de auto-análisede Pierre Bourdieu.

“Nos falamos todos os meses. Temuma relação bastante profissional. Sergio é um autor bastante meticuso, com grande experiência em ediçe, portanto, contribui imensamecom o meu trabalho. Dentro da etora, Ciências Sociais tem representividade no catálogo. Há algumas dculdades com essas obras devido a upúblico cada vez menor e espaços divulgação restritos”.

Durante sua trajetória intelectuMiceli produziu e publicou livros até setembro de 2011. D

destes pela editora Companhia dLetras. Quando questionado sobredificuldades de publicar livros no Bsil e depender disso, ele interrompentrevista imediatamente.

“Eu nunca vivi de vender livquem consegue fazer isso no BrasSó o Paulo Coelho (risos). Cientisocial no Brasil não pode depender vender livros. Eu dependo da mincarreira acadêmica dentro da Upara pagar minhas contas. Eu ganum dinheirinho com os livros e de tem três meses dá uma pingadinMas, do lado do reconhecimentomuito bom ter livros, é uma satisfaçpessoal. A repercussão de uma obdepende da qualidade da editora, disão, no caso a Companhia das Letme dá. Mas depender dos meus livseria impossível”.

 A Noite da Madrinha, como o pprio autor declara, foi uma tese amgua e de uma receptividade de fornuances e contrastes. Em fevereiro 1978, Sergio, ao entrar na banca avaliação da sua tese de doutoradodurante as mais de quatro horas q

permaneceria ali, sob um auditólotado, certamente não deve ter pcebido que abriria um novo nicho discussão dentro da sociologia da ctura que mudaria a forma de se penna vida intelectual brasileira. Os Inlectuais e a Classe Dirigente no Brainaugurava um método inovador avaliar as obras dos intelectuais braleiros sob uma interface das trajetórmateriais e origens sociais dentro dproduções desses autores. Acrescetambém um nome como Pierre Bodieu para entender a arguição. Dtro de uma universidade como a Uonde Marx, Gramsci e Althussier era

autores privilegiados, falar de domnação simbólica para sociólogos actumados a lidar com a luta de clasentre detentores e não detentores dmeios de produção materiais não causara estranhamento como perpledade. Uma pitada final: o maior crítliterário, defensor do ensaísmo comuma importante forma de entendeBrasil, estava sentado à frente do dtorando. Para usar um termo difundna antropologia, Sergio Miceli era ugrande profano.

“Eu acho que (digo acho porqtalvez alguém de fora possa opin

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melhor), primeiro, a tese tinha umaousadia porque ela estava tratandodos intelectuais enquanto tais e não asideais dos intelectuais, isso foi um cho-que. Ninguém até então tinha tratadodos intelectuais, somente suas produ-ções, ideais e categorias. Depois teveoutra parte da reação, é que na cadei-ra da sociologia, por causa da tradiçãodo Florestan, e do mapa da lousa queera essa reconstituição da sociedadeurbana-industrial em São Paulo, cultu-

ra não ocupava destaque. E de repenteaparece uma tese que tinha investidoloucamente na reconstituição da histó-ria da vida intelectual brasileira. Eu es-tava também dando circulação a auto-res que ninguém conhecia. Ninguémtinha lido Raymond Willians, Ringer,Bourdieu. Era tudo uma novidade”.

Luiz Pereira Bresser abriu a argui-ção. Bresser criticou duramente a tesepor tratar de esferas da vida intelectualque não interessavam à sociologia. In-sistentemente ele dizia que a questãosobre os gêneros das carreiras defini-das como masculinas, principalmen-te a literatura classificada por Sergiocomo sendo feminina, era no mínimoabsurda. Maria do Carmo Campellode Souza estava espantada. Carmuti,como era apelidada, estava descrentecomo alguém poderia falar de socio-logia da cultura sem usar o sociólogohungáro Karl Mannheim. Quandoestava com a palavra, Sergio já tinhaa resposta na ponta da língua: “achoele um chato, detestável e não querosaber desse cara”. Gabriel Cohn fez amesma linha de Maria do Carmo, umamiscelânea teórica. A arguição maissurpreendente foi de Antonio Candido(posteriormente o prefácio principal-

mente). Sergio havia sido aluno do in-telectual em duas disciplinas: Estéticacontemporânea e Tragédias históricasde Shakespeare . Miceli tinha verdadei-ro fascínio por Candido. A presença dointelectual na sua banca era um pres-tígio e um agente legitimador da tese.

 Afinal, ele conhecia de perto aquelesletrados tratados por Sergio. Para oautor de Parceiros do Rio Bonito, jus-tamente a reconstituição da vida ma-terial e intelectual desses autores erao pioneirismo do trabalho. Inclusive,professor Antonio Candido foi contraos colegas da banca de examinação,pois eles queriam matar o que a tese

tinha de mais brilhante: a trajetória eorigem social de alguns intelectuaisque participaram ativamente dentro daconstrução política cultural do EstadoNovo Getulista.

José Carlos Durand estava na plateiano dia da arguição de Os Intelectuaise a Classe Dirigente no Brasil . A lem-brança das palavras de Candido perma-necem vivas.

“Eu assisti à defesa de tese dele.Lembro que Antonio Candido falouque pela primeira vez alguém conse-guiria entender que em um país novocomo o nosso a literatura tinha um sa-

bor decadente. Vamos para a próximapergunta. Foi um trabalho muito bom.O primeiro contato que tive com análi-se comparativa de biografias”.

Terminada a tumultuada arguição, orecém-doutor não pensara duas ve-zes: queria que Candido prefaciasse

seu livro. Mais de trinta anos depois, oorientador da tese de Miceli, LeôncioMartins Rodrigues, se recorda bem darepercussão de Os Intelectuais e a Classe

Dirigente no Brasil . Mesmo, como eledeclarou não conhecer nada de Bour-dieu, saiu em defesa do seu orientando.Inclusive, Gabriel Cohn o acusou de serelogioso durante a arguição.

“Acho que o Sergio não fez bem con-vidando-o para prefaciar seu livro. Mas,na época eu saí em defesa do Sergio.Para mim, o Candido tinha uma visãomuito mistificada da função intelectu-al. Ele tinha impressão que os intelec-tuais eram pessoas acima do bem e domal. O trabalho do Sergio, no entanto,sempre tentou a desmistificação do sis-tema de poder que tenta se esconder.

 Antonio não podia aceitar que intelec-tuais brilhantes tivessem desejos vulga-res. O Sergio foi muito atento a tudo.Porém, Candido era um quatrocentão,socialista e democrático. Eu defendi otrabalho. Um objeto que não focava oconteúdo da obra dos autores, mas astrajetórias dos autores e os interessesdesses intelectuais com o sistema depoder. A metodologia por usar biogra-fia era algo inovador na sociologia”.

O prefácio poderia ter ganho um ca-pítulo dentro de Intelectuais e a ClasseDirigente . Além de defender o tema ino-vador sua participação foi cômica. Anto-nio Candido começou a imitar os autores

tratados por Sergio. O auditório caiu nagargalhada e no riso. Sergio não achougraça nenhuma quando leu o prefácio.

“Quando fui receber o prefácio nacasa dele, peguei, agradeci o reconhe-cimento e fui me despedir. Ele disse‘não, você vai sentar e ler porque senão gostar do que escrevi pode não pu-blicar’. Eu disse, ‘mas porque’, já estra-nhando. Quando li, logo fui entendoporque ele tinha insistido tanto”.

PREFÁCIO  Antonio Candido

[…] Eu o li agora pela segundavez numa versão bastante retocadae tive a mesma impressão favorável,a mesma ideia de que está abrindocaminho novo na interpretação dopapel do intelectuais na sociedadebrasileira contemporânea.

[…] estamos diante de um inves-tigador honesto que procura levara verdade, o mais longe possível,num terreno escorregadio e cheiode armadilhas […] Digo isto, por-que neste caso o autor acaba sendo

também objeto do próprio estudo[…] Daí seu inquérito ter tenso, equem sabe algo punitivo em rela-ção à sua categoria.

[…] Nesta batalha das interpreta-ções ele nem sempre escapa ao riscode condenar em vez de compreen-der […] É que no fundo a atitude deMicelli (sic) é polêmica, e talvez, ele“julgue” mais do que preciso.

[…] Mas o fato é que no processoestão envolvidos os homens, comsua carne e alma, de modo quese conviria acentuar mais que umCarlos Drummond de Andrade“serviu” ao Estado Novo como umfuncionário que já era antes dele,mas não alienou por isso e menorparcela da sua dignidade ou autono-mia mental […] dou este exemplonão apenas para dizer que Micelli(sic) às vezes dá realce excessivo àgeneralização simplificadora.

[…] E ao descrever esse processo

esclarece alguns aspectos funda-mentais, como a correlação entredecadência social e recrutamentodos quadros de servidores de poder.Mas, com isso, chega a algo maisinteressante: a correlação entre areferida decadência e a produçãocultural, inclusive literária.

[…] Micelli (sic) propõe um tiponovo de explicação, como novossão também diversos outros pon-tos de vista, em vários momentosdeste livro lúcido, corajoso e meio

angustiado. 

Quando Sergio terminou a leitura,Cândido perguntou o que ele ha-via achado do prefácio. Sem hesi-

tar respondeu “gostei muito”. -Mas, e essas críticas e ressalvas que fiz?-Sabe professor, isso diz mais a res-

peito do senhor do que sobre mim.-Mas, Sergio, você acha isso?-Eu tenho certeza. Professor, daqui

a vinte ou trinta anos, terei sempre oreconhecimento por ter escrito meuprefácio, mas o senhor fala muito maissobre o senhor do que de mim e issoestá claro no texto.

“Eu publiquei assim mesmo e eleficou impressionado. Foi uma boa tercolocado aquele prefácio. Acima des-sas críticas, Candido reconheceu noprefácio que eu tinha um afastamentohistórico e pessoal daqueles autoresque ele não tinha. Foi algo difícil para oprofessor escrever esse prefácio. O livrotratava de figuras que conhecia muitointimamente como Carlos Drummondde Andrade”, relembra Sergio.

 A socióloga Maria Arminda do Nas-cimento Arruda, ao contrário de Le-

ôncio, acredita que Sergio fez mubem em ter pedido e publicado o tede Candido. Se ele estava sendo acudo de iconoclástico e a tese tinha urecepção ambígua, o prefácio deveeternizar essa esfera contraditória.

“Eu leio essas armadilhas apontapelo prefaciador assim: ao falar dintelectuais seria possível falar deO próprio Sergio cairia na armadilde Candido. Essa crítica serviu paradois. Para o professor porque, ele m

tra o lado intelectual no qual está eSergio para mostrar que o livro era bom que merecia uma crítica no precio feita por Antonio Candido”.

Os Intelectuais e a Classe Dirigepercorreu um longo caminho a publicação. Entre 1973 e 19

pelo suporte dado pela instituição qlecionava, pôde produzir uma pesquextensa sobre os intelectuais brasileirNa França, com o auxílio de PieBourdieu, foi apresentado a RingeWillians e recebeu importante oritação dos rumos do seu trabalho, prcipalmente pela possibilidade de uparte do material para aplicação suas hipóteses e a publicação do estusobre os anatolianos. Durante o ano1975, de volta ao Brasil, até 1977, regiu a dissertação da tese. No início 1978 a defendeu em português e viapara França na semana seguinte. Edezembro daquele ano, apresentaratese em francês sob alguns ajustes.governo brasileiro passou a ameaçem 1978, que não reconheceria ou vdaria diplomas vindos de universidaestrangeiras. Portanto, Sergio Miceli rantiu o título brasileiro e só no final1978 a apresentou na capital parisien

Sergio acredita que seja o trabalmais importante, ou pelo menos o qtenha tido maior repercussão. Os Inlectuais e a Classe Dirigente no Bramarcou seu estilo de trabalho e umétodo novo. Após essa inauguraçseu esquema interpretativo de olharobras dos intelectuais brasileiros jutamente com suas trajetórias e origesociais foram aparecendo em outtrabalhos. No Brasil há uma tradiçmuito forte de análises que buscareinterpretar os intelectuais brasileicomo tais. Esse estudo realizado pSergio foi pioneiro por recuperar tratórias como as de Drummond, Gra

liano Ramos, José Lins do Rêgo, Ér Veríssimo entre outros e as correlarem entre produção autoral e conções sociais desses autores no mometo em que foram realizadas. Até 19isso não havia sido feito na sociolobrasileira. Ao revelar as condições mteriais e sociais envolvidas nas obdos intelectuais, Sergio, ao mesmtempo, desmitificava a atividade inlectual, denunciando a falta de isençe que, muitas vezes, era a única opçde reconversão social através da litetura desses escritores. Essa incipiênno mercado cultural levava a uma m

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bilização de capitais sociais (definidopor Bourdieu como o conjunto de re-lações sociais que o indivíduo dispõe eque favorece a sociabilização e a ma-nutenção dos relacionamentos) e cul-turais (qualificações produzidas dentrode um sistema escolar formal) para aaproximação com as classes dirigentespor parte desses intelectuais.

De acordo com o professor do Ins-tituto Universitário de Pesquisas doEstado do Rio de Janeiro e sociólogo

Ricardo Benzaquén, Intelectuais e aClasse Dirigente no Brasil  é um estudocomprometido e referencial para quemtrabalha com sociologia da cultura e davida intelectual brasileira.

“O trabalho do Sergio traz o Bour-dieu para uma outra área, desenvol-vendo um argumento que o auxiliavana pesquisa dos intelectuais durante oEstado Novo. O trabalho de doutora-do foi inovador por trazer o Bourdieusob nova perspectiva já lidando com osintelectuais, dialogando criticamentecom boa parte das instituições da épo-ca. Chama a atenção para trajetória dosintelectuais e opções de interesses polí-ticos e prestígio. Quer se concordo oudiscorde, raramente alguém concordatotalmente ou discorda totalmente, éum livro de enorme importância paraamplificação do Bourdieu entre nós”.

De acordo com Maria Armindaa tese de doutorado de Sergio é ummarco nas Ciências Sociais brasileiras.Não somente pela apresentação de umnovo jeito de ver a intelectualidadebrasileira, mas pela coragem de Miceliem usar a referência de Pierre Bour-dieu em um meio pouco receptivo aoautor francês dentro da Universidadede São Paulo.

“Ele é um marco, pois inauguraesse novo meio de interpretação. Mi-celi foi o principal divulgador dele noBrasil. O Bourdieu traz uma nova lei-tura menos dogmática, menos marxis-ta e mais simbólica. Isso até então do-minava no Brasil, o que empobreciaMarx e não dava opção para gente. Osfrankfurtianos fizeram também umaanálise central da cultura, um lugarprivilegiado para se entender a socie-dade e uma visão menos dogmática.É preciso registrar isso. Mas, Bourdieuconseguiu consolidar o que a EscolaCrítica havia começado. Porém, na-quele momento o Bourdieu era mais

complexo para ser admitido dentro daUniversidade de São Paulo, reinavamas ideais marxistas. Eu, por exemplo,o conhecia vagamente”.

Se dentro das Ciências Sociais atéaquele momento as ideais inaugura-das por Sergio Miceli eram vistas comressalvas e críticas pesadas, a literaturarecebeu um tapa na cara. A desmisti-ficação do trabalho intelectual e a in-terferência de fatores externos na pro-dução das obras (como origem social,apadrinhamento, trajetórias profissio-nais) incomodaram os letrados. Maisuma vez o autor era acusado por profa-

nar a autonomia das obras intelectuaisdaqueles autores, e mais: praticar umaespécie de sociologia reducionista.

Davi Arrigucci é amigo do autor deOs Intelectuais e a Classe Dirigen- te no Brasil . Heloísa, inclusive,

afirma que Sergio aprendera a cozinhare apreciar vinhos na presença de Arri-gucci. Certamente, Davi tentou ensinaroutros pratos, que Miceli não digeriubem. Importante crítico literário, Arri-

gucci foi aluno de Antonio Candido. Oestudo dos anatolianos, a tese de dou-torado, assim como o nome Bourdieununca foi bem visto entre os seus.

“Eu endosso essas críticas feitas porCandido e ele tem toda razão. Porexemplo, no caso específico do CarlosDrummond de Andrade e a ocupaçãodele dentro do Estado Novo, nós tive-mos uma longa divergência nisso e, in-clusive, eu desafiei o Sergio a mostrarno interior dos poemas do Drummondonde é que est ava qualquer desvio quederivasse no trabalho que ele exerceudurante esse período. Não é que a basematerial do trabalho artístico não tenhaimportância, mas não podemos reduziro que é arte e literatura nas circunstân-cias da sua produção. Ele fica presoa elementos exteriores da obra comoanálise de trajetória e origem social da-queles autores e artistas. Não se podereduzir uma obra em elementos exte-riores, isso para mim se chama redu-cionismo sociológico. Há várias distor-ções nessa visão, principalmente comrelações aos poetas. O ponto é mostrar,dentro das obras desses autores, essescondicionantes que influenciaram naprodução. Sergio não faz isso”.

 A antropóloga Silvana Rubino está

acostumada a ouvir que Sergio cami-nha para sociologia reducionista. In-clusive, enquanto estava no mestradoalguém comentou sobre Intelectuais ea Classe Dirigente no Brasil  de formanegativa e pediu que ela não lesse o li-vro. Ela acatou o conselho e não leu.

 Anos depois, quando foi trabalhar comSergio dentro do extinto IDESP, pas-sou a notar como Miceli lidava comas trajetórias intelectuais. A professorade antropologia social da UNICAMPacredita que Sergio, diferente do quefoi taxado, não é apenas um reprodutorde Pierre Bourdieu.

  “O que eu aprendi lendo e traba-

lhando ao lado do Sergio foi usar di-versos autores, estabelecendo umaconversa com eles, mas sem concordarcom tudo o que dizem. Você deve pe-gar o autor para conversar com ele enão para assumir o discurso para si. OSergio emprega sempre uma análisedos condicionantes dos objetos analisa-dos, e eu já ouvi muitas pessoas dizen-do que é um tipo de sociologia reducio-nista. Isso tudo dissocializa um pouco opersonagem na qual estamos tratando.O Sergio ensina as pessoas a não seremsubservientes diante do autor. Ele temuma coisa muito interessante que não

é ter medo de ser sociólogo. Miceli nãopede desculpas para ser sociólogo”.

 Mesmo nutrindo toda espécie de fas-cínio pelas teorias de Pierre Bourdieu,o doutorando brasileiro não aplicavatudo em sua tese. Um dos conceitosmais difundidos até hoje pelo filósofofrancês foi a ideia de campo. Simplifi-cando, campo representava para Bour-dieu uma solução para os problemasde estratificação e divisão social dotrabalho. Um campo  era representa-

do por uma posição dentro do espaçosocial, que reunia alguns agentes queestavam no mesmo campo por um de-terminado tipo de capital (social, cul-tural, simbólico e patrimonial). Cadacampo era autônomo, mas, não total-mente fechado. Sergio nunca aplicouesse termo “porque a ideia de campo nem existia no caso brasileiro. Eu faleiisso ao Bourdieu na época. Ele achavaque era uma coisa que respeitava meumaterial. Eu conversava com as ideiasdele. É diferente de aceitar tudo”, in-siste Sergio. O atual professor do de-partamento de sociologia da USP eex-orientando de Sergio, Fernando Pi-nheiro acredita que, de fato, Bourdieuestá muito presente na obra do orien-tador. Mas, fora dos rótulos aparentes,ele possui uma leitura pessoal e inven-tiva do mestre francês.

  “Ele usa poucas vezes a ideia decampo, que é um negócio que virou re-ceita de bolo no Brasil. O Sergio esca-pa completamente disso. Ele aprendeucom o Bourdieu, mas isso o leva a pen-sar por contra própria ou até diferentedele. É uma leitura pessoal”.

A professora aposentada de socio-logia da USP, Irene Cardoso, faz

coro à ideia de Fernando Pinhei-ro. Diferentemente do que se podepensar, Bourdieu entrou no Brasilpela Fundação Getúlio Vargas e nãopela Universidade de São Paulo. Ire-ne acredita que a raiz do preconceitocontra as ideais de Bourdieu não eramcontra o Sergio, mas por pessoas comoMonique de Saint Martin (assistenteda Escola de Altos Estudos em Ciên-cias Sociais que viera ao país) e outrosautores que empregavam as teorias dePierre ou as tentavam explicar.

“Ele é um marco da introdução doBourdieu e criou um estilo de pesquisae reflexão que tem muitos seguidores.

Todo estilo da pesquisa, da trajetória,dos condicionantes, tudo vinculavaa Bourdieu, sendo este um autor nãomuito aceito por nós dentro da sociolo-gia da USP. Pensando depois, a falta deapreço no nome de Bourdieu não eraculpa de Sergio. Bourdieu veio muitoatravés da Monique de Saint Martin eoutros autores que foram criando ummodo de fazer os trabalhos, uma leitu-ra única. O que Sergio não fez, ele bus-cou traduzir obras como Economia dasTrocas Simbólicas  e não ser apenas umpropagador direto do Bourdieu. Ficouuma coisa meio esquemática. Campo,

habitus e estilo virou uma fórmula. íam teses com esses jargões e eu impcava com isso”.

Sergio está acostumado com as cticas. Inclusive quando ouviu algumdurante a entrevista riu alto. Comopróprio Davi Arrigucci disse, algumvezes, ele foi desafiado a provar, dtro das poesias de Carlos Drummode Andrade, referências sobre a cotação política do Estado Novo dendas suas produções.

“Eu acho até graça nisso. É simpde provar, e não tenho problema algupara mostrar isso. O Davi escrevum livro sobre o Drummond quanestava nos Estados Unidos, de títuCoração Partido. Ele mandou o tepara eu ler e disse que estava intersante, mas que a participação polítdo Drummond no Estado Novo quvisível em muitos poemas que ele alisava, é como se não existisse. Alerque ele teria problemas com a crítporque hoje em dia ninguém acha imais. Davi não reagiu bem. Quandlivro saiu foi rechaçado pois o autor fgia não existir o resto da bibliografique não falava da participação polítdo Drummond”.

Laura de Mello e Souza é filha crítico literário Antonio Candido e gundo ela “companheira de lutas” Sergio. Diferentemente do profesCandido, acredita que a obra de Mceli tem como contribuição chamatenção para a sociologia, pois foi ualerta para uma interpretação que nomitisse as posições de agentes histócos que são os intelectuais.

“A obra de Sérgio é decisiva. Ele jconsiderado um dos maiores socióloque a universidade brasileira produz

Introduziu uma perspectiva arejadainterdisciplinar, valorizando a sociogia da cultura em um viés muito psoal, muito aberto sobre as análises obras literárias e artísticas, articulancultura, política e sociedade. De ucerta maneira, vejo a sociologia prcada por Sérgio como bastante próxida história da cultura”.

A discussão em torno da tese, tapara os que o criticaram, copara os que fruíram, permitiu q

o nome Sergio Miceli e suas pesquiocupassem destaque na agenda de esdos sobre literatura, arte e cultura. D

rante toda década de 80 e 90, seu nomentraria no hall   dos sociólogos mimportantes do Brasil. Ana Paula Cavcanti que trabalha dentro do IEB (Itituto de Estudos Brasileiros) da Uavalia que o destaque creditado a Serdentro da sociologia contemporâneadeve ao esforço dele após o doutorad

“Sem exagero é possível dizer quSergio cunhou uma verdadeira agende pesquisa para a sociologia da ano Brasil. Talvez ela existisse, mas coele se tornou algo forte. Vale notar qnem sempre foi assim, nos anos 80tema da cultura não tinha o prestíg

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que tem hoje, ao menos na USP. Hojeas pesquisas sobre cultura e arte na uni-versidade tem um lugar central, e issoem grande parte se deve à atuação doSergio como pesquisador, professor eorientador”.

 A Doutora em sociologia pelo Insti-tuto Universitário de Pesquisas do Riode Janeiro e professora da PUC-Rio,Maria Alice Rezende não conheceuSergio enquanto ele vivia no Rio deJaneiro. Mas, poderia tê-lo conhecido.

Estudaram na mesma instituição e fre-quentaram as mesmas rodas de amigos.Tempos difíceis aqueles. A tensão entrecristãos e comunistas gerava desconfor-to para os alunos da Pontifícia Univer-sidade Católica carioca. Um momentode desacerto político e repreensão ide-ológica pelo governo autoritário. ParaMaria Alice o nome do sociólogo Ser-gio Miceli é uma espécie de referênciasem fronteiras.

“É claro que Sergio Miceli ultrapas-sou limites regionais e recortes institu-cionais. Ele é conhecido, lido e citadoem todo o Brasil e na PUC também.Pode-se dizer que, além de uma obrasólida, consagrada, representada por vá-rios e excelentes trabalhos, outro aspec-to que chama a atenção quando se tratade Sergio Miceli é o fato de ter formadomuitos mestres e doutores que hoje seencontram em diferentes universidadesdo país. Ele, portanto, é muito conheci-do na sociologia brasileira”.

O professor Sergio só foi para uni-versidade pública em 1984, paraa Universidade Estadual de Cam-

pinas (UNICAMP). A partir deste ano,ele diminuiria o ritmo de trabalho den-tro da Fundação Getúlio Vargas (na

qual se desligaria totalmente em 1988,dezoito anos de vínculo e quinze anosininterruptos). Dentro da UNICAMPele defendeu sua tese de livre-docência

 A Elite Eclesiástica no Brasil , que forauma continuação dos estudos sobre operíodo entre 1890 a 1930, mas, destavez, a delimitação ficava acerca dascarreiras eclesiásticas e da cooptaçãoda Igreja Católica de setores empo-brecidos das antigas oligarquias. Em1986, ainda, Sergio sofreria um infar-to. Trabalhava, comia, bebia e fumavademais. Aos quarenta e um anos, o co-ração não aguentou. Ele foi obrigadoa diminuir sua agenda lotada. Foi um

ano muito triste na vida de Sergio. Seutio Armando falecerá, sua avó e suamãe se suicidara.

“Havia uma ligação entre os três. Nodia do enterro do meu tio elas estavamdestruídas. É como se tivesse rompidoum elo e a vida delas também acabado.Minha avó quis morrer, ela tinha umaótima saúde. Eles tinham um grude etudo faziam juntos. Acho tudo aquiloesquisito até hoje”.

 Até aquele momento, o currículode Sergio tinha uma especificidade in-comum para seus colegas de geração.Mesmo com uma formação qualificá-

vel dentro da USP, ele nunca lecionaranaquela instituição. Ter permanecidoapenas dentro de uma instituição pri-vada poderia ser justificado por ques-tões financeiras, ou não. Essa primeirahipótese seria facilmente respondidapelo também professor da FGV JoséDurand: uma fundação rica e que per-mitia um debate livre das amarras polí-ticas e policiais que aconteciam dentroda Universidade de São Paulo.

 “Carreira de sociólogo só existia em

função de universidades. E as alter-nativas eram poucas. A FGV ofereciavantagens financeiras, pagava mais quea pública, as pessoas tinham liberdadede colocar seus temas de estudo semninguém ser barrado”.

Mas Sergio nunca fora um alunocomum. Havia realizado seumestrado e doutorado pratica-

mente sem orientação, tinha buscadona França a orientação de Pierre Bour-dieu e inauguraria novos caminhos dediscussão dentro da sociologia da cultu-ra. Apenas em 1989 Miceli foi para USP(um dos últimos que entraram por in-dicação ao invés de concurso público).Se a FGV dera condições excepcionaisde pesquisa para Sergio, presumimos...

 “Que se resume a dinheiro? Não. A

história parece mentira, mas não foiisso. Ao final do mestrado, o Leônciome procurou dizendo que o depar-tamento queria que eu lecionasse naUSP. Imediatamente. Eu não respondina hora, pois aleguei que precisava con-versar com o Octávio Ianni (tinha medode fazer alguma coisa errada). Pedi umtempo. Mas, no fundo era claro que eutinha interesse. Só que o Octávio não

reagiu bem, dizendo que não precisavame precipitar, que eu era muito jovem.Fiquei decepcionado e fui falar com oLeôncio alegando que o Octávio iria ar-rumar algo para ir tocando no interior,em Marília e devia entrar lá em outromomento. O Leôncio me passou umsabão, me chamou de cretino, não acre-ditando que alguém podia não aceitarum cargo na USP, sendo público e semconcurso. Não foi uma opção, foi umasaída mesmo. Talvez, se eu não tivesseficado na FGV, e sim na USP, não teriafeito essa tese”.

Em 1989, houve um novo convi-te. Desta vez, Miceli aceitou e não

consultou ninguém. No entanto, seunome não era bem visto por todos den-tro da Faculdade de Filosofia Ciênciase Letras. Maria Arminda do Nasci-mento Arruda entrara um ano antes dadata. Trabalhava com Sergio dentro doIDESP no projeto A História das Ciên- cias Sociais no Brasil . Ela chegou di-zendo ao amigo que havia uma divisãodentro do departamento de sociologiaentre seu nome e o de Renato Ortiz.Na verdade, a coisa ia além de uma di-visão, era briga mesmo e “eu que nãoqueria entrar nessa disputa horrorosa,pois estava empregado e não precisava

disso”, desabafa Sergio. Para que a deci-são fosse tomada de uma forma menosbarulhenta, foi proposto um semináriopara que Sergio Miceli e Renato Ortizpudessem participar e o departamentoapontar o nome. Antes do seminário,Leôncio, quase 20 anos depois, apare-ce com outro convite para Sergio. Odepartamento seria Ciência Política.“Eu disse não e agradeci. Mas meunegócio era sociologia”. Maria TeresaSadek fez coro a Leôncio dizendo que

nas Ciências Políticas ele poderia con-tar com os amigos, já que na Sociologiaalgumas pessoas não queriam a entradadele. “Como eu já era livre-docente seentrasse logo me tornaria titular e seispessoas não queriam que eu entrasseporque racharia a fila. Mas, soube quetinham duas posições de titulares queiriam desocupar nos próximos anos.Eu aceitei na hora (risos)”. Nem preci-sou do seminário.

Nesse momento, sua estadia dentrodo IDESP permitiu desenvolver umapesquisa sem precedentes na históriadas Ciências Sociais. Sergio Miceli aolado dos Cientistas políticos Bolívar La-mounier e Maria Teresa Sadek criaram,em 1979, o Instituto de Estudos Econô-micas, Sociais e Políticos de São Paulo,o IDESP. A finalidade da instituição eraconseguir investimento das agências defomento para pesquisa dentro das Ciên-cias Sociais. O primeiro projeto precisa-va de um financiamento a longo prazoda FINEP (Financiadora de Estudose Projetos). Para isso, era exigido algograndioso e que durasse alguns anos. Noentanto, Sergio foi à Europa na épocae Bolívar assumiu a direção. Dois me-ses depois, Miceli voltara e ocuparia oposto. O IDESP parou suas atividades

em 2001. O Cientista político BolívarLamounier não tem boas recordaçõesdesse tempo.

“Eu diria que é um pesadelo; naquelaépoca, certamente era. Organizaçõesdesse tipo só conseguem sobreviver efazer alguma coisa na medida em quealguns de seus integrantes se dediquemde corpo e alma a inventar, elaborar enegociar projetos. Levantar fundos, esseé o problema. E as relações internasficam inevitavelmente estressadas, por-que sempre há alguns dispostos a carre-garem o piano, outros que o fazem sepuderem subordinar tais tarefas a seusobjetivos pessoais, e outros que não que-

rem ouvir nem falar delas”.

O IDESP para existir necessitava deprojetos longos e caros. No entan-to, não foram os custos financeiros

que levaram ao fechamento. O IDESPfoi projetado por três cientistas sociaisque, em determinando tempo de suascarreiras, resolveram caminhar pararumos específicos. Sergio estava dentroda Universidade de São Paulo, MariaTeresa Sadek estava ligada à consulto-ria jurídica e Bolívar Lamounier emconsultorias. “Se os próprios mentoresnão estavam interessados, quem iria

sustentar?”, se pergunta Sergio. Ande encerrar o instituto, usaram a reseem caixa para custear as demissões dfuncionários. Em 2001, Sergio foi po Estados Unidos, na Standford cofellow  do centro de estudos avançade ficou lá até 2002 (ano que Bourdimorreu). Nesse período, por telefoe e-mail eles foram planejando o dmonte. Quando ele voltou, em 20estava tudo encerrado. Assim comBolívar, Miceli não demonstra sau

sismo pelo fim da instituição.“Se as universidades cada vez mestavam assumindo projetos temcos, para que sustentar algo comoIDESP? Todos esses centros de fomto que sobreviveram e sobrevivem hoje passam por enormes dificuldadNão é fácil”.

O IDESP foi um projeto que depedia dos seus fundadores. Nenhum les estavam mais interessados. SilvaRubino trabalhou ao lado de Serem 1988 e afirma que o encerramendo instituto não foi uma perda irrevsível às Ciências Sociais.

“Existiam iniciativas de pesquimuito inovadoras lá dentro, incluve sob a direção do Miceli. O IDEera um núcleo importante de pesqudentro de São Paulo e o Sergio era ulíder lá dentro. Eu acredito que abou por falta de verba. Mas, hoje edia as universidades começaram a grandes projetos de pesquisa, e de ceforma, o que fazíamos lá, fazemos hdentro da universidade”.

Em 1989, ainda dentro do IDESPsob financiamento da FINEP, Sgio organizou um projeto ma

para a disciplina. A História das Ciênc

Sociais no Brasil  (o primeiro volumelançado em 1989 e o segundo em 19resgatava a história institucional Ciências Sociais brasileiras, recontacoletivamente por uma equipe mudisciplinar. Ao total, dez pesquisadorsendo esses, quatro pesquisadores senres e seis juniores. Devido à experiêne por uma personalidade tipicamede líder, o projeto tinha a impressãoSergio. A história das Ciências Socibrasileiras deveria ser contada não anas por seus autores, mas pela articução entre obra, autores e as instituiçõ

 A antropóloga Heloísa Pontes lecionno mesmo período que Miceli dentro

UNICAMP. Ela na graduação, ele pós-graduação. Mas foi durante o proto que eles se conheceram e estão jundesde então. Heloísa foi uma das pesqsadoras do projeto temático. A dinâmexigida por Sergio era rígida.

“Cada um tinha que produzir um ago por semestre. Esses artigos eram distidos no grupo abertamente. Você imana ter essa oportunidade? Ter seu trabadiscutido por dez pessoas. Não podíamdefender o texto, apenas apresentá-lo. Ada você tinha que ouvir até o final o quepessoas estavam dizendo, ou seja, se vonão conseguisse registrar por escrito o q

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você queria dizer, teria que reescrever”.

O antropólogo carioca RicardoBenzaquén não participou doprojeto, mas acredita que a pes-

quisa coletiva realizada na época porprofessores experientes, hoje promis-sores, possui grande relevância paradisciplina.

“Mas veja, era um projeto coletivoque tinha diálogo com a história dasCiências Sociais, que é um tema em-blemático. Foi um projeto extrema-

mente importante, é uma referência.O Sergio desde o começo acompa-nhou as discussões. Claro, já existiamtrabalhos sobre as Ciências Sociais,mas eram isolados até então. Ele foiuma das pessoas que se destacaram namontagem do projeto”.

Na época, já uma pesquisadorasênior, Maria Arminda do Nasci-mento Arruda integrou a equipe

ao lado de Sergio. Mesmo acreditandoque os dois volumes não organizarama disciplina no Brasil, seu caráter ino-vador está pelo ineditismo de construiruma reflexão sistemática sobre as Ciên-cias Sociais. E o projeto se beneficiouda experiência do autor de Os Intelec- tuais e a Classe Dirigente no Brasil .

“Depois tentaram dizer que nossogrupo era institucionalista e não fo-mos capazes de entender, pois haviauma instituição por trás. Isso é umavisão distorcida. Nós tentamos traba-lhar com as conjunções que influen-ciavam as ideais. Era preciso mostrara condição social junto com a obra. Avida intelectual não é independentedas suas condições materiais. Por isso

o Sergio foi muito importante, pois elejá tinha projetado essa metodologia emOs Intelectuais e a Classe Dirigenteno Brasil . O Sergio é responsável peloaparecimento do meio interpretativoda cultura brasileira, na história inte-lectual entendida a partir desses condi-cionamentos”.

Sergio teve uma satisfação muitopessoal coordenando o projeto “umabaita experiência legal” como afirma.Mas, como não podia ser diferente, sua

iniciativa foi alvo de críticas, como asapontadas por Maria Arminda. Alémda acusação de fazer sociologia redu-cionista, agora também podia ser acres-cida de institucionalista. Novamente,ele parece pouco incomodado com osataques dos seus colegas.

“Eu faço história social e não his-tória institucional. Eu nunca depen-di de guias e roteiros institucionaispara conduzir minhas análises.  AHistória das Ciências Sociais , porexemplo, tinha um foco institucio-nal da construção que viabilizou oscursos de Ciências Sociais em Reci-fe, São Paulo, Rio de Janeiro e Mina sGerais. Minha carreira dependeu domeu trabalho. Claro, que uma USPe FGV não eram como uma univer-sidade em Osasco”.

“Ele tem pulso com equipe, eleconstrói instituições e ele gosta dissoe tem muito senso político. O Sergioé um homem político”. A frase pro-nunciada por Maria Arminda, amigade Sergio há mais de trinta anos pa-rece representar uma constante refe-rência da personalidade do sociólogo.De uma família italiana, que “vivia

junto o tempo todo” e de um tio querespirava letras e política, parece terherdado bem mais que o sobrenome.“Ele é um excelente coordenador degrupos, tem uma capacidade únicade pôr todas as rédeas numa trilhacomum, ao mesmo tempo respeitan-do as liberdades de pesquisa”, reitera

 Ana Paula Cavalcanti .Silvana Rubino produziu ao lado

de Sergio Um olhar sobre a cidadede São Paulo: o centro de São Pau- 

lo e Metrópole e arte . Sobre a per-sonalidade de Sergio, ela é enfática:o mesmo homem que é um críticosevero é também mais do que umchefe: é um líder de equipe que assu-me o papel da divergência. Ele nãoapenas manda, conduz. Se “o Sergiolesse seu texto e achasse uma drogaele falava com essas palavras ou atécoisas piores, mas ao mesmo tempomuito generoso”. Geralmente, osprojetos temáticos são burocráticos.Contam com uma equipe grande depesquisadores e o financiamento sósai se tiver um nome de peso por tr ás.Miceli não tem problemas para isso.De acordo com sua esposa, HeloísaPontes, que já trabalhou com ele, senão tiver uma liderança firme, comoé a do Sergio, a coisa não anda.

“Ele tem essa capacidade de co-ordenar equipes. Possui uma marcamuito forte do trabalho dele nas nos-sas formações e na condução dessestrabalhos. Tem a ver com uma ques-tão de condução, mas também hie-rarquia. Para se coordenar projetos épreciso ter uma superioridade moral eintelectual. Não havendo uma contes-

tação na condução da liderança, ehierarquia é benéfica, pois não telutas de controle e a energia fica calizada na produção intelectual. Sertem essa habilidade”.

Além da capacidade reconhecde coordenar equipes, Miceli rece ter um know-how  adquir

para orientar, politicar e colocar pessoas nos lugares dela. Irene Cdoso diz que sempre foi assim “Serg

tem uma personalidade forte e sempesteve em meio às disputas políticIsso é um traço dele e continua, mestá mais mudado. Sergio diz na lo que pensa. Ele não é de meias lavras e isso pode gerar mal-estar vezes”. Modesto, Sergio Miceli nsabe explicar da onde vem essa clinação para organizar trabalhos a mesma coisa que perguntar quvem primeiro, o ovo ou a galinhaexperiência facilita tudo. Eu aceitovezes, porque é preciso ter nome pa FAPESP aceitar certos projetos”.

Polêmicas à parte, o crítico literáDavi Arrigucci acredita que Sergioum homem muito estudioso e tralhador. As inquietações intelectude Miceli são uma marca que Dafirma ser importante para a consodação de um bom sociólogo. Contudele é “muito passional, adora ópee de fato, tem essa coisa de entrecom ânimo passional as coisas, as qgosta e as que não gosta. Isso cria uclima especial na convivência com eComo Sergio está sempre destinaa desmitificar as coisas, isso tem uefeito que certamente não é só nas

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lações intelectuais. O interesse dele éde puxar as coisas para mais perto dochão. Ele não é um homem de gabi-nete e até parece agressivo no primeirocontato, mas é na verdade solidário”.

Sergio Miceli é uma figura emble-mática para se entender a sociologiabrasileira. Além de uma personalidadeímpar e uma produção multidiscipli-nar, o intelectual possui preocupaçãona consolidação das Ciências Sociaiscomo uma disciplina autônoma e pre-

sente na pauta universitária. O sociólo-go José Durand não tem dúvidas “elefez uma carreira de construção institu-cional. Fundou um centro de pesquisa(IDESP), entrou para Universidadede São Paulo, foi editor da EDUSP eorganizou vários trabalhos coletivos.O trabalho do Sergio não se esgota naprodução de livros”.

Sua estadia na EDUSP, entre1994 a 1995, resume bem osobjetivos do sociólogo e do ho-

mem político. Plínio Martins estáà frente da editora da Universidadede São Paulo há quase vinte anose acompanhou Sergio durante suaestadia como presidente da editorauniversitária. A participação nos cin-co anos de presidência está refletidaaté hoje dentro da editora. Plínio écategórico: “Miceli foi o responsávelpela EDUSP perder medo em lançarlivros de arte. Ele aguentou muitascríticas, mas era um homem ousadoe determinado, e aos poucos, mudoua cara da EDUSP. Foi pelas mãos doMiceli que a Sociologia passou a ga-nhar destaque nas publicações aquidentro. Ele não é só um sociólogo,ele é um orientador e organizador

dentro e fora das Ciências Sociais”.Sergio Miceli Pessôa de Barrosnasceu em 1945 na cidade de Men-des, Rio de Janeiro. Doutorado emsociologia pela Universidade de SãoPaulo e pela École des Hautes Étu- des en Sciences Sociales  sob à orien-tação de Pierre Bourdieu. Lecionouna Fundação Getúlio Vargas, Uni-versidade Estadual de Campinas,Universidade Estadual Paulista JúlioMesquita Filho e na Universidade deSão Paulo. Foi professor convidadopela Standford University, Universi- ty of Chicago, University of Florida,École des Hautes em Sciences So- 

ciales  e da Universidade Nacional de Antropologia e Histó ria do México.Entre 1994-1999 foi Diretor-Presi-dente da editora da Universidade deSão Paulo, EDUSP. Fundou ao ladode Bolívar Lamounier e Maria Tere-sa Sadek o Instituto de Estudos Eco-nômicos Sociais e Políticos de SãoPaulo, o IDESP. Durante oito anosfoi Presidente do Comitê da CAPES.Na ANPOCS, foi secretário entre1984 a 1988.

Produziu durante quarenta anos decarreira mais de 30 artigos para revistas.Como autor e organizador participou

de 33 publicações. Orientou 33 tesesde doutorado e mestrado. Em uma tra-jetória densa, produtiva e inquieta suacontribuição supera o simples paradig-ma de ser introdutor de Pierre Bour-dieu no Brasil:

 “Até agora ele é uma referência

importante, é um dos maiores soci-ólogos brasileiros da geração de 70em diante. Há grandes sociólogosque não se afinam com o método do

Miceli. Mas ele é um marco para asociologia da cultura, quem quisertrabalhar com essa área tem queconhecer as coisas dele, aproveitarà sua maneira ou evitá-las, mas co-nhecê-las. Não há muito sociólogosque possuem esse estatuto”.

Fernando Pinheiro, ex-orientando doprofessor Sergio Miceli e atualmenteprofessor de sociologia da USP

“Economizando todos os adjeti-vos e sendo bastante sintética, creioque o esforço de Sergio Miceli sem-pre foi o de estabelecer um pontode vista estritamente sociológicopara pensar a vida intelectual brasi-leira. O ‘estritamente sociológico’ éo que melhor traduz – eu penso – oseu programa de atuação docente ecomo pesquisador”.

 Maria Alice Rezende, doutora em socio-logia e professora da PUC-Rio

“Mas, é difícil avaliar Miceli total-mente, pois nutro sentimento de ami-zade. O maior patrimônio dele é anossa amizade. Mas sociologicamen-te, ele vai deixar um caráter inovador

dessa análise no campo da cultura elerecuperou a importância da sociolo-gia da cultura brasileira. O uso dasbiografias foi algo importante”.

 Maria Arminda do Nascimento Arruda,pró-Reitora da USP, trabalhou ao ladode Sergio

 “Para quem trabalha na sociolo-

gia da cultura tem que ler, semnem discutir, é obrigatório. Numsegundo momento você pode atédiscordar ou concordar, mas temque ler Sergio Miceli. Por exem-plo, a questão da mídia abordada

por ele em A Noite da Madrinhaé um clássico. Quarenta anos de-pois a gente descobre se algo vi-rou um clássico, na época a gentenão sabia, mas hoje se tornou”.

 Silvana Rubino, trabalhou comMiceli no IDESP e produziu doislivros com ele 

“Pierre Bourdieu foi um nomeconhecido no Brasil, por causa doesforço do Sergio. Mesmo que elepróprio não admita. Miceli é umnome fundamental para se enten-

der a cultura brasileira. Ele é capazde reunir antologia através da orga-nização de vários autores”. 

Leôncio Martins Rodrigues orientouSergio Miceli durante o mestrado edoutorado

“Tenho a impressão que os móveissociais, dados de formação, itinerá-rio e carreira são importantes paraconfiguração geral da obra, mas elas

não são o ponto final. Ele contribuipor ter lido com certo distanciamen-to e com uma medida precisa de atéonde vão os fatores explicativos, eaté onde eles cessam de valer, porisso ele é muito útil e renovou bas-tante a sociologia da cultura e daliteratura. Depois, as inquietudesintelectualidade dele ao fazer tudoisso com dinâmica o torna um nomecom muito interesse para o meiocultural brasileiro. Ele certamenteveio enriquecer o panorama cultu-ral. Ele é um expoente com um as-pecto muito importante na culturado Brasil até hoje. Isso não impedeque haja divergências contra o nú-cleo do pensamento dele”.

 Davi Arrigucci, crítico literário e deMiceli

 “Essa preocupação em examinar a

atividade acadêmica ou visual levan-do em consideração inclusive o con-texto das produções certamente éuma marca de Sergio na sociologia.É uma contribuição extraordináriaevidentemente, todos nós que tra-balhamos nessa área não poderemosfazer o que fazemos, quer seja uma

ampliação do que ele fez, ou um pa-ralelo, sem levar em consideração otipo de trabalho que ele apresentou.Qualquer discussão de obra depen-de que você leve em consideraçãoos contextos, inclusive o que ele fez.Ele traz uma perspectiva de contex-to inovadora e de qualidade. É sem-pre importante para quem o segueou para quem segue caminhos com-plementares conhecer o métodousado por ele”.

Ricardo Benzaquén, doutor em antro-pologia e professor do IUPERJ

 

“Seus livros estão em todas asprateleiras das principais livrariasdo Brasil. Particularmente achoimportante salientar que o Sergiosempre chama a atenção para aimportância de estudos sobre eli-tes no Brasil. Meu sonho é queum dia ele coordene uma gran-de pesquisa sobre isso. Creio queseus orientandos e alunos vem,de modo individualizado, levan-do esse projeto a cabo”.

  Ana Paula Cavacanti, ex orientandade Sergio e atualmente docente do

Sergio se despede com o mmo sorriso convidativo do comço da entrevista. “Tenho quepara análise, cuidar da minha cbeça”. Não é para menos.

IEB-USP “O Sergio sempre foi um c

idealizador, eu conheço ele dde as primeiras publicações dedentro da editora Perspectiva e sempre foi um cara que se envveu em projetos que que refletea experiência da produção e crítdele, como foi dentro do caso EDUSP. Ele tinha consciência que ele queria e sabia onde chegentão essa determinação dele a

dava muito o caminhar das coisPara enfrentar o que ele enfrentpara estar aqui e fazer o que fez, não foi fácil não. Sempre tepessoas que acham até hoje que fazia livros caros demais”.

Plínio Martins, atual presidente da tora universitária, EDUSP. Trabalao lado de Sergio por cinco anos

 “Ao entender os intelectuais b

sileiros, Sergio estava pensancomo era possível essas trajetórse articularem com a produçintelectual que deram destaqu

a esses intelectuais. Essa ideia pensar os próprios intelectucomo um grupo social com carterísticas próprias, essa é a manede pensar a história da vida inteletual. Quem definiu esse projeto econstruiu foi o Sergio. Mesmo sedo convidados, podíamos claromodificando e ampliar os objetEle era a liderança no grupo, pele tem essa capacidade de articlar e conduzir equipes”.

Heloísa Pontes, esposa de Sergio Mli e participou ao seu lado do projet

História das Ciências Sociais no Br

“Eu o critiquei muito no pasdo porque ele não dava atençao conteúdo da obra, e sim as tjetórias dos intelectuais. Relenhoje, talvez não diria a mesmcoisa. Havia um estranhamene pode-se dizer que Pierre Bodieu era inexistente na USP.introdução do Bourdieu aconce quando Sergio foi para Uem 1989. Era só ele. Agora, centemente deve ter mais gete trabalhando com esse auto

Mas, Miceli foi o primeiro. Esmetodologia que dá valor as ogens sociais e as trajetórias é ummarca das análises do Bourdieudo Sergio”.

Irene Cardoso, socióloga e prosora aposentada da USP. Ingresno mestrado em 1968 na turmaSergio Miceli.

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