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Curso de Gestão Ambiental Artigo Original PERCEPÇÃO AMBIENTAL NAS COMUNIDADES DE CAPÃOZINHO E MARANATHA (FLONA DE BRASÍLIA): UMA ABORDAGEM PRELIMINAR. ENVIRONMENTAL PERCEPTION AT CAPÃOZINHO AND MARANATHA COMUNITY (FLONA DE BRASÍLIA): A PRELIMIRARY APPROACH. Elisete Jardim da Costa¹, João Batista Drummond Câmara² 1 Aluna do Curso de Gestão Ambiental 2 Professor Doutor do Curso de Gestão Ambiental Resumo Este estudo avaliou a percepção ambiental dos moradores de Capãozinho e de Maranatha, Área 3 localizada dentro da Floresta Nacional de Brasília. O objetivo principal foi caracterizar a percepção ambiental dos atores sociais em relação ao uso e ocupação do território, e a importância que eles atribuem à Floresta Nacional de Brasília. No período de 21 a 26 de novembro de 2015, foram realizadas as entrevistas com os moradores selecionados para a caracterização socioeconômica de ambas as comunidades, com dados como idade, sexo, naturalidade, escolaridade, tempo de residência no local e questões relacionadas à percepção em relação ao uso e ocupação do território, bem como a criação da Floresta Nacional de Brasília, restrições de uso e convivência com a administração da Flona. A análise concluiu que não existe diálogo entre os moradores de Capãozinho e de Maranatha e a gestão da Flona, mas diferentes percepções em relação ao uso e ocupação do solo, e a consolidação da Flona. Há também interesses divergentes que geram diversos conflitos como o descumprimento das normas de uso da Flona, além de as comunidades não considerarem a constitucionalidade da unidade de conservação. Palavras-Chave: Percepção Ambiental; Unidade de Conservação; Uso e ocupação do território. Abstract Introduction: This research evaluated the environmental awareness of the residents of Capãozinho and Maranatha located within the boundaries of the area 3 of the Brasilia National Forest. The main objective was to characterize the environmental perception of these social stakeholders regarding the use and occupation of the territory and the importance that they attach to the Brasilia National Forest. In the period of November 21st to 26th, 2015, interviews were conducted with selected residents for socioeconomic characterization, which was composed by socioeconomic indicators (like age, sex, place of birth, education, residence time, and issues related to the per- ception of residents regarding the use and occupation of the territory, the creation of the National Forest Brasilia, restrictions of use and the coexistence conditions with the administration of the National Forest (FLONA). The analysis concluded that there is no dialogue be- tween the residents of Capãozinho and Maranatha and the team responsible for the management of the National Forest. The residents have different perceptions about the use and occupation of the land and regarding the consolidation of the FLONA. There are also di - verging interests, generators of multiple conflicts, such as the lack of compliance with the FLONA use standards, and with the lack of recognition of the UC constitutionality. Keywords: Environmental perception; Conservation units; use and occupation of the territory. Contato: [email protected] Introdução A criação das unidades de conservação no mundo atual vem se constituindo numa das principais formas de intervenção governamental, visando reduzir as perdas da biodiversidade diante da degradação ambiental imposta pela sociedade (desterritorialização das espécies da flora e fauna). Entretanto, esse processo tem sido acompanhado por conflitos e impactos decorrentes da ocupação de grupamentos sociais (tradicionais ou não) em várias partes do mundo (VALLEJO, 2002). Uma das principais causas de conflitos em torno dos espaços protegidos é o problema da regularização fundiária. A grande maioria das unidades de conservação de proteção integral, criadas desde a época da ditadura militar, ainda não apresenta situação fundiária regularizada. A desapropriação de áreas privadas no interior das UCs ainda não foi concluída e não há indícios de que problemas dessa natureza sejam resolvidos e esses conflitos geram problemas que confrontam com a gestão da Unidade de Conservação (MARTINS, 2012).

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Curso de Gestão Ambiental Artigo Original

PERCEPÇÃO AMBIENTAL NAS COMUNIDADES DE CAPÃOZINHO E MARANATHA(FLONA DE BRASÍLIA): UMA ABORDAGEM PRELIMINAR.ENVIRONMENTAL PERCEPTION AT CAPÃOZINHO AND MARANATHA COMUNITY (FLONA DEBRASÍLIA): A PRELIMIRARY APPROACH.

Elisete Jardim da Costa¹, João Batista Drummond Câmara²1 Aluna do Curso de Gestão Ambiental2 Professor Doutor do Curso de Gestão Ambiental

Resumo

Este estudo avaliou a percepção ambiental dos moradores de Capãozinho e de Maranatha, Área 3 localizada dentro da FlorestaNacional de Brasília. O objetivo principal foi caracterizar a percepção ambiental dos atores sociais em relação ao uso e ocupação doterritório, e a importância que eles atribuem à Floresta Nacional de Brasília. No período de 21 a 26 de novembro de 2015, foramrealizadas as entrevistas com os moradores selecionados para a caracterização socioeconômica de ambas as comunidades, comdados como idade, sexo, naturalidade, escolaridade, tempo de residência no local e questões relacionadas à percepção em relação aouso e ocupação do território, bem como a criação da Floresta Nacional de Brasília, restrições de uso e convivência com aadministração da Flona. A análise concluiu que não existe diálogo entre os moradores de Capãozinho e de Maranatha e a gestão daFlona, mas diferentes percepções em relação ao uso e ocupação do solo, e a consolidação da Flona. Há também interessesdivergentes que geram diversos conflitos como o descumprimento das normas de uso da Flona, além de as comunidades nãoconsiderarem a constitucionalidade da unidade de conservação.

Palavras-Chave: Percepção Ambiental; Unidade de Conservação; Uso e ocupação do território.

Abstract

Introduction: This research evaluated the environmental awareness of the residents of Capãozinho and Maranatha located within theboundaries of the area 3 of the Brasilia National Forest. The main objective was to characterize the environmental perception of thesesocial stakeholders regarding the use and occupation of the territory and the importance that they attach to the Brasilia National Forest.In the period of November 21st to 26th, 2015, interviews were conducted with selected residents for socioeconomic characterization,which was composed by socioeconomic indicators (like age, sex, place of birth, education, residence time, and issues related to the per-ception of residents regarding the use and occupation of the territory, the creation of the National Forest Brasilia, restrictions of use andthe coexistence conditions with the administration of the National Forest (FLONA). The analysis concluded that there is no dialogue be-tween the residents of Capãozinho and Maranatha and the team responsible for the management of the National Forest. The residentshave different perceptions about the use and occupation of the land and regarding the consolidation of the FLONA. There are also di -verging interests, generators of multiple conflicts, such as the lack of compliance with the FLONA use standards, and with the lack ofrecognition of the UC constitutionality.

Keywords: Environmental perception; Conservation units; use and occupation of the territory.

Contato: [email protected]

Introdução

A criação das unidades de conservação no mundoatual vem se constituindo numa das principaisformas de intervenção governamental, visandoreduzir as perdas da biodiversidade diante dadegradação ambiental imposta pela sociedade(desterritorialização das espécies da flora e fauna).Entretanto, esse processo tem sido acompanhadopor conflitos e impactos decorrentes da ocupaçãode grupamentos sociais (tradicionais ou não) emvárias partes do mundo (VALLEJO, 2002).

Uma das principais causas de conflitos em tornodos espaços protegidos é o problema daregularização fundiária. A grande maioria dasunidades de conservação de proteção integral,criadas desde a época da ditadura militar, aindanão apresenta situação fundiária regularizada. Adesapropriação de áreas privadas no interior dasUCs ainda não foi concluída e não há indícios deque problemas dessa natureza sejam resolvidos eesses conflitos geram problemas que confrontamcom a gestão da Unidade de Conservação(MARTINS, 2012).

Segundo Quintas (2005), o conflito ambientalocorre por que atores sociais reagem em defesados seus interesses, com utilização e/ou gestãodos recursos ambientais.A percepção que um grupo ou indivíduo tem doterritório que ocupa contribui para a compreensãodos problemas ambientais, podendo influenciar nomaior envolvimento e participação dos indivíduosou grupos na tomada de decisão, além deconfigurar uma ferramenta de grande importânciapara os gestores públicos, na implementação depolíticas e programas que envolvem a sociedadeem geral.

A criação da Floresta Nacional de Brasília se deuprincipalmente para ser um cinturão verde depreservação dos mananciais e do Parque Nacionalde Brasília, portanto, antes da criação da Flona jáexistiam outros atores sociais naquele território,gerando conflitos pelo seu uso, por causa deinteresses divergentes. Neste sentido, estetrabalho tem como objetivo principal caracterizar apercepção ambiental desses atores sociais, emrelação ao uso e ocupação do território, e aimportância que eles atribuem à Floresta Nacionalde Brasília.

Unidades de conservação

As áreas protegidas são instituídas por lei cujoprincipal objetivo é a conservação, preservação eo uso racional e sustentável da biodiversidade.Fazem parte das áreas protegidas as unidades deconservação, terras indígenas, terras quilombolas,áreas de preservação permanente (APP) ereservas legais. Além de garantir a preservação,essas áreas são importantes estratégias decontrole territorial, pois estabelecem limites de usoe ocupação.

A criação do Parque Nacional de Yellowstone nosEstados Unidos, em 1872, configurou-se como omarco na criação de unidades de conservação. Apartir de sua criação, consolidaram-se as basesconceituais para a criação e manejo de parquesnacionais no mundo.

Araújo (2007) relata que a idéia de criar parquesnacionais teve grande apelo e se espalhourapidamente pelo mundo. Inspirados naexperiência americana, diversos países criaramseus parques: o Canadá em 1885; a NovaZelândia em 1894; a Austrália e a África do Sul em1898, o México em 1898; e a Argentina em 1903

Vallejo (2003) afirma que esse modelo americanoespalhou-se pelo mundo numa perspectivadicotômica entre ‘’povos’’ e ‘’parques’’. Partindo doprincípio de que a presença humana é sempredevastadora para a natureza, deixaram de serconsiderados os diferentes modos de vida daschamadas ‘’populações tradicionais’’ existentes emoutros países como na América do Sul e África.

Para Medeiros (2006) o ano de 2000 marcou umaimportante modificação na estrutura de grandeparte das áreas protegidas brasileiras. Nele,finalmente foi concretizada a ambição surgida nofinal dos anos 70 de estabelecer um sistema único– o Sistema Nacional de Unidades deConservação da Natureza (SNUC) – que definiriacritérios mais objetivos para a criação e gestão dealgumas tipologias e categorias de áreasprotegidas que antes se encontravam dispersasem diferentes instrumentos legais.

De acordo com o Sistema Nacional de Unidadesde Conservação da Natureza (Snuc), unidades deconservação são espaços com característicasnaturais relevantes, que têm a função deassegurar a representatividade de amostrassignificativas ecologicamente viáveis dasdiferentes populações, habitats e ecossistemas doterritório nacional e das águas jurisdicionais,preservando o patrimônio biológico existente. AsUCs asseguram o uso sustentável dos recursosnaturais e propiciam às comunidades envolvidas odesenvolvimento de atividades econômicassustentáveis em seu interior ou entorno.

O Snuc é composto pelo conjunto de unidades deconservação federais, estaduais, municipais eparticulares, distribuídas em 12 categorias demanejo. Cada uma dessas categorias sediferencia quanto à forma de proteção e usospermitidos.A categoria de proteção integral é mais restritiva enecessita de maiores cuidados por sua fragilidadee particularidades ambientais, já nas unidades deuso sustentável, os recursos naturais podem serutilizados de forma direta e sustentável, bem comoconservados, pois além de proteger váriosrecursos hídricos da poluição, protege o solocontra a erosão. Outro papel importante das áreasprotegidas para a conservação da biodiversidade écontribuir para a redução de emissão do carbonopara a atmosfera e também funcionar como umimportantíssimo instrumento para inibir e controlar

o desmatamento.Na categoria de uso sustentável estão inseridas asáreas de proteção ambiental, áreas de relevanteinteresse ecológico, florestas nacionais, reservasextrativistas, reservas de fauna, reservas dedesenvolvimento sustentável e reservasparticulares do patrimônio natural. Na categoria deproteção integral: estações ecológicas, reservasbiológicas, parques, monumentos naturais erefúgios de vida silvestre.

Segundo o Snuc, floresta nacional é uma áreacom cobertura florestal de espéciespredominantemente nativas e tem como objetivo ouso múltiplo sustentável dos recursos florestais e apesquisa científica, com ênfase em métodos paraexploração sustentável de florestas nativas(BRASIL, 2000).

A floresta nacional é de posse e domínio públicos,sendo que as áreas particulares incluídas em seuslimites devem ser desapropriadas, de acordo como que dispõe a Lei do Snuc.

A criação de uma unidade de conservação deveser precedida de estudos técnicos e de consultapública que permitam identificar a localização, adimensão e os limites mais adequados, porémnem sempre as populações que moram no entornodessas unidades são ouvidas, o que provocaconflitos e problemas ambientais.

Percepção ambiental

Cada indivíduo enxerga e interpreta o meioambiente de acordo com o próprio olhar, suasexperiências prévias, expectativas e ansiedades.Ao considerar os níveis de percepção ambiental,verifica-se que os grupos humanos possuembagagens experienciais distintas devido aelementos como cultura, faixa etária, gênero, nívelsocioeconômico, entre outros, que revelampercepções sob diversas formas (GONÇALVES;HOEFFEL, 2012).

Segundo Machado (1999), a capacidade deperceber, conhecer, representar, pensar e secomunicar permite ao homem moldar os lugares eas paisagens. Suas respostas ambientais sãoinfluenciadas pelas interpretações que é capaz defazer, a partir de experiências presentes epassadas, expectativas, propósitos, aspirações,gostos e preferências. A realidade que cerca osindivíduos é aprendida por meio dos sentidos, que

podem ser comuns (visão, audição, tato, olfato,paladar) ou especiais, como o sentido das formas,de harmonia, de equilíbrio, de espaço e de lugar.

Segundo Quintas (2005), no processo detransformação do meio ambiente, de suaconstrução e reconstrução pela ação coletiva dosseres humanos são criados e recriados modos derelacionamento da sociedade com o meio natural(ser humano/natureza) e no seio da própriasociedade (ser humano/ser humano). Ao serelacionar com a natureza e com outros homens emulheres, o ser humano produz culturaevidenciada por suas manifestações, ou seja, criabens materiais, valores, modos de fazer, depensar, de perceber o mundo, de interagir com aprópria natureza e com outros seres humanos, queconstituem o patrimônio cultural construído pelahumanidade, ao longo de sua história.

Santos et al. (2005) afirmam que os estudos quese caracterizam pela aplicação da percepçãoambiental objetivam investigar a forma como ohomem enxerga, interpreta, convive e se adapta àrealidade do meio em que vive, principalmente emse tratando de ambientes instáveis ou vulneráveissocial e naturalmente. Em termos de método, apercepção ambiental pode comportar diferentesorientações e abordagens, tais como as ligadas acorrentes específicas das ciências psicológicas ede caráter filosófico, como o métodofenomenológico.

Outro autor, Machado (1999), conclui quepercepção é o conhecimento que adquirimos pelocontato direto e imediato com os objetos e comseus movimentos, dentro do espaço sensorial. Épossível perceber, “aqui e agora", que é ainteligência que equilibra esse processo mental. Arelação entre a percepção e a inteligênciaapresenta dois aspectos importantes: o operativo eo figurativo. O primeiro se origina no própriopensamento, na inteligência, enquanto o segundose origina na percepção.

Conflitos ambientais em UC

Lidar com a gestão de uma UC implica mergulharna complexidade. Múltiplas áreas e temascoexistem tanto na sua administração quanto nasrelações que estabelece com os distintos atoressociais – grupos sociais ou instituições – que,direta ou indiretamente, exercem influência sobresua existência no território.Theodoro (2005) menciona que a multiplicidade depercepções sobre a forma de uso dos recursosnaturais gera conflito em todos os níveis, desde olocal ao global, com vieses econômicos, sociais,culturais e políticos, entre outros mais difusos.Os conflitos ambientais, para Quintas (2006),ocorrem quando atores sociais reagem em defesados seus interesses, pela utilização e/ou gestãodos recursos ambientais.

Nesse sentido, Acselrad (2004) afirma queconflitos ambientais são aqueles que envolvemgrupos sociais com modos diferenciados deapropriação, uso e significação do território, tendoorigem quando pelo menos um dos grupos tem acontinuidade das formas sociais de apropriação domeio ameaçada por impactos indesejáveistransmitidos pelo solo, água, ar ou sistemas vivosdecorrentes do exercício das práticas de outrosgrupos.

Segundo ICMBio (2015), existem impassescausados pela falta de consolidação fundiária.Pela lei, é preciso realizar a regularização fundiáriaaté cinco anos após a criação da UC. Na prática,não é o que acontece, pois há sobreposições doterritório da UC com propriedades particulares,outras áreas protegidas (terras indígenas equilombolas), com áreas de outros órgãos públicosmunicipais, estaduais e federais, como a Marinhae o Instituto Nacional de Colonização e ReformaAgrária (Incra), especialmente quando existemassentamentos de reforma agrária.

A identificação e a análise dos atores sociaistambém são elementos fundamentais para oestudo dos conflitos, já que tenta explicitar osinteresses específicos em jogo, no momento dacrise. O levantamento das interações entre cadaum dos atores sociais é outro ponto importante.Para entender um conflito em sua totalidade, énecessário compreender as interações e asposições de todos os atores sociais envolvidos(THEODORO, 2005, p. 60). De acordo com ICMBio (2015), há duas situaçõesdistintas que caracterizam conflito pela existência

de uma unidade de conservação no território: deum lado, há os conflitos criados por setores da so-ciedade, que veem nas UCs um obstáculo ao de-senvolvimento da região. Muitas vezes, são os se-tores que perdem possibilidade de lucros diretos,com especulação fundiária ou com a exploraçãode recursos naturais situados nas terras públicas,que serão convertidos em UCs. Por outro lado,existem os que têm prejuízos em suas atividades,causados por restrições de uso previstas nas zo-nas de amortecimento ou por dificuldades de infra-estrutura ou acesso à região na qual existe umaunidade de conservação.

Materiais e métodos

Primeiramente foi realizado levantamento biblio-gráfico e coleta de dados secundários de informa-ções básicas sobre a área estudada. Para conhecer a percepção dos moradores daÁrea 3, da Flona de Brasília, foram realizadas seisentrevistas abertas, gravadas e transcritas, comtrês moradores do Capãozinho e três do Marana-tha.

As entrevistas foram orientadas por questionáriosemiestruturado contendo 16 perguntas, comquestões fechadas. Elas foram compostas porindicadores socioeconômicos (idade, sexo,naturalidade, escolaridade, tempo de residência equestões relacionadas à percepção dosmoradores em relação ao uso e ocupação doterritório, criação da Floresta Nacional de Brasília,restrições de uso e convivência com aadministração).

O levantamento dos dados foi realizado entre osmeses de outubro a novembro com aplicação deseis questionários nos finais de semana. O primeiro contato serviu para o reconhecimentoda área da Flona. No total, foram três visitas acampo, em outubro e novembro de 2015, quandofoi utilizado o questionário com 16 perguntas, res-pondido individualmente. Além disso, foram feitasentrevistas para coletar informações sobre a per-cepção ambiental dos moradores das comunida-des.Os assuntos abordados referem-se ao uso eocupação do território e a percepção ambientalsobre a criação da Flona. As entrevistas foramgravadas, com o consentimento prévio eautorização dos entrevistados, e as perguntas sãoas seguintes:

1. Há quanto tempo você mora aqui?2. O que te motivou a vir para cá?

3. Você sabe como se deu a distribuição daspropriedades?4. Como era a terra quando você chegou?5. O lugar mudou muito de lá para cá?6. O senhor deixou alguma coisa da mataconservada?7. Que tipo de cultura é cultivada na suachácara?8. O que é feito com a produção?9. Vocês se aliam para resolver os problemasenfrentados na comunidade? 10. Sua chácara está regularizada?11. Você sabe por que a Flona foi criada?12. Conhece as regras de uma unidade deconservação?13. Sabe que mora próximo a mananciais enascentes, e do lago que mais abastece Brasíliade água e que, por isso, a conservação e limpezaé muito importante?14. Existe alguma relação entre você e osfuncionários da Flona? Como é essa relação?15. Quais os principais problemas que vocêpercebe na comunidade?16. A Flona tem alguma importância para a suavida?

Caracterização da área de estudo

A Floresta Nacional de Brasília foi criadapelo Decreto n° 1.299, de 10 de junho de 1999,com o objetivo de constituir um cinturão verde queassegurasse a preservação dos mananciais e doParque Nacional de Brasília. É uma área comcobertura florestal de espécies usadas emreflorestamentos comerciais, predominandoeucaliptos e Pinus spp., além de áreas comcobertura nativa do Cerrado. Tem como objetivobásico o uso múltiplo sustentável dos recursosflorestais e a pesquisa científica, com ênfase emmétodos para exploração sustentável de florestasnativas, conforme define a Lei nº 9.985/2000, doSistema Nacional de Unidades de Conservação(Snuc) (IBAMA, 2010).

A Flona possui 9.346 hectares divididos emquatro áreas: duas na Região Administrativa deBrazlândia – Área 3 (Flona 3), com 3.071 ha,localizada entre a DF-180, de frente paraBrazlândia e o Rio Descoberto, fazendo limite como estado de Goiás. É dividida em talhões, comchácaras “regularizadas” na parte conhecida comoCapãozinho, e invasões na parte sul, conhecidacomo Maranatha. Está localizada próxima do Lagodo Descoberto e abrange as comunidades Barra

do Córrego, Capãozinho, Capãozinho II,Maranatha, Córrego Cortado, FazendaChapadinha e Fazenda Zé Pires.

Seu plano de manejo está em elaboração eo conselho consultivo em processo de renovação.Está localizada na Área de Proteção Ambiental daBacia do Rio Descoberto e próxima ao ParqueNacional de Brasília (ICMBio, 2014).

Figura 1. Localização da Floresta Nacional de Brasília, naregião noroeste do Distrito Federal. (Fonte: Ibama).

Resultados e discussões

Os entrevistados mostraram-se abertos para res-ponder as perguntas. Foram escolhidos seis mora-dores da Flona 3, destes, 5 do sexo masculino e 1do feminino, sendo que três deles são indivíduoschaves pois já foram presidentes da associação demoradores das respectivas comunidades.A idade dos entrevistados varia de 28 a 60 anos,sendo que 3 dos entrevistados nasceram noestado de Goiás, um no DF e dois no Nordeste(Paraíba e Pernambuco). Dois possuem nívelsuperior e 4 nível médio e fundamental. O tempode residência varia de 2 meses a 30 anos.

Observa-se que a maior parte dos entrevistadosreside há mais de 10 anos no local, sendo queapenas 1 não era o proprietário da chácara, masprestador de serviço.

Os principais usos das propriedades estudadassão agricultura, criação de animais e lazer e asculturas desenvolvidas são hortaliças e criação deanimais.

O destino dado aos produtos cultivados é a venda,principalmente para o Ceasa; o segundo destino éo consumo próprio, pelos proprietários. Foipossível observar o uso de defensivo em algumaspropriedades.

A maioria dos entrevistados foi morar na área, quehoje é a Flona 3, em busca de sossego e espaçopara plantar. Mas apenas 2 vivem exclusivamenteda renda obtida da venda da produção. Os outros4 têm outro emprego e utilizam a renda comoextra. Parte dos entrevistados são funcionáriospúblicos e não participaram do processo deocupação do solo, pois compraram depois daconsolidação da área, porém anterior à criação daFlona. Foi possível observar também empresáriose funcionários públicos que compraram a terrapara lazer.

“[...] Eu sou militar quando eu me envolvi com esse tipode coisa é que a gente teve orientação de infiltrar comos sem-terra que, na época, ela resistia na Chapadinhae na Radiobras, que hoje é o Assentamento Betinho,então, a gente recebeu orientação: seguinte, infiltra quersaber o quê que é e tal e tal, beleza virei um sem-terra,fiz barraca entrei pra dentro e fui viver a vida do meuvizinho, aí eu fui viver a vida porque até naquela épocaexistia o João Sem-Terra. Foi o primeiro assentamentode sem-terra feito em Brasília, foi feito pelo João sem-terra tá? Isso há 28 anos mais ou menos, então surgiu apergunta: que povo é esse que tribo é essa que paradaé essa? Aí foi onde eu aprendi, eu entrei no esquemapra ter conhecimento pra saber como é que era, comofuncionava e tal entendeu? Aí eu vi que não tinha nadade mais, que cada um tava buscando direito o que lhefazia jus, então começamos a dar apoio, a organizar,pois era uma coisa desorganizada, virou organização. Aísurgiram outros partidos, já existia o MST há muitos

anos né? Aí surgiu o MBST, que é o movimento

Brasília” (Marcos)

Outro morador, afirma que sempre gostou docampo e que não sabia que a chácara estavadentro dos limites de uma Flona.

“[...] na época, eu não tinha casa e eu sempre gostei docampo, sou nascido e criado em Brazlândia, conheçoisso aqui desde garoto e, na verdade, quando compreiisso aqui não sabia que tava esse problema ambientalné? O pessoal tinha feito a cascalheira ali do outro lado,que é outro setor de chácaras. Fizeram aqui e eu com-prei a chácara depois que fui ver que tinha essa estipu-lação toda, mas é mesmo a vontade de uma vida maistranquila’’(Eliano).

Gilson já trabalhava com agricultura em outra áreae o patrão o convidou para ser sócio em umachácara no Maranatha.

[...] Olha, eu trabalhava na Radiobras né? Aqui é novo,umas terras novas para melhor trabalhar. Eu procurei vir

pra cá, mais perto da cidade NE? (Gilson)

Já, Estelita, foi motivada pela sua mãe, que já mo-rava na área. [...] Minha mãe que morava aqui e aqui foi onde eu com-

prei também meu pedacinho e tô até hoje. (Estelita)Jovane também gosta do campo e devido à áreaser próxima a Brazlândia, resolveu comprar a pro-priedade.[...] Vim porque gosto do campo, da roça, e sempre mo-rei em Brazlândia, e escolhi essa região por ser próximo

a Brazlândia. (Jovane)Antônio queria um espaço maior para morar, plan-tar e criar animais.[...] Espaço, morar num lote maior pra criar ani-mais, plantar. (Antônio)

Sobre a forma de como se deu a distribuição das propriedades, Marcos foi um dos incentivadores a ocupar a área e fez parte do movimento Brasília Sem-Terra:

[...] Começamos a montar barracos na Radiobras.Eu vim remendar um pneu aqui em Brazlândia eouvi comentários sobre essa região, aí eu vim, co-nheci a área todinha, aqui era tudo pastagem, erabraquiária pura. Eu tenho fotos, eu tenho álbunsde fotos quando eu cheguei, aí eu conheci a área,eu tinha muita influência no Governo e fui nos ór-gãos competentes como Iema, Sematec e tal, eprocurei os colegas pra me orientar. Fui ler o Pe-dot, pra ver como é que funcionava, porque atéentão não era responsabilidade minha. Aí eles dis-seram o seguinte: aqui você não faz, aqui você fazassim entendeu? Era nascente né? Deixe tantosmetros aqui, você não deixa aproximar isso aqui, éfloresta tal e tal, então, fomos bem orientados aesse respeito aí eu trouxe o povo pra cá, os que játinham, os que me acompanharam viemos pra cá,mas outras cadastraram. Se cadastraram na asso-ciação, fizeram os barracos deles, chegou a teracampado aqui umas 300 famílias, parcelei, medi-mos isso aqui na corda, com a comissão, 112 par-celas, daqui foi pra um sorteio ao vivo, sorteio lim-po, quem tirou aqui ficou, quem não tirou foi praImperial entendeu? Pra fazenda Dois Irmãos. Eufui subordinado ao MBST. Aqui não teve confrontocom ninguém, aqui foi pacífico, a nossa posse aquié de 20 anos pacífica, parcelado direitinho, nin-guém roubou nada de ninguém, ninguém desma-tou nada. (Marcos)

É notório que há divergências em relação àocupação das áreas do Capãozinho e Maranatha,e também falta de informação. Alguns moradoresdo Capãozinho afirmam que os moradores da áreado Maranatha não foram assentados, mas alegamque foi invasão.

Eliano chegou à região depois que ela foiocupada. A compra da chácara foi de terceiro.

[...] Ela foi feita por sorteio, entre as pessoas queestavam acampadas lá na beira da estrada, na época,foi feito os lotes e foi sorteado entre os acampados.

(Eliano).

A versão que Gilson conta é que a área foiinvadida e que o Incra doou as terras para os sem-terra.

[...] Olha, isso aqui era uma fazenda na época, assim,pelo que eu sei, acho que o Incra veio e dividiu isso aquiné? É tanto que as chácaras são tudo 5 hectares, tudodividida, na época foi invasão, acho que o Incra veio e

deu. (Gilson)

Jovane afirma que a Flona foi criada por conta dometrô e que também existe a história de que foicriada para impedir adensamento populacional.

Já Antonio e Estelita afirmam não saber como sedeu a distribuição das propriedades.

Os entrevistados informaram que quandoocuparam a área não existia vegetação, eraapenas descampado e braquiária, e criticam, poisantes da ocupação da área, existia um projeto doPró-Flora de plantação eucaliptos e pinus.

[...] Aqui era campo, isso aqui era descampado,braquiária, inclusive eu tô com uma ação na justiça porque o Ibama me processou e alegou que aqui euconstruí em alvenaria, que não podia, e desmatei.Quando eu levei o álbum com máquina digital para oDPU eles ficaram de cara. A doutora ficou de caraporque eu fico de cara porque um órgão competentecomo o Ibama, que merece confiança, tem que ter fépública, então você vai com uma mentira muito grande,eu entrei com uma ação contra o Ibama, pois refloresteiaqui. Ninguém desmatou nada, não foi eu não, eu não

tinha o que desmatar. (Marcos)

[...] Isso aqui antes tinha uma plantação de eucaliptoda Pró-Flora, mas quando eu cheguei já tinha sidocortada, isso foi um projeto de reflorestamento, retiraramo Cerrado e plantaram eucalipto. Foi uma coisa loucaque alguém inventou, tira a vegetação do Cerrado, queé muito diversa, coloca uma vegetação exótica e uma

monocultura. (Eliano)

Gilson afirma que em sua propriedade só haviaplantação de milho.

[...] Aqui só tinha milho plantado, o pessoal que moravaaí plantava milho. (Nós plantamos um bocado de coisascomo morango, tomate, vagem, repolho, beterraba, ma-

xixe. (Gilson)

[...] Olha, o dono já plantava, só que ela já estava nomato, já estava matagal, hoje a mata que você encontra

é as frutas e as plantações. (Estelita)

[...] Só existia braquiária, só pasto, não existiam árvo-

res e o que tem foi eu que plantei. (Jovane)

[...] Tinha umas árvores aí eu deixei, e só tinha capim.

(Antônio)

Quando perguntados se a área mudou, na percep-ção da maioria dos entrevistados eles responde-ram que fizeram um bem para a Flona. Afirmamque a área era toda desmatada, que não existiavegetação na época em que ocuparam a região ese hoje existe árvores foi por que eles plantaram.Eles afirmam que hoje a área é toda produtiva eque muita gente vive do que produz.

[...] Mil por cento, isso aqui tudo é produtivo. Nossa áreatoda é produtiva: são setecentos e oitenta e poucos hec-tares, se não me engano, todos produtivos, então, aquihoje, muita gente vive da terra, o povo vive da terra.

(Marcos)

[...] Ah! mudou bastante, quando eu comprei aqui, mui-tas pessoas ainda estavam embaixo de lona quando agente chegou aqui, inclusive essa casa de alvenaria oICMBio não permite, isso aqui eu fiz por que o barraqui-

nho estava caindo aos pedaços. (Eliano)

[...] Sim, mudou bastante. Isso aqui tudo era eucalipto,hoje os sem-terra invadiram aqui na frente NE? Há uns

anos, a gente viu mudar muitas coisas. (Estelita) Gilson e Antonio afirmam que a área não mudounos últimos anos, já Jovane diz ter mudado.

Com o passar dos anos, a região de abrangênciado Distrito Federal vem sofrendo perdas significati-vas da cobertura vegetal do bioma. Degradaçãomotivada, entre outros fatores, pela expansão dasfronteiras agrícolas, intenso fluxo migratório ocorri-do principalmente na década de 1970, com o pro-cesso de urbanização das cidades-satélites do DF,e instalação de projetos de reflorestamentos comespécies exóticas pela empresa Pró-Flora, que fo-ram abandonados na década de 1990, sem tersido realizado o manejo adequado e a recomposi-ção florestal (ICMBio, apud OLIVEIRA, 2009).

Os moradores afirmam que nunca tiveram ajudade nenhum órgão:

[...] Nunca tivemos ajuda de órgão nenhum, a não ser oIncra, que me cedeu cesta aqui acho que uns dois anose meio. Dou valor danado a isso aqui e defendo a tesede que isso aqui não vire urbana, defendo de unhas edentes isso aqui, sou contra o parcelamento, mas nãoposso falar sobre as áreas dos outros, tenho de falarsobre a área minha, que ninguém segura. Agora tásurgindo ajuda da Emater, era proibido viu? a Ematernão podia entrar aqui pra dar suporte, agora tem de unsquatro anos pra cá, mais ou menos, eu posso até mentirpor que eu não dependia da Emater, este ano eu tivecontato com a Emater. Eles dão suporte de análise, uns

projetinhos, eles dão um certo apoio aqui. (Marcos)

[...] Aqui ninguém tem ajuda de nada, aqui todo mundoque faz as coisas é na cara e na coragem, as pessoas

aqui são totalmente abandonadas pelo Estado. (Elia-no)

Apenas Jovane diz ter participado de um projetocom a Embrapa-Cerrado, no ano de 1999.

[...] Tivemos ajuda da Embrapa-Cerrado, que realizouprojeto de plantio de mudas nativas em 1999. Eucolaborei no projeto e plantamos várias mudas ao redordo córrego. (Jovane)

Figura 2. Área reflorestada pelo projeto daEmprapa-Cerrado, localizada no Capãozinho.

Eles afirmam que não retiraram nada davegetação existente quando chegaram no local, eque se hoje existe vegetação é graças a eles, queplantaram.

[...] As árvores do Cerrado que tinha aqui elas estãoaqui e reflorestei com madeira de lei. Só que eu sei queem 1997 e 1996 nós viemos pra cá, aqui tinha 14 anosque tinham tirado eucalipto daqui isso aqui erareflorestamento da Pró-Flora, que foi desmatado e nãofoi reflorestado, tinha 14 anos que foi feito o corte e ela

tava abandonada. (Marcos)

[...] É, pra você ter uma ideia, a maioria do que vocêestá vendo aqui foi eu que plantei, aí se você ver essaslobeiras aí, eu não gosto que corte nem as lobeiras, mas

é porque aqui não tinha nada mesmo quando eucheguei. Essas plantas cresceram depois que eu

cheguei, só tinha braquiária. (Eliano)

[...] Hoje a mata que você encontra lá é as frutas e aplantação que eu plantei, porque não tinha nada quando

eu vim morar. (Estelita)

Uma das entrevistadas reclama da ausência dopresidente da Associação do Capãozinho.

Um dos membros da associação do Maranathaafirma que pretende unificar as duas associaçõespara dar mais força para as comunidades doMaranatha e Capãozinho.

[...] A gente tem uma associação, inclusive estavaconversando com o presidente do Capãozinho, nós

provavelmente vamos unir as duas associações.(Eliano)

[...] Nós não temos nada é só nos mesmos, nós nãoprocura nada, inclusive até fiz a carteirinha da Emater,igual se tivesse a associação aqui pronta. A gente ia tertrator, ia ter tudo que a gente precisasse, se nós quer,nós temos que pagar tudo por fora por que não tem, era

pra ter tudo isso aqui. (Estelita)

Antonio comprou a chácara recentemente e diznão saber se existe associação de moradores.Gilson também diz não saber.

[...] Nem sei se aqui tem associação de moradores, masjá conhecia essa região, aí comprei essa chácara de um

parente. (Antônio)

A regularização fundiária é um dos principaisproblemas que o ICMBio enfrenta e que impedeque a situação dos moradores seja regularizada,pois até o momento as chácaras que estãolocalizadas na área da Flona não foramindenizadas. Como essas comunidades já viviamantes da criação da Flona, a maioria possuisessão de uso ou escritura declaratória. Comoesse processo de desapropriação e indenização édemorado, muitas chácaras estão sendoparceladas e vendidas. Foi possível observarplacas de venda na comunidade de Capãozinho.

Figura 3. Chácara à venda localizada nacomunidade de Capãozinho.

[...] Eu que mandei fazer uma escritura declarató-ria daqui, por que é o documento que eu consigoprovar que tô aqui, desde aquela época. É umcomprovante de residência, porque aqui não temágua, não tem luz, não é legal, órgão nenhum querassumir a responsabilidade. (Marcos)

[...] Tenho uma escritura declaratória, contrato decompra e venda e cessão de direito de uso daterra. (Eliano)

Olha, aqui é o seguinte, nós não temosdocumento, só é posse, a maioria das chácarasaqui no DF tem sessão de posse. (Gilson)

Estelita e Antônio dizem não ter o documento dapropriedade.

Perguntados sobre a origem da Flona, Estelita,Gilson e Antônio disseram não saber pra que aFlona foi criada, os outros três responderam daseguinte forma.

[...] Eu acho o seguinte: a minha forma de pensar aFlona não precisava ter sido criada, órgão praregularizar, órgão pra fiscalizar já existia o Ibama, essasáreas de Flona que eles falam rachou o Ibama, teveuma parte Chico Mendes e Ibama, não precisava de terInstituto Chico Mendes, não precisava disso, eu falei proouvidor deles lá no ICMBio, se eles querem gastardinheiro façam um projeto, procura o assentamentoMaranatha, pega cada proprietário, exige que elesreflorestem 20% da área, porque não tem necessidade,porque já existe em Brasília uma área maior do que oexigido por lei como reflorestamento, como proteçãoambiental. A única coisa que eu sou contrariado é queeles fizeram esse Instituto ICMBio pra atrapalhar agente, por que todo mundo que veio aqui olhar, a minhachácara tem mais de 1 km da água e eles não podiamapoiar a gente pois alegaram que a gente poluía, entãoquem poluía eram as pessoas que já tinham 30, 35 anosna área, então quem poluía eram algumas pessoas,pois o fundo da chácara fazia margem com o córregoque antigamente se criava porco e mangueiro. Eles

inventaram esses órgãos pra atrapalhar, mas elesvieram, mediram os 30 metros, o povo respeitou. Tá aí,quer gastar dinheiro tira os fiscais. Aqui tinha umasempresas de segurança que fiscalizavam isso aqui 24horas. Era Ipanema depois passou pra Santa Helena.Eles estavam gastando dinheiro com material bélico,com viatura com homens, desnecessário, por que nãogastou o dinheiro dessas despesas comreflorestamento? Por que não gastaram o dinheiro como povo? Por que não chamou a população e nãoensinou a proteger a reflorestar? Então, eu acho que éforma de jogar dinheiro onde não precisa, aqui não tem

benefício desse povo não. (Marcos)

[...] Bom, o que a gente tem de documento é a Flona,que foi criada como contrapartida pra liberação de

empréstimo pra obra do metrô. (Eliano)

[...] Puramente pra contenção de expansão imobiliária.Acredito só por esse sentido, por que aqui nunca tevefloresta e quando teve o próprio governo tirou, devastou

tudo. (Jovane)

Fica explícita a falta de diálogo entre os atores eos gestores. O próprio Ministério do MeioAmbiente reconhece que essa falta de diálogogera conflitos (MMA, 2015). A utilização derecursos ambientais pela população local, antesda implantação da UC, podia não ser vista comoproblema. Mas depois que foi implantada,especialmente se enquadrada nos tipos ecategorias mais restritivos, isso passa a serpercebido como problema. E em alguns casos,gera conflitos.

Quando perguntados sobre as regras da Flona,dois disseram não ter conhecimento e outros trêstêm consciência que em área de Floresta Nacionalnão pode existir pessoas morando. Tambémenfatizaram sobre cuidados com construção ereformas. Vários deles já receberam multas porconstruir sem autorização, mas alegam que viviamem barracos precários e precisavam de um lugardigno para morar. Isso mostra que as regras deuma Flona não ficaram claras para eles e que nãoexiste nenhuma fiscalização, pois foi possívelobservar várias construções na área, inclusiveplacas anunciando venda.

Um dos moradores afirma que já teve váriosconflitos com a Chefe da Flona e demonstrarevolta a respeito das regras impostas noMaranatha e a forma como a Flona foi criada.

[...] Eles não autorizam ninguém a construirmais, ninguém quer assumir a responsabilidade, vocêpode ir lá hoje e pedir pra construir eles não vãoconcordar com você de forma alguma, mas como queeu vou pegar a minha família e vou colocar num lugardesse aqui se eu não posso dar um lugar decente pra

viver, pra morar, agora não posso aumentar minha casa,pra mim dar uma privacidade pro meu filho, pra minhafilha, então isso é um pensamento muito bobo, essepessoal do ICMBio, eu acho o seguinte: essa área aquinão é destinada para a área rural, sim já não existia? Eutava há cinco anos aqui quando eles chegaram, a Eldaarrumou um problema pessoal comigo por que, elessurgiram aqui cru de tudo, eles não sabiam nada doMaranatha, não sabiam de nada, cheguei com ela comtodo respeito. Ela, eu admiro muito, a senhora por seruma menina nova com uma responsabilidade dessas sefor pra nos ajudar me procura que quem fez oassentamento foi eu, eu sei te passar tudo ela nãoentendeu, ela arrumou um problema pessoal comigo,abri processo contra ela, lutei pra tirar ela de lá como elasaiu, tirei a vigilância daqui de dentro, lutei pra tirar, tireientendeu? Então quer dizer enquanto ficava de bocaaberta a vigilância deitando e rolando e o ICMBioquerendo mandar na casa de todo mundo tava valendo,quando eu peitei eu me queimei porquê você não podeafrontar só que eu tenho cara pra afrontar, eu dou conta,eu consigo afrontar sei até onde eu posso ir. Me deramfoi 20 mil de multa aqui por que eu construí de alvenariamas já existia um barraco de madeira há 14 anos e foi aíque eu consegui construir, ver se eu tenho direito emque que eu prejudiquei o meio ambiente? Procura naminha chácara uma falha, um erro meu contra o meioambiente, contra o órgão que, segundo eles, existe, e éirregular, é ilegal, o ICMBio é ilegal. O que minhaconstrução aqui prejudicou o meio ambiente? Aqui erasó braquiária, olha hoje a quantidade de árvores que eu

tenho aqui plantado, reflorestada. (Marcos)

[...] Bom eu não tenho conhecimento de tudo não, tenhoconhecimento em partes, problema que em florestanacional só pode ter comunidade tradicional NE? E

juridicamente pela lei não poderíamos estar. (Eliano)

[...] Não sabemos, já veio já a Agefis já veio agora a Flo-na Nacional nunca veio, a Agefis já multou aqui a casa,porque nos tava construindo, a dona da casa tinha auto-

rização pra construir aqui. (Gilson)

[...] Se tiver Flona a princípio não pode nem ter moradordentro, apesar de várias Flonas no Brasil terem morado-res lá são aceitos a mesma lei e aqui não pode, real-mente se foi efetivado Flona aqui entra em conflito coma lei. A presença de qualquer morador aqui a não serque fosse comunidade tradicional que seria quilombola

ou índio. (Jovane)

[...] Eles dizem que se um dia eles forem tirar nós daquieles vão indenizar que esse lado daqui é da Caesb olado de lá não, por que é sem-terra, eu fiquei sabendoque foi liberado, que a gente pode construir inclusiveaqui ninguém podia construir, agora já tá construindo,eles até multaram minha mãe por que ela construiu,mas ela não pagou. Mas eles continuam reclamandoque não pode fazer, um dia desses teve reunião, elespassaram aqui chamando, mas a gente não foi. Parece

que liberou pra fazer poço artesiano. (Estelita)

Quando perguntado sobre a importância dasnascentes, eles afirmaram que na área nãoexistem nascentes, mas reconhecem aimportância de manter os mananciais limpos epreservados. Somente Antonio afirmou nãodepender do córrego localizado próximo a suamoradia. Isso mostra o desconhecimento sobre aimportância desses mananciais. Gilvan reclamaque o córrego localizado próximo a sua chácarasofre pressão da cidade de Águas Lindas.

[...] aqui não tem sujeira, a maioria da sujeira eusempre desço aqui embaixo nesse córrego que abaste-ce aqui, a sujeira todinha que vem disso aqui desse lagoaqui é de Águas Lindas, você vê coisas tristes dentrodesse lago, a gente fica até desanimado um pouco népor que se tá poluindo a água do DF, tem muita genteque não repara isso. A fiscalização às vezes maltratamuita gente, eles vêm aqui condenar a gente por que agente não pode construir onde é que a gente vai morar,se a gente planta pra abastecer o DF, a gente vai morarnum barraco de madeirite? Não tem como, isso aqui éuma área boa de plantar, a maioria desses córregos aí afiscalização nem liga, a Caesb anda aqui vai lá embaixo

volta, mas ela nem olha o córrego’ (Gilson)

Quintas (2004) afirma que o principal responsávelpela proteção ambiental no Brasil é o Poder Públi-co, por meio de suas diferentes esferas. É precisointervir nesse processo, de modo a evitar que osinteresses de determinados atores sociais (madei-reiros, empresários da construção civil, industriais,agricultores, moradores etc.) provoquem altera-ções no meio ambiente, que ponham em risco aqualidade de vida da população afetada.

Eliano diz que no Maranatha não tem nascentes,mas que é área de recarga do lençol freático:

[...] No Maranatha não tem nascente, mas é claro queé área de recarga do lençol freático né? A questão é aseguinte: o problema maior é por que no Brasil as coi-sas são meio bagunçadas, por que se ao invés disso cri-ar uma Floresta Nacional, por que Brazlândia toda ficasobre uma área de proteção ambiental né? Brazlândiatoda tá sobre a APA do Rio Descoberto ou que se defi-nisse regras claras de ocupação, de recolhimento delixo, de tratamento de esgoto entendeu? Por que sim-plesmente você chega num lugar faz um decreto e tiraaquelas pessoas que estão ali, aí vai colocar aquelaspessoas onde? É um impacto social, talvez não vai sermuito pior? E deixar essas pessoas à margem da lei

também sem nenhuma estrutura, sem informação. (Eli-ano)

Segundo Costa (2015), a dinâmica de formação doterritório no DF está intimamente relacionada aosintensos processos de adensamento da malhaurbana e do crescimento da agricultura que, em

conjunto, podem ser considerados os principaiscomponentes das modificações territoriais daredução da área de Cerrado e docomprometimento dos recursos hídricos.

Foi perguntado se havia alguma relação, naprática, entre os moradores e a gestão da Flona.Três moradores responderam que não haviam tidonenhum contato, já os outros três informaram quejá haviam estabelecido contato. Eliano, Marcos eJovane fazem parte da associação de moradoresdo Capãaozinho e Maranatha. A ausência daGestão da Flona na área 3 dificulta a tomada dedecisão e o monitoramento da área, fato queacaba abrindo margem para o não cumprimentodas normas.

[...] hoje, se eu te falar que é mal, eu posso mentir, poiscaso pessoal só a dona Elda que teve comigo, só elaque teve comigo foi pessoal. Hoje eu não tenho contatocom a Flona, não tenho nada contra eles, porque não

estão me perturbando. (Marcos)

Um dos entrevistados explica que pretende seaproximar do conselho gestor e que gostaria departicipar das reuniões:

[...] Muito pouco, vou em algumas reuniões para tratarde regularização da área. Conheço o conselho gestor,mas o pessoal do Maranatha não está participando des-sas reuniões ultimamente, mas eu já conversei com adona Maria do Socorro pra ver se ela me informa das

reuniões próximas que tiverem, pra eu participar. (Elia-no)

Observa-se que já foi desenvolvido algum projetona área, pois Jovane afirma que já fez várias par-cerias com a gestão, principalmente para o com-bate de incêndio na área.

[...] Assim, relação institucional, a gente faz muitaparceria com eles principalmente em relação aocombate ao fogo, questões ambientais no geral,inclusive nós fizemos uma ação aqui com a comunidadetoda junto com o Chico Mendes, distribuímos aqui maisde cem abafadores de fogo pra combate ao fogo. Porenquanto tem efetivamente só essa, o que eu não façomais aqui é dedurar ninguém se vender, se parcelar, seconstruir eu quero ver é o circo pegar fogo, antes devocês virem eu tava pensando que essa chácara ali dafrente era uma chácara só, já tem oito casas dentro,essa parte do Maranatha já não tem o que fazer, vai serespeculação imobiliária. Primeiro que não tem água,essa parte de baixo aqui é mais preservada por que elatem mais recurso hídrico, o pessoal preserva mais,agora a população vai crescendo e precisa de lugar pramorar né? Não tem como iludir que um ou outro não vai

tá parcelando. (Jovane)

Um dos grandes problemas é o parcelamento das

chácaras, que ameaça o futuro da Flona. A maioriados moradores tem consciência do problema,ainda assim eles são a favor da legalização daárea e desafetação da Flona 3. Eles citaram váriosoutros problemas, principalmente no Maranatha,que é a falta de iluminação, acesso à coleta delixo, esgoto e acesso à água tratada, fator que éuma ameaça à Flona, pois acelera a degradaçãodo meio ambiente. A Área 3 da Flona é uma dasmais habitadas.

Na visão de Marcos, o principal problema é a faltade apoio e incentivos e para que isso ocorra alegalização da área seria fundamental.

[...] Aqui seria bom financiamento e pra fazerfinanciamento tinha que ter a legalização da área, agente tá lutando há quantos anos? Eu precisava deiluminação pública, asfaltamento, água potável, não temágua potável porque é cisterna, não tem iluminaçãopública, é ganbiarra, regularização não tem quemcompre a briga.

[...] Quando eles vinham aqui vinham pra bater de testacom a gente, nunca vieram aqui pra abrir mão de nada,pra ajudar em nada, nunca, foi na administração deBrazlândia e falou: o fecha a porta do Maranatha nãoserve nada pro Maranatha e não apoia o Maranathadentro da administração de Brazlândia. Os colegas iambuscar informação não posso te ajudar em nada, que afulana de tal e cicrana teve aqui e pediu que a gente fe-chasse as portas à administração de Brazlândia, não

tem vocês como vizinho. (Marcos)

Outro morador diz que o principal proble-ma é a falta de informação de questões ambientaise sociais.

[...] Eu acho que o principal problema é a informaçãomesmo né? Das pessoas lidarem com a terra e até mes-mo a questão ambiental, crédito e serviços do Estado.

(Eliano)

[...] Principais problemas: aqui tem vários, energia é depéssima qualidade, é tudo ganbiarra, aqui quem nãotiver condições de colocar um transformador na chácaraele não planta, ele não tem iluminação, se der um ventoaqui quem não tem energia na chácara acabou, aqui agente colocou um transformador particular. A gente temvontade que eles regularizem. A gente quer trabalhartudo regularizado né? Mas só que eles não olham praisso, asfalto aqui ônibus escolar não passa, época dechuva o ônibus atola e não passa, aí as crianças não

vão pro colégio. (Gilson)

Já outro morador fala da questão do asfalto eassocia um dos problemas ambientais como oassoreamento que está causando impactos aocórrego.

[...] Questão do asfalto é uma questão importante, por

que o assoreamento aqui é muito grande a enxurradaque desce é muito grande, então leva terra pro córregovizinho, e se eu fosse olhar pra questão ambientalrealmente o parcelamento é visível, eles têmconsciência, a Flona tem feito notificações, mas nãoadianta. Os mais antigos já tinham energia elétrica eucoloquei iluminação aqui anterior à Flona. Quando eucheguei consegui colocar energia aqui. O vizinho aquinão tinha condição de pôr na época e até hoje tá semenergia, então vive todo mundo aqui de ganbiarra, devedar mais ou menos uns duzentos mil reais de prejuízoda CEB né? Todo mundo aqui puxa energia. Transporte,que seria o fundamental, não tem aqui e outra coisa, éilusão achar que vão conter o progresso. O principalacesso a Águas Lindas é a BR-070, são 7 km de terra,então o movimento da estrada é muito grande e seasfaltarem a estrada vai ser um movimento muitogrande e não tem como represar o rio. Mais cedo oumais tarde eles vão ter que ceder esse asfalto, por que

é o principal acesso entre o DF e Goiás. (Jovane)

Durante o questionamento sobre a importância daFlona para a vida dos moradores, três dos entre-vistados responderam que ela é importante, porémnecessita de um bom plano e gestão, para que re-almente funcione na prática, e que é necessáriaoutra área e não a área que eles moram. Outracoisa é que eles não concordam com a formacomo foi criada, sem a consulta das pessoas quejá residiam no local. Outros três responderam queela não é importante: [...] Olha, a gente enxerga claro a Flona como im-portante, não só para minha família, mas para a comuni-dade como um todo, mas o que a gente discorda é des-sa coisa de se criar algo sem nem consultar a comuni-dade ou que no início várias medidas poderiam ter sidotomadas. Essas pessoas estavam chegando aqui aindapoderiam ter pensado numa outra área, agora tem outraquestão também, a gente tem certeza que se não tives-se essa ocupação aqui desses chacareiros isso aqui ti-nha se tornado um aglomerado urbano até porque unsdeputados da época, o Edimar Pirineus, inclusive, erapresidente da Câmara Legislativa ele foi contra a cons-trução da Flona aqui porque queriam transformar isso

aqui em condomínio de luxo (Eliano).

[...] A minha forma de pensar a Flona não precisava tersido criada, órgão pra regularizar, órgão pra fiscalizar jáexistia o Ibama, essas áreas de Flona que eles falam ra-chou o Ibama, teve uma parte Chico Mendes e Ibama,não precisava de ter Instituto Chico Mendes, não preci-sava disso, eu falei pro ouvidor deles lá no ICMBio seeles querem gastar dinheiro façam um projeto, procuremo assentamento Maranatha peguem cada proprietário,exijam que eles reflorestem 20% da área por que nãotem necessidade por que já existe em Brasília uma áreamaior do que o exigido por lei, como reflorestamentocomo proteção ambiental, a única coisa que eu sou con-trariado é que eles fizeram esse Instituto ICMBio praatrapalhar a gente, por que todo mundo que veio aqui

olhar, a minha chácara tem mais de 1 km da água e elesnão podiam apoiar a gente por que alegaram que a gen-te poluía, então quem poluía eram as pessoas que já ti-nham 30, 35 anos na área, então quem poluía eram al-gumas pessoas que o fundo da chácara fazia margemcom o córrego que antigamente se criava porco. Eles in-ventaram esses órgãos aí pra atrapalhar, mas eles vie-

ram, mediram os 30 metros, o povo respeitou (Mar-cos).

[...] A importância é muito grande por que as nas-centes a gente tem que proteger muito. Não está fácil agente ver essas nascentes tudo secando, por que aondetem árvore tem água, eu vou nesse córrego às vezes efico admirado as nascentes brotando debaixo das árvo-res, é coisa de Deus e ainda tem muita gente que vempara esse lugar e derruba tudo, não fica nada, aí secatudo e como é que a gente vai viver? Porque sem água,

vira um desertão aí (Gilson).

Há também moradores que apresentam percepçãodiferente, vêem a Flona como um entrave que pre-judica a produção.

[...] Não, sabe por quê? Porque aqui nósnão precisamos disso. Por que vamos querer mata aqui,todo mundo tá plantando pra que nós vamos querer amata se nós não vamos comer dela. O que eu vejomuito que aqui não teve é gente trabalhando e tão

conseguindo. (Estelita)

É possível observar o desconhecimento dosmoradores da importância que uma Flona oferecepara a humanidade. É preciso destacar a ausênciados gestores do ICMBio com programas deeducação ambiental na área, para aproximar osmoradores com a Flona.

[...] Eu acho que se o governo levasse a Flona a sério,encarando essa questão social ela seria muito boa efuncionaria direitinho, inclusive há uma demanda nossano legislativo de retirar de dentro da Flona essas áreasocupadas e efetivarem a Flona nas áreas desocupadas,dessa forma, eu acreditaria que a Flona pudesseacontecer. Tem muita área desocupada. Na verdade,acho que 40% só dessa área já está ocupada e 60% édesocupada e essa área desocupada sofre pressãotambém e mais cedo ou mais tarde vai perder inclusiveesse 60% desocupados se não houver uma sanidade doGoverno em relação a isso aqui. Se efetivassem a Flonae tivesse fiscalização, esses parcelamentos queacontecem todo dia não estariam acontecendo, aí apessoa que compra, compra até de boa-fé, pois vê todo

mundo construindo e pensa que tá liberado. (Jovane)

Conclusão

Durante a pesquisa verificou-se que na percepçãodos entrevistados o ICMBio não abre espaço paradiálogo com as comunidades que residem na Flo-na. A falta de espaços de diálogos entre o PoderPúblico e os atores sociais dificulta a resoluçãodos conflitos socioambientais e agrava os danosambientais a área. Conhecer a percepção ambiental dos moradoresda Flona 3 configurou-se em instrumento degestão muito importante, pois foi possível observarque os moradores da Flona 3 são contrários àcriação da Flona, e mesmo sendo contráriosestão abertos para conversar com o órgão gestore a entrar com possíveis ações que visem amediação dos conflitos e a resolução dos impactoscausados na área.

O entorno é caracterizado por chácaras quepraticam agricultura familiar com grandediversidade de produtos e em algumas sãoutilizados defensivos agrícolas, embora algumasfamílias pratiquem a agricultura é possívelobservar que a maioria tem outro emprego e nãotem nenhuma relação com a terra, tendo escolhidoo local apenas para viver mais tranquilamente. Foiobservado que não há união para a resolução dosproblemas enfrentados na área, já que osmoradores não conversam entre si e reclamamque a associação de moradores não os representacomo deveria. Além desses problemas, foiobservado que os moradores não cumprem comas normas da Flona, principalmente quando setrata de reforma e construção.

Existem muitas demandas e cobranças dosmoradores, eles afirmam que os gestores nãoaparecem na área e que nunca procuraram osmoradores para conversar, além de proibiremqualquer tipo de serviço básico a comunidadecomo água, luz e asfalto, posto de saúde, éprovável que a Gestão da Flona tenha receio empermitir esses serviços à comunidade pelo fato decriar expectativas futuras de que a área sejaregularizada e desafetada.

A ausência de informação sobre a Flona e afiscalização são problemas muito graves quefazem com que a pressão sobre essa UCaumente. É necessário haver um estreitamento narelação entre os gestores e os moradores paraque possam, em conjunto, tomar as decisões naconstrução de medidas que venham impedir aexpansão da urbanização da área. É necessáriatambém a elaboração de projetos de educaçãoambiental para sensibilizar esses atores sociais,da importância da preservação da área.

Ainda que faltem informações e orientações paraos moradores de Capãozinho e Maranatha, foipossível observar que os moradores reconhecema importância de haver espaços protegidos.

Unidades de conservação (UCs) são importantesestratégias para a conservação da biodiversidade.No entanto, é essencial que tenham umplanejamento adequado que possibilite cumprircom os objetivos para o quais foram propostas eesse objetivo só pode ser alcançado se houveraproximação dos sujeitos com os gestores da áreaprotegida.

Agradecimentos:

Primeiramente a Deus, somente ele sabede todas as dificuldades que passei para chegaraté aqui.

Ao meu orientador João Câmara, aos meuspais Manoel Costa e Maria Cleuza por todo apoio,ao Ricardo Lopes amigo que me incentivou paraconcluir este artigo, a Brenda Morais e Marcão, aoChefe da Floresta Nacional de Brasília a todos osamigos que me apoiaram ao longo dessatrajetória.

A equipe de professores da faculdadeICESP pelo carinho, dedicação e todoconhecimento repassado.

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