COMPÊNDIO POLITICAS E PROMOÇÃO EM SAÚDE

Embed Size (px)

Citation preview

[PS-GRADUAO]Lato Sensu

POLTICAS E PROMOO EM SADE PBLICASade Pblica e Farmacologia

POLTICA E Pgina |2 PROMOO EM SADE PBLICA

COMPNDIO APOSTILADO DA DISCIPLINA:

POLTICAS E PROMOO EM SADE PBLICA

CURSO DE PS-GRADUAO EM: SADE PBLICA E FARMACOLOGIA

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

POLTICA E Pgina |3 PROMOO EM SADE PBLICA

Elaborado por: Jaqueline Amorim Enfermeira e especialista em Sade Pblica Reviso por: Daniel Carana da Motta

Psicanalista Clnico, Bacharel em teologia, cursado em psicologia cognitiva, psgraduado em Psicopedagogia Clnica e Institucional e especialista em Comunicao Social.

Barreiras BA. junho de 2011

P S G R A D U A OSade Pblica e Farmacologia

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

www.pronades.com / www.cetai.com.br

POLTICA E Pgina |4 PROMOO EM SADE PBLICA

FACULDADE JOO CALVINO BARREIRAS BAwww.cetai.com.brCoordenadoria de Pesquisa e Ps-Graduao LATO-SENSO. MEC portaria 135. 13/01/06 Barreiras Ba. 77-36131514 CNPJ: 04.714.398/00189

(81)9788-0513

Programa Nacional de Democratizao do Ensino Superior www.pronades.com

DOCUMENTO DE PROPRIEDADE DA FACULDADE JOO CALVINO www.pronades.com email [email protected] / www.cetai.com.br

TODOS OS DIREITOS RESERVADOS Nos termos da legislao sobre direitos autorais, proibido a reproduo total ou parcial deste documento, por qualquer forma ou meio eletrnico ou mecnico, inclusive por processo xerogrficos de fotocpia e de gravao sem a permisso expressa e por escrito da Faculdade Joo Calvino.

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

POLTICA E Pgina |5 PROMOO EM SADE PBLICA

Nota explicativa Prezado Ps-graduando: Quando se trata do futuro, acreditamos que a educao v alem da simples busca de novos conhecimentos. Para ns, o crescimento pessoal esta relacionado ao desenvolvimento integral do ser; que segundo nossa compreenso e de outros autores, esta fundamentado em cinco tpicos: intelectual, emocional, fsico, social e espiritual. E, afim de que esse conceito se torne uma real verdade, enfatizamos o uso da razo, base do senso crtico e reflexivo, elementos norteadores da busca e encontro da verdade pura, e, sem os quais no pode haver a integralidade do ser. Assim, dedicamo-nos a pesquisar, selecionar, extrair e agrupar em um nico instrumento literrio de estudo uma coleo dos melhores trechos de pesquisas, artigos, obras monogrficas e teses doutorais de bons autores que hoje so referncias da determinada rea do conhecimento. E para tornar a leitura mais agradvel e empolgante alm de buscar uma ordem de apresentao mais lgica da transmisso dos conhecimentos, inserimos nessa coleo alguns comentrios que complementam e formam uma estrutura mais bem elaborada para a compreenso da determinada rea do conhecimento. A esse conjunto selecionado de partes de artigos, pesquisas e estudos comentados chamamos de Compndio Apostilado e esperamos que possa servir de orientao na construo profunda de novos conhecimentos e que agora passamos s suas mos. Receba com carinho o Compndio Apostilado da disciplina de Polticas e Promoo em Sade Pblica. Sucesso e bons estudos! A COORDENAO Daniel Carana da MottaP S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

POLTICA E Pgina |6 PROMOO EM SADE PBLICA

Sumrio

Desenvolvimento histrico da sade no Brasil......................................................

07 28 39 46 52

Promoo da sade e qualidade de vida..................................................................... As Conferncias Internacionais sobre Promoo da Sade................................. Polticas pblicas saudveis, intersetorialidade e municpios saudveis.................

Legislao do SUS - Sistema nico de Sade...............................................................58

LEI ORGNICA DA SADE LOS (Lei 8.080/1990 e Lei 8.142/1990)................... LEI ORGNICA DA SADE N 8.142 DE 28/12/1990................................................

64

NORMA OPERACIONAL DA ASSISTNCA SADE (NOASSUS 01/2001 Portaria GM / MS N 95, de 86 26/01/2001)..................................................................... PORTARIA N 399/GM 2006....................................... DE 22 DE FEVEREIRO DE

72

Referncias Bibliogrficas P S G R A D U A OSade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

POLTICA E Pgina |7 PROMOO EM SADE PBLICA

DESENVOLVIMENTO HISTRICO DO SISTEMA NICO DA SADE NO BRASIL

INTRODUO Este texto tem por objetivo discutir a evoluo das polticas de sade no Brasil, como subsdio para uma melhor compreenso dos aspectos histricos que influenciaram a conformao de um sistema de sade no Brasil reconhecidamente ineficaz e ineficiente no enfrentamento dos problemas de sade da populao. Esta situao crtica imps a necessidade de mudanas nesse sistema e desencadeou o processo de implementao da reforma sanitria no Brasil, que tem como perspectiva fundamental a construo do Sistema nico de Sade. Para esta anlise histrica sero apresentados, organizados por perodos, excertos de vrios outros textos de autores que se ocuparam deste tema, com a finalidade de apresentar uma sntese de contribuies que julgamos significativas para o debate sobre as polticas de sade no Brasil. Iniciaremos a discusso abordando a concepo de polticas pblicas, onde se inserem as polticas de sade: Entendemos as polticas pblicas como sendo o conjunto das diretrizes e referenciais tico-legais adotados pelo Estado para fazer frente a um problema que a sociedade lhe apresenta. Em outras palavras, poltica pblica a resposta que o Estado oferece diante de uma necessidade vivida ou manifestada pela sociedade. Ao responder, o Estado empresta ao problema maior ou menor importncia, define seu carter (social, de sade, policial etc.), lana mo de instrumentos para seu equacionamento, define responsabilidades (ministrios, Congresso, Judicirio etc.) e adota, ou no, planos de trabalho ou programas" (Teixeira, 1997) Portanto as polticas pblicas so gestadas e implementadas pelo Estado para o enfrentamento de problemas sociais, dentre eles aqueles relacionados sade. fcil perceber que existe uma discrepncia entre o conjunto de problemas sociais e a capacidade do Estado de enfrent-los. Cabe ento perguntar como o Estado atribui ao

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

POLTICA E Pgina |8 PROMOO EM SADE PBLICA

problema maior ou menor importncia, ou seja, como o Estado prioriza os problemas que sero enfrentados por meio de polticas pblicas em determinado perodo?(...)As diversas definies de polticas pblicas atendem a diversos objetivos de estudo. Para os estudos sobre a histria das polticas, pode ser til adotar definies bastante genricas, como a de Lemieux, que a concebe como '(...) tentativas de regular situaes que apresentam problemas pblicos, situaes essas afloradas no interior de uma coletividade ou entre coletividades. (apud Vianna, 1997:207).

Ao falar em tentativa, Lemieux pretende enfatizar que '(...) o ato de normatizar uma situao pode ser visto de diferentes formas pelos atores sociais envolvidos com uma determinada poltica. Um problema pblico pode ser considerado, ao mesmo tempo, como excessivamente regulado por um dos atores e no regulado por outro, dependendo do tipo de interferncia que este problema tenha sobre a vida de cada um' (apud Vianna, 1997:207). Uma definio desse tipo ressalta que as polticas pblicas so sempre objeto de disputa entre diversos grupos, disputa que estende-se a prpria deciso do que deve ser considerado em certo momento como um problema pblico e, portanto, deve ser alvo da ao regulatria do Estado. Em outros termos, h uma agenda de problemas pblicos, isto , problemas que devem ser alvo de polticas pblicas, agenda esta que continuamente negociada, tanto no que concerne eventual incluso de um novo tema no conjunto de problemas pblicos, como no que se refere sua importncia relativa no interior da agenda. Da mesma forma que se pode falar em uma agenda das polticas pblicas em geral, pode-se falar em agendas especficas de cada instituio ou agncia que compe o Estado nos mais diversos nveis de governo. Aqui tambm ocorrem demandas pela modificao da agenda dessas diferentes instituies governamentais. (...) nesse sentido que podemos compreender qualquer poltica pblica como uma resposta dada pelo Estado a um conjunto de demandas postas pela sociedade." (Mattos, 1999). Aqui, aparece um conceito importante para o entendimento do processo de implementao de polticas pblicas, que o conceito de ator social, entendido como um coletivo de pessoas ou, no seu extremo, uma personalidade que participa de determinada situao, tem organizao minimamente estvel, capaz de intervir nesta situao e tem um projeto. O conceito de problema tambm fundamental (...). Podese entender como problema uma necessidade no satisfeita, desde que se tenha conscincia desta e o desejo de satisfaz-la. Cabe observar que, em determinadas situaes, o que problema para um ator pode ser oportunidade para outro". (Acurcio et al., 1998). Portanto, a elaborao, implementao e resultados obtidos por determinada poltica pblica tem estreita relao com a disputa de projetos dos diversos atores sociais interessados no(s) problema(s) a ser(em) enfrentado(s) por esta poltica. Assim, cada ator social ao escolher o(s) problema(s), delimit-lo(s) e construir as estratgias de ao a serem desenvolvidas no mbito institucional, expressa um projeto de poltica, articulado determinadas foras sociais.Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

POLTICA E Pgina |9 PROMOO EM SADE PBLICA

A poltica de sade de uma poca reflete o momento histrico no qual foi criada, a situao econmica, os avanos do conhecimento cientfico, a capacidade das classes sociais influenciarem a poltica etc. (CEFOR, s.d.). O xito e o grau de implementao de seu(s) projeto(s) d a dimenso da capacidade de determinados atores/foras sociais influenciarem a poltica de sade em um contexto histrico, em detrimento de outros atores e projetos. Sendo assim, pode ser til recuperar a dimenso simblica da cidadania, enquanto valor a orientar (ou no) as opes polticas dos sujeitos sociais fundamentais quanto elaborao, implementao e/ou reivindicao de polticas sociais. A idia da cidadania ocupa um lugar central no iderio e na institucionalidade poltica democrticas, por sua associao com o valor da liberdade e com os direitos dele derivados. Em sua verso liberal-democrtica, a idia da cidadania foi , talvez, mais bem sistematizada por T.H. Marshall, que a compreende como um composto de trs elementos: civil, poltico e social. Os direitos que materializam a liberdade individual ('liberdade de ir e vir, de imprensa, de pensamento e f, direito propriedade, a concluir contratos vlidos e de defender e afirmar todos os direitos em termos de direito justia') constituem o ncleo civil da cidadania, que tem por fiadores os tribunais. No campo poltico, afirma-se o 'direito participao no exerccio do poder', como 'membro ou eleitor dos membros das instituies investidas de poder poltico, como o Parlamento e demais cmaras representativas ou conselhos de governo'. J os direitos sociais no envolvem definio precisa, pois esto relacionados ao padro de desenvolvimento das sociedades, implicando desde o 'direito a um mnimo de bem-estar econmico e segurana' at o direito 'participao total' nos nveis de 'vida civilizada' prevalentes em cada sociedade. Direitos que se exercem, fundamentalmente, atravs do sistema educacional e dos servios sociais. Debatido e criticado, mas igualmente difundido e arraigado, o chamado Welfare State uma referncia indispensvel para se pensar o Estado contemporneo. Quase todos os pases possuem mecanismos pblicos de proteo social. De um ponto de vista formal, eles se assemelham muito (so, em geral programas previdencirios, assistenciais e de sade); porm quando examinados sob a tica de como operam (formas de financiamento, cobertura, tipos de programas, acesso etc), se diversificam em inmeras modalidades. (...) poltica, entretanto, a dimenso essencial prpria existncia do Welfare State: a constituio de uma esfera pblica inclusiva. A mobilizao popular por direitos sociais esbarra em obstculos to mais graves quanto menos a sociedade se apresenta integrada politicamente. 'Estar no mesmo barco', noo (compartilhada por todos) que embasa a solidariedade do Welfare State social-democrtico, segundo Esping-Andersen, requer que todos realmente estejam, e se reconheam como estando, no mesmo barco. A despeito do aparente etnocentrismo de suas formulaes (a cronologia inglesa, que descreve, pode ser entendida at como metfora), Marshall fornece um quadro conceitual valioso quando concebe cidadania como incorporao progressiva de direitos civis, polticos e sociais. O suposto bsico no que, para tornarse efetiva, a cidadania tenha que seguir formalmente aqueles passos, e sim que a efetividade da cidadania significa a amplificao da medida de igualdade representada pelo pertencimento comunidade, que se estende (a todos) e se enriquece (pelos ditos direitos). 'A cidadania um status concedido queles que so membros integrais de umaSade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

POLTICA E P g i n a | 10 PROMOO EM SADE PBLICA

comunidade. Todos aqueles que possuem o status so iguais em relao aos direitos e obrigaes pertinentes ao status' (...) Marshal descreveu uma seqncia de expanso das prerrogativas (civis, polticas e sociais). Ela tem importncia, na medida que se entenda a cidadania como contrapartida do Welfare State. (Vianna, 1991). As profundas, amplas e velozes transformaes observadas no mundo ao longo das ltimas trs dcadas, principalmente quelas originadas no campo da poltica e economia e denominadas de "globalizao", tm evidenciado a necessidade de transformao do Estado e por conseqncia produzido um acalorado debate sobre a abrangncia e direcionalidade das polticas pblicas. "O reconhecimento desta necessidade est longe de significar o perfilhamento aos argumentos do discurso neo-liberal que presidiu o debate na dcada anterior, preconizando a devoluo ao mercado no apenas das funes produtivas como tambm de muitas funes regulatrias e, em particular, a ruptura com o padro de solidariedade que caracterizou a organizao social e orientou a interveno estatal at o fim dos anos setenta e que se convencionou chamar 'Welfare State'. Desde os primeiros momentos do processo de transformao produtiva, quando a crise do padro fordista se explicitou, o Welfare State foi responsabilizado pelas dificuldades financeiras com que se defrontavam os diversos Estados nacionais. A crise de financiamento apontava caminhos que envolviam a restrio de direitos sociais e de benefcios como nica alternativa de sua superao, e a maior parte das medidas de poltica, em diferentes pases, se pautou por este diagnstico. No entanto, se nos pases desenvolvidos a reorganizao do Estado tem se realizado sem que os direitos sociais sejam afetados em seus aspectos essenciais, a questo assume outros contornos em pases como o Brasil, em que a crise no plano econmico se associou a uma crise do regime poltico, coincidindo com o incio do processo tardio de construo da cidadania. Aqui, as conquistas ainda esto se consolidando e suas foras sociais de sustentao tm densidade que pode ser ainda insuficiente para sustent-las. Construir o NOVO significa buscar estratgias viabilizadoras de polticas pblicas includentes, tendentes universalizao, direcionadas construo de uma sociedade mais equnime e menos desigual, enfrentando as tendncias, e no subordinando-se a elas. Mais do que hospitais, o que precisa ser assegurado aos cidados qualidade de vida. Essa mais uma das razes pelas quais a existncia de um sistema pblico estatal de ateno sade importante numa sociedade como a brasileira. Ele deve ser tambm um espao catalizador de aes multisetoriais, promotor da articulao das polticas pblicas necessrias para assegurar a sade e interromper os ciclos de transmisso de doenas. Numa sociedade que tem os nveis de excluso da nossa, em que pelos menos vinte por cento da populao sobrevive em condies extremamente precrias, em decorrncia de um processo histrico de desenvolvimento que produziu uma das mais desiguais distribuies de renda do mundo, a garantia do direito sade no pode prescindir de uma estratgia integrada de ao estatal. E se pensarmos nas possibilidades de agravamento desse quadro determinadas pelo processo de transformao da economia mundial num futuro prximo, mais importante ainda se afigurar a ao estatal no equacionamento da questo social. Nesse contexto, que caractersticas deve ter o sistema de sade para que a populao brasileira possa exercer o seu direito?

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

POLTICA E P g i n a | 11 PROMOO EM SADE PBLICA

- Deve ser acessvel a todo cidado, independente de sua capacidade financeira ou de sua forma (ou possibilidade) de insero no mercado de trabalho; - Deve ser capaz de responder s exigncias postas pela transformao do quadro demogrfico e do perfil epidemiolgico, garantindo a adequao das aes s demandas postas pelos diferentes quadros sanitrios, nas diversas regies do pas; - Deve ter como objetivo a construo e a preservao da sade e no apenas a cura da doena; - Deve operar de modo articulado, sujeito aos mesmos princpios e diretrizes, viabilizando a integralidade dos cuidados com sade e oferecendo servios de boa qualidade; - Deve, para assegurar tudo isso, contar com um processo decisrio participativo e submeter-se ao controle dos sujeitos sociais. Em resumo, acesso universal, integralidade da ateno, nfase em aes de promoo e proteo da sade, descentralizao, participao social. Exatamente o que a legislao brasileira hoje em vigor - e ainda no inteiramente implementada prope para o SUS." (Barros, 1996) O processo de construo do Sistema nico de Sade resultante de um conjunto de embates polticos e ideolgicos, travados por diferentes atores sociais ao longo dos anos. Decorrente de concepes diferenciadas, as polticas de sade e as formas como se organizam os servios no so fruto apenas do momento atual, ao contrrio, tm uma longa trajetria de formulaes e de lutas. A busca de referncias histricas do processo de formulao das polticas de sade, e da vinculao da sade com o contexto poltico mais geral do pas, pode contribuir para um melhor entendimento do momento atual e do prprio significado do SUS." (Cunha & Cunha, 1998) Nesta perspectiva, passamos a discutir alguns aspectos fundamentais da evoluo histrica das polticas de sade no Brasil, neste sculo, sintetizados de acordo com seu perodo de ocorrncia.

A primeira repblica (1889 - 1930) Durante a Repblica Velha (1889-1930) o pas foi governado pelas oligarquias dos estados mais ricos, especialmente So Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. A cafeicultura era o principal setor da economia, dando aos fazendeiros paulistas grande poder de deciso na administrao federal. (...) Os lucros produzidos pelo caf foram parcialmente aplicados nas cidades. Isso favoreceu a industrializao, a expanso das atividades comerciais e o aumento acelerado da populao urbana, engrossada pela chegada dos imigrantes desde o final do sculo XIX" (Bertolli Filho, 1996).(...) com a abolio da escravido em 1888, consolidou-se o processo de substituio da mo de obra escrava pela assalariada, de origem europia. (...) Na industria nascente tambm utilizou-se mo de obra europia, que chegou da

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

POLTICA E P g i n a | 12 PROMOO EM SADE PBLICAEuropa carregada de idias anarquistas. Foram freqentes os protestos e greves neste perodo. No que se refere situao de sade, as epidemias continuavam a matar a escassa populao, diminuindo o nmero de pessoas dispostas a vir para o Brasil. Por isso, o governo da poca foi obrigado a adotar algumas medidas para melhorar esta situao. (CEFOR, s.d.). Nesse perodo, foram criados e implementados os servios e programas de sade pblica em nvel nacional (central). frente da diretoria Geral de Sade Pblica, Oswaldo Cruz, ex-aluno e pesquisador do Instituto Pasteur, organizou e implementou progressivamente, instituies pblicas de higiene e sade no Brasil. Em paralelo, adotou o modelo das 'campanhas sanitrias', destinado a combater as epidemias urbanas e, mais tarde, as endemias rurais.(...) Em termos de poder, o prprio nome sugere que o modelo campanhista de inspirao blica, concentra fortemente as decises, em geral tecnocrticas, e adota um estilo repressivo de interveno mdica nos corpos individual e social. (Luz, 1991).

A crescente interveno mdica nos espaos urbanos foi recebida com desconfiana e medo pela populao. A retirada fora da populao dos ambientes a serem saneados foi constantemente acompanhada pela vigilncia policial, pois temia-se que o povo se revoltasse, agredindo os agentes sanitrios. Alm disso, muitas vezes a polcia agia com violncia sem motivo, reproduzindo as formas repressoras comumente empregadas pelo regime oligrquico contra os protestos coletivos como passeatas e greves. (Bertolli Filho, 1996). A oposio ao modo como eram feitas (as campanhas) pode ser evidenciada na revolta contra a vacina obrigatria (contra varola), em 1904. Liderados por um grupo de cadetes positivistas que eram oposio ao governo, muitos se revoltaram acusando o governo de desptico, de devassar a propriedade alheia com interdies, desinfeces, da derrubada macia de bairros pobres, de arrombamentos de casas para nelas entrarem fora. A revolta reprimida pois a questo sade ainda era concebida como uma questo policial. Impressionado e desgastado com os acontecimentos, o governo revogou a obrigatoriedade da vacina, tornando-a opcional para todos os cidados. (Bertolli Filho, 1996). No campo da assistncia mdica individual, as classes dominantes continuaram a ser atendidas pelos profissionais legais da medicina, isto , pelos 'mdicos de famlia'. O restante da populao buscava atendimento filantrpico atravs de hospitais mantidos pela igreja e recorria medicina caseira. (CEFOR, s.d.).O surgimento da Previdncia Social no Brasil se insere num processo de modificao da postura liberal do Estado frente problemtica trabalhista e social, portanto, num contexto poltico e social mais amplo. Esta mudana se d enquanto decorrncia da contradio entre a posio marcadamente liberal do Estado frente s questes trabalhistas e sociais e um movimento operriosindical que assumia importncia crescente e se posicionava contra tal postura. Esta tambm a poca de nascimento da legislao trabalhista brasileira. Em 1923 promulgada a lei Eloy Chaves, que para alguns autores pode ser definida como marco do incio da Previdncia Social no Brasil. No perodo Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

POLTICA E P g i n a | 13 PROMOO EM SADE PBLICAcompreendido entre 1923 e 1930 surgem as Caixas de Aposentadoria e Penses - CAPs. Eram organizadas por empresas, de natureza civil e privada, responsveis pelos benefcios pecunirios e servios de sade para os empregados de empresas especficas. As CAPs eram financiadas com recursos dos empregados e empregadores e administradas por comisses formadas de representantes da empresa e dos empregados. Cabia ao setor pblico apenas a resoluo de conflitos. No modelo previdencirio dos anos 20 a assistncia mdica vista como atribuio fundamental do sistema, o que levava, inclusive, organizao de servios prprios de sade. Caracteriza ainda este perodo, o elevado padro de despesa. Estas duas caractersticas sero profundamente modificadas no perodo posterior. (Cunha & Cunha, 1998).

A Era Vargas (1930 - 1945) A revoluo de 1930 marcou o fim da hegemonia poltica da classe dominante ligada exportao do caf. A crise de 1929 afetou as exportaes, provocando uma enorme queda nos preos do caf. O governo, impossibilitado de continuar a exercer a poltica de proteo aos preos do caf, devido crise que afetava os cofres pblicos, estava perdendo legitimidade. Assim, em 1930 ocorreu a revoluo, liderada por fraes da classe dominante que no estavam ligadas exportao de caf. Alm disso, o movimento contou com o forte apoio de camadas mdias urbanas, como intelectuais, profissionais liberais, militares, particularmente os tenentes.Investido na Presidncia da Repblica pela revoluo de 1930, Getlio Vargas procurou de imediato livrar o Estado do controle poltico das oligarquias regionais. Para atingir este objetivo promoveu uma ampla reforma poltica e administrativa (...) suspendeu a vigncia da Constituio de 1891 e passou a governar por decretos at 1934, quando o Congresso Constituinte aprovou a nova Constituio. As dificuldades encontradas para governar democraticamente levaram Vargas a promover uma acirrada perseguio policial a seus opositores e aos principais lderes sindicais do pas, especialmente a partir de 1937, quando foi instituda a ditadura do Estado Novo. Durante todo o seu governo - que durou at 1945 - Vargas buscou centralizar a mquina governamental e tambm bloquear as reivindicaes sociais. Para isso recorreu a medidas populistas, pelas quais o Estado se apresentava como pai, como tutor da sociedade, provendo o que julgava ser indispensvel ao cidado. As polticas sociais foram a arma utilizada pelo ditador para justificar diante da sociedade o sistema autoritrio, atenuado pela 'bondade' do presidente. (Bertolli Filho, 1996) (...) o governo criou o Ministrio do Trabalho, atrelando a ele Sindicatos e elaborou ampla legislao trabalhista. Regulamentando a relao entre o capital e o trabalho, o Estado criou condies indispensveis para que a economia enfrentasse uma nova etapa, baseada na industrializao com objetivo de substituir importaes. (...) No plano da poltica de sade, pode-se identificar um processo de centralizao dos servios que objetivava dar um carter nacional a esta poltica. Nesta poca, uniformizou-se a estrutura dos departamentos estaduais de sade do pais e houve um relativo avano da ateno sade para o interior, com a multiplicao dos servios de sade. (CEFOR, s.d.) Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

POLTICA E P g i n a | 14 PROMOO EM SADE PBLICA"Em relao s aes de sade coletiva, esta a poca do auge do sanitarismo campanhista.(...) No perodo 38/45 o Departamento Nacional de Sade reestruturado e dinamizado, articulando e centralizando as atividades sanitrias de todo o Pas. Em 1942 criado o Servio Especial de Sade Pblica - SESP, com atuao voltada para as reas no cobertas pelos servios tradicionais." (Cunha & Cunha, 1998). (...) compreendendo a conjuntura de ascendncia e hegemonia do Estado populista, observamos a criao dos institutos de seguridade social (institutos de Aposentadorias e Penses, IAPs), organizados por categorias profissionais. Tais institutos foram criados por Getlio Vargas ao longo dos anos 30, favorecendo as camadas de trabalhadores urbanos mais aguerridas em seus sindicatos e mais fundamentais para a economia agroexportadora at ento dominante. Ferrovirios, empregados do comrcio, bancrios, martimos, estivadores e funcionrios pblicos foram algumas categorias favorecidas pela criao de institutos. Todas constituam pontes com o mundo urbano-industrial em ascenso na economia e na sociedade brasileira de ento. (Luz, 1991). Diferentemente das CAPs, a administrao dos IAPs era bastante dependente do governo federal. O conselho de administrao, formado com a participao de representantes de empregados e empregadores, tinha uma funo de assessoria e fiscalizao e era dirigido por um presidente, indicado diretamente pelo Presidente da Repblica. H uma ampliao da Previdncia com a incorporao de novas categorias no cobertas pelas CAPs anteriormente. (...) Do ponto de vista da concepo, a Previdncia claramente definida enquanto seguro, privilegiando os benefcios e reduzindo a prestao de servios de sade. (...) Caracterizam esta poca a participao do Estado no financiamento (embora meramente formal) e na administrao dos institutos, e um esforo ativo no sentido de diminuir as despesas, com a consolidao de um modelo de Previdncia mais preocupado com a acumulao de reservas financeiras do que com a ampla prestao de servios. Isto faz com que os supervits dos institutos constituam um respeitvel patrimnio e um instrumento de acumulao na mo do Estado. A Previdncia passa a se configurar enquanto 'scia' do Estado nos investimentos de interesse do governo. (Cunha & Cunha, 1998).

O perodo de redemocratizao (1945 - 1964) A vitria dos Estados Unidos e dos Aliados na Segunda Guerra Mundial teve imensa repercusso no Brasil. Grandes manifestaes populares contra a ditadura acabaram resultando, em outubro de 1945, na deposio de Getlio Vargas e, no ano seguinte, na elaborao de uma Constituio democrtica de inspirao liberal. A partir de ento e at 1964, o Brasil viveu a fase conhecida como perodo de redemocratizao, marcado pelas eleies diretas para os principais cargos polticos, pelo pluripartidarismo e pela liberdade de atuao da imprensa, das agremiaes polticas e dos sindicatos. Mesmo sob regime democrtico, a poltica populista inaugurada por Vargas foi mantida. Os presidentes da Repblica continuaram a buscar apoio popular com medidas demaggicas, destinadas mais a firmar sua imagem como 'pais do povo' do que aSade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

POLTICA E P g i n a | 15 PROMOO EM SADE PBLICA

resolver de fato os grandes problemas da populao. Os movimentos sociais, por sua vez, exigiam que os governantes cumprissem as promessas de melhorar as condies de vida, de sade e de trabalho. Neste contexto, a dcada de 50 foi marcada por manifestaes nacionalistas, que procuravam firmar o pas como potncia capaz de alcanar seu prprio desenvolvimento econmico, independente das presses internacionais e especialmente do imperialismo norte-americano. Ao mesmo tempo, houve um forte crescimento da entrada de capital estrangeiro na economia nacional, favorecendo a proposta desenvolvimentista, isto , de modernizao econmica e institucional coordenada pelo Estado. Esta poltica teve como principal personagem o presidente Juscelino Kubitscheck, que governou o pas de 1956 a 1961." (Bertolli Filho, 1996). No campo da sade pblica vrios orgos so criados. Destaca-se a atuao do Servio Especial de Sade Pblica - SESP, criado no perodo anterior, em 1942, em decorrncia de acordo com os EUA. O SESP visava, principalmente, a assistncia mdica dos trabalhadores recrutados para auxiliar na produo da borracha na Amaznia e que estavam sujeitos malria. A produo de borracha era necessria ao esforo de guerra dos aliados na 2 guerra. Criou-se tambm o Ministrio da Sade, em 1953. As aes na rea de sade pblica se ampliaram a ponto de exigir uma estrutura administrativa prpria. Neste perodo, os sanitaristas discutiam sobre poltica de sade, refletindo o debate que acontecia sobre economia. Havia de um lado aqueles que achavam que as condies de sade melhorariam se fossem utilizadas tcnicas e metodologias adequadas, de outros pases. O SESP era um exemplo deste grupo, pois, no incio, a estrutura dos servios era sofisticada e cara, semelhante estrutura nos Estados Unidos. De outro lado haviam os sanitaristas que buscavam uma prtica articulada com a realidade nacional. Mas por muitos anos, as idias do primeiro grupo influenciaram a prtica do governo." (CEFOR, s.d.). Nessa mesma poca o Brasil passa a ser influenciado pelas ideias de seguridade social que so amplamente discutidas no cenrio internacional ao final da II Guerra Mundial, em contraposio ao conceito de seguro da poca anterior. As aes de previdncia so agora caracterizadas pelo crescimento dos gastos, elevao das despesas, diminuio de saldos, esgotamento de reservas e dficits oramentrios.(...) As explicaes para tais mudanas podem ser colocadas enquanto resultado de uma tendncia natural (maior nmero de pessoas recebendo benefcios, uma vez que esta a poca de recebimento de benefcios dos segurados incorporados no incio do sistema); como tambm de mudanas de posies da Previdncia Social (desmontagem das medidas de conteno de gastos dos anos 30/45; crescimento dos gastos com assistncia mdica, que sobe de 2,3% em 45 para 14,9% em 66; crescimento dos gastos com benefcios, em funo do aumento de beneficirios, de mudanas nos critrios de concesso de benefcios e no valor mdio destes). (Cunha & Cunha, 1998).

Quanto a assistncia mdica, os principais avanos ficaram por conta da luta dos sindicatos para que todos os IAPs prestassem assistncia mdica aos seus associados.

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

POLTICA E P g i n a | 16 PROMOO EM SADE PBLICA

Em 1960 aprovada a lei que iguala os direitos de todos os trabalhadores, mas ela no posta em prtica. O prprio movimento sindical no via com bons olhos a unificao dos institutos pois isto poderia nivelar por baixo a qualidade dos servios. Muitos deputados tambm estabeleciam seus vnculos com uma ou outra categoria, em cima da diferenciao dos institutos. Neste perodo, os IAPs que possuam recursos suficientes construram hospitais prprios. Surgiram tambm os primeiros servios mdicos particulares contratados pelas empresas, insatisfeitas com o atendimento do Instituto dos Industririos - IAPI. Tem-se a a origem dos futuros convnios das empresas com grupos mdicos conhecidos como 'medicina de grupo', que iriam caracterizar a previdncia social posteriormente. O perodo caracteriza-se tambm pelo investimento na assistncia mdica hospitalar em detrimento da ateno primria (centros de sade), pois aquele era compatvel com o crescente desenvolvimento da industria de equipamentos mdicos e da industria farmacutica. (CEFOR, s.d.).Se as condies de vida da maior parte da populao no pioraram, a conscincia da dureza dessas condies foi se tornando cada vez mais clara no perodo. Mas, em presena da impossibilidade de solues reais por parte das instituies, essa conscincia originou um impasse nas polticas de sade. Ele foi percebido, alis, como um impasse estrutural, envolvendo o conjunto das polticas sociais e a prpria ordem institucional e poltica. Uma sada histrica para esse impasse foi proposta pelo grande movimento social do incio dos anos 60 no pas, liderado e conduzido pelas elites progressistas que reivindicavam 'reformas de base' imediatas, entre as quais uma reforma sanitria consistente e conseqente. Mas a reao poltica das foras sociais conservadoras levou ao golpe militar de 1964. (Luz, 1991).

O governo militar ( 1964 - 1980)No dia 31 de maro de 1964, um golpe de Estado liderado pelos chefes das Foras Armadas colocou fim agonizante democracia populista. Sob o pretexto de combater o avano do comunismo e da corrupo e garantir a segurana nacional, os militares impuseram ao pas um regime ditatorial e puniram todos os indivduos e instituies que se mostraram contrrios ao movimento autoproclamado Revoluo de 64. Classificados como agentes do comunismo internacional, foram perseguidos muitos lderes polticos, estudantis, sindicais e religiosos, que lutavam pela melhoria das condies de sade do povo. (...) Os generais presidentes promoveram alteraes estruturais na administrao pblica, no sentido de uma forte centralizao do poder, privilegiando a autonomia do Executivo e limitando o campo de ao dos poderes Legislativo e Judicirio. Sob a ditadura, a burocracia governamental foi dominada pelos tecnocratas, civis e militares, (...) responsveis em boa parte pelo 'milagre econmico' que marcou o pas entre 1968 e 1974. (...) Essa

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

POLTICA E P g i n a | 17 PROMOO EM SADE PBLICAelevao do Produto Interno Bruto (PIB) foi resultado da modernizao da estrutura produtiva nacional, mas tambm, em grande parte, da poltica que inibiu as conquistas salariais obtidas na dcada de 50. Criava-se assim uma falsa iluso de desenvolvimento nacional, j que o poder de compra do salrio mnimo foi sensivelmente reduzido, tornando ainda mais difcil a vida das famlias trabalhadoras. (Bertolli Filho, 1996).

A poltica econmica e o forte arrocho salarial operaram intensa concentrao de renda que resultou no empobrecimento da populao. E esta situao se refletiu no crescimento da mortalidade e da morbidade. quando ocorrem as epidemias de poliomielite e de meningite, sendo que as notcias sobre esta ltima foram censuradas nos meios de comunicao, em 1974.O primeiro efeito do golpe militar sobre o Ministrio da Sade foi a reduo das verbas destinadas sade pblica. Aumentadas na primeira metade da dcada de 60, tais verbas decresceram at o final da ditadura. (...) Apesar da pregao oficial de que a sade constitua um 'fator de produtividade, de desenvolvimento e de investimento econmico', o Ministrio da Sade privilegiava a sade como elemento individual e no como fenmeno coletivo. E isso alterou profundamente sua linha de atuao. (Bertolli Filho, 1996).

Com o golpe de 1964 e o discurso de racionalidade, eficcia e saneamento financeiro, ocorre a fuso dos IAPs, com a criao do Instituto Nacional de Previdncia Social INPS. Este fato, ocorrido em 1966, marca tambm a perda de representatividade dos trabalhadores na gesto do sistema. A criao do INPS insere-se na perspectiva modernizadora da mquina estatal, aumenta o poder de regulao do Estado sobre a sociedade e representa uma tentativa de desmobilizao das foras polticas estimuladas em perodos populistas anteriores. O rompimento com a poltica populista no significou alterao em relao poltica assistencialista anterior, ao contrrio, o Estado amplia a cobertura da previdncia aos trabalhadores domsticos e aos trabalhadores rurais, alm de absorver as presses por uma efetiva cobertura daqueles trabalhadores j beneficiados pela Lei Orgnica da Previdncia Social. Excetuando os trabalhadores do mercado informal de trabalho, todos os demais eram cobertos pela Previdncia Social. Em relao assistncia mdica, observa-se um movimento ainda mais expressivo de ampliao de cobertura. Os gastos com assistncia mdica, que continuaram a crescer neste perodo, chegam a representar mais de 30% dos gastos totais do INPS em 76. A nfase dada ateno individual, assistencialista e especializada, em detrimento das medidas de sade pblica, de carter preventivo e de interesse coletivo. Exemplo do descaso com as aes coletivas e de preveno a diminuio do oramento do Ministrio da Sade, que chega a representar menos de 1,0% dos recursos da Unio. Acontece uma progressiva eliminao da gesto tripartite das instituies previdencirias, at sua extino em 70. Ao mesmo tempo, a 'contribuio do Estado' se restringia aos custos com a estrutura administrativa.A criao do INPS propiciou a implementao de uma poltica de sade que levou ao desenvolvimento do complexo mdico-industrial, em especial nas

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

POLTICA E P g i n a | 18 PROMOO EM SADE PBLICAreas de medicamentos e equipamentos mdicos. Ao mesmo tempo, e em nome da racionalidade administrativa, o INPS d prioridade a contratao de servios de terceiros, em detrimento de servios prprios, deciso que acompanha a postura do governo federal como um todo. (Cunha & Cunha, 1998).

No perodo de 1968 a 1975, generalizou-se a demanda social por consultas mdicas como resposta s graves condies de sade; o elogio da medicina como sinnimo de cura e de restabelecimento da sade individual e coletiva; a construo ou reforma de inmeras clnicas e hospitais privados, com financiamento da Previdncia Social; a multiplicao de faculdades particulares de medicina por todo o pas; a organizao e complementao da poltica de convnios entre o INPS e os hospitais, clnicas e empresas de prestao de servios mdicos, em detrimento dos recursos - j parcos tradicionalmente destinados aos servios pblicos. Tais foram as orientaes principais da poltica sanitria da conjuntura do 'milagre brasileiro'. Esta poltica teve, evidentemente, uma srie de efeitos e conseqncias institucionais e sociais, entre as quais a progressiva predominncia de um sistema de ateno mdica 'de massa' (no sentido de 'massificado') sobre uma proposta de medicina social e preventiva; o surgimento e o rpido crescimento de um setor empresarial de servios mdicos, constitudos por proprietrios de empresas mdicas centradas mais na lgica do lucro do que na da sade ou da cura de sua clientela. Assistimos tambm ao desenvolvimento de um ensino mdico desvinculado da realidade sanitria da populao, voltado para a especializao e a sofisticao tecnolgica e dependente das industrias farmacuticas e de equipamentos mdico-hospitalares. Assistimos, finalmente, consolidao de uma relao autoritria, mercantilizada e tecnificada entre mdico e paciente e entre servios de sade e populao." (Luz, 1991). Ainda neste perodo que difundida a chamada medicina comunitria, com apoio da Organizao Mundial de Sade e da Organizao Panamericana de Sade. A medicina comunitria propunha tcnicas de medicina simplificada, a utilizao de mo de obra local (os agentes de sade) e a participao da comunidade. Entre os trabalhos que buscaram a participao da comunidade na rea de sade, havia os ligados igreja catlica como o projeto de Nova Igua e o de Gois Velho, os projetos ligados s universidades, financiados por rgos externos, como o de Londrina-PR e os projetos assumidos pelo governo como o Programa de Interiorizao das Aes de Sade e Saneamento - PIASS, que objetivava a extenso dos servios de sade populao carente. Em 1975, foi promulgada a lei que instituiu o Sistema Nacional de Sade, que apesar de conter idias inovadoras, reforava a dualidade do setor sade dando ao Ministrio da Sade carter apenas normativo e aes na rea de interesse coletivo e ao Ministrio da Previdncia a responsabilidade pelo atendimento individualizado. Aps algum tempo de funcionamento, o INPS enfrentou grave crise financeira, resultado de: 1) aumento de gastos; 2) aumento da demanda; 3) maneira como se dava o contrato com a rede mdica privada, possibilitando fraudes; 4) inexistncia de fiscalizao dos servios executados pela rede privada.

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

POLTICA E P g i n a | 19 PROMOO EM SADE PBLICA

Assim, em 1978 houve nova tentativa de racionalizao da previdncia e foi criado o SINPAS - Sistema Nacional de Previdncia e Assistncia Social (...)" (CEFOR, s.d.). A criao do SINPAS tinha como objetivo disciplinar a concesso e manuteno de benefcios e prestao de servios, o custeio de atividades e programas, a gesto administrativa, financeira e patrimonial da previdncia. Foram criados o Instituto Nacional de Assistncia Mdica da Previdncia Social - INAMPS e o Instituto de Arrecadao da Previdncia Social - IAPAS, alm de integrar os rgos j existentes. A criao do SINPAS pode ser compreendida no processo de crescente tendncia a universalizao e adoo do modelo de Seguridade Social. Neste perodo esto definidas as bases que permitiram a hegemonia, na dcada de 70, do modelo assistencial privatista. De acordo com Mendes, este modelo se assenta no seguinte trip: a) o Estado como financiador do sistema, atravs da Previdncia Social; b) o setor privado nacional como maior prestador de servios de assistncia mdica; c) o setor privado internacional como o mais significativo produtor de insumos, em especial equipamentos mdicos e medicamentos." (Cunha & Cunha, 1998).

As dcadas de 80 e 90A crise brasileira agravou-se aps a falncia do modelo econmico do regime militar, manifestada, sobretudo pelo descontrole inflacionrio, j a partir do final dos anos 70. Ao mesmo tempo, a sociedade voltava a mobilizar-se, exigindo liberdade, democracia e eleio direta do presidente da Repblica. O ltimo general presidente, Joo Figueiredo (1979-1985), viu-se obrigado a acelerar a democratizao do pas, a lenta e gradual abertura poltica iniciada por seu antecessor. Foi extinto o bipartidarismo imposto pelos militares e criaram-se novos partidos polticos. A imprensa livrou-se da censura, os sindicatos ganharam maior liberdade e autonomia e as greves voltaram a marcar presena no cotidiano das cidades brasileiras. (Bertolli Filho, 1996). A reorganizao do pas em direo a um Estado de direito desenvolveu-se lentamente e de maneira conflituosa. A partir das eleies de 1982, as negociaes entre as foras polticas mais conservadoras e moderadas se sucederam, na busca da ampliao da abertura democrtica. Essas negociaes colocaram em plano secundrio - na verdade quase excluram - os sindicatos e partidos de esquerda, rcem-sados da clandestinidade, apesar do seu sucesso eleitoral nos anos de 1982 e 1984. Os resultados das eleies de 1986 favoreceram as foras conservadoras, graas a procedimentos de corrupo eleitoral (clientelismo, curralismo eleitoral, financiamento de candidatos favorveis a lobbies etc) empregados desde a Primeira Repblica. Apesar disso, grande massa de votos foi para os setores e partidos polticos progressistas e de esquerda. (Luz, 1991).

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

POLTICA E P g i n a | 20 PROMOO EM SADE PBLICA

Desde os anos 70, havia uma certa inquietao no interior do Estado com os gastos crescentes na sade. (...) A incorporao de grandes contingentes de trabalhadores no sistema, o desenvolvimento de novas tecnologias mdicas maios complexas (encarecendo o atendimento) e a m distribuio destes recursos, tornavam a assistncia mdica previdenciria extremamente onerosa. Tudo isso, num quadro de crise econmica, prognosticava a falncia do modelo. Assim, no final dos anos 70, estava demarcada a diretriz de reduo de custos, mas, contraditoriamente, havia forte tendncia de expanso do atendimento mdico para os setores ainda no cobertos. J no incio da dcada, comeara a surgir, ainda fora do aparato estatal, uma corrente contra-hegemnica que preconizava como proposta - para a melhoria da assistncia mdica no pas - a descentralizao, articulada regionalizao e hierarquizao dos servios de sade e democratizao do sistema, atravs da extenso de cobertura a setores at ento descobertos, como os trabalhadores rurais. O movimento sanitrio criticava o modelo hospitalocntrico e propunha a nfase em cuidados primrios e a prioridade do setor pblico. Mas somente na dcada de 80 que as propostas defendidas pelos sanitaristas passam a prevalecer no discurso oficial. O movimento sanitrio vai ter, portanto, um ponto em comum com os setores at ento hegemnicos: a necessidade de racionalizar os gastos com sade. Do ponto de vista dos sanitaristas, o argumento da racionalizao dos gastos podia servir, de um lado, luta pela quebra do modelo prevalente, uma vez que o setor privado era responsvel pelo aumento e pela maior parte das despesas na sade. De outro lado, possibilitava uma maior democratizao do atendimento mdico, estendendo-o populao marginalizada que no contribua diretamente com a Previdncia Social.(...) Entre 1981 e setembro de 1984 o pas vivencia uma crise econmica explcita, e quando se iniciam as polticas racionalizadoras na sade e as mudanas de rota com o CONASP / Conselho Consultivo da Administrao da Sade Previdenciria e as AIS / Aes Integradas de Sade. Este um momento tumultuado na sade, tendo em vista a quebra de hegemonia do modelo anterior." (Frana, 1998).

Em 1981 foi criado o CONASP que elaborou um novo plano de reorientao da Assistncia Mdica (...) que, em linhas gerais propunha melhorar a qualidade da assistncia fazendo modificaes no modelo privatizante (de compra de servios mdicos) tais como a descentralizao e a utilizao prioritria dos servios pblicos federais, estaduais e municipais na cobertura assistencial da clientela. A partir do plano do CONASP, surgiu o Programa de Aes Integradas de Sade, que ficou conhecido como AIS. Tinha o objetivo de integrar os servios que prestavam a assistncia sade da populao de uma regio. Os governos estaduais, atravs de convnios com os Ministrios da Sade e Previdncia, recebiam recursos para executar o programa, sendo que as prefeituras participavam atravs de adeso formal ao convnio. Em todos estes planos, havia a idia de integrao da sade pblica com a assistncia mdica individual. Era uma aspirao antiga que encontrava interesses contrrios suaSade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

POLTICA E P g i n a | 21 PROMOO EM SADE PBLICA

concretizao nos grupos mdicos privados e na prpria burocracia do INAMPS. (CEFOR, s.d.). No governo da Nova Repblica, a proposta das AIS fortalecida e este fortalecimento passa pela valorizao das instncias de gesto colegiada, com participao de usurios dos servios de sade. Em 1986 realizada em Braslia a VIII Conferncia Nacional de Sade, com ampla participao de trabalhadores, governo, usurios e parte dos prestadores de servios de sade. Precedida de conferncias municipais e estaduais, a VIII CNS significou um marco na formulao das propostas de mudana do setor sade, consolidadas na Reforma Sanitria brasileira. Seu documento final sistematiza o processo de construo de um modelo reformador para a sade, que definida como 'resultante das condies de alimentao, habitao, educao, renda, meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse da terra e acesso a servios de sade. assim, antes de tudo, o resultado das formas de organizao social da produo, as quais podem gerar desigualdades nos nveis de vida.' Este documento serviu de base para as negociaes na Assemblia Nacional Constituinte, que se reuniria logo aps." (Cunha & Cunha, 1998). Em 1988 a Assemblia Nacional Constituinte aprovou a nova Constituio Brasileira, inclundo, pela primeira vez, uma seo sobre a Sade. Esta seo sobre Sade incorporou, em grande parte, os conceitos e propostas da VIII Conferncia Nacional de Sade, podendo-se dizer que na essncia, a Constituio adotou a proposta da Reforma Sanitria e do SUS. No entanto, isso no foi fcil. Vrios grupos tentaram aprovar outras propostas, destacando-se duas: a dos que queriam manter o sistema como estava, continuando a privilegiar os hospitais privados contratados pelo INAMPS e a dos que queriam criar no pas um sistema de seguro-sade mais ou menos parecido com o americano (que, todos sabemos, caro e no atende a todos). Como essas alternativas no tinham muita aceitao, pois uma j tinha demonstrado que no funcionava e a outra era invivel pela questo econmica, a proposta feita pelo movimento da Reforma Sanitria teve chance e acabou sendo aprovada, ainda que com imperfeies. De qualquer forma essa foi uma grande vitria, que coloca a Constituio brasileira entre as mais avanadas do mundo no campo do direito sade." (Rodriguez Neto, 1994) Durante o processo de elaborao da Constituio Federal, uma outra iniciativa de reformulao do sistema foi implementada, o Sistema Unificado e Descentralizado de Sade - SUDS. Idealizado enquanto estratgia de transio em direo ao Sistema nico de Sade, propunha a transferncia dos servios do INAMPS para estados e municpios. O SUDS pode ser percebido como uma estadualizao de servios. Seu principal ganho foi a incorporao dos governadores de estado no processo de disputa por recursos previdencirios. Contudo a estadualizao, em alguns casos, levou retrao de recursos estaduais para a sade e apropriao de recursos federais para outras aes, alm de possibilitar a negociao clientelista com os municpios.

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

POLTICA E P g i n a | 22 PROMOO EM SADE PBLICA

Enquanto resultante dos embates e das diferentes propostas em relao ao setor sade presentes na Assemblia Nacional Constituinte, a Constituio Federal de 1988 aprovou a criao do Sistema nico de Sade, reconhecendo a sade como um direito a ser assegurado pelo Estado e pautado pelos princpios de universalidade, eqidade, integralidade e organizado de maneira descentralizada, hierarquizada e com participao da populao." (Cunha & Cunha, 1998).

INSTITUIO DO MINISTRIO DA SADE Muito embora a histria da Sade Pblica Brasileira tenha incio em 1808, o Ministrio da Sade s veio a ser institudo no dia 25 de julho de 1953, com a Lei n 1.920, que desdobrou o ento Ministrio da Educao e Sade em dois ministrios: Sade e Educao e Cultura. A partir da sua criao, o Ministrio passou a encarregar-se, especificamente, das atividades at ento de responsabilidade do Departamento Nacional de Sade (DNS), mantendo a mesma estrutura que, na poca, no era suficiente para dar ao rgo governamental o perfil de Secretaria de Estado, apropriado para atender aos importantes problemas da sade pblica existentes. Na verdade, o Ministrio limitava-se a ao legal e a mera diviso das atividades de sade e educao, antes incorporadas num s ministrio. Mesmo sendo a principal unidade administrativa de ao sanitria direta do Governo, essa funo continuava, ainda, distribuda por vrios ministrios e autarquias, com pulverizao de recursos financeiros e disperso do pessoal tcnico, ficando alguns vinculados a rgos de administrao direta, outros s autarquias e fundaes. Trs anos aps a criao do Ministrio, em 1956, surge o Departamento Nacional de Endemias Rurais, que tinha como finalidade organizar e executar os servios de investigao e de combate malria, leishmaniose, doena de Chagas, peste, brucelose, febre amarela e outras endemias existentes no pas, de acordo com as convenincias tcnicas e administrativas. O Instituto Oswaldo Cruz preservava sua condio de rgo de investigao, pesquisa e produo de vacinas. A Escola Nacional de Sade Pblica incumbia-se da formao e aperfeioamento de pessoal e o antigo Servio Especial de Sade Pblica atuava no campo da demonstrao de tcnicas sanitrias e servios de emergncia a necessitarem de pronta mobilizao, sem prejuzo de sua ao executiva direta, no campo do saneamento e da assistncia mdico-sanitria aos estados. No incio dos anos 60, a desigualdade social, marcada pela baixa renda per capita e a alta concentrao de riquezas, ganha dimenso no discurso dos sanitaristas em torno das relaes entre sade e desenvolvimento. O planejamento de metas de crescimento e de melhorias, conduziram o que alguns pesquisadores intitularam como a grande panacia dos anos 60 - o planejamento global e o planejamento em sade. As propostas para adequar os servios de sade pblica realidade diagnosticada pelos sanitaristas desenvolvimentistas tiveram marcos importantes, como a formulao da Poltica Nacional de Sade na gesto do ento ministro, Estcio Souto-Maior, em 1961, com oSade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

POLTICA E P g i n a | 23 PROMOO EM SADE PBLICA

objetivo de redefinir a identidade do Ministrio da Sade e coloc-lo em sintonia com os avanos verificados na esfera econmico-social. Outro marco da histria da sade no mbito ministerial ocorreu em 1963, com a realizao da III Conferncia Nacional da Sade (CNS), convocada pelo ministro Wilson Fadul, rduo defensor da tese de municipalizao. A Conferncia propunha a reordenao dos servios de assistncia mdico-sanitria e alinhamentos gerais para determinar uma nova diviso das atribuies e responsabilidades entre os nveis poltico-administrativos da Federao visando, sobretudo, a municipalizao. Em 1964, os militares assumem o governo e Raymundo de Brito firma-se como ministro da sade e reitera o propsito de incorporar ao MS a assistncia mdica da Previdncia Social, dentro da proposta de fixar um Plano Nacional de Sade segundo as diretrizes da III Conferncia Nacional de Sade. Com a implantao da Reforma Administrativa Federal, em 25 de fevereiro de 1967, ficou estabelecido que o Ministrio da Sade seria o responsvel pela formulao e coordenao da Poltica Nacional de Sade, que at ento no havia sado do papel. Ficaram as seguintes reas de competncia: poltica nacional de sade; atividades mdicas e paramdicas; ao preventiva em geral, vigilncia sanitria de fronteiras e de portos martimos, fluviais e areos; controle de drogas, medicamentos e alimentos e pesquisa mdico-sanitria. Ao longo destes quase cinqenta anos de existncia, o Ministrio da Sade passou por diversas reformas na estrutura. Destaca-se a reforma de 1974, na qual as Secretarias de Sade e de Assistncia Mdica foram englobadas, passando a constituir a Secretaria Nacional de Sade, para reforar o conceito de que no existia dicotomia entre Sade Pblica e Assistncia Mdica. No mesmo ano, a Superintendncia de Campanhas de Sade Pblica - SUCAM - passa subordinao direta do Ministro do Estado, para possibilitar-lhe maior flexibilidade tcnica e administrativa, elevando-se a rgo de primeira linha. Foram criadas as Coordenadorias de Sade, compreendendo cinco regies: Amaznia, Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-Oeste, ficando as Delegacias Federais de Sade compreendidas nessas reas subordinadas s mesmas. As Delegacias Federais de Sade deixavam, assim, de integrar rgos de primeira linha. criada tambm, a Coordenadoria de Comunicao Social como rgo de assistncia direta e imediata do Ministro de Estado e institudo o Conselho de Preveno Antitxico, como rgo colegiado, diretamente subordinado ao Ministro de Estado. Do final da dcada de 80 em diante, destaca-se a Constituio Federal de 1988, que determinou ser dever do Estado garantir sade a toda a populao e, para tanto, criou o Sistema nico de Sade. Em 1990, o Congresso Nacional aprovou a Lei Orgnica da Sade que detalha o funcionamento do Sistema.

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

POLTICA E P g i n a | 24 PROMOO EM SADE PBLICA

PRINCIPAIS DATAS DO DESENVOLVIMENTO HISTRICO DO SUS 1988 O SUS criado e aprovado pela Constituio Federal, que reconhece o direito de acesso universal sade para toda a populao. 1989 Registro do ltimo caso de poliomielite no Brasil. Criao do Programa de Sade do Adolescente. 1990 Regulamentao da organizao e funcionamento dos servios do SUS. Regulamentao da participao da comunidade na gesto o SUS e das transferncias intergovernamentais de recursos. Implantao do Sistema de Informaes Hospitalares e o Sistema de Informaes Ambulatrias. 1991 Implantao do Programa Agentes Comunitrios da Sade. Realizao da primeira campanha da mdia da hansenase, quebrando o preconceito ao redor da doena. 1992 Realizao da 9 Conferncia Nacional de Sade, com o tema Municipalizao o caminho. 1993 Regulamentao do processo de descentralizao da gesto dos servios e aes do SUS, por meio da Norma Operacional Bsica. Extino do Instituto Nacional de Assistncia Mdica da Previdncia Social (Inamps). 1994 Organizao Pan-Americana da Sade (OPAS/OMS) concede ao Brasil o certificado de erradicao da poliomielite. Criao do Programa Sade da Famlia. 1995Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

POLTICA E P g i n a | 25 PROMOO EM SADE PBLICA

Recomendao para que as emissoras de TV evitem a transmisso de imagens em que personalidades aparecem fumando. 1996 Implantao da distribuio gratuita de medicamentos aos portadores de HIV/Aids. Redefinio do modelo de gesto do SUS que disciplina as relaes entre Unio, estados, municpios e Distrito Federal, por meio da Norma Operacional Bsica. Realizao da 10 Conferncia Nacional de Sade, com o tema SUS: Construindo um Novo Modelo de Ateno Sade para a Qualidade de Vida. 1997 Criao do Sistema Nacional de Transplantes. Implantao do servio de Assistncia Domiciliar Teraputica (ADT) para o atendimento aos portadores de HIV/Aids. Criao do Disque Sade. 1998 Instituio do Piso de Ateno Bsica para viabilizar a organizao de ateno bsica sade nos municpios brasileiros. 1999 Criao da Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria (Anvisa). O medicamento genrico estabelecido no pas, assim como a utilizao de nomes genricos em produtos farmacuticos. Incio da Campanha Nacional de Vacinao para a Terceira Idade contra a gripe, ttano e difteria. 2000 Criao da Agncia Nacional de Sade Suplementar (ANS). Realizao da 11 Conferncia Nacional de Sade, com o tema Efetivando o SUS: Acesso, Qualidade e Humanizao na Ateno Sade com Controle Social. Registro do ltimo surto de sarampo no Brasil. So assegurados os recursos mnimos para o financiamento das aes e servios pblicos de sade nas trs esferas de governo. 2001 O Brasil alcana a marca de 150 mil Agentes Comunitrios de Sade, antecipando a meta prevista para o fim de 2002.Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

POLTICA E P g i n a | 26 PROMOO EM SADE PBLICA

Aprovao da Norma Operacional de Assistncia Sade (NOAS), que define a regionalizao e a descentralizao da assistncia sade. A Organizao Mundial da Sade reconhece o Brasil como o pas com a maior e mais complexa Rede de Bancos de Leite Humano do mundo. 2002 Instituio do Dia Nacional de Mobilizao contra a Dengue. Criao da Poltica Nacional de Sade da Pessoa Portadora de Deficincia. Criao da Poltica Nacional de Ateno Sade dos Povos Indgenas. 2003 Criao da nova estrutura do Ministrio da Sade com as secretarias: Ateno Sade; Vigilncia em Sade; Cincia, Tecnologia e Insumos Estratgicos; Gesto Participativa; e Gesto do Trabalho e da Educao na Sade. Realizao da 12 Conferncia Nacional de Sade com o tema Sade: um Direito de todos e um Dever do Estado a sade que temos, o SUS que queremos. Criao do Servio de Atendimento Mvel de Urgncia (SAMU). Criao do programa De Volta para Casa, que contribuiu com o processo de reinsero social de pessoas com longa histria de internao psiquitrica. Criao do Plano Nacional de Sade no Sistema Penitencirio. Implantao do tratamento para fumantes na rede de ateno bsica. 2004 Instituio da Poltica Nacional de Humanizao no Sistema nico de Sade (HumanizaSUS). Lanamento do programa Brasil Sorridente. Um conjunto de aes do Ministrio da Sade para melhorar as condies de sade bucal da populao brasileira. Lanamento do programa Farmcia Popular do Brasil Criao da Empresa Brasileira de Hemoderivados e Biotecnologia (Hemobras). Publicao da Poltica Nacional de Ateno Integral Sade da Mulher. 2005 Publicao do Plano Nacional da Sade. Lanamento da Poltica Nacional de Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos. Inaugurao do Banco Nacional de Tumores (BNT), do Instituto Nacional do Cncer (Inca). 2006

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

POLTICA E P g i n a | 27 PROMOO EM SADE PBLICA

Aprovao do Pacto pela Sade em trs dimenses: Pela Vida, em Defesa do SUS e de Gesto. Instituio da Carta dos Direitos dos Usurios da Sade. Incorporao da vacinao contra o rotavrus no Calendrio Bsico de Vacinao da Criana, tornando-se o primeiro pas do mundo a oferecer essa vacina na rede pblica de sade. Lanamento da Poltica da Pessoa Idosa. 2007 Realizao da 13 Conferncia Nacional de Sade, com o tema Sade e Qualidade de Vida: Poltica de Estado e Desenvolvimento. Lanamento do Programa Mais Sade PAC Sade direito de todos, em quatro vertentes: 1. Promoo e ateno; 2. Gesto, trabalho e controle social; 3. Ampliao do acesso com qualidade; 4. Desenvolvimento e Inovao em Sade e o PAC do saneamento, ara ampliar o acesso e a qualidade dos servios prestados pelo SUS populao brasileira. Lanamento do Programa Nacional de Telesade Licenciamento compulsrio do anti-retroviral Efavirenz, remdio usado no tratamento da Aids. 2008 Implantao das aes do Programa Mais Sade PAC: Sade, direito de todos. Governo estimula mudanas estruturais nas unidades de sade para incentivar o parto normal humanizado, controlar riscos e reduzir a mortalidade materna neonatal. Lanamento da Campanha Nacional contra a Rubola, a maior campanha de vacinao do mundo.

P S G R A D U A OSade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

POLTICA E P g i n a | 28 PROMOO EM SADE PBLICA

Promoo da sade e qualidade de vidaHealth promotion and quality of life1

Departamento de Administrao e Planejamento em Sade, Escola Nacional de Sade Pblica, Fundao Oswaldo Cruz. Rua Leopoldo Bulhes o 1.480, 3 andar, 21041210 Rio de Janeiro, RJ [email protected]

Abstract Several scientific evidences show the contribution of health to the quality of life of either individuals or populations. Similarly, many of the social life components that contribute to quality in life are also essential for individuals and populations to attain an adequate health standard. For individuals and populations to achieve appropriate health standards it is necessary not only access to quality medical-health services. Health determinants must be considered widely, thus requiring healthy public policies (concerned with its impacts on health), an effective intersectoral articulation, and the population's engagement. In this paper, the author reviews the emergency and development of health promotion by focusing his analysis on the above strategies, which according to the health sector's propositions would be the most promising strategies to improve the quality of life, especially in social formations where social-public health inequities are so many, as in Brazil. These strategies are materialized in the bases and practices of the healthy towns movement, which are strictly associated with public management innovations for the integral and sustainable local development, as well as with the local Agenda 21.

Key words Health Promotion; Quality of Life

Resumo - Existem evidncias cientficas abundantes que mostram a contribuio da sade para a qualidade de vida de indivduos ou populaes. Da mesma forma, sabido que muitos componentes da vida social que contribuem para uma P vida com qualidade so tambm fundamentais para que indivduos e populaes alcancem um perfil elevado de sade. S necessrio mais do que o acesso a servios mdico- G assistenciais de qualidade, preciso enfrentar os R determinantes da sade em toda a sua amplitude, o que requer A polticas pblicas saudveis, uma efetiva articulao D intersetorial do poder pblico e a mobilizao da populao. U No presente artigo, o autor faz uma reviso da emergncia e A desenvolvimento da promoo da sade, centrando sua anlise justamente nas estratgias promocionais acima apontadas, que seriam aquelas que, a partir de proposies do setor sade, OSade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

POLTICA E P g i n a | 29 PROMOO EM SADE PBLICA

apresentam-se como mais promissoras para o incremento da qualidade de vida, sobretudo em formaes sociais com alta desigualdade scio-sanitria, como o caso do Brasil. no movimento dos municpios saudveis que tais estratgias se concretizam, atravs de seus prprios fundamentos e prticas, que esto estreitamente relacionados com as inovaes na gesto pblica para o desenvolvimento local integrado e sustentvel e as Agendas 21 locais. Palavras-chave Promoo da Sade; Qualidade de Vida

IntroduoAs condies de vida e sade tm melhorado de forma contnua e sustentada na maioria dos pases, no ltimo sculo, graas aos progressos polticos, econmicos, sociais e ambientais, assim como aos avanos na sade pblica e na medicina. Estudos de diferentes autores e os relatrios sobre a sade mundial (WHO, 1998) e da regio das Amricas (OPAS, 1998) so conclusivos a respeito. Na Amrica Latina, por exemplo, a expectativa de vida cresceu de 50 anos, depois da II Guerra Mundial, para 67 anos, em 1990, e para 69 anos, em 1995. Entretanto, as mesmas organizaes so taxativas ao informar que ainda que tal melhoria seja incontestvel, tambm o a permanncia de profundas desigualdades nas condies de vida e sade entre os pases e, dentro deles, entre regies e grupos sociais. De outro lado, ao examinar as condies de morbi-mortalidade prevalentes, verifica-se, em alguns setores, a permanncia de problemas que j esto resolvidos em muitos lugares e para diversas populaes (como o caso de certas doenas infectoparasitrias e condies ligadas infra-estrutura urbana bsica, por exemplo); o crescimento de outros problemas (as doenas crnicas no-infecciosas, tais como o cncer e as doenas cardio e cerebrovasculares); e o aparecimento de novos problemas (como a AIDS) e de questes antes no identificadas ou consideradas importantes (como o uso de drogas e a violncia, ao lado dos fatores comportamentais) ou, sequer, como questes de sade (o estresse, por exemplo). A principal resposta social a tais problemas de sade tm sido investimentos crescentes em assistncia mdica curativa e individual, ainda que se identifique, de forma clara, que medidas preventivas e a promoo da sade, assim como a melhoria das condies de vida em geral, tenham sido, de fato, as razes fundamentais para os avanos antes mencionados.

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

POLTICA E P g i n a | 30 PROMOO EM SADE PBLICA

Este artigo pretende discutir a contribuio da promoo da sade, como campo de conhecimento e de prtica, para a qualidade de vida. Para tanto, apresentaremos os conceitos que aproximam promoo da sade e qualidade de vida, bem como algumas estratgias e iniciativas capazes de operacionalizar sua interao: as polticas pblicas saudveis que exigem a ao intersetorial, e uma nova institucionalidade social que vem se materializando com as propostas dos municpios saudveis, da Agenda 21 e do desenvolvimento local integrado e sustentvel.

Sade e qualidade de vidaO tema da influncia da sade sobre as condies e a qualidade de vida, e viceversa, tem ocupado polticos e pensadores ao longo da histria. J no sculo XVIII, quando ocupava as funes de diretor geral de sade pblica da Lombardia austraca e professor da Faculdade de Medicina, Johann Peter Frank escreveu, no seu clebre A misria do povo, me das enfermidades, que a pobreza e as ms condies de vida, trabalho, nutrio etc. eram as principais causas das doenas, preconizando, mais do que reformas sanitrias, amplas reformas sociais e econmicas (Sigerist, 1956). Chadwick, na primeira metade do sculo passado, referindo-se situao de sade dos ingleses, afirmava que a sade era afetada - para melhor ou para pior - pelo estado dos ambientes social e fsico, reconhecendo, ainda, que a pobreza era muitas vezes a conseqncia de doenas pelas quais os indivduos no podiam ser responsabilizados e que a doena era um fator importante no aumento do nmero de pobres (Rosen, 1979). Segundo Sigerist (1956), Chadwick no queria apenas aliviar os efeitos das ms condies de vida e sade dos pobres ingleses, mas sim transformar suas causas econmicas, sociais e fsicas. Da mesma forma, h muito tempo tem sido questionado o papel da medicina, da sade pblica e, num sentido mais genrico, do setor sade no enfrentamento do que seriam as causas mais amplas e gerais dos problemas de sade, aquelas que fugiriam ao objeto propriamente mdico da questo sade. Virchow, na Alemanha, por exemplo, nos anos que precederam a revoluo de 1848, liderou um poderoso movimento de reforma mdica, atravs do qual defendia que a medicina uma cincia social e a poltica no mais do que a medicina em grande escala (Sigerist, 1956). Em um livro j clssico, McKeown & Lowe (1989) afirmam que as melhorias na nutrio e no saneamento (aspectos relativos ao meio ambiente) e as modificaes nas condutas da reproduo humana (sobretudo a diminuio no nmero de filhos por famlia) foram os fatores responsveis pela reduo da mortalidade na Inglaterra e no Pas de Gales, no sculo XIX e na primeira metade do sculo XX. As intervenes mdicas eficazes, como as imunizaes e a antibioticoterapia, tiveram influncia tardia e de menor importncia relativa. No panorama mundial, estudos clssicos, como o 'Black Report' ingls, alm de uma notvel tradio de estudos canadenses, norte-americanos e europeus, so prdigos em mostrar as relaes entre sade e qualidade/condies de vida.Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

POLTICA E P g i n a | 31 PROMOO EM SADE PBLICA

O debate sobre qualidade (condies) de vida e sade tem tambm razovel tradio tanto no Brasil quanto na Amrica Latina. Paim (1997) publicou um excelente artigo de reviso sobre estudos que relacionam condies de vida e sade desenvolvidos nas ltimas dcadas, no mbito das correntes da medicina e da epidemiologia social. Nesse artigo ele destaca os trabalhos pioneiros de Josu de Castro, Samuel Pessoa, Hugo Bemh (Chile), e outros mais recentes, como os de Breilh e Gandra, no Equador; Laurell, no Mxico; e Monteiro, Possas, Arouca e o prprio autor, no Brasil, todos de cunho terico-conceitual ou que demonstram as mencionadas relaes atravs de trabalhos empricos. A Associao Brasileira de Sade Coletiva (Abrasco) realizou, no faz muito tempo, um seminrio sobre condies de vida e situao de sade em que vrios autores latinoamericanos discutem, de diversos ngulos, o tema da sade e qualidade de vida. Os congressos brasileiros de sade coletiva, epidemiologia, e cincias sociais e sade promovidos pela mesma entidade nos ltimos anos tm sido prdigos em trabalhos que, em diferentes conjunturas, discutem o mesmo tema. Duas revises recentes, publicadas simultaneamente (Minayo, 1995; Monteiro, 1995), exploram diversas dimenses do tema sade e qualidade de vida no Brasil. Particularmente em pases como o Brasil e outros da Amrica Latina, a pssima distribuio de renda, o analfabetismo e o baixo grau de escolaridade, assim como as condies precrias de habitao e ambiente tm um papel muito importante nas condies de vida e sade. Em um amplo estudo sobre as tendncias da situao de sade na Regio das Amricas recentemente publicado, a OPAS (1998) mostra, de forma inequvoca, que os diferenciais econmicos entre os pases so determinantes para as variaes nas tendncias dos indicadores bsicos de sade e desenvolvimento humanos. A reduo na mortalidade infantil, o incremento na esperana de vida, o acesso gua e ao saneamento bsico, o gasto em sade, a fecundidade global e o incremento na alfabetizao de adultos foram funo direta do Produto Nacional Bruto dos pases. Entretanto, demonstrar que a qualidade/ condies de vida afeta a sade e que esta influencia fortemente a qualidade de vida no o nico desafio. Embora sobejamente demonstradas, restam muitas questes a serem resolvidas e respondidas neste campo de investigao, inclusive no que diz respeito s intervenes que, a partir do setor sade, possam, mais eficazmente, influenciar de forma favorvel a qualidade de vida. Nessa articulao entre sade e condies/ qualidade de vida, pode-se identificar mais recentemente - com flagrante inspirao nos pensadores e nos movimentos pioneiros da sade pblica e da medicina social j mencionados - o desenvolvimento da promoo da sade como campo conceitual e de prtica que busca explicaes e respostas pretensamente integradoras para esta questo. o que discutiremos a seguir.

Promoo da sade

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

POLTICA E P g i n a | 32 PROMOO EM SADE PBLICA

A promoo da sade, como vem sendo entendida nos ltimos 20-25 anos, representa uma estratgia promissora para enfrentar os mltiplos problemas de sade que afetam as populaes humanas e seus entornos neste final de sculo. Partindo de uma concepo ampla do processo sade-doena e de seus determinantes, prope a articulao de saberes tcnicos e populares, e a mobilizao de recursos institucionais e comunitrios, pblicos e privados, para seu enfrentamento e resoluo. Decorridos pouco mais de dez anos da divulgao da Carta de Ottawa (WHO, 1986), um dos documentos fundadores da promoo da sade atual, este termo est associado a um conjunto de valores: qualidade de vida, sade, solidariedade, eqidade, democracia, cidadania, desenvolvimento, participao e parceria, entre outros. Refere-se tambm a uma combinao de estratgias: aes do Estado (polticas pblicas saudveis), da comunidade (reforo da ao comunitria), de indivduos (desenvolvimento de habilidades pessoais), do sistema de sade (reorientao do sistema de sade) e de parcerias intersetoriais. Isto , trabalha com a idia de responsabilizao mltipla, seja pelos problemas, seja pelas solues propostas para os mesmos. A promoo da sade vem sendo interpretada, de um lado, como reao acentuada medicalizao da vida social e, de outro, como uma resposta setorial articuladora de diversos recursos tcnicos e posies ideolgicas. Embora o termo tenha sido usado a princpio para caracterizar um nvel de ateno da medicina preventiva (Leavell & Clark, 1976), seu significado foi mudando, passando a representar, mais recentemente, um enfoque poltico e tcnico em torno do processo sade-doena-cuidado. O conceito moderno de promoo da sade (e a prtica conseqente) surgiu e se desenvolveu, de forma mais vigorosa nos ltimos vinte anos, nos pases em desenvolvimento, particularmente no Canad, Estados Unidos e pases da Europa Ocidental. Quatro importantes Conferncias Internacionais sobre Promoo da Sade, realizadas nos ltimos 12 anos - em Ottawa (WHO, 1986), Adelaide (WHO, 1988), Sundsvall (WHO, 1991) e Jacarta (WHO, 1997) -, desenvolveram as bases conceituais e polticas da promoo da sade. Na Amrica Latina, em 1992, realizou-se a Conferncia Internacional de Promoo da Sade (OPAS, 1992), trazendo formalmente o tema para o contexto sub-regional. Sigerist (1946, apud Rosen, 1979) foi um dos primeiros autores a referir o termo, quando definiu as quatro tarefas essenciais da medicina:

a promoo da sade; a preveno das doenas; a recuperao dos enfermos; e a reabilitao,

e afirmou que a sade se promove proporcionando condies de vida decentes, boas condies de trabalho, educao, cultura fsica e formas de lazer e descanso, para o que pediu o esforo coordenado de polticos, setores sindicais e empresariais,

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

POLTICA E P g i n a | 33 PROMOO EM SADE PBLICA

educadores e mdicos. A estes, como especialistas em sade, caberia definir normas e fixar padres. Leavell & Clark (1976) utilizam o conceito de promoo da sade ao desenvolverem o modelo da histria natural da doena, que comportaria trs nveis de preveno. Dentro dessas trs fases de preveno existiriam pelo menos cinco nveis distintos, nos quais poder-se-iam aplicar medidas preventivas, dependendo do grau de conhecimento da histria natural de cada doena.

A preveno primriaA ser desenvolvida no perodo de pr-patognese, consta de medidas destinadas a desenvolver uma sade geral melhor, pela proteo especfica do homem contra agentes patolgicos ou pelo estabelecimento de barreiras contra os agentes do meio ambiente. A educao em sade elemento importante para esse objetivo. Afirmam os autores que os procedimentos para a promoo da sade incluem: bom padro de nutrio, ajustado s vrias fases do desenvolvimento humano; o atendimento das necessidades para o desenvolvimento timo da personalidade, incluindo o aconselhamento e educao adequados dos pais, em atividades individuais ou de grupos; educao sexual e aconselhamento pr-nupcial; moradia adequada; recreao e condies agradveis no lar e no trabalho. A orientao sanitria nos exames de sade peridicos e o aconselhamento para a sade em qualquer oportunidade de contato entre o mdico e o paciente, com extenso ao resto da famlia, esto entre os componentes da promoo. Trata-se, portanto, de um enfoque da promoo da sade centrado no indivduo, com uma projeo para a famlia ou grupos, dentro de certos limites. De outro lado, verificou-se que a extenso dos conceitos de Leavell & Clark inapropriada para o caso das doenas crnicas no-transmissveis. De fato, com a segunda revoluo epidemiolgica (Terris, 1992) - o movimento de preveno das doenas crnicas -, a promoo da sade passou a associar-se a medidas preventivas sobre o ambiente fsico e sobre os estilos de vida, e no mais voltadas exclusivamente para indivduos e famlias. As diversas conceituaes disponveis para a promoo da sade podem ser reunidas em dois grandes grupos (Sutherland & Fulton, 1992).

No primeiro deles, a promoo da sade consiste nas atividades dirigidas transformao dos comportamentos dos indivduos, focando nos seus estilos de vida e localizando-os no seio das famlias e, no mximo, no ambiente das culturas da comunidade em que se encontram. Neste caso, os programas ou atividades de promooSade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

POLTICA E P g i n a | 34 PROMOO EM SADE PBLICA

da sade tendem a concentrar-se em componentes educativos, primariamente relacionados com riscos comportamentais passveis de mudanas, que estariam, pelo menos em parte, sob o controle dos prprios indivduos. Por exemplo, o hbito de fumar, a dieta, as atividades fsicas, a direo perigosa no trnsito. Nessa abordagem, fugiriam do mbito da promoo da sade todos os fatores que estivessem fora do controle dos indivduos. O que, entretanto, vem caracterizar a promoo da sade, modernamente, a constatao do papel protagonista dos determinantes gerais sobre as condies de sade, em torno da qual se renem os conceitos do segundo grupo.

Este sustenta-se no entendimento que a sade produto de um amplo espectro de fatores relacionados com a qualidade de vida, incluindo um padro adequado de alimentao e nutrio, e de habitao e saneamento; boas condies de trabalho; oportunidades de educao ao longo de toda a vida; ambiente fsico limpo; apoio social para famlias e indivduos; estilo de vida responsvel; e um espectro adequado de cuidados de sade. Suas atividades estariam, ento, mais voltadas ao coletivo de indivduos e ao ambiente, compreendido num sentido amplo, de ambiente fsico, social, poltico, econmico e cultural, atravs de polticas pblicas e de condies favorveis ao desenvolvimento da sade (as escolhas saudveis sero as mais fceis) e do reforo (empowerment) da capacidade dos indivduos e das comunidades. Nesse sentido, como j afirmamos atrs, a promoo da sade moderna vai resgatar, ainda que com qualidade distinta, as proposies de sanitaristas do sculo XIX, como Villerm, na Frana; Chadwick, na Inglaterra e Virchow e Neumann, na Alemanha, para quem as causas das epidemias eram tanto sociais e econmicas como fsicas, e os remdios para as mesmas eram prosperidade, educao e liberdade (Terris, 1992).

Definio dos termos Promoo da SadeA Carta de Ottawa define promoo da sade como o processo de capacitao da comunidade para atuar na melhoria da sua qualidade de vida e sade, incluindo uma maior participao no controle deste processo (WHO, 1986). Inscreve-se, desta forma, no grupo de conceitos mais amplos, reforando a responsabilidade e os direitos dos indivduos e da comunidade pela sua prpria sade. Para Gutierrez (1994, apud Gutierrez, M. et al., 1997), promoo da sade o conjunto de atividades, processos e recursos, de ordem institucional, governamental ou da cidadania, orientados a propiciar a melhoria das condies de bem-estar e acesso a bens e servios sociais, que favoream o desenvolvimento de conhecimentos, atitudes e comportamentos favorveis ao cuidado da sade e o desenvolvimento de estratgias que permitam populao maior controle sobre sua sade e suas condies de vida, a nveis individual e coletivo. Neste conceito, mais apropriado realidade latinoamericana, agrega-se ao papel da comunidade a responsabilidade indelegvel do Estado na promoo da sade de indivduos e populaes.Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

POLTICA E P g i n a | 35 PROMOO EM SADE PBLICA

Na realidade, o conceito de promoo da sade vem sendo elaborado por diferentes atores tcnicos e sociais, em diferentes conjunturas e formaes sociais, ao longo dos ltimos 25 anos. Inmeros eventos internacionais, publicaes de carter conceitual e resultados de pesquisa tm contribudo para aproximaes a conceitos e prticas mais precisas para este campo. Nos Quadros 1 e 2 encontra-se uma breve (e certamente incompleta) cronologia do desenvolvimento do campo da promoo da sade no mundo e no Brasil, conforme Buss (1998).

P S G R A D U A OSade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

POLTICA E P g i n a | 36 PROMOO EM SADE PBLICA

P S G R A D U A OSade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

POLTICA E P g i n a | 37 PROMOO EM SADE PBLICA

O moderno movimento de promoo da sade surgiu formalmente no Canad, em maio de 1974, com a divulgao do documento A New Perspective on the Health of Canadians, tambm conhecido como Informe Lalonde (1974). Lalonde era ento ministro da Sade daquele pas. A motivao central do documento parece ter sido poltica, tcnica e econmica, pois visava enfrentar os custos crescentes da assistncia mdica, ao mesmo tempo em que apoiava-se no questionamento da abordagem

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

POLTICA E P g i n a | 38 PROMOO EM SADE PBLICA

exclusivamente mdica para as doenas crnicas, pelos resultados pouco significativos que aquela apresentava. Os fundamentos do Informe Lalonde encontram-se no conceito de campo da sade, que rene os chamados determinantes da sade. Esse conceito contempla a decomposio do campo da sade em quatro amplos componentes: biologia humana; ambiente; estilo de vida e; organizao da assistncia sade, dentro dos quais se distribuem inmeros fatores que influenciam a sade. O documento concluiu que quase todos os esforos da sociedade canadense destinados a melhorar a sade, bem como a maior parte dos gastos diretos em matria de sade, concentravam-se na organizao da assistncia mdica. No entanto, as causas principais das enfermidades e mortes tinham suas origens nos outros trs componentes: biologia humana, meio ambiente e estilos de vida. Em 1978, a Organizao Mundial da Sade (OMS) convocou, em colaborao com o Fundo das Naes Unidas para a Infncia (UNICEF), a I Conferncia Internacional sobre Cuidados Primrios de Sade, que se realizou em Alma-Ata. A conferncia trouxe um novo enfoque para o campo da sade, colocando a meta de "sade para todos no ano 2000" e recomendando a adoo de um conjunto de oito elementos essenciais: 1. educao dirigida aos problemas de sade prevalentes e mtodos para sua preveno e controle; 2. promoo do suprimento de alimentos e nutrio adequada; 3. abastecimento de gua e saneamento bsico apropriados; 4. ateno materno-infantil, incluindo o planejamento familiar; 5. imunizao contra as principais doenas infecciosas; 6. preveno e controle de doenas endmicas; 7. tratamento apropriado de doenas comuns e acidentes; 8. e distribuio de medicamentos bsicos. Talvez o que tenha ficado como a marca da conferncia tenha sido a proposta da ateno primria de sade. Mas outros componentes muito importantes e menos divulgados devem ser ressaltados: a reafirmao da sade como direito humano fundamental; que as desigualdades so inaceitveis; que os governos tm a responsabilidade pela sade dos cidados; e que a populao tem o direito de participar das decises no campo da sade.

P S G R A D U A O

Direitos reservadosFaculdade Joo Calvino Ba.

Sade Pblica e Farmacologia www.pronades.com / www.cetai.com.br

POLTICA E P g i n a | 39 PROMOO EM SADE PBLICA

As concluses e recomendaes de Alma-Ata trouxeram um importante reforo para os defensores da estratgia da promoo da sade, que culminou com a realizao da I Conferncia Internacional sobre Promoo da Sade, em Ottawa, Canad, em 1986.

As Conferncias Internacionais sobre Promoo da SadeContando com participantes de cerca de 38 pases, principalmente do mundo industrializado, a I Conferncia Internacional sobre Promoo da Sade teve como principal produto a Carta de Ottawa (WHO, 1986), que tornou-se, desde